Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
938/11.0TBPTL.G1
Relator: FRANCISCA MICAELA MOTA VIEIRA
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANO BIOLÓGICO
DANO NÃO PATRIMONIAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/12/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: O recurso da matéria de facto não visa a obtenção de um segundo julgamento sobre aquela matéria, sendo antes uma forma de obviar a eventuais erros, ou incorrecções, cometidos na decisão recorrida.
Não se visa um novo julgamento, mas sim a legalidade da decisão recorrida na forma como apreciou a prova e nos segmentos concretos indicados pelo recorrente.

Considerando que a convicção do tribunal de 1ª instância é produto da conjugação dialética de dados objectivos fornecidos por documentos com as declarações de parte e depoimentos de testemunhas prestados em julgamento, se a impugnante pretende impugnar a credibilidade das declarações ou dos depoimentos deve indicar elementos objectivos que imponham um diverso juízo sobre a credibilidade das declarações ou dos depoimentos.

Decisão Texto Integral:
Tribunal da Relação de Guimarães
2ª Secção
Largo João Franco – 4810-269 Guimarães
Telef: 253439900 Fax: 253439999 Mail: guimaraes.tr@tribunais.org.pt
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Processo nº 938/11.0TBPTL.G1

Acordam os Juízes da 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Guimarães:

I – RELATÓRIO

1.1.A propôs a presente acção contra a MSeguros e contra a Companhia de Seguros G pedindo a condenação das mesmas no pagamento de uma indemnização global de 83.650,66 €.

Alegou, resumidamente, que no dia 4 de Janeiro de 2007, pelas 20h00m, ao km 1,8 do IC 28, em Refoios, Ponte de Lima, ocorreu um acidente de viação. Nele foram intervenientes os veículos ligeiros de passageiros AJ, conduzido por E, no qual o A. seguia como ocupante e o BX, tripulado por Ant.

O veículo AJ circulava pelo IC 28, no sentido Ponte da Barca/Viana do Castelo, seguindo o seu condutor sem atenção e a velocidade excessiva. O condutor do AJ, quando passava pelo KM 1,8 do IC 28, em Refoios, ao descrever uma curva à direita, perdeu o domínio da marcha do veículo, transpôs a linha longitudinal descontínua que divide a faixa de rodagem, invadiu a hemi-faixa esquerda do IC 28, considerado o seu sentido, passando a rodar nessa parte da via. Acabou assim por embater com a parte lateral direita da frente do AJ na parte lateral esquerda da frente do BX.

O responsável pelo acidente foi E, condutor do AJ, que acabou por falecer. Aliás, presume-se a culpa do condutor do AJ, nos termos do art. 503° n° 3 do CC, uma vez que conduzia o veículo no interesse, sob a direcção efectiva e interessada do seu proprietário, a favor de quem exercia a actividade de pedreiro, sendo certo que se deslocava de uma obra em Espanha, onde trabalhava por conta de J, para a sua residência em Portugal.

Diz o A. que também se poderá entender que o condutor do BX circulava muito próximo do eixo da via, sendo também responsável pelo acidente.

A responsabilidade civil emergente da circulação do veículo AJ havia sido transferida para a M; por sua vez, a responsabilidade civil emergente da circulação do veículo BX estava transferida para a G.

Diz o A. A que, fruto do acidente, sofreu danos patrimoniais e não patrimoniais, reclamando uma indemnização global de 83.650,66 €.

Juntou documentos aos autos para prova do alegado.

1.2.Ant e M propuseram acção contra a Companhia de Seguros M (tendo a acção sido apensada à interposta por A).

Referem os Autores que, no dia, hora e local em que ocorreu o acidente em discussão nos autos, o condutor do AJ, ao descrever uma curva para a sua direita, atento o seu sentido de marcha, não segurou o veículo que conduzia, dentro dessa hemi-faixa. O condutor do AJ atravessou a linha divisória da estrada e penetrou na hemi-faixa de rodagem por onde circulava o BX. Aí ocorrendo o embate, entre a parte frontal do AJ e a parte lateral esquerda do BX. Após o embate, o AJ voltou à hemi - faixa de rodagem de onde havia saído, indo embater contra a protecção lateral metálica existente desse lado da via. Após o que tombou numa vala de escoamento de águas ali existente.

Os AA. reclamam uma indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais alegadamente sofridos.

1.3. O CRAM apresentou articulado pedindo a condenação da Ré M a pagar-lhe a quantia de 424 €.

Alegou que os AA. Ant e M foram assistidos no serviço de urgência do CRAM no dia 4 de Janeiro de 2007, vítimas do acidente de viação em causa nos presentes autos.

A M voltou a receber tratamentos de urgência nos dias 13 de Janeiro e 4 de Abril de 2007.

O montante correspondente aos tratamentos prestados ao A. Ant é de 106 € e o relativo à A. M é de 318 €.

O CRAM juntou dois documentos aos autos para prova do alegado.

2. AR. M apresentou contestação.

Refere a R. que, através do contrato de seguro titulado pela apólice n°… assumiu a responsabilidade emergente da circulação rodoviária do veículo automóvel ligeiro misto marca PEUGEOT, modelo 505 DIESEL, matrículaAJ.

Todavia, a Seguradora R. ignora as circunstâncias de tempo, lugar e modo que rodearam o acidente de viação que serve de fundamento aos presentes autos. Bem como quais tenham sido, porventura, as suas causas directas, imediatas e necessárias. Assim como os danos e prejuízos que, do mesmo, possam ter resultado.

Diz a R. que na data do sinistro que serve de causa de pedir aos presentes autos, o J era totalmente alheio à posse, direcção efectiva ou circulação do AJ. Desconhecendo de onde e para onde e com que objectivo o Eo conduzia.

Como complemento da retribuição, o J atribuiu ao E, entre outros, os seguintes benefícios: alojamento junto do local de trabalho e veículo automóvel para uso total (profissional e particular).

Nessa conformidade, o E era livre de utilizar o veículo AJ para todas as deslocações que entendesse efectuar, sem qualquer conexão com o seu horário, local ou tarefas laborais. Na sexta¬feira 05/11/2007 o Eencontrar-se-ia em gozo de férias. E o acidente que o vitimou sobreveio na véspera desse dia, 2 horas depois de findo o expediente laboral e a 200 km do local de trabalho. E não durante o intervalo de tempo e percurso do E do seu local de trabalho para o alojamento que o J lhe disponibilizara. Este era, pois, alheio e desconhecedor ao local onde o E se encontrava, a rota que seguia, ao meio de transporte de que se servia ou ao objectivo que perseguia.

O condutor do AJ foi surpreendido pelo veículo BX, que seguia igualmente pelo IC 28, mas no sentido VIANA DO CASTELO - PONTE DA BARCA, a uma velocidade aproximada de 120 Kmlhora.

O seu condutor ia totalmente desatento da condução e demais circulação rodoviária e em violação flagrante das regras estradais. Tendo invadido a faixa de rodagem pela qual circulava o veículo AJ em, pelo menos, um metro. O veículo BX colheu o condutor do veículo AJ de surpresa. Já que este não podia legitimamente prever que aquele iria interpor-se na trajectória por ele mantida. E, nessa conformidade, o BX foi embater com a sua frente na frente do AJ.

Refere a R. que a enunciação e quantificação dos danos sobrevindos ao A. A excede os efectivamente sofridos. Aliás, no âmbito do processo de inquérito que correu os seus termos pelos Serviços do Ministério Publico sob o n° 7/07.7TAPTL, o A. A declarou, no auto de interrogatório de arguido de fls. 33 ss, que os ferimentos e lesões causadas pelo sinistro se restringiram a um golpe profundo na cabeça e dores no peito.

Diz também a R. M que, nesse mesmo inquérito, o A. Ant declarou ter apenas ficado com dores no pescoço; quanto à sua mãe disse que ficará com um hematoma no olho direito e que estava dorida nas costas. A aqui A. I disse ter ficado com danos físicos no ombro direito, hematoma no olho, tendo perdido a placa dentária.

3. A Ré G apresentou contestação a fls. 75 ss. Alega a mesma que é inequívoco que a responsabilidade pela ocorrência do sinistro pertence ao condutor do AJ, ao malogrado E.

O condutor do AJ é que invadiu a faixa contrária por onde circulava o veículo BX.

A R. salienta que no croqui da participação do acidente de viação junta pelo A. são evidentes as marcas na via que indicam que o condutor do AJ invadiu a faixa contrária.

A R. contesta a indemnização reclamada pelo A. A, dizendo que os valores reclamados são excessivos e desprovidos de fundamento.

Teve lugar a realização da audiência preliminar (fls. 109 ss) e da audiência de julgamento, com observância do legal formalismo e foi proferida sentença cujo dispsotivo se transcreve :

“Pelo exposto, decide-se:

• Absolver integralmente a R. G dos pedidos contra si deduzidos;

• Julgar parcialmente procedente por provado o pedido formulado na presente acção pelo Autor A, condenando a R. M no pagamento àquele da quantia de 46.610,66 € (quarenta e seis mil, seiscentos e dez euros e sessenta e seis cêntimos), assim discriminada:

- a quantia de 12.000,00 € (doze mil euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, contados desde a prolação da presente decisão e até efectivo e integral pagamento;

- a quantia de 31.500,00 € (trinta e um mil e quinhentos euros), pelo défice funcional permanente, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, a contar da citação até efectivo e integral pagamento;

- a quantia de 2.851,62 € (dois mil oitocentos e cinquenta e um euros e sessenta e dois cêntimos), a título de privação de rendimentos, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, a contar da citação até efectivo e integral pagamento;

- a quantia de 213,91 € (duzentos e treze euros e noventa e um cêntimos), a título de despesas médicas, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, a contar da citação até efectivo e integral pagamento;

- a quantia de 45,13 € (quarenta e cinco euros e treze cêntimos), a título de despesas com viagens e refeições, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, a contar da citação até efectivo e integral pagamento;

• Julgar totalmente procedente por provado o pedido formulado na presente acção pelo Autor CRAM, condenando a R. M no pagamento àquele da quantia de 424 € (quatrocentos e vinte e quatro euros), acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, a contar da citação até efectivo e integral pagamento;

• Julgar parcialmente procedente por provado o pedido formulado na presente acção pelo Autor Ant, condenando a R. M no pagamento àquele da quantia de 12.750 € (doze mil setecentos e cinquenta euros), assim discriminada:

- a quantia de 9.000,00 € (nove mil euros), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, contados desde a prolação da presente decisão e até efectivo e integral pagamento;

- a quantia de 3.750 € (três mil setecentos e cinquenta euros), a título de danos patrimoniais (2.250 € pelo défice funcional permanente + 1.500 € a título de perdas salariais), acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, a contar da citação até efectivo e integral pagamento;

• Julgar parcialmente procedente por provado o pedido formulado na presente acção pela Autora M I, condenando a R. M no pagamento àquela da quantia de 15.000 € (quinze mil euros), assim discriminada:

- a quantia de doze mil euros (12.000 E), a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, contados desde a prolação da presente decisão e até efectivo e integral pagamento;

- a quantia de 3.000 € (três mil euros), pelo défice funcional permanente, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais, a contar da citação até efectivo e integral pagamento.

