Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
232/24.6T8BRG-B.G1
Relator: SANDRA MELO
Descritores: REGULAÇÃO DO EXERCÍCIO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
DECISÃO PROVISÓRIA
REGIME DE VISITAS
SUSTAÇÃO DA DECISÃO
SUPERIOR INTERESSE DA CRIANÇA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/29/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Embora a exiguidade de elementos probatórios não justifique, em regra, que o juiz possa abster-se de proferir decisão provisória sobre todos os aspetos da regulação das responsabilidades parentais, finda a conferência, nos termos do 38º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, quando o interesse do menor exija uma postura mais cuidadosa sobre alguma das matérias ou a articulação da decisão com as demais medidas em curso em processos apensos relativo ao mesmo menor, pode o tribunal sustar na decisão até obter resposta dos serviços que permita alcançar solução que seja benéfica para o menor.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

.I - Relatório

Apelada:
a Requerente, AA

Apelante:
o Requerido, BB

Autos de: ação de regulação do exercício das responsabilidades parentais
relativos ao menor CC, nascido a ../../2018, filho de Requerente e Requerido.

A Autora pediu que fosse efetuada fixação da residência do menor, a atribuição do exercício das responsabilidades parentais, com a definição de um regime de visitas a favor do progenitor, bem como a forma e valor da prestação de alimentos.
Em conferência de pais, após ouvir os progenitores, e após promoção do Ministério Público, foi proferido o seguinte despacho:
“Atento o estado dos autos, mostra-se necessário fixar um regime provisório quanto à regulação do exercício das responsabilidades parentais que garanta a segurança e estabilidade do menor, mas que não é possível o acordo atenta a posição dos progenitores. A decisão a proferir não contém qualquer juízo de valor relativo a qualquer dos progenitores, destinando- se a regular o interesse do menor durante o andamento do processo, conferindo ao menor a estabilidade necessária e os cuidados de que carece enquanto os adultos e o Tribunal diligenciam pelo seu superior interesse com cumprimento dos trâmites legais.
Assim, importa atento o estado dos autos, ponderar tudo aquilo que aqui foi relatado pelos progenitores e respectivos Ilustres Mandatários, designadamente que o menor sempre viveu com a progenitora e que, há pelo menos 2 anos não está presencialmente com o progenitor, salientando-se que aquele está em acompanhamento psicológico e pedopsiquiátrico, no confronto com a informação prestada pela CPCJP do que decorre que junto do mesmo foi aplicada a medida de apoio junto dos pais, a executar junto da mãe. Reiterando aqui, a douta argumentação aventada pelo Digno Ministério Público, considerando o desacordo dos progenitores sobre o regime parental a fixar, a necessidade de garantir estabilidade na vida do menor e de prevenir conflitos, decide-se ao abrigo do disposto no artigo 38º do RGPTC, fixar o seguinte regime provisório:

I- RESPONSABILIDADES PARENTAIS.

1) Residência e Atos da Vida Corrente:
O menor fica à guarda e cuidados da mãe, com quem fica a residir, e que exercerá as responsabilidades parentais relativas aos atos de vida, corrente do CC;
2) Questões de Particular Importância:
As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do CC serão exercidas, conjuntamente, por ambos os progenitores, salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho, devendo prestar informação ao outro logo que possível.

II- ALIMENTOS/DESPESAS:

1.º A título de alimentos devidos à filha, o pai pagará mensalmente à mãe a quantia de 125,00€ (cento e vinte e cinco euros), até ao dia 8 do mês a que disser respeito, mediante transferência bancária para a conta cujo IBAN deverá ser indicado nos autos e comunicado ao progenitor no prazo de 5 dias, atualizando-se essa prestação anualmente, a partir de janeiro de 2025, no montante de 5,00€ (cinco euros).
2º - As despesas médicas extraordinárias (ex.: óculos, aparelho dentário, cirurgia) e medicamentosas justificadas por receita médica, as futuras despesas escolares com a aquisição de material no início do ano lectivo e livros o ano todo, serão pagas pelos progenitores na proporção de metade do valor não comparticipado, devendo para o efeito a mãe remeter ao progenitor os respetivos comprovativos no final do mês e o pai proceder ao seu pagamento no final do mês seguinte.
Relativamente ao regime convivial, uma vez mais subscrevendo aqui aquilo que já foi referido pela Digna Magistrada do Ministério Publico e tendo sempre como objectivo o superior interesse do CC, a estabilidade e bem estar emocional do mesmo, solicite-se o processos de promoção e protecção que corre termos na Comissão, para apensação aos presentes autos e determina-se que se procede em conformidade como o promovido, designadamente solicitando que seja elaborado o respectivo relatório, aferindo deste regime convivial, tendo sempre presente a estabilidade e bem estar do menor identificado nos autos.”

É desta decisão que o Requerido apelou, formulando, para tanto, as seguintes
conclusões:

