Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
5703/09.1TVLSB.L1-6
Relator: PEREIRA RODRIGUES
Descritores: DIREITO DE RETENÇÃO
DETENÇÃO
POSSE
LEGÍTIMA
PROVIDÊNCIA CAUTELAR
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 02/04/2010
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Sumário: I. São requisitos do direito de retenção que alguém possua a detenção de uma coisa, que não lhe pertença e tenha obrigação de entregar a seu verdadeiro titular, e que seja credor deste último em virtude de despesas feitas com a coisa detida ou de danos por ela causados.
II. O direito de retenção subentende, para sua real existência, a detenção efectiva do bem ou a conservação do bem em poder do reconhecido detentor, com exclusão de outrem, designadamente do seu proprietário ou legítimo possuidor.
III. Sem detenção actual do bem não pode ser invocado direito de retenção, como não pode ser invocado este direito para se legitimar o início, ou reinício, da detenção de facto da coisa reclamada como objecto deste mesmo direito.
IV. Ou seja, tem-se direito de retenção quando se tenha a detenção de determinada coisa e crédito sobre o seu titular por despesas efectuadas com essa coisa. Não existindo já detenção, ou porque se fez a entrega voluntária da coisa ou porque se consentiu que o seu titular a extraísse da esfera de domínio daquele que a podia ter detido, não pode haver direito de retenção.
V. Apenas se o titular do direito de retenção tiver sido espoliado da detenção da coisa, quer por acto violento (esbulho) quer por qualquer outra conduta furtiva e contrária a sua vontade, eventualmente se poderá defender a invocação de tal direito e a sua actual violação, quiçá, passível de defesa pelos meios legais conferidos ao possuidor de boa fé.
VI. Não é de deferir o procedimento cautelar em que se pede a entrega de bens sobre os quais se invoca direito de retenção, mas de que não se tem a efectiva detenção ou não se invoca actual ou iminente desapossamento ilícito.
(PR).
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:

I. OBJECTO DO RECURSO.
No Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, A, instaurou o presente procedimento cautelar não especificado contra B, formulando o seguinte pedido:
“Deve a presente providência cautelar ser julgada provada e procedente e, consequentemente, deve ser reconhecido sumária e provisoriamente o direito de retenção da Requerente sobre as obras identificadas nos artigos 1º e 5º do presente requerimento, condenando-se a Requerida a restituir a sua posse à Requerente, entregando os respectivos imóveis livre de pessoas e bens, bem como a abster-se de proceder à sua alienação ou oneração, tudo até ao trânsito em julgado da acção principal a instaurar e da qual depende a presente providência cautelar”.
Prosseguindo os autos os seus trâmites, procedeu-se à inquirição de testemunhas arroladas, sendo depois proferida sentença, julgando o procedimento improcedente e absolvendo a Requerida do pedido.
Inconformada com a decisão, veio a Requerente interpor recurso para este Tribunal da Relação, apresentando doutas alegações, com as seguintes CONCLUSÕES:
1ª - A Requerente visa, com a presente providência cautelar, obter o reconhecimento provisório do direito de retenção da Requerente com a consequente atribuição da posse dos imóveis supra identificados para a Requerente e a condenação da Requerida a abster-se de praticar quaisquer actos materiais ou jurídicos que possam pôr em causa o direito da Requerente, nomeadamente, a abster-se de alienar ou por qualquer forma onerar os imóveis em causa.
2ª - É manifesta a procedência do presente recurso porquanto, salvo o devido respeito, a douta sentença recorrida, ao indeferir a providência requerida, não fez correcta interpretação e aplicação das disposições legais aplicáveis. Desde logo,
3ª - É manifesto o erro de julgamento quanto à matéria de facto.
4ª - Não obstante a matéria dada como indiciariamente provada e os depoimentos das testemunhas citados na sentença, a mesma sentença recorrida considerou, em absoluta contradição, não indiciados vários factos, relativamente aos quais a Requerente, ora recorrente, entende verificar-se uma situação de erro de julgamento, havendo documentos e prova testemunhal que implicavam julgamento diverso.
5ª - Com base nos documentos de fls. 44 a 66 e fls. 67 a 91 dos autos, com base nas alíneas 17) e 111) da matéria de facto provada na sentença e com base no depoimento de Alexandre Sousa citado na sentença (fls. 16 e 17), deveria ter-se considerado indiciariamente provado que a empresa C irá explorar um estabelecimento hoteleiro nos imóveis objecto dos contratos de empreitada.
6ª - Tendo em conta o pedido de recepção provisória referido no ponto 42) da matéria de facto indiciariamente provada e a conclusão, constante da mesma sentença, de que se considera os trabalhos concluídos, bem como os pontos 17) e 57) da matéria indiciariamente provada, deveria ter-se considerado provado que está eminente a transferência da posse dos imóveis em causa para a empresa arrendatária e o início da sua exploração comercial/turística portal empresa.
7ª - Atendendo à prova testemunhal citada na sentença recorrida e ao documento referido no ponto 110) da matéria de facto dada como indiciariamente provada deveria ter dado como indiciariamente provado que a requerida se prepara para vender a um fundo de investimento imobiliário, os imóveis em questão.
8ª - Por resultar expressamente do DOC. 30 junto com o requerimento inicial, e tratando-se, em qualquer caso de facto público e notório, deveria ter-se considerado indiciariamente provada que o FUNDO DE INVESTIMENTO …. é gerido pelo …….;
9a - Em face do teor da própria sentença que refere que os trabalhos ficaram concluídos (fls. 17 da sentença) e os depoimentos das testemunhas referidos a fls. 16 da sentença bem como dos DOCs 1 e 2, deveria ter-se concluído que a obra está concluída e os edifícios prontos a ser utilizados;
10ª - Acresce que, ao contrário do sustentado na sentença recorrida, é manifesto o direito de retenção da Requerente, ora Recorrente, pelo que a sentença recorrida violou, por errada interpretação e aplicação os artigos 754º e ss do C.C.
11ª - Conforme resulta da sentença recorrida, a Requerente facturou e está por liquidar a quantia total de 375.257,05€ relativa a trabalhos executados - trabalhos contratados, trabalhos a mais e trabalhos resultantes de erros e omissões do projecto, tudo executado em conformidade com o contratado e de acordo com as medições efectuadas.
12ª - A doutrina e a jurisprudência são actualmente unânimes em reconhecer ao empreiteiro o direito de retenção sobre a obra construída em caso de relapsidão do dono da obra;
13ª - "Enquanto o dono da obra não pagar o preço da empreitada, goza o empreiteiro do direito de retenção das chaves do prédio, que àquele devia entregar uma vez concluída a obra, visto tal crédito provir de despesas com aquela feitas e não ser justo que outrem se locuplete à custa do empreiteiro que as realizar".
14ª - o entendimento supra exposto é válido, de acordo com a mesma jurisprudência, seja qual for a modalidade da empreitada (de construção, reparação, demolição e conservação) podendo reter a coisa onde se realizou, total ou parcialmente, a obra, e quer no caso de a obra ser totalmente concluída, quer na eventualidade de haverem surgido ocorrências conducentes à resolução (precoce) do contrato.
15ª - Em suma, o empreiteiro goza de direito de retenção sobre o que deve entregar enquanto o dono da obra não pagar o preço.
16ª - O direito de retenção constitui um direito real de garantia, relativo, na circunstância, a coisa imóvel, prevalecendo mesmo sobre a hipoteca ainda que previamente registada - artigo 759º nºs 1 e 2 do C. Civil.
17ª - O direito real de garantia se constitui e está latente a partir do momento em que tem lugar a tradição que é seu pressuposto, "manifestando a sua plena utilidade e força" quando o beneficiário dispõe do crédito por incumprimento da outra parte «sem necessidade de declaração prévia do tribunal» (ac. STJ de 24/4/02, in ITIJ, prós. n.º 02B1136).
