Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
269/11.5JABRG.G1
Relator: FERNANDO MONTERROSO
Descritores: ROUBO
CO-AUTORIA
CIRCUNSTÂNCIAS AGRAVANTES
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/06/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: I - A circunstância qualificativa da al. f) do nº 2 do art. 204 do Cod. Penal implica que o objeto trazido pelo agente possa, objetivamente, ser considerado uma «arma».
II - O roubo não é um crime de «mão própria», no sentido de se exigir que todos os participantes cometam atos de violência e de subtração de bens. São comunicáveis a todos os autores as circunstâncias qualificativas que ao caso couberem, como o arrombamento, o escalamento ou o uso de armas, desde que tenham conhecimento (direto, necessário ou eventual), dos atos que preenchem tais circunstâncias.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

No 2º Juízo do Tribunal Judicial de Fafe, em processo comum com intervenção do tribunal coletivo (Proc. nº 269/11.5JABRG), foi proferida sentença que:
A - Condenou o arguido Manuel F...:
1 - na pena de quatro (4) anos de prisão, por um crime de roubo qualificado, na forma consumada, previsto e punido pelo artigo 210º, nºs. 1 e 2, alínea b), e 204º, n.º 2, alínea f), do Código Penal; e
2 - na pena de dois (2) anos de prisão, por um crime de roubo simples, na forma consumada, previsto e punido pelo artigo 210º, nºs. 1 do Código Penal; e
3 – Em cúmulo jurídico destas duas penas parcelares na pena única de quatro (4) anos e oito (8) meses de prisão, nos termos do disposto no artigo 77º, nºs. 1 e 2 do Cód. Penal.

B – Absolveu os arguidos Manuel F... Nuno M... e Armando N....



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O arguido Manuel F... interpôs recurso deste acórdão, suscitando as seguintes questões:
- não se verifica a circunstância qualificativa do 204º, n.º 2, alínea f), do Código Penal, que foi considerada para a agravação de um dos roubos por que foi condnado;
- as penas aplicadas devem ser diminuídas; e
- deve ser suspensa a execução da pena única que for aplicada.
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Respondendo, a magistrada do MP junto do tribunal recorrido defendeu a improcedência do recurso.
Nesta instância, o sr. procurador-geral adjunto emitiu parecer no mesmo sentido.
Cumpriu-se o disposto no art. 417 nº 2 do CPP.
Colhidos os vistos cumpre decidir.
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I – No acórdão recorrido foram considerados provados os seguintes factos (transcrição):

1. Maria J... e Ângela M... partilham uma residência, em Fafe, sita na T..., nesta cidade de Fafe;

2. Ambas praticam a prostituição nessa residência e, com vista a angariarem clientes, colocaram um anúncio no Jornal N..., com contacto para telemóvel n.º 913397...;

3. O arguido Manuel F... combinou, em Maio de 2011, com outros dois indivíduos de identidade concretamente não apurada, ligarem telefonicamente para o número indicado no parágrafo anterior e depois roubarem as prostitutas, quando se encontrassem na residência delas;

4. No âmbito de tal plano, o arguido Manuel F... e os outros dois indivíduos de identidade concretamente não apurada, deslocaram-se à cidade de Fafe, onde Manuel F..., através do telemóvel n.º 910204..., cujas definições da chamada estavam colocadas como número anónimo, ligou para o telemóvel n.º 913397..., por volta das 23 horas e 15 minutos, e foi atendido pela ofendida Ângela M..., cidadã de nacionalidade brasileira, à qual demonstrou interesse em se deslocar à sua residência, dizendo-lhe que o iria fazer na companhia de mais dois amigos, para obterem os seus serviços sexuais;

5. Volvidos 10 a 15 minutos, o arguido Manuel F... e os outros dois indivíduos de identidade concretamente não apurada deslocaram-se para a residência indicada no facto provado número 1., tocaram à campainha, tendo-lhes sido aberta a porta pela ofendida Ângela M... e, como, só aí se encontrassem, naquele momento, o Manuel F... e um dos outros dois indivíduos, a Ângela perguntou-lhes pelo terceiro, ao que estes responderam que esse tinha desistido;