A. Foi intentada pela Requerente acção para regulação do exercício das responsabilidades parentais no dia 09 de janeiro de 2024, sendo requerida a fixação da residência do menor CC, nascido a ../../2018, actualmente com 5 (cinco) anos, bem como a atribuição do exercício das responsabilidades parentais, definição do regime de convívios e da prestação de alimentos;
B. No dia 31-01-2024 foi realizada Conferência de Pais, pelo que o tribunal de 1.ª instância proferiu despacho que veio regular provisoriamente a responsabilidade parental do menor CC;
C. Em síntese, foram fixados pelo tribunal a quo: i) o menor ficará sob a guarda da mãe, que exercerá as responsabilidades parentais referentes aos actos de vida corrente da criança; ii) o valor de 125,00 € (cento e vinte cinco euros) a título de alimentos, com atualização anual, a partir de janeiro de 2025, no montante de 5,00€ (cinco euros); iii) as despesas médicas extraordinárias, medicamentosas, despesas escolares, pagas por ambos os progenitores, na proporção de metade do valor não comparticipado;
D. Não obstante, entende o Recorrente, salvo o devido respeito, que a douta decisão está inquinada de vícios, por omissão na fundamentação, razão pela qual deverá ser declarada a sua nulidade;
E. Isso porque o r. decisum carece de manifesta falta fundamentação, quer probatória, quer jurídica, pelo que é nulo;
F. Na verdade, ao deixar de estabelecer o regime convivial do Recorrente com o menor e não fixar as formas de contacto a serem realizadas entre o progenitor e a criança, sem uma fundamentação de tal omissão, o tribunal primitivo criou uma medida limitativa e inibitória do exercício das responsabilidades parentais do Recorrente sem qualquer demonstração da existência de um perigo para segurança ou saúde do menor;
G. A fundamentação para o tribunal recorrido afastar qualquer possibilidade de contacto presencial entre o Recorrente e o seu filho decorre da promoção do Ministério Público, ao referir que os mesmos estão afastados presencialmente há dois anos e a criança estar a ter um acompanhamento por psicólogo e pedopsiquiatra;
H. Nos termos dos n.ºs 2 e 3 do artigo 24.º do CDFUE: “2. Todos os atos relativos às crianças, quer praticados por entidades públicas, quer por instituições privadas, terão primacialmente em conta o interesse superior da criança. 3. Todas as crianças têm o direito de manter regularmente relações pessoais e contactos diretos com ambos os progenitores, exceto se isso for contrário aos seus interesses.”, pelo que é um direito das crianças manter contacto com ambos os progenitores, sendo tal questão do seu superior interesse, de modo a ter um desenvolvimento saudável;
I. Portanto, ao afastar tal direito fundamental do menor e do Recorrente, deveria o tribunal a quo, ter fundamentado a sua decisão, uma vez que estar-se-á diante de uma limitação de direitos fundamentais consagrados nos artigos 36.º, n.ºs 3 e 5, 68.º, n.º 1, 69.º, n.º 1 e 205.º, n.º 1 da CRP, o que não foi observado no caso sub judice;
J. Não há qualquer documento ou meio probatório a justificar tal afastamento;
K. De facto, provavelmente é a ausência do Recorrente na vida da criança que poderá ter desencadeado uma reacção dissonante, resultando na alteração comportamental e intervenção da CPCJ;
L. Sem uma justificação, quer factual, quer de direito, o tribunal recorrido não regulou o direito de convívio do Recorrente com o menor, violando o direito do progenitor de educar o filho, velar pela sua segurança e saúde, promover o desenvolvimento físico, intelectual e moral da criança, bem como o princípio da igualdade entre os progenitores, em afronta as previsões contidas nos artigos 1878.º, n.º 1, 1885.º, n.º 1, 1906.º, n.ºs 5, 7 e 8 do CC;
M. Ainda, a decisão em apreço ao deixar de regular os convívios entre Pai e Filho, impede de o menor ter contacto com a sua irmã e a família paterna, violando o disposto no artigo 1887.º-A do CC, bem como o direito a identidade, a receber afecto do progenitor e sua família;
N. Porquanto não restam dúvidas que a decisão do tribunal a quo não teve em consideração o superior interesse do menor, visto que a ausência presencial, pelo período de dois anos, invocado como fundamento pelo Ministério Público, não é, e nem pode, ser motivo para afastar os contactos do Pai com o seu Filho;
O. É um direito do menor, previsto em diversos diplomas internacionais, europeus e nacionais, pelo que ao ser afastado/limitado/restringido, somente em situações restritas e devidamente fundamentadas;
P. Portanto, sempre com o devido respeito, deverá ser declarada nula a decisão em crise, face a violação dos artigos 36.º, n.ºs 3 e 5, 68.º, n.º 1, 69.º, n.º 1 e 205.º, n.º 1 da CRP, n.ºs 1 e 2 do artigo 154.º do CPC, e, artigos 1878.º, n.º 1, 1885.º, n.º 1, 1887.º-A, 1906.º, n.ºs 5, 7 e 8 e 1915.º do CC;
Q. Assim, deve ser julgada procedente a nulidade arguida, e, consequentemente, que se anule a decisão recorrida, proferida no dia 31 de janeiro de 2024, que não fixou o regime convivial, devendo ser proferida decisão regule o regime convivial entre o Recorrente e o menor;
R. Por outra parte, caso o E. Tribunal entenda pela não configuração da nulidade, o que não se espera, a decisão que se pronunciou provisoriamente sobre o exercício das responsabilidades parentais afronta os princípios da igualdade das partes, da proporcionalidade e do superior interesse do menor;