18ª - A partir desse momento o direito mantém-se, garantindo ao seu titular a preferência sobre os outros credores. A sua eficácia não depende de declaração, decorrendo directamente da lei e é válido erga omnes (cfr. Acórdão do STA de 18.12.2007, proferido no processo n.º 07B4123)
19ª - Reconhecido o direito de retenção a favor do credor sobre o bem do devedor, tal direito perdurará enquanto não ocorrer uma das causas de extinção previstas no artigo 761º e 730º do Código Civil.
20ª - Do exposto supra resulta, sumariamente e para o que ora releva, que o direito de retenção do empreiteiro se constitui quando é feita a consignação da obra, momento em que o dono da obra procede a traditio do imóvel. A partir desse momento e até à verificação de causa extintiva do direito, o empreiteiro é titular de um direito de retenção sobre o imóvel.
21ª - Da recepção dos trabalhos (seja ela tácita ou expressa no auto de recepção) não pode concluir-se pela restituição/entrega do imóvel ao dono da obra, pois uma coisa é a conclusão da obra e o pedido de recepção provisória da obra apresentado pelo empreiteiro ao dono da obra, outra, totalmente distinta, é a entrega da obra como acto extintivo da posse do empreiteiro.
22ª - Ora, a recepção provisória da obra e a celebração do respectivo auto (ou a recepção provisória tácita) prevista no regime das empreitadas de obras públicas e para o qual remetem os contratos em causa nos autos constitui apenas uma formalidade destinada a confirmar que a obras foi executada de acordo com o contrato e a estabelecer o momento a quo da contagem do prazo para a recepção definitiva da obra (cfr. artigos 217º e ss do Decreto-lei n.º 59/99, de 2 de Março).
23ª - Acresce, em qualquer caso, que a posse é uma situação jurídica e não uma situação de facto, como bem faz notar Oliveira Ascensão. A posse é um poder e "é hoje inegável que a posse subsiste mesmo que dissociada da situação de facto que está na sua origem (cfr. Direito Civil Reais, 4.ª edição refundida, Coimbra Editora, p. 83 e ss).
24ª - Por outro lado, e ao contrário do que pressupõe a sentença recorrida, pode haver corpus sem possibilidade de exercício ou sem gozo efectivo - "basta uma relação de pessoa e coisa que exprima a subordinação da coisa à vontade da pessoa - expressa na possibilidade de continuar o gozo - para que o corpus exista".
25ª - A Requerente foi investida na detenção da obra na data da sua consignação e tal detenção mantém-se mesmo que não se encontre a executar trabalhos no local e mesmo que tenha dado por concluídos os trabalhos, pelo que nada mais necessitava de alegar ou provar a este respeito.
26ª - Ao contrário do que pressupõe o tribunal a quo, o recurso à tutela possessória pelo empreiteiro titular de direito de retenção não está dependente de se encontrar ainda no imóvel a executar trabalhos da empreitada ou de ali ter pessoal. Tendo-se constituído na situação jurídica de detentor com a consignação da obra, tal situação jurídica perdura até que haja elementos que permitam concluir pela inexistência de uma relação entre a pessoa e a coisa que exprima a subordinação da coisa à vontade da pessoa, ou seja, a entrega da coisa.
27ª - No caso, a Requerente não entregou à Requerida as chaves do imóvel nem por qualquer modo manifestou a vontade de proceder à entrega dos imóveis, tendo-se limitado a comunicar que havia terminado os trabalhos e a requerer uma vistoria para efeitos de recepção provisória.
28ª - Pelo que, não pode concluir-se que se verificou qualquer das causas de extinção do direito de retenção previstos nos artigos 761º e 730º do C.C., nomeadamente, que se verificou a entrega da coisa. Por outro lado,
29ª - A defesa da posse passa também, como resulta expressamente do artigo 1276º do C.C, pela acção de prevenção: "se o possuidor tiver justo receio de ser perturbado ou esbulhado por outrem será o autor da ameaça, a requerimento do ameaçado, intimado a se abster de lhe fazer agravo, sob pena de multa e responsabilidade pelo prejuízo que lhe causar".
30ª - Sendo certo que "o possuidor que for perturbado ou esbulhado pode manter-se ou restituir-se por sua própria força e autoridade, nos termos do artigo 336º ou recorrer ao tribunal para que este lhe mantenha ou restitua a posse" (cfr. artigo 1277º do C.C.)
31ª - Ou seja, para efeitos de recurso à tutela possessória, o titular do direito de retenção não está obrigado a aguardar que alguém venha a esbulhá-lo do seu direito, podendo recorrer à tutela cautelar precisamente para evitar que tal esbulho venha a acontecer. E é precisamente esse o caso dos autos: a Requerente pretende ver judicialmente reconhecido o seu direito de retenção em sede cautelar para poder opor à Requerida uma decisão judicial que impeça de por em causa o seu direito.
32ª - Assim, ao contrário do sustentado na aliás douta sentença recorrida, não é necessária a existência de esbulho para que o titular do direito de retenção possa recorrer à tutela cautelar comum para que lhe seja entregue em exclusivo o imóvel objecto do direito de retenção com exclusão do exercício de quaisquer poderes pelo proprietário.
33ª - Tal esbulho só é requisito do recurso à providência cautelar especificada de restituição provisória da posse regulada no artigo 393º do C.C. Bastando a mera perturbação da posse para que seja possível recorrer em alternativa à acção directa ou à via judicial para efeitos de obter a mera manutenção da posse.
34ª - Pelo que, também neste ponto, andou mal a sentença recorrida, violando por errada interpretação e aplicação as disposições conjugadas dos artigos 1276º, 1277° do C.C. e 381º e ss do CPC.
35a - A sentença recorrida violou ainda, por errada interpretação e aplicação as disposições dos artigos 381º, n.º 1 e 387º, n.º 1 do CPC ao considerar que não se verifica o requisito do periculum in mora.
36ª - No requerimento inicial a Requerente alegou que corre o risco sério de o exercício do seu direito de retenção (enquanto direito de garantia) na acção principal ficar absolutamente inviabilizado pela transmissão da posse do dono da obra, aqui Requerida para terceiros, a qual não tardará a consumar-se pela tradição da coisa no âmbito do contrato celebrado entre a Requerida e a empresa C a que se refere o Considerando G dos Contratos de empreitada GAT l e GAT 2 (DOCS. l e 2)
37ª - O Considerando em causa expressamente refere que o contrato definitivo de arrendamento será celebrado após a execução das obras de reabilitação e que nos edifícios irá ser instalada uma unidade hoteleira.
38ª - Como resulta da própria sentença recorrida, ainda que possa eventual faltar a certificação do equipamento de ar condicionado, o certo é que as obras de reabilitação estão concluídas, verificando-se assim o pressuposto da celebração do contrato definitivo previsto no Considerando G) dos contratos de empreitada.
39ª - Acresce que, como resulta da matéria de facto dada como indiciariamente assente na sentença recorrida, desde Março que a empresa C, empresa de direito espanhol, se encontra a instalar-se nos edifícios, ali colocando equipamento e mobiliário.
40ª - Ou seja, em face da prova documental apresentada - DOCS. 1 e 2 juntos com o requerimento inicial - associada ao facto de a obra estar concluída e à prova testemunhal de que a empresa espanhola arrendatária iniciou em Junho a instalação do hotel nos imóveis, resulta, inequivocamente, que está eminente a tradição dos imóveis para a empresa espanhola que irá explorar o hotel nos edifícios que constituem objecto da empreitada.
