Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
6921/22.2T8VNF.G1
Relator: PEDRO MAURÍCIO
Descritores: PEAP
RECUSA DE HOMOLOGAÇÃO DO ACORDO DE PAGAMENTO
VÍCIOS NÃO NEGLIGENCIÁVEIS
VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE DE TRATAMENTO DOS CREDORES
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
PROIBIÇÃO DO ARBÍTRIO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/27/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - O PEAP tem uma função estritamente preventiva: o âmbito subjetivo do PEAP é o devedor que não seja titular de empresa (em essência, pessoas singulares), pelo que a sua finalidade não é a recuperação, a qual só tem em vista «empresas», mas sim tentar evitar ou prevenir a insolvência com as consequências económicas e sociais daí advenientes. Portanto, a susceptibilidade de recuperação do devedor não constitui requisito legal do PEAP (ao contrário do que sucede no PER).
II - Decorre do disposto nos nºs. 1 e 2 do art. 222ºF do C.I.R.E. que as negociações podem ser concluídas com a aprovação unânime de acordo de pagamento ou com a aprovação de acordo de pagamento por uma das maiorias previstas no nº3 do referido art. 222ºF, sendo que, em qualquer dos casos (aprovação unânime ou maioritária), compete sempre ao juiz decidir se homologa ou recusa a homologação do acordo de pagamento, aplicando-se com as devidas adaptações as regras vigentes em matéria de aprovação e homologação do plano de insolvência previstas no título IX, em especial o disposto nos arts. 215º (recusa oficiosa) e 216º (recusa a solicitação dos interessados) do C.I.R.E.
III - O C.I.R.E. não define o que seja o conceito de «violação não negligenciável» consagrado no art. 215º, mas em conformidade com a densificação do mesmo que tem vindo a ser realizada pela doutrina e pela jurisprudência, podemos concluir que constituem vícios não negligenciáveis (ou não desculpáveis) aqueles que configurem inequivocamente uma violação de normas imperativas, cujo resultado seja ilegal e insusceptível de ser suprido com o consentimento dos tutelados, ou seja, aqueles que representem violações destas normas imperativas e acarretem a produção de um resultado que a lei não autoriza (veda/impede).
IV - Um dos casos que pode configurar precisamente uma violação não negligenciável das normas aplicáveis ao conteúdo do acordo de pagamento aprovado é a violação do princípio da igualdade de tratamento dos credores consagrado no art. 194º do C.I.R.E.
V - Este princípio da igualdade de tratamento dos credores consubstancia uma trave mestra e estruturante na regulação do acordo de pagamento e abrange as duas dimensões em que se desenvolve o princípio da igualdade: impõe que se trate como igual o que for necessariamente igual e impõe que como diferente o que for essencialmente diferente; este normativo tem um carácter imperativo, mas não em termos absolutos já que a 2ª parte do nº1 do art. 194º permite que existam «diferenciações justificadas por razões objectivas»; e entre as circunstâncias que podem ser atendidas em concreto para justificar o tratamento diferenciado, revelam as distintas classes de créditos definidas no art. 47º/4 do C.I.R.E., o respectivo grau hierárquico dentro da mesa categoria, e diversidade das suas fontes, mas também o consentimento do credor afectado previsto no nº2.
VI - No apuramento da existência das razões objectivas para um concreto tratamento diferenciado tem que se observar o princípio da proporcionalidade e atentar na proibição do arbítrio.
VII - Não contendo o acordo de pagamento aprovado qualquer fundamento (causa) objectivo, racional, e razoável para explicar o tratamento diferenciado entre os créditos garantidos (salvaguarda de 100% do capital, pagamento em 240 prestações mensais a partir do trânsito em julgado da decisão de homologação do acordo, acrescidas de juros vincendos) e os créditos comuns e subordinado (perdão de 90% do capital, pagamento em duas prestações, vencendo-se a primeira, no mínimo, 21 anos após do trânsito em julgado da decisão de homologação do acordo e a segunda, no mínimo, 22 anos após esse trânsito, e sem juros vincendos), então tal diferenciação implica uma tratamento de enorme e descomunal desfavor dos créditos comuns (e subordinado) em relação aos créditos garantidos, o que se traduz numa medida totalmente desproporcional, discriminatória e até arbitrária e, por via disso, violadora do princípio da igualdade previsto no art. 194º do C.I.R.E.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães[1]

1. RELATÓRIO

1.1. Da Decisão Impugnada
AA e mulher BB, na qualidade devedores, e CC, na qualidade de Credor, vieram «manifestar a vontade de encetarem negociações conducentes à revitalização daqueles devedores por meio da aprovação de um plano de pagamento», e propor, nos termos e para efeitos do art. 222º-A e seguintes do C.I.R.E., processo especial para acordo de pagamento, pedindo que «seja ordenada a promoção de PROCESSO ESPECIAL PARA ACORDO DE PAGAMENTO, nos termos do CIRE, requerendo ainda a respectiva tramitação urgente nos termos legais».