6. O arguido Manuel F... e um dos outros dois indivíduos de identidade concretamente não apurada entraram no apartamento e, por sugestão da Ângela, que lhes disse que uma das meninas ainda estava com um cliente, foram para o quarto da Maria J..., com a qual ficaram a conversar;

7. Decorridos alguns minutos, a Ângela voltou ao quarto da Maria J... e perguntou ao arguido Manuel F... e ao outro indivíduo que o acompanhava se já tinham decidido com qual delas cada um deles pretendia ficar;

8. Nesse momento, o arguido Manuel F..., munido de um objecto com a aparência de uma pistola, que apontou à cabeça da Ângela, referiu-lhe que se tratava de um assalto e que queria dinheiro e jóias, enquanto que o outro indivíduo, empunhando uma faca se dirigiu à ofendida Maria J... e obrigou-a a acompanhá-lo até à porta de entrada do apartamento, que abriu para o terceiro individuo com identidade concretamente não apurada, que aí já se encontrava encapuçado, (com um capuz de uma SWEAT- SHIRT, que envergava, tipo fato de treino) e munido de uma faca, entrasse;

9. De seguida, o arguido Manuel e os outros dois indivíduos exigiram que Maria J... e Ângela M... lhes entregassem o dinheiro e as jóias que tivessem em casa, ao que estas lhes entregaram quantia não inferior a cem euros (€ 100,00) pertencente a ambas, que se encontrava guardada numa gaveta;

10. Depois, o arguido Manuel F..., que empunhava um objecto com a aparência de uma pistola, obrigou a ofendida Ângela a ir para a casa de banho, enquanto que os outros dois indivíduos com identidades concretamente não apuradas, sempre empunhando facas, obrigaram a Maria J... a ir para o seu quarto, exigindo-lhe que lhes entregasse o dinheiro e as jóias que aí guardava;

11. Posteriormente, o arguido Manuel, acompanhado dos outros dois indivíduos, conduziram a Ângela M... até à cozinha e, sempre mediante a exibição do objecto com a aparência de uma pistola e de facas, disseram-lhe que lhes entregasse todo o dinheiro que existisse na casa;

12. A ofendida Ângela M..., temendo pela sua vida, entregou-lhes todo o dinheiro que tinha no valor aproximado de oitocentos euros (€ 800,00);

13. O arguido Manuel e os outros dois indivíduos cujas identidades não foram concretamente apuradas, apoderaram-se ainda do telemóvel da Ângela, de marca Samsung, que contém o cartão SIM 966.796….., no valor de cerca de cento e dezanove euros (€ 119,00);

14. O arguido Manuel e os outros dois indivíduos com identidades não apuradas, antes de abandonarem a residência das ofendidas, pretendiam fechá-las na casa de banho, o que só não fizeram porque foram sensíveis aos apelos da Ângela, que lhes disse para não fazerem isso, porque elas não chamariam a polícia;

15. O arguido Manuel, que agiu em conjugação de esforços e de intentos com os outros dois indivíduos cujas identidades não foram apuradas, sabiam perfeitamente que o dinheiro e objectos de que se apoderaram, lhes não pertenciam e que ao apoderarem-se deles, o faziam contra a vontade e sem autorização das suas legítimas donas;

16. Não se eximiram, para tanto, de utilizarem, fazendo-as temer pela sua integridade física e até pela sua vida, objecto com a aparência de uma pistola e facas, actuando ainda um deles com o rosto tapado por um capuz;

17. O arguido Manuel agiu livre, deliberada a conscientemente, bem sabendo ser a sua conduta proibida.


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Provou-se ainda que:

O arguido Nuno M...:

É o mais novo de 9 filhos de um casal dependente dos rendimentos auferidos pelo pai, como operário da construção civil (por vezes emigrado);

. Abandonou os estudos aos 12 anos de idade, tendo concluído o 3º ano de escolaridade;