S. De facto, ao não permitir o contacto presencial entre o Apelante e o seu filho, o tribunal a quo atribuiu uma maior fé nas declarações de um progenitor sobre o outro, visto que não há provas do que foi outrora alegado pela Apelada;
T. No âmbito da Conferência de Pais restou evidenciado um claro favorecimento da progenitora e da sua posição processual de que se fixe a residência do menor junto de si, bem como nas declarações proferidas pela Recorrida, desprovidas de qualquer documento probatório, em afronta ao disposto no artigo 4.º do CPC;
U. Foram desconsideradas as declarações do Recorrente, particularmente no que concerne a ter condições de receber e cuidar do seu filho;
V. A posição e os factos narrados pelo Recorrente não se encontraram refletidos na acta da Conferência de Pais, o que motivou o Apelante a requerer a rectificação da Acta, no requerimento de 12 de fevereiro de 2024, com base na falsidade do seu conteúdo;
W. Durante o decurso da diligência, aproveitando-se do facto de que o Recorrente e o Ilustre Mandatário participavam por meio de comunicação à distância, o tribunal, o Ministério Público, a Ilustre Mandatária da Recorrida e a Apelada falam entre si, em surdina, de modo a não serem auscultados pelo Recorrente e seu mandatário;
X. Facto que é declarado, repetidas vezes, ao longo da Conferência de Pais;
Y. O tribunal a quo nas negociações em sede de alimentos, oculta do Recorrente que a rejeição da sua proposta vem por parte da progenitora, como também nunca informa que as limitações por si impostas, são na realidade impostas pela progenitora;
Z. Ainda, viola o princípio do contraditório, uma vez que não especifica se tais propostas não são da sua autoria, mas sim da Recorrida e não permite que o Recorrente as contradiga;
AA. Porquanto, ficou demonstrada nas alegações e na transcrição junta ao processo, a flagrante violação aos princípios do contraditório, disposto no n.º 3 do artigo 3.º do CPC, bem como do princípio da igualdade de partes, se revelando uma total e gravosa ausência de paridade simétrica das posições das partes perante o tribunal, previsto no artigo 4.º do CPC;
BB. É importante referir que a decisão recorrida afronta o princípio da proporcionalidade, referido na parte final do n.º 2 do artigo 18.º da CRP, uma vez que está a empregar um meio excessivo e desequilibrado para atingir um fim;
CC. A omissão e privação do direito do CC em ter a companhia do Recorrente revela uma medida excessiva e desproporcionada para alcançar os fins pretendidos, posto que não há elementos que demonstrem que este afastamento é uma protecção ao superior interesse da criança;
167. E tal decisão, não teve em conta o superior interesse da criança, uma vez que restringe de modo desproporcional a manutenção de uma relação gratificante e estável com o Apelante; DD. A posição da Recorrida é de que o menor deve residir junto de si e os contactos com o Recorrente devem ser reduzidos e vigiados, pois esse contacto não é benéfico para o menor;
EE. Por sua vez, a posição assumida pelo Recorrente nos autos é de que como menor tem estado aos cuidados da mãe, deverá ser mantida tal situação. Todavia, deverá ser-lhe atribuída a possibilidade de ter contactos alargados com o menor, para que um possa fazer parte da vida do outro e tornar mais estreito os laços existentes;
FF. Chegados a este ponto e tendo em conta que é do superior interesse do menor, a promoção das relações habituais do filho com o Recorrente e a convivência o mais igualitária possível com a mãe e com a pai, é manifesto que a decisão recorrida não tem em conta o superior interesse do menor, e sim, tutela o superior interesse da progenitora;
GG. No caso vertente, constata-se que o tribunal recorrido, numa decisão provisória, procurou acautelar situações futuras, excluindo os convívios com o Recorrente nos períodos festivos, por exemplo, designadamente ao fixar como reajuste o valor de 5,00 € (cinco euros) a iniciar em janeiro de 2025, e não nos termos fixados pelo governo, através do reajuste do IAS;
168. Porquanto, o tribunal primitivo ao deixar de fixar o regime convivial entre o Recorrente o e menor, restringiu os direitos fundamentais do menor e do Apelante, violou os princípios mais comezinhos de Direito, bem como a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;
HH. Neste sentido, pretende o Apelante a revogação da decisão para alterar a decisão recorrida, e regular, a título provisório, o exercício das responsabilidades parentais do menor CC, mantendo a residência com a Recorrida, determinando a realização do regime convivial, nomeadamente:
.i) uma vez por mês, sendo que a entrega da criança deverá ocorrer em Coimbra, por se encontrar em meio termo entre ... e ...; .ii) o menor passar com o Recorrente a totalidade das férias escolares de Carnaval, da Páscoa e do Verão, estas com exceção de quinze dias, a passar com a mãe, em altura por esta escolhida, dentro das férias de Verão do menor;
.iii) em caso de o início ou o termo dos fins-de-semana mensais com o Recorrente ser precedido ou sucedido de um feriado, os períodos de visitas se iniciem e terminem, respetivamente, na véspera (quarta-feira ou, a partir da frequência do ensino básico, quinta-feira) e no dia do feriado, e, em caso de possibilidade de ponte, se estendam por todo o tempo que abranja essa ponte;
 .iv) a substituição da atualização anual fixada no valor de 5,00 € (cinco euros) para a aplicação do indexante de reajuste do IAS, tendo em consideração o princípio da proporcionalidade e os rendimentos auferidos pelo Recorrente.