Fundamentaram a sua pretensão, essencialmente, no seguinte: «O requerente exerce funções de Fiel de Armazém, tendo como único rendimento o salário base que aufere de 705 Euros; a requerente, esposa do requerente desde ../../2017, aufere rendimentos acima da média, mas variáveis, como trabalhadora independente, na área de reparação de mobiliário e similares, criação artística e literária; desde 2002 que o devedor se dedicava ao comércio e distribuição alimentar de produtos congelados e refrigerados, sendo sócio-gerente na empresa “EMP01..., Lda”; em 2007 constituiu outra empresa ligada àquele ramo de actividade, sendo sócio-gerente da sociedade “EMP02..., Lda.”, atendendo às necessidades de mercado nos serviços de entrega de comida ao domicílio, através de protocolos com restaurantes, sendo apenas responsável pela sua distribuição e marketing; face às contingências de mercado e crise internacional ambos acabaram por desaguar numa situação económica quase insustentável no seu dia-a-dia; os devedores assumiram pessoalmente diversos créditos e garantias pessoais, e na qualidade de sócios assumiram garantias a fim de verem aprovados os financiamentos em nome da empresa supra referida, assumindo obrigações e responsabilidades das quais hoje têm vindo a apresentar dificuldades em cumprir pontualmente, face ao seu rendimento e demais despesas; os requerentes tentaram renegociar as condições contratuais com a banca acordando em planos prestacionais para cumprimento da dívida, o que, no entanto, não permitiu ultrapassar todas as dificuldades de tesouraria vividas, entrando em incumprimento nalgumas das obrigações pendentes; considerando os requerentes que apenas se encontram em situação financeira difícil, decidiram encetar um acordo com um dos credores e promover junto deste Tribunal o processo especial para acordo de pagamento; os devedores celebraram no dia 15/06/2022 um acordo com um dos credores “CC” para encetarem negociações conducentes à revitalização, conforme resulta do documento que se junta; com a aposição da assinatura em tal declaração, o credor considera que os devedores têm condições susceptíveis de viabilizar a sua recuperação evidenciando sinais para tal, considerando serem financeiramente responsáveis; os apresentantes têm passivo que ronda os € 400.000 Euros, mas não detêm um número excessivo de credores; encontram-se ambos numa situação viável para cumprir com um plano de recuperação; a elaboração do plano de recuperação com períodos de carência, prazos adaptáveis que se reflitam em prestações mensais, compatíveis com os rendimentos auferidos e as despesas essenciais à subsistência da devedora, irão permitir uma revitalização dos requerentes».
Na data de 27/12/2022, foi proferido despacho a nomear administrador judicial provisório (AJP) e ordenando a citação dos credores identificados e dos demais interessados, nomeadamente para que reclamassem eventuais créditos.
Em 23/01/2023 (referência citius «14051350»), a AJP apresentou nos autos a lista provisória de créditos, na qual constam como credores reconhecidos: EMP03..., Lda (dois créditos comum nos valores totais de € 1.205.727,21 e de € 553.558,69 respectivamente); EMP04... STC, SA (seis créditos comuns nos valores totais de € 466,93, de € 1.081,88, de € 49.779,27, de € 43,296,52, de € 17.059,19 e de € 23.609,60 respectivamente; três créditos garantidos nos valores totais de € 12.199,73, de € 43.473,15 e de € 98.456,46 respectivamente; e um crédito subordinado no valor total de € 199,42); CC (crédito comum no valor total de € 37.062,27); EMP05..., SA (crédito garantido no valor total de € 121.391,41); Instituto de Segurança Social, IP (crédito privilegiado no valor total de € 306,61 e crédito comum no valor total de € 19,95); EMP06... - STC, SA (cinco créditos comuns nos valores totais de € 650,36, de € 64,75, de € 26.172,05, de € 258,16 e de € 9.682,12 respectivamente); e EMP07..., SA (três créditos comuns nos valores totais de € 25.150,92, de € 685,93 e de € 5.752,46 respectivamente; e um crédito subordinado no valor total de € 11,49).
Em 31/03/2023 (referência citius «14393027»), a AJP e os Devedores juntaram aos autos acordo de prorrogação de prazo para as negociações no âmbito do PEAP pelo período de 30 dias.

Em 02/05/2023 (referência citius «14511921»), os Devedores juntaram aos autos «Plano Especial para Acordo de Pagamentos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, e no qual consta:
“(…) VII – Plano de reembolso dos créditos no âmbito do Plano de Pagamentos
No entendimento dos Requerentes, a sua recuperação passará não só pelo perdão dos juros de mora referentes aos seus créditos e outras despesas conexas com os incumprimentos (num total de 559.570,84€) mas também pela aceitação do presente plano especial de recuperação no qual foram equacionados diferentes cenários, apresentando-se aquele que em entender da Requerente, melhor atende à atual situação:
• Foram observados critérios de máxima prudência, atendendo a uma conjuntura económica desfavorável que se vive em particular nosso país, bem como às dificuldades trazidas por força da apresentação do Processo Especial de Recuperação;
• Foi considerado o pagamento integral do capital em dívida às entidades detentoras de créditos garantidos;
• Foi considerado o perdão total dos juros de mora e outras despesas conexas referentes aos créditos existentes;
• Foi considerado o pagamento integral de valores em dívida ao Estado;
• Pretendeu-se assim atentar à questão financeira, por forma a possibilitar a subsistência aos Requerentes e ao seu agregado familiar;
VIII - Medidas propostas para pagamento
Apresenta-se no estudo e submete-se, para aprovação de todos os credores, a reestruturação de dívida nos seguintes termos:
• INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P.
- Pagamento integral do valor em dívida ao Instituto da Segurança Social, I.P. no prazo máximo de 8 dias após aprovação do presente plano.
• CRÉDITOS GARANTIDOS
Capital: 195.326,87 € Total reclamado: 275.520,75 €
- Perdão dos juros de mora e outras despesas decorrentes da mora ou incumprimento dos créditos garantidos, no montante total de 80.193,88€.
- Perdão de juros vencidos entre a data da reclamação de créditos e a data do trânsito em julgado da Sentença de Homologação do Plano;
- Estabelecimento de um período de carência para pagamento de capital e juros vincendos de um ano com início no mês seguinte ao do trânsito em julgado da decisão que vier a homologar o presente acordo de credores;
- Pagamento de 100% do capital em dívida no montante de 195.326,87€, em 240 prestações mensais, postecipadas e sucessivas, vencendo-se a primeira no último dia útil do ano seguinte ao do término da carência de pagamentos estabelecida imediatamente acima;
- Dessas 240 prestações mensais, sucessivas, as primeiras 239 serão no valor de 602,68€ (cada uma) -e incluem amortização de capital e juros- (a ratear proporcionalmente pelos credores garantidos na direta proporção do seu crédito sobre a totalidade dos créditos garantidos) e a 240º será no valor de 179.955,57 € -inclui amortização de capital e juros
vincendos-, a título de “valor residual”;
- Pagamento de juros vincendos, a liquidar após o último dia útil do ano seguinte ao do trânsito em julgado da Sentença de Homologação do Plano, resultante da Euribor 12M acrescida de um spread de 0,33, ao ano (Refª Euribor a 12M em 28 de Abril de 2023 é de 3,88%);
- Manutenção das garantias reais e pessoais prestadas a favor dos credores garantidos.