Começou a trabalhar como servente da construção civil, após o que passou a exercer a actividade de polimento de móveis, que ainda mantém, sempre com vínculo precário;

Iniciou relação amorosa com a sua actual companheira aos 17 anos de idade, passando a residir, os 20 anos de idade, em união de facto com ela, da qual tem dois filhos com 7 e 3 anos de idade, respectivamente;

À data da prática dos factos dedicava-se, para além da actividade principal de polidor, à recolha e venda de sucata;

A subsistência do seu agregado familiar depende, actualmente, do rendimento social de inserção, no valor de € 461,00, suportando despesas mensais fixas de € 230,00 com arrendamento, água e luz;

Não tem antecedentes criminais.

O arguido Armando N...:

É o terceiro de cinco irmãos, a que acresce uma irmã uterina;

A mãe rompeu a relação com o pai devido à manutenção, por este, de outros relacionamentos afectivos;

O pai manteve relacionamento próximo com os filhos depois da separação, proporcionando algum apoio material ao seu sustento;

O arguido habilitou-se com o 7º ano de escolaridade aos 17 anos de idade;

Começou a trabalhar como servente da construção civil, a título precário, com períodos de inactividade, durante os quais também se dedicou à actividade de apanha de fruta, em Espanha;

À data da prática dos factos, vivia com a mãe, com a namorada e com o irmão, na casa da primeira;

Os rendimentos do agregado familiar são assegurados pelo irmão do arguido (operário da construção civil em Espanha) em cerca de € 700,00 mensais, pela namorada do arguido que aufere € 200,00 mensais, e pela prestação pecuniária de € 57,00, a título de rendimento social de inserção;

O arguido encontra-se preso preventivamente desde o dia 13.12.2011;

Concluiu o 9º ano de escolaridade no Estabelecimento Prisional;

Não tinha, à data da prática dos factos, antecedentes criminais.
O arguido Manuel F...:
É o mais novo de quatro irmãos de família de condição social média;
O pai tinha o hábito do jogo e separou-se da mãe do arguido quando este tinha 17 anos de idade para viver maritalmente com outra pessoa;
O arguido abandonou o sistema de ensino aos 14 anos de idade, com o 5º ano de escolaridade concluído;
Começou a trabalhar na empresa de construção civil do pai, sem receber salário;
Optou depois por outras entidades patronais, tendo estado, no decurso do ano de 2008, emigrado em Espanha, onde trabalhou cerca de 8 meses, e depois em França, onde permaneceu cerca de um ano;
Depois de regressar a Portugal, o arguido residiu só com a sua mãe, doméstica, em casa própria, com boas condições de habitabilidade;
Os bens dos seus pais foram penhorados, incluindo a casa onde moravam;
O arguido empregou-se por conta de uma empresa familiar de montagem de tectos falsos.
Decorridos seis meses, optou por emigrar para França, onde se manteve até Novembro de 2010;
Posteriormente, a casa onde residiam foi penhorada e o arguido, juntamente com os demais elementos do agregado familiar, forma residir para casa arrendada;
Na ocasião da prática dos factos, o arguido não trabalhava e era consumidor esporádico de haxixe;
Tinha, à data da prática dos factos, antecedentes criminais pela prática de: um crime de condução sem habilitação legal pelo qual foi condenado na pena de 60 dias de multa; um crime de furto qualificado, pelo qual foi condenado na pena de três anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo; um crime de furto qualificado, pelo qual foi condenado na pena de dois anos e seis meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo.

