Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães  | |||
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| Relator: | RAQUEL BAPTISTA TAVARES | ||
| Descritores: |  ARRENDAMENTO DENÚNCIA AGREGADO FAMILIAR DESCENDENTE  | ||
| Nº do Documento: | RG | ||
| Data do Acordão: | 01/26/2023 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | APELAÇÃO IMPROCEDENTE | ||
| Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO CÍVEL | ||
| Sumário: |   I- A apreciação do circunstancialismo que determina a necessidade do arrendado para o senhorio, afere-se da mesma forma que o circunstancialismo que determina a necessidade do arrendado para o descendente a quem o senhorio pretende satisfazer a necessidade de habitação. 2- O local arrendado cuja denúncia o senhorio pretende deve mostrar-se imprescindível para a instalação do agregado familiar do descendente que dele necessita e essencial para a satisfação das suas necessidades básicas de habitação.  | ||
| Decisão Texto Integral: |   Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório AA, residente na Rua ..., freguesia ..., ... instaurou a presente Ação de Processo Comum contra BB, residente na Rua ..., ..., ... ..., ..., ..., formulando os seguintes pedidos: a) seja declarado extinto, por denúncia da senhoria, o contrato de arrendamento celebrado entre os antecessores da Autora e da Ré, referente à fração autónoma identificada no ponto 1.º da petição inicial; b) seja a Ré condenada a desocupar o arrendado e entregá-lo à Autora, livre de pessoas e bens, decorridos seis meses após a data da referida denúncia e mediante o pagamento à Ré, por parte da Autora, do valor de €1.440,00, equivalente a um ano de renda; c) seja a Ré condenada a pagar à Autora uma indemnização no montante diário de €150,00, desde a efetivação da denúncia até à efetiva restituição do prédio à Autora. Alegou, para tanto e em síntese, é proprietária fração autónoma sita na Rua ..., ..., lugar de ..., ..., em ..., arrendada pelo pai da Autora à Ré e ao seu falecido marido CC. Mais alega que, por carta datada de 2 de agosto de 2021, comunicou à Ré a denúncia do contrato, com fundamento na necessidade do prédio para a habitação do seu filho DD e que a Ré recusa aceitar a cessação do contrato de arrendamento. Regularmente citada, a Ré contestou sustentando não estarem reunidos os pressupostos legais para que a denúncia se concretize. Veio a efetivar-se a audiência de discussão e julgamento com a prolação de sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva: “Nestes termos e perante todo o exposto, julga-se a presente ação procedente, por provada, e consequentemente: - declara-se extinto, por denúncia do senhorio, o contrato de arrendamento celebrado entre os antecessores da Autora e a Ré, referente à fração autónoma identificada no ponto 1-dos factos provados; - condena-se a Ré a desocupar o arrendado e a entregá-lo à Autora, livre de pessoas e bens, mediante o pagamento à Ré, por parte da Autora, do valor de € 1440,00 (mil, quatrocentos e quarenta euros), equivalente a um ano de renda; - absolve-se a Ré do demais peticionado. Custas pela Ré e pela Autora na proporção do respetivo decaimento (80% e 20% respetivamente). Registe e notifique”. Inconformada, a Ré veio interpor recurso, concluindo as suas alegações da seguinte forma: “1ª- Vem o presente recurso da parte da douta sentença proferida pelo Tribunal “a quo”, que declarou extinto, por denúncia do senhorio, o contrato de arrendamento objeto dos autos, e da parte que condenou a Ré a desocupar o arrendado e a entregá-lo à Autora, livre de pessoas e bens. 2ª- A legitimidade da denúncia do contrato de arrendamento pela senhoria, por necessidade de habitação pelo seu descendente em 1º grau, está dependente, além da verificação de pressupostos formais previstos no artigo 1.102º do Código Civil, da necessidade prevista no artº 1.101º, a), do mesmo diploma. 3ª- Tal necessidade, tem de ser séria, real, efetiva e eminente. 4ª-O filho da Autora/recorrida, vive em casa da sua mãe, que é ampla e espaçosa, com 3 quartos e satisfaz mais do que as suas necessidades básicas de habitação, pelo que não tem, aquele, necessidade de habitação séria, real, efetiva e eminente no arrendado, que possa permitir a denúncia do contrato de arrendamento. 5ª- A faculdade de denúncia do contrato de arrendamento dos autos, tem de se basear em necessidade do filho da Autora/recorrida e não em pretensão do mesmo. 