Sobre estes créditos, para uma melhor percepção dos mesmos, convém esclarecer o seguinte:
Estão dados como garantia imóveis urbanos dos requerentes que apresentam um valor patrimonial fiscal de €112.928,90Euros.
É sabido que o seu real valor de mercado, não só pelo momento que atravessamos, como também pela sua localização, é hoje de grande subjectividade, mas invariavelmente sempre muito próximo, por defeito, do supra referido VPT.
Também temos bem presente as inúmeras vendas que diariamente são feitas no âmbito de processos executivos ou outros. Regra geral é considerado o valor de venda de 70% do valor patrimonial dos imóveis. Seguindo este raciocínio, para efeitos de venda em liquidação, podemos considerar como valor de mercado para estes imóveis 79.050,23€.
Mesmo considerando os 80% do valor patrimonial como valor realizável para efeitos de venda, e se considerarmos uma rentabilidade a 30 anos com juro anual de 2 % chegamos ao valor de 119.253,29€ (capital e juros) na rentabilização destes activos.
No que propomos neste plano, ao assumirmos a totalidade do capital em dívida, a uma taxa real indexada de 4,21 % ao ano, chegamos confortavelmente a um valor superior ao que atrás se indica.
Acresce que, com a subida muito acentuada das taxas de juro de referência (EURIBOR), em cerca de 4% num ano, o valor do crédito bancário tornou-se incomportável para a maioria das famílias de classe média, provocando a consequente diminuição de preços dos imóveis destinado a esse segmento de mercado, por diminuição acentuada da procura.
Assim, não só protegemos o credor com hipoteca pagando-lhe a totalidade da sua dívida como lhe acautelamos a sua rentabilidade esperada, o que significa que, pelo cumprimento do presente plano o credor hipotecário obterá seguramente um resultado mais vantajoso do que pela via da liquidação.
É defendida a carência de um ano como prazo razoável e previsível para relançar negócios e estabilizar a vida dos devedores e, consequentemente a sua capacidade de gerar tesouraria e fluxos de caixa positivos que lhes permitam cumprir o proposto, bem se sabendo que a pendência inviabiliza essa redefinição de modo de vida.
• CRÉDITOS COMUNS E SUBORDINADOS
Capital: 1.501.218,82 € Total reclamado: 1.980.595,78 €
- Perdão dos juros de mora e outras despesas decorrentes da mora ou incumprimento, no montante total de 479.376,96 €.
- Perdão de juros vencidos entre a data da reclamação de créditos e a data do trânsito em julgado da Sentença de Homologação do Plano;
- Perdão de juros vincendos;
- Perdão incondicional de 90% do capital reclamado;
- Pagamento de 10% do capital em dívida no montante de 151.121,88€, em 2 prestações anuais, iguais, postecipadas e sucessivas, de 75.560,94€, cada uma, vencendo-se a primeira no último dia útil do ano seguinte ao do último pagamento efetuado aos credores garantidos e a segunda em igual dia do ano subsequente, ambas a ratear na proporção direta com os créditos comuns reclamados entre os respetivos credores (…)”.
Em 12/05/2023 (referência citius «14560824»), o Credor Instituto de Segurança Social, IP veio informar que «vota favoravelmente o Acordo de Pagamentos dos devedores».

Ainda em 12/05/2023 (referência citius «14562498»), o Credor EMP04... STC, SA veio declarar «votar contra a aprovação do mesmo, solicitando a não homologação do plano, uma vez que a situação ao abrigo do plano é menos favorável do que a que interviria na ausência de qualquer plano».
Em 16/05/2023 (referência citius «14577404»), o Credor EMP05..., SA veio declarar «votar contra a aprovação do mesmo, requerendo, desde já, a sua não homologação, porquanto o mesmo será desfavorável para a ora Credora».
Também em 16/05/2023 (referência citius «14577404»), o Credor EMP06... - STC, SA veio informar que «votou contra o plano especial para acordo de pagamento apresentado, porquanto o mesmo se mostra desfavorável, não devendo o mesmo ser homologado».
 Em 18/05/2023 (referência citius «14591036»), a AJP veio juntar aos autos a «Ata de Votação do Plano de Recuperação apresentado pelos Devedores», cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, e na qual consta:
“(…) Tomando a palavra a Administradora Judicial Provisória, informou que votaram o Plano 88,68% dos credores cujos créditos foram reconhecidos (vide tabela 1 em anexo), verificando-se assim, a existência de quórum deliberativo.
Relativamente aos credores que emitiram o seu sentido de voto (que integram a. presente
como Documento nº1) resulta que, 78,75% dos votos emitidos são favoráveis e 9,93% dos votos emitidos são desfavoráveis (vide tabela 2 em anexo).
Em face do exposto, conclui-se pela APROVAÇÃO do Plano Especial para Acordo de Pagamento, nos termos e para os efeitos do artigo 222.°F, n.o 3. do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (…)”.
Na data de 24/05/2023, o Tribunal a quo proferiu sentença com o seguinte decisório:
“Pelo exposto, ao abrigo do disposto no artigo 222.º-F, n.º 6, e do artigo 215.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, decide-se não homologar o Acordo de Pagamento apresentado por AA e BB”.
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1.2. Da Recurso dos Devedores
Inconformados com a referida decisão, os Devedores interpuseram recurso de apelação, pedindo que «seja revogada a decisão proferida em 1ª instância de não homologação do plano apresentado, substituindo-a por outra que o julgue homologado», e formulando as seguintes conclusões no final das respectivas alegações:
“1. O processo especial para acordo de pagamento é um processo de cariz marcadamente voluntário e extrajudicial, em que se privilegia o controlo pelos credores, restringindo o controlo jurisdicional à gestão processual, e procura criar as condições para que o devedor e os credores negoceiem, de boa fé e de forma equilibrada e tentem chegar a um acordo, seja ela através de deferimento do pagamento, plano prestacional, e/ou de reconfiguração/reestruturação do passivo, que permita ao devedor, nesse tempo, superar as suas dificuldades.
2. PORÉM, entendeu, o Tribunal “a quo” (sem que nenhum credor o invocasse e à revelia do facto da clara e retumbante maioria de credores ter negociado e votado favoravelmente o plano de revitalização dos devedores); que houve violação do Princípio da igualdade.