A Requerente e o Ministério Público responderam, ambos pugnando que se mantivesse na íntegra o despacho recorrido.

II- Objeto do recurso

O objeto do recurso é definido pelas conclusões das alegações, mas esta limitação não abarca as questões de conhecimento oficioso, nem a qualificação jurídica dos factos (artigos 635º nº 4, 639º nº 1, 5º nº 3 do Código de Processo Civil).
Este tribunal também não pode decidir questões novas, exceto se estas forem de conhecimento oficioso ou se tornaram relevantes em função da solução jurídica encontrada no recurso e os autos contenham os elementos necessários para o efeito. - artigo 665º, nº 2, do mesmo diploma.
 Assim, a questão a apreciar é se devia no âmbito da fixação provisória da regulação das responsabilidades parentais, neste caso concreto, ser fixada o regime de visitas ao menor, no sentido proposto pelo Recorrente.
 
III- Fundamentação de Facto

Os factos, de natureza processual, relevantes para a decisão já foram enunciados supra.

Cumpre ainda, para a sua melhor compreensão trazer para os autos os seguintes elementos retirados do processo de promoção e proteção entretanto apenso, do qual consta:

-- A seguinte informação, datada de 15-1-2024, “informo que foi instaurado o Processo de Promoção e Proteção para a criança CC, no dia 22 de fevereiro de 2023, devido a uma comunicação proveniente PSP ..., sobre criança que assume comportamentos inadequados. Os progenitores, DD e BB, tiveram conhecimento da comunicação, bem como a informação relativa à intervenção desta Comissão, os mesmos prestaram o Consentimento para intervenção da CPCJ,”;
-- A seguinte participação de ocorrência, datada de 9-2-2023 “No âmbito das Equipas de Policia Escola Segura integrada no Modelo Integrado de Policiamento de Proximidade, foi solicitado através do telemóvel de serviço desta Equipa, comparência no local da ocorrência por haver notícia de agressividade, vandalismo de aluno menor do pré-escolar. Chegado ao local, apresentou-se-me a Participante Professora ___, a comunicar que, quando se encontrava na sala de aula com o menor CC juntamente com os restantes alunos da turma, estando assistir às atividades a progenitora do mesmo devido a comportamentos agressivos do menor, a dado momento e contrariando a ordem que lhe foi dada, começou a derrubar objetos/materiais escolares, cadeiras e mesas, deixando a sala de aula completamente revirada, conforme fotogramas em anexo.  Mais disse que, o menor, foi transportada por uma ambulância do INEM para o Hospital ..., fazendo-se acompanhar pela progenitora, desconhecendo os danos e valores causados. Efetuadas diligências junto da unidade hospitalar, apurou-se que o menor deu entrada com o episódio de urgência n. , e na ressecção tentou derrubar/danificar o computador daquele serviço bem como, cuspiu para os assistentes; auxiliares, enfermeiros e médicos que se ia cruzando, no decorrer da identificação, o menor esboçou agressividade tentando tirar/derrubar o bloco de  apontamento ao mesmo tempo ia tentando atingir com cuspe esta policia, sendo notória a passividade e conivência da progenitora.”
--A seguinte informação prestada pela COMISSÃO DE PROTECÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS para explicar a anterior ocorrência: “Verificando-se algumas dificuldades na interpretação por parte da respetiva encarregada de educação quanto a adequação e eficácia das estratégias de resposta aos comportamentos desajustados do CC, pretendendo- se, também, perceber o perfil e dinâmica relacional entre a criança e a sua mãe, bem como quanto à sua resposta perante situações como as que diariamente se têm vindo a verificar em contexto de sala e grupo (confronto direto e desafio à educadora e assistente operacional, atitudes hostis para com os colegas e adultos, recusa em desenvolver os trabalhos propostos e destruição de materiais e trabalhos do seus pares) foi agendada a referida reunião e estabelecida a ser realizada em contexto de sala de aula, procurando-se, desta forma, uma observação em contexto natural e numa rotina diária habitual.
Previamente ao momento da reunião, o CC tinha já manifestado comportamentos desadaptadas, com significativa intensidade, para com a educadora de infância e restantes adultos. No momento da chegada da sua mãe, o CC posicionou-se sob um banco frontal à sua sala, recusando-se a sair. Com a intervenção da mesma saiu e reconheceu, em resposta às perguntas da mãe, que se tinha portado mal.
 Já posicionados na mesa de reunião, o CC começou a destruir diferentes produtos do trabalho dos colegas, a atirar para o chão materiais existentes na sala e a agredir colegas aleatoriamente.
A sua mãe mostrou sempre uma atitude de autocontrolo geral (tom de voz moderado e afável, controlo físico regulado e eficaz) no entanto, a cada tentativa para perceber se o CC já se encontrava capaz de adotar um comportamento adequado, a situação foi ganhando intensidade e gravidade acrescida.
Perante esta exposição negativa e mesmo potencial risco para as restantes crianças, foi dada indicação para a assistente operacional desenvolver dinâmicas de grupo no espaço exterior. Neste processo, ao invés de uma acalmia do CC verificou-se um elevado grau de descontrolo, o que levou à necessidade de, com a sua mãe, se chamar o INEM, para encaminhamento para consulta de pedopsiquiatria no Hospital ....
Esta ação implicou o protocolo de ativação do piquete da PSP, que tomou nota da ocorrência, com registo fotográfico da grande desorganização do espaço de sala de aula, reflexo dos comportamentos únicos do CC.
A mãe manteve sempre uma atitude conforme, sempre afável com o filho e ajustada à interação com todos, mesmo perante a gravidade do vivenciado e preocupação com o quadro de desorganização emocional revelado pelo CC.”
A seguinte informação, datada de 15-1-2024   “informo que foi instaurado o Processo de Promoção e Proteção para a criança CC, no dia 22 de fevereiro de 2023, devido a uma comunicação proveniente PSP ..., sobre criança que assume comportamentos inadequados. Os progenitores, DD e BB, tiveram conhecimento da comunicação, bem como a informação relativa à intervenção desta Comissão, os mesmos prestaram o Consentimento para intervenção da CPCJ”.

IV -Fundamentação de Direito

A--- Da nulidade da decisão

O Recorrente invoca a nulidade da decisão, fundando-se para tanto:

.1- que não foi estabelecido o regime convivial do Recorrente com o menor, como também não há qualquer menção acerca dos contactos regulares com o menor por meio de comunicação à distância, o que, na prática, se traduz numa medida limitativa e inibitória do exercício das responsabilidades parentais do Recorrente sem qualquer demonstração da existência de um perigo para segurança ou saúde do menor. Como se verá, esta é uma questão de mérito, que terá que ser apreciada noutra sede, não de nulidade.
.2- Repete a fundamentação constante de parte do despacho e afirma que “A fundamentação para o tribunal recorrido afastar qualquer possibilidade de contacto presencial entre o Recorrente e o seu filho decorre do facto de os mesmos estarem afastados e a criança estar a ser acompanhada por psicólogo e pedopsiquiatra.” Após discute o mérito desta decisão. Ora, a nulidade de uma decisão não se confunde com o seu mérito, como vimos, pelo que esta questão terá que ser discutida aquando da aplicação do Direito aos factos.
.3- Afirma que “a omissão da decisão que não se pronuncia acerca da possibilidade de o Recorrente de ter contactos presenciais com o CC, com justificação na mera aderência a promoção do Ministério Público, é uma clara afronta ao disposto dos n.ºs 1 e 2 do artigo 154.º do Código de Processo Civil”.
Há, pois, que verificar se ocorreu a falta de fundamentação da decisão.
Para tanto é de relevância primordial salientar que, quer as sentenças, quer os despachos têm que ser fundamentados, divergindo, no entanto, o grau de exigência de fundamentação em função da complexidade da situação.
No que aqui nos importa, visto que de mero despacho se trata, importa atentar no disposto no artigo 154º do Código de Processo Civil: “As decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas. A justificação não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição, salvo quando, tratando-se de despacho interlocutório, a contraparte não tenha apresentado oposição ao pedido e o caso seja de manifesta simplicidade.”
Este dever de fundamentação das decisões judiciais tem em vista um conjunto de objetivos que são fundamentais no nosso estado de direito: contribui para a eficácia das decisões, conseguindo-se o seu respeito, não pela força da autoridade, mas pela razão com que convencem; sendo, pois, um fator de legitimação do poder judicial; permite o controlo da decisão, possibilitando a sindicância do processo lógico e racional que lhe esteve na base, impedindo, desta forma, decisões arbitrárias e garantindo a transparência do processo decisório e o respeito da independência e da imparcialidade das decisões. Processualmente tem ampla utilidade, quer na fase decisória, obrigando o tribunal que a profere a verificar e controlar a sua própria decisão, quer posteriormente, permitindo a sua reapreciação através de recurso.
Assim, a fundamentação visa garantir a inexistência de decisões arbitrárias, além de garantir implicitamente o direito a um processo justo e equitativo.
É por isso que o dever de fundamentação das decisões incorpora uma garantia integrante do próprio conceito de Estado de direito democrático. Assim, este princípio tem tutela no artigo 6º da Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem das Liberdades Fundamentais, no artigo 10º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e 205º nº 1 da Constituição da República Portuguesa e é especificada no artigo  154º do Código de Processo Civil.
A omissão do dever de fundamentação é causa de nulidade da decisão nos termos da alínea b) do artigo 615º do Código de Processo Civil, que se reporta às sentenças, mas que e extensivo aos despachos nos termos do artigo 613º, nº 3, do Código de Processo Civil.
É pacífico, no entanto, citando-se Alberto dos Reis, em Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 2.º, Coimbra Editora, 1945, págs. 172-173, demonstrando a segura consolidação desta posição, que “O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afeta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto”. A nulidade do despacho, por falta de fundamentação, prevista no art. 615º, nº 1, al. b), do Código de Processo Civil, não se verifica quando apenas tenha havido uma justificação incompleta, deficiente ou pouco persuasiva, apenas tendo lugar se for a omissão de substruções for completa e total.