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Considerou-se não provado que:
1. Os arguidos Manuel F..., Armando N... e Nuno se conhecem de frequentarem os mesmos cafés em P..., onde residem;
2. Os arguidos combinaram entre si ligarem telefonicamente para as prostitutas com anúncios colocados no Jornal N... e roubarem-nas depois, quando se encontrassem na residência delas;
3. No âmbito de tal plano, entre eles combinado, no dia 16 de Maio de 2011, deslocaram-se no veículo automóvel do arguido Armando, marca Ford Fiesta, de cor vermelha, a esta Cidade de Fafe;
4. O telemóvel com o n.º 910204... era do arguido Armando;
5. Os arguidos Nuno e Armando N... se deslocaram para a residência das ofendidas, tocaram à campainha, tendo o primeiro entrado no apartamento quando a porta foi aberta por Ângela M... e ido para o quarto da Maria J... onde ficou a conversar;
. O arguido Manuel empunhava uma pistola/arma de fogo e os arguidos Nuno e Armando empunhavam navalhas/canivetes;
7. O arguido Armando se encontrava à porta do apartamento, encapuçado (com um capuz de uma SWEAT- SHIRT, que envergava, de cor azul clara, tipo fato de treino), munido de uma navalha/canivete, e entrou no interior do apartamento;
8. A ofendida Maria J..., temendo pela sua vida, entregou aos arguidos cento e setenta euros que tinha na sua bolsa e, como o indivíduo que empunhava a arma de fogo lhe disse que “se encontrasse mais dinheiro lhe dava um tiro nos miolos” entregou mais cinquenta euros, que tinha num bolsa mais pequena;
9. O arguido Armando, que se manteve sempre encapuçado, apoderou-se ainda das jóias que a Maria J... usava, mais concretamente, de um fio, um anel, uma aliança e uma pulseira, artigos estes todos em ouro;
10. Os arguidos Nuno e Armando conduziram a Ângela M... até à cozinha e, sempre mediante a exibição de canivetes/navalhas, disseram-lhe que lhes entregasse todo o dinheiro que existisse na casa;
11. Os arguidos Nuno e Armando apoderaram-se do valor aproximado de oitocentos euros em dinheiro, bem como do telemóvel de marca Samsung, que contem o cartão SIM 966.796.186, pertencentes à ofendida Ângela M...;
12. Os arguidos Nuno e Armando pretendiam fechar as ofendidas na casa de banho;
13. Os arguidos Nuno e Armando agiram em conjugação de esforços e de intentos, sabiam perfeitamente que o dinheiro e os objectos de que se apoderaram lhes não pertenciam e que ao apoderarem-se deles, o faziam contra a vontade e sem autorização das suas legítimas donas, as ofendidas;
14. Os arguidos Nuno e Armando não se eximiram, para tanto, de utilizar, fazendo-as temer pela sua integridade física e até pela sua vida, canivetes/navalhas;
15. O arguido Armando agindo sempre com o rosto tapado por um capuz e empunhando um canivete/navalha, num situação que sabia criar nas ofendidas, como criou, um forte sentimento de medo, fazendo-as temer pela sua integridade física, vida e património, obrigou-as a entregar-lhes os objectos e valores de que se apoderaram.
16. Os arguidos Nuno e Armando sabiam que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
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FUNDAMENTAÇÃO
1 – A qualificação do crime de roubo
O arguido foi condenado por um crime de roubo “simples” e outro qualificado pela circunstância do art. 204 nº 2 al. f) do Cod. Penal, por remissão do art. 210 nº 2 al. b) do mesmo código.
Prevê aquela al. f) que “quem furtar coisa móvel alheia (…) trazendo, no momento do crime, arma aparente ou oculta, é punido com pena de prisão de dois a oito anos”.
O recorrente durante o assalto descrito nos «factos provados» empunhou um objeto “com a aparência de uma pistola” (ponto nº 8 dos «factos provados»).
A fundamentação do acórdão, na parte em que decidiu ter existido um roubo agravado, é contraditória.
Por um lado, definiu o âmbito daquela alínea, considerando que “a arma será aparente se estiver à vista e oculta se não for exibida”. Isto é, “arma aparente” não é a que “parece”, ou tem a “aparência” de arma, mas a que está à vista.