3. No caso não poderiam restar dúvidas ao Tribunal “a quo” que o plano apresentado, com as diferenças nele plasmadas, significativas ou não, era o resultado da vontade dos próprios credores que o negociaram, votaram e quiseram aprovar o plano apresentado nos termos ora “condenados” pelo mesmo.
4. Depois, tal como decorre do segundo segmento do nº 1 do citado artº 194º do CIRE, o princípio da igualdade nele plasmado não configura para os credores um direito absoluto, podendo, num regime de exceção, e em casos de situações objetivamente justificáveis, sofrer de afrouxamentos ou restrições, e permitir tratamentos diferenciáveis entre os credores.
5. Desse modo, a violação desse princípio terá que ser aferida na ponderação global de cada caso concreto, devendo a homologação do plano ser recusada sempre que a vinculação de algum credor a ele se revele claramente excessiva, desproporcionada ou desrazoável.
6. Cremos porém que no caso concreto tal diferenciação se mostra objectivamente justificada, não sendo excessiva, desproporcionada ou desrazoável, isto porque, desde logo, resulta do próprio plano que os devedores apenas têm como património um único imóvel que por sua vez, se encontra como garantia do credor garantido -o que por si só deveria bastar para se responder à pergunta/comentário tecido pelo SR. Juiz acerca de não se perceber o voto favorável do maior credor.
7. Cremos na verdade, que é facilmente compreensível que qualquer credor comum minimamente interessado em receber, se aperceba que o plano apresentado (ainda com as diferenciações de tratamento nele plasmadas) é mais benéfico para todos os credores comuns do que que a ausência de um, pois em caso de execução ou de insolvência dos devedores (e tendo estes como único património um imóvel, que pode nem sequer garantir o crédito garantido) apenas o credor garantido iria ser ressarcido dos seus créditos, (ou de parte deles) ficando os credores comuns, sem nada.
8. POR OUTRO LADO, o artigo 194 n.º 1 do CIRE na sua parte final, prevê explicitamente que sejam possíveis diferenciações justificadas por razões objectivas ao princípio da igualdade. Pelo que a diferenciação aplicada se baseia, desde logo, na razão objectiva da caracterização distinta dos tipos de créditos elencados, ou seja, distinguiu-se créditos comuns, de garantidos e de privilegiados.
9. Parece-nos aliás, muito razoável que se tratem de forma diferente os créditos contraídos junto do estado (já que os trata a Lei como créditos indisponíveis), dos credores garantidos e dos créditos comuns, pois (como é público e notório, e do conhecimento generalizado) é importante acautelar o equilíbrio do sistema financeiro dos bancos, pela razão crucial de ser esse o motor essencial ao funcionamento/financiamento da economia, sem o qual e sem o equilíbrio do qual não haverá funcionamento/financiamento da economia a jusante.
10. Assim, face a esta situação, e sobretudo à evidência plasmada no plano de que os devedores apenas tinham um bem imóvel, cujo valor patrimonial nem sequer era suficiente para pagar a totalidade da dívida ao credor garantido, cremos que o perdão aplicado aos credores comuns se encontra justificado objectivamente, inexistindo assim qualquer violação do princípio da igualdade de tratamento entre os credores.
11. Ademais, os PEAP’S são - efectivamente - suscetíveis de impor aos credores uma compressão generalizada e grave das suas faculdades típicas. - O que faz parte do escopo do próprio processo em si.
12. Assim, a presente decisão mais não é senão uma condenação dos devedores à insolvência, mas também e sobretudo uma sentença de morte à única esperança dos credores comuns de ainda poderem ser pagos nem que seja de parte do seu crédito.
13. Merece a decisão recorrida censura, designadamente por violação da lei substantiva (Art. 194 e 215º do CIRE), consubstanciada em erro de interpretação, e na aplicação das normas legais e também por se mostrar em contradição com o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, no Processo nº 3316/19.9T8CBR.C1.S1, datado de 07-09-2020”.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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O recurso foi admitido pelo Tribunal de 1ª Instância como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo, não tendo sido objecto de alteração neste Tribunal da Relação.
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Foram colhidos os vistos legais.
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2. OBJECTO DO RECURSO E QUESTÕES A DECIDIR

Por força do disposto nos arts. 635º/2 e 4 e 639º/1 e 2 do C.P.Civil de 2013, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo o Tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas (as conclusões limitam a esfera de actuação do Tribunal), a não ser que se tratem de matérias que sejam de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, ou que sejam relativas à qualificação jurídica dos factos (cfr. art. 608º/2, in fine, aplicável ex vi do art. 663º, nº2, in fine, e 5º/3, todos do C.P.Civil de 2013).
Mas o objecto de recurso é também delimitado pela circunstância do Tribunal ad quem não poder conhecer de questões novas (isto é, questão que não tenha sido objecto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que “os recursos constituem mecanismos destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando… estas sejam do conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha elementos imprescindíveis”[2] (pela sua própria natureza, os recursos destinam-se à reapreciação de decisões judiciais prévias e à consequente alteração e/ou revogação, não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objeto de apreciação na decisão recorrida[3]).
Neste “quadro legal” e atentas as conclusões do recurso de apelação interposto pelos Recorrentes é uma a questão a apreciar por este Tribunal ad quem: se deve ou não ser recusada a homologação do acordo de pagamento apresentado pelos Devedores em razão da violação do princípio da igualdade entre credores previsto no art. 194º do C.I.R.E.
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3. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Os factos que revelam para a presente decisão são os que se encontram descritos no relatório que antecede.
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4. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Actualmente, no domínio do «direito da insolvência», existem duas realidades distintas: a situação pré-insolvencial, que a lei caracteriza em diversos preceitos (arts. 1º/2 e 3, 17º-A/1 e 222º-A/1 do C.I.R.E.) como «situação económica difícil» (é aquela em que «a empresa que enfrenta dificuldade séria para cumprir pontualmente as suas obrigações, designadamente por ter falta de liquidez ou por não conseguir obter crédito» - cfr. art. 17º-B - ou em que «o devedor que enfrenta dificuldade séria para cumprir pontualmente as suas obrigações, designadamente por ter falta de liquidez ou por não conseguir obter crédito» - cfr. art. 222º-B), ou «em situação de insolvência meramente iminente»; e a situação insolvencial[4].