concretização

A justificação dada verbalmente em ata, não se limitou a aderir à promoção do Ministério Público, mas referiu os pontos essenciais em que se baseou e remeteu o seu complemento para a promoção que acabava de ser ditada : “A decisão a proferir não contém qualquer juízo de valor relativo a qualquer dos progenitores, destinando-se a regular o interesse do menor durante o andamento do processo, conferindo ao menor a estabilidade necessária e os cuidados de que carece enquanto os adultos e o Tribunal diligenciam pelo seu superior interesse com cumprimento dos trâmites legais… Assim, importa atento o estado dos autos, ponderar tudo aquilo que aqui foi relatado pelos progenitores e respectivos Ilustres Mandatários, designadamente que o menor sempre viveu com a progenitora e que, há pelo menos 2 anos não está presencialmente com o progenitor, salientando-se que aquele está em acompanhamento psicológico e pedopsiquiátrico, no confronto com a informação prestada pela CPCJP do que decorre que junto do mesmo foi aplicada a medida de apoio junto dos pais, a executar junto da mãe…. Reiterando aqui, a douta argumentação aventada pelo Digno Ministério Público, considerando o desacordo dos progenitores sobre o regime parental a fixar, a necessidade de garantir estabilidade na vida do menor e de prevenir conflitos, decide-se ao abrigo do disposto no artigo 38º do RGPTC, fixar o seguinte regime provisório: Relativamente ao regime convivial, uma vez mais subscrevendo aqui aquilo que já foi referido pela Digna Magistrada do Ministério Publico e tendo sempre como objectivo o superior interesse do CC, a estabilidade e bem estar emocional do mesmo, solicite-se o processos de promoção e protecção que corre termos na Comissão, para apensação aos presentes autos  e determina-se que se procede em conformidade como o promovido, designadamente solicitando que seja elaborado o respectivo relatório, aferindo deste regime convivial, tendo  sempre presente  a estabilidade e bem estar do menor identificado nos autos.”
No presente caso é evidente que a decisão recorrida não diferencia de forma separada factos e direito, mas o Recorrente não se insurge contra esta situação. De qualquer forma, a natureza da decisão, provisória e na própria ata, com base em elementos ainda muito incipientes, explica alguma simplificação na sua estrutura.
Na decisão recorrida referiram-se os factos essenciais em que se baseou, pelo que a mesma não padece de total falta de indicação dos fundamentos de facto e de direito e por isso não se justifica a sua anulação com base na falta de alicerçagem: dúvidas não há que foi apresentada argumentação, aliás fortemente debatida no recurso.
Improcede, pois a alegada nulidade.
 
B --- Da necessidade de regulação provisória das responsabilidades parentais

Encontramo-nos no âmbito de um processo de regulação das responsabilidades parentais, o qual, como todos os processos tutelares cíveis, tem a natureza de jurisdição voluntária, nos termos do artigo 12º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível (Lei n.º 141/2015, de 08 de Setembro cuja alteração mais recente foi introduzida pela Lei n.º 24/2017, de 24/05) determinando, pois, face ao disposto no artigo 987º do Código de Processo Civil, que o Tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo antes adotar em cada caso a solução que julgue mais conveniente e oportuna. O artigo 4º deste diploma, por seu turno, explicita que estes se regem pelos princípios orientadores de intervenção estabelecidos na lei de proteção de crianças e jovens em perigo e ainda pelo princípio da simplificação instrutória e oralidade, consensualização, audição e participação da criança.
Do conjunto destes preceitos não se apura a concessão de um poder discricionário do juiz, mas que este tem um dever acrescido de orientar o processo, tendo em vista o objetivo do processo, que é, como é consabido, o superior interesse da criança.
Nos termos do artigo 38º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível se ambos os pais estiverem presentes ou representados na conferência, mas não chegarem a acordo que seja homologado, o juiz decide provisoriamente sobre o pedido em função dos elementos já obtidos, suspende a conferência e remete as partes para: a) Mediação, nos termos e com os pressupostos previstos no artigo 24.º, por um período máximo de três meses; ou
b) Audição técnica especializada, nos termos previstos no artigo 23.º, por um período máximo de dois meses.