41ª - AO contrário do sustentado na sentença recorrida, em face da matéria de facto dada como indiciariamente provada não pode deixar de concluir-se pela existência de indícios de que a Requerida se prepara para vender a um fundo de investimento imobiliário, o que tornará muito difícil, senão mesmo impossível, quer a cobrança do crédito quer a efectivação do direito de retenção enquanto direito de garantia da Requerente.
42ª - Como referido na matéria de facto dada como indiciariamente provada, no dia 1 de Junho de 2009, a Requerida enviou à Requerente um email no qual solicitava a emissão de novas garantias bancárias relativas à boa execução da obra em nome do "FUNDO DE INVESTIMENTO …., e não da ….. que, de acordo com os Contratos celebrados é a proprietária dos imóveis e a dona da obra (DOC. 30).
43ª - Ou seja, não pode deixar de concluir-se que se verifica uma situação de periculum in mora, sendo manifesto e compreensível o fundado receio de lesão dificilmente reparável e a necessidade da presente providência para assegurar a efectividade do direito da ora Requerente - o direito de retenção.
NESTES TERMOS, e nos demais de Direito, deve o presente recurso ser julgado provado e procedente, revogando-se, em consequência, a sentença recorrida e decretando-se a providência requerida.
Não houve contra-alegação.
Admitido o recurso na forma, com o efeito e no regime de subida devidos, subiram os autos a este Tribunal da Relação, sendo que nada obstando ao conhecimento do mesmo, cumpre decidir.
As questões colocadas pela recorrente no presente recurso são as de saber:
a) Se a decisão da matéria de facto deve ser alterada.
b) Se o procedimento cautelar requerido deve ser decretado.
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II. FUNDAMENTOS DE FACTO.
A 1.ª instância considerou indiciariamente assentes os seguintes factos:
1 - No dia 15 de Junho de 2007, Requerente e Requerida subscreveram um contrato de empreitada, designado por "Contrato GAT 1", de reabilitação do imóvel sito na Rua Jardim do Regedor, …Lisboa, composto por sete pisos acima do solo, inscrito na matriz predial urbana sob os artigos 113 e 60 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o número … (DOC. 1).
2- Nos termos da Cláusula 1.ª, n.º 1, do “Contrato GAT 1”, a empreitada contratada abrangia a "demolição, contenção, fundações e estrutura, instalações e acabamentos globais" nos termos especificados nos documentos que constituem o anexo l.
3- De acordo com o n.º 2 da cláusula 1.ª, n.º 2 do mesmo “Contrato GAT 1”, "a empreitada compreende a execução, por parte do EMPREITEIRO, de todos os trabalhos de construção civil e fornecimento de materiais, mão-de-obra e equipamento necessários à realização e concretização, com elevados níveis de qualidade, acabamentos e perfeição, das obras no imóvel identificadas no Anexo I ao presente Contrato" (DOC. 1).
4- O prazo de execução da empreitada previsto na cláusula 6.ª do Contrato GAT 1 era de 16 meses contados da assinatura do auto de consignação (DOC.1)
5- Na mesma data a Requerente e a Requerida celebraram um outro contrato de empreitada, designado por "Contrato GAT 2", de reabilitação do imóvel sito na Travessa do Forno, …., concelho de Lisboa, composto por três pisos acima do solo, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 88 e descrito na 5.ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º 166 e propriedade da Requerida (DOC. 2).
6- Nos termos da Cláusula 1.ª, n.º 1 do Contrato GAT 2 a empreitada contratada abrangia a "demolição, contenção, fundações e estrutura, instalações e acabamentos globais" nos termos especificados nos documentos que constituem o anexo l (DOC. 2)
7- De acordo com o n.º 2 da cláusula 1.ª, n.º 2 do mesmo Contrato GAT 2, "a empreitada compreende a execução, por parte do EMPREITEIRO, de todos os trabalhos de construção civil e fornecimento de materiais, mão-de-obra e equipamento necessários à realização e concretização, com elevados níveis de qualidade, acabamentos e perfeição, das obras no imóvel identificadas no Anexo I ao presente Contrato" (DOC. 2).
8- O prazo de execução da empreitada previsto na cláusula 6.ª do Contrato GAT 1 era de 16 meses contados da assinatura do auto de consignação (DOC. 1).
9 - O prazo de execução da empreitada previsto na cláusula 6.ª do Contrato GAT 2 era de 10 meses contados da assinatura do auto de consignação (DOC.2).
10- A Requerente iniciou os trabalhos referentes a ambas as empreitadas como previsto após a consignação do GAT1 em 12/06/2007 e do GAT2 em 11/12/2007.
11 - Por carta datada de 20.01.2009, a Requerente solicitou à Requerida a prorrogação do prazo de empreitada relativa ao Contrato GAT 1, com fundamento em inúmeras alterações introduzidas pelo dono de obra e excessivos atrasos nas decisões e aprovação de adicionais de trabalhos a mais, conforme resulta do documento respectivo que aqui se dá por integralmente reproduzido (DOC. 3).
12 - Por carta datada de 20.01.2009, a Requerente solicitou à Requerida a prorrogação do prazo de empreitada relativa ao Contrato GAT 2, fundamento em inúmeras alterações introduzidas pelo dono de obra e excessivos atrasos nas decisões e aprovação de adicionais de trabalhos a mais, conforme resulta do documento respectivo que aqui se dá por integralmente reproduzido (DOC. 4).
13 - Por carta datada de 13.02.2009, a Requerida aceitou a prorrogação do prazo de execução do Contrato GAT 1 até ao dia 9.04.2009 (DOC. 5).
14 - Por carta da mesma data, a Requerida aceitou a prorrogação do prazo de execução do Contrato GAT 2 até ao dia 9.04.2009 (DOC. 6).
15 - A Requerente continuou a execução dos trabalhos relativos às duas obras contratadas.
16 - No dia 9.04.2009 a obra não estava concluída.
17 - Em meados de Março de 2009, a empresa com quem a … celebrou um contrato para exploração nos imóveis de um Hotel, começou a ocupar os imóveis, instalando mobiliário, e equipamento.
18 - Esta ocupação prejudicou o normal desenvolvimento dos trabalhos na empresa.
19 - A proposta apresentada e os prazos entretanto acordados também não tiveram em conta tal circunstância.
20 - Em 15 de Abril de 2009 a Requerente exigiu à Requerida decisão urgente sobre um conjunto de 20 adicionais, conforme documentos de fls. 111 e 112.
21 - Tal situação provocou a paragem de diversos trabalhos e inevitável impossibilidade de cumprimento de prazos acordados.
22- Por e-mail de 05/05/09 a Requerente chamava a atenção do dono de obra para a importância na decisão sobre um conjunto de 5 adicionais pois só após a sua provação seria possível dar datas para aprovisionamento e execução, conforme documentos de fls. 113 e 114.
23- Conforme resulta da acta de reunião do dia 6 de Maio de 2009, nessa data ainda havia trabalhos dependentes de acções da …. referentes a entrega de materiais, conforme documentos de fls. 115 a 118.
24- Na mesma data e reunião foram aprovados pela Requerida os adicionais 43, 50, 51 e 57, conforme documentos de fls. 115 a 118.
25- As decisões ali tomadas relativamente a acções a desenvolver pela Requerida não foram cumpridas por esta, o que impossibilitou a conclusão da obra antes de Junho de 2009.
26- No inicio de Junho ainda persistiam algumas questões fundamentais por definir pela …. relacionadas com as vistorias das entidades certificadoras da responsabilidade do dono da obra.
27- As questões em causa verificavam-se relativamente à obra do Contrato GAT 1 e do Contrato GAT 2.
