Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | MARIA AUGUSTA FERNANDES | ||
Descritores: | PROVA PERICIAL DEPOIMENTO DE TESTEMUNHA MENOR | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 04/27/2006 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | RECURSO IMPROCEDENTE | ||
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Sumário: | I – O tribunal considerou credível o depoimento da menor pela forma desassombrada, viva e inteligente como a mesma descreveu os factos, “apresentando uma narrativa coerente e verosímil nos seus detalhes”, pormenores estes de comunicação não verbal que só parcialmente poderão ser por nós percepcionados através da transcrição ou mesmo através da audição das cassetes. II – Para corroborar a razão da credibilidade no depoimento da menor vale-se ainda o Tribunal “a quo” do “Relatório de avaliação psicológica” solicitado pelo Magistrado do M°P°, na fase de inquérito, conforme permite o n°2 do art°131° do C.P.P. III – Contra a utilização desse relatório insurge-se a recorrente defendendo que ao aceitar como meio de prova, os “relatórios de avaliação psicológica” bem como o testemunho do psicólogo que acompanhou a menor após os factos, e ao valorá-los como factores decisivos para a formação da convicção ofendeu o Tribunal “a quo” o n°3 do art°131° do C.P.P., o princípio da imediação, o exclusivo da função jurisdicional, consagrado no art°202° da CRP, subverteu o sistema legal de leitura de declarações prestadas perante autoridades não judiciais, em especial o n°7 do art°356° do C.P.P. e violou o disposto na al. b) ao nº 2 do art°130° do mesmo diploma. IV – Não lhe assiste, porem, razão, pois, com efeito, a finalidade daquele meio de prova (assim o classifica o legislador), é a verificação da aptidão psíquica da menor para prestar testemunho relativamente aos graves factos de que a arguida vem acusada, considerado necessário pelo M°P° para avaliar da credibilidade que deve ser dada ao seu depoimento e cuja validade e necessidade a arguida não impugnou a seu tempo. V – A prova pericial tem lugar, de acordo com o art°151° do C.P.P., quando a percepção ou apreciação dos factos exigem especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos, sendo a perícia, “a actividade de percepção ou apreciação dos factos probandos efectuada por pessoas dotadas de especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos” - Germano Marques da Silva - Curso de Processo Penal II, pág.197. VI – Embora o juiz pela formação que possui tenha capacidade para avaliar da credibilidade das testemunhas em geral, tratando-se de menores, porque a percepção da sua aptidão física e mental para prestar testemunho se toma mais difícil e, por vezes, escapa ao seu entendimento técnico-jurídico, permite e até aconselha a lei que se solicite a técnicos avalizados, com conhecimentos técnicos específicos, a realização de perícias destinadas a avaliar da sua credibilidade. VII – O perito, pessoa dotada desses especiais conhecimentos técnicos, está melhor preparado para percepcionar ou apreciar da credibilidade do depoimento, funcionando, assim, como auxiliar do juiz. VIII – No caso dos autos a função do perito é a de auxiliar do juiz tão só no que concerne à apreciação da credibilidade da testemunha, não se substituindo ao juiz na avaliação do testemunho. Ou seja, o perito não “diz” ao juiz o que do depoimento deve ou não ser aproveitado, apenas lhe indicando, de acordo com os estudos que fez, se a testemunha merece ou não credibilidade. IX – Relativamente ao depoimento do psicólogo que acompanhou a menor, o tribunal “a quo” apenas o valorou, contrariamente ao afirmado pela recorrente, para dar como provadas as consequências que a ocorrência teve para a saúde da menor. X – É, pois, de concluir que não foi utilizada prova proibida, não foi ofendido, por qualquer forma, o princípio da imediação nem violados quaisquer das apontadas normas do C.P.P. ou da C.R.P. | ||
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Decisão Texto Integral: | Registo n.º111/05 Processo n.º 2347/05 - 1ª Secção Relatora: Maria Augusta Fernandes Adjuntos: Des. Tomé Branco Des. Miguez Garcia Acordam, em audiência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães. No processo comum colectivo nº215/02.7GBPTL, do 1º Juízo do Tribunal Judicial de Ponte de Lima, por acórdão datado de 24/05/05 e depositada na mesma data, foi a arguida MARIA F... condenada pela prática de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artºs131º, 132º, nº1 e 2, al.d) e g), 22º e 23º, todos do C.P., na pena de 4 anos de prisão. ***** Inconformada, recorreu a arguida que termina a sua motivação com as seguintes conclusões, que se transcrevem: 1. A Recorrente considera que foram incorrectamente julgados os seguintes factos: No dia 23 de Novembro de 2002, pelas 17h20m, a arguida tripulava o veículo ligeiro de passageiros, marca “Ford”, modelo “Transit 120 Van”, com a matrícula 35-66-O...., pela hemi-faixa direita da E.N. nº306, atento o seu sentido de marcha, Freixo – Ponte de Lima. Quando passava pelo largo do Sr. dos Aflitos, no lugar das Barreiras, freguesia de S. Julião do Freixo, a arguida avistou à sua esquerda a Ana I..., que vinha da igreja e se dirigia à sua residência. Deslocava-se a pé, num caminho de pedra, o qual permite que quem vem da igreja aceda à referida estrada nacional. Nesse momento, ao ver a menor, e por causa do desentendimento com Maria A..., a arguida torceu, repentinamente, à esquerda o volante do veículo que tripulava, com o intuito de direccionar o referido veículo àquela e com ele a atingir. Tripulou o veículo na direcção da Ana I... – que ao dar conta das intenções da arguida procurou fugir – e quando a alcançou embateu com o pára-choques frontal do veículo nas costas daquela, derrubando-a. A Ana I..., no momento em que foi embatida, tentando escapulir ao veículo que a perseguia, encontrava-se em frente a um portão situado no lado esquerdo do referido caminho, atento o sentido que a menor seguia, portão este que estava aberto e dá acesso a uma casa. Após o embate, a arguida manobrou o veículo de modo a que o mesmo recuasse e, verificando que Ana I... se encontrava no chão, manobrou-o de modo a que este avançasse para cima da menor, com o propósito de a atingir com os rodados do veículo. A Ana I... rodopiou, conseguindo colocar-se sob o veículo, entre os rodados direito e esquerdo deste, evitando assim que algum deles lhe passasse por cima e a esmagasse. De seguida, a arguida recuou o veículo sobre a Ana I..., que permanecia imóvel no chão, e assim regressou à referida estrada nacional, retomando o seu trajecto inicial. Com tal conduta, a arguida provocou na Ana I..., de forma directa e necessária, além de dores físicas e mal-estar, uma contusão lombar, a determinar-lhe 30 dias de doença, com igual tempo de impossibilidade para o trabalho. Ao levar a cabo as condutas descritas, pretendeu a arguida causar a Ana I... lesões de tal modo graves, nomeadamente por traumatismo e esmagamento, que lhe acarretassem de forma directa e necessária a morte. A Ana I... só não perdeu a vida por circunstâncias alheias à vontade da arguida, ou seja, porque logrou esquivar-se fugindo ao embate e minorando as consequências deste e porque depois, deitada no solo, foi capaz de se esquivar aos rodados do veículo que a arguida manobrava para que a esmagassem. Agiu a arguida movida pelo fito de assim tirar desforço da Maria A..., por causa da desavença que mantinha com ela a propósito do grupo coral. A arguida agiu de forma livre, voluntária e consciente, sabendo que as suas condutas eram proibidas pela lei penal. A arguida é doméstica e vive com o marido, industrial de construção civil, e com duas filhas, uma menor e outra casada, e ainda com o genro. Não tem antecedentes criminais. 