Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
94/21.5T8EPS-A.G1
Relator: PEDRO MAURÍCIO
Descritores: INVENTÁRIO
FALTA DE RESPOSTA À RECLAMAÇÃO DE BENS
EFEITO COMINATÓRIO SEMIPLENO
CONTAS BANCÁRIAS SOLIDÁRIAS
QUANTIA LEVANTADA ANTES DA MORTE DA INVENTARIADA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/07/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - Por força da entrada em vigor da Lei nº117/2019, de 13/09, o processo de inventário judicial estar configurado como uma verdadeira acção declarativa, sendo que a este processo especial são plenamente aplicáveis os princípios gerais do Código, bem como o regime do processo comum de declaração, com as adaptações necessárias.
II – Em resultado do novo modelo procedimental que lhe foi consagrado na lei processual, e em razão do disposto no art. 549º/1 do C.P.Civil de 2013, é aplicável ao processo de inventário o efeito cominatório semipleno previsto para a processo comum de declaração (nos arts. 574º/1 e 2 e 587º do C.P.Civil de 2013), designadamente quando, notificado nos termos e para os efeitos do art. 1105º/1 do C.P.Civil de 2013, o cabeça-de-casal não responde às reclamações contra a relação de bens deduzidas pelos demais interessados.
III - A titularidade da conta (depósito) distingue-se do direito de propriedade sobre o dinheiro nela depositado, pelo que importa distinguir sempre o aspecto bancário do aspecto real: nas relações com o banco, o titular da conta solidária pode fazer o levantamento da totalidade do depósito, mas tal não significa que a quantia depositada lhe pertença e muito menos que lhe pertença por inteiro. Apesar de qualquer dos depositantes poder exigir do banco a restituição integral do dinheiro depositado, ficando o banco libertado para com os demais credores, a verdade é que na esfera patrimonial do depositante que procede ao levantamento só se inscreve um direito real sobre o numerário se, efectivamente, lhe couber qualquer parte no saldo do depósito e apenas dentro dos limites dessa parte. Portanto, a importância do depósito pode pertencer a todos os titulares, a um só ou a alguns deles ou mesmo a um terceiro.
IV - Sendo os titulares da conta, não proprietários do dinheiro depositado, mas sim meros credores do Banco, então é inteiramente aplicável o enquadramento normativo das obrigações solidárias, regulado nos arts. 512º e ss. do C.Civil, nomeadamente o disposto no art. 516º relativamente à participação no crédito dos credores solidários.
V - Como decorre do disposto no art. 350º/2 do C.Civil, a forma de ilidir tal presunção prevista no referido art. 516º, será a demonstração de que o dinheiro depositado (ou até utilizado) pertence originariamente a um deles ou aos dois mas em diferente proporção.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES,
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1. RELATÓRIO

1.1. Da Decisão Impugnada

Na data de 23/01/2017, AA requereu no Cartório Notarial Dra. BB - Notária, em ..., inventário para partilha de bens por herança da inventariada CC, falecida na data de .../.../2015.
Na data de 03/04/2017, foi proferido despacho que, para além do mais, deferiu o incidente de escusa do cargo de cabeça-de-casal formulado por DD e nomeou, em sua substituição, como Cabeça-de-Casal, EE.
Através de requerimentos apresentados na data de 22/05/2017, o Cabeça-de-Casal apresentou relação de bens, relação de dívidas, e identificação dos herdeiros, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
Na data de 23/05/2017, o Cabeça-de-Casal apresentou requerimento, através do qual juntou nova relação de bens, na qual incluiu veículo automóvel da propriedade da Inventariada que «por mero lapso, não indicou na relação anterior», e juntou certidões matriciais e descrições prediais dos bens imóveis, dando-se aqui por integralmente reproduzido o teor desta nova relação de bens.
Foram efectivadas as citações dos Interessados.
Na data de 12/06/2017, o Interessado AA apresentou reclamação contra a relação de bens, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzida, mas que se transcreve na parte que revela para o presente recurso:

“(…) I) BENS EM FALTA:
A) DINHEIRO:
1. A Inventariada era titular de uma conta bancária no Banco 1....
2. A Inventariada era também titular de uma conta bancária na Banco 2....
3. A totalidade do dinheiro existente nessas contas à data do óbito da inventariada pertencem à sua herança.
4. Falta relacionar os saldos dessas contas à data do óbito da inventariada (…)

TERMOS EM QUE deve ordenar-se a notificação do cabeça-de-casal para relacionar o dinheiro acusado em falta (…)”.
 Na data de 04/07/2017, o Interessado DD apresentou reclamação contra a relação de bens, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzida, mas que se transcreve na parte que revela para o presente recurso:

“B) BENS QUE FALTA RELACIONAR  (…)
A inventariada tinha diversas jóias, que usava e ostentava com frequência, as quais estão em poder do cabeça-de-casal, e que, obviamente, devem ser relacionadas.
Neste momento, não é possível concretizar quais são essas jóias, o que será obtido por via da prova a produzir, nos termos a indicar infra, na sequência da qual deverão ser relacionadas tais jóias (…)
A inventaria era titular de diversas contas bancárias a cujos saldos o cabeça-de casal acedeu abusivamente e das quais fez retiradas de dinheiro em montante que não será inferior a 150.000 euros, fazendo seu tal dinheiro, o que sucedeu nos meses que antecederam a morte da inventariada e também depois dessa morte.
Como tais operações foram feitas à revelia da inventariada, o cabeça-de casal constitui-se na obrigação de repor tais valores à herança, sendo, pois, devedor em conformidade.
De resto, tanto quanto se julga saber, está pendente processo crime contra o cabeça-de-casal a este propósito.
Daqui resulta que devem ser relacionados como créditos da herança sobre o cabeça-de-casal os montantes de que o mesmo se apropriou.
A definição dos montantes em causa será obtida mediante as diligências probatórias a requerer infra.
Termos em que,
Requer que seja admitida a presente reclamação, procedendo-se à alteração da relação de bens em conformidade com quanto antecede (…)”.
Na data de 07/07/2017, a Interessada FF apresentou reclamação contra a relação de bens, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzida, mas que se transcreve na parte que revela para o presente recurso:
“(…) II. DOS BENS EM FALTA NO ARROLAMENTO E RELAÇÃO DE BENS APRESENTADA:
II.I. Valores monetários e Direitos de Crédito (…)
24. Acresce que a inventariada era titular de diversas contas bancárias, que não estão aqui de todo identificadas nem relacionadas,
25. E que o Cabeça-de-casal deve identificar, e juntar os respetivos extratos bancários das operações a crédito e a débito desde janeiro de 2014 até ao presente, para os devidos efeitos.
26. Mais devendo identificar e relacionar todos os produtos financeiros (Certificados de aforro, títulos mobiliários, poupanças-reforma e afins) de que a Inventariada era titular e/ou co-titular, pelo menos desde 2014, designadamente oficiando-se o Banco de Portugal / Autoridade Tributária (esta última através de declaração específica e de fornecimento do modelo 13 da declaração de IRS) para que sejam identificados tais bens e títulos de crédito de que a Inventariada fosse titular e/ou beneficiária.
27. Na realidade, a Inventariada foi durante grande parte da sua vida professora, e muito esparsa e prudente nos seus gastos e hábitos.
28. A Inventariada foi titular e co-titular de diversas contas bancárias, e de outros produtos financeiros cujos saldos o Cabeça-de-casal alegadamente acedeu, de forma inapropriada e abusiva,
29. Daí tendo feito várias retiradas de dinheiro a seu favor e em montante que não será inferior a €150.000,00 (cento e cinquenta mil euros),
30. Montante que fez seu e de que dispôs a seu bel prazer,
31. Em altura que medeia desde os meses anteriores à morte da Inventariada, e em que a mesma já não se encontrava de plena saúde, e
32. Depois de ocorrer o óbito da Inventariada.
33. Todas estas apropriações indevidas, sem título válido e à custa dos interesses da herança e dos herdeiros, devendo tais valores ser restituídos, com os respetivos juros vencidos e vincendos que as respetivas aplicações rendessem.
34. Factualidade essa que se encontra sob investigação no processo crime que corre termos contra o Cabeça-de-casal a este propósito.
35. Devendo a Relação de Bens ser devidamente corrigida no sentido de integrar os bens móveis e títulos de crédito que aqui se elencam genericamente e cuja definição (em espécie e dos valores em questão) resultará das diligências probatórias requeridas a final e a realizar, sem prejuízo de o Cabeça-de-casal se pronunciar sobre a existência e paradeiro dos mesmos, relacionando-os voluntariamente (…)
II.III. Dos Bens Móveis (…)
57. Novamente e sempre sem prescindir, entre os bens móveis de propriedade da Inventariada, estavam diversas jóias, que a Inventariada usava publicamente e a elas se referia, as quais estão em poder do Cabeça-de-Casal (ou de terceiro conhecido) sem que lhe tenham sido validamente transmitidas, e que têm necessariamente que ser relacionadas.
58. Nesses bens móveis, os quais assumem a forma de jóias de grande valor, a sua espécie, quantidade e valor será devidamente identificada por via de prova a produzir, nos termos a indicar infra, sem prejuízo de o Cabeça-de-casal se pronunciar sobre a existência e paradeiro dos mesmos, relacionando-os voluntariamente (…)
Termos em que, e nos melhores que V.ª Ex.ª doutamente suprirá de acordo com o disposto na Lei n.º 29/2009, de 29 de Junho, que aprovou o Regime Jurídico do Processo de Inventário, na redação que lhe foi conferida pela Lei n.º 29/2013,de 19 de abril, se requer se digne admitir a presente reclamação, oficiando-se o Cabeça-de-casal nos exatos termos, e procedendo-se à retificação da relação de bens nos termos antecedentes e que resultem das diligências probatórias a realizar, seguindo-se os ulteriores termos até final (…)”.
Na data de 17/08/2017, os Interessados GG, HH e II apresentaram reclamação contra a relação de bens, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzida, mas que se transcreve na parte que revela para o presente recurso:
“I-Dinheiros:
1° Falta relacionar diversas quantias em dinheiro, que fazem parte do património da inventariada, que se encontravam depositadas no Banco 1..., S.A, bem como outras importâncias depositadas na Banco 2..., S.A. agências existentes no concelho ..., de que os reclamantes desconhecem os montantes exatos até porque são sobrinhos da inventariada (filhos de uma irmã desta, JJ, falecida em .../.../2017).
2° Apenas tendo os reclamantes conhecimento que os montantes se encontravam depositados naquelas instituições bancárias, em contas abertas de que era titular a inventariada.
3° Tendo os reclamantes apurado que os dinheiros depositados, pertença da inventariada, foram levantados pelo cabeça-de-casal, EE, sem conhecimento e consentimento da mesma inventariada, em finais de Dezembro de 2014, após esta ter sido vitima um acidente vascular cerebral (AVC), do qual resultou a paralisação do lado direito do corpo, a impossibilidade de escrever e de ter qualquer manifestação de vontade própria até à data do seu falecimento (.... n.º1).
4° Desconhecendo os reclamantes o destino dado aos sobreditos dinheiros e os valores exatos que se encontravam depositados em contas existentes em nome da inventariada. Com efeito,
5° Apesar das informações solicitadas pelos reclamantes junto do Banco 1..., S.A. e da Banco 2..., S.A., o certo é que estas instituições bancárias se recusaram fornecer-lhes, a coberto do sigilo bancário, a identificação das contas bancárias e de eventuais produtos financeiros de que a inventariada era titular e/ou possuidora, bem como os valores existentes em contas bancárias da inventariada e os montantes dos produtos financeiros de que a inventariada era eventualmente titular ou possuidora.
6° Pelo que se impõe apurar junto daquelas instituições de crédito as contas bancárias e/ou produtos financeiros de que era titular e/ou possuidora a inventariada, bem como os valores exatos existentes nessas contas e os montantes de eventuais produtos financeiros, para uma correta e cabal relação de todos os bens que constituem o património da inventariada, o que infra se irá requerer (…)
III - Objetos de ouro e prata:
8° Falta relacionar diversas joias que fazem parte do acervo hereditário da inventariada, nomeadamente fios, pulseiras, trancelins, alfinetes e anéis, em ouro e prata, e relógios de pulso, que se encontram em poder da interessada, KK.