6ª- O filho da Autora/recorrida não tem necessidade de habitar outro local que não aquele em que atualmente habita, com a sua mãe e a sua filha, quando esta se encontra à sua guarda e cuidados. 7ª-O arrendado cuja denúncia a Autora/recorrida pretende, não é imprescindível para o seu filho instalar o seu agregado familiar – constituído por si e pela sua filha, intermitentemente, – nem essencial para satisfação da sua necessidade básica de habitação, que está mais do que assegurada, pois reside com a sua mãe, em casa desta. 8ª- A sentença de que ora se recorre, não fez, com o devido respeito, correta interpretação e aplicação da lei, concretamente da alínea a), do artigo 1101º do Código Civil. 9ª – Neste sentido vide: - Ac. do STJ de 21/03/2012 (Proc. n.º 960/03.0TBPVZ.P1.S2), disponível em http://www.stj.pt; - Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra de 05/07/2006 (Proc. 1213/2006),e - Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 12/11/2009 (Proc. n.º 273/09.3YRLSB-8), ambos disponíveis em http://www.dgsi.pt; e - “A Cessação do Contrato de Arrendamento por denúncia justificada” – pág. 1251, Professor Doutor João Espírito Santo, em http://portal.oa.pt. 10ª - Razão pela qual a douta sentença recorrida deve ser revogada e substituída por outra que julgue a ação totalmente improcedente, absolvendo a Ré/recorrente de tudo quanto foi peticionado pela Autora/recorrida.” Pugna a Recorrente pela procedência do recurso e, consequentemente, pela revogação da sentença recorrida. A Autora contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso e pela manutenção da sentença recorrida. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. *** II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSOO objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso (artigo 639º do Código de Processo Civil, de ora em diante designado apenas por CPC). A questão a decidir, tendo em conta o teor das conclusões formuladas pela Recorrente, é apenas a de saber se é legitima a denúncia do contrato de arrendamento levada a cabo pela Autora. *** III. FUNDAMENTAÇÃO3.1. Os factos Factos considerados provados em Primeira Instância: 1- A Autora é dona e legítima proprietária da fração autónoma designada pela letra ..., destinada a habitação, no ... esquerdo, com uma garagem e dois logradouros, que faz parte do prédio urbano sito na Rua ..., ..., lugar de ..., freguesia ..., ..., inscrito na matriz sob o artigo ...86 (anterior 1054) e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ...98; 2- Este imóvel veio à posse e propriedade da Autora por meio sucessão hereditária, por óbito de sua mãe EE, tendo-lhe sido adjudicado tal prédio por partilha em inventário judicial obrigatório; 3- A Autora fez registar a seu favor a aquisição do direito de propriedade sobre esse imóvel já em 24 de março de 2011 - cfr. Ap. ...01 de 2011/03/24; 4- A Autora, por si e seus antecessores, desde há 30 e mais anos, usufrui do referido imóvel, entra e permanece aí quando entende, arejando-o e assegurando a limpeza do mesmo; 5- É a Autora quem paga o IMI devido e quaisquer taxas relativas a esse imóvel; 6- A Autora procede deste modo à vista de todos, de boa-fé, de modo pacífico e com a convicção de que lhe pertence o direito de propriedade sobre esse imóvel; 7- Em 1 de março de 1986, o pai da autora - FF, nessa data proprietário do imóvel identificado no ponto 1- dos factos provados, celebrou com a Ré e o seu falecido marido, CC, um contrato de arrendamento relativo a esse imóvel – documento nº ... junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; 8- Através deste contrato foi assim dado de arrendamento à Ré e ao seu então marido o referido imóvel, para habitação, pelo prazo de um ano, com início em 1 de Março de 1986, renovável por iguais períodos, se não fosse denunciado; 9- Acordaram a renda mensal de 14 000$00 (catorze mil escudos), que presentemente ascende ao valor de € 120,00 (cento e vinte euros) por mês e que a Ré deposita na conta bancária da autora - cfr. documento n.º ... junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; 10- Por carta datada de 2 de agosto de 2021, a Autora comunicou à Ré a denúncia do referido contrato, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 1101.º do Código Civil, a fim de o fazer cessar e lhe ser entregue o prédio dado de arrendamento - documento n.º ... junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (fls. 12v e 13 dos autos); 11- Nessa comunicação a Autora, entre o mais, expressamente referiu que o fundamento da denúncia do aludido contrato consubstanciava-se na necessidade do referido prédio para habitação do seu filho DD; 12- E que, com a efetivação da denúncia, a autora pagaria à ré, o montante equivalente a um ano de renda, ou seja, o valor de €1.440,00 (mil quatrocentos e quarenta euros); 13- A Ré rececionou essa comunicação em 5 de agosto de 2021 e, na sequência, através do seu advogado, informou a autora que entendia não estarem verificados os requisitos legais para a denúncia do contrato, considerando, pois, ineficaz a comunicação efetuada pela autora para o efeito; 14- A Ré recusa aceitar a cessação do aludido contrato de arrendamento e, consequentemente, em entregar o imóvel em causa à Autora; 15- O filho da Autora, maior, de 32 anos de idade, vivia desde maio de 2018 com a sua então companheira, de quem tem uma filha com 5 anos de idade; 16- Após o término dessa relação, o filho da Autora ficou a viver em casa da ora Autora, na habitação que esta possui na Rua ..., freguesia ..., ..., uma vez que não dispunha de outro alojamento; 17- A Autora consentiu que este ali vivesse com ela e que lá ficasse também a viver a sua neta, filha do referido DD, sempre que a mesma estivesse à guarda deste; 18- O filho da Autora pretende sair da casa da mãe, ora Autora e passar a viver autonomamente com a sua filha; 19- O filho da Autora não tem, nem nunca teve, no concelho ... ou em qualquer outro concelho do país, casa própria que satisfaça as necessidades de habitação do mesmo - documento n.º ... junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; 20- A Autora necessita por isso do prédio arrendado à Ré do qual é proprietária há mais de dez anos, para habitação do seu referido filho; 21- Com a atuação da Ré, esta impede que a Autora afete o prédio urbano em causa à habitação do seu filho DD; 22- A Ré tem no local arrendado instalada a sua própria habitação, desde março de 1986 ininterruptamente, sendo aí que toma as refeições, que dorme, que recebe familiares e pessoas amigas, que recebe a correspondência que lhe é endereçada, que lava e seca a roupa. *** Factos considerados não provados em Primeira InstânciaTal situação foi entendida como sendo meramente temporária e cessaria logo que o filho tivesse possibilidade de mudar a sua residência para outra habitação. A Autora tem interpelado o filho GG para deixar a casa onde presentemente habita com ela. A Ré após o falecimento do seu marido passou a viver em união de facto com o seu atual companheiro, Sr. HH. A ré, com regularidade, usa, pernoita e habita a casa do seu companheiro sita na cidade .... O companheiro da Ré é proprietário de uma casa, em comum com um filho, em virtude do falecimento da mulher daquele, mãe deste. *** 3.2. DA DENUNCIA DO CONTRATO DE ARRENDAMENTOImporta começar por salientar que não vem impugnada a matéria de facto fixada em 1ª Instância. Assim, tal como delimitado pela Recorrente, o presente recurso versa apenas sobre matéria de direito, concretamente se é legitima a denuncia do contrato de arrendamento efetuada pela Autora. Resulta inequivocamente dos autos a existência de um contrato de arrendamento: no dia 1 de março de 1986, o pai da Autora, FF, celebrou com a Ré e o seu falecido marido, CC, um contrato de arrendamento relativo ao imóvel identificado nos autos, através do qual foi dado de arrendamento à Ré e ao seu então marido o referido imóvel, para habitação, pelo prazo de um ano, com início em 1 de março de 1986 e renovável por iguais períodos, se não fosse denunciado (pontos 7 e 8 dos factos provados). Estabelece o artigo 1022º do Código Civil que “Locação é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra o gozo temporário de uma coisa mediante retribuição”; se a locação versar sobre coisa imóvel diz-se arrendamento (artigo 1023º do Código Civil). In casu, a Autora, por carta datada de 2 de agosto de 2021, comunicou à Ré a denúncia do contrato, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 1101º do Código Civil, a fim de o fazer cessar e lhe ser entregue o prédio dado de arrendamento, ai referindo que o fundamento da denúncia consubstanciava-se na necessidade do referido prédio para habitação do seu filho DD. Sustenta