Custas em dívida a suportar pelos AA. A, Ant e M I e pela R. M na proporção do respectivo decaimento (sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia o Autor A).

Registe e notifique.”

Inconformada, a Ré M interpôs recurso de apelação formulando as seguintes Conclusões:

1.Os presentes autos fundam-se, quanto à Seguradora Recorrente, na responsabilidade civil emergente de acidente de viação, e por via da transferência de responsabilidade decorrente da celebração de contrato de seguro automóvel, válido e em vigor à data do evento dos autos.

2.Com tal fundamento, vieram os AA. pedir a condenação da ora Recorrente no pagamento das indemnizações que lhe seriam eventualmente devidas em virtude dos danos sofridos em acidente de viação ocorrido em 04/01/2007.

3.Procedeu-se à instrução probatória do processo, com observância dos formalismos legais.

4.Finda a qual, o Meritíssimo Tribunal “a quo” proferiu a douta decisão aqui posta em crise, julgando a acção parcialmente procedente, imputando a responsabilidade pela ocorrência do acidente rodoviário ao condutor do veículo seguro na Recorrente.

5.E atribuindo aos recorridos as consequentes indemnizações pelos danos por estes sofridos.

6.A Seguradora recorrente não pode, de forma alguma, conformar-se com a douta decisão vertida na sentença ora impugnada.

7.Salvo o devido respeito por diverso entendimento, o Meritíssimo Tribunal “a quo” operou uma incorrecta apreciação da prova produzida, acabando por proferir, consequentemente, um errado juízo a propósito da determinação da dinâmica e da imputação da responsabilidade, a título de culpa, pela eclosão do acidente.

8.E, bem assim, quanto à extensão de alguns dos danos peticionados e respectivo quantum indemnizatur fixado, designadamente quanto aos danos não patrimoniais fixados aos AA. ANT e M I e quanto aos dano patrimonial futuro atribuído ao A. A.

II – DO ERRO DE JULGAMENTO:

DA REAPRECIAÇÃO DA PROVA DOCUMENTAL E TESTEMUNHAL:

9.O Meritíssimo Tribunal “a quo” incorreu em verdadeiro erro de julgamento, consubstanciado numa desadequada análise da prova documental e testemunhal, no que concerne aos factos vertidos nos arts. 13), 14), 15), 17) e 18) dos factos provados pois a perante a prova produzida impunha-se decisão diversa da proferida.

10.Na verdade, a prova documental e testemunhal carreada aos autos a propósito da matéria factual ínsita nos aludidos artigos mostrou-se manifestamente escassa e insuficiente para que os mesmos pudessem ser julgados como provados com a certeza e segurança exigidas.

11.A prova produzida nos presentes autos impunha que os factos nos artigos 13), 14), 15), 17) e 18) do elenco da factualidade dada como provada, fossem julgados NÃO PROVADOS, impondo-se, neste particular aspecto, o reexame dos seguintes elementos probatórios:

a.Participação de acidente de viação de fls 13 e ss

b.Depoimento da testemunha J, depoimento prestado em audiência de julgamento de 19/11/2015, gravado em suporte digital ficheiro 20151119121350_035541_2871823

c.Depoimento do A. A, depoimento prestado em audiência de julgamento de 15/12/2015, gravado em suporte digital, Ficheiro 20151215103507_1035541_2871823

ACRESCE:

12.O art. 20º dos factos provados mereceu a redacção que se passa a recordar:

“Na altura do acidente, o condutor do AJ conduzia o veículo no interesse, sob a direcção efectiva e interessada do seu proprietário a favor de quem exercia a actividade de pedreiro”.

13.Salvo o devido respeito por diverso entendimento, considera a Seguradora recorrente que tal alínea dos factos provados integra conceitos jurídicos e juízos conclusivos que não são verdadeiros “factos”.

14.É o caso das expressões “no interesse, sob a direcção efectiva e interessada do seu proprietário” constantes do citado art. 20º dos factos provados.

15.E por esse motivo não podem constar do elenco da factualidade considerada provada, devendo ser suprimidas, sob pena de violação do disposto no art. 607º do Cód, Proc Civil.

DO DIREITO:

16.A ora propugnada alteração da decisão quanto à matéria de facto implica, necessariamente, a alteração da decisão de mérito a causa.

17.O que se deixa expressamente alegado, para todos os devidos efeitos legais.

DA RESPONSABILIDADE PELA OCORRÊNCIA DO ACIDENTE:

18.Perante a exígua factualidade considerada provada e relativa à concreta dinâmica do evento dano em apreço nos presentes autos, impõe-se concluir, pois, que não foi de todo possível, com o grau de certeza e segurança exigidos, demonstrar a forma como o acidente ocorreu.

19.E muito menos demonstrar que na sua eclosão houve culpa efectiva de qualquer dos condutores intervenientes.

20.O que nos leva a enveredar pela aplicação das regras da responsabilidade objectiva, vertidas no art. 506º do Cód. Civil e aplicável à colisão de veículos.

21.Ora, e aqui chegados, impõe-se ainda determinar se, perante os factos dados como provados, podemos considerar que estão verificados os pressupostos da culpa presumida vertidos no art. 503º do Cód. Civil.

22.Quanto a nós, e sempre com o máximo respeito por opinião diversa, entendemos que não.

23.Desde logo porque escalpelizado o elenco dos factos considerados provados – e aqui perspectivando a alteração supra propugnada - não resultaram provados factos dos quais se possa depreender, com rigor, quem eram os proprietários dos veículos ou sequer quais as concretas razões pelas quais os respectivos condutores os conduziam naquele dia, (e com excepção do vertido no art. 21º dos factos provados).

24.Note-se, neste conspecto, que nenhum facto consta do elenco dos factos provados e do elenco dos factos não provados, quanto à questão da propriedade do veículo de matricula BX.

25.E sendo assim, impõe-se recorrer ao critério de repartição do risco vertido no art.506º n.º 2 do Cód. Civil, decidindo no sentido de que, à falta de matéria factual bastante para determinar seja a culpa efectiva, seja a culpa presumida e bem assim a medida da contribuição de cada um dos veículos para a produção dos dano, ambos os veículos e condutores contribuíram em igual medida para a ocorrência do acidente.

26.O que se deixa expressamente alegado, para todos os devidos efeitos e legais consequências.

SEM PRESCINDIR:DOS DANOS

27.Ainda que assim não seja doutamente entendido, e independentemente da procedência ou não da propugnada modificação da decisão proferida sobre a matéria de facto e da decisão proferida quanto à determinação do responsável pelo acidente, sempre se dirá que andou mal a douta sentença proferida no que diz respeito à quantificação e extensão dos danos e, portanto, na quantificação e fixação dos montantes indemnizatórios fixados.

DA COMPENSAÇÃO FIXADA AOS AA. ANTÓNIO E MARIA INÊS TÍTULO DE DANOS NÃO PATRIMONAIS

28.Com efeito, entende a Seguradora recorrente que andou mal o Meritíssimo tribunal a quo na fixação do valor indemnizatório a este título aos AA. Ant e M I, (Euro 9.000,0 e Euro 12.000, respectivamente) na medida em que os mesmos se mostram excessivos face aos concretos danos por estes sofridos e tendo em linha de conta as orientações jurisprudenciais em casos análogos.

29.O montante pecuniário da compensação deve fixar-se equitativamente, tendo em atenção as circunstâncias a que se reporta o artigo 494º do Código Civil (Cód. Civil, artº 496º, n.º 3, 1ª parte). Na determinação da mencionada compensação atender-se ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e à do lesado e às demais circunstâncias do caso, nomeadamente à gravidade do dano, sob o critério da equidade envolvente da justa medida das coisas (artigo 494º do Código Civil).

30.A apreciação da gravidade do referido dano, embora tenha de assentar, como é natural, no circunstancialismo concreto envolvente, deve operar sob um critério objectivo, num quadro de exclusão, tanto quanto possível, da subjectividade inerente a alguma particular sensibilidade humana.".

31.Perante tal douto entendimento, impõe-se agora aquilatar a forma como a nossa jurisprudência tem fixado tais montantes indemnizatórios, recorrendo, nesse aspecto, a situações semelhantes:

32.Assim, permitimo-nos destacar o seguinte aresto:Acórdão do TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO, de 11/05/2011, Processo n.º 513/08.6PBMTS.P1: (…)

33.Perante os factos provados quanto à A. MI entendemos como justa e adequada a fiação de uma compensação por danos não patrimoniais nunca superior a Euro 5.000,00.

34.Do mesmo modo, perante idênticos critérios, e no que diz respeito ao A. ANT, entendemos como justa e adequada a fiação de uma compensação por danos não patrimoniais nunca superior a Euro 4.000,00.

35.O que se deixa expressamente alegado, para todos os devidos efeitos legais.

DA INDEMNIZAÇÃO PELO DANO PATRIMONIAL FUTURO FIXADA AO A. A:

36.Com base na factualidade provada, considerou o tribunal a quo , justa e adequada a fixação de uma indemnização pela perda da capacidade de ganho (dano patrimonial futuro na vertente de lucro cessante por via da incapacidade de que o A. A recorrido ficou afectado), de Euro 31.500,00, valor esse com o qual a Seguradora recorrente não se conforma, considerando-o manifestamente empolado face ao dano efectivamente verificado na esfera jurídica do lesado.

37.Entende a recorrente – e sempre com o merecido respeito por opinião diversa – que, em face da factualidade provada, dos critérios jurisprudenciais aplicáveis e ponderando vários factores, tais como, o grau de incapacidade, a idade da vítima, o tempo provável da sua vida activa, a natureza do trabalho, a variação dos rendimentos, a possibilidade de progressão na carreira, a desvalorização da moeda em função da inflação, aliando-os a uma correcção de acordo com a equidade, temos que, salvo o devido respeito por diversa opinião, o montante indemnizatório de Euro 20.000,00 afigura-se-nos adequadamente compensador dos danos futuros em apreço.