9° Falta relacionar diversos castiçais e salvas em prata, que se encontravam, à data do óbito, na residência da falecida, sita no Largo ..., da União das Freguesias ... e ..., do concelho ... (…)
Termos em que deve:
a)- Ser relacionados os dinheiros que vierem a apurar-se, como abaixo se irá requerer, que fazem parte do acervo hereditário deixado pela inventariada; (…)
c)- Ser relacionados os objetos de ouro e prata, bens móveis e imóveis, cuja falta acima se acusa; (…)”.
Na data de 06/11/2017, a Interessada LL apresentou reclamação contra a relação de bens, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzida, mas que se transcreve na parte que revela para o presente recurso:
“I – BENS EM FALTA:
a) Dinheiro:
1.º A inventariada possuía pelo menos duas contas bancárias, uma no Banco 1... e outra na Banco 2..., faltando relacionar o saldo dessas contas e outras que porventura existissem à data do óbito e cuja averiguação se requer a final.
2.º Para além disso, o cabeça de casal, ainda em vida da inventariada, foi retirando abusivamente das contas daquela, várias quantias em dinheiro, que fez suas, devendo ser relacionado como um crédito da herança sobre o cabeça de casal o montante que se vier a apurar ter sido subtraído pelo cabeça de casal.
b) Móveis/Jóias:
3.º A inventariada possuía inúmeras jóias em ouro que sempre exibia e que estão em poder do cabeça de casal, designadamente, cordões, fios, brincos, pulseiras, anéis, alfinetes e conjuntos de pérolas.
4.º Por outro lado, a relação de bens correspondente aos bens móveis encontra-se bastante incompleta, faltando relacionar todo o recheio do imóvel da verba 14, designadamente, artigos de arte sacra e de decoração, quadros a óleo e aguarelas, serviços em porcelana, castiçais, salvas e faqueiros em prata, cristais, candelabros, etc (…)
Em face do exposto, requer-se a V. Exa. se digne admitir a presente reclamação, oficiando-se ao Cabeça de Casal nos exatos termos, e procedendo-se à retificação da relação de bens nos termos antecedentes e que resultem das diligências de prova a realizar (…)”.
Na data de 11/12/2018, o Cabeça-de-casal veio apresentar requerimento, no qual consignou “1. Tendo em consideração o teor das reclamações apresentadas à relação de bens por si apresentada, relativamente à alegada apropriação de quantias depositadas em conta bancária, propriedade de CC, pelo aqui Requerente, 2. Requer-se a junção aos autos de despacho de arquivamento proferido pelo Ministério Público, no âmbito do processo n.º 271/15...., que correu termos no DIAP ..., Comarca ...”, documento que apenas juntou com o requerimento apresentado a 29/01/2019.
Na data de 17/01/2021, foi proferido despacho que, para além do mais, se decidiu: “a) – O artigo 12º da Lei 117/2019, na alínea b) do seu n.º 2, estabelece a remessa dos Inventários Notariais para o tribunal competente, a solicitação de qualquer dos Interessados e desde que o processo esteja parado há mais de seis meses. b) - Os presentes autos deram entrada no dia 23/01/2017. c) - Considerando o elevado número de processos de inventário pendentes neste Cartório (acima dos 200), o facto de este Cartório ter sido durante mais de 2 anos Cartório único no concelho, a acumulação de trabalho impediu que o mesmo fosse tramitado. d) - De facto, o presente processo está parado, sem realização de qualquer diligência útil, há mais de 6 meses, pelo que vai o requerido deferido. XV. Nestes termos, REMETA-SE o presente processo para o Tribunal competente – Tribunal Judicial da Comarca ... - Instância Local ..., conforme requerido”, tendo o processo sido remetido ao identificado Tribunal.
Na data 26/04/2021, o Tribunal a quo proferiu decisão a «julgar MM, NN e GG habilitados como sucessores do interessado MM», e proferiu despacho a determinar o cumprimento «do disposto no artigo 1105º, nº 1, do C.P.C., relativamente às reclamações à relação de bens apresentadas».
Na data de 26/04/2021, a secção expediu notificação electrónica ao mandatário do Cabeça-de-casal em cumprimento do referido despacho.
O Cabeça-de-casal não apresentou resposta a qualquer das reclamações supra identificadas.
Foi realizada audiência prévia.
Na data de 12/11/2021, o Cabeça-de-casal apresentou requerimento, no qual consignou, na parte que releva para o presente recurso, o seguinte:
“(…) II. DA NOTIFICAÇÃO NOS TERMOS DO N.º1 DO ART. 1105º DO C.P.C. (…)
9. Constata-se que, nos presentes autos foram apresentadas várias reclamações à Relação de bens, todas elas em meses diferentes,
10. Mas, dos autos apenas consta um despacho, datado de 15/06/2017, proferido ainda pela Notária, de admissão de uma e só uma reclamação à relação de bens.
11. Não constando dos autos admissão das restantes reclamações, assim como, não consta a notificação, ao aqui Interessado/ cabeça-de-casal, nos termos do n.º1 do art. 1105º do C.P.C.
12. Motivo pelo qual, desde já, se requer a V/Exa. notificação do aqui Interessado nos termos do n.º1 do Art. 1105º do CPC,
13. O que desde já requer”.
Na data de 16/11/2021, o Tribunal a quo proferiu o despacho, no qual, para além do mais, decidiu: “No mais, por despacho de 26/4/2021, notificado ao cabeça de casal na pessoa da sua Ilustre Mandatária à data, a 26/4/2021, ref.ª ...58, foi já dado cumprimento ao disposto no artigo 1105º do CPC. Aliás, a audiência prévia só tem lugar findos os articulados. Assim sendo, nada há ordenar a este propósito, indeferindo-se ao requerido”.
Na data de 07/04/2022, o Tribunal a quo proferiu as seguintes decisões (que se transcrevem na parte que aqui releva): 
“I.
Conforme decorre do teor das reclamações à relação de bens, mostra-se em discussão nos presentes autos, além do mais, saber se a inventariada tinha à data do seu óbito quantias em dinheiro depositadas em contas bancárias e noutros instrumentos financeiros.
Por outro lado, decorre igualmente dos articulados que correu termos no DIAP deste Tribunal um processo de inquérito com o nº 271/15...., em que foi arguido o ora cabeça e casal e denunciante o interessado OO em que apurou, além do mais, quais eram as quantias em dinheiro depositadas em contas bancárias e noutros instrumentos financeiros que estavam tituladas pela inventariada à data do seu óbito e nos meses anteriores.
Assim sendo, por ter relevo para os presentes autos, determino a extração de certidão e a junção aos presentes autos de fls. 41, 58 a 111, 269 e 270, 307 a 416, 419 a 420 do inquérito 271/15.....
Devolva-se o inquérito.
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II.
Nos presentes autos de inventário por óbito de CC, o cabeça de casal EE apresentou a relação de bens a fls. 50 a 52.
Citados os interessados e notificado o requerente, viram reclamar:
I) A fls. 99, o interessado AA;
II) A fls. 119, o interessado DD,
III) A fls. 124 a interessada FF;
IV) A fls. 149, os interessados GG, HH e II.
V) A fls. 163, a interessada LL.
Notificado os interessados das reclamações apresentadas, cfm. despacho de fls. 228, ninguém respondeu, concretamente o cabeça de casal não respondeu às reclamações apresentadas
Cumpre apreciar da consequência da falta de resposta às reclamações, impondo-se apreciar e decidir se a falta de resposta da cabeça de casal à reclamação tem efeito cominatório, isto é, se se consideram confessados os factos alegados pelo reclamante.
Salvo o devido respeito, entendemos que a resposta é positiva, a falta de resposta da cabeça de casal tem efeito cominatório.
(…)
Assim sendo, os factos novos invocados pelos reclamantes que não foram contestados, consideram-se, por isso, confessados.
Pelo exposto, julgo confessados os factos invocados pelos reclamantes e, em consequência, indefiro a ulterior produção de prova, passando a conhecer-se das reclamações apresentadas.
**
III.
O cabeça de casal nos articulados de 3/1/2022, ref.ª ...93 e 30/11/2021, ref.ª ...03, além dos documentos que junta, vem pronunciar-se quanto às reclamações à relação de bens apresentadas.
Atento o teor do despacho que antecede e considerando os princípios da concentração da defesa e preclusão, que impunham que o cabeça de casal se houvesse pronunciado quanto às mesmas no momento processual adequado, não se tomará em consideração a defesa entretanto apresentada.
**
IV. Decisão quanto às reclamações à relação de bens
(…)
V. Decisão:
Pelo exposto, julgo:
- totalmente procedente a reclamação apresentada pelo interessado AA;
- parcialmente procedente a reclamação do interessado DD;
- parcialmente procedente a reclamação da interessada FF;
- parcialmente procedente a reclamação dos interessados GG, HH e II;
- parcialmente procedente a reclamação da interessada LL e, em consequência:
1) Determina-se que o cabeça de proceda à alteração relacionação das verbas 12) e 13) da relação de bens, passando a relacionar tais verbas como um só prédio, urbano, na proporção pertencente à inventariada que é de metade;
2) Determina-se que o cabeça de casal relacione como crédito sobre si próprio as quantias existentes nas contas bancárias à data do falecimento da inventariada, assim como as mobilizadas desde .../.../2014 (inclusive), concretamente as quantias referidas em 4) a 6), 10) 11) e 12) dos factos provados;
3) Determina-se que, em complemento das verbas 2) a 10) já relacionadas, o cabeça de casal relacione os restantes bens móveis adquiridos pela inventariada por óbito do seu pai e referidos nas verbas 27) a 37) do inventário ...33, tudo na proporção de 1/7 a favor da inventariada.
4) Determina-se que o cabeça de casal relacione o jazigo referido na verba 47) do inventário ...33 na proporção de 1/7 a que acresce 1/5 de 33/140;
5) Determina-se que o cabeça de casal relacione a verba 14) da relação de bens na proporção de 1/7, a que acresce a proporção de 1/5 de 28/140 e de 479/2100.
6) Determina-se que o cabeça de casal relacione:
- os fios/cordões, pulseiras, trancelins, alfinetes, anéis, em ouro e prata e relógios de pulso e conjuntos de pérolas pertencentes à inventariada;
- os castiçais, faqueiros e salvas de prata existentes na habitação da inventariada;
- os demais objetos que compunham o recheio da habitação da inventariada descritos nas alíneas a) a al) da reclamação à relação de bens dos GG, HH e II, a fls. 150v e 151.
7) Relega-se para a conferência de interessados a aprovação do passivo reclamado pelos interessados GG, HH e II, a fls. 149.
8) Julga-se improcedente o demais reclamado (…)”.
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1.2. Do Recurso do Cabeça-de-casal
Inconformado, o Cabeça-de-casal interpôs recurso de apelação, pedindo que se revogue “o Despacho Saneador, proferido em 08/04/2022, na parte que ordena o cabeça de casal/Recorrente a apresentar nova relação de bens onde relacione como crédito sobre si próprio as quantias existentes nas contas bancárias à data do falecimento da inventariada (.../.../2015), no montante de €102.290 (cento e dois mil e duzentos e noventa euros), os fios/ cordões, pulseiras, trancelins, alfinetes, anéis, em ouro e prata e relógios de pulso e conjuntos de pérolas, castiçais, faqueiros e salvas de prata”, e formulando as seguintes conclusões no final das respectivas alegações:
“I. A necessidade do presente recurso surge na sequência do Despacho Saneador proferido pelo Tribunal de Primeira Instância, em 08 de abril de 2022, no sentido de apresentar relação de bens devidamente corrigida.
II. Fundamentando o Tribunal a quo tal decisão no simples facto de que, o cabeça de casal,
regularmente, notificado das reclamações à relação de bens não apresentou, no momento processual devido a devida respostas às mesmas, pelo que, a falta de resposta à reclamação gera o efeito o cominatório de se terem confessados os factos.