a Recorrente que a legitimidade da denúncia do contrato de arrendamento pela senhoria, por necessidade de habitação para o seu descendente em 1º grau, está dependente, além da verificação de pressupostos formais previstos no artigo 1102º do Código Civil, da necessidade prevista no artigo 1101º, alínea a) e que tal necessidade, tem de ser séria, real, efetiva e eminente. Entende, por isso, que a faculdade de denúncia do contrato de arrendamento dos autos, tem de se basear em necessidade do filho da Autora e não em pretensão do mesmo e que este não tem necessidade de habitar outro local que não aquele em que atualmente habita, com a sua mãe e a sua filha, quando esta se encontra à sua guarda e cuidados, não sendo o locado imprescindível para instalar o seu agregado familiar, nem essencial para satisfação da sua necessidade básica de habitação, que está mais do que assegurada, pois reside com a sua mãe, em casa desta. Vejamos. Resulta efetivamente do disposto no artigo 1101º do Código Civil que o senhorio pode denunciar o contrato de duração indeterminada nos casos seguintes: a) Necessidade de habitação pelo próprio ou pelos seus descendentes em 1.º grau; b) Para demolição ou realização de obras de remodelação ou restauro profundos que obriguem à desocupação do locado, desde que não resulte local com características equivalentes às do locado, onde seja possível a manutenção do arrendamento; c) Mediante comunicação ao arrendatário com antecedência não inferior a cinco anos sobre a data em que pretenda a cessação. O direito de denúncia para habitação do senhorio depende do pagamento do montante equivalente a um ano de renda e da verificação dos seguintes requisitos (artigo 1102º n.º 1): a) Ser o senhorio proprietário, comproprietário ou usufrutuário do prédio há mais de dois anos ou, independentemente deste prazo, se o tiver adquirido por sucessão; b) Não ter o senhorio, há mais de um ano, na área dos concelhos ... ou do ... e seus limítrofes ou no respetivo concelho quanto ao resto do País casa própria que satisfaça as necessidades de habitação própria ou dos seus descendentes em 1.º grau. O direito de denúncia para habitação do descendente está ainda sujeito à verificação do requisito previsto na alínea a) do n.º 1 relativamente ao senhorio e do da alínea b) do mesmo número para o descendente. Tal como se refere na sentença recorrida, e não vem questionado no presente recurso, não obstante o contrato de arrendamento ter sido celebrado em 1 de março de 1986, antes da entrada em vigor do Regime do Arrendamento Urbano (DL n.º 321-B/90 de 15 de outubro), é aqui aplicável o disposto nos referidos artigos 1101º, nº 1, alínea a) e 1102º, n.º 1 e n.º 3 do Código Civil (cfr. artigo 27º da Lei n.º 6/2006 de 27 de fevereiro, Novo RAU). A Autora pode, por isso, denunciar o contrato de arrendamento no caso de necessidade de habitação do seu filho, tal como decorre do artigo 1101º n.º 1 alínea a) do Código Civil. Pelo tribunal a quo foi considerado que “atentando na factualidade apurada é forçoso concluir que a Autora logrou demonstrar os factos com base nos quais sustentou o pedido de declaração de denúncia do contrato de arrendamento”, entendendo “estarem reunidos os pressupostos legais para declarar a denúncia do contrato de arrendamento, por necessidade de habitação por parte do descendente da Autora e, consequentemente, condenar a Ré a desocupar o arrendado e entregá-lo à Autora, livre de pessoas e bens, mediante o pagamento à Ré, por parte da Autora, do valor de € 1440,00 (mil quatrocentos e quarenta euros)”. É contra este entendimento que se insurge a Recorrente sustentando a denuncia tem de se basear em necessidade e não em pretensão do filho da Autora e que este não tem necessidade de habitar outro local que não aquele em que atualmente habita, com a sua mãe e a sua filha, quando esta se encontra à sua guarda e cuidados, e que o locado não é imprescindível para instalar o seu agregado familiar, nem essencial para satisfação da sua necessidade básica de habitação, pois que esta está assegurada ao residir com a sua mãe, em casa desta. Vejamos se lhe assiste razão. Atentemos na matéria de facto provada: - O filho da Autora, maior, de 32 anos de idade, vivia desde maio de 2018 com a sua então companheira, de quem tem uma filha com 5 anos de idade (ponto 15); - Após o término dessa relação, o filho da Autora ficou a viver