2. Ao contrário do que ficou decidido, sustenta a Recorrente que esses factos deveriam ter sido considerados não provados, ao menos em tudo quanto se refere a si, pois, 3. inversamente, deveria ter-se julgado provado que a Arguida não participou neles e que, na altura em que, porventura, tenham acontecido, se encontrava em sua casa, com a família. 4. São os seguintes os elementos de prova que impõem decisão diferente da que agora se impugna: o os depoimentos das testemunhas LUÍS C... (que está gravado entre as rotações 0009 e 0927 do lado A da 4ª cassete), FERNANDO B... (que está gravado entre as rotações 928 e 1544 do lado A da 4ª cassete), MANUEL L... (que está gravado entre as rotações 1545 e 2333 do lado A da 4ª cassete), ISABEL L... (que está gravado entre as rotações 2334 do lado A e 2030 do lado B da 4ª cassete) e FRANCISCO N... (que está gravado entre as rotações 2031 do lado B da 4ª cassete e 0770 da 5ª cassete), que confirmam a versão da Arguida e cuja credibilidade não foi nem pode ser posta em causa; o a conjugação dos depoimentos da Assistente Maria A... (que está gravada entre as rotações 2084 e 2497 do lado A da 2ª cassete) e da testemunha e Ofendida Ana I... (que está gravado entre as rotações 0000 e 1490 do lado A da 2ª cassete) com o depoimento da testemunha MARIA M... (que está gravado entre as rotações 1705 e 2379 do lado B da 2ª cassete), depoimento este último que contraria os anteriores em aspectos fulcrais, desmentindo, i.a, que a Ofendida, ao chegar a casa, tenha relatado que reconheceu a Arguida como a condutora do veículo que a teria atropelado e que tenha referido a manobra que lhe permitiu colocar-se entre os rodados da viatura e relacioná-la com brincadeiras com que costumava entreter-se; 5. O Tribunal fez uma errada avaliação da prova produzida, além de não ter consignado nenhuma razão objectiva – aliás, inexistente – que justifique ter postergado, na íntegra, os depoimentos das testemunhas acima referidas que confirmaram a versão da Arguida. 6. Além de ofender o princípio in dubio pro reo, cuja validade se entende à ponderação dos meios de prova, o Tribunal fez uma errada aplicação do princípio da livre convicção probatória consagrado no artº127.º, que não permite convicções de índole subjectiva, sem apoio na prova produzida, nas regras da experiência e na inteligibilidade lógica. 7. Acresce que, ao aceitar como meio de prova dois, assim chamados, “relatórios de avaliação psicológica” – docs de fls 124 a 128 e 131 a 139 – e ao admitir o depoimento de PAULO L... (que está gravado entre as rotações 2241 e 2497 do lado A e as rotações 0000 e 0830 do lado B da 3ª cassete), e ao valorá-los como factores decisivos para formar a sua convicção, o Tribunal ofendeu o disposto no artº 131º, nº3, e ainda a imediação implicada no princípio do acusatório que orienta o processo criminal (artº 32º, nº5, CRP) e o exclusivo da função jurisdicional consagrado no artº202º CRP, além de subverter (e, por isso, desrespeitar) o sistema legal de leitura de declarações prestadas perante autoridades não judiciais (cfr artº356º, em especial, nº7) e o disposto na al.b) do nº2 do artº130º, 8. ou, no mínimo, adoptou uma interpretação inconstitucional do disposto no artº127º (princípio da livre convicção probatória), por ofensa dos citados preceitos da CRP. 9. Na verdade, quer aqueles relatórios, quer o depoimento daquela testemunha não procedem à avaliação da credibilidade geral da personalidade das testemunhas. 10. Pelo contrário, procedem à avaliação da credibilidade da versão que elas relatam dos factos que constituem objecto do processo, 11. versão, de resto, registada de modo expresso nesses relatórios e depoimento. 12. Além de ser óbvio que as conversas que antecederam essa avaliação permitiram às testemunhas ensaiar e aperfeiçoar as suas versões, sedimentá-las e tornar fluente (logo, d aparência mais credível) a sua narração. 13. a sua transcrição ou reprodução e a emissão de juízos de valor sobre o seu conteúdo, influenciando o Tribunal – como este reconhece que aconteceu -, implicam a alienação do poder de julgar e decidir com base na exclusiva convicção do julgador, que são apanágio exclusivo dos órgãos do poder judicial. 14. Além disso, a nossa lei só permite a perícia da personalidade das testemunhas menores que deponham sobre crimes sexuais e se tal perícia tiver natureza geral – cfr artº113º, nº3. 15. Mais acresce que a Ofendida Ana I... foi inquirida em julgamento como assistente – que não é, nem podia ser – cfr artº68º, nº1, al.a) – e que a Assistente ANGELINA foi inquirida como testemunha, que não é nem podia ser – cfr artº133º, nº1, al.b) – , o que constitui nulidade por implicar o uso de meios de prova proibidos – artº125º; cfr artº118º, nº3. SEM PRESCINDIR: 16. ainda que se mantenha a generalidade do quadro factual que a Recorrente agora impugna, sempre seria certo que, pelo menos os factos relativos à intenção de matar não podem jamais considerar-se provados, 17. em especial o seguinte: “ Ao levar a cabo as condutas descritas, pretendeu a arguida causar a Ana I... lesões de tal modo graves, nomeadamente por traumatismo e esmagamento, que lhe acarretassem de forma directa e necessária a morte”. 18. As circunstâncias do caso (atropelamento com uma viatura praticamente parada, junto a um portão aberto que, na prática, impedia o veículo de prosseguir a sua marcha) e a conduta imputada á Arguida são compatíveis com a mera intenção de ofender a integridade física da Ana I.... 19. Na ausência de qualquer elemento de índole objectiva ou subjectiva que subordine, para além da dúvida razoável, a explicação dos factos à intenção de matar e, portanto, que exclua a mera intenção de ofender a integridade física, o princípio in dubio pro reo impõe que se opte por este último, mais favorável à Arguida. 