Porém, por outro lado, decidiu estar verificada aquela circunstância qualificativa porque (transcreve-se) “o arguido Manuel empunhou e usou para atemorizar as ofendidas, um objecto com aparência de uma pistola, criando na ofendida Ângela a convicção de que se tratava de verdadeira arma de fogo. Utilizou, por isso, no momento da prática do crime de roubo, uma arma aparente…”.
Há, pois, que tomar aqui posição sobre o alcance daquela norma.
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A circunstância qualificativa da al. f) do nº 2 do art. 204 do Cod. Penal implica que o objeto trazido pelo agente possa, objetivamente, ser considerado uma «arma». O que está em causa é prevenir “o potencial de superioridade de ataque que uma arma traz ao delinquente, uma realidade indesmentível e indiscutível, o que tem como contrapartida uma clara diminuição da defesa que a vítima pode encetar”. Arma é “todo o instrumento que por si só, ou a partir de si, é, objetivamente, apto a ferir ou a matar” – Conimbricense, tomo II, pags. 79 e 80.
Não se demonstrando que o objeto empunhado pelo recorrente tinha tais potencialidades de ferir ou matar, não pode ser considerado uma arma – por todos v. ac STJ de 18-5-06, CJ stj tomo II, pag. 186: “os objetos que aparentam ser armas de fogo, mas que não o são, não integram a circunstância qualificativa do crime de roubo”.
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Ainda assim, embora por razões distintas, o roubo em causa é qualificado pela norma indicada no acórdão recorrido.
O recorrente cometeu-o em coautoria com dois outros indivíduos, que durante o assalto estavam munidos e exibiam facas.
Na execução do crime em coautoria, não é indispensável que cada um dos agentes intervenha em todos os atos de execução, bastando que a atuação de cada um, embora parcial, seja elemento componente do todo e indispensável à produção do resultado Nos termos do art. 26.º do CP, "é punível como autor quem executar o facto, por si mesmo, ou por intermédio de outrem, ou tomar parte direta na sua execução, por acordo ou juntamente com outro ou outros". Daqui resulta que basta que o comparticipante contribua com a sua ação, conjugada com a dos outros, para a realização típica do evento qualificado como crime, ainda que não tenha participação em todos os atos que fazem parte daquele processo de realização.
O roubo não é um crime de «mão própria», no sentido de se exigir que todos os participantes cometam pessoalmente atos de violência e de subtração de bens. Por exemplo, comete este crime (ou o de furto) o agente que fica em missão de vigilância, sendo-lhe comunicáveis as circunstâncias qualificativas que ao caso couberem, como o arrombamento, o escalamento, o uso de armas, etc. Essencial é que tenha conhecimento (direto, necessário ou eventual), dos atos que preenchem tais circunstâncias, pois tal é imperativo dum direito penal fundado na culpa – v. ac. do STJ de 4-2-2002, relator Carmona da Mota, disponível no sítio do ITIJ daquele tribunal, citado no parecer do sr. procurador-geral adjunto.
Sendo certo que o recorrente tinha conhecimento de que os outros usavam facas (cfr. facto nº 8), não pode deixar de ser considerada, também em relação a ele, a circunstância qualificativa.
Improcede, assim, o recurso nesta parte, embora por razões distintas das indicadas no acórdão recorrido.
2 – A pena
Uma primeira nota: o recorrente nasceu em 21 de Fevereiro de 1990 e os factos ocorreram em Maio de 2011. Ao contrário do que alega na motivação (conclusão nº 9), no momento da prática dos crimes já tinha completado 21 anos, pelo que não lhe é aplicável o regime especial para jovens delinquentes previsto no Dec.-Lei 401/82 de 23-9.
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Para o crime de roubo simples, numa moldura de prisão 1 a 8 anos, foi fixada a pena concreta de 2 anos de prisão; para o de roubo agravado, numa moldura de 3 a 15 anos, foi fixada a pena concreta de 4 anos de prisão.
Ou seja, as duas penas situam-se próximo dos limites mínimos, muito abaixo do meio da moldura penal.
Como se sabe, a pena concreta é limitada, no seu máximo inultrapassável, pela medida da culpa – art. 40 nº 2 do Cod. Penal. O limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico. Dentro destes limites, a pena é encontrada em função de exigências de prevenção especial. “Toda a pena que responda adequadamente às exigências preventivas e não exceda a medida da culpa é uma pena justa” – cfr. Figueiredo Dias, Direito Penal, Tomo I, pag. 81.