em casa da ora Autora, na habitação que esta possui na Rua ..., freguesia ..., ..., uma vez que não dispunha de outro alojamento (ponto 16); - A Autora consentiu que este ali vivesse com ela e que lá ficasse também a viver a sua neta, filha do referido DD, sempre que a mesma estivesse à guarda deste (ponto 17); - O filho da Autora pretende sair da casa da mãe, ora Autora e passar a viver autonomamente com a sua filha (ponto 18); - O filho da Autora não tem, nem nunca teve, no concelho ... ou em qualquer outro concelho do país, casa própria que satisfaça as necessidades de habitação do mesmo (ponto 19). Em face da factualidade apurada não podemos deixar de concordar com o tribunal a quo quando afirma que a Autora logrou demonstrar os factos com base nos quais sustentou o pedido de declaração de denúncia do contrato de arrendamento, designadamente a necessidade de habitação pelo seu filho, nos termos exigidos pela alínea a) do n.º 1 do artigo 1101º do Código Civil. Aliás, não está em causa uma mera pretensão, resultando expressamente do ponto 20) dos factos provados que a Autora necessita por isso do prédio arrendado à Ré do qual é proprietária há mais de dez anos, para habitação do seu referido filho. O facto de o filho estar neste momento a viver em casa da Autora não afasta o referido requisito da necessidade de habitação, sendo certo que o mesmo não tem, nem nunca teve, no concelho ... ou em qualquer outro concelho do país, casa própria que satisfaça as suas necessidades de habitação. Como diz Aragão Seia (Arrendamento Urbano, 7ª Edição, p. 501 o “verdadeiro fundamento do direito de denúncia pelo senhorio, a causa de pedir da correspetiva ação, é a sua necessidade de habitação, necessidade que não é sinónimo de querer, desejar ou pretender o arrendado. Necessitar do prédio é precisar dele, precisão que há-de traduzir-se na sua imprescindibilidade e que deve representar um estado de carência atual conexionado com a situação concreta que existia quando o contrato foi celebrado.” A apreciação do circunstancialismo que determina a necessidade do arrendado para o senhorio, afere-se da mesma forma que o circunstancialismo que determina a necessidade do arrendado para o descendente a quem o senhorio pretende satisfazer a necessidade de habitação. O local arrendado cuja denúncia o senhorio pretende deve mostrar-se imprescindível para a instalação do agregado familiar do descendente que dele necessita e essencial para a satisfação das suas necessidades básicas de habitação. In casu, ficou provado que a Autora tem efetivamente necessidade do locado para habitação do seu filho; este, com 32 anos de idade, que vivia desde maio de 2018 com a sua então companheira, de quem tem uma filha com 5 anos de idade, terminou a relação e ficou a viver em casa da Autora, uma vez que não dispunha de outro alojamento. O filho da Autora não tem, nem nunca teve, no concelho ... ou em qualquer outro concelho do país, casa própria que satisfaça as necessidades de habitação do mesmo e, não obstante a Autora ter consentido que vivesse com ela e que lá ficasse também a viver a filha, sempre que a mesma estivesse à sua guarda, pretende sair da casa da mãe, e passar a viver autonomamente com a sua filha. Tal pretensão, de sair da casa da mãe para viver autonomamente com a sua filha, traduz-se numa necessidade atual, real e séria do filho da Autora para instalar o seu lar, e aí viver com a sua filha, no local arrendado, revelando-se este imprescindível para o filho da Autora instalar o seu agregado familiar, e essencial para satisfação da sua necessidade básica de habitação, uma vez que não tem, no concelho ... ou em qualquer outro concelho do país, casa própria que satisfaça as suas necessidades de habitação, não podendo afirmar-se que estas estão asseguradas ao residir com a sua filha em casa da sua mãe. Em face de todo o exposto, improcede, pois, a apelação, sendo de confirmar a decisão recorrida. A Recorrente é responsável pelas custas atento o seu integral decaimento (artigo 527º do Código de Processo Civil). *** IV. Decisão*** Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a sentença recorrida. Custas pela Recorrente. Guimarães, 26 de janeiro de 2023 Texto elaborado em computador e integralmente revisto pela signatária Raquel Baptista Tavares (Relatora) Margarida Almeida Fernandes (1ª Adjunta) Afonso Cabral Andrade (2ª Adjunto)  |