28 - No dia 6 de Maio de 2009, a … adjudicou à Requerente uma série de trabalhos adicionais a que as partes convencionaram chamar 43º, 44º, 50º, 51º e 57º Adicionais, tudo conforme Acta da Reunião de obra respectiva, conforme documentos de fls. 115 a 118.
29 - No dia 19 de Maio de 2009 a Requerente escrevia à Requerida sobre algumas questões referentes à entrega tardia de elementos e materiais por parte da …., bem como sobre a pendência da aprovação das propostas apresentadas para os adicionais que se convencionou designar de 33, 34, 41, 42, 47, 53, 58, 59, 61, 61 e 64, conforme documento de fls.119 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
30- Situações que, impossibilitavam o cumprimento das datas fixadas.
31- No dia 20 de Maio de 2009 ainda não tinham chegado as "Luminárias da Troll", a fornecerá Requerente pela …..
32- No dia 20 de Maio de 2009 ainda não estavam aprovados pela DIOMIRA os quadros eléctricos e instalação de utilização das lojas e garagens.
33- No dia 28 de Maio de 2009 a … adjudicou a proposta da Requerente para o 65º adicional (DOC. 12)
34 - No dia 29 de Maio de 2009 a …. adjudicou a proposta da Requerente para o 69º adicional (DOC. 13).
35 - No dia 2 de Junho de 2009, a Requerida adjudicou ainda a proposta apresentada pela Requerente para o 67º adicional no valor de 5.499,13€ (DOC. 14).
36 - No dia 5 de Junho de 2009 a Requerida procedia à adjudicação da proposta apresentada pela Requerente para o 71º adicional, pelo valor de 2.884,80€ (DOC. 15).
37 - Em 9 de Junho de 2009 ainda não se encontrava aprovado o projecto de instalações eléctricas necessário à realização da vistoria das instalações eléctricas pela Certiel, da responsabilidade da Requerida (DOC. 16).
38 - De qualquer modo, e não obstante o que ficou exposto, no dia 13 de Abril de 2009 foi feita a recepção provisória parcial da obra a que se refere o Contrato GAT 1, tudo conforme o respectivo auto assinado pelas partes (DOC. 17).
39 - De acordo com o auto, a …. considerou executados de acordo com as condições estipuladas os trabalhos referentes aos pisos 2º a 6º dos imóveis (sendo que a empreitada é constituída por sete pisos) (DOC. 17).
40 - Em anexo ao auto de recepção provisória parcial referido no número anterior consta a lista de deficiências constatadas pelo dono da obra, tendo-se para o efeito concedido ao empreiteiro o prazo de 10 dias para suprir tais deficiências (DOC. 17).
41- No dia 1 de Junho, a Requerente deu por terminados os trabalhos.
42- A autora solicitou via fax a recepção provisória da obra nos termos e para os efeitos previstos na cláusula 8.ª dos mesmos contratos de empreitada (DOCS 18 E 19).
43 - A Requerida não deu qualquer resposta à referida solicitação.
44- Em reunião de obra realizada em 30 de Junho de 2009, as partes acordaram em assinar o respectivo auto de recepção provisória com data de 30 de Junho de 2009.
45 - A Requerida acabou por levantar sempre entraves à assinatura do referido auto.
46 - Em 15 de Julho de 2009 a Requerente recebeu uma carta da Requerida na qual esta - como se nada até aí se tivesse passado e como se não tivesse sido requerida mais de um mês antes a recepção provisória - vem exigir a realização de uma vistoria para recepção provisória da obra relativa ao Contrato GAT 1 "até ao final da corrente semana" (DOC. 20).
47 - A referida carta repetiu-se para a obra relativa ao Contrato GAT 2 (DOC. 21).
48 - A Requerente respondeu na mesma data, via fax, reiterando que (i) as obras estavam concluídas há várias semanas, (ii) os edifícios já estavam nessa data plenamente ocupados e, finalmente, que (iii) aguardava a formalização dos autos de recepção provisória, com o qual procederia à entrega da garantia bancária (DOC. 22 e DOC. 23).
49 - Na mesma data, a Requerida sugeriu, por escrito, que se procedesse a uma vistoria no dia seguinte para as obras GAT 1 e GAT2, pelas 15 horas (DOC. 24 e DOC. 25).
50 - No dia seguinte, a Requerente limitou-se a comunicar à Requerida que estaria em obra nesse dia 16.07.09 pelas 15 horas (DOC. 26).
51 - Na reunião realizada em 16.07.2009 em obra, a Requerida levantou uma série de questões e situações a corrigir, tendo a Requerente aceite corrigir aquelas que entendeu serem-lhe imputáveis.
52 - O que fez, como combinado e nos prazos acordados.
53 - Por carta de 24 de Julho de 2009 a Requerente fez um ponto de situação sobre as correcções que ainda estavam pendentes (DOC. 27).
54 - As correcções a que Requerente se comprometeu foram realizadas.
55 - No dia 31 de Julho 2009 a Requerida escreve nova missiva sobre o mesmo assunto, insistindo numa série de deficiências que a Requerente não reconhece e voltando a alegar não ter sido feita a recepção provisória da obra (DOC. 28).
56 - A esta carta a Requerente respondeu nos termos que constam da carta junta, datada de 6 de Agosto de 2009 e que aqui se dá por integralmente reproduzida (DOC. 29).
57 - Desde o princípio de Junho a empresa …., empresa espanhola, começou a instalar-se nos edifícios conforme previsto no Considerando g) dos Contratos GAT 1 e GAT 2 (DOCS. 1 E 2).
58 - Por outro lado, no dia 1 de Junho de 2009 a Requerida enviou à Requerente um e-mail no qual solicitava a emissão de novas garantias bancárias relativas à boa execução da obra em nome do "FUNDO DE INVESTIMENTO …. (DOC. 30).
59 - Em 30/04/09 a requerente enviou à requerida, que a recebeu, a FACTURA N.º 3414, no valor de 228.759,68€, relativa ao 23.º auto, trabalhos contratuais no GAT1 (DOC. 31).
60 - A factura em causa refere-se a trabalhos contratuais devidamente verificados e objecto de auto de medição aprovado pela Requerida, conforme anexo à mesma (DOC. 31).
61 - Na mesma data a requerente enviou à Requerida, que a recebeu, a FACTURA Nº 3415, no valor de 90.558,23€, relativa ao 25º auto GAT2 (DOC. 32).
62 - A factura em causa refere-se a trabalhos contratuais devidamente verificados e objecto de auto de medição aprovado pela Requerida, conforme anexo à mesma (DOC. 32).
63 - Na mesma data a Requerente enviou à requerida, que a recebeu, a NOTA DE CRÉDITO N.º 701, no valor de 62.643,31€, relativa a crédito sobre trabalhos a mais e a menos do 23º auto GAT 1 (DOC. 33).
64 - Na mesma data a Requerente enviou à Requerida, que a recebeu, a NOTA DE CRÉDITO N.º 702, no valor de 15.400,69€, relativa a crédito sobre trabalhos a mais e a menos do 15º auto GAT 2 (DOC. 34).
65 - Em 23 de Junho de 2009, a Requerida pagou o valor de 99.999,00€, como pagamento parcial da factura n.º 3414 (DOC. 35).
66 - No dia 29 de Maio de 2009 a Requerente enviou à Requerida, que a recebeu, a FACTURA N.º 3433, datada de 29.05.2009, no valor de 84.019,24€ referente ao auto de trabalhos n.º 24, realizados em Maio de 2009 (DOC. 36).
67 - A factura em causa refere-se a trabalhos contratuais devidamente verificados e objecto de auto de medição aprovado pela Requerida, conforme anexo à mesma (DOC. 36).
68 - Na mesma data a Requerente emitiu e enviou à Requerida - e esta recebeu - a FACTURA N.º 3434 no valor de 38.426,48€ referente ao auto de trabalhos n.º 16, realizados em Maio de 2009 (DOC. 37).