Noutra obra – As Consequências Jurídicas do Crime – , ao tratar da controlabilidade por via de recurso da medida da pena, o Prof. Figueiredo Dias dá notícia das doutrinas segundo as quais “a questão do limite ou da moldura da culpa estaria plenamente sujeita a revista, assim como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, mas já não a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto da pena, para o qual o recurso de revista seria inadequado”. Aquele nosso maior Mestre conclui considerando que “esta posição é a mais correta…” (pag. 197) – sublinhado do relator.
Ou seja, num recurso interposto pelo arguido, com vista à diminuição da pena aplicada, ele deverá, antes de mais, alegar que foi ultrapassado aquele limite máximo da medida da culpa. Pelo contrário, no recurso interposto pelo Ministério Público para a agravação da pena, terá de demonstrar-se que a pena fixada não garante a satisfação das exigências de prevenção geral positiva. Dentro destas fronteiras, que indicam o máximo e mínimo da pena concreta legalmente admissível, deverá, por regra, prevalecer o prudente critério do tribunal a quo. O direito penal português ainda não aderiu a uma certa ideia de matematização da pena.
Pois bem, sendo a «culpa» o juízo de censura ético-jurídica dirigida ao agente por ter atuado de determinada forma, quando podia e devia ter agido de modo diverso (Eduardo Correia, Direito Criminal, vol. I, pag. 316), tem de concluir-se que é muito elevada. Está em causa o assalto a uma casa onde mulheres se prostituíam, que implicou algum planeamento com antecedência e frieza na execução, que estão espelhados nos factos: o acordo com os comparsas, a deslocação até Fafe, o telefonema a marcar os serviços sexuais, a conversa no quarto com a Maria J... antes de, finalmente, se revelarem como assaltantes. Isto para além dos pormenores da enorme violência usada no assalto.
É uma culpa concreta que consentia penas fixadas acima do meio da moldura.
Por isso, nenhuma censura é possível às penas parcelares fixadas no tribunal recorrido por serem excessivas.
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Não vem especificamente questionada a pena única, para o caso de se manterem as penas parcelares.
Ainda assim, dir-se-á o seguinte.
O art. 77 do Cod. Penal fornece um critério especial para a fixação concreta da pena em caso de concurso, para além das exigências gerais de culpa e prevenção: devem ser considerados em conjunto os factos e a personalidade do agente.
Os «factos» indicam-nos a gravidade do ilícito global perpetrado.
Na avaliação da «personalidade» do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma carreira) criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade – Figueiredo Dias, As consequências Jurídicas do Crime, pags. 190 e ss.
Ora, o arguido já foi condenado por crimes contra a propriedade, o que indicia uma personalidade votada a este tipo de comportamentos, pelo que nenhum excesso houve na fixação duma pena única a 1/3 da moldura do concurso.
Finalmente, nada de objetivo, para além das declarações do arguido de que pretende arrepiar caminho, permite o juízo de que a suspensão da execução da prisão seria suficiente para o afastar da prática de novos crimes.
Na realidade, quando praticou os crimes destes autos, já tinha sido condenado por dois crimes de furto qualificado, em penas cuja execução fora suspensa, estando ainda a decorrer os respetivos períodos de suspensão.
. O que está em causa na decisão sobre a execução da prisão é, antes de mais, a possibilidade de se formular o juízo de que a ameaça da pena e a censura do facto bastarão para afastar o delinquente da criminalidade. Isto é, são razões de prevenção especial. Nada de objetivo permite ajuizar que ajuizar que agora seria diferente do que foi após as anteriores condenações.

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DECISÃO
Os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães negam provimento ao recurso, confirmando o acórdão recorrido.
O recorrente pagará 3 UCs de taxa de justiça.