20. Deveria, por isso, o facto a que se alude ter sido julgado não provado, 21. o que, além do mais, implica a sua absolvição pelo crime de homicídio que lhe foi imputado e a sua condenação pelo crime de ofensas à integridade física simples, p. e p. pelo artº143º CP. AINDA SEM PRESCINDIR: 22. Na hipótese – que se rejeita com toda a firmeza e apenas se aborda por mera cautela – de vir a manter-se o quadro factual que a douta sentença em mérito julgou provado, com ou sem a intenção de matar, considera a Recorrente que o seu passado sem mácula criminal, a sua idade e a sua comprovada inserção social, aliados à circunstância de a Ofendida não ter sofrido quaisquer danos físicos, inculcam, sem hesitações, a constatação de que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, 23. pelo que, a ser condenada, a execução da pena aplicável (que não deveria nunca exceder os três anos de prisão) deveria ser suspensa pelo período considerado justo. 24. Ao decidir de modo diferente, a douta sentença ofendeu, entre outras, as disposições contidas nos arts 50º, 71º, 131º, 132º e 143º do Código Penal. ***** O recurso foi admitido por despacho de fls.274. ***** Responderam o MºPº e a assistente, concluindo pela sua improcedência. ***** O Exmo Procurador–Geral Adjunto nesta Relação emitiu parecer no qual conclui o recurso não merece provimento. ***** Foi cumprido o disposto no artigo 417º n.º 2 do C.P.P.. ***** Realizado o exame preliminar e colhidos os vistos, prosseguiram os autos para a audiência, na qual foram observados todos os formalismos legais. ***** Cumpre decidir: Matéria de facto provada, não provada e motivação (transcrição): Ana I... , nascida a 30 de Agosto de 1992, é filha de Maria A... . Esta mantém uma desavença com a arguida devido a uma zanga ocorrida no seio e por causa do grupo coral da paróquia de Freixo, de que faziam parte a arguida e um filho de Maria A...; o início desta desavença é anterior a Novembro de 2002. No dia 23 de Novembro de 2002, pelas 17h20m, a arguida tripulava o veículo ligeiro de passageiros, marca “Ford”, modelo “Transit 120 Van”, com a matrícula 35-66-O..., pela hemi-faixa direita da E.N. nº306, atento o seu sentido de marcha, Freixo – Ponte de Lima. Quando passava pelo largo do Sr. dos Aflitos, no lugar das Barreiras, freguesia de S. Julião do Freixo, a arguida avistou à sua esquerda a Ana I..., que vinha da igreja e se dirigia à sua residência. Deslocava-se a pé, num caminho de pedra, o qual permite que quem vem da igreja aceda à referida estrada nacional. Nesse momento, ao ver a menor, e por causa do desentendimento com Maria A..., a arguida torceu, repentinamente, à esquerda o volante do veículo que tripulava, com o intuito de direccionar o referido veículo àquela e com ele a atingir. Tripulou o veículo na direcção da Ana I... – que ao dar conta das intenções da arguida procurou fugir – e quando a alcançou embateu com o pára-choques frontal do veículo nas costas daquela, derrubando-a. A Ana I..., no momento em que foi embatida, tentando escapulir ao veículo que a perseguia, encontrava-se em frente a um portão situado no lado esquerdo do referido caminho, atento o sentido que a menor seguia, portão este que estava aberto e dá acesso a uma casa. Após o embate, a arguida manobrou o veículo de modo a que o mesmo recuasse e, verificando que Ana I... se encontrava no chão, manobrou-o de modo a que este avançasse para cima da menor, com o propósito de a atingir com os rodados do veículo. A Ana I... rodopiou, conseguindo colocar-se sob o veículo, entre os rodados direito e esquerdo deste, evitando assim que algum deles lhe passasse por cima e a esmagasse. De seguida, a arguida recuou o veículo sobre a Ana I..., que permanecia imóvel no chão, e assim regressou à referida estrada nacional, retomando o seu trajecto inicial. Com tal conduta, a arguida provocou na Ana I..., de forma directa e necessária, além de dores físicas e mal-estar, uma contusão lombar, a determinar-lhe 30 dias de doença, com igual tempo de impossibilidade para o trabalho. Ao levar a cabo as condutas descritas, pretendeu a arguida causar a Ana I... lesões de tal modo graves, nomeadamente por traumatismo e esmagamento, que lhe acarretassem de forma directa e necessária a morte. A Ana I... só não perdeu a vida por circunstâncias alheias à vontade da arguida, ou seja, porque logrou esquivar-se fugindo ao embate e minorando as consequências deste e porque depois, deitada no solo, foi capaz de se esquivar aos rodados do veículo que a arguida manobrava para que a esmagassem. Agiu a arguida movida pelo fito de assim tirar desforço da Maria A..., por causa da desavença que mantinha com ela a propósito do grupo coral. A arguida agiu de forma livre, voluntária e consciente, sabendo que as suas condutas eram proibidas pela lei penal. A arguida é doméstica e vive com o marido, industrial de construção civil, e com duas filhas, uma menor e outra casada, e ainda com o genro. Não tem antecedentes criminais. * FACTOS NÃO PROVADOS Não ficou por provar qualquer facto constante da acusação nem se provou nenhum outro com relevância para a decisão da causa. * FUNDAMENTAÇÃO A convicção do tribunal assentou na análise crítica de toda a prova carreada para os autos, merecendo natural lugar de destaque o contributo da menor Ana I... que, apesar da sua pouca idade, descreveu os factos com desassombro, vivacidade e inteligência, tendo consciência da gravidade da acusação e apresentando uma narrativa coerente e verosímil nos seus detalhes; aliás, o extenso e pormenorizado relatório de avaliação psicológica desta menor (fls. 130 a 140) mais não fez do que confirmar a indelével impressão de credibilidade deixada pelo teor das declarações da Ana I.... No mesmo sentido foi o depoimento de Paulo S..., psicólogo que acompanhou a menor depois dos factos, e que nunca encontrou motivos técnicos para duvidar do narrado pela mesma. Única testemunha presencial de parte dos factos, foi também importante o depoimento de Cindy B... (que se encontrava no largo da igreja, e viu a manobra da carrinha junto ao portão), o qual também se pautou por uma serenidade e honestidade que tornaram o seu relato plausível, como complemento ao da menor Ana I...; também o depoimento desta testemunha foi reforçado pelo relatório de avaliação psicológica elaborado em relação à mesma (fls. 124 a 128). Para enquadrar os dados fornecidos pelas duas menores, quer no que respeita à topografia do local, quer à sua luminosidade quer à configuração da carrinha em causa, foram de grande relevância os seguintes elementos: o exame ao local e registo fotográfico de fls. 101/102, as fotografias da zona do portão e da estrada (fls. 19/20 e 151), o auto de exame a veículo automóvel semelhante, com rapaz de 10 anos incompletos (de compleição física semelhante à de Ana I...), que consta de fls. 86 a 89, os documentos da carrinha 35-66-O... (fls. 92/93) e o respectivo auto de exame (fls. 94), este confirmado, no que respeita à ausência de protecção inferior, pelo documento junto pela arguida em audiência. Já em menor grau de importância, mas ainda assim reforçando o quadro factual extraído dos elementos acima citados, estão os depoimentos de Maria A... , mãe de Ana I..., e de Maria L... M..., prima de ambas, sobretudo quanto ao estado de choque em que a menor chegou a casa no dia dos factos; Maria A... descreveu ainda, para além do que já tinha feito a arguida, as circunstâncias que tinham gerado o desentendimento entre as duas