Assim, tem sido entendido que “na ação de regulação das responsabilidades parentais, finda a conferência a que alude o art.º 35º do RGPTC, sem que nela seja homologado acordo, o art.º 38º impõe que o juiz decida provisoriamente sobre o pedido, em função dos elementos já obtidos, não tendo que aguardar por quaisquer outras diligências de prova, nem pela audição de técnicos especializados, sem prejuízo de, posteriormente, ainda antes da decisão final, logo que ouvidos esses técnicos ou produzida mais prova, poder ser alterado o inicialmente decidido, como previsto no art.º 28º nº 2, “a fortiori” II – Tratando-se de uma decisão provisória, fundada nos poucos elementos até essa data recolhidos, normalmente apenas nas declarações dos progenitores, o julgador deve nortear-se por princípios de razoabilidade, actuando com bom senso, prudência e moderação, protegendo os interesses dos menores e só depois os dos progenitores eevitando que a decisão agudize o conflito e assim impeça um acordo, que ainda poderá vir a ser obtido na segunda fase da conferência (Cfr. art.º 39º nº 1 do RGPTC).” Acordão do Tribunal da Relação de Guimarães de 2017-01-12 no processo nº 996/16.0T8BCL-D.G1
Por outro lado, também é entendimento atual que esta norma impõe decisão provisória sobre o regime das responsabilidades parentais, com base nos elementos que disponha, independentemente da sua exuberância ou exiguidade, mas sempre tendo em vista que a tutela do interesse fundamental do menor tem efetivamente de prevalecer sobre quaisquer constrangimentos ou dificuldades procedimentais ou práticas que hajam obstado à aquisição processual de factos relevantes (cf o acordão do Supremo Tribunal de Justiça de 10/04/2018 no processo 2909/15.8T8FAR-A.E1.S1 (“I – Em processo para regulação do exercício das responsabilidades parentais, quando, estando presentes ou representados ambos os pais na conferência, estes não cheguem a acordo que seja homologado, a lei impõe ao juiz a prolação de decisão provisória e cautelar. II – Nesta decisão deverá ser fixada a pensão de alimentos a pagar pelo progenitor não guardião, ainda que se desconheça a sua concreta situação económica.”, onde se refere “Não é, por outro lado, esta seguramente a única situação em que os tribunais, através de juízos de prognose, porventura delicados, de presunções naturais (por exemplo, a de que o progenitor ausente deterá seguramente um patamar mínimo de rendimento, de valor equiparável ao salário mínimo ou, ao menos, ao rendimento social de inserção), do apelo a critérios e juízos de equidade acabam por ter de tomar decisões sobre matérias que se revelam de impossível apuramento consistente através dos factos e provas efectivamente produzidas nos autos (basta pensar na fixação de indemnização por danos patrimoniais futuros sofridos por lesado menor, em que não é identicamente viável formular juízos minimamente seguros e consistentes sobre o curso hipotético dos factos, sem que por isso o julgador não acabe por ter de dirimir efectiva e actualmente o litígio, através dos elementos disponíveis).”
Sendo este também o nosso raciocínio, há que verificar se o superior interesse do menor impunha que neste momento, mais a mais com os parcos elementos que se dispõem, se fixasse um regime de visitas do progenitor ao menor, nomeadamente com a complexidade que este propõe.

C--- Do direito de visitas

Não há dúvidas que a decisão que se deve proferir nestes autos tem que ser orientada pelo superior interesse da criança (mas realça-se que também este princípio tem que orientar as atitudes dos pais, o que nunca é demais repetir neste tipo de processos, em que é patente o conflito entre os progenitores e tantas vezes vem ao de cimo o privilegiar da sua autoestima e egoísmo, esquecendo-se que a sua obrigação primeira é agir em benefício dos seus filhos).
Por outro lado, é também indiscutível que "Os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos e os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial.”(artigo 36º nº 5 e 6 da Constituição da República Portuguesa).
O exercício das responsabilidades parentais não pode ficar prejudicado pelo afastamento dos pais entre si, sendo necessários ambos os progenitores para o crescimento harmonioso da criança, que com estes mantêm relações próximas.
Assim, assiste a ambos os progenitores o dever de estar presente e intervir no crescimento e educação dos seus filhos, tendo os menores o direito a conviver com ambos os progenitores e beneficiando da sua companhia, mesmo que um dos progenitores com eles não partilhe a mesma morada a maior parte do tempo.
Ao período que se atribui ao relacionamento e convívio dos menores com o progenitor que com ele não reside habitualmente e com a família cujo vínculo se funda nesse tronco, chama-se, em termos amplos, direito de visitas.
Este direito de visitas deve ser estipulado tendo em conta o interesse da criança e seus pais, tendo que ser encontrado em concreto, tendo em conta as circunstâncias dos filhos e a situação dos pais.
É, do exposto, claro que, salvo situações extremas, a convivência do menor com o progenitor que com ele não reside habitualmente, de forma regular, continuada, segura e pacificada satisfaz o interesse do menor, assumindo por isso o regime de visitas uma importância primordial no crescimento equilibrado da criança.
Todos estes princípios estão traduzidos no artigo 1906º do Código Civil, o qual afirma como regra que as responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida do filho são exercidas em comum por ambos os progenitores nos termos que vigoravam na constância do matrimónio, afirmando que “o tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles.”
Da mesma forma, o artigo 24º nº 3 da Carta Dos Direitos Fundamentais Da União Europeia dispõe que “Todas as crianças têm o direito de manter regularmente relações pessoais e contactos diretos com ambos os progenitores, exceto se isso for contrário aos seus interesses. Também o artigo 3º, da Convenção das Nações Unidas sobre os direitos das crianças impõe que todas as decisões relativas a crianças, adotadas por instituições públicas ou privadas de proteção social, por tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, terão primacialmente em conta o interesse superior da criança.”
Desta forma, para concretizar este interesse da criança há que atentar, em cada caso concreto, as necessidades desta, que passam também pela relação afetiva que tem com cada um dos pais, a disponibilidade de cada um para lhe prestar os cuidados necessários para o seu pleno desenvolvimento, a sua preferência, a continuidade das relações afetivas e do ambiente em que tem vivido, a disposição de cada um para fomentar a relação com o outro progenitor, tendo também em conta o que causa inferior desestabilização e descontinuidade na sua vida.
Tudo sem esquecer como a quebra de relações afetivas pode afetar o desenvolvimento das crianças e de como, em regra, é central para esta o papel dos dois progenitores.
O direito de visita tem um objeto muito amplo, abrangendo qualquer forma de contacto, que vão desde comunicações à distância, como contactos telefónicos, como convivência presencial, por diferentes períodos: por horas, com ou sem pernoita, fins de semanas, estadias por várias semanas.
No entanto, decorre do nº 3 do artigo 24º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia que tais visitas devem ser regulares e mediante contactos diretos, salvo se o interesse do menor o não aconselhar.
Para fixar o regime de visita há, pois, que ter em conta, antes de mais, como realça este preceito e todo o nosso direito nesta matéria, o "superior interesse da criança". Com efeito, decorre do artigo 4º da Lei n.º 147/99, de 01 de setembro Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo aqui aplicável ex vi artigo 4º nº 1 da Lei n.º 141/2015, de 08 de setembro, (que regula o presente processo tutelar cível, por fixar o seu regime geral (RGPTC), que “A intervenção para a promoção dos direitos e proteção da criança e do jovem em perigo obedece aos seguintes princípios:
“a) o Interesse superior da criança e do jovem - a intervenção deve atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do jovem, nomeadamente à continuidade de relações de afeto de qualidade e significativas, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no além âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto
Enfim, neste campo há que ter em conta o direito de visitas, enquanto (e quando) contributo relevante para o saudável crescimento afetivo e psicológico do menor. Entre os outros interesses a considerar para fixar o regime de visitas, há também que ter em conta o interesse do titular do direito de visita e as prerrogativas do guardião.
Concorda-se, assim, com a posição do Recorrente ao salientar a importância do direito de visitas do progenitor que não coabita com o menor e a manutenção (ou criação) dos laços afetivos entre os progenitores e os seus filhos, que só deve ser limitado quando o interesse da criança o impuser.