III. Sucede, porém, que, as reclamações à relação de bens não foram e nem se encontram instruídas com quaisquer documentos, autênticos, com força probatória, que lograssem demonstrar tudo quanto alegado.
IV. E a prova disso é que das cinco reclamações apresentadas só uma é que foi totalmente
procedente, todas as restantes foram parcialmente, procedentes, e, isto porque, não estavam acompanhadas de elementos de prova.
V. O que significa que, no caso sub judice, o Tribunal a quo «teve dois pesos e duas medidas» para cada reclamação.
VI. Todavia, atente-se, para o efeito, no facto de que nenhum dos interessados reclamantes
soube quantificar quantos fios, cordões, pulseiras, trancelins, alfinetes, anéis em ouro e prata e relógios de pulso e conjunto de pérolas pertencem à Inventariada.
VII. No mesmo sentido, atente-se que vários interessados reclamantes pediram que se relacionassem duas campas/jazigos, mas como os reclamantes não instruíram os autos com quaisquer documentos que lograssem a existência das mesmas, foram tais reclamações, improcedentes, nesta parte.
VIII. Pelo que decisão igual se impunha, e impõe, não só para as joias, ouro e prata, assim como, para os castiçais, faqueiros e salvas de prata, e demais objetos que compunham o recheio da habitação da inventariada.
IX. Razão pela qual, devem V/Exas. Venerandos Desembargadores, revogar, nesta sede, o Despacho saneador, de que ora se recorre, julgando totalmente improcedentes as reclamações apresentadas por falta de prova.
X. Devendo, também, ser revogado, na parte que ordena que o aqui Recorrente/ cabeça de casal relacione como crédito sobre si próprio as quantias existentes nas contas bancárias à data do falecimento existente na conta sediada no Banco 3... com o IBAN  ...23, e ainda todos os dinheiros que foram depositados e movimentados nas contas bancárias da de cujus.
XI. Tais contas bancárias, sediadas, quer no Banco 3..., agora, Banco 1..., quer na Banco 2... cumpre referir que toda esta matéria foram alvo de um procedimento criminal que deu origem ao processo crime n.º 271/15....,
XII. Processo esse que o Tribunal a quo teve acesso, através de certidão eletróncia, e de onde se pode concluir, como concluiu o Ministério Público que, as contas aqui relacionadas tratam-se de contas, ora Conjuntas, ora solidárias.
XIII. Tal significa que, necessitam os titulares de agir em conjunto para movimentar a conta no primeiro caso e podendo qualquer um dos titulares movimentá-la sem o consentimento dos outros no segundo caso, presumindo-se que as participações dos titulares da conta são iguais, no entanto, a titularidade da conta não se confunde com a propriedade dos respetivos fundos, podendo ser feita a prova de que os titulares não têm comparticipação igual, ou não são mesmo donos dos fundos, ilidindo-se, assim, as referidas presunções (acs. RL 1/02/2007, p.8274/2006, RC 30/05/2006, p. 1582/06, ambos em www.dgsi.pt).
XIV. Ora, conforme resulta de toda a documentação bancária, é inequívoco que, a conta Sediada no Banco 3..., agora, Banco 1..., foi aberta em 16.05.2007 e no dia 29.05.2007 foi ali depositada uma quantia, em numerário, pelo aqui cabeça de casal e a partir dessa data (29.05.2007) não foi depositado naquela conta qualquer outro montante ao longo dos anos.
XV. Documentos esses que o Tribunal a quo teve acesso e que até menciona e transcreve no despacho saneador de que recorremos.
XVI. Por outro lado, também, nenhuma prova documental, para além da existente no processo crime, existe nos autos que vá ao encontro da conclusão do Tribunal a quo, quando afirma que “resulta da matéria de facto provada que a totalidade das quantias aí depositadas eram pertença da inventariada…” (sublinhado e negrito nosso)
XVII. Uma vez mais, o único raciocínio que nos afigura que o Tribunal a quo teve foi, exatamente, ter, aqui, dois pesos e duas medidas, pois, nenhum facto foi alegado pelos Interessados reclamantes que conduzam à propriedade de tal dinheiro por parte da inventariada.
XVIII. Ora, se parte das reclamações foram julgadas improcedentes por falta de discriminação, individualização e concretização de factos, também, nesta sede, deveriam as reclamações serem julgadas improcedentes.
XIX. Quer por falta de prova, mas também, porque está afastada a presunção da comparticipação igual dos montantes depositados na conta do Banco 1....
XX. Por fim, o Recorrente insurge-se ainda contra este despacho saneador, por entender e estar provado que a aludida quantia de €125.375,00 foi por si depositada na conta em causa do banco.
XXI. Anote-se que do processo crime, que foi junto a estes autos, constam todos os elementos de prova que os Reclamantes omitiram e que conduzem a decisão/despacho saneador em sentido contrário.
XXII. E o mesmo se aplica para a conta sediada na Banco 2..., a qual era uma Conta Solidária, pelo que nesta sede e com relevo para os autos, só pode ser questionado os movimentos efetuados após o internamento da de cujus.
XXIII. Razão pela qual, devem V/Exas. Venerandos Desembargadores, fazer uso da presunção do Art. 516º do Cód. Civil, já que nos autos consta matéria que resulta que o dinheiro foi depositado pelo aqui cabeça-de-casal/recorrente, logo, essas quantias são propriedade do mesmo.
XXIV. Pelo que se impõe, a todas luzes, revogar o Despacho Saneador, nesta sede, fazendo, assim, V/Exas. a almejada e sã Justiça”.
Nenhum dos restantes Interessados apresentou contra-alegações.
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O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, em separado, com efeito devolutivo.
Foram colhidos os vistos legais.
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2. OBJECTO DO RECURSO E QUESTÕES A DECIDIR

Por força do disposto nos arts. 635º/2 e 4 e 639º/1 e 2 do C.P.Civil de 2013, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo o Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas (as conclusões limitam a esfera de actuação do Tribunal), a não ser que se tratem de matérias sejam de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, ou que sejam relativas à qualificação jurídica dos factos (cfr. art. 608º/2, in fine, aplicável ex vi do art. 663º, nº2, in fine, e 5º/3, todos do C.P.Civil de 2013).
Mas o objecto de recurso é também delimitado pela circunstância do Tribunal ad quem não poder conhecer de questões novas (isto é, questão que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que “os recursos constituem mecanismo destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando… estas sejam do conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha elementos imprescindíveis”[1] (pela sua própria natureza, os recursos destinam-se à reapreciação de decisões judiciais prévias e à consequente alteração e/ou revogação, não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objeto de apreciação da decisão recorrida[2]).
Neste “quadro legal” e atentas as conclusões do recurso de apelação interposto pelo Cabeça-de-casal, são duas as questões a apreciar por este Tribunal ad quem:
1) se a Inventariada era ou não proprietária de quantias existentes em contas bancárias que devem ser relacionadas;
2) e se a Inventariada era ou não proprietária de «fios/cordões, pulseiras, trancelins, alfinetes, anéis, em ouro e prata e relógios de pulso e conjuntos de pérolas» e de «castiçais, faqueiros e salvas de prata» que devem ser relacionados.
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3. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Os factos que revelam para a presente decisão são os que se encontram descritos no relatório que antecede, e ainda aqueles que o Tribunal a quo considerou como provados na decisão impugnada e que são os seguintes factos:
1) À data do seu óbito a inventariada era titular das seguintes contas bancárias:
A) No Banco 3.../Banco 1...:
1. Banco 3... ...17, do tipo depósito bancário a prazo, encerrada a 30/8/2014;
2. Banco 3...- ...07 do tipo instrumento financeiro;
3. Banco 3... ...64, do tipo instrumento financeiro;
4.  ...23 do tipo depósito à ordem;
B) No banco Banco 2...:
5. ...04, do tipo, abertura de crédito, cartão de crédito;
6.  ...01, do tipo instrumento financeiro,
7.  ...66, do tipo depósito bancário a prazo, encerrada a 9/4/2015;
8.  ...82, do tipo depósito bancário à ordem;
9.  ...89, do tipo depósito bancário à ordem;
10.  ...40, do tipo depósito bancário à ordem;
11.  ...47, do tipo depósito bancário à ordem, conforme documento junto aos autos a fls. 41, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
2) O saldo do depósito a prazo da conta do Banco 1... nº ...17 referida em 1) A) 1., no valor de €102.000 (cento e dois mil euros) foi transferido em 30/8/2014 para a conta do Banco 3...  ...23 referida em 1) A) 4, cfm. fls. 393v do processo de inquérito, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido;
3) A conta referida em A) 4., titulada no Banco 1..., apresentava a 30/12/2014 um saldo de €103.292,06…
4) Data em que o cabeça de casal deu ordem de movimentação, para a conta de EE, a quantia de €102.290, cfm. fls. 296 do processo de inquérito, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
5) Em 18/3/2015 foi mobilizado para a conta de EE a quantia de €594,08. cfm. fls. 296 do processo de inquérito, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido;
6) E em 29/7/2015 foi mobilizado para a conta de EE a quantia de €388,92. cfm. fls. 296 do processo de inquérito, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido;
7) A conta Banco 3...  ...23, referida em 1) A) 4., era do tipo plural, em que a inventariada e o cabeça de casal PP se reconheceram como “depositantes solidários”, conforme fls. 397, do processo de inquérito, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
8) A conta referida em 1) A) 4 foi provisionada em 29/5/2007 com a quantia de €125.375, conforme documento de fls. 309v, do processo de inquérito, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
9) Do documento que titulou o depósito consta:
“Dra. CC
Data 29/5/2007 (…)
Entrega para depósito de numerário/valores em EUR Tot. Numerário: 125.375,00” e mostra-se assinado pelo cabeça de casal, conforme documento de fls. 419 e 420, do processo de inquérito, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
10) A conta bancária referida em B) 7. foi liquidada a 9/7/2015, tendo sido levantada a quantia aí depositada nessa data de €361,20, que era a mesma à data do óbito da inventariada, cfm. fls. 108, do processo de inquérito, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido;
11) A conta bancária referida em B) 8. tinha à data do óbito da inventariada a quantia de 1.205,55…
12) Sendo que a 17/4/2015 foi depositado pela Caixa Geral de Aposentações a quantia de €1.658,71, cf. fls. 101, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
13) A conta referida em B) 9), nunca teve movimentos, conforme fls. 111 do processo de inquérito, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido;
14) A conta referida em B) 10) não tem movimentos desde 2007, conforme fls. 111, do processo de inquérito, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido;
15) A conta bancária referida em B) 11) não tem saldo nem movimentos desde 2013, conforme fls. 111, do processo de inquérito, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido;
16) A totalidade do dinheiro depositado nas contas bancárias referidas em 1) à data do óbito da inventariada era propriedade desta.
17) Assim como eram pertença da inventariada as quantias em dinheiro levantadas pelo cabeça de casal em finais de Dezembro de 2014.
18) Tais levantamentos foram feitos sem conhecimento e consentimento da inventariada, após esta ter sido vítima de um AVC.