38.Ao conceder o montante indemnizatório final de Euro 31.500,00 para ressarcimento do dano patrimonial futuro da perda aquisitiva de ganho, o Meritíssimo Tribunal recorrido incorreu em franca violação dos princípios norteadores do cálculo de indemnizações plasmados nos arts. 562º e 564º do Cód. Civil.

39.Por esse motivo a douta sentença recorrida deverá ser, nessa parte, revogada nos termos aqui propugnados.

O autor A interpôs também recurso de apelação e formulou as seguintes Conclusões:

1ª – O montante fixado na douta sentença (€ 31.500,00) como indemnização devida ao A. pelo dano patrimonial decorrente da Incapacidade Permanente Geral de este ficou a padecer (10 pontos), é escasso e não valoriza conveniente mencionado dano;

2ª – A indemnização destinada a compensar o dano resultante da IPG deve, tal como tem sido entendimento dominante na jurisprudência dos nosso Tribunais, representar um capital que proporcione o rendimento, em abstrato, perdido e se extinga no fim do tempo provável de vida do lesado;

3ª – Ultimamente, tem-se entendido – e bem – que o lesado precisa de manter o nível de rendimento enquanto viver, mesmo para além da idade da reforma;

4ª – É, com efeito, depois do final da vida ativa que o lesado mais necessidades tem e mais precisa de manter um nível de rendimentos que lhe permita satisfazer essas suas necessidades suplementares;

5ª – Será adequado, na esteira do que tem sido decidido pelo nossos Tribunais Superiores, que, em casos como o presente, se recorra, como auxiliar de cálculo da indemnização pelo dano material emergente da IPG, à fórmula de cálculo utilizada no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 04/04/1995 – CJ – Ano XX – Tomo II;

6ª – Esta fórmula, na verdade, tem em conta vários fatores relevantes, tais como a progressão na carreira, a erosão monetária, e o crescimento dos rendimentos salariais;

7ª – Os valores assim encontrados deverão, depois, ser temperados à luz das circunstâncias concretas de cada caso e da equidade;

8ª – Através da mencionada fórmula, considerando que o recorrente auferiria o salário de € 1.140,65, que tinha 29 anos à data do acidente, a incapacidade permanente parcial de 10 pontos, e o período de vida até aos 85 anos e a progressiva baixa da taxa de juro (neste momento e face à realidade atual, inferior a 2%) encontramos um capital ligeiramente superior a € 68.000,00;

9ª – Temperando este montante à luz das regras da equidade, afigura-se-nos que será justo e equilibrado atribuir ao recorrente, como compensação pela IPG de 10 pontos que o afeta e inerente dano patrimonial, a indemnização de € 60.000,00;

10ª – Em relação ao valor fixado para ressarcimento dos danos não patrimoniais, a douta sentença recorrida, fixou a indemnização de € 12.000,00, a qual entendemos ser manifestamente exígua, atendendo à gravidade dos danos que o recorrente padeceu e às suas sequelas permanentes;

11ª – Deve, neste particular, atender-se às consequências físicas e morais que para o recorrente resultaram do acidente, sendo aqui manifestamente relevante que tinha apenas 29 anos à data do evento;

12ª – Recorrendo, pois e uma vez mais, à equidade e tendo em consideração as concretas circunstâncias do caso em apreço, temos que a justa e equilibrada indemnização, adequada a compensar os danos não patrimoniais sofridos, deverá corresponder ao montante de € 20.000,00;

13ª – A douta sentença recorrida violou, entre outras normas, os artºs 483.º, 496.º, n.º 1, 562.º, 564.º e 566.º, todos do Código Civil.

O Autor A e a Ré G apresentaram contra-alegações relativamente ao recurso interposto pela Ré M, pugnando pela confirmação da sentença recorrida.

A recorrida pela Ré M apresentou contra – alegações.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II -DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO.

As conclusões acima transcritas definem e delimitam o objecto dos presentes recursos – cfr. artigos 608º., nº. 2, exvi do artº. 663º., nº. 2; 635º., nº. 4; 639º., nºs. 1 a 3; 641º., nº. 2, b), todos do Código de Processo Civil (C.P.C.).

Porque assim, atendendo às conclusões das alegações apresentadas pelos apelantes, e atendendo às contra-alegações dos recorridos, urge apreciar as seguintes questões

1- Apurar da alegada verificação de erro de julgamento na decisão de facto no que concerne aos pontos 13, 14, 15, 16, 17, 18 e 20 dos Factos Provados.
2- Apreciar e decidir sobre o correcto enquadramento da factualidade apurada em resultado do recurso sobre a matéria de facto e apreciar e decidir sobre os valores a atribuir a título de indemnização ao autor A, pelo dano patrimonial decorrente da Incapacidade Permanente Geral de este ficou a padecer (10 pontos) e pelos danos não patrimoniais sofridos.

III – FUNDAMENTAÇÃO

3.1- A 1ª instância considerou provada e não provada a seguinte factualidade:

1.Factos Provados:

1) No dia 4 de Janeiro de 2007, pelas 20h00, ao Km 1,8 do IC28, em Refoios, Ponte de Lima, ocorreu um acidente de viação, em que foram intervenientes os veículos ligeiros de passageiros AJ, conduzido por E, no qual o A. A seguia como ocupante e o BX, tripulado por Ant.

2) A responsabilidade civil emergente da circulação do veículo AJ havia sido transferida para a M Seguros, ora R., através do contrato de seguro titulado pela apólice nº….

3) A responsabilidade civil emergente da circulação do veículo BX estava transferida para a G Companhia de Seguros, através da apólice nº….

4)À data do acidente, o Autor A tinha 29 anos de idade.

5)À data do acidente, o A. Ant tinha 44 anos.

6)À data do acidente, a A. I tinha 66 anos.

7)No referido local do acidente, a circulação de veículos no IC28 processa-se em ambos os sentidos de marcha, estes divididos por uma linha longitudinal descontínua.

8) O IC28, nesse local e considerado o sentido Ponte da Barca Viana do Castelo, desenvolve-se em curva para a direita.

9) O veículo AJ circulava pelo IC28, no sentido Ponte da Barca - Viana

do Castelo a uma velocidade não concretamente apurada.

10)Era noite.

11)Estava a chover.

12)E havia nevoeiro.

13)O condutor do AJ, quando passava pelo Km 1,8, do IC28, em Refoios e ao descrever a referida curva para a sua direita (atento o sentido Ponte da Barca Viana do Castelo), perdeu o domínio de marcha desse veículo.

14) Transpôs a linha longitudinal descontínua que divide a faixa de rodagem e invadiu a hemi-faixa esquerda do IC28, considerado o seu sentido.

15)Passando a rodar nessa parte da via.

16)Acabando por embater com a parte lateral direita da frente do AJ na parte lateral esquerda da frente do BX.

17) Que, nesse momento, seguia pela metade direita do IC28 considerado o sentido Viana do CastelolPonte da Barca, sentido em que circulava o BX.

18) Este embate ocorreu na metade direita do IC28, considerado o sentido de marcha do BX (Viana do CastelolPonte de Barca).

19) O local onde ocorreu este acidente tinha a configuração de uma curva que não impedia o condutor do AJ de avistar a aproximação do BX a circular em sentido contrário ao seu.

20) Na altura do acidente, o condutor do AJ conduzia o veículo no interesse, sob a direcção efectiva e interessada do seu proprietário a favor de quem exercia a actividade de pedreiro.

21) Deslocava-se de uma obra em Espanha, onde trabalhava por conta do J, para a sua residência em Portugal.

22) No local do acidente, o piso é em alcatrão, de características e configuração regulares e em bom estado de conservação.

23)O piso apresentava vestígios de humidade.

24)Após o acidente, o A., A, foi de imediato transportado para o Hospital de Viana do Castelo, onde foi submetido a vários exames e permaneceu uma noite.

25) Nesse hospital, foi-lhe diagnosticada ferida do couro cabeludo, lesão no cotovelo direito e contusão do joelho direito.

26) O A. A foi observado na Casa de Saúde da Boavista onde corrigiu ferida de couro cabeludo.

27) O A. Arepetiu imagiologia do cotovelo e aplicaram imobilização gessado que usou durante cinco semanas, após o que cumpnu tratamento de MFR durante três semanas em Castelo de Paiva.

28)O A. A teve alta três meses após o evento.

29)Em despesas médicas, o A. A despendeu a importância de € 213,9l.

30) Em viagens e refeições, por causa dos tratamentos, o A. A despendeu a quantia de €45,13.

31) O A. A, à data do acidente, era técnico de construção civil, auferindo mensalmente o rendimento ilíquido de € 1.140,65.

32) Após a alta clínica, o A. A apresenta as seguintes sequelas resultantes do acidente:

- alterações do foro psíquico caracterizadas por ansiedade, insónia, cefaleias, síndrome depressivo com ligeira repercussão na autonomia pessoal, social e profissional;

- cicatriz numa área irregular com dois centímetros de comprimento máximo na região parietal direita, coberta pelo cabelo.

33) O A. A em virtude das lesões sofridas no cotovelo direito foi obrigado a andar com gesso nesse braço, o que lhe causou transtornos e incómodos.

34) O facto de o A. A ter sido obrigado a frequentar consultas também lhe provocou incómodos e transtornos.

35) Em virtude do acidente, o A. A passou a sentir dores no braço direito, dificultando-lhe o exercício da sua profissão.

36) Devido ao acidente o A. A ficou com limitação da extensão no membro superior direito.

37) Devido ao acidente, o A. A passou a sentir medo de viajar de automóvel.

38) O A. A tomou-se uma pessoa triste, de difícil contacto, desconcentrada, ansiosa, sendo certo que, antes do acidente, era uma pessoa saudável, alegre, calma e comunicativa.

39) O A. A teve um período de repercussão temporária na actividade profissional total de 91 dias.

40)O quantum doloris do A. A foi fixado no grau 3/7.

41)O défice funcional permanente da integridade físico-psíquica foi fixado em 10 pontos.

42) As sequelas do A. A são compatíveis com a profissão habitual, com esforços acrescidos.

43)O dano estético permanente do A. A foi fixado no grau 1/7.

44)Dentro do período de repercussão temporária na actividade profissional total, o A. A recebeu subsídio de doença nos montantes referidos nas informações de fls. 262 e 269 que aqui se dão por inteiramente reproduzidas.