concretização

No presente caso, o tribunal não fixou um regime de visitas entre o progenitor e o menor, considerado que “que o menor sempre viveu com a progenitora e que, há pelo menos 2 anos não está presencialmente com o progenitor, salientando-se que aquele está em acompanhamento psicológico e pedopsiquiátrico, no confronto com a informação prestada pela CPCJP do que decorre que junto do mesmo foi aplicada a medida de apoio junto dos pais, a executar junto da mãe”.
O Recorrente afirma que a falta de estabelecimento no momento da conferencia do regime provisório convivial do Recorrente com o menor, se traduz, na prática, numa medida limitativa e inibitória do exercício das responsabilidades parentais do Recorrente sem qualquer demonstração da existência de um perigo para segurança ou saúde do menor.
Não concordamos.
O tribunal não decidiu limitar o regime de visitas do Requerido, limitou-se a decidir que ainda não estava em condições de se pronunciar provisoriamente sobre essas visitas e o modo como se realizariam e fixou o momento em que se propunha proferir tal decisão: junto que estivesse o relatório social cuja elaboração determinou, para que pudesse decidir com base em elementos avalisados.
Se não tivesse sido fixado um momento próximo para a tomada da decisão, ainda se poderia conceder que na prática fora decidido privar o Requerido de tais visitas, pela ausência de pronúncia quanto a um regime provisório, mas não foi esse o caso. Decorre da decisão que o tribunal  decidiria quando tivesse o relatório para nele se basear: “Relativamente ao regime convivial, uma vez mais subscrevendo aqui aquilo que já foi referido pela Digna Magistrada do Ministério Publico e tendo sempre como objectivo o superior interesse do CC, a estabilidade e bem estar emocional do mesmo, solicite-se o processos de promoção e protecção que corre termos na Comissão, para apensação aos presentes autos  e determina-se que se procede em conformidade como o promovido, designadamente solicitando que seja elaborado o respectivo relatório, aferindo deste regime convivial, tendo  sempre presente  a estabilidade e bem estar do menor identificado nos autos.”, mais a mais ao remeter para a promoção do Ministério Público: “afigura-se-nos que deverá ser determinada a apensação do processo da CPCJ a este processo e que uma vez junto se solicite relatório social à Segurança Social quanto à medida de promoção e protecção a aplicar e designadamente a delineação de um regime de visitas , que não só seja exequível como benéfico para o menor”.
É esta a decisão que cumpre analisar e não outra, apresentada pelo Requerido e que não corresponde ao que consta dos autos.
Analisemos, no entanto, os demais argumentos do requerido, visto que também esta decisão é posta em causa pelo mesmo.
O Recorrente estriba-se no facto de não haver nos autos qualquer prova de ter praticado atos que possam caracterizar-se como violência doméstica, como afirmou a Requerente, mas como se viu a decisão não se baseou nessas afirmações da mãe. Da mesma forma insurge-se contra a consideração de que foi sujeito de uma suspensão provisória do processo por posse de produto suspeito de ser cannabis/haxixe/prensado em 2 de maio de 2017, sem ter em atenção que a decisão recorrida também se não baseou nesse facto. Não refere a extinção da pena em 9 de maio de 2011, aplicada ao progenitor pela prática de um crime de p. e p. no artigo 172º, nº 2 e 30º, nº 2 do CP, por facto praticados em 17 de abril de 2000, sendo que na fundamentação da decisão também se não considerou tal facto.
A decisão não se baseou sequer na pessoa do progenitor, mas no facto de não haver quaisquer contactos presenciais entre este e o menor desde 2022 e o menor estar a ser sujeito a acompanhamento psicológico e pedopsiquiátrico, com aplicação de medida de apoio junto dos pais, a executar junto da mãe. Será que fez bem?
Do processo apenso, resulta que o menor apresenta neste momento comportamentos de grande instabilidade emocional, fora do corrente, com comportamentos de intensa violência, pelo que não é aconselhável impor-lhe situações com grande peso afetivo antes de verificar se são benéficos para o seu bem-estar e saúde mental e o modo mais concreto de proceder.
É pacífico que o menor e o pai não estão em presença um do outro há mais de dois anos. Tal corresponde a cerca de um terço da vida do menor, sendo que mesmo anteriormente não terão convivido com frequência. Sabida a importância da figura paternal, há que ter em atenção a importância que tal reencontro pode ter no menor e que poderá ser necessário preparar ambos para tal reunião ou, mesmo, zelar para que o mesmo ocorra em ambiente controlado.
Assim, face a este quadro e a necessidade de estudar a possibilidade e modo de um reatamento convivencial entre o menor e o progenitor, o tribunal limitou-se a suspender a decisão sobre essa matéria enquanto aguarda informações que lhe permitam provisoriamente pronunciar-se sobre a mesma: não foi aplicada nenhuma medida limitativa do exercício das responsabilidades parentais, sequer provisória.
Da mesma forma a existência de um processo apenso onde também se tomam medidas sobre o menor e onde está a ser aplicada medida com impacto na sua vida junto da mãe, implica que se proceda a uma harmonização entre as decisões e medidas de ambos os processos.
Foi, sensatamente, proferida uma decisão conservadora, justificável quando está em causa a estabilidade psicológica e o desenvolvimento emocional do menor, não se decidindo imediatamente sobre o regime de visitas, por não se poder ter, para já, face ao estado do processo, como favorável ou desfavorável ao menor. Sustou-se na decisão, mantendo-se o status quo, enquanto se obtém elementos que permitam uma decisão que não prejudique o menor e sobre a melhor forma de a executar. A situação psicológica de instabilidade em que se encontra o menor, dada conta pelos relatórios juntos, exigiam que até que se obtivessem elementos que permitissem perceber a situação do menor, se mantivesse o mesmo rodeado de uma situação mais estável enquanto se aguardava pelo promovido “relatório social à Segurança Social quanto à medida de promoção e proteção a aplicar e designadamente a delineação de um regime de visitas, que não só seja exequível como benéfico para o menor”, nos termos promovidos e subscritos pela decisão recorrida.