69 - A factura em causa refere-se a trabalhos contratuais devidamente verificados e objecto de auto de medição aprovado pela Requerida, conforme anexo à mesma (DOC. 37).
70 - As facturas supra identificadas foram imediatamente devolvidas pela Requerida.
71 - Em 24 de Junho de 2009, a Requerente reenviou as facturas em causa insistindo no seu pagamento (DOC. 38).
72 - E, simultaneamente procedeu ao envio da FACTURA N.º 3436, de 18.06.09 no valor de 29.347,58€ referente ao auto de trabalhos a mais e a menos realizados em Maio de 2009 (DOC. 38).
73 - Por carta datada de 26 de Junho de 2009, a Requerida procedeu de novo à devolução de todas as facturas supra identificadas (DOC. 39).
74 - Em 30 de Junho de 20009 a Requerente enviou à Requerida, que a recebeu, a FACTURA n.º 3442, de 30.06.2009, no valor de 19.304,35€ € referente ao auto de trabalhos n.º 25 realizados em Junho de 2009 (DOC 40).
75 - Bem como a FACTURA n.º 3443, de 30.06.2009, no valor de 5.028,41€ referente ao auto de trabalhos n.º 18 realizados em Junho de 2009 (DOC 41).
76 - De novo a Requerida procedeu à devolução das facturas em causa alegando, sem mais, que se trata de trabalhos não aceites pela Requerida (DOCS. 42 e 43).
77 - A Requerente insistiu no pagamento das facturas em causa por cartas datadas de 3, 6 e 20 de Julho de 2009 (DOCS 44, 45 e 46).
78 - Em 31 de Julho de 2009 a Requerente enviou à Requerida, que as recebeu, as seguintes NOTAS DE CRÉDITO:
a. Nota de Crédito n.º 0714 relativa à supressão de trabalhos da empreitada no valor de 10.922,06€ (DOC. 47); b. Nota de Crédito n.º 0715 relativa à supressão de trabalhos da empreitada no valor de 17.326,76€ (DOC. 48).
79- Na mesma data, a Requerente enviou à Requerida, que a recebeu, a FACTURA N.º 3460, no valor de 12.858,32€ referente a trabalhos a mais realizados no âmbito dos Contratos GAT 1 e GAT 2, tudo como discriminado na listagem anexa à factura (DOC. 49).
80 - Os trabalhos em causa respeitam aos adicionais 20, 38 (3ª revisão), 44, 65, 67, 69 e 71 aprovados pela Requerida e identificados na listagem em anexo à factura (DOC. 49)
81 - Ainda na mesma data, a Requerente enviou à Requerida, que a recebeu, a FACTURA n.º 3458 no valor de 14.646,73€ € igualmente referente a trabalhos a mais (DOC. 50).
82 - Os trabalhos em causa respeitam aos adicionais 47, 60, 66, 68, 70 devidamente aprovados pela Requerida e identificados na listagem em anexo à factura (DOC. 50).
83 - Ainda na mesma data, a Requerente enviou à Requerida, que a recebeu, a FACTURA n.º 3459 no valor de 27.736,816 igualmente referente a trabalhos a mais (DOC. 51).
84 - Os trabalhos em causa respeitam aos adicionais 1, 3, 14, 23, 33, 34 devidamente aprovados pela Requerida e identificados na listagem em anexo à factura (DOC. 51).
85 - Ainda na mesma data, a requerente enviou à Requerida, que a recebeu, a FACTURA n9 3461 no valor de 14.912,756 referente a erros e omissões no edifico GAT 1 (DOC. 52).
86 - Os referidos erros e omissões decorreram de trabalhos realizados, reclamados no prazo legal e devidamente justificados (DOC. 53).
87 - Ainda na mesma data, a requerente enviou à requerida, que a recebeu, a FACTURA n.º 3462 no valor de 435,60€ referente a erros e omissões no edifício GAT 2 (DOC. 54).
88 - Ainda na mesma data, a requerente enviou à requerida, que a recebeu, a FACTURA n.º 3463 no valor de 15.514,69€ igualmente referente aos trabalhos imprevistos na estrutura e cobertura no edifico GAT 1 (DOC. 55).
89 - Os trabalhos imprevistos foram aprovados pela Requerida (DOC. 55).
90 - E encontram-se identificados e discriminados nos documentos e peças desenhadas que acompanharam a respectiva factura (DOC. 55).
91 - Todos os trabalhos facturados foram integralmente executados pela Requerente e são-lhe devidos os respectivos montantes.
92- Por carta datada de 24.06.2009 e acompanhada dos respectivos documentos de suporte, a Requerida apresentou de forma detalhada a justificação de todas as quantias reclamadas relativamente aos autos de trabalhos de Maio de 2009 (DOC. 56).
93 - bem como a sua posição documentada sobre os valores finais do fecho de contas. (DOC. 56).
94 - Por carta de 28 de Julho de 2009 e sob a epígrafe de "Fecho de contas das empreitadas" veio a Requerida negar-se ao pagamento dos valores em dívida (DOC. 57).
95 - Encontram-se por liquidar à presente data as seguintes facturas:
• FACTURA N.º 3414, datada de 30.04.09, no valor de 228.759,68€, (parcialmente em dívida após pagamento de 99.999,00€);
• FACTURA N.º 3415, datada de 30.04.2009, no valor de 90.558,23€;
• FACTURA N.º 3433, datada de 29.05.2009, no valor de 84.019,24€;
• FACTURA N.º 3434, datada de 29.05.2009, no valor de 38.426,48€;
• FACTURA N.º 3436, de 18.06.2009, no valor de 29.347,58€;
. FACTURA N.º 3442, de 30.06.2009, no valor de 19.304,35€;
. FACTURA N.º 3443, de 30.06.2009, no valor de 5.028,41€;
• FACTURA N.º 3458, de 31.07.2009, no valor de 14.646,73€;
• FACTURA N.º 3459, de 31.07.2009, no valor de 27.736,81€;
. FACTURA N.º 3460, de 31.07.2009, no valor de 12.858,32€;
. FACTURA N.º 3461, de 31.07.2009, no valor de 14.912,75€;
• FACTURA N.º 3462, de 31.07.2009, no valor de 435,60€;
• FACTURA N.º 3463, de 31.07.2009, no valor de 15.514,69€.
96 - As facturas ascendem a um valor total de 581.548,87€.
97 - Ao valor daquelas facturas deve ser deduzido o valor das Notas de Crédito entretanto emitidas pela Requerente, a saber:
• Nota de Crédito n.º 701, de 30.04.2009, no valor de - 62.643,31€;
• Nota de Crédito n.º 702, de 30.04.2009, no valor de -15.400,69€;
• Nota de Crédito n.º 714, de 31.07.2009, no valor de -10.922,06€;
• Nota de Crédito n.º 715, de 31.07.2009, no valor de -17.326,76€.
98 - Para a execução dos contratos de empreitada GAT 1 e GAT 2 a Requerente recorreu a subempreiteiros que executaram vários trabalhos da empreitada e, nomeadamente, muitos dos trabalhos a que se referem as facturas em dívida.
99 - Os principais créditos reclamados pelos subempreiteiros são os seguintes:
• … (trabalhos de instalações eléctricas, telefones, segurança. Detecção de incêndios) - 151.277,63€ (DOC. 58);
• …. (trabalhos relativos ao sistema AVAC) -139.662,90€ (DOC. 59);
• ….. (trabalhos relativos a águas e esgotos) - 19.831,46€ (DOC. 60);
• … (trabalhos relativos a carpintarias) - 211.999,54€ (DOC. 61);
• … (trabalhos relativos a pinturas) - 43.771,73€ (DOC. 62).