19) A propriedade do prédio urbano, composto de casa com dois pavimentos, logradouro e terreno de lavradio, com área coberta de 181m2, logradouro 900m2 e terreno de lavradio de 9,119m2, inscrito na matriz nos artigos ...55 urbano e ...21 rústico, mostra-se registada a favor da inventariada, pela Ap. ... de 1985/95/09, na proporção de metade, conforme documento junto aos autos a fls. 62, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
20) O prédio referido em 15) encontra-se inscrito na matriz urbana no atual artigo ...61º (que proveio do antigo 155º) e na matriz rústica no artigo ...40º (que proveio do antigo 18º e antes do 121º rústicos), conforme documentos juntos aos autos a fls. 55v e 56, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
21) Correu termos no Tribunal Judicial ... o inventário orfanológico nº88/1933, em que foi inventariado QQ, pai da agora inventariada, conforme certidão junta aos autos a fls. 323 a 350, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
22) Nesse inventário, além do mais, foi descrita como verba nº 38 “…Casa torre … sita no Lugar ... …” descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...85, a qual veio a ser adjudicada à inventariada e a cada um dos seus sete irmãos na proporção de 1/7, conforme certidão junta aos autos a fls. 333v, 350, e 350v cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
23) E como verba nº 39º uma “casa em ruínas e eirado de lavradio com ramadas,” sita no Lugar ..., a qual veio a ser adjudicada à ora inventariada, na proporção de ½, conforme certidão junta aos autos a fls. 333v e 350, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
24) E foram relacionados como verbas 27º a 37º, bens móveis aí descritos, os quais vieram a ser adjudicados à ora inventariada, na proporção de 1/7, conforme certidão junta aos autos a fls. 333v e 349 e 350, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
25) E ainda como verba nº 47, um jazigo de família, o qual veio a ser adjudicado à inventariada na proporção de 1/7, conforme certidão junta aos autos a fls. 333v e 349 e 350, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
26) A propriedade do prédio urbano, composto de morada de casa de torre e quintal, lavradio com ramadas, descrito na Conservatória do Registo Predial ... na descrição antiga nº 985 e atual 2191/...29, mostra-se registada a favor de QQ, pela Ap. ... de 1907/11/04, conforme certidão junta aos autos a fls. 64, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
27) Por escritura pública denominada “Partilha”, outorgada a 24 de Fevereiro de 1961, no Cartório Notarial ..., em que intervieram como outorgantes RR, por si na qualidade de representante de SS, TT, JJ, e a inventariada CC, declararam os outorgantes que procederiam à partilha por óbito de UU, conforme escritura pública junta aos autos a fls. 369 a 376, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
28) Aí, declararam os outorgantes pertencer à inventariada, além do mais, como verba nº 3: 28/140 indivisos de uma casa de torre descrita a Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...85º e como verba nº 5: 33/140 indivisos de um jazigo no cemitério ..., conforme escritura pública junta aos autos a fls. a 369 a 376 (concretamente a fls. 374), cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
29) E acordaram em adjudicar à inventariada CC uma quinta parte indivisa das verbas descritas em 28), conforme escritura pública junta aos autos a fls. 369 a 374 (concretamente a fls. 372), cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzido.
30) Por escritura pública, outorgada a 9 de janeiro de 2021 no Cartório Notarial ..., VV, declarou por intermédio de representante vender a CC, inventariada, 479/2100 indivisos do prédio urbano, composto de casas torres e quintal, descrito na Conservatória do Registo Predial ..., sob o nº ...91 e inscrito na matriz no artigo ...87º, conforme certidão junta aos autos a fls. 364 a 366, cujo teor aqui se dá por fiel e integralmente reproduzida.
31) VV era casada com TT, falecido a .../.../2010, sem filhos ou outros herdeiros além da esposa, conforme documento junto aos autos a fls. 377 e 378, cujo teor aqui s dá por fiel e integralmente reproduzido.
Na mesma decisão ora impugnada, o Tribunal a quo considerou inexistirem factos não provados.
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4. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

4.1. Das Quantias Existentes em Contas Bancárias
Os presentes autos dizem respeito a um processo de inventário para proceder à partilha dos bens que constituem a herança da Inventariada CC.
A Lei nº117/2019, de 13/09, para além do mais, alterou o C.P.Civil de 2013, revogando o regime jurídico do processo de inventário aprovado pela Lei nº23/2013, de 05/03, e dando nova redacção aos arts. 1082º a 1135º daquele Código, preceitos estes que passaram a regular os processos de inventário instaurados nos tribunais judiciais a partir de 01/01/2020 (cfr. arts. 11º/1, 1ªparte, e 15º da referida Lei nº117/2019).
Porém, como resulta do disposto na 2ªparte do art. 11º da Lei nº117/2019, a nova redacção daqueles arts. 1082º a 1135º é também aplicável aos processos que, estando pendentes nos cartórios notariais naquela mesma data (01/01/2020), viessem (e venham) a ser remetidos ao Tribunal Judicial, ao abrigo dos arts. 12º e 13º da mesma Lei nº117/2019 (ainda que com sujeição a medidas de gestão processual e de adequação formal previstas no nº4 deste art. 13º).
Como se decidiu no Ac. desta RG de 19/05/2022[3], “1- Os processos de inventário instaurados no domínio de vigência da Lei n.º 23/2013, de 05/03 (RJPI) que se encontrem pendentes em 01/01/2020 (data da entrada em vigor da Lei n.º 117/2019, de 13/09), ficam sujeitos ao regime transitório previsto nos arts. 11º, 12º e 13º da Lei n.º 117/2019, resultando desse regime transitório que: a) há processos de inventário que são de remessa obrigatória e oficiosa pelo notário a tribunal por, na sequência da Lei n.º 117/2019, terem passado a ser da competência material exclusiva dos tribunais (art. 12º, n.º 1 da Lei n.º 117/2019); b) há processos de inventário que não sendo da competência exclusiva dos tribunais, são remetidos a tribunal a requerimento do interessado ou interessados diretos na partilha (art. 12º, n.ºs 2 e 3 da Lei n.º 117/2019); e c) há processos de inventário que permanecem no cartório notarial, onde continuam a ser tramitados de acordo com o regime jurídico do RJPI, à exceção do disposto no n.º 3 do art. 11º da Lei 117/2019 (…) 3- Os processos de inventário instaurados no domínio da RJPI que se encontrem pendentes em 01/01/2020 e que transitem para o tribunal, são remetidos no estado em que se encontrarem, sendo aplicável à tramitação subsequente o regime dos arts. 1082º a 1135º do CPC, introduzido pela Lei n.º 117/2019, cumprindo ao juiz, uma vez ouvidas as partes, fazendo uso dos poderes de gestão processual e de adequação formal, conciliar essa tramitação subsequente com a realizada anteriormente à remessa do processo para o tribunal, a qual seguiu o regime jurídico do RJPI”.
O presente processo de inventário foi instaurado em cartório notarial na data de 23/01/2017, e estando pendente à data da entrada em vigor da Lei nº117/2019 (01/01/2020), foi remetido para Tribunal ao abrigo do disposto nos arts. 12º/2b) e 13º/1 da referida Lei (cfr. despacho proferido em 17/01/2021), pelo que lhe são aplicáveis os arts. 1082º a 1135º do C.P.Civil de 2013, na redacção que lhes foi dada pela Lei nº117/2019[4].
Por força do estatuído no art. 1082º/a) do C.P.Civil de 2013, o processo de inventário destina-se a fazer cessar a comunhão hereditária e proceder à partilha de bens, devendo o cabeça-de-casal relacionar todos os bens sujeitos a inventário, ainda que a administração não lhe pertença (cfr. art. 1097º/3c) do mesmo diploma legal).
Os bens sujeitos a inventário são aquelas que correspondem ao acervo hereditário, o qual, como decorre do disposto nos arts. 2024º, 2025º/1 e 2031º do C.Civil, é integrado pelos bens, direitos e obrigações (isto é, relações jurídicas patrimoniais) de que o de cujus é titular no momento da sua morte e que sejam transmissíveis. Neste sentido ensinava João António Lopes Cardoso[5], “no acervo hereditário compreende-se todos os bens, direitos e obrigações que não sejam considerados intransmissíveis por sua natureza, por força de lei ou por vontade do autor da sucessão”.  
Comentando as alterações introduzidas pela Lei nº117/2019, referem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa[6] que importa sublinhar a vontade de alteração do paradigma a que obedecia o processo de inventário judicial quando era regulado segundo as normas inscritas no CPC de 1961. É este o verdadeiro contraponto do novo regime legal, sendo de notar que recebe os contributos das regras gerais do processo e da acção declarativa, o que especialmente se evidencia pelo que se dispõe acerca da concentração e da preclusão dos actos respeitantes a cada fase processual, como forma de potenciar a celeridade e a eficácia da tramitação (…) É nesta primeira fase (fase dos articulados, que engloba a fase inicial e da oposições e verificação do passivo), em face do requerimento inicial e dos actos e documentos apresentados pelo requerente (arts. 1097º e l099º) ou pelo cabeça de casal judicialmente designado ou confirmado (art. 1100º, nº1, al. b)), que deve ser concentrada a discussão de todos os aspectos essenciais relevantes. Sem embargo das excepções salvaguardadas por regras gerais de processo (Vg. meios de defesa supervenientes) ou por regras específicas do inventario que permitem o diferimento (v.g. avaliação dos bens, incidente de inoficiosidade), cada interessado tem o ónus de suscitar nesta ocasião, com efeitos preclusivos, as questões pertinentes para o objetivo final do inventário (art. 1104º), designadamente tudo quanto respeite à sua admissibilidade, identificação e convocação dos interessados, relacionamento e identificação dos bens a partilhar, dividas e encargos da herança e outras questões atinentes à divisão do acervo patrimonial…” (os sublinhados são nossos).
Relativamente à fase de articulados (que abrange a fase inicial e a fase das oposições e verificação do passivo[7]), resulta do art. 1104º do C.P.Civil de 2013 que os interessados diretos na partilha podem, no prazo de 30 dias a contar da sua citação, deduzir oposição ao inventário, impugnar a legitimidade dos interessados citados ou alegar a existência de outros, e impugnar a competência do cabeça de casal ou as indicações constantes das suas declarações, e apresentar reclamação à relação de bens, e/ou impugnar os créditos e as dívidas da herança (nº1), faculdades estas que também podem ser exercidas, com as necessárias adaptações, pelo requerente do inventário ou pelo cabeça de casal (nº2).
Pronunciando-se precisamente sobre o preceito contido no referido art. 1104º, explicam Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa[8] que “tal corresponde a um verdadeiro ónus e não a uma mera faculdade, já que o decurso do prazo de 30 dias determina, por regra, efeitos preclusivos quanto a tais iniciativas, sendo que a não impugnação dos elementos factuais e documentais vertidos nas alegações do requerente de inventário ou do cabeça de casal tem os efeitos previstos nos arts. 566º, 567º e 574º ex vi art. 549º, n°1. Mantêm-se as excepções ao efeito cominatório semipleno decorrentes dos arts. 568° e 574, nºs 2 a 4 (…)”.
Especificamente sobre a reclamação contra relação de bens com fundamento na insuficiência, no excesso ou na inexatidão da descrição ou do valor, realçam os mesmos autores[9] que “Contrariando a solução prevista no art. 1348° CPC de 1961, a reclamação relativa à relação de bens não suporta o diferimento que tal regime permitia. Uma vez que os bens são relacionados pelo cabeça de casal e só depois se procede a citação dos interessados, facilmente se compreende que também tenha sido marcado um prazo perentório para o exercício do direito de defesa mediante reclamação, de modo que, uma vez exercido o contraditório e produzidas as provas pertinentes, as questões atinentes ao ativo e passivo da herança estejam definitivamente decididas quando for convocada a conferência de interessados (…) Os motivos que levaram a antecipar, com efeitos preclusivos, a discussão em torno dos bens que integram a herança indivisa são semelhantes aos que estiveram na base da antecipação do ónus de impugnação de créditos e dívidas da herança, evitando que questões de tamanho relevo para a partilha pudessem ficar a pairar até à conferência de interessados, como permitia o art. 1353° do CPC de 1961”[10].
Por seu turno, estatui o art. 1105º do mesmo diploma legal (na parte que aqui releva): “1 - Se for deduzida oposição, impugnação ou reclamação, nos termos do artigo anterior, são notificados os interessados, podendo responder, em 30 dias, aqueles que tenham legitimidade para se pronunciar sobre a questão suscitada. 2 - As provas são indicadas com os requerimentos e respostas. 3 - A questão é decidida depois de efetuadas as diligências probatórias necessárias, requeridas pelos interessados ou determinadas pelo juiz, sem prejuízo do disposto nos artigos 1092.º e 1093.º” (isto é, sem prejuízo do Juiz determinar a suspensão da instância no caso de verificação de uma das situações elencadas nas alíneas do nº1 do referido art. 1092º ou determinar a remessa dos interessados para os meios comuns caso se verifique a «inconveniência» da apreciação da questão prevista no nº1 do referido art. 1093º).