famílias (confirmados, embora de forma titubeante, pelo depoimento do padre da freguesia, T... Vieira). Da animosidade que a arguida manifestava em relação à menor Ana I... deu testemunho Maria M..., que era frequentemente transportada pela arguida no regresso da missa, e aí se apercebia daquele estado de espírito, verbalizado na vontade de “passar a ferro” a menor. Quanto à intenção que norteou a arguida, o meio empregue – uma carrinha de 9 lugares – e a reiteração da manobra (abalroar não se mostrou suficiente, teve ainda de passar por cima da menor com os rodados) demonstram à saciedade que a arguida queria tirar a vida a Ana I..., e que isso só não aconteceu pela presença de espírito desta. No que respeita às consequências para a saúde de Ana I..., além do descrito por sua mãe e, a nível psicológico, pelo já referido Paulo S..., serviram as fichas clínicas de fls. 25 e 29 a 31, analisadas e explicadas por José G..., médico que viu a menor no hospital de Ponte de Lima, e o relatório pericial de fls. 147 a 149. Perante todo o acervo probatório acima referido, resultou patética a postura da arguida em negar o sucedido, e de uma enorme fragilidade a tentativa de álibi desenhada pelo conjunto dos depoimentos das testemunhas de defesa (o seu primo e vizinho Luís C..., o seu vizinho Fernando B..., o seu marido Manuel L..., a sua filha Isabel L... e o seu genro Francisco N...), que revelaram algumas contradições, ainda que de pormenor, quando comparados entre si, além de que nenhum deles se atreveu a assegurar que conhecia o paradeiro da arguida durante todos os períodos daquele dia. De nenhuma valia se mostrou o depoimento de Ana C..., prima da menor Ana I..., dada a sua actual – e bem patente – animosidade contra a tia Maria A..., por motivos alheios a estes autos. Serviram ainda a certidão de nascimento de fls. 14 e o certificado de registo criminal de fls. 163. Para as condições económicas e familiares da arguida, valeram as declarações da própria, confirmadas pelas testemunhas Manuel S.., Casimiro D..., José S..., Manuel C... e Maria B.... ***** O objecto do recurso é definido pelas conclusões extraídas pelo recorrente da motivação por ele apresentada, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, designadamente, as referidas no nº2 do artº410º do C.P.P.. As questões a decidir são, pois, as seguintes: 1. Saber se o facto de a menor ter sido inquirida na qualidade de assistente e sua mãe na qualidade de testemunha integra uma nulidade por implicar uso de meios de prova proibidos. 2. Saber se existe erro de julgamento - Saber se foram incorrectamente julgados os factos provados sob o § 2º e seguintes; 3. Medida da pena: a) Saber se à arguida deverá ser aplicada pena que não exceda 3 anos de prisão; b) Saber se essa pena deverá ser suspensa na sua execução. ***** 1ª Questão: Defende a arguida que constitui nulidade, por implicar o uso de meios de prova proibidos, o facto de a menor Ana I... ter sido inquirida, em julgamento, na qualidade de assistente e sua mãe na qualidade de testemunha. Conforme resulta da al.d) do nº1 do artº68º do C.P.P., à menor Ana I... falta capacidade para se constituir assistente dada ter menos de 16 anos. É, no caso, a mãe quem tem legitimidade para o efeito. O facto de esta ter sido ouvida como testemunha e aquela como assistente, em violação do disposto no artº133º nº1 al.b) do C.P.P., configura mera irregularidade não arguida atempadamente (até ao final de cada um dos depoimentos em audiência em que a arguida esteve presente) e que, por isso, se encontra sanada – artº123º do C.P.P... 2ª Questão: A arguida visa, com o recurso, a apreciação da matéria de facto e a sua alteração, pois considera que esta foi incorrectamente apreciada e valorada. Esse conhecimento é possível dado que houve documentação das declarações prestadas oralmente na audiência (artº363º do C.P.P.) e foram cumpridas as exigências impostas nos nºs3 e 4 do artº412º do C.P.P., indicando-se os pontos de facto considerados incorrectamente julgados e as provas que impõem decisão diversa, na perspectiva da recorrente, com referência aos suportes técnicos. Começa esta por impugnar a decisão relativamente aos factos provados sob o §2º e seguintes por, em seu entender, ao contrário do que ficou decidido, dever o Tribunal a quo ter dado como provado que ela não teve qualquer participação nos factos e que na altura em que os mesmos terão acontecido se encontrava em casa. Defende que foi feita uma errada avaliação da prova produzida, além de não ter sido consignada nenhuma razão objectiva – aliás, inexistente – que justifique ter postergado, na íntegra, os depoimentos das testemunhas por si arroladas que confirmaram a sua versão. Como meios de prova que impõem decisão diferente indica: - os depoimentos das testemunhas Luís C, Fernando B..., Manuel L... e Francisco C... , que confirmam a versão da arguida; - a conjugação dos depoimentos da assistente Maria A... e da testemunha e ofendida Ana I... com o depoimento da testemunha Maria M..., contrariando este último, em aspectos fulcrais, os daquelas; - os registos fotográficos de fls.80 a 88 e o documento de fls.92, conjugados com as regras da experiência e com a inexistência de ferimentos no corpo da ofendida e de sujidade na roupa que envergava, tornam a sua versão altamente improvável. Considera ainda que foi ofendido o princípio in dubio pro reo e que foi feita uma errada aplicação do princípio da livre apreciação da prova, consagrado no artº127º do C.P.P., o qual não permite convicções de índole subjectiva, sem apoio na prova produzida, nas regras da experiência e na inteligibilidade lógica. Entende também que ao aceitar como meio de prova os “relatórios de avaliação psicológica de fls.124 a 128 e de fls.131 a 139 e ao admitir o depoimento da testemunha Paulo Lima Santos e ao valorá-los como factores decisivos para a formação da convicção, ofendeu o Tribunal a quo o nº3 do artº131º do C.P.P., o princípio da imediação, o exclusivo da função jurisdicional, consagrado no artº202º da CRP, subverteu o sistema legal de leitura de declarações prestadas perante autoridades não judiciais, em especial o nº7 do artº356º do C.P.P. e violou o disposto na al.b) do nº2 do artº130º do mesmo diploma. Em primeiro lugar há que esclarecer o seguinte: Controlar da bondade da decisão sobre matéria de facto com base na transcrição dos depoimentos ou mesmo na gravação audio não é a mesma coisa que ouvi-los directamente, tendo à frente a fonte (testemunha ou declarante). É que a oralidade e a imediação dão-nos uma outra amplitude da credibilidade do depoimento, pois permitem-nos apreciar o comportamento e reacções da testemunha ou declarante perante o interrogatório, o modo como este é feito e até o próprio ambiente em que é feito, as tensões criadas à volta da testemunha (ou declarante), a forma como é conduzido o interrogatório, etc.. Como escreve Castro Mendes Direito Processual Civil – Vol.III, pág.211 (1980)., “existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas podem