100 - Num total de 566.543,26€.
101 - A Requerente está a pagar mensalmente um empréstimo de médio prazo que contraiu em Outubro último junto do Banco …, no montante de 300.000,00€.
102 - A Requerente está a recorrer a uma racionalização de todos os custos e a limitações nos próximos pagamentos a efectuar a fornecedores e subempreiteiro.
103 - Se a Requerente não receber no curto prazo as quantias em acima referidas, ficará impossibilitada de pagar aos subempreiteiros que executaram muitos dos trabalhos para a Requerida e que, neste momento, têm sobre a Requerente, relativamente a estas obras, um crédito total de cerca de 566.543,26€.
104 - Bem como o cumprimento de obrigações para com o Estado, concretamente de pagar os encargos fiscais e a Segurança Social.
105 - Na carta de 6 de Julho de 2009, e Requerente reiterou o pedido de liquidação das facturas em dívida, e já alertava a Requerida para as gravíssimas dificuldades financeiras que a situação de atraso de pagamento estava já à data a causar à empresa (DOC. 45).
106 - Informando ainda estar a Requerente sob a ameaça crescente de vários subempreiteiros de retirarem equipamentos fornecidos e montados na obra e actuarem judicialmente contra a empresa por incumprimento no pagamento de facturas vencidas.
107 - A Requerente, com excepção da operacionalidade definitiva do equipamento de ar condicionado, atinente à sua certificação, executou todos os trabalhos acordados.
108 - Os montantes constantes das facturas acima referidas correspondem a 15% do valor das empreitadas.
109 - Desde data não apurada do corrente ano que a empresa …. empresa espanhola, se encontra a instalar-se nos edifícios.
110 - Conforme dos considerandos vertidos nas alíneas G) dos contratos constantes de fls. 44 a 66; e fls. 67 a 91 aí consta que a requerida celebrou um contrato promessa de arrendamento comercial (adiante, contrato promessa), em 27 de Abril de 2006, com a sociedade comercial de direito espanhol designada (...) nos termos da qual prometeu dar de arrendamento a esta sociedade ....
111 - No dia 1 de Junho de 2009 a Requerida enviou à Requerente um e-mail, cuja cópia consta de fls. 170, no qual solicitava a emissão de novas garantias bancárias relativas à boa execução da obra em nome do "FUNDO DE INVESTIMENTO ……., e não da …, aqui se dando por integralmente reproduzido o conteúdo desse e-mail.
112 - Não foi possível pagar o subsídio de férias ao pessoal da Requerente.
113 - Os fornecedores e subempreiteiros desta empreitada ameaçam accionar judicialmente a requerente por não pagamento das facturas vencidas.
114 - Em 06-07-2009 pela carta Ref.ª
2209/09, a Requerente deu conhecimento à Requerida desta situação de crescente ameaça dos subempreiteiros em inclusive retirar equipamentos da obra.
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III. FUNDAMENTOS DE DIREITO.
a) Da alteração da matéria de facto indiciariamente provada:
Alega a recorrente que:
a) - Com base nos documentos de fls. 44 a 66 e fls. 67 a 91 dos autos, com base nas alíneas 17) e 111) da matéria de facto provada na sentença e com base no depoimento de Alexandre Sousa citado na sentença (fls. 16 e 17), deveria ter-se considerado indiciariamente provado que a empresa …. irá explorar um estabelecimento hoteleiro nos imóveis objecto dos contratos de empreitada.
b) - Tendo em conta o pedido de recepção provisória referido no ponto 42) da matéria de facto indiciariamente provada e a conclusão, constante da mesma sentença, de que se considera os trabalhos concluídos, bem como os pontos 17) e 57) da matéria indiciariamente provada, deveria ter-se considerado provado que está eminente a transferência da posse dos imóveis em causa para a empresa arrendatária e o início da sua exploração comercial/turística portal empresa.
c) - Atendendo à prova testemunhal citada na sentença recorrida e ao documento referido no ponto 110) da matéria de facto dada como indiciariamente provada deveria ter dado como indiciariamente provado que a requerida se prepara para vender a um fundo de investimento imobiliário, os imóveis em questão.
d) - Por resultar expressamente do DOC. 30 junto com o requerimento inicial, e tratando-se, em qualquer caso de facto público e notório, deveria ter-se considerado indiciariamente provada que o FUNDO DE ….. é gerido pelo …..;
e) - Em face do teor da própria sentença que refere que os trabalhos ficaram concluídos (fls. 17 da sentença) e os depoimentos das testemunhas referidos a fls. 16 da sentença bem como dos DOCs 1 e 2, deveria ter-se concluído que a obra está concluída e os edifícios prontos a ser utilizados.
Vejamos se à recorrente assiste razão.
Como é sabido, a decisão sobre a matéria de facto, é alterável pelo Tribunal da Relação nos casos excepcionais, previstos no art. 712º do CPC, de constarem do processo todos os elementos de prova, que serviram de base às respostas, ou de ter ocorrido gravação dos depoimentos prestados e ter sido impugnada, nos termos do artigo 690º-A, a decisão com base neles proferida ou de os elementos fornecidos pelo processo imporem uma resposta insusceptível de ser destruída por quaisquer outros meios de prova, ou ainda de o recorrente apresentar documento novo superveniente, que, por si só, seja suficiente para destruir a prova em que a resposta assentou.
Porém, é necessário não olvidar que vigora no nosso ordenamento jurídico o princípio da liberdade de julgamento ou da prova livre (art. 655º do C. P. C.), segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas e fixa a matéria de facto em sintonia com a convicção que tenha firmado acerca de cada facto controvertido, salvo se a lei exigir, para a existência ou prova do facto jurídico, qualquer formalidade especial, caso em que esta não pode ser dispensada.
De acordo com este princípio, que se contrapõe ao princípio de prova legal, as provas são valoradas livremente, sem qualquer grau de hierarquização, nem preocupação do julgador quanto à natureza de qualquer delas Cf. Antunes Varela, Manual de Processo Civil-2.ª Edição, Revista e Actualizada, pág. 471.. Acresce que o princípio da livre apreciação das provas só cede perante situações de prova legal, que fundamentalmente se verificam nos casos de prova por confissão, por documentos autênticos, por certos documentos particulares e por presunções legais Cf. Acórdão da Relação de Évora de 20.09.90, sumariado no BMJ, 399/603..
Ora, em face destes princípios e dos elementos fornecidos pelos autos não se justifica no caso proceder a qualquer alteração da matéria em questão no sentido de considerar como indiciariamente provados aqueles pontos da matéria de facto.
Antes de mais se assinala que as respostas produzidas sobre a matéria de facto foram devidamente fundamentadas, com base no teor de vários documentos juntos aos autos e no depoimento das testemunhas inquiridas, considerando-se como não provados os factos que a recorrente agora pretende ver assentes.
E não se vê qualquer motivo para alterar as respostas dadas sobre os pontos em concreto colocados em análise pela apelante, não podendo ser considerada a argumentação que deduz com vista a chegar a determinadas conclusões que se esforça em atingir, nomeadamente com apelo a certos documentos, por estarem em causa documentos particulares, cuja força probatória não impõe uma resposta insusceptível de ser destruída ou de tornada mais precisa por quaisquer outros meios de prova.
A apelante faz uma leitura de determinados meios de prova, documentais e testemunhais, que não é aquela que foi acolhida pelo tribunal recorrido, mas que este tribunal não pode aceitar, por parecer correcto o julgamento produzido pela 1.ª instância, que na sua livre apreciação até tinha ao seu dispor melhores elementos para formular um julgamento devidamente ponderado e rigoroso sobre a matéria em questão.