Pronunciando-se sobre este art. 1105º, explicam Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa[11] que “À semelhança do que se prescreve para o Requerente, nos termos do art. 1104º, nº2, também vigoram para o requerido ou requeridos visados os princípios da preclusão e da concentração, de modo que qualquer resposta deve ser apresentada naquele prazo perentório”, frisando que: A não ser que a lei disponha de modo diverso, por aplicação supletiva das regras gerais, a falta de resposta, quanto aos fundamentos da contestação ou a algum facto novo aduzido, determina a aplicação do efeito cominatório semipleno, nos termos da conjugação dos arts. 549º, nº1 e 587º, nº1. Assim, como regra geral e sem embargo das exclusões gerais (v.g. prova documental necessária), ocorre a admissão dos factos que não tenha sido impugnados por qualquer dos requeridos diretamente interessados na sua resposta, ou antecipadamente. Contudo, a resposta apresentada por um interessado, na medida em que se projete também na posição sucessória ou creditícia de outros interessados, é suficiente para tornar controvertido o facto em causa quanto a estes interessados” (o sublinhado é nosso).
Esta aplicabilidade do efeito cominatório semipleno previsto para a processo comum de declaração (nos arts. 574º/1 e 2 e 587º do C.P.Civil de 2013) ao processo de inventário (e especificamente ao regime da reclamação de bens) alicerça-se no novo modelo procedimental consagrado na lei processual: por força da entrada em vigor da Lei nº117/2019, de 13/09, o processo de inventário judicial está configurado como uma verdadeira acção declarativa, sendo que a este processo especial são plenamente aplicáveis os princípios gerais do Código, bem como o regime do processo comum de declaração, com as adaptações necessárias[12]. E também decorre do disposto no art. 549º/1 do C.P.Civil de 2013 que estabelece que à tramitação do inventário são aplicáveis as disposições da parte geral do Código, bem como as regras do processo civil de declaração que se mostrem compatíveis com o processo de inventário judicial.
No caso em apreço, tendo o Cabeça-de-Casal apresentado a relação de bens, que posteriormente corrigiu (cfr. os seus requerimentos de 22/05/2017 e de 23/05/2017), foram apresentadas cinco reclamações contra a relação de bens (uma pelo Interessado AA; uma pelo Interessado DD; uma pela Interessada FF; uma pelos Interessados GG, HH e II; e uma pela Interessada LL).
Notificado nos termos e para os efeitos do art. 1105º/1 do C.P.Civil de 2013 (notificação determinada pelo despacho de 26/04/2021, tendo a Secção enviado a respectiva notificação electrónica ao mandatário em 26/04/2021), o Cabeça-de-casal não apresentou resposta a qualquer das cinco reclamações.
Apesar disto (e através de conduta que roça a litigância de má fé), através de requerimento datado 12/11/2021, o Cabeça-de-casal veio alegar que «não consta a notificação, ao aqui Interessado/ cabeça-de-casal, nos termos do nº1 do art. 1105º do C.P.C.» e requerer «a notificação do aqui Interessado nos termos do n.º1 do Art. 1105º do CPC», tendo o Tribunal a quo, por despacho de 16/11/2021, indeferido tal pretensão, considerando que «já fora dado cumprimento ao preceito em causa», despacho este que se encontra transitado em julgado uma vez que aquele não interpôs recurso do mesmo  conjuntamente com a apelação da decisão de saneamento do processo [cfr. art. 1123º/2a) e 4 do C.P.Civil de 2013].
Nesta sequência, e de forma prévia ao proferimento da decisão impugnada pelo presente recurso, na data de 07/04/2022, o Tribunal a quo proferiu despacho, no qual considerou que «a falta de resposta do cabeça-de-casal às reclamações tem efeito cominatório» e decidiu «julgar confessados os factos invocados pelos reclamantes e, em consequência, indeferir a ulterior produção de prova, passando a conhecer-se das reclamações apresentadas» (o sublinhado é nosso), despacho este que também se encontra transitado em julgado uma vez que  Cabeça-de-casal não interpôs recurso do mesmo conjuntamente com a apelação da decisão de saneamento do processo [cfr. art. 1123º/2a) e 4 do C.P.Civil de 2013].
Daqui resulta que, perante a falta de resposta do Cabeça-de-Casal às cinco reclamações deduzidas contra a relação de bens, o Tribunal a quo aplicou o efeito cominatório semipleno previsto no art. 587º/1, que remete para o disposto no art. 574º/1 e 2, e que são aplicáveis ao processo de inventário ex vi do art. 549º/1, todos do C.P.Civil de 2013, o que, aliás, é reconhecido por aquele na conclusão «II», embora seja errado o afirmado na 1ª parte desta mesma: como adiante se explicará, o Tribunal a quo não fundamentou a decisão impugnada «no simples facto» da aplicação daquele efeito cominatório semipleno.
Embora do conjunto das cinco reclamações resulte um objecto muito mais vasto e embora a decisão impugnada («Decisão quanto às reclamações à relação de bens») contenha um decisório com maior amplitude, através do presente recurso, o Cabeça-de-casal apenas pretende impugnar parcialmente a decisão, sendo que, no âmbito desta primeira questão, está em causa a pretensão recursiva relativamente ao ponto 2) do decisório [«determina-se que o cabeça de casal relacione como crédito sobre si próprio as quantias existentes nas contas bancárias à data do falecimento da inventariada, assim como as mobilizadas desde .../.../2014 (inclusive), concretamente as quantias referidas em 4) a 6), 10) 11) e 12) dos factos provados»], ponto que o Recorrente pretende que seja revogado por entender que as quantias em causa são da sua propriedade (cfr. conclusão XXIII).
Vejamos.   
Acompanha-se a decisão recorrida no que toca à fundamentação jurídica desenvolvida quanto à questão da propriedade dos saldos depositados em contas bancárias e quanto ao momento em que deverão ter sidos em consideração (só na data do óbito ou também movimentações anteriores), a qual não foi, aliás, objecto de qualquer impugnação em sede de recurso. Acrescentam-se, no entanto, as seguintes considerações jurídicas.
O contrato de depósito bancário, em sentido amplo, pode definir-se como sendo o contrato pelo qual uma pessoa (depositante) entrega a um banco (depositário) uma soma em dinheiro ou bens móveis de valor, para que este os guarda e restitua quando o depositante o solicitar e que, em sentido restrito, pode ser definido como o contrato pelo qual uma pessoa entrega uma quantia pecuniária a um banco, o qual dela poderá livremente dispor, obrigando-se a restituí-la, mediante solicitação e de acordo com as condições estabelecidas (também denominado de depósito bancário de disponibilidades monetárias)[13].
O contrato de depósito bancário tem sido considerado, pela Doutrina e Jurisprudência, como sendo um depósito irregular, aplicando-se-lhe na medida do possível, as normas concernentes ao mútuo conforme decorre do art. 1206º do C.Civil[14] (o banqueiro adquire, assim, a titularidade do dinheiro que lhe é entregue, sendo cliente um simples credor; o que verdadeiramente importa para o depositário é a obrigação de restituir  «outro tanto do mesmo género ou qualidade» - cfr. art. 1142º do C.Civil -, ou seja, no caso, restituir numerário em quantitativo igual ao depositado).
Na sua acepção estrita (ou própria), trata-se duma operação que surge sempre associada/ligada a uma abertura de conta, de tal modo que, em regra, o banqueiro já deu o seu assentimento genérico: ele mais não pode fazer do que aceitar as diversas manifestações da sua concretização. De facto, quando é efectuado um depósito bancário, este dá origem à abertura de uma conta, constituindo esta a expressão contabilística do depósito (ou depósitos) efectuado, já que é nessa conta que se vão registando todas as entregas feitas pelo cliente ao abrigo do contrato de depósito inicialmente celebrado, bem como todos os levantamentos das quantias nela depositadas.
A conta bancária (associada ao respectivo contrato) tanto pode ser individual ou singular, como colectiva ou conjunta: no primeiro caso, figura como titular uma única pessoa, ao passo que na segunda hipótese figuram como titulares duas ou mais pessoas.
As contas colectivas podem ser conjuntas ou solidárias: no primeiro caso, a sua movimentação exige a intervenção simultânea de todos os seus titulares; no segundo caso, podem ser movimentadas livremente por um só dos titulares, ficando o banqueiro desonerado pela entrega da totalidade do saldo a quem lho pedir (como se refere no Ac. do STJ de 01/10/2015[15], Nas contas de depósito solidárias (….) qualquer um dos titulares tem a faculdade de exigir, por si só, a prestação integral, ou seja, o reembolso de toda a quantia depositada, caso em que a prestação assim efectuada liberta o devedor (banco depositário) para com todos eles [cf. art.º 512.º do Código Civil (CC)]. Este regime, assenta numa relação de confiança entre os contitulares, que não desconhecem a possibilidade de apenas um deles reclamar a totalidade do saldo”).
Porém, a titularidade da conta (depósito) distingue-se do direito de propriedade sobre o dinheiro nela depositado. Já no Ac. do STJ de 25/02/81[16] se assinalava que “o problema da titularidade do depósito ou da conta aberta não se confunde com o da propriedade do dinheiro depositado e que poderá ser levantado, por qualquer dos meios contemplados na lei, por qualquer dos contitulares da conta. O direito de crédito dimanado da relação obrigacional ou creditória, oriunda do contrato ou acordo de depósito, que pode ser exercido por qualquer dos titulares da conta ou depósito, sendo o estabelecimento bancário o devedor, distingue-se do direito real sobre a mercadoria-dinheiro que fora depositado».
Na mesma linha de entendimento, ensinava José Gabriel Pinto Coelho[17]: “Esquece-se, com efeito, por vezes, que a relação jurídica que nasce da abertura da conta de depósito é uma relação jurídica de obrigação e confunde-se o direito de crédito desta emergente para os titulares da conta com a propriedade dos bens objecto de depósito, isto é, com o direito real sobre este. O depositante, como credor solidário, tem apenas um direito de crédito, isto é, o direito a receber a prestação a que está adstrito o devedor, o direito de extinguir a entrega do depósito. Mas esse direito não pode confundir-se com a propriedade da quantia depositada; é atribuído por igual a todos os titulares da conta, e a importância do depósito pode pertencer a um só deles ou mesmo a um terceiro e é evidente que, na totalidade, não pode integrar-se no património ou constituir riqueza de todos».
Isto significa que importa distinguir sempre o aspecto bancário do aspecto real: nas relações com o banco, o titular da conta solidária pode fazer o levantamento da totalidade do depósito, mas tal não significa que a quantia depositada lhe pertença e muito menos que lhe pertença por inteiro. Apesar de qualquer dos depositantes poder exigir do banco a restituição integral do dinheiro depositado, ficando o banco libertado para com os demais credores, a verdade é que na esfera patrimonial do depositante que procede ao levantamento só se inscreve um direito real sobre o numerário se, efectivamente, lhe couber qualquer parte no saldo do depósito e apenas dentro dos limites dessa parte. Portanto, a importância do depósito pode pertencer a todos os titulares, a um só ou a alguns deles ou mesmo a um terceiro.
Neste sentido se pronunciou o Ac. do STJ de 15/11/2017[18]: “I - A conta bancária colectiva solidária é caracterizada pela faculdade conferida a cada um dos seus titulares de exigir a prestação integral, ou seja, o reembolso pelo banco depositário de toda a quantia que lhe foi entregue. II - Tal regime vigora independentemente de quem seja, de facto ou de direito, o dono dos valores ou fundos nela depositados. III - A titularidade da conta não predetermina a propriedade dos fundos nela contidos, que pode pertencer apenas a algum ou alguns dos seus titulares ou mesmo até porventura a um terceiro”.