ser percepcionados, apreendidos, interiorizados ou valorizados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção dos julgadores”. É integrado naquele ambiente que o julgador decide da credibilidade ou não de uma depoimento. Por outro lado, é também o confronto entre os vários depoimentos, conjugados com os demais meios de prova, que lhe vai permitir, com maior segurança, atribuir maior credibilidade a uns que a outros. Assim, a reconstituição do acontecimento que tem lugar em cada julgamento é feita com base em todo um conjunto de vivências e circunstâncias impossíveis de transmitir na gravação e muito menos na transcrição. A estes aspectos objectivos acrescem os “elementos não racionalmente explicáveis” e mesmo “puramente emocionais”, de que fala Figueiredo Dias Direito Processual Penal – Vol.I, - 1974, pág.204. Sendo a formação da convicção realizada de forma tão complexa, o controle que o tribunal de recurso pode fazer da matéria de facto é, necessariamente, limitado, sob pena de subverter o princípio da livre apreciação da prova, consagrado no artº127º do C.P.P.. A esse controle é essencial a motivação, através da qual o tribunal de recurso vai aquilatar da legalidade e razoabilidade da convicção do julgador, tomando conhecimento dos meios de prova e do processo dedutivo que lhe permitiu dar como provados uns factos e não provados outros. Haverá, assim, erro de julgamento se se detectar que a valoração da prova não foi feita de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência e dos conhecimentos científicos. De qualquer modo, há sempre que ter presente que conhecer de facto não significa fazer um novo julgamento, procurando nova convicção, como parece ser a pretensão da recorrente, mas antes reapreciar determinados aspectos da matéria de facto em relação aos quais alguma das partes considere ter havido erro de julgamento na 1ª instância Cfr. Germano Marques da Silva – A aplicação das alterações ao Código de Processo Penal – Fórum Iustitiae, Maio de 1999, pág.21. . É que a garantia do duplo grau de jurisdição, como é comummente aceite, não pode subverter, repete-se, o princípio da livre apreciação da prova, consagrado no artº127º do C.P.P.. Escreve-se, a propósito, no Ac. do STJ, de 16/06/05 www.dgsi.pt/jstj.nsf/, o duplo grau de jurisdição em matéria de facto não visa a repetição do julgamento na 2ª instância, mas dirige-se somente ao reexame dos erros de procedimento ou de julgamento que lhe tenham sido referidos em recurso e às provas que impõem decisão diversa, e não indiscriminadamente todas as provas produzidas em audiência. No mesmo sentido, o acórdão do mesmo Tribunal, de 17/02/05 www.dgsi.pt/jstj.nsf/, refere: os recursos são remédios jurídicos que se destinam a despistar e corrigir erros in judicando ou in procedendo, que são expressamente indicados pelo recorrente, com referência expressa ou específica aos meios de prova que impõem decisão diferente, quanto aos pontos de facto concretamente indicados, ou com referência à regra de direito respeitante à prova que teria sido violada, com indicação do sentido em que foi aplicada e qual o sentido com que deveria ter sido aplicada. Por isso, compete e este Tribunal, no que a este aspecto do recurso se refere, apurar se a convicção formada pelo Tribunal a quo tem suporte razoável naquilo que a gravação da prova e os demais elementos existentes nos autos podem fornecer. No caso, o principal erro que a recorrente aponta ao acórdão é o facto de o Tribunal a quo não ter valorizado as suas declarações e os depoimentos das testemunhas por si arroladas e cuja credibilidade, em sua opinião, não foi posta em causa. Ora isto mais não é do que pôr em causa a convicção do julgador, esquecendo-se de que em processo penal rege o já falado princípio da livre apreciação da prova (artº127º do C.P.P.), o que significa que, em regra, não existem critérios legais que determinem o valor a atribuir à prova. Esta será valorada de acordo com as regras da experiência e a livre convicção do juiz, embora com algumas excepções ou “limites” Assim lhes chama Castanheira Neves – Sumários de Processo Criminal – Coimbra 1968., “designadamente, as respeitantes ao valor probatório dos documentos autênticos e autenticados (art.169.º); ao caso julgado, não obstante este apenas se encontrar indirectamente regulado no CPP, a propósito do pedido cível (art.84.º); à confissão integral e sem reservas no julgamento (art.344.º) e à prova pericial (art.163.º)”. É certo que, como se escreveu no Ac. do Tribunal Constitucional Nº1165/96 de 19/11, in BMJ 461/93, o julgador ao apreciar livremente a prova, ao procurar através dela atingir a verdade material, deve observância a regras de experiência comum utilizando como método de avaliação e aquisição do conhecimento critérios objectivos, genericamente susceptíveis de motivação e controlo. No caso, adianta-se, desde já, essas regras não se mostram violadas, como adiante se explicitará. Por isso é que, tal como se escreve no acórdão da Rel. do Porto, de 12/05/04 www.dgsi.pt/jtrp.nsf/ , a convicção do julgador de 1ª instância só pode ser modificada pelo tribunal de recurso quando seja obtida através de provas ilegais ou proibidas, ou contra a força probatória plena de certos meios de prova ou então, quando afronte, de forma manifesta, as regras da experiência comum. Sempre que a convicção seja uma convicção possível e explicável pelas regras da experiência comum, deve acolher-se a opção do julgador, até porque beneficiou da oralidade e da imediação da recolha da prova. A prova em que o tribunal a quo se baseou para dar como provados os factos impugnados é, à excepção da prova pericial, de livre apreciação (prova testemunhal e documental. Isto, porém, não significa, como é por demais sabido, uma apreciação discricionária e/ou arbitrária. Pelo contrário, tem que reconduzir-se a critérios objectivos e controláveis através da motivação. Nos termos do artº374º nº2 do C.P.P., a sentença começa por um relatório, ao qual se segue a fundamentação “...que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição, tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.” (sublinhado nosso). Assim, é obrigatória a indicação das provas que serviram para formar a convicção do tribunal e o seu exame crítico, ou seja, o julgador tem, na fundamentação, que indicar “os elementos que em razão das regras da experiência ou de critérios lógicos constituem o substracto racional que conduziu a que a convicção do tribunal se formasse em determinado sentido ou valorasse de determinada forma os diversos meios de prova apresentados em audiência” Marques Ferreira – Meios de Prova , in Jornadas de Direito Processual Penal - o Novo Código de Processo Penal, pág.229/230. . “A fundamentação ou motivação deve ser tal que, intraprocessualmente, permita aos sujeitos processuais e ao tribunal superior o exame do processo lógico ou racional lhe subjaz, pela via do recurso...”, acrescenta o mesmo autor. Note-se que a lei não impõe que o raciocínio feito pelo julgador seja