45)O A. foi assistido pelos serviços clínicos da R. M.

46) Os AA. Ante MI foram assistidos no serviço de urgência do CRAM no dia 4 de Janeiro de 2007, vítimas do acidente de viação em causa nos presentes autos.

47) A MI voltou a receber tratamentos de urgência nos dias 13 de Janeiro e 4 de Abril de 2007.

48) O montante correspondente aos tratamentos prestados ao A. Anté de 106 € e o relativo à A. MI é de 318 €.

49) Em virtude do acidente sofrido, o A. Ant ficou com traumatismos torácicos provocados pelo cinto que tinha colocado.

50) O A. Ant foi assistido no CRAM e realizou RX torácico, mas como não tinha fracturas, teve alta no mesmo dia.

51) Apresentava hematoma supraciliar esquerdo, hematoma do braço, ombro direito e região cervical esquerda, hematoma frontal e do olho esquerdo.

52) Manteve vigilância durante 90 dias e realizou ecografia da face superior do ombro por apresentar dor e dismorfia local, que revelou rotura muscular.

53) Como sequela relacionada com o acidente sofrido, o A. Ant ficou com omalgia e dismorfia da face superior do ombro, compatível com rotura muscular, associada a ligeira limitação da flexão/adução do ombro.

54) O período de incapacidade profissional total do A. Ant é fixável em 91 dias.

55)O quantum doloris do A. Ant é fixável no grau 3.

56)A incapacidade permanente geral do A. Ant é fixável em dois pontos.

57) Estas sequelas, em termos de rebate profissional, são compatíveis com o exercício da actividade habitual, mas implicam esforços suplementares.

58) O dano estético do A. Ant foi fixado no grau 0.

59) A A. MI, na sequência do sinistro, foi assistida no CRAM onde apresentava traumatismo da face com hematoma peri orbitário esquerdo, contusão torácica e ombro direito com estiramento.

60) Após 24 h de vigilância teve alta mas, em 13/0112007, foi de novo observada por apresentar cefaleia intensa com zumbido e dor no membro superior direito associada a diminuição da força muscular.

61)A A. MI não fez fisioterapia.

62)Como sequela relacionável com o acidente, a A. MI apresenta monoparésia do membro superior esquerdo.

63) O período de repercussão temporária na actividade profissional total é fixável relativamente à A. MI em 182 dias.

64)O quantum doloris da A. MI é fixável no grau 3.

65)A incapacidade permanente geral da A. I é fixável em cinco pontos.

66) Estas sequelas, em termos de rebate profissional, são compatíveis com o exercício da actividade habitual, mas implicam esforços suplementares.

67) O dano estético da A. I foi fixado no grau 2/7, pela deformidade adquirida na sequência da monoparésia.

68)A A. I estava reformada e desempenhava as tarefas domésticas.

69)O A. Ant é pintor de automóveis nos EUA.

2.Factos não provados:

Não resultaram provados quaisquer outros factos, nomeadamente que:

a) O veículo AJ circulava pelo IC28, no sentido Ponte da Barca - Viana do Castelo a uma velocidade superior a 100 kms/h.

b) No dia e hora em que ocorreu o acidente a posse e direcção efectiva do AJ pertenciam a E.

c) Que detinha o seu domínio público, pacífico, titulado e de boa fé, exercendo, continuadamente, sem violência ou oposição de quem quer que seja, por forma reiterada e contínua, à luz do dia e com publicidade notória, todos os actos próprios de um proprietário.

d) Nomeadamente, conduzindo-o nas suas deslocações, abastecendo-o com o necessário combustível e demais consumíveis e provendo à respectiva higiene, manutenção e reparações.

e) Na data do sinistro que serve de causa de pedir aos presentes autos, o J era totalmente alheio à posse, direcção efectiva ou circulação do AJ.

f) Desconhecendo de onde e para onde e com que objectivo o E o conduzia.

g) O E encontrava-se vinculado ao J, através de contrato individual de trabalho, no âmbito do qual lhe cabia proceder ao desempenho das suas funções laborais na localidade de Manchica, província de Orense, em Espanha, no horário assim distribuído:

- entre as 07,00 e as 18,00 horas, de segunda a quinta feira;

- entre as 07,00 e as 13,00 horas à sexta feira;

- descanso complementar e semanal ao Sábado e Domingo.

h) Como complemento da retribuição, o J atribuiu ao E, entre outros, os seguintes benefícios:

- alojamento junto do local de trabalho;

- veículo automóvel para uso total (profissional e particular).

i) O E era livre de utilizar o veículo AJ para todas as deslocações que entendesse efectuar, sem qualquer conexão com o seu horário, local ou tarefas laborais.

j) Na sexta-feira 05/0112007, o E encontrar-se-ia em gozo de férias.

k) O acidente que o vitimou não ocorreu durante o intervalo de tempo e percurso do E do seu local de trabalho para o alojamento que o J lhe disponibilizara.

I) Este era alheio e desconhecedor ao local onde o E se encontrava, a rota que seguia, ao meio de transporte de que se servia, ou ao objectivo que perseguia.

m) A velocidade máxima no local era de 100 kms/h.

n) Nestas circunstâncias de lugar e tempo, o veículo AJ que circulava ao longo do IC 28 no sentido PONTE DA BARCA - VIANA DO CASTELO, ocupava a faixa de rodagem direita, atento o sentido da marcha, a cerca de 50 cm da berma.

o)O seu condutor imprimia-lhe uma velocidade não superior a 80 km/h.

p)O seu condutor era experiente e conhecia o traçado rodoviário, já que desde 2005 conduzia ao longo daquele trajecto cerca de duas vezes por semana, uma em cada sentido, habitualmente durante a noite.

q) Quando foi surpreendido pelo veículo BX, que seguia igualmente pelo IC 28, mas no sentido VIANA DO CASTELO - PONTE DA BARCA.

r)A uma velocidade aproximada de 120 Km/hora.

s)Tendo invadido a faixa de rodagem pela qual circulava o veículo AJ em, pelo menos, um metro.

t) O veículo BX colheu o condutor do veículo AJ de surpresa.

u) E, nessa conformidade, BX, foi embater com a sua frente na frente do AJ.

v) A força do embate foi tal, que projectou ambos os veículos para bermas opostas, fora do traçado rodoviário.

w) O A. A frequentou consultas de cirurgia plástica até à data da alta, que se verificou em 02/02/2007.

x) Em virtude do acidente, o A. A inutilizou umas calças (60,00€), uma camisa (€ 40,00), uma camisola (€ 50,00€), um blusão (€ 120,00), um par de sapatos (€ 70,00) e um telemóvel (€ 200,00), tudo no total de € 540,00.

y) Após a alta clínica o A. A viu -se afectado de uma incapacidade parcial permanente de 12%, em virtude das sequelas resultantes do acidente.

z) Após a alta clínica, o A. A viu a sua capacidade geral de trabalho diminuída em 12%, o que lhe acarreta, para o futuro, um prejuízo correspondente a essa mesma incapacidade.

aa) Devido aos ferimentos sofridos na perna direita, o A. A sente muitas dores nessa perna, que o impedem de fazer longas caminhadas e lhe dificultam o exercício da sua actividade profissional.

bb) Devido ao traumatismo craniano, o A. A sente frequentes dores de cabeça, apresenta falhas de memória, o que se reflecte na sua vida pessoal e profissional, designadamente numa diminuição dos seus níveis de eficiência.

cc) Todas as lesões fazem com que o A. A se sinta diminuído perante as pessoas em geral.

dd) Os serviços clínicos da R.M atestaram a incapacidade temporária absoluta do A. para o trabalho desde o dia 4/10/2007 ao dia 22/02/2007, não lhe tendo sido atribuída qualquer desvalorização.

ee) A A. MI partiu a placa dentária no valor de 500 €.

ff) Como sequela do acidente, a A. I apresenta diminuição da sua capacidade visual, lacrimejar permanente e visão turva.

gg) Depois de ter tido alta do CHAM, a A. I esteve de cama uma semana.

hh) A A. contratou uma mulher a dias, durante 3 meses e pagou-lhe 600 €.

ii) Fruto do acidente sofrido, a A. Inês deixou de auferir 600 €, fruto do trabalho que desenvolvia na terra.

jj) No acidente, a A. I perdeu os sapatos, rasgou a saia e o casaco que trajava, os quais,valiam 150 €.

kk) Em medicamentos, deslocações e almoços, a A. I despendeu 180 €.

II) Depois de ter tido alta do CHAM, o A. Ant esteve de cama durante duas semanas.

mm) O A. Ant faz exames mensais de vigilância nos EUA ao talo que lhe apareceu no peito, junto ao pescoço, após o acidente.

nn) O A. recebe nos EUA cerca de 2100 € /mês.

00) No acidente o A. Ant ficou com o fato rasgado, perdeu o sapato direito, sendo que tal vestuário valia cerca de 130 €.

pp) Em medicamentos, deslocações e almoços, o A. Ant gastou 90 €.

3.2 Verificados que estão os requisitos legalmente previstos no artigo 640º do CPC admitimos o recurso interposto sobre a matéria de facto.

Alega a Recorrente M que existe erro de julgamento no que concerne aos pontos 13, 14, 15, 16, 17, 18 dos Factos Provados.

Para tanto, pede que este Tribunal da Relação proceda ao reexame da participação do acidente de viação de fls 13 e ss, à reapreciação do depoimento da testemunha J,agente da GNR que elaborou a participação e o depoimento do autor A.

Mais alega que o ponto 20 dos factos provados ( cuja redacção é a seguinte: “Na altura do acidente, o condutor do AJ conduzia o veículo no interesse, sob a direcção efectiva e interessada do seu proprietário a favor de quem exercia a actividade de pedreiro”) integra conceitos jurídicos e juízos conclusivos que não são verdadeiros “factos”, designadamente as expressões “no interesse, sob a direcção efectiva e interessada do seu proprietário” constantes do citado art. 20º dos factos provados, e, por, isso pede a supressão dessas expressões.

Apreciando e decidindo:

Este Tribunal procedeu à análise conjunta da participação de fls 13 e sse à audição dos depoimentos daquela testemunha J, que confirmou o teor do croquis constante dos autos, com o depoimento da testemunha JM, oficial de justiça, que apesar de não ter visto o acidente, foi a segunda pessoa que chegou ao local do acidente, referindo que viu no local do embate existia maior concentração de vestígios junto da divisória das faixas de rodagem, mais concretamente na meia faixa de rodagem do sentido Ponte – Lima para Ponte da Barca. Ouvimos também o depoimento de parte de A.