A tais realidades correspondem vias de reacção diferentes: para a situação pré-insolvencial das empresas, o Processo Especial de Revitalização (PER), cujo regime essencial se encontra nos aludidos arts. 17º-A a 17º-J do C.I.R.E.; para a situação pré-insolvencial do devedor que não seja empresa, o Processo Especial de Acordo de Pagamento (PEAP), cujo regime essencial se encontra nos arts. 222º-A a 222º-J do C.I.R.E.; e, não sendo possível nenhuma delas e verificando-se uma situação de insolvência, o processo especial de insolvência com a liquidação do património do devedor insolvente e a repartição do produto obtido pelos credores[5].
Foi através do Dec.-Lei nº79/2017, de 30/06, entrado em vigor em 01/07/2017 (cfr. art. 8º deste diploma), que, através do aditamento dos citados arts. 222ºA a 222ºJ ao C.I.R.E., o legislador introduziu no nosso ordenamento jurídico o novo processo especial para acordo de pagamento (PEAP).
Lê-se no preâmbulo do Dec.-Lei nº79/2017 que “Apostou-se na credibilização do processo especial de revitalização (PER) enquanto instrumento de recuperação, reforçou-se a transparência e a credibilização do regime e desenhou-se um PER dirigido às empresas, sem abandonar o formato para as pessoas singulares não titulares de empresa ou comerciantes”.
Daqui decorre que, dissipando as dúvidas que anteriormente vinham surgindo sobre se o PER seria ou não aplicável às pessoas singulares que não fossem titulares de empresa, através das alterações introduzidas pelo Dec.-Lei nº79/2017, o legislador definiu e estabeleceu que o PER se aplica apenas aos devedores que sejam empresas (“Estando em situação económica difícil, ou em situação de insolvência meramente iminente, a empresa pode requerer ao tribunal a instauração de processo especial de revitalização, de acordo com o previsto nos artigos 17.º-A a 17.º-J” - art. 1º/2 do C.I.R.E., na redacção que lhe foi dada pelo referido Dec.-Lei), sendo que, por força do disposto no art. 5º do C.I.R.E., se considera empresa toda a organização de capital e de trabalho destinadas ao exercício de qualquer atividade económica.
E mais decorre que, para compensar esta restrição legal do âmbito subjectivo do PER, o legislador criou o PEAP que, nos termos do nº1 do art. 222º-A do C.I.R.E., “destina-se a permitir ao devedor que, não sendo uma empresa e que comprovadamente se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, estabelecer negociações com os respetivos credores de modo a concluir um acordo de pagamento”.
Estatuindo-se que o PEAP se destina «aos devedores que não sejam empresas», então este instrumento pré-insolvencial aplica-se quer às pessoas singulares quer às pessoas colectivas que não sejam titulares de empresa. Afirma-se no Ac. da RC de 18/05/2020[6] que “O PER é restrito às empresas e o PEAP é reservado aos devedores não titulares duma empresa, ou seja, aplicando a noção constante do art. 5.º do CIRE, o PEAP é reservado aos devedores que não sejam titulares duma qualquer organização de capital e de trabalho destinada ao exercício de qualquer atividade económica” (o sublinhado é nosso).
Através de uma análise comparativa, verifica-se que as normas constantes dos citados arts. 222ºA a 222ºJ (que regulam o PEAP) correspondem às normas antigas dos arts. 17ºA a 17ºI do C.I.R.E. e não exactamente às normas que actualmente integram estas mesmas disposições legais, ou seja, os arts. 222ºA a 222ºJ equivalem às normas que regulavam o PER antes da sua alteração pelo Dec.-Lei nº79/2017.
Daí que se afirme que “o PEAP não é, na verdade, outra coisa senão «o PER dos não empresários», configurando-se o seu regime como o regime do antigo PER deslocado para outra parte do Código”[7].
Explica Catarina Serra[8], “o PEAP é (…) essencialmente igual ao velho PER, podendo quase dizer-se que o seu regime é o antigo regime do PER deslocado para outra parte do Código”, salientando que “a circunstância do PEAP ser o velho PER com um nome novo” permite “a possibilidade de se aproveitarem os resultados da interpretação do regime do PER, atingidos ao longo do tempo pela doutrina e pela jurisprudência, para interpretar o regime do PEAP. Com excepção das normas do PER que pressupõe a qualidade de titular de empresa, não se vê, de facto, razão para não aproveitar a interpretação das normas do PER que, à parte da diferença formal residente na distinta numeração, têm exactamente o mesmo teor e servem interesses iguais / têm teleologia igual à das normas do PEAP”.
O PEAP caracteriza-se por ser um processo[9]:
- judicial especial que se rege, em primeiro lugar, pelas respectivas disposições (arts. 222ºA a 222ºJ), em segundo lugar, pelas regras previstas no C.I.R.E. que não sejam incompatíveis com a sua natureza, com as devidas adaptações (cfr. art. 222ºA/3 do C.I.R.E.) e, em terceiro lugar, pelas disposições gerais e comuns do C.P.Civil de 2013, igualmente com as necessárias adaptações (cfr. art. 17º/1 do C.I.R.E., conjugado com o art. 549º/1 do C.P.Civil de 2013);
- pré-insolvencial na medida em que é aplicável a devedores (não titulares de empresa) que já se encontrem em situação económica difícil ou em situação de insolvência iminente (pela positiva) mas que não estejam ainda numa situação de insolvência actual (pela negativa) - cfr. art. 222ºA/1 do C.I.R.E.;
- concursal em razão de todos os credores interessados poderem nele participar e em razão da sentença homologatória do acordo de pagamento aprovado vincular todos credores, mesmo aqueles que não tenham reclamado os seus créditos ou participado nas negociações (cfr. art. 222ºF/8 do C.I.R.E.);
- e híbrido em virtude de ser um composto por uma forte componente extrajudicial (a fase das negociações, em que não intervém o juiz, mas sim o devedor e os seus credores, sob a alçada, orientação e fiscalização do administrador judicial provisório), mas compensada («temperada») com a intervenção do juiz em momentos chave (máxime no controlo inicial, na decisão da impugnação de créditos, e na decisão de homologação ou recusa de homologação), conditio sine qua non do carácter concursal do mesmo processo em causa. 