demonstrado facto a facto, até porque a fundamentação deve ser concisa. Mas tem que ser suficiente para que quem leia o acórdão ou sentença fique convencido da bondade da decisão (de facto). O acórdão em recurso indica as provas em que se baseou para dar como provados os factos e, concisa mas claramente, faz o seu exame crítico, dando a conhecer a este Tribunal as razões pelas quais, apesar de a arguida os ter negado e haver testemunhas de cujo depoimento resulta que à hora em que o “incidente” terá ocorrido ela se encontrava em casa, não lhes deu credibilidade – as declarações da menor, conjugadas com o depoimento da testemunha Cindy e reforçado pelos depoimentos da mãe daquela e da prima Maria L..., quanto ao “estado de choque” em que aquela chegou a casa mostraram-se de tal modo convincentes que tornaram “patética” a postura da arguida negando os factos e irrelevantes, por pouco seguros, os depoimentos das “testemunhas de defesa”. Estão bem patentes as razões pelas quais não foi dada credibilidade aos depoimentos destas testemunhas e às declarações da arguida e perfeitamente esclarecidas – elas não conseguiram abalar a convicção formada pelos julgadores depois de ouvirem a descrição dos factos feita pela menor que, apesar da sua pouca idade, descreveu os factos com desassombro, vivacidade e inteligência, tendo consciência da gravidade da acusação e apresentando uma narrativa coerente e verosímil nos seus detalhes (sublinhado nosso), conjugada com os depoimentos da testemunha Cindy, Angelina e Maria L.... Dito de outra forma, estes depoimentos, pela veracidade que transmitiram, foram suficientes para abalar a tese da arguida. Por outro lado, também foi relevante para os julgadores a prova documental junta aos autos, em especial os registos fotográficos e os exames efectuados ao veículo e o exame ao local. A fundamentação da decisão está devidamente alicerçada nas regras da experiência e em adequados juízos de normalidade, como melhor adiante se demonstrará. Posto isto, a questão a apurar é a de saber se os referidos elementos de prova valorados pelo Tribunal a quo impõem decisão diversa da tomada, ou seja, saber se permitem dar como provado ter a arguida praticado os factos provados, com dolo directo ou se, pelo contrário, deve ser dado como provado que não podia ela ter praticado os factos por se encontrar em casa à hora em que os mesmos terão ocorrido. Sobre estes factos o tribunal a quo valorou essencialmente, repete-se, o depoimento da menor/ofendida que os imputa à arguida. Conjugou-o, porém, com o exame efectuado ao local, os registos fotográficos de fls.10/20, 151, 101/102, o auto de exame do veículo – fls.86/89 e 94 -, bem como com os depoimentos da menor Cindy, da menor ofendida e de sua prima Maria L.... Considerou aquele tribunal credível tal depoimento pela forma desassombrada, viva e inteligente como a menor descreveu os factos, “apresentando uma narrativa coerente e verosímil nos seus detalhes”. Estes pormenores de comunicação não verbal percepcionados pelo Tribunal a quo só parcialmente poderão ser por nós percepcionados através da transcrição ou mesmo através da audição das cassetes. Para corroborar a razão da credibilidade no depoimento da menor vale-se ainda o Tribunal a quo do “Relatório de avaliação psicológica” solicitado pelo Magistrado do MºPº ao Instituto de Educação e Psicologia da UM, na fase de inquérito, conforme permite o nº2 do artº131º do C.P.P.. Contra a utilização desse relatório insurge-se a recorrente defendendo que ao aceitar como meio de prova os “relatórios de avaliação psicológica de fls.124 a 128 e de fls.131 a 139 e ao admitir o depoimento da testemunha Paulo S... e ao valorá-los como factores decisivos para a formação da convicção ofendeu o Tribunal a quo o nº3 do artº131º do C.P.P., o princípio da imediação, o exclusivo da função jurisdicional, consagrado no artº202º da CRP, subverteu o sistema legal de leitura de declarações prestadas perante autoridades não judiciais, em especial o nº7 do artº356º do C.P.P. e violou o disposto na al.b) do nº2 do artº130º do mesmo diploma. Não lhe assiste, porém, razão. Com efeito, a finalidade daquele meio de prova (assim o classifica o legislador), é a verificação da aptidão psíquica da menor para prestar testemunho relativamente aos graves factos de que a arguida vem acusada, considerado necessário pelo MºPº para avaliar da credibilidade que deve ser dada ao seu depoimento e cuja validade e necessidade a arguida não impugnou a seu tempo. A prova pericial tem lugar, de acordo com o artº151º do C.P.P., quando a percepção ou apreciação dos factos exigem especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos, sendo a perícia, a actividade de percepção ou apreciação dos factos probandos efectuada por pessoas dotadas de especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos Germano Marques da Silva - Curso de Processo Penal II, pág.197. . O objecto da perícia é, pois, a percepção de factos ou a sua valoração. Embora o juiz pela formação que possui tenha capacidade para avaliar da credibilidade das testemunhas em geral, tratando-se de menores, porque a percepção da sua aptidão física e mental para prestar testemunho se torna mais difícil e, por vezes, escapa ao seu entendimento técnico-jurídico, permite e até aconselha a lei que se solicite a técnicos avalizados, com conhecimentos técnicos específicos, a realização de perícias destinadas a avaliar da sua credibilidade. O perito, pessoa dotada desses especiais conhecimentos técnicos, está melhor preparado para percepcionar ou apreciar da credibilidade do depoimento, funcionando, assim, como auxiliar do juiz. No caso dos autos a função do perito é a de auxiliar do juiz tão só no que concerne à apreciação da credibilidade da testemunha. Não se substitui ao juiz na avaliação do testemunho. Ou seja, o perito não “diz” ao juiz o que do depoimento deve ou não ser aproveitado. Apenas lhe indica, de acordo com os estudos que fez, se a testemunha merece ou não credibilidade. Relativamente ao depoimento da testemunha Paulo S..., psicólogo que acompanhou a menor, o tribunal a quo apenas o valorou, contrariamente ao afirmado pela recorrente, para dar como provadas as consequências que a ocorrência teve para a saúde da menor. É, pois, de concluir que não foi utilizada prova proibida, não foi ofendido, por qualquer forma, o princípio da imediação nem violados quaisquer das apontadas normas do C.P.P. ou da C.R.P.. Passando à leitura dos depoimentos nos quais o Tribunal a quo se baseou para dar como provados os factos e conjugando-os com a prova pericial (exames médicos e exame ao veiculo) e com os registos fotográficos, é de concluir que a convicção sobre eles formada tem pleno suporte na prova produzida. No que ao depoimento da menor se refere, considera a arguida que não é credível que aquela pudesse ter identificado a condutora de uma viatura que lhe surgiu pelas costas e a colheu com o pára-choques da frente em posição diagonal ao portão. Se atentarmos nesse depoimento, o que