E dessa análise, sobretudo do depoimento do agente da GNR que elaborou a participação dos autos, resultou para nós que a percepção que esta testemunha formou sobre a forma como terá ocorrido o embate, retirada da análise dos vestígios do acidente ( tais como as marcas no betuminoso, os vidros e os fragmentos plásticos encontrados) e dos sulcos e respectiva direcção, deixados no pavimento pelos ferros do veículo onde seguia o Autor, é de acolher, isto é, convencemo-nos que foi o veículo AJ, onde seguia o Autor A que invadiu a faixa de rodagem contrária causando o acidente dos autos.

Atente-se também que a fls 32 a 35 dos autos, está junta cópia do despacho de arquivamento do inquérito aberto por óbito de E, condutor do AJ, tendo-se aí apurado no ponto 5 que foi o veículo AJ que invadiu a hemi-faixa de rodagem, por onde circulava o veículo BX e que o evento que deu origem à morte de E se deveu à sua própria conduta.

Aliás, ouvido que foi também o Autor A, resulta que este apesar de ter tentado dar respostas evasivas, não escondeu que antes da ocorrência do embate o condutor do AJ terá feito uma condução que fez com que o autor tivesse feito reparo ao condutor para este mudar o comportamento. Mais. Analisados ossulcos deixadas no pavimento pelos ferros do veículo onde seguia o Autor , nomeadamente a direcção dos mesmos, também resulta para nós, sem margem para dúvidas, que o acidente se deveu à conduta do condutor do veículo ligeiro de passageiros, o qual, invadiu a meia faixa de rodagem destinada aos veículos que circulavam em sentido contrário.

Assim, no tocante aos factos vertidos nos pontos 13 a 18 dos factos provados a convicção formada por este Tribunal da Relação sobre esses factos não diverge daquela que foi formada pelo tribunal recorrido, não merecendo provimento o recurso sobre a decisão de facto nesta parte.

No tocante ao ponto 20 dos factos provados, mais concretamente relativamente às expressões “no interesse, sob a direcção efectiva e interessada do seu proprietário”, alega a recorrente que se trata de conceitos jurídicos e pede a supressão dessas expressões, ao abrigo do art. 607º do CPC.

Apreciando e decidindo :

No caso específico dos acidentes causados por veículos, estabelece o art. 503, nº1, do Cód. Civil:

“Aquele que tiver a direcção efectiva de qualquer veículo de circulação terrestre e o utilizar no seu próprio interesse, ainda que por intermédio de comissário, responde pelos danos provenientes dos riscos próprios do veículo, mesmo que este não se encontre em circulação”.

Ou seja, na ausência de culpa, responde com base no risco quem tiver a direcção efectiva do veículo e o utilizar no seu próprio interesse.

Tem correntemente a direcção efectiva do veículo o proprietário, o usufrutuário, o adquirente com reserva de propriedade, o comodatário, o locatário, o que o furtou, o condutor abusivo e, de um modo geral, qualquer possuidor em nome próprio.

Como ensinam Pires de Lima e Antunes Varela (Código Civil Anotado, Vol. I, 4ª ed, pág. 513) “ ter a direcção efectiva do veículo destina-se a abranger todos aqueles casos em que, com ou sem domínio jurídico, parece justo impor a responsabilidade objectiva, por se tratar de pessoas a quem especialmente incumbe, pela situação de facto em que se encontram investidas, tomar as providências para que o veículo funcione sem causar dano a terceiro.

A direcção efectiva do veículo é o poder real (de facto) sobre o veículo e constitui o elemento comum a todas as situações referidas, sendo a falta dele que explica, em alguns casos, a exclusão da responsabilidade do proprietário.

Tem a direcção efectiva do veículoaquele que, de facto, goza ou frui as vantagens dele, e quem, por essa razão, especialmente cabe controlar o seu funcionamento”.

O segundo requisito (utilização no próprio interesse) visa afastar a responsabilidade objectiva daqueles que, como o comissário utilizam o veículo, não no seu próprio interesse, mas em proveito ou às ordens de outro.

A simples alegação da propriedade do veículo sem a invocação expressa de quem tem a sua direcção efectiva e interessada é suficiente para admitir a existência de uma verdadeira presunção legal de direcção efectiva e interessada do veículo a favor do seu proprietário, pois o conceito de direcção efectiva e interessada cabe perfeita e legalmente dentro do conceito do direito de propriedade (Ac. S.T.J. de 27-10-88, Bol. 469; Ac. S.T.J. de 20-2-2001,Col. Ac. S.T.J., I, 2º, 125; Ac. S.T.J. de 6-11-2001, Col. Ac. S.T.J., IX, 141).

Acresce que o ónus da prova e de alegação de que a dona do veículo não tinha a direcção efectiva do mesmo e de que a utilização dele não era feita no seu próprio interesse, cabe aos réus, como factos impeditivos que são ( Ac. S.T.J. de 6-11-2001, Col. Ac. S.T.J., IX, 141).

O interesse na utilização do veículo pode ser material ou económico, como um simples interesse moral ou espiritual (Ac. S.T.J. de 2-2-1993, Col. Ac. S.T.J., I, 2º, 125).

Ora, não se ignora que para se concluir pela existência de uma situação de comissão, nos termos do artigo 500º, nº1, do C.Civil, Conforme refere Pires de Lima e Antunes Varela, na anotação ao artigo 500º do CC, 4ª edição, pág. 507, “o termo comissão tem aqui o sentido amplo de serviço ou actividade por conta e sob direcção de outrem, podendo essa actividade traduzir-se tanto num acto isolado como numa função duradoura, ter carácter gratuito ou oneroso, manual ou intelectual, etc”

torna-se necessário que se alegue e que se apure factualidade que a caracterize como tal, pois que, sendo de presumir a coincidência entre a qualidade de proprietário e a direcção efectiva de um veículo, não é legítimo e nem se pode concluir que o terceiro que conduz um veículo automóvel o faz, necessariamente, como comissário do seu dono, cabendo ao lesado a demonstração dessa relação de comissão.

A comissão pressupõe uma relação de dependência (droit de direction, de surveillanceet de contrôle, na expressão da jurisprudência francesa) ou instruções a este, pois só essa possibilidade de direcção é capaz de justificar a responsabilidade do primeiro pelos actos do segundo”

No caso dos autos, aquelas expressões estão suportadas em factos que foram vertidos nos pontos 20 e 21 , na parte onde aí se refere que “o condutor trabalhava como pedreiro para J, proprietário do veículo AJ e que deslocava-se de uma obra em Espanha, onde trabalhava por conta de J”.

Assim, tais expressões foram usadas para definir a condução que estava a ser feita pelo E, condutor do AJ, isto é, para definir se este actuava ou não como mero comissário.

Feitas estas considerações, erevertendo ao caso dos autos, concretamente ao ponto 20 dos Factos Provados, e com o propósito de sanar a referida “ falta técnica” traduzida no uso daquela expressão ““no interesse, sob a direcção efectiva e interessada do seu proprietário”, atento o seu significado jurídico, determinamos a supressão no ponto 20 dos factos provados, o qual, passa a ter a seguinte redacção “

20- Na altura do acidente, o condutor do AJ conduzia o veículo no interesse do seu proprietário a favor de quem exercia a actividade de pedreiro.

Assim, nesta parte, merece provimento o recurso sobre a matéria de facto.

3.3- Em face do provimento parcial do recurso sobre a questão de facto, mantemos a decisão da primeira instância relativamente à factualidade provada e não provada, com excepção da redacção do ponto 20 dos Factos Provados, o qual, passa a ter a seguinte redacção:

20- Na altura do acidente, o condutor do AJ conduzia o veículo no interesse do seu proprietário a favor de quem exercia a actividade de pedreiro.

3.4 FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA.

3.4.1-Como resulta do exposto, este Tribunal da Relação manteve inalterada a decisão sobre a questão de facto, com excepção da redacção do ponto 20 dos Factos Provados.

Todavia, essa alteração da redacção do ponto 20 dos Factos Provados, não opera qualquer alteração no que concerne ao enquadramento jurídico que foi feito na sentença recorrida quanto à dinâmica do acidente.

a) Da Dinâmica do acidente.
Assim, atenta a factualidade provada, dúvidas não restam de que o acidente se ficou efectivamente a dever à conduta do condutor do veículo ligeiro de passageiros de matrícula AJ, o qual, com culpa efectiva , invadiu a faixa contrária, violando o disposto no nº1 do artigo 13º do Código da Estrada.

Assinale-se também que, no seguimento do Ac do STJ de 03.06.03 - Sumários Junho de 2003 8 – entendemos que : “ "Quando um condutor age objectivamente por forma a que o seu comportamento seja enquadrável no espectro das condutas passíveis de causar acidentes do tipo daqueles que a lei quer evitar ao tipificá-las como infracções, deve imputar a responsabilidade a esse condutor, por presunção, quer natural, quer juristantum, da culpa (negligência) em concreto do autor da contra-ordenação.

De resto, além dessa culpa efectiva na produção do acidente, urge atentar que o artigo 503º, n.º 3 (1ª parte) do Código Civil estabelece que “aquele que conduzir o veículo por conta de outrem responde pelos danos que causar, salvo se provar que não houve culpa da sua parte”.

A previsão citada faz recair sobre o condutor por conta de outrem, no caso, o falecido E, uma presunção de culpa pelos danos causados no exercício da condução de veículos. E como se definiu no Assento do STJ de 14/04/83 (hoje com valor de acórdão uniformizador de jurisprudência) aquele normativo estabelece uma presunção de culpa do condutor do veículo, por conta de outrem pelos danos que causar, aplicável nas relações entre ele, como lesante, e o titular ou titulares do direito à indemnização.

E, como também tem sido entendido com certa uniformidade na jurisprudência, só a existência de uma relação de comissão faz presumir a culpa do condutor, sendo certo que essa relação de comissão tem de ser encontrada fora de aplicação do artigo 503º n.º 1, pois as expressões aí referidas – “direcção efectiva” e “interesse próprio” - são apenas elementos balizadores dessa norma, ou seja, somente dizem respeito à responsabilidade pelo risco e apenas servem para determinar esta e não a responsabilidade por culpa, mesmo que presumida.