Em todo o caso sempre se dirá que relativamente à matéria acima aludida em a) e b) já se reporta em parte a matéria vertida nos pontos 109) e 110) dos factos dados por assentes, não parecendo que quer os documentos quer as declarações das testemunhas permitam ir além do que se considerou provado.
No que concerne à matéria referida nas alíneas c), d) e e) não há prova indiciária suficiente dessa matéria, fornecida pelos documentos a que se faz referência e muito mesmo a prova testemunhal proporciona qualquer contributo nesse sentido.
Mas, diga-se, por último, que mesmo que fosse de haver por indiciados aqueles factos, sempre a solução de direito seria a mesma, como seguidamente se demonstrará.
Mantém-se, deste modo, inalterada a decisão sobre a matéria de facto produzida pela 1.ª instância.
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b) Da questão de saber se o procedimento cautelar requerido deve ser decretado.
Como se deixou já assinalado no intróito do presente recurso, pretende a apelante com o presente procedimento cautelar ver reconhecido, sumária e provisoriamente, o direito de retenção da Requerente sobre as obras identificadas na petição, condenando-se a Requerida a restituir a sua posse à Requerente, entregando os respectivos imóveis livre de pessoas e bens, bem como a abster-se de proceder à sua alienação ou oneração, tudo até ao trânsito em julgado da acção principal a instaurar e da qual depende a presente providência cautelar.
Importa, por isso e antes de mais, verificar se, em face dos factos indiciados e até mesmo dos alegados, à apelante assiste direito ao reconhecimento do invocado direito de retenção, pois que se não lhe assistir tal direito, a providência não pode ser deferida, independentemente da verificação, ou não, dos restantes pressupostos.
O art. 754° do CC institui que “o devedor que disponha de um crédito contra o seu credor goza do direito de retenção se, estando obrigado a entregar certa coisa, o seu crédito resultar de despesas feitas por causa dela ou de danos por ela causados”.
Segundo Pires de Lima e Antunes Varela, “consiste o direito de retenção na faculdade que tem o detentor de uma coisa de a não entregar a quem lha pode exigir, enquanto este não cumprir uma obrigação a que está adstrito para com aquele. Porque é um direito de garantia, o detentor pode fazer vender as coisas móveis, como o pode fazer um credor pignoratício (art. 758.°), e executar os imóveis, nos mesmos termos em que o pode fazer o credor hipotecário (art. 759.°), sendo pago, em qualquer dos casos, com preferência aos demais credores do devedor”.
E, conforme os mesmos autores, “para que exista direito de retenção, nos termos deste artigo 754°, é necessário, em primeiro lugar, que o respectivo titular detenha (licitamente: cfr. art. 756°, al. a)) uma coisa que deva entregar a outrem; em segundo lugar, que, simultaneamente, seja credor daquele a quem deve a restituição; por último, que entre os dois créditos haja uma relação de conexão (debitum cum re junctum), nas condições definidas naquele artigo — despesas feitas por causa da coisa ou danos por ela causados” In Código Civil anotado, I, 1967, pgs. 586-587.
No mesmo sentido diz M. J. Almeida Costa que “o direito de retenção previsto no art. 754º depende de três requisitos: a) a detenção lícita de uma coisa que deve ser entregue a outrem; b) que o detentor seja, por sua vez, credor da pessoa com direito à entrega; c) que entre os dois créditos exista o nexo apontado - tratar-se de despesas feitas por causa dessa coisa ou de danos por ela causados” in Noções Fundamentais de Direito Civil, pg. 260..
E que o direito de retenção pode ter lugar no contrato de empreitada não parece oferecer a menor dúvida. Com efeito, a propósito de estudo sobre a matéria, formula o Prof. Inocêncio Galvão Telles, as seguintes conclusões: «a) O empreiteiro, quer de obra mobiliária, quer de obra imobiliária, tem o direito de retenção do objecto da empreitada, esteja a obra já concluída ou não, desde que no caso concreto não a tenha ainda entregue e a respectiva propriedade lhe não pertença; b) O empreiteiro goza do direito de retenção, nos termos gerais do art. 754° do Cód. Civil, porque o seu crédito resulta de despesas feitas por causa da coisa; c) Não pode entender-se de modo diferente, uma vez que aquilo que o empreiteiro tem a receber destina-se fundamentalmente a cobrir as despesas, porventura avultadíssimas, respeitantes a materiais e mão-de-obra, além de outras, por ele efectuadas por causa da obra, isto é, para a criar; d) Na fórmula legal «despesas feitas por causa da coisa» não podem considerar-se abrangidas só as «despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa», ou sejam, as benfeitorias (Cód. Civil, art. 216°), pois a primeira expressão possui amplitude maior do que a segunda, e no citado art. 754° ter-se-ia falado pura e simplesmente de benfeitorias se apenas se quisesse contemplar estas; e) Não faria, aliás, sentido que se reconhecesse direito de retenção a quem se limita a realizar dispêndios para conservar ou melhorar coisa já existente e se negasse tal direito a quem realiza gastos, em princípio muito mais elevados, para a criar, tutelando-se as meras despesas de benfeitorização e negando-se protecção às de construção ou fabrico, decisivas para o desenvolvimento do país e por conseguinte com muito maior relevância económica e social; (...)» In “O direito de retenção no contrato de empreitada”, em “O Direito”, 106.°-119.°, 1974/1987, citado por A. Neto, em Código Civil anotado, 1997, pg. 571..
No mesmo sentido opinam Ferrer Correia e J. Sousa Ribeiro em parecer sobre o tema “direito de retenção”, em que concluem que: “I - O direito de retenção, como direito real de garantia, actua em dois grupos de casos: a) Aqueles em que o crédito resulta de despesas feitas por causa da coisa ou de danos por ela causados (critério da conexão directa e material do crédito com a coisa: art. 754º, do Cód. Civil); b) Os casos especialmente previstos no art. 755°, texto em que o legislador utilizou o critério da conexão jurídica; II — Os dois referidos critérios funcionam autonomamente. Por conseguinte, o facto de o contrato de empreitada não figurar na enumeração do art. 755° não obsta a que na esfera jurídica do empreiteiro nasça o direito de retenção, por incumprimento da obrigação de pagar do dono da obra, desde que se encontrem presentes os requisitos do art. 754°; III — Ora, o crédito do empreiteiro sobre o dono da obra reveste justamente (pelo menos em parte) a natureza de crédito resultante de despesas feitas por causa da coisa. O que significa que, nessa medida estão inteiramente satisfeitos os requisitos do art. 754°, e assegurada, assim, a existência do direito de retenção do empreiteiro; IV — Este direito incide sobre a obrigação de entrega da obra total ou parcialmente executada” In “Direito de Retenção”, CJ, 1988, I, pg. 15 e ss..
Também em idêntica orientação se tem pronunciado a jurisprudência. Por todos, veja-se o acórdão desta Relação de 26.04.94 em que se entendeu que “ I - São requisitos do direito de retenção: a) Detenção lícita de uma coisa por alguém que está obrigado a entregá-la a outrem; b) Crédito simultâneo do primeiro em relação ao segundo; c) Conexão desse crédito com a coisa detida, derivada de despesas feitas por causa desta ou de danos causados pela mesma. II - Mostrando-se omitido o pagamento de parte do preço duma empreitada, traduzindo o crédito essencialmente de despesas feitas por causa da obra em que se integram 24 fogos, ocorre o requisito de conexão entre estes e o crédito” Acessível em WWW.dgsi.pt.
E ao exercício do direito de retenção no âmbito da empreitada não obsta a norma do n.º 2 do art. 1212º do CC que diz que “no caso de empreitada de construção de imóveis, sendo o solo ou a superfície pertença do dono da obra, a coisa é propriedade deste, ainda que seja o empreiteiro quem fornece os materiais; estes consideram-se adquiridos pelo dono da obra à medida em que vão sendo incorporados no solo”.