Para além do respectivo âmbito subjectivo, existe um outro traço distintivo fundamental entre o PEAP e o PER que consiste na circunstância deste pressupor a recuperabilidade do devedor e aquele não. Com efeito, diferentemente do estatuído no citado art. 17ºA/1 («mas que ainda seja suscetível de recuperação»), em nenhum preceito do PEAP se faz referência à recuperabilidade do devedor não titular de empresa, donde resulta que o legislador não exigiu, como requisito do PEAP, a sua recuperabilidade. Aliás, frise-se que nem citados arts. 1º/3 e 222ºA/1 nem em qualquer preceito de regulação do PEAP se prevê a aprovação de um qualquer plano de recuperação do devedor, prevendo-se sim e apenas a aprovação de um acordo de pagamento (e daí  que também não se exija que o devedor obtenha uma certificação de que não se encontra em situação de insolvência atual, ao contrário do que está previsto para o PER[10].
O PEAP tem uma função estritamente preventiva, visando evitar, na medida do possível, que o devedor passe, irremediavelmente, a uma situação de insolvência[11]. Uma vez que, como vimos, o âmbito subjetivo do PEAP é o devedor que não seja titular de empresa (em essência, pessoas singulares), então a sua filosofia não é a recuperação, a qual só tem em vista «empresas», mas sim tentar evitar ou prevenir a insolvência com as consequências económicas e sociais daí advenientes[12]. Assim, caso já tenha sido proferida sentença que declarou a insolvência do devedor à data da admissão do PEAP, por força do disposto no art. 222-E/6 do C.I.R.E., o mesmo não pode prosseguir, ocorrendo causa de impossibilidade superveniente da lide[13].
Portanto, a susceptibilidade de recuperação do devedor não constitui requisito legal do PEAP (ao contrário do que sucede no PER).
O recurso ao PEAP é voluntário: apenas o devedor tem legitimidade activa para o instaurar (cfr. nº1 do art. 222ºC do C.I.R.E.) e assiste ao devedor o direito de pôr termo às negociações a todo o tempo, independentemente de qualquer causa, sujeitando-se, contudo, a poder ser requerida a sua insolvência caso o administrador judicial provisório emita parecer no sentido de que aquele já se encontra em estado de insolvência (cfr. nºs. 3, 4 e 6 do art. 222ºG do C.I.R.E.). Saliente-se que também os credores do devedor, convidados para encetarem negociações com o devedor de modo a concluírem com aquele um acordo de pagamento, não são obrigados a encetar negociações ou a aprovar a proposta de acordo de pagamento.
Nos termos do art. 222ºC do C.I.R.E., o PEAP inicia-se pela manifestação de vontade do devedor e de pelo menos um dos seus credores, por meio de declaração escrita, de encetarem negociações conducentes à elaboração de acordo de pagamento (nº1), declaração escrita que deve ser assinada por todos os declarantes e conter a data da assinatura (nº2), e devendo ser apresentado no tribunal competente requerimento acompanhado da referida declaração escrita [(nº3a)] e dos elementos discriminados na alínea b) do nº3 do art. 222ºC.
Por força do disposto no nº2 do citado art 222ºA, no requerimento previsto naquele nº3 do art. 222ºC o devedor está obrigado a atestar, através de declaração por si assinada, que cumpre os requisitos necessários para a abertura do processo. Como refere Maria do Rosário Epifânio[14], “no PEAP, a lei não exige qualquer certificação externa do preenchimento, bastando-se com uma espécie de «autoatestado»”.
A lei também não exige que, no PEAP, com o requerimento inicial (previsto no nº3 do art. 222ºC), o devedor apresente uma proposta de acordo (plano) de pagamentos (ao contrário do que sucede no PER)[15].
Prescreve o nº4 do art. 222ºC que, recebido (e distribuído) o processo, “o juiz nomeia de imediato, por despacho, administrador judicial provisório”. Apesar da utilização da expressão «nomeia de imediato» indiciar o contrário, certo é que, ao estatuir no art. 222ºE/2 do C.I.R.E. que “Caso o juiz nomeie administrador judicial provisório nos termos do n.º4 do artigo 222.º-C, o devedor fica impedido de praticar atos de especial relevo (…)”, o legislador está, inequivocamente, a admitir que há lugar a despacho liminar no âmbito da tramitação do PEAP, no âmbito do qual pode ser proferido despacho de admissão do processo ou despacho de indeferimento liminar do mesmo (frisa Maria do Rosário Epifânio[16] que “a expressão legal «caso o juiz nomeie administrador judicial provisório nos termos do n.º 4 do artigo 222-C», contida no art. 222-E/2, foi indevidamente «importada» do regime jurídico do PER (do seu art. 17-E/2), devendo ser interpretada com o seguinte sentido, apenas: «caso o juiz profira despacho de admissão do requerimento»”).
Tem sido neste sentido que tem pronunciado a jurisprudência e a maioria da doutrina, como se dá nota no já citado Ac. desta RG de 04/04/2024[17]: “(…) No mesmo sentido, RC 13.06.2022 (627/23.2T8CBR.C1), relatado por José Avelino Gonçalves, onde se entendeu ainda que o juiz pode verificar a situação material do devedor, designadamente quando, no momento do despacho liminar, constate, em face do alegado, que este «já se encontra em situação de insolvência efetiva.» A possibilidade de controlo jurisdicional destes requisitos foi também admitida em RC 13.11.2018 (1535/17.1T8CBR.C2), relatado por Freitas Neto, RC 1.12.2019 5494/19.8T8CBR.C1), relatado por Ferreira Lopes, RP 11.02.2020 (2752/19.5T8STS.P1), relatado por Ana Lucinda Cabral, e em RC 28.03.2023 (3005/22.7T8LRA.C1), relatado por Arlindo Oliveira. Na doutrina, este controlo é defendido por Catarina Serra (Lições cit., p. 636), nota 1206, que critica o entendimento contrário de Luís Menezes Leitão (Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado cit., p. 265), Maria do Rosário Epifânio (Manual cit., p. 540), Carla Rodrigues (“O Processo Especial Para Acordo de Pagamento”, Revista de Direito da Insolvência, n.º 4, 2020, p. 45) e Marco Carvalho Gonçalves (Processo de Insolvência e Processos Pré-Insolvenciais, Coimbra: Almedina, 2023, pp. 744-745) (…) a natureza urgentíssima assim expressa não é impeditiva de um controlo mínimo dos pressupostos materiais. Assim, o requerimento deve ser indeferido liminarmente, por exemplo, se o devedor foi declarado insolvente em processo de insolvência pendente, ou beneficiou de PEAP nos dois anos anteriores. Há também espaço para um despacho de correção, por exemplo se não for apresentado algum dos mencionados documentos. Não havendo fundamento para o indeferimento liminar, o juiz profere despacho de admissão em que nomeia sempre o administrador judicial provisório”.