Convém, a propósito citar o Assento do STJ de 20-10-94, in BMJ 456/19.- que tem força obrigatória geral, no que respeita à uniformização de jurisprudência (face ao estabelecido no art. 732º- A do CPC) - que veio estabelecer que "o dono do veículo só é responsável, solidariamente, pelos danos causados pelo respectivo condutor quando se aleguem e provem factos que tipifiquem uma relação de comissão, nos termos do artigo 500º n.º 1, do Código Civil, entre o dono do veículo e o condutor do mesmo".

Ora, no caso está verificada essa relação de comissão, porquanto o condutor do veículo AJ foi encarregado de uma comissão, traduzindo-se esta na realização de actos de carácter material que se integravam nas funções que lhe foram confiadas pelo dono do veículo, comissão que implica uma relação de dependência entre o comitente e o comissário, agindo este mediante ordens ou instruções daquele.

Logo, atento o circunstancialismo fáctico apurado, resulta que o condutor do veículo AJ conduzia por conta do proprietário a favor de quem exercia a actividade de pedreiro, e mediante ordens ou instruções deste.

Assim sendo, os Autores-lesados logrou provar os factos que tipificam uma relação de dependência ou comissão entre o condutor do veículo seguro e o proprietário deste e que logrou provar factos que permitem concluir que o acidente dos autos se verificou em consequência de culpa efectiva do condutor do veículo, sendo certo que, por força da presunção de culpa do n.º 3 do artigo 503º sempre seria de afirmar a culpa desse condutor com base na presunção legal.

Note-se ainda que, conforme Parecer do Professor A. Varela, in "Boletim da Ordem dos Advogados", Janeiro de 1984) "Nenhum fundamento existe para distinguir, nos seus efeitos, entre a culpa (do comissário) provada por presunção legal, nos termos da primeira parte do n.º 3 do artigo 503º do Código Civil, e a culpa demonstrada por qualquer outro meio de prova". E se "havendo apenas culpa presumida, o comissário responde por todos os danos causados aos lesados, sem qualquer limitação fundada no risco e apenas podendo beneficiar da redução prevista no artigo 494 do Código Civil, e também o comitente responde por todos os danos causados no acidente".

O Tribunal entende, em face da factualidade provada, que o condutor do BX não teve qualquer responsabilidade na ocorrência do sinistro.

Assim, porque a responsabilidade por danos causados a terceiros pelo veículo AJ estava transferida para a companhia de seguros M, esta terá de responder pelos danos dos AA., sendo de absolver a R. G, confirmando-se nesta parte a sentença recorrida.

b- Dos valores das indemnizações atribuídas aos Autores.

b.1Dano Patrimonial Futuro sofrido pelo Autor A.

Nesta parte a sentença recorrida discorreu do seguinte modo :

“São objecto da obrigação de indemnizar os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelos lesados.

Os danos patrimoniais são indemnizáveis quando constituam prejuízos emergentes ou lucros cessantes, sejam danos presentes ou futuros (art. 564° nºs 1 e 2 do CC).

A regra geral é a da reparação in natura: aquele que está obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (art. 562° do CC); a regra subsidiária, nos casos em que esta reparação natural não é possível, é a indemnização em dinheiro, segundo a teoria da diferença, nos termos do art. 566° n° 1 do CC.

Os danos não patrimoniais são indemnizáveis quando, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (art. 496° n° 1 do CC).

Resultou provado nos autos que na sequência do acidente, o A. A ficou com um déficit funcional permanente de 10 pontos. As sequelas do Autor são, em termos de Repercussão Permanente na Actividade Profissional, compatíveis com a profissão habitual, embora exigindo esforços acrescidos.

Estando em causa um dano biológico, traduzido numa incapacidade funcional ou fisiológica de 10 pontos, a repercussão negativa centra-se na diminuição da condição física e numa penosidade, dispêndio e desgaste físico acrescidos na execução de tarefas antes desempenhadas, sem o mesmo esforço, no seu dia-a-dia. Ora, esta realidade incontornável deve ser vertida na determinação da indemnização a atribuir e deve sê-lo partindo dos cálculos objectiváveis a partir das usuais fórmulas e tabelas financeiras.

Definida e explicada, a opção de indemnizar este dano, é tempo de explicar o cálculo do mesmo, sendo que, acompanhando a jurisprudência do nosso Supremo Tribunal, teremos como ponto de partida o "velho cálculo que parte do montante auferido pelo lesado e da percentagem que - ainda que teoricamente - a incapacidade nele se reflecte."

Assim, partindo deste critério tradicional, para evitar um subjectivismo indesejado, continua a constituir uma boa prática jurisprudencial o recurso a processos objectivos, através de fórmulas, cálculos financeiros ou a aplicação de tabelas (como se salienta no Ac. STJ de 10.10.2012 (P' 632/2001.G1.S1), sem prejuízo de uma calibração equitativa, atenta à situação concreta vivenciada.

Em termos sintéticos, sendo abundante a jurisprudência concomitante, seguiremos o entendimento de que o "quantum" indemnizatório destinado a compensar danos futuros deve corresponder a um capital produtor de rendimentos que proporcione o que, teórica ou efectivamente, deixou de se auferir e se extinga no fim presumível da vida do lesado, determinado com base na esperança de vida - cfr., neste sentido, entre muitos outros, Acs. STJ de 26.01.2012 (P' 220/2001-7.Sl) e de 20.05.2010 (P' 103/2002.L1.S1), acessível em dgsi.pt.

Temos, assim, como elementos a atender os seguintes:

A idade do lesado à data do sinistro - 29 anos; o tempo previsível de vida activa que tem pela frente (desde aquela data) até atingir a idade de reforma; a sua esperança de vida; o rendimento anual do A., no momento do acidente; o défice de que ficou afectado - 10 pontos; a inexistência de culpa ainda que concorrencial da sua parte na produção do acidente e o factor da tabela financeira adequado ao tempo de vida activa do demandante.

Pois bem. Tendo em conta o cálculo feito à luz de cálculos objectivos entendemos, na ponderação dos factores que ficaram apontados e com uma calibração equitativa, que a indemnização justa e adequada ao défice funcional permanente em referência deveria situar-se nos 42.000,00 €.

Cumpre agora efectuar um desconto em função da antecipação do pagamento da indemnização de uma só vez, podendo o capital a receber ser rentabilizado. Afigura-se equitativa a dedução de uma parcela equivalente a IA ou 25 %, ficando o capital de 42.000 €, reduzido a 31.500 €.”

No recurso interposto pela Ré M esta entende que o valor da indemnização devida ao autor A a título de perda de capacidade de ganho deve ser reduzida para € 20 000,00.

Por outro lado, no recurso interposto pelo Autor A este alega que a indemnização fixada a este título é exígua e defende que o valor indemnizatório seja fixado na quantia aproximada de € 68 000,00.

Apreciando e decidindo:

No que concerne à parte do recurso relativa à fixação de uma indemnização por danos futuros pela perda da capacidade de ganho emergente da afectação da integridade físico – psíquica, diremos, que a melhor qualificação desse dano corresponde a “ défice funcional permanente da integridade físico- psíquica” .

A afectação da integridade produtiva do ser humano é susceptível de contender não só com bens jurídicos de natureza imaterial, mas também patrimonial, posto que pecuniariamente quantificáveis. É o que sucede, por exemplo, quando a incapacidade funcional diminui directamente o rendimento do lesado. Mas é o que sucede também quando o lesado só com um esforço acrescido ou em mais tempo consegue realizar as mesmas tarefas que desempenhava antes do facto danoso. Em qualquer caso, trata-se de danos que são pecuniariamente avaliáveis e que, portanto, têm natureza claramente patrimonial. Mesmo quando falamos de esforço acrescido para realizar as mesmas tarefas, estamos sempre a considerar que a energia inerente à integridade produtiva do ser humano é um bem jurídico susceptível de ser transaccionado e, portanto, passível de expressão pecuniária.

Assim, não podem restar quaisquer dúvidas de que a incapacidade permanente geral, isto é, a incapacidade para os actos e gestos correntes do dia a dia, tal como a incapacidade para o trabalho, por atingirem aquele bem jurídico, são danos de natureza patrimonial.

Ora, chegados a este ponto e sabendo nós que o A. ficou afectado com uma IPG de 10 pontos, é inegável o seu direito à indemnização por este dano. A incapacidade permanente geral, ainda que compatível com o exercício da actividade profissional habitual mas exigindo esforços suplementares para a desenvolver, sendo um dano biológico, lesivo da saúde, é também causa de danos patrimoniais futuros, indemnizáveis nos termos dos art.ºs 562.º e segs., do C.C., maxime dos artºs 564.º e 566.º”.

Trata-se, como é comumente reconhecido, de um dano patrimonial futuro (artigo 564.º, n.º 2, 1ª parte, do Código Civil). Embora gerado por um facto actual, os seus efeitos só no decurso da vida do A. se irão manifestar. É, porém, desde já previsível que assim aconteça. Só não se sabe ao certo em que dimensão exata.

Ora, quando assim sucede, determina o artigo 566.º, n.º 3, do Código Civil, que tais danos sejam ressarcidos mediante um montante equitativamente encontrado. Ou seja, mediante um valor pecuniário que, atendendo às especificidades do caso concreto, traduza uma solução justa. E, para o efeito, devem utilizar-se critérios de verosimilhança ou de probabilidade, de acordo com o que é normal acontecer, com aquilo que em cada caso concreto poderá vir a passar-se, pressupondo, naturalmente, que a vida segue o seu curso normal .

Até porque o que está em causa no apuramento da indemnização em apreço, não é a reposição da situação existente antes da perda patrimonial, mas sim a compensação do A. pelo maior esforço que terá de despender sem remuneração acrescida.

Com o intuito, pois, de conferir maior objectividade na fixação deste tipo de indemnização (por danos patrimoniais futuros), a jurisprudência tem-se mostrado favorável à adopção de critérios matemáticos, temperados pela equidade.

Ora, como é sabido, os nossos tribunais, com particular destaque para a jurisprudência do STJ, têm vindo a reconhecer o dano biológico como dano patrimonial, na vertente de lucros cessantes, na medida em que respeita a incapacidade funcional, ainda que esta não impeça o lesado de trabalhar e que dela não resulte perda de vencimento, uma vez que a força de trabalho humano sempre é fonte de rendimentos, sendo que tal incapacidade obriga a um maior esforço para manter o nível de rendimento anteriormente auferido. E que, em sede de rendimentos frustrados, a indemnização deverá ser arbitrada equitativamente, de modo a corresponder a um capital produtor do rendimento que o lesado não irá auferir, que se extinga no fim da sua vida provável e que é susceptível de garantir, durante essa vida, o rendimento frustrado Entre muitos outros, vide, a título de exemplo, o ac. do STJ, de 7-6-2011, relatado pelo Exm.º Juiz Cons. Granja da Fonseca, no âmbito do processo 160/2002.P1.S1, publicado na Internet, http://www.dgsi.pt/jstj..

