Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | ANTÓNIO BEÇA PEREIRA | ||
Descritores: | PRAZO IMPUGNAÇÃO JUDICIAL REGISTO PREDIAL | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 02/11/2016 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | O prazo para a interposição da impugnação judicial previsto no artigo 141.º n.º 1 do Código do Registo Predial não tem natureza judicial, pelo que se não suspende no decorrer das férias judiciais. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I RP e seu marido FD requereram na Conservatória do Registo Predial de Valença o cancelamento das apresentações 1028, 1029, 1030, 1031 e 1032, respeitantes aos prédios que identifica. Esse pedido foi recusado por decisão da Sr.ª Adjunta (em substituição) da Sr.ª Conservadora do Registo Predial de Valença Então, RP e FD impugnaram judicialmente a tal decisão. Perante essa impugnação o Meritíssimo Juiz a quo proferiu despacho em que decide que: "Em face do exposto entendemos que a petição foi apresentada para além do prazo de 30 dias previsto no artigo 141.º, n.º 1, do CRP, pelo que se decide não receber o recurso de impugnação interposto por RP e FD." Inconformados com esta decisão, os impugnantes dela interpuseram recurso, que foi recebido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo, findando a respectiva motivação, com as seguintes conclusões: I- contrariamente ao entendimento perfilhado no despacho recorrido, a impugnação judicial impetrada pelos impugnantes/recorrentes, é tempestiva; II- na verdade, o prazo de 30 (trinta) dias a que alude o art.º 141.º, do Cód. Registo Predial, é judicial, de natureza processual, sendo-lhe, por isso, aplicável, o disposto no art.º 138.º, do Cód. Proc. Civil; III- assim considerando, in casu, sendo o prazo de interposição da impugnação judicial de 30 (trinta) dias (e, por isso, inferior aos seis meses previstos naquela disposição legal), e não estando, como efectivamente, não estamos, no âmbito de um processo urgente, aquele prazo de 30 (trinta) dias suspende nas férias judiciais; IV- ora, sendo certo que, tal como dispõe o art.º 141.º, 1 do Cód. Registo Predial, aquele prazo de 30 (trinta) dias, se conta da notificação aludida no art.º 71.º, desse mesmo diploma legal, e que os impugnantes/recorrentes foram notificados da recusa do registo que impetraram, por correio registado, datado de 06.07.2015, presumem-se notificados no dia 09.07.2015, data a partir da qual se inicia a contagem daquele prazo de 30 (trinta) dias; V- atendendo a que, esse prazo de 30 (trinta) dias suspende nas férias judiciais (designadamente de 16 de Julho a 31 de Agosto inclusive), o mesmo só terminaria a 24.09.2015, sendo certo que, a impugnação deduzida deu entrada na competente Conservatória no dia 08.09.2015, pelo que, dúvidas não pode haver que a impugnação judicial foi deduzida dentro do prazo estabelecido para o efeito, sendo, por isso, tempestiva; VI- aliás, o nosso entendimento de que, o prazo de 30 (trinta) dias para a interposição da impugnação judicial, é um prazo judicial, de natureza processual, ao qual, se aplica, por conseguinte, o disposto no art.º 138.º do Cód. Proc. Civil, sai altamente reforçado face ao preceituado no art.º 156.º do Cód. Registo Predial (introduzido pelo Dec. Lei n.º 125/13, de 30 de Agosto), sendo certo que, até a jurisprudência mais recente vai nesse sentido (vd. a esse propósito, entre outros, Ac. T.R. Porto de 29.11.2005, Ac. T.R. Porto, de 06.02.2014 e Ac. T.R. Coimbra, de 28.01.2014, in www.djsi.pt). VII- de resto, o facto do art.º 155.º, 2. do Cód. Registo Predial, estabelecer que o "prazo é contínuo", não significa que não suspenda nas férias judiciais, muito pelo contrário, mas tão só que não estamos no âmbito de um prazo de natureza administrativa, no qual se não contabilizam os sábados, domingos e feriados; VIII- trata-se, pois, de um prazo judicial, de natureza processual, contínuo, por conseguinte, mas que suspende no período das férias judiciais; IX- e não se diga que, uma tal suspensão, nem sequer se justifica, pelo simples facto da petição do recurso de impugnação respectiva ser apresentada, não nos tribunais judiciais, mas no Serviço de Registo que proferiu a decisão impugnada; X- até porque, como ler se pode no já referido Ac.do T.R.Porto de 06.02.2014, "a actuação do Conservador não se limita tão só ao exercício duma função enquanto órgão de administração pública – de tutela de direitos ou interesses próprios do Estado – mas ainda numa actuação da publicitação a incidir mesmo que em termos reflexos, no domínio de direitos e interesses particulares, embora na prossecução do interesse público. E nessa medida não fará sentido recorrer às normas do direito administrativo para aquilatar da forma da contagem desse prazo. Mas, por força dos pressupostos acabados de referir, cremos igualmente que os actos tendentes à formação da decisão de registo sobre o respectivo pedido formulado pelo interessado têm natureza não inteiramente administrativa, mas antes para/judicial. E, movendo-nos num procedimento tendente à formação duma decisão que pode passar pela apreciação de jurisdição comum, tudo aponta para o mencionado prazo de 30 (trinta) dias, ser caracterizado como prazo judicial, de natureza processual, por isso sendo-lhe aplicável o prescrito nos art.