Proferido este despacho de nomeação do administrador judicial provisório (despacho de admissão do processo), o qual é irrecorrível (e tem subjacente um juízo meramente perfunctório dos requisitos processuais e uma natureza tabular, não produzido qualquer efeito de caso julgado formal quanto à não verificação dos motivos que poderiam ter conduzido ao indeferimento liminar[18]) e para além da produzis os efeitos (processuais e substantivos) elencados no citado art. 222ºE, o devedor (logo que seja notificado do mesmo) tem que comunicar de imediato e por meio de carta registada, a todos os seus credores que não hajam subscrito a declaração mencionada no n.º 1 do mesmo preceito, que deu início a negociações com vista à elaboração de acordo de pagamento, convidando-os a participar, caso assim o entendam, nas negociações em curso (nº1 do art. 222ºD do C.I.R.E.) e os credores dispõem de 20 dias, contados da publicação no portal Citius daquele despacho, para reclamar créditos, devendo as reclamações ser remetidas ao administrador judicial provisório, que no prazo de cinco dias elabora uma lista provisória de créditos (nº2 do art. 222ºD).
Apresentada na secretaria do tribunal e publicada no Portal Citius, a lista provisória de créditos pode ser impugnada no prazo de cinco dias úteis, com fundamento na indevida inclusão ou exclusão de créditos, na incorreção do montante ou da qualificação dos créditos relacionados, dispondo, em seguida, o juiz de idêntico prazo para decidir sobre as impugnações formuladas (nº2 do art. 222ºD).
Note-se que os créditos não impugnados são tidos em conta para o cálculo das maiorias necessárias para se considerar aprovado o acordo de pagamento, mas o que forem impugnados também poderão ser computados se o juiz entender que há possibilidade séria de serem reconhecidos (nº3 do art. 222ºF)[19].
Caso não seja objecto de impugnação, a lista provisória de créditos converte-se em definitiva (nº4 do art. 222ºD), e ficando precludida a possibilidade de, ulteriormente, no âmbito do PEAP, vir a ser discutida a indevida inclusão de créditos[20].
Findo o prazo para impugnações, os declarantes dispõem do prazo de dois meses para concluir as negociações encetadas, o qual pode ser prorrogado, por uma só vez e por um mês, mediante acordo prévio e escrito entre o administrador judicial provisório nomeado e o devedor (nº5 do art. 222ºD), desenvolvendo-se estas negociações entre o devedor e os seus credores, com a participação e sob a orientação e fiscalização do administrador judicial provisório (nºs. 8 e 9 do mesmo art. 222ºD).
Decorre do disposto nos nºs. 1 e 2 do art. 222ºF do C.I.R.E. que as negociações podem ser concluídas com a aprovação unânime de acordo de pagamento (“em que intervenham todos os seus credores, este deve ser assinado por todos, sendo de imediato remetido ao processo, para homologação ou recusa do mesmo pelo juiz, acompanhado da documentação que comprova a sua aprovação, atestada pelo administrador judicial provisório nomeado”) ou com a aprovação de acordo de pagamento por uma das maiorias previstas no nº3 do referido art. 222ºF (caso em que “o devedor remete-o ao tribunal, sendo de imediato publicado anúncio no portal Citius advertindo da junção do plano e correndo desde a publicação o prazo de votação de 10 dias, no decurso do qual qualquer interessado pode solicitar a não homologação do plano, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 215.º e 216.º, com as devidas adaptações”), sendo que, em qualquer dos casos (aprovação unânime ou maioritária), compete sempre ao juiz decidir se homologa ou recusa a homologação do acordo de pagamento, aplicando-se com as devidas adaptações as regras vigentes em matéria de aprovação e homologação do plano de insolvência previstas no título IX, em especial o disposto nos arts. 215º (recusa oficiosa) e 216º (recusa a solicitação dos interessados) do C.I.R.E.[21]. É o que decorre expressamente do estabelecido no nº5 do art. 222ºF: “O juiz decide se deve homologar o acordo de pagamento ou recusar a sua homologação, nos 10 dias seguintes à receção da documentação mencionada nos números anteriores, aplicando, com as necessárias adaptações, as regras vigentes em matéria de aprovação e homologação do plano de insolvência previstas no título IX, em especial o disposto nos artigos 215.º e 216.º”.
A propósito desta remissão para as regras da aprovação e homologação do plano de insolvência, explica Maria do Rosário Epifânio[22]: “Contrariamente ao PER (art. 17.º-F, n.º 7), e ao PEAP previsto no art. 222.º-I, na disciplina do PEAP, o legislador não faz qualquer remissão expressa para o artigo 194.º (que consagra o princípio de igualdade de tratamento dos credores), para o artigo 195.º (quer regula o conteúdo do plano), para o artigo 196.º (sobre as providências com incidência no passivo), ou para o artigo 197.º (disposição com caráter supletivo, face à ausência de disposição expressa do plano).  Entendemos que esta omissão não constitui qualquer impedimento à aplicabilidade dos referidos preceitos, pois a mesma está devidamente alicerçada, não só na remissão genérica contida no art. 222.º-A, n.º 3, como também, na remissão operada pelo art. 222.º-F, n.º 5, para o Título IX”[23].