-- da violação do princípio da igualdade das  partes, da proporcionalidade e do superior interesse do menor

O Recorrente afirma que ao não ter de imediato fixado o regime convivial entre o Apelante e o menor o tribunal afrontou os princípios da igualdade das partes, proporcionalidade e do superior interesse da criança.
Vimos já que não violou de forma alguma o superior interesse da criança: a situação de instabilidade emocional que a mesma apresenta, a distância que existe entre ela e o progenitor fruto de mais de dois anos de separação e de falta de contactos presenciais, em tão tenra idade, impõe que seja avisado estudar e preparar o regime de visitas com ajuda dos técnicos. Com efeito, o estabelecimento ou manutenção dos laços parentais e filiais nos casos em que existiu uma profunda separação entre pai e filho ou não chegou a haver uma aproximação entre eles não é de somenos, causando necessariamente perturbação a qualquer criança, quanto mais a um menor que se mostra já fragilizado emocionalmente, face ao tipo de atos violentos contra pessoas e coisas que consegue praticar. Há, por isso, que obter elementos que permitam aferir se e como se realizarão as visitas, atenta a importância desta matéria e a suscetibilidade de problemas no início do relacionamento entre o progenitor e o filho causarem maior ofensa na saúde psicológica e na afetividade do menor.
Não ocorreu, pois, qualquer uso de “um meio excessivo” ao deferir a decisão sobe o regime de visitas para o momento em que fosse apresentado o relatório sobre essa matéria, tanto mais que que decorre que junto do mesmo foi aplicada a medida de apoio junto dos pais, a executar junto da mãe.
Quanto ao princípio processual estruturante da igualdade das partes, há que atender que este significa que ambas as partes devem possuir os mesmos poderes, direitos, deveres e ónus, estando em paridade entre si e vistas e tratadas da mesma forma pelo tribunal arbitral (artigo 13º da Constituição da República Portuguesa). Impõe um tratamento não discriminatório das partes, visando-se evitar a arbitrariedade na decisão e implica, pois, o seu tratamento imparcial.
O princípio da igualdade não proíbe tratamentos diferenciados de situações distintas, implica, sim, que se trate da mesma forma o que é essencialmente igual e de formas desigual, em função dessa diferença, o que não o que é igual. Só se verifica a violação do princípio da igualdade se se encontrar tratamento diferenciado de situações essencialmente iguais.
Este princípio destaca-se também na apreciação da matéria de facto provada e não provada, devendo o tribunal assegurar a ambas as partes as mesmas condições, seja para exercer o seu direito à prova de um facto, seja para exercer o seu direito à contraprova ou à prova do facto contrário e tratar ambas as partes de forma paritária.
 Com efeito, o direito à prova é essencial a um processo justo e equitativo. 
No entanto, não há que confundir o direito à prova ou a um tratamento imparcial com uma discordância dos critérios utilizados para a sua avaliação crítica.
O que resulta das alegações do Recorrente é que este discorda da veracidade das afirmações da Requerida e que julga que ocorreu errónea formação da convicção relativa às declarações e elementos probatórios juntos aos autos.
No entanto, visto o processo apenso junto aos autos, de que supra demos conta, não se encontra qualquer disparidade entre os pressupostos factuais apresentados na decisão recorrida e as que resultam desses autos, quanto à difícil situação do menor no que toca ao seu estado emocional ou psicológico, vistos os seus comportamentos violentos.
O tribunal, assim, baseou-se em elementos objetivos para decidir, sem que se veja que tenha atribuído uma maior fé nas declarações de um progenitor sobre o outro (o que, aliás, poderia fazer, desde que o justificasse racional e coerentemente, dado que nem todas as afirmações são dignas da mesma credibilidade), nem que tenha favorecido algum interesse da progenitora, visto que a mesma não se opõe a que sejam permitidas visitas.
Afirma ainda que “o mais grave é a violação do trato e princípios universais de urbanidade”. Não obstante considerar-se mais grave a violação do interesse do menor, caso tivesse ocorrido, não decorre da audição da gravação qualquer atitude menos urbana por parte do Tribunal.
Assim, também por aqui não se vê que a decisão tenha violado qualquer interesse do menor ou direito dos progenitores, nem qualquer princípio a que deva obediência, pelo que deve ser mantida, nomeadamente no que toca ao modo de atualização anual fixada, atento o valor diminuto da prestação alimentar que foi encontrada e o facto das despesas do menor irem aumentando com a sua idade.
Termos em que se mantém a decisão proferida.

V- Decisão

Por todo o exposto, julga-se totalmente improcedente a apelação e em consequência mantem-se o despacho proferido
Custas do recurso pelo Recorrente, que ficou vencido.
Guimarães, 29 de maio de 2024

Sandra Melo
Paula Ribas
Jorge dos Santos