ºs 144.º e 145.º do Cód. Proc. Civil (actuais art.ºs 138.º e 139.º)"; XI- dever-se-á, pois, considerar a impugnação judicial, deduzida pelos recorrentes, tempestiva, porque interposta dentro do prazo fixado, na lei, para o efeito, e, em virtude disso, deve a mesma ser recebida, a fim de ser julgada; XII- o despacho recorrido violou o disposto nos art.ºs 155.º, 2., e 156.º, ambos do Cód. Registo Predial, e art.º 138.º, 1. do Cód. Proc. Civil. O Ministério Público contra-alegou sustentando a improcedência do recurso. As conclusões das alegações de recurso, conforme o disposto nos artigos 635.º n.º 3 e 639.º n.os 1 e 3 do Código de Processo Civil , delimitam os poderes de cognição deste Tribunal e, considerando a natureza jurídica da matéria versada, a questão a decidir consiste em saber se o prazo do citado artigo 141.º tem natureza judicial e, por isso, se suspende nas férias judiciais. II 1.º Para a decisão desta questão importa ter presente que: - o despacho impugnado foi remetido por correio à Ilustre Mandatária dos impugnantes no dia 2-7-2015; - a notificação em causa foi recebida pela Sr.ª Advogada no dia 7-7-2015; - a impugnação judicial deu entrada nos serviços da C. R. Predial de Valença no dia 8-9-2015. 2.º O Tribunal a quo fundou a sua decisão dizendo que: "No que respeita ao modo de contagem do prazo de impugnação judicial em apreço, diremos que o mesmo deverá ser contado de forma contínua, tendo em conta o disposto no artigo 155.º, n.º 2, do CRPredial. Mas isso não quer dizer que se suspenda durante as férias judiciais, uma vez que o CPC só se aplica subsidiariamente em matéria de prazos (artigo 156.º do CRPredial) salvo disposição legal em contrário, e o n.º 3 do citado artigo 155.º dispõe expressamente que "O prazo que termine em sábado, domingo, feriado, em dia com tolerância de ponto ou em dia em que o serviço perante o qual deva ser praticado o ato não esteja aberto ao público, ou não funcione durante o período normal, transfere-se para o primeiro dia útil seguinte.". Do facto de a norma transcrita não fazer qualquer referência às férias judiciais não resulta que tenha de ser aplicado subsidiariamente o CPC em matéria de prazos, mormente o disposto no artigo 138.º desse diploma legal. Com efeito, as Conservatórias estão em funcionamento nos períodos equivalentes às férias judiciais, com o Conservador ou o seu substituto ao serviço, pelo que, assim sendo, torna-se claro que o legislador não tinha de fazer qualquer referência às férias judiciais, inexistindo por isso qualquer lacuna a ser preenchida pela aplicação subsidiária do CPC. Não se vislumbra no âmbito da actividade do Conservador a razão de ser da suspensão dos prazos judiciais previstos no artigo 138.º do CPC. Contra o que acabamos de sustentar não se diga que está em causa a impugnação de um acto de Conservador nos tribunais judiciais, porque é a própria lei que expressamente prevê que a petição deve ser apresentada no serviço de registo que proferiu a decisão impugnada (artigo 142.º, n.º 2, do CRPredial), ou seja, o acto – a impugnação judicial da decisão do Conservador – deve ser praticado junto da Conservatória onde o mesmo foi praticado, o que não é de todo inócuo porque a lei determina, como já vimos, que de seguida o Conservador se pronuncie, sustentando ou reparando a decisão impugnada. Em face do exposto entendemos que a petição foi apresentada para além do prazo de 30 dias previsto no artigo 141.º, n.º 1, do CRP, pelo que se decide não receber o recurso de impugnação (…)". Concorda-se inteiramente com esta fundamentação e, na verdade, pouco mais se pode dizer. Prazo judicial é somente aquele que corre no âmbito de um processo judicial. E a razão de ser da suspensão desses prazos no decorrer das férias judiciais é evidente, razão essa que não se verifica se o processo, não obstante possa mais tarde vir a ter uma fase judicial, ainda não se encontra em juízo quando o prazo em questão decorre. E, por outro lado, não há motivo algum para que um prazo que se reporta a um acto a praticar junto de uma conservatória do registo predial se suspenda no decorrer das férias judiciais; essas férias não se estendem às conservatórias. Há uma certa proximidade entre a situação em análise - artigos 141.º e 155.º do Código do Registo Predial - e a dos artigos 59.º n.º 3 e 60.º do Decreto-Lei 433/82 de 27 de Outubro (Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas), que se referem ao prazo da impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa que condenou um arguido numa coima. Neste caso, a impugnação da decisão da autoridade administrativa é (também) apresentada junto desta e só mais tarde é que o processo entrará em juízo . O prazo a que se reporta esse artigo 60.º, tal como o do artigo 155.º do Código do Registo Predial, corre quando o respectivo processo está (ainda) confiado a uma entidade administrativa e o acto a que ele se refere é junto desta que tem que ser praticado. Como dizia Vaz Serra , o prazo judicial pressupõe que "a acção já está em juízo". III Com fundamento no atrás exposto, julga-se improcedente o recurso pelo que se mantém a decisão recorrida. Custas pelos impugnantes. 11 de Fevereiro de 2016 (António Beça Pereira) (António Santos) (Maria Amália Santos) |