Sendo os titulares da conta, não proprietários do dinheiro depositado, mas sim meros credores do Banco, então é inteiramente aplicável o enquadramento normativo das obrigações solidárias, regulado nos arts. 512º e ss. do C.Civil, nomeadamente o disposto no art. 516º relativamente à participação no crédito dos credores solidários, preceito este que estatui: “Nas relações entre si, presume- -se que os devedores ou credores solidários comparticipam em partes iguais na dívida ou no crédito, sempre que da relação jurídica entre eles existente não resulte que são diferentes as suas partes, ou que um só deles deve suportar o encargo da dívida ou obter o benefício do crédito”.
Explica-se no Ac. do STJ de 24/05/2022[19] que “na conta coletiva «solidária» - como era o caso - o direito que está em causa, em relação ao banco, é o direito que qualquer dos titulares tem de poder movimentar sozinho e livremente a conta, direito este que, é absolutamente pacífico, está dissociado da propriedade das quantias depositadas (…), se deve presumir igual entre todos os titulares da conta (cfr. artigo 516.º do C. Civil)”.
Embora seja de separar o regime da movimentação da conta (e dos depósitos) do problema da propriedade dos fundos, porquanto a abertura daquela, só por si, não é adequada a alterar a relação anteriormente existente entre os titulares quanto à propriedade dos valores com que nela entraram, certo é que o legislador optou por uma solução simplificadora para a definição substantiva desse direito de propriedade, olhando à forma ou tipo de movimentação de conta escolhido, sendo que, ao consagrar a presunção constante do art. 516º, o legislador parte do princípio de que o depósito foi efectuado com dinheiro dos titulares disponibilizado em partes iguais[20].
Como decorre do disposto no art. 350º/2 do C.Civil, a forma de ilidir tal presunção será a demonstração de que o dinheiro depositado (ou até utilizado) pertence originariamente a um deles ou aos dois mas em diferente proporção.
Explica-se no Ac. do STJ de 27/01/98[21], “Aquela presunção justifica-se pela normal dificuldade de prova da quota de cada um dos credores e, como é próprio das diversas presunções, assenta num pressuposto de probabilidade ou normalidade”, pelo que “o meio mais directo e frontal de se ilidir a presunção” é “a prova da exclusão do seu pressuposto, ou seja, de o depósito não ter sido feito com dinheiro, em partes iguais, dos titulares da conta, independentemente do motivo do regime da conta”.
Neste enquadramento, podemos assentar que:
- nas contas solidárias, há sempre que distinguir entre a titularidade da conta e a propriedade dos fundos, uma vez que a designação «solidária» exprime apenas e exclusivamente a disponibilidade dos valores depositados na conta, independentemente de quem seja de facto e juridicamente o proprietário desses valores;
- suscitando-se dúvidas sobre quem é o verdadeiro proprietário dos fundos de uma conta solidária, impõe-se apurar se tais fundos são pertença de apenas um dos titulares ou se são pertença de todos os titulares da conta;
- caso não se consiga apurar a qual dos titulares pertence o dinheiro, impõe presumir-se, à luz do disposto no art. 516º do C.Civil, que tal dinheiro pertence em partes iguais a cada um dos titulares da conta;
- caso se apure que o dinheiro da conta é pertença de todos os titulares (e não apenas de um deles), mas não se conseguia apurar qual a fracção correspondente a cada um deles, mantém-se a presunção no art. 516º do C.Civil (tal dinheiro pertence em partes iguais a cada um dos titulares da conta);
- e caso se apure que é pertença de apenas um dos titulares, ou, sendo pertença de pertença de todos eles, se apure que tal propriedade respeita a fracções (valores) distintas/diferentes, fica afastada a presunção do art. 516º do C.Civil.
Este entendimento aplica-se aos saldos (quantias) existentes nas contas bancárias solidárias de que o de cujus fosse titular à data do respectivo óbito, ou seja, à data da abertura da sucessão (cfr. art. 2024º do C.Civil), devendo ser relacionado (porque integra o acervo hereditário) o valor cuja propriedade for reconhecida e atribuída ao inventariado (50% em função da aplicação da aludida presunção, 100% caso se prove que era o proprietário exclusivo do saldo, ou “x%” caso se prove que era proprietário de uma concreta fracção).
Já no que respeita aos valores (dinheiro) movimentados a débito por outro co-titular a partir de uma conta bancária solidária, da qual o de cujus também era (co-)titular, apenas integrará o acervo hereditário e deverá se relacionado, como crédito da herança, sobre esse co-titular (que pode ser ou não Interessado), se se alegar e se se demonstrar a ilicitude da respectiva operação de débito, por terem sido feitas contra a vontade do inventariado (titular da quantia em causa) ou que o acto de transmissão está legalmente inquinado, cabendo o ónus de prova a quem pretenda que tal valor (ou valores) seja incluído na relação de bens[22].
Neste sentido, decidiu-se no Ac. do STJ de 01/01/2015[23], II - Apesar de se ter provado que o saldo existente numa conta solidária pertencia em exclusivo à co-titular inventariada, não se pode considerar que a transferência dessa importância para uma conta bancária da outra co-titular constitua um crédito da massa da herança sobre esta última (e, consequentemente, pela obrigatoriedade da sua restituição à herança) sem que se demonstre que essa transferência é ilícita [v.g. por não ter sido consentida pela proprietária das importâncias depositadas ou por o acto de transmissão inter-vivos estar legalmente inquinado], tanto mais que tal acto ocorreu antes do decesso da de cujus. III - Incumbia a quem pretende a inclusão, na relação de bens, da verba referida em II a prova dos factos demonstrativos da ilicitude da movimentação aí mencionada”.
No caso em apreço, atento o manancial factual provado (cfr. factos provados nºs. 1 a 9), ficou probatoriamente demonstrado que, à data do seu óbito, a inventariada era titular das seguintes contas bancárias no Banco 3.../Banco 1...:
- «Banco 3... ...17», do tipo depósito bancário a prazo, encerrada a 30/8/2014, cujo saldo do depósito no valor de €102.000 (cento e dois mil euros) foi transferido em 30/8/2014 para a conta do «Banco 3...  ...23»
- «Banco 3...- ...07» e «Banco 3... ...64», ambas do tipo instrumento financeiro;
- « ...23» do tipo depósito à ordem, e era do tipo plural, em que a inventariada e o cabeça de casal PP se reconheceram como “depositantes solidários”, a qual apresentava a 30/12/2014 um saldo de €103.292,06, data em que o cabeça de casal deu ordem de movimentação, para a conta de EE, a quantia de €102.290, sendo que na data de 18/3/2015 foi mobilizado para a conta de EE a quantia de €594,08, e na data de 29/7/2015 foi mobilizado para a conta de EE a quantia de €388,92;
- e a referida conta « ...23» foi provisionada em 29/5/2007 com a quantia de €125.375, constando do documento que titulou o depósito “Dra. CC Data 29/5/2007 (…) Entrega para depósito de numerário/valores em EUR Tot. Numerário: 125.375,00” e mostra-se assinado pelo Cabeça-de-casal.
Atento, de novo, o manancial factual provado (cfr. factos provados nºs. 1 e 10 a 15), mais ficou probatoriamente demonstrado que, à data do seu óbito, a inventariada era titular das seguintes contas bancárias no banco Banco 2...:
- «...04», do tipo, abertura de crédito, cartão de crédito;
- « ...01», do tipo instrumento financeiro;
- « ...66, do tipo depósito bancário a prazo, encerrada a 9/4/2015 e liquidada a 9/7/2015, tendo a sido levantada a quantia aí depositada nessa data de €361,20, que era a mesma à data do óbito da inventariada;
- « ...82», do tipo depósito bancário à ordem, que tinha à data do óbito da inventariada a quantia de 1.205,55, sendo que a 17/4/2015 foi depositado pela Caixa Geral de Aposentações a quantia de €1.658,71;
- e « ...89», « ...40» e « ...47», todas do tipo depósito bancário à ordem, sendo que a primeira nunca teve movimentos, a segunda não tem movimentos desde 2007, e terceira não tem saldo nem movimentos desde 2013.
Por fim, atento o manancial factual provado, mais ainda ficou demonstrado que a totalidade do dinheiro depositado nas contas bancárias supra referidas, à data do óbito da inventariada, era propriedade desta, e que também eram pertença da inventariada as quantias em dinheiro levantadas pelo cabeça de casal em finais de Dezembro de 2014, sendo que tais levantamentos foram feitos sem conhecimento e consentimento da inventariada, após esta ter sido vítima de um AVC (cfr. factos provados nºs. 16 a 18).
Perante tal “quadro” probatório, verifica-se que, à data do seu óbito, a Inventariada era titular de 11 (onze) contas bancárias (4 no Banco 3.../Banco 1... e 7 na Banco 2...), das quais 8 (oito ) não registavam qualquer saldo, tal como não registaram qualquer movimento antes de Dezembro de 2014 (data em a Inventariada sofreu um AVC), relativamente às quais inexiste, portanto, qualquer valor (quantia) que deva ou possa ser incluída na relação de bens (são concretamente as contas «Banco 3... ...17», «Banco 3...-...07» e «Banco 3... ...64», e as contas da Banco 2... «...04», « ...01», « ...89», « ...40» e «...01
...47»).
Assinale-se que a decisão recorrida não se pronunciou directamente sobre tais contas, mas sim apenas por via indirecta, em resultado de não ter determinado qualquer relacionamento relativamente às referidas sete contas, o que se revela correcto, e, por isso, se acompanha.  
O mesmo “quadro” probatório mais permite verificar que, daquelas 11 (onze) contas bancárias, 2 (duas) da Banco 2... apresentavam saldos bancários à data do óbito: a « ...66», com um saldo de € 361,20, mas que foi levantado em 09/07/2015; e « ...82», com um saldo de € 1.205,55, ao qual acresceu, em 17/4/2015, a quantia de €1.658,71.
Uma vez que não ficou provado estas duas contas (ou alguma delas) tivessem outro titular para além da inventariada, estamos perante contas individuais, o que, desde logo, afasta a aplicação da presunção prevista no art. 516º do C.Civil, acrescendo que, estando provado que as quantias nelas depositadas eram da propriedade da inventariada à data da abertura da sucessão, então devem serem objecto de inclusão na relação de bens, porque fazem parte da herança, mas devem ser relacionadas como saldos bancários e não como crédito da herança sobre o Cabeça-de-casal (existiam à data da morte, não tendo sido objecto de movimentação por este antes do óbito). Deste modo, subscreve-se a decisão recorrida na parte em que determina que sejam relacionadas, mas já não se acompanha a mesma na parte em que determinou que fossem relacionadas «como crédito da herança sobre o Cabeça-de-casal». Frise-se que a questão do levantamento do saldo de € 361,20 em data posterior ao óbito, não pode nem deve ser apreciada neste recurso.
O “quadro” probatório que está sob análise permite igualmente comprovar que, daquelas 11 (onze) contas bancárias, 1 (uma) do Banco 3.../Banco 1... era uma conta solidária que tinha como titulares a Inventariada e o Cabeça-de-Casal (« ...23»), conta esta que foi objecto de três movimentos de débito realizados pelo Cabeça-de-casal (co-titular) em momento anterior ao decesso da Inventariada: em 30/12/2014 o valor de € 103.292,06, em 18/3/2015 o valor de € 594,08, e em 29/7/2015 o valor de € 388,92, todos mobilizados para a conta de EE.
Uma vez que se trata de conta solidária mostrar-se-ia aplicável a presunção estatuída no art. 516º do C.Civil.
Sucede que, tal presunção foi ilidida uma vez que os Interessados Reclamantes lograram provar (tal como lhes incumbia em exclusivo) aquelas quantias debitadas/movimentadas pelo Cabeça-de-Casal eram pertença da Inventariada.
Acresce que os Interessados Reclamantes mais lograram demonstrar (tal como também lhes incumbia em exclusivo) que os três referidos débitos/movimentos foram realizados de forma ilícita pelo Cabeça-de-casal porque foram feitos sem conhecimento e consentimento da Inventariada, e em momento posterior a esta ter sido vítima de um AVC.