No desenvolvimento desse entendimento, o acórdão do STJ, de 10/ 10/2012, proferido no processo n.º 632/2001.G1.S1 Relatado pelo Exm.º Juiz Conselheiro Lopes do Rego, disponível na Internet – http://www.dgsi.pt/jstj., considerou que:

“… a compensação do dano biológico tem como base e fundamento, quer a relevante e substancial restrição às possibilidades de exercício de uma profissão e de futura mudança, desenvolvimento ou conversão de emprego pelo lesado, implicando flagrante perda de oportunidades, geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o vai afectar; quer a acrescida penosidade e esforço no exercício da sua actividade diária e corrente, de modo a compensar e ultrapassar as graves deficiências funcionais que constituem sequela irreversível das lesões sofridas.

Na verdade, a perda relevante de capacidades funcionais – mesmo que não imediata e totalmente reflectida no valor dos rendimentos pecuniários auferidos pelo lesado – constitui uma verdadeira «capitisdeminutio» num mercado laboral exigente, em permanente mutação e turbulência, condicionando-lhe, de forma relevante e substancial, as possibilidades de exercício profissional e de escolha e evolução na profissão, eliminando ou restringindo seriamente a carreira profissional expectável – e, nessa medida, o leque de oportunidades profissionais à sua disposição -, erigindo-se, deste modo, em fonte actual de possíveis e futuramente acrescidos lucros cessantes, a compensar, desde logo, como verdadeiros danos patrimoniais …”

E, no mesmo aresto, se acrescenta que:

“Nesta perspectiva, deverá aditar-se ao lucro cessante, decorrente da previsível perda de remunerações, calculada estritamente em função do grau de incapacidade permanente fixado, uma quantia que constitua junta compensação do referido dano biológico, consubstanciado na privação de futuras oportunidades profissionais, precludidas irremediavelmente pela capitisdeminutio de que passou a padecer (o lesado), bem como pelo esforço acrescido que o já relevante grau de incapacidade fixado irá envolver para o exercício de quaisquer tarefas da vida profissional ou pessoal …”

Assim, independentemente de se verificarem, ou não, consequências em termos de diminuição de proventos por parte do lesado, este dano biológico é indemnizável per si (neste sentido tem decidido o STJ, designadamente nos Acs. de 27/10/2009, de 19/05/2009 e de 04/10/2007, de 20-05-2010, disponíveis em www.dgsi.pt).

A nossa lei ordinária não contém regras precisas destinadas à fixação da indemnização pelo dano futuro no caso de incapacidade permanente para o trabalho, de vítimas de acidente de viação.

O cálculo destes danos é sempre uma operação delicada, de solução difícil, porque obriga a ter em conta a situação hipotética em que o lesado estaria se não houvesse sofrido a lesão, o que implica a previsão, pouco segura, sobre dados verificáveis no futuro. É por isso que tais danos se devem calcular segundo critérios de verosimilhança ou de probabilidade, de acordo com o que, no caso concreto, poderá vir a acontecer, seguindo as coisas o seu curso normal e, se mesmo assim, não puder apurar-se o seu valor exacto, deverá o tribunal julgar segundo a equidade, em obediência ao critério enunciado no artigo 566º, n.º 3 do Código Civil.

O princípio base de que se deve partir é o de que o cálculo de frustração de ganho deverá conduzir a um capital que considere a produção de um rendimento durante todo o tempo de vida activa da vítima, adequado ao que auferiria se não fora a lesão correspondente ao grau de incapacidade e adequado a repor a perda sofrida.

Por forma a assegurar a atribuição de uma indemnização que não seja arbitrária ou aleatória, o que pressupõe uma base objectiva, o julgador pode e deve socorrer-se de fórmulas matemáticas ou de tabelas; sendo que, em relação à que consta da Portaria n.º 377/08 de 26.05 actualizada pela n.º 679/09 de 25.06 a jurisprudência tem vindo a reconhecer que não garante uma indemnização minimamente adequada, sendo o seu campo de aplicação específico nas soluções extrajudiciais.

A factualidade relevante, para decidir a questão do cálculo indemnizatório, dada como provada corresponde àquela vertida nos pontos 31, 35, 36, 41, 42, e é a seguinte :

“4)À data do acidente, o Autor A tinha 29 anos de idade.

31) O A. A, à data do acidente, era técnico de construção civil, auferindo mensalmente o rendimento ilíquido de € 1.140,65.

35) Em virtude do acidente, o A. A passou a sentir dores no braço direito, dificultando-lhe o exercício da sua profissão.

36) Devido ao acidente o A. A ficou com limitação da extensão no membro superior direito.

41)O défice funcional permanente da integridade físico-psíquica foi fixado em 10 pontos.

42) As sequelas do A. A são compatíveis com a profissão habitual, com esforços acrescidos”

Tendo presente os mencionados parâmetros, os factores a atender para efeitos de cálculo indemnizatório são os seguintes :

--o salário anual no valor de € 1 140,65 ;

--41 anos de vida activa considerando o limite médio de 70 anos de idade de vida activa ;

--Défice Funcional Permanente da Integridade Físico - Psíquica de 10 pontos com repercussão permanente da actividade profissional pois implica esforços acrescidos.

Com estes dados, e seguindo a metodologia adoptada por vários arestos, que se afigura correcta e transparente, cumpre fazer uma análise comparativa de resultados e optar por aquele que nos parece mais ajustado às circunstâncias do caso concreto, fazendo ainda operar as correcções que a equidade determinar.

Assim, multiplicando o rendimento anual de € 15 969,1 ( 1 140, 65 x14) auferido pelo Autor A pelo défice funcional (0,10) pelo número de anos de vida activa- 41- obtemos uma indemnização de € 65 473,31.

Por outro lado, a indemnização a receber a este título, na medida em que representa a entrega imediata de um determinado capital de uma só vez, é susceptível de produzir rendimentos de que o A. imediatamente poderá usufruir, o que representa uma vantagem patrimonial relevante.

Todavia, considerando a atual conjuntura económica - financeira europeia, a revelar uma taxa de inflação próxima de zero em alguns países, considerando que as taxas de juro de depósitos a curto e médio prazo na zona económica europeia se aproximam de zero, considerando que não é previsível a alteração desses parâmetros a curto e médio prazo, considerando a manutenção da actual crise económica que está a justificar por parte do Banco Central Europeu a descida da taxa de juros referencial, entendemos que não se justifica qualquer dedução, a título, de compensação pela antecipação do capital.

Utilizando a tabela indicada no Acórdão do STJ de 04.12.2007, destinada a facilitar os cálculos através de uma aplicação de programa informático Excell da fórmula referida no Acórdão do STJ de 05/05/1994, a indemnização obtida é de € 37 387,26156.

Estes valores, resultantes da aplicação de auxiliares matemáticos, constituem, como se sabe, apenas uma orientação com o objectivo de uniformização de soluções para casos idênticos ou de contornos semelhantes.

A equidade, sustentada nos factos provados, deve ser norteada pelo princípio de igualdade, o que implica uma uniformização de critérios, desde que sejam respeitadas as circunstâncias do caso concreto.

Ora, tendo presentes, por um lado, os valores acima obtidos através dos auxiliares matemáticos, com uma função norteadora do julgador, a gravidade do caso concreto resultante nomeadamente do grau de 10 pontos de incapacidade permanente geral, a idade do Autor ( 29) , e por outro, a necessidade de distinção dos casos de gravidade superior , afigura-se-nos ajustada e equilibrada a indemnização no montante de € 42 000,00), alterando-se nesta parte a sentença recorrida.

b.2 Dos Danos Não Patrimoniais .

Dispõe o art. 496º do Código Civil:“1. Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.

2. (...)

3. O montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494º; no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não patrimoniais sofridos pela vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos número anterior.”

“Danos não patrimoniais – são os prejuízos (como dores físicas, desgostos morais, vexames, perda de prestígio ou de reputação, complexos de ordem estética) que, sendo insuscetíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem estar, a liberdade, a beleza, a honra, o bom nome) que não integram o património do lesado, apenas podem ser compen­sados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização” (A.Varela, “Das Obrigações em Geral”, 6ª edição, l.°-571).

Incluem-se entre os danos não patrimoniais indemnizáveis as dores físicas e psíquicas, a perturbação da pessoa, os sofrimentos morais, os prejuízos na vida de relação.

As dores e sequelas que, do ponto de vista da perda de qualidade de vida, irão prolongar-se no tempo, são padecimentos subsumíveis à categoria dos prejuízos não patrimoniais.

O montante da indemnização deve ser proporcionado à gravidade do dano, devendo ter-se em conta na sua fixação todas as regras de prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida”.

Destarte embora a determinação dos danos não patrimoniais indemnizáveis dependa do prudente arbítrio do juiz, deve este referir sempre com a necessária precisão o objeto do dano para evitar que a sua liquidação se converta num ato puramente arbitrário do tribunal.

Quando se faz apelo a critérios de equidade, pretende-se encontrar somente aquilo que, no caso concreto, pode ser a solução mais justa. A equidade está assim limitada sempre pelos imperativos da justiça real (a justiça ajustada às circunstâncias) em oposição à justiça meramente formal.

Para a formulação do juízo de equidade, que norteará a fixação da compensação pecuniária por este tipo de “dano”, socorremo-nos do ensinamento dos Professores Pires de Lima e Antunes Varela, in “Código Civil Anotado”, vol. I, pág.501:“O montante da indemnização correspondente aos danos não patrimoniais deve ser calculado em qualquer caso (haja dolo ou mera culpa do lesante) segundo critérios de equidade, atendendo ao grau de culpabilidade do responsável, à sua situação económica e às do lesado e do titular da indemnização, às flutuações do valor da moeda, etc.E deve ser proporcionado à gravidade do dano, tomando em conta na sua fixação todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida.”.