Isto porque estão em apreço direitos distintos. Neste preceito (art. 1212º/2) está em causa o direito de propriedade sobre a construção de imóvel, reconhecido ao dono da obra, enquanto que no art. 754º está em causa apenas o direito de retenção dessa mesma construção, por despesas com ela realizadas e reconhecido ao empreiteiro da obra que as tenha suportado. Daí que o direito de retenção possa ser efectivado sem prejuízo da propriedade do bem sobre que incide, que, enquanto tal, permanece incólume, sendo, todavia, certo que, para certos efeitos, a situação do titular da coisa é menos vantajosa do que a do mero possuidor – “melior est conditio possidentis”.
Mas é necessário ter bem presente e não perder de vista que o direito de retenção subentende, para sua real existência, a detenção efectiva do bem ou a conservação do bem em poder do reconhecido detentor, com exclusão de outrem, designadamente do seu proprietário ou legítimo possuidor. Na verdade, são requisitos, específicos e essenciais, para que haja direito de retenção, antes de mais que alguém tenha a possessão de coisa que não lhe pertença e tenha obrigação de entregar a seu verdadeiro titular e em segundo lugar que seja credor deste último em virtude de despesas feitas com a coisa detida ou de danos por ela causados.
Sem detenção actual do bem não pode ser invocado direito de retenção, como não pode ser invocado este direito para se legitimar o início, ou reinício, da detenção de facto da coisa reclamada como objecto deste mesmo direito. É o que resulta claramente da lei e expressamente tem sido entendido pela doutrina e jurisprudência, como se vê pelas citações acima expressas e tantas mais se poderiam nomear.
Na verdade, nos termos da lei apenas tem direito de retenção aquele que, além do mais, esteja “obrigado a entregar certa coisa”, o que, necessariamente, pressupõe que a coisa se encontre em seu poder (art. 754º do CC). Por outro lado, o direito de retenção extingue-se, entre outras causas, “pela entrega da coisa” (art. 761º do CC), o que demonstra bem que apenas quem detenha a custódia da coisa possa invocar direito de retenção sobre a mesma.
Daí que não seja legítimo invocar um hipotético direito de retenção sobre determinado bem se do mesmo se não possui verdadeira detenção, não sendo lícito em tal circunstância ir a juízo pedir a condenação do dono ou legítimo possuidor do bem a entregá-lo ao demandante a fim de este poder exercitar aquele direito, mesmo que o primeiro seja credor do segundo por despesas feitas com o bem disputado.
Ou seja, tem-se direito de retenção quando se tenha a detenção de determinada coisa e crédito sobre o seu titular por despesas efectuadas com essa coisa. Não existindo já detenção, ou porque se fez a entrega voluntária da coisa ou porque se consentiu que o seu titular a extraísse da esfera de domínio daquele que a podia ter detido, não pode haver direito de retenção.
Situação diferente será aquela em que o titular do direito de retenção tenha sido espoliado da detenção da coisa, ou esteja na iminência de o ser, quer por acto violento (esbulho) quer por qualquer outra conduta furtiva e contrária a sua vontade, pois que nesse caso já se poderá, casualmente, defender a invocação de tal direito e a sua actual violação, ou ameaça, quiçá, passível de defesa pelos meios legais conferidos ao possuidor de boa fé.
Revertendo ao caso em apreço, temos que a recorrente veio intentar o presente procedimento cautelar, com fundamento num alegado direito de retenção sobre os imóveis que identificou nos autos.
Porém, em nenhuma parte, do extenso articulado que apresentou, invocou possuir a detenção dos aludidos prédios, nem de ter sido esbulhada da posse dos mesmos, antes dando claras indicações em sentido contrário, designadamente, ao alegar que desde princípio de Junho a empresa …., se encontrava a instalar-se nos edifícios – o que foi indiciariamente considerado provado - e, mais nitidamente, ao formular o seu pedido de condenação da Requerida a restituir à Requerente a posse dos imóveis, entregando-os livre de pessoas e bens.
Ora, se a recorrente pede no procedimento para lhe serem entregues os imóveis sobre os quais invoca ter direito de retenção só o pode fazer no pressuposto de não os possuir à sua ordem e detenção, o que de resto a prova até indicia.
Se assim acontece, a recorrente não podia sustentar o presente procedimento cautelar no alegado direito de retenção, por não o mostrar possuir.
Na sua douta alegação, a recorrente expende, aliás com assinalável brilho e ao que parece com muita convicção, bem congeminadas considerações sobre o direito de retenção, chamando à colação os ensinamentos da doutrina e da jurisprudência sobre a matéria, aliás bem arquitectados e inatacáveis, mas que no caso não conduzem a concluir, muito pelo contrário, que a recorrente possua qualquer direito de retenção, que lhe deva ser reconhecido.
E quando alega que “a Requerente foi investida na detenção da obra na data da sua consignação e tal detenção mantém-se mesmo que não se encontre a executar trabalhos no local e mesmo que tenha dado por concluídos os trabalhos…”, não oferece conclusão que se possa aceitar, por tudo quanto se disse quanto à “detenção”, que não pode para o efeito ser entendida diferentemente de um poder de facto sobre a coisa, que a recorrente pelos termos da demanda até mostra não possuir.
Daí que mesmo que fossem de considerar provados todos os factos que a recorrente invocou no seu requerimento, sempre o presente procedimento cautelar estava votado ao insucesso, pelo que nem seria despropositado ter sido indeferido liminarmente.
A decisão recorrida não merece, pois, qualquer censura, pelo que resta confirmá-la e para ela se remeter no mais que se pudesse aditar.
Em síntese:
I. São requisitos do direito de retenção que alguém possua a detenção de uma coisa, que não lhe pertença e tenha obrigação de entregar a seu verdadeiro titular, e que seja credor deste último em virtude de despesas feitas com a coisa detida ou de danos por ela causados.
II. O direito de retenção subentende, para sua real existência, a detenção efectiva do bem ou a conservação do bem em poder do reconhecido detentor, com exclusão de outrem, designadamente do seu proprietário ou legítimo possuidor.
III. Sem detenção actual do bem não pode ser invocado direito de retenção, como não pode ser invocado este direito para se legitimar o início, ou reinício, da detenção de facto da coisa reclamada como objecto deste mesmo direito.
IV. Ou seja, tem-se direito de retenção quando se tenha a detenção de determinada coisa e crédito sobre o seu titular por despesas efectuadas com essa coisa. Não existindo já detenção, ou porque se fez a entrega voluntária da coisa ou porque se consentiu que o seu titular a extraísse da esfera de domínio daquele que a podia ter detido, não pode haver direito de retenção.
V. Apenas se o titular do direito de retenção tiver sido espoliado da detenção da coisa, quer por acto violento (esbulho) quer por qualquer outra conduta furtiva e contrária a sua vontade, eventualmente se poderá defender a invocação de tal direito e a sua actual violação, quiçá, passível de defesa pelos meios legais conferidos ao possuidor de boa fé.
VI. Não é de deferir o procedimento cautelar em que se pede a entrega de bens sobre os quais se invoca direito de retenção, mas de que não se tem a efectiva detenção ou não se invoca actual ou iminente desapossamento ilícito.
Improcedem, por isso, as conclusões do recurso, sendo de manter a decisão recorrida.
IV. DECISÃO:
Em conformidade com os fundamentos expostos, nega-se provimento à apelação e confirma-se a decisão recorrida.
Custas nas instâncias pela apelante.
Lisboa, 4 de Fevereiro de 2010.
Fernando Pereira Rodrigues
Maria Manuela Gomes
Olindo dos Santos Geraldes