Neste contexto, conclui-se que o valor total dos três referidos débitos/movimentos constitui um crédito que integra o acervo hereditário, devendo ser relacionado (aqui sim) como um crédito da herança sobre o cabeça-de-casal, acompanhando-se também, neste parte, a decisão recorrida.
 Nenhum das conclusões «III», «IV», «X» a «XXIII» formuladas pelo Recorrente é susceptível de colocar em causa ou modificar as conclusões supra alcançadas.
A alegação de que «as reclamações à relação de bens não foram e nem se encontram instruídas com quaisquer documentos, autênticos, com força probatória, que lograssem demonstrar tudo quanto alegado» é completamente infundado: nenhum dos factos considerados provados na decisão recorrida configura matéria cuja demonstração probatória apenas pudesse ser realizada através de documento autêntico, sendo certo que o Recorrente omite a concretização de qual é factualidade que exige tal tipo de prova documental, tal como omite a identificação do documento autêntico que devia ter sido apresentado nos autos.
Também infundada se revela a alegação de que «das cinco reclamações apresentadas só uma é que foi totalmente procedente, todas as restantes foram parcialmente, procedentes, e, isto porque, não estavam acompanhadas de elementos de prova»: a Recorrente olvida que, na sequência da sua falta de resposta a todos as reclamações, o Tribunal a quo aplicou o efeito cominatório semipleno, consistente na confissão pelo cabeça-de-casal dos factos alegados nas reclamações, o que é completamente distinto da aplicação de um efeito cominatório pleno; ora, o Tribunal a quo analisou juridicamente cada uma das reclamações deduzidas em face dos factos provados por confissão (e também da prova documental que já se encontrava nos autos), o que conduziu à procedência de alguns das pretensões e à improcedência de outras, como resulta claramente da decisão recorrida, inexistindo, obviamente, qualquer princípio ou preceito legal que impunha o deferimento ou o indeferimento simultâneo de todas as reclamações!
As alegações referentes «ao processo crime n.º 271/15.... e à conclusão do Ministério Público sobre as contas aqui relacionadas tratam-se de contas, ora conjuntas, ora solidárias» mostram-se totalmente irrelevantes já que, como o Recorrente bem sabe, a decisão proferida em sede de inquérito criminal não produz qualquer efeito jurídico (nem ao nível dos factos nem do direito) nos presentes autos (apenas uma sentença/acórdão penal transitada em julgado pode produzir alguns efeitos em sede de processo civil, como resulta do disposto nos arts. 623º e 624º do C.P.Civil de 2013).
O conteúdo das conclusões «XIV» e «XV» mostram-se ininteligíveis uma vez não se compreende a que conta o Recorrente se reporta e nem sequer se vislumbra qual o efeito jurídico relevante que o mesmo pretende extrair das mesmas.
A alegação de que «nenhuma prova documental, para além da existente no processo crime, existe nos autos que vá ao encontro da conclusão do Tribunal a quo, quando afirma que “resulta da matéria de facto provada que a totalidade das quantias aí depositadas eram pertença da inventariada…”» é totalmente infundada e roça até a litigância de má fé: como o Recorrente bem sabe e até supra já se explicou, a matéria em causa está plasmada nos factos provados nºs. 16 e 17, sendo certo que, como resulta da motivação de decisão de facto inserta na decisão recorrida, a sua demonstração probatória decorreu do efeito cominatório (confissão dos factos) da falta de resposta às reclamações. Logo, estando provados por confissão, não necessitavam de ser demonstrados através de qualquer outro meio probatório (nomeadamente, documental), realçando-se que o Recorrente não impugnou a decisão de facto. 
  Também absolutamente infundada e a “tocar na fronteira” da litigância de má fé se apresenta a alegação de que «o único raciocínio que nos afigura que o Tribunal a quo teve foi, exatamente, ter, aqui, dois pesos e duas medidas, pois, nenhum facto foi alegado pelos Interessados reclamantes que conduzam à propriedade de tal dinheiro por parte da inventariada»: para além de estar provada a matéria que integra os factos nºs. 1 a 18, sendo que a respectiva decisão de facto não foi objecto de impugnação no presente recurso, em todas as reclamações deduzidas, os Interessados, ainda que com graus de rigor diferentes, alegaram e concretizaram quais as entidades bancárias em que estavam sediadas as contas (naturalmente, não era de exigir que indicassem os números de cada uma delas), qual o valor total de saldos que as mesmas deviam apresentar («e 150.000,00», sendo que a factualidade provada revela um valor inferior), e as operações de movimentos (débitos) realizadas pelo Cabeça-de-casal e o espaço temporal em que aconteceram (obviamente, não era de exigir que indicassem cada data precisa e o valor concreto de cada movimento), pelo que cumpriram (quanto a esta parte) o mínimo do ónus alegatório que sobre os mesmos recaía, não ocorrendo aqui o vício de falta de alegação de que padece outra parte das reclamações (e, assim sendo, também é infundada a alegação de que «se parte das reclamações foram julgadas improcedentes por falta de discriminação, individualização e concretização de factos, também, nesta sede, deveriam as reclamações serem julgadas improcedentes»).
Nova ininteligibilidade se verifica na alegação de que «quer por falta de prova, mas também, porque está afastada a presunção da comparticipação igual dos montantes depositados na conta do Banco 1...»: não se vislumbra qual a conta a que se quer referir o Recorrente, e muito menos o efeito jurídico que pretende extrair perante a factualidade que está efectivamente provada.
As alegações de que «insurge-se ainda contra este despacho saneador, por entender e estar provado que a aludida quantia de €125.375,00 foi por si depositada na conta em causa do banco» e de que «do processo crime, que foi junto a estes autos, constam todos os elementos de prova que os Reclamantes omitiram e que conduzem a decisão/despacho saneador em sentido contrário» são inequivocamente infundadas: por um lado, como anteriormente já se explicou, ficou efectivamente provado que a propriedade das quantias existentes nas contas e movimentadas pelo Cabeça-de-casal antes da abertura da sucessão, eram apenas da Inventariada (cfr. factos provados nºs. 16 e 17 e por força da confissão dos factos do próprio Cabeça-de-casal); por outro lado, o Recorrente não impugnou a decisão de facto (e, aliás, nem identifica que documentos seriam esses que poderiam conduzir a alegada decisão contrária); e, por fim, esteja demonstrado que a conta « ...23» foi provisionada em 29/5/2007 com a quantia de €125.375, e que o documento que titulou tal depósito foi assinado pelo Cabeça-de-casal, certo é que, como resulta do próprio documento, que efectivamente entregou a quantia para depósito foi a Inventariada e não o Cabeça-de-casal (“Dra. CC Data 29/5/2007 (…) Entrega para depósito de numerário/valores em EUR Tot. Numerário: 125.375,00”), o que aponta a propriedade da quantia à Inventariada e não ao Cabeça-de-Casal (como erradamente se quer fazer crer em sede de recurso).
Por último, também se mostra infundada e ininteligível a alegação de que «o mesmo se aplica para a conta sediada na Banco 2..., a qual era uma Conta Solidária, pelo que nesta sede e com relevo para os autos, só pode ser questionado os movimentos efetuados após o internamento da de cujus»: infundada porque não ficou provado que qualquer das contas da Banco 2... fosse uma conta solidária (e mais uma vez se relembre que o Recorrente não impugnou a decisão de facto); e ininteligível porque não se compreende que efeito jurídico se pretende extrair com a referência «só pode ser questionado os movimentos efetuados após o internamento».
Consequentemente e sem necessidade de outras considerações, perante tudo o que supra se expôs e concluiu, a resposta à presente questão, que no âmbito do recurso incumbe a este Tribunal ad quem apreciar, é necessariamente no sentido de que a Inventariada era proprietárias de quantias existentes em contas bancárias que devem ser relacionadas, tal como se concluiu na decisão recorrida, mas a sua forma de relacionamento legal não é exactamente nos termos determinados nesta decisão: devem ser relacionados, como saldos de contas bancárias, os valores dos saldos existentes à data do óbito da Inventariada nas contas « ...66» e « ...82», no caso desta acrescido da quantia aí depositada posteriormente de €1.658,71, contas a que se reportam os factos provados nºs. 10, 11 e 12; e deve ser relacionado, como crédito da herança sobre o Cabeça-de-casal, o valor total dos três débitos/movimentos referidos nos factos provados nºs. 4, 5 e 6.
Por conseguinte, impõe concluir-se que o recurso do Cabeça-de-casal/Recorrente deverá proceder apenas parcialmente quanto a esta questão embora com base numa fundamentação diversa da invocada no recurso e, por via disso, deverá o ponto nº2 do decisório da decisão recorrida ser alterado em conformidade com os termos supra indicados.
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4.2. Dos/Das «fios/cordões, pulseiras, trancelins, alfinetes, anéis, em ouro e prata e relógios de pulso e conjuntos de pérolas» e de «castiçais, faqueiros e salvas de prata»
Como supra já se referiu, embora do conjunto das cinco reclamações resulte um objecto muito mais vasto e embora a decisão impugnada («Decisão quanto às reclamações à relação de bens») contenha um decisório com maior amplitude, através do presente recurso, o Cabeça-de-casal apenas pretende impugnar parcialmente a decisão, sendo que, no âmbito desta segunda questão, está em causa a pretensão recursiva relativamente aos dois primeiros segmentos do ponto 6) do decisório [«Determina-se que o cabeça de casal relacione: - os fios/cordões, pulseiras, trancelins, alfinetes, anéis, em ouro e prata e relógios de pulso e conjuntos de pérolas pertencentes à inventariada; - os castiçais, faqueiros e salvas de prata existentes na habitação da inventariada»].
Assinale-se que, embora na conclusão «VIII», o Recorrente aluda a «demais objectos que compunham o recheio da habitação da inventariada», como resulta da pretensão formulada na parte final, e apesar de estar muito discriminado, aquele não peticiona a revogação da decisão recorrida quanto ao terceiro segmento do WW do respectivo decisório [«- os demais objetos que compunham o recheio da habitação da inventariada descritos nas alíneas a) a al) da reclamação à relação de bens dos GG, HH e II, a fls. 150v e 151»], tal como, em sede de motivação, não deduziu qualquer alegação concreta e fundada quanto a esta matéria, pelo que, em nosso entender, não foi efectivamente impugnado esta parte da decisão recorrida.
Posto isto, na decisão recorrida, na parte que aqui releva, consignou-se:
“(…) quanto às joias e bens móveis que compunham o recheio da casa da inventariada, a análise do Tribunal ater-se-á aos bens cuja falta foi invocada pelos interessados GG, HH e II, e pela interessada LL, (referidos em IV) e V) do relatório), uma vez que descriminam, de forma minimamente individualizada e concretizada, os objetos em discussão (…)
Isto posto, tendo os interessados reclamado a omissão de relacionação dos objetos identificados e não contestando o cabeça de casal que tais bens pertencem à inventariada deverão os bens em causa ser relacionados, sendo nesta parte procedentes as reclamações.
Assim sendo, deverá o cabeça de casal relacionar:
- os fios/cordões, pulseiras, trancelins, alfinetes, anéis, em ouro e prata e relógios de pulso e conjuntos de pérolas pertencentes à inventariada;
- os castiçais, faqueiros e salvas de prata existentes na habitação da inventariada (…)”.
Em sede de recurso, o Recorrente defende, essencialmente, que: «nenhum dos interessados reclamantes soube quantificar quantos fios, cordões, pulseiras, trancelins, alfinetes, anéis em ouro e prata e relógios de pulso e conjunto de pérolas pertencem à Inventariada; atente-se que vários interessados reclamantes pediram que se relacionassem duas campas/jazigos, mas como os reclamantes não instruíram os autos com quaisquer documentos que lograssem a existência das mesmas, foram tais reclamações, improcedentes, nesta parte; decisão igual se impunha, e impõe, não só para as joias, ouro e prata, assim como, para os castiçais, faqueiros e salvas de prata» (cfr. conclusões «VI» a «IX»).