Resulta do exposto que o juiz, para a decisão a proferir no que respeita à valoração pecuniária dos danos não patrimoniais, em cumprimento da prescrição legal que determina que o julgamento seja feito de harmonia com a equidade, deverá, pois, atender aos fatores expressamente referidos na lei e, bem assim, a outras circunstâncias que emergem da factualidade provada. Tudo com o objetivo de, após adequada ponderação, poder concluir a respeito do valor pecuniário que considere justo para, no caso concreto, compensar o lesado pelos danos não patrimoniais que sofreu.

A doutrina e a jurisprudência portuguesas têm teorizado sobre os modos de expressão do dano não patrimonial, realçando o quantum doloris (que sintetiza as dores físicas e morais sofridas no período de doença e de incapacidade temporária), o dano estético (que simboliza o prejuízo anátomo-funcional associado às deformidades e aleijões que resistiram ao processo de tratamento e recuperação da vítima), o prejuízo de afirmação social (que respeita à inserção social do lesado nas suas variadíssimas vertentes - familiar, profissional, sexual, afectiva, recreativa, cultural e cívica), o prejuízo da saúde geral e da longevidade (que valoriza os danos irreversíveis na saúde e bem estar da vítima e o corte na expectativa de vida, avultando aqui o dano da dor e o défice de bem estar), e o pretiumjuventutis (que realça a especificidade da frustração do viver em pleno a primavera da vida). Tal indemnização deverá sempre equivaler à quantia considerada necessária para proporcionar ao lesado prazeres compensatórios do dano, já que tem como objectivo compensá-lo daqueles danos, através de uma quantia em dinheiro que lhe permita um acréscimo de bem-estar e de acesso a bens recreativos e culturais, enquanto naturais contrapontos das dores e angústias passadas e futuras, da perda da auto-estima, da frustração da sociabilidade, etc.. Nesta matéria, a jurisprudência tem evoluído no sentido de considerar que a indemnização, ou compensação, deverá constituir um lenitivo para os danos suportados, não devendo, portanto, ser miserabilista, mas significativa, a fim de responder actualizadamente ao comando do artigo 496º do Código Civil e constituir uma efectiva possibilidade compensatória. Por outro lado, a doutrina nacional tem vindo a reconhecer que a indemnização dos danos não patrimoniais não reveste natureza exclusivamente ressarcitória, desempenhando também uma função preventiva e uma função punitiva, devendo o seu valor ser fixado com recurso à equidade, ponderando-se, entre outras circunstâncias, a culpa do agente e a sua situação económica, bem como a do lesado.”

Assim se compreende que a atividade do juiz no domínio do julgamento à luz da equidade, não obstante se veja enformada por uma importante componente subjetiva não se reconduza ao puro arbítrio.

Mas, como se escreve no acórdão do STJ de 23 de Setembro de 1998, “claro que o julgador ao atribuir esta compensação não está subordinado a critérios normativos fixados na lei. O que aqui tem força são razões de conveniência, de oportunidade, de justiça concreta em que a equidade se funda”.

Reportando-nos aos fatores a considerar na formulação do juízo de equidade para a fixação do montante indemnizatório, apontados pelo art. 494º, interessa considerar que, embora se faça referência à situação económica do lesante, a ponderação de tal parâmetro se revela desprovida de sentido nos casos em que, como acontece no presente, não é o património do lesante, mas sim o de um terceiro – concretamente, a Seguradora, a suportar o pagamento da indemnização.

Finalmente, feito um bosquejo na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça- com o qual se procura dar expressão à preocupação da normalização ou padronização quantitativa da compensação devida por esta espécie dano, e, por essa via, ao princípios da igualdade e da unidade do direito e ao valor eminente da previsibilidade da decisão judicial - encontramos caso em que essa compensação foi fixada em € 30.000,00 para um jovem que teve um período de tratamento particularmente penoso, com intervenções cirúrgicas, acamamento, imobilização, enjoos, dores de grau 3 numa escala de 7, e sequelas com gravidade relativa (Ac. do STJ de 27.11.11, www.dgsi.pt.), outro em que foi fixada em € 50.000,00 para uma pessoa de 29 anos de idade que sofreu várias fracturas e um traumatismo crânio-encefálico, com dores de grau 5 numa escala de 7, que esteve hospitalizado duas vezes, foi sujeito a intervenções cirúrgicas e a tratamento de fisioterapia, que teve de se deslocar, longo tempo, com o auxílio de canadianas e que ficou, como sequelas permanentes, com cicatrizes na perna, claudicação de marcha, dificuldade em permanecer de pé, subir e descer escadas impossibilitado de correr e praticar desporto que antes praticava, e que passou de alegre e comunicativo a triste, desconcentrado e ansioso (Ac. do STJ de 07.10.10, www.dgsi.pt), outro, no qual foi fixada essa compensação em € 60.000,00 para um lesado de 16 anos de idade, que sofreu fraturabasicervical do fémur esquerdo e traumatismo craniano com perda de consciência, que teve de andar de canadianas três meses e fazer fisioterapia, ficou com marca viciosa e marcadamente claudicante, dismetria dos membros inferiores, báscula da bacia com rotação e maior saliência da anca esquerda, desvio escoliótico com dor na palpação lombar, atrofia da coxa e da perna esquerdas e marcada rigidez na anca esquerda; incapacidade para a corrida, para se ajoelhar e adotar posição de cócoras, dificuldade marcada na permanência de pé, alterações sexuais devido a dificuldades de posicionamento, impossibilidade de praticar desportos que impliquem esforço físico; sensação de tristeza, vergonha e revolta bem como frustração e medo no contacto com o sexo oposto; necessidade de nova intervenção cirúrgica, de fisioterapia, de adaptação automóvel para poder conduzir; não frequência de praias por dificuldade em caminhar na areia e pela vergonha de exibir o corpo, e de piscinas; não participação em jogos de futebol e impossibilidade de carregar pesos; anteriormente alegre e extrovertido, passou a ser mal-humorado, com pesadelos frequentes, insónias e tendências para o isolamento, lendo e escrevendo com dificuldade (Ac. do STJ de 27.05.10, www.dgsi.pt.) e outro caso relativo a jovem de 24 anos, vitima de atropelamento, que ficou a padecer de IPP de 10 pontos, sequela compatível com a atividade catual, não implicando esforços suplementares e à qual foi concedida compensação pelos danos morais de 10 000,00 Euros (ac. do STJ de 24-11-2014, proferido no p. nº 5572/05.0TVLSB.L1.S1, Relator : Maria dos Prazeres Beleza).

- Feitas estas considerações, cumpre agora reapreciar os valoresfixados na sentença recorrida a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos pelos Autores A, Ant e MI.

Na sentença recorrida esses valores foram fixados nos valores de € 12 000,00, € 12 000,00 e € 9 000,00, respectivamente.

Relativamente ao Autor A:

Ora relativamente ao autor A há que atentar que este teve transtornos e incómodo em consequência das lesões sofridas, tornou-se triste, teve um tempo de recuperação significativo, - teve alta três meses após acidente, o quantum doloris foi fixado no grau 3/7, o dano estético no grau 1/7, o Autor A tinha 29 anos à data do acidente, ficou com medo de viajar.( ver pontos 33, 34, 37, 38, 40, 43., desconcentrado de difícil contacto), continua a ter sequelas do foro psíquico após o acidente.

Em face do exposto e atendendo ainda aos padrões de cálculo seguidos pela jurisprudência, levam- nos a considerar como razoável, nos termos do art. 496º, nºs 1 e 4 do c. Civil, fixar em € 12 12 000,00, o quantitativo devido a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos pelo Autor A, não merecendo assim provimento nesta parte, o recurso de apelação da Recorrente M.

Relativamente ao Ant.

Relativamente ao autor Ant há que atentar que o quantum doloris foi fixado em 3/7 e com um dano estático de 0, como sequela relacionada com acidente ficou com omalgia e dismorfia da face superior do ombro, compatível com rotura muscular, associada a ligeira limitação da flexão/ adução do ombro.

Tendo em conta estes factos à luz das considerações anteriores consideramos justo e equitativo fixar em € 9 000,00 o valor da compensação a atribuir ao autor Ant a título de danos não patrimoniais, não merecendo assim provimento nesta parte, o recurso de apelação da Recorrente M.

Relativamente à autora MI.

Há que atentar que esta na sequência do sinistro, foi assistida no CRAM onde apresentava traumatismo da face com hematoma peri orbitário esquerdo, contusão torácica e ombro direito com estiramento, o quantum doloris da A. MI é fixável no grau 3, o dano estético da A. I foi fixado no grau 2/7, pela deformidade adquirida na sequência da monoparésia, a A. I estava reformada e desempenhava as tarefas domésticas.

Em face do exposto e atendendo ainda aos padrões de cálculo seguidos pela jurisprudência, levam- nos a considerar como razoável, nos termos do art. 496º, nºs 1 e 4 do c. Civil, fixar em € 12 000,00, o quantitativo devido a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos pela Autora, não merecendo assim provimento nesta parte, o recurso de apelação da Recorrente M.

Em consequência do exposto, concluímos pela improcedência do recurso interposto pela Recorrente Me pela procedência parcial do recurso interposto pela A.

Sumário.

O recurso da matéria de facto não visa a obtenção de um segundo julgamento sobre aquela matéria, sendo antes uma forma de obviar a eventuais erros, ou incorrecções, cometidos na decisão recorrida.

Não se visa um novo julgamento, mas sim a legalidade da decisão recorrida na forma como apreciou a prova e nos segmentos concretos indicados pelo recorrente.

Considerando que a convicção do tribunal de 1ª instância é produto da conjugação dialética de dados objectivos fornecidos por documentos com as declarações de parte e depoimentos de testemunhas prestados em julgamento, se a impugnante pretende impugnar a credibilidade das declarações ou dos depoimentos deve indicar elementos objectivos que imponham um diverso juízo sobre a credibilidade das declarações ou dos depoimentos.

IV- DECISÃO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso de apelaçãointerposto pela Recorrente M e em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação interposto pelo Autor A, fixando em € 42 000,00 o valor da indemnização devida a título do referido défice funcional permanente da integridade físico – psíquica de 10 pontos, mantendo-se a parte restante da sentença recorrida.
Custas do recurso da recorrente M a cargo desta.
Custas do recurso do recorrente A a cargo deste e da recorrida M, na proporção dos decaimentos respectivos.
Notifique.
Guimarães, 12-01-2017
(Processado e revisto com recurso a meios informáticos)
______________________________
(Francisca Micaela Fonseca da Mota Vieira)
_______________________________
(Fernando Fernandes Freitas)
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(Lina Aurora Ramada e Castro Bettencourt Baptista .)