resulta é que tanto a menor como o veículo circulavam no sentido Freixo - Ponte de Lima, isto é, no mesmo sentido de marcha, embora aquela circulasse pela berma esquerda e a carrinha pela hemifaixa direita (cfr. fls.49/50 do apenso de transcrição). A determinada altura, a menor “ouviu” o “acelerar do carro” e, por achar estranho, vira-se (fls.50 do mesmo apenso). No momento em que se vira vê a carrinha a avançar na sua direcção. É então, nesse curto espaço de tempo (dois, três segundos – fls.51), que consegue “olhar para…para o condutor” e vê “que era a dona Fátima” (cfr. fls.39, 43 e ainda 50). Também reconhece a carrinha (cfr. fls.47). É uma versão perfeitamente consonante com as regras da experiência, pois mesmo que nenhum barulho especial o veículo tivesse feito, é uma curiosidade normal numa aldeia em que a circulação não é muito intensa, as pessoas, em especial as crianças, olharem para os veículos em circulação. Para além disso, numa pequena terra onde todas as pessoas se conhecem (no caso, a mãe da menor e a arguida tinham mesmo sido amigas até há pouco tempo), num rápido olhar se identifica o veículo e a pessoa que conduz. De resto, basta ler quer o depoimento da Maria A... quer o da Maria L... para se constatar que a menor, ao chegar a casa, passado o primeiro momento de “torpor”, como lhe chama a recorrente, começou a contar o sucedido, identificando logo a pessoa que a terá atropelado (cfr. fls.68 e 102, respectivamente). Assim, à luz das regras da experiência, a versão da menor é perfeitamente credível. Defende ainda a arguida que “é muito mais do que improvável que uma viatura cujos braços de suspensão distam 16 centímetros do solo (fls.88) pudesse alguma vez passar por cima de uma criança de dez anos sem lhe causar o mais insignificante ferimento”. Também neste aspecto a versão da menor é plausível. Na verdade, o que ela refere é que, num primeiro momento, quando vê a carrinha a vir na sua direcção, foge e é por ela embatida nas costas. Cai, então, de barriga para baixo. Entretanto a carrinha, que ia em direcção a um pilar (fls.51), não chega a passar-lhe por cima e recua para naquele não embater. Nesse momento a menor vira-se de barriga para cima. Já nessa posição, a carrinha volta investir na sua direcção e é então que vai “para cima” dela, raspando-lhe. A Ana I... fica entre as duas rodas (fls.41). Ora, os “braços” da suspensão não abrangem o veículo em toda a sua largura. Há uma parte no centro, como é perfeitamente visível na fotografia de fls.88, cujo espaço até ao solo é superior aos referidos 16 cm. Basta a menor, como refere, ter-se mantido quieta e a meio da carrinha (fls.41) para esta passar por cima, quase lhe raspando (fls.41), mas sem lhe provocar ferimentos visíveis. Considera também a recorrente que não é possível que num dia chuvoso e tendo o pavimento as características visíveis nas fotografias a “roupa da Ofendida tivesse ficado impoluta, como a descrevem ela própria, a Assistente ANGELINA e a testemunha MARIA L...”. Antes de mais, nenhuma das testemunhas refere que a roupa que a menor vestia ficou impoluta. Esta não se lembra muito bem, embora “ache” que não ficou suja (fls.46). A mãe, diz que a roupa “tinha um bocadinho sujo, pouquinho” (fls.76) e molhado (fls.75). A prima Maria L... refere que a roupa estava suja, “em baixo, o costume de quando está a chover” (fls.100). Por outro lado, desconhece-se que tipo de roupa a menor trajava (há roupas, como as gangas, em que a sujidade penetra mais dificilmente). Porém, atentando no local onde esteve deitada – parte empedrada e parte cimentada – é bem provável que não se notasse muito, já que a chuva que caiu nesse dia, segundo referem as testemunhas, não era muito intensa (há até quem refira que não choveu). Quanto à intenção de matar, também cremos não assistir razão à recorrente. Com efeito, sair voluntariamente da faixa de rodagem (não existem quaisquer indícios de que tenha sido uma manobra involuntária) e invadir a berma para atropelar uma criança de 10 anos que aí caminhava, embatê-la nas costas, fazer marcha atrás para evitar o embate num pilar e repetir a manobra para lhe passar por cima e só não a atingindo com os rodados por esta ter conseguido colocar-se a meio do veículo é, sem dúvida, indicativo daquela intenção. Assim e para concluir, a leitura dos depoimentos a que o Tribunal deu credibilidade e a prova documental tida em consideração, conjugados com as regras da experiência comum, permitem aceitar perfeitamente a matéria de facto tal como foi fixada pela 1ª instância. O processo de convicção afigura-se-nos lógico e racional, não violando as regras da experiência comum na apreciação da prova. Apesar das limitações inerentes à impossibilidade de apreciação directa da prova atrás referidas, lidas as transcrições e ponderados todos os elementos disponíveis nos autos, cremos que o Tribunal a quo decidiu correctamente. Nenhum reparo nos merece o acórdão recorrido no que à fixação da matéria de facto concerne, não existindo qualquer razão válida para alterar a valoração da prova feita pelo Tribunal a quo nem se mostrando ter havido incorrecta aplicação do princípio da livre apreciação da prova ou do in dubio pro reo. Note-se que este princípio, como se escreve no acórdão do STJ de 12/07/05 www.dgsi.pt/jstj.nsf/ é uma imposição dirigida ao juiz no sentido de se pronunciar favoravelmente ao arguido quando não conseguir adquirir a certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa. Não significa dar relevância às dúvidas que as partes encontram na decisão ou na sua interpretação da factualidade descrita e revelada nos autos ou que tendo havido versões díspares e até contraditórias sobre factos relevantes, o arguido deva ser absolvido em obediência a tal princípio. A violação deste princípio pressupõe um estado de dúvida no espírito do julgador, só podendo ser afirmada, quando, do texto da decisão recorrida, decorrer, por forma evidente, que o tribunal, na dúvida, optou por decidir contra o arguido. De resto, como também se escreve no Acórdão da Relação do Porto, de 10/10/01 http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf?: dificilmente o julgador dos factos lidará com a prova cem por cento segura ou certa. Inevitavelmente terá que conviver com a ausência de certeza absoluta e com a dúvida. Mas nem por isso se pode demitir de, com recurso à experiência comum e á lógica das coisas, porfiar por uma certeza relativa sobre os factos (tenha-se em atenção que "certeza relativa" não equivale a "certeza dominada por incertezas"; significa antes "convicção honesta e responsável da realidade ou irrealidade do facto"). Se conseguir superar o umbral da dúvida razoável, de modo a sentir a necessária segurança sobre a realidade ou irrealidade de um facto, então tem que o assumir. As provas têm por função a demonstração da realidade dos factos (artº 341º do Código Civil), mas esta demonstração da realidade não visa a certeza absoluta (a irrefragável exclusão da possibilidade de o facto não ter ocorrido ou ter