Importa, desde já, afirma que assiste, nesta parte, inteira razão ao Recorrente, nem se compreendendo muito bem a razão pela qual, na questão aqui em causa, o Tribunal a quo não aplicou na íntegra (a todas as reclamações) a fundamentação e o entendimento (correctos, diga-se) que desenvolveu relativamente às reclamações dos Interessados DD e RR, e que foram os seguintes:
“Os interessados DD e FF, (referidos em II) e III) do relatório), não descrevem, no entanto, os bens concretos cuja falta acusam (sobretudo quanto às joias), defendendo que a sua identificação ocorrerá no âmbito de prova a produzir.
Salvo o devido respeito, não acompanhamos este entendimento.
Como já referimos, os interessados têm o dever de se pronunciar de forma concretizada sobre a relação de bens.
Uma impugnação da relação de bens de tal forma vaga e genérica que não individualize minimamente quais os objetos cuja falta se acusa não cumpre essa função.
Por outro lado, a falta de concretização dos objetos cuja falta se acusa não pode, salvo o devido respeito, ser suprida pela prova a produzir.
As provas destinam-se, nos termos do disposto no artigo 341º do Código Civil, à demonstração da realidade dos factos.
Os factos, portanto, têm de estar alegados para que possam ser sujeitos a prova”.
Na verdade, percorrendo a parte das reclamações dos Interessados GG, XX, e XX, e da Interessada LL, verifica-se as mesmas faltas de individualização e de concretização (e de especificação e de identificação, acrescentamos nós). Frise-se que o Interessado AA não deduziu reclamação quanto a estes bens.
Na reclamação dos Interessados GG, XX e XX, invoca-se, nesta matéria, apenas e tão que «8° Falta relacionar diversas joias que fazem parte do acervo hereditário da inventariada, nomeadamente fios, pulseiras, trancelins, alfinetes e anéis, em ouro e prata, e relógios de pulso, que se encontram em poder da interessada, KK. 9° Falta relacionar diversos castiçais e salvas em prata, que se encontravam, à data do óbito, na residência da falecida, sita no Largo ..., da União das Freguesias ... e ..., do concelho ...».
E na reclamação da Interessada LL, nesta matéria, invoca-se, apenas e tão só, que «3.º A inventariada possuía inúmeras jóias em ouro que sempre exibia e que estão em poder do cabeça de casal, designadamente, cordões, fios, brincos, pulseiras, anéis, alfinetes e conjuntos de pérolas. 4.º Por outro lado, a relação de bens correspondente aos bens móveis encontra-se bastante incompleta, faltando relacionar todo o recheio do imóvel da verba 14, designadamente (…), castiçais, salvas (…) em prata».
Sendo estas as “alegações” que estes Interessados produziram nas respectivas reclamações, não vislumbramos como é que o Tribunal a quo pôde concluir que as mesmas “descriminam, de forma minimamente individualizada e concretizada, os objetos em discussão”: aliás, o próprio Tribunal a quo não explica em que em que termos foi realizada tal individualização e concretização.
Em nenhum momento, estes Interessados (tal como sucedeu com os Interessados DD e RR) concretizam:
1)  qual é o número de cada um dos em causa, apesar de os referirem sempre no plural (são dois, quatro ou dez fios/cordões? São três, cinco ou nove pulseiras? São seis, 12 ou 20 anéis ouro e prata? Etc);
2) quais são as características específicas de cada um desses bens (Qual é o tamanho e materiais dos fios/cordões? Qual é o material das pulseiras? Qual é a marca dos relógios de pulso? Que tipo de peças compõem os faqueiros e quais são os modelos? Tamanho e imagem dos castiçais e das salvas de prata? No que consiste precisamente um «conjunto de pérolas»? Etc);
3) e não juntaram quaisquer documentos/fotografias dos mesmos, para os quais remetessem aquelas alegações, e que permitissem identificar e percepcionar os bens que podem estar por relacionar (pensamos que seria fácil juntar aos autos fotografias da própria Inventaria em que fosse perceptível o uso de alguns destes bens, nomeadamente fios, relógios, pulseiras, anéis e alfinetes, e/ou fotografias da habitação da mesma onde estivessem os aludidos castiçais e salvas de prata), salientando-se que, como decorre do disposto no nº4 do art. 1098º do C.P.Civil de 2013, “a menção dos bens é acompanhada dos elementos necessários à sua identificação”.
E se dúvidas existissem de que também estes Interessados não identificaram, não concretizaram, não especificaram e nem individualizaram nenhum destes bens, sempre seriam dissipadas pela simples circunstância de, apesar de ter feito funcionar o efeito cominatório semipleno da falta de resposta às reclamações por parte do Cabeça-de-casal (confissão dos factos), o Tribunal a quo não consignou qualquer facto relativamente a estes bens na decisão de facto (que inclui a factualidade provada) que integra e decisão recorrida e não o fez porque, pura e simplesmente, os factos essenciais sobre estes bens não foram alegados.
Como decorre do disposto no art. 5º/1 do C.P.Civil de 2013, «às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir».
Logo, uma vez que pretendiam reclamar a falta de relacionamento de tais bens, incumbia a todos estes Interessados o ónus de alegarem um mínimo de matéria factual que identificasse, individualizasse, concretizasse e discriminasse cada um dos bens cuja aquela falta reclamam, matéria essa que fosse susceptível de prova (e que, por via disso, tanto poderia ser demonstrada quer pelo efeito cominatório da confissão dos factos, quer por qualquer outro meio de prova).
Sendo todas as alegações que integram as reclamações sobre esta matéria completamente genéricas, ambíguas e imprecisas, impõe concluir-se que os Interessados não cumpriram de forma mínima o ónus alegatório que sobre si recaía.
E não tendo o Tribunal a quo integrado na decisão de facto qualquer factualidade provada sobre estes bens (e, pelas razões que supra se explicaram, não o podia fazer), então jamais podia concluir no sentido de que os alegados bens integravam o património da Inventariada no momento da sua morte e, por via disso, não há fundamento legal para que seja determinado o relacionamento de qualquer destes bens.
E sempre importa notar que a supra referida falta de identificação, individualização, concretização e especificação inquina, de forma decisiva e absoluta, o próprio segmento decisório que o Tribunal proferiu nesta matéria (cfr. WW), já que o mesmo configura uma comando (ordem) genérico, ambíguo e impreciso: quantos bens, e de que tipo, o Cabeça-de-casal deveria relacionar?      
Consequentemente e sem necessidade de outras considerações, perante tudo o que supra se expôs e concluiu, a resposta à presente questão, que no âmbito do recurso incumbe a este Tribunal ad quem apreciar, é necessariamente no sentido de que não ficou demonstrado que a Inventariada era proprietária de «fios/cordões, pulseiras, trancelins, alfinetes, anéis, em ouro e prata e relógios de pulso e conjuntos de pérolas» e de «castiçais, faqueiros e salvas de prata», pelo que, ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, tais supostos bens não devem ser relacionados.
E, por conseguinte, impõe concluir-se que o recurso do Cabeça-de-Casal/Recorrente deverá proceder quanto a esta questão, pelo que deverá revogar-se a decisão recorrida quanto ao WW do respectivo decisório, o qual deve ser eliminado quanto aos dois primeiros segmentos.
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4.3. Do Mérito do Recurso
Perante as respostas alcançadas na resolução das questões supra apreciadas, deverá julgar-se parcialmente procedente o recurso de apelação interposto pelo Cabeça-de-casal/Recorrente e, por via disso, deverá modificar-se a decisão recorrida nos termos supra assinalados.
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4.4. Da Responsabilidade quanto a Custas
Procedendo o recurso apenas de forma apenas parcial, e verificando-se que, embora não tenham apresentado contra-alegações, foram os Interessados DD, RR, GG, XX, XX e LL que reclamaram a falta de relacionamento dos bens sobre os quais versou a segunda questão apreciada no presente recurso (o Interessado AA não reclamou relativamente a estes bens), as custas do presente recurso deverão ficar a cargo do Cabeça-de-casal e a cargo dos identificados Interessados, na proporção de 3/5 e 1/5 respectivamente - art. 527º/1 e 2 do C.P.Civil de 2013.
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5. DECISÃO

Face ao exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelo Cabeça-de-casal/Recorrente e, em consequência:

1) alteram o ponto nº2 do decisório da decisão recorrida, o qual passa a ter a seguinte redacção - «2) Determina-se que o Cabeça-de-casal relacione: a) como saldos de contas bancárias, os valores dos saldos existentes à data do óbito da Inventariada nas contas « ...66» e « ...82», no caso desta acrescido da quantia aí depositada posteriormente de €1.658,71, contas a que se reportam os factos provados nºs. 10, 11 e 12; b) e, como crédito da herança sobre o Cabeça-de-casal, o valor total dos três débitos/movimentos referidos nos factos provados nºs. 4, 5 e 6»;
2) eliminam os dois primeiros segmentos do WW da decisão recorrida, o qual passa a ter a seguinte redacção: «6) Determina-se que o cabeça de casal relacione os objetos que compunham o recheio da habitação da inventariada descritos nas alíneas a) a al) da reclamação à relação de bens dos GG, HH e II, a fls. 150v e 151»;
3) e mantêm integralmente o remanescente da decisão recorrida. 
Custas do recurso pelo Cabeça-de-casal/Recorrente e pelos Interessados DD, RR, GG, XX, XX e LL (Recorridos), na proporção de 3/5 e 1/5 respectivamente.
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Guimarães, 07 de Junho de 2023.
(O presente acórdão é assinado electronicamente)
 
Relator - Pedro Manuel Quintas Ribeiro Maurício;
1ºAdjunto - José Carlos Pereira Duarte;
2ºAdjunto - Maria Gorete Roxo Pinto Baldaia de Morais.


[1]António Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, 6ªedição actualizada, Almedina, p. 139.
[2]Ac. STJ de 07/07/2016, Juiz Conselheiro Gonçalves da Rocha, proc. nº156/12.0TTCSC.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[3]Juiz Desembargador José Alberto Moreira Dias, proc. nº5443/20.0T8BTG-A.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.
[4]Todos os artigos do C.P.Civil de 2013 que doravante forem mencionados são na redacção posterior à Lei n117/2019, salvo indicação em contrário.
[5]In Partilhas Judiciais, vol I, 4ªdição, p. 426 e 427.
[6]In Código de Processo Civil Anotado, vol. II, 2ªedição, p. 553 e 554
[7]Lopes do Rego, in A recapitulação do inventário, Julgar Online, Dezembro de 2019, p. 9.
[8]In obra citada, p. 603.
[9]In obra citada, p. 606.
[10]No mesmo sentido, Lopes do Rego, in A recapitulação do inventário, Julgar Online, dezembro de 2019, p.12.
[11]In obra citada, p. 608 e 609.
[12]Neste sentido, decidiu-se no Ac. desta RG de 25/05/2023, proferido no proc. nº2525/21.5T8VCT-A.G1 e pelo mesmo colectivo de Juízes que intervém na presente decisão.  
[13]Cfr. Paula Camacho, in Do Contrato de Depósito Bancário, p. 69 e 93.
[14]Crr. Menezes Cordeiro, in Manuel de Direito Bancário, 1998, p. 479; Ac. STJ de 19/07/79, in BMJ, nº289, p. 345; Ac. STJ de 08/10/91, in BMJ, nº410, p. 805; e Ac. STJ de 09/02/75, in CJ-ACSTJ, I, p. 75.
[15]Juiz Conselheiro Gonçalves da Rocha, proc. nº15/09.3TBPNC.C1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[16]In  BMJ 304º, p.444.
[17]In RLJ, 81º, p. 237.
[18]Juiz Conselheiro António Piçarra, proc. nº879/14.9TBSSB.E1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[19]Juiz Conselheiro António Barateiro Martins, proc. nº4482/20.6T8LSB.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[20]Cfr. Ac. RG 10/07/2018, Juiz Desembargador José Cravo, proc. nº256/13.9TBVPA.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[21]In CJ-ACSTJ, 1998, Tomo I, p. 43 e 44
[22]Cfr. Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa, in obra citada, p. 597.
[23]Juiz Conselheiro Orlando Afonso, proc. nº15/09.3TBPNC.C1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.