ocorrido de modo diferente). Os factos que interessam ao julgamento da causa são de ordinário ocorrências concretas do mundo exterior ou situações do foro psíquico que pertencem ao passado e não podem ser reconstituídas nos seus atributos essenciais. A demonstração da realidade de factos desta natureza, com a finalidade do seu tratamento jurídico, não pode visar um estado de certeza lógica, absoluta, sob pena de o Direito falhar clamorosamente na sua função social de instrumento de paz social e de realização de justiça. A prova visa apenas, de acordo com os critérios de razoabilidade essenciais á aplicação prática do Direito, criar no espírito do julgador (judici fit probatio) um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto [V. Antunes Varela, Manual de Processo Civil, pág 434]. Dificilmente o julgador poderá ter a certeza absoluta de que os factos aconteceram tal como eles são por si interiorizados, como são dados como provados. Mas isto não obsta a que o tribunal se convença da realidade dos mesmos, posto que consiga atingir o umbral da certeza relativa. A certeza relativa é afinal um estado psicológico (a tal convicção de que se costuma falar) que, conquanto necessariamente se tenha de basear em razões objectivas e possa ser fundamentável, não demanda que estas sejam inequivocamente conclusivas. Daqui decorre que não é decisivo para se concluir pela realidade da acusação movida a um qualquer arguido, que haja provas directas e cabais do seu envolvimento nos factos, maxime que alguém tenha vindo relatar em audiência que o viu a praticar os factos, ou que o arguido os assuma expressamente. Condição necessária, mas também suficiente é que os factos demonstrados pelas provas produzidas, na sua globalidade, inculquem a certeza relativa (a tal convicção honesta e responsável de que se falou atrás), dentro do que é lógico e normal, de que as coisas sucederam como a acusação as define. Ora, na fundamentação da decisão, que apreciamos cuidadosamente, não se descortina qualquer necessidade de deitar mão a este princípio nem da decisão resulta que o seu não uso seja censurável. 3ª Questão: Medida da pena: Entende a arguida que perante a inexistência de antecedentes criminais, a idade e a comprovada inserção social, aliadas à circunstância de a ofendida não ter sofrido quaisquer danos físicos, a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Conclui, pois que deve ser-lhe aplicada uma pena que não exceda os três anos, suspensa na sua execução. Quanto à medida concreta da pena regem os artºs40º nº2 e 71º do C.P.. Decorre destas disposições que o limite máximo da pena é definido pela culpa, enquanto que o seu limite mínimo é definido pelas exigências de prevenção geral (positiva), isto é, pela necessidade de punição sentida pela comunidade e que varia conforme o sentimento que o crime causa. Dentro deste limite máximo e mínimo irão funcionar as exigências de prevenção especial, dirigidas ao próprio agente, à sua ressocialização, entendendo-se esta como o dever de ajuda e solidariedade devido para com aquele, de forma a proporcionar-lhe condições que previnam a reincidência e lhe proporcionem um futuro sem delinquir Cfr. Figueiredo Dias – Direito Penal Português – As consequências jurídicas do crime, §58, pág.74.. Nos casos em que não haja carência de socialização, «tudo se resumirá, em termos de prevenção especial, em conferir à pena uma função de suficiente advertência, o que permitirá que a medida da pena desça até perto do limite mínimo da “moldura de prevenção” ou mesmo que com ele coincida» Cfr. autor citado – Temas Básicos da Doutrina Penal, pág.108.. Para sintetizar e continuando a citar Figueiredo Dias Temas Básicos, pág.110/111, dir-se-á que «1) Toda a pena serve finalidades exclusivas de prevenção, geral e especial. 2) A pena concreta é limitada, no seu máximo inultrapassável, pela medida da culpa. 3) Dentro deste limite máximo ela é determinada no interior de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico. 4) Dentro desta moldura de prevenção geral de integração a medida da pena é encontrada em função de exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização, excepcionalmente negativa ou de intimidação ou segurança individuais». Também se escreve no acórdão do STJ, de 08/11/95 (processo nº48318) o limite abaixo do qual a pena não pode descer é o que resulta da aplicação dos princípios de prevenção geral, segundo os quais a pena deve neutralizar o efeito negativo do crime na comunidade e fortalecer o seu sentimento de justiça e de confiança na validade das normas violadas, a de constituir um elemento dissuasor. A medida da pena tem de corresponder às expectativas da comunidade. Daí para cima, a medida exacta da pena é a que resulta das regras da prevenção especial. É a medida necessária à reintegração do indivíduo na sociedade, causando-lhe só o mal necessário. Dirige-se ao próprio condenado para o afastar da delinquência e integrá-lo nos princípios dominantes na comunidade. Há, porém, que não esquecer, como se disse, que o limite máximo da pena é definido pela culpa. O crime dos autos - homicídio qualificado, na forma tentada, previsto nos artºs131º, 132º nºs1 e 2 al.d) e g), 22º e 23º, todos do C.P. – é punido com a pena aplicável ao crime consumado, especialmente atenuada (artº23º nº2 e 73º, ambos do C.P.). Assim, correspondendo ao crime consumado pena de prisão variável entre 12 e 25 anos, ao crime tentado corresponde pena de prisão variável entre 2 anos 4 meses e 24 dias e 16 anos e 8 meses. No caso, para a fixação da medida concreta da pena há que ponderar as seguintes circunstâncias: - ter a arguida agido com dolo (directo) e intenso; - ser elevado grau de ilicitude, atentos os bens jurídicos violados e a forma de actuação (já não as consequências resultantes da actuação da arguida - a menor não sofreu ferimentos físicos graves embora tenha, necessariamente, ficado psiquicamente perturbada); - a situação económica e social da arguida; - não ter antecedentes criminais; - estar social e familiarmente inserida. O grau de culpa é elevado e elevadas são também as exigências de prevenção positiva, pois embora se trate de crime pouco frequente, a sua comissão causa, necessariamente, grande alarme social. As exigências de prevenção especial são também elevadas. Apesar de ser primária, a arguida demonstra uma personalidade desrespeitadora do mais elevado bem jurídico. Assim, perante a moldura penal abstracta, ponderadas todas as apontadas circunstâncias, apesar de a medida da pena dever, sempre que possível, “evitar a quebra de inserção social do agente e servir a sua reintegração na comunidade”, entende-se adequada e proporcional a pena fixada pelo Tribunal a quo. Mantendo-se a medida da pena improcede, por impossibilidade legal, a questão da sua suspensão. ***** DECISÃO: Pelo exposto e em conclusão, acordam os Juízes deste Tribunal em julgar totalmente improcedente o recurso, confirmando-se a decisão recorrida. Fixa-se em 10 UCs a taxa de justiça a suporta ***** Guimarães, |