Assim, com esta remissão para o disposto nas regras da aprovação e homologação do plano de insolvência, constata-se que o legislador optou/decidiu por submeter o acordo de pagamento aprovado pelos credores à apreciação judicial, nos termos da qual, por um lado, o juiz tem, oficiosamente, que sindicar o cumprimento das regras procedimentais e das normas aplicáveis ao conteúdo do acordo, assegurando-se que não se verificam nenhuma das situações fundamentadoras de rejeição estabelecidas no art. 215º (função de garante da legalidade) e, por outro lado, o juiz tem que analisar o mérito das oposições à aprovação do acordo que tenham sido deduzidas por algum credor (função de assegurar a tutela mínima das minorias - art. 216º).
Portanto, como se conclui no Ac. desta RG de 30/03/2023[24], “O processo especial para acordo de pagamento, regulado nos arts 222º-A a 222-J do CIRE, assume uma natureza predominantemente extrajudicial, máxime na fase das negociações, mas estão previstos momentos de intervenção judicial, e a liberdade e a autonomia dos intervenientes podem sofrer limitações, mormente ao abrigo dos arts 215º e 216º, aplicáveis por remissão do nº5 do art. 222º -F do CIRE”, salientando-se no Ac. desta RG de 06/02/2020[25] que “tendo presente a especial natureza do PEAP (com claro predomínio do que se pretende que seja a vontade dos credores, e os limites da intervenção do juiz), dir-se-á que só uma situação de evidente e comprovada insolvência poderá obstar à homologação do plano de pagamento antes aprovado pela maioria dos credores reconhecidos (não bastando para o efeito a sua mera suspeita, independentemente do grau - mais ou menos reforçado - de que se revista)”.
Para o presente recurso, releva apenas o caso «de não homologação por violação não negligenciável das regras/normas» prevista no art. 215º do C.I.R.E. que prescreve: “O juiz recusa oficiosamente a homologação do plano de insolvência aprovado em assembleia de credores no caso de violação não negligenciável de regras procedimentais ou das normas aplicáveis ao seu conteúdo, qualquer que seja a sua natureza, e ainda quando, no prazo razoável que estabeleça, não se verifiquem as condições suspensivas do plano ou não sejam praticados os actos ou executadas as medidas que devam preceder a homologação”.
Como o C.I.R.E. não define o que seja «violação não negligenciável», suscitaram-se dúvidas na determinação deste conceito, o qual tem vindo a ser densificado pela Doutrina e pela Jurisprudência. Pelas razões já anteriormente mencionadas, as interpretações deste conceito que têm sido realizadas mais especificamente a propósito da apreciação do PER, mostram-se aplicáveis ao regime do PEAP, ainda que as devidas adaptações, designadamente tendo-se em conta que, neste regime, não se verifica o requisito da recuperabilidade (“Assente, pelo cotejo entre os preceitos que regem sobre o PER e o PEAP que o principal elemento que os distingue é o de que a ideia de recuperação do devedor está ausente do PEAP, basta atentarmos na respectiva tramitação subsequente para concluirmos que, no mais, as impressivas semelhanças devem levar a que, os demais princípios àquele processo especial aplicáveis, e cuja densificação a doutrina e a jurisprudência têm vindo a efectuar, encontrem acolhimento neste”[26]).
Carvalho Fernandes e João Labareda[27] explicam que as «normas procedimentais» são “todas aquelas que regem a actuação a desenvolver no processo, que incluem os passos que nele devem ser dados até que a assembleia de credores decida sobre as propostas que lhe foram presentes - incluindo, por isso, as relativas à sua própria convocatória e funcionamento - e, bem assim, as relativas aos modo como ele deve ser elaborado e apresentado” e que as «normas relativas ao conteúdo» serão “todas respeitantes à parte dispositiva do plano, mas, além delas, ainda aquelas que fixam os princípios a que ele deve obedecer imperativamente e as que definem os temas que a proposta deve contemplar”. E a partir daqui concretizam que são não negligenciáveis todas as violações de normas imperativas que acarretem a produção de um resultado que a lei não autoriza. Diversamente, são consideradas as infracções que atinjam simplesmente regras de tutela particular que podem, todavia, ser afastadas com o consentimento do protegido (…) Então, verdadeiramente do que se trata, para decidir se ela justifica ou não a recusa de homologação de um plano aprovado pelos credores - que é, afinal de contas, aquilo que aqui está em causa -, é de avaliar a relevância, ou não, da violação constatada (…) O que é importante é, pois, sindicar se a nulidade observada é susceptível de interferir na boa decisão da causa, o que significa valorar se interfere ou não com a justa salvaguarda dos interesses protegidos ou a proteger - nomeadamente, no que respeita à tutela devida à posição dos credores e do devedor nos diversos domínios em que se manifesta -, tendo em conta que é, apesar de tudo, livremente renunciável” (os sublinhados são nossos).
Também Catarina Serra[28] afirma que “é razoável entender que violação não negligenciável é aquela e apenas aquela que importe uma lesão grave de valores ou interesses juridicamente tutelados (…)”.
Segundo Maria do Rosário Epifânio[29], “À semelhança do processo de insolvência, deve tratar-se de uma «violação não negligenciável», isto é, «as violações consideradas menores, que não ponham em causa o interesse do devedor e dos credores afectados, não constituem causa suficiente para que o juiz possa recusar a homologação do plano»”.
De forma muito assertiva, entende-se no Ac. da RC de 11/10/2017[30] que: “A violação de normas procedimentais corresponde, em bom rigor, a uma irregularidade processual que se consubstancia no facto de ter sido praticado um acto que a lei não admite ou de ter sido omitido um acto ou formalidade prescrito na lei e, nessa medida, o critério para apurar se tal violação é (ou não) negligenciável deve ser semelhante ao critério adoptado no artigo 195º do CPC com vista a determinar se a irregularidade tem aptidão necessária para produzir nulidade. Dessa forma, a violação dessas normas será não negligenciável sempre que possa afectar e influir no exame ou na decisão da causa, o que, no âmbito do processo de revitalização, equivale a dizer que tal violação será não negligenciável sempre que ela seja susceptível de afectar, de forma relevante, o processo negocial e o resultado que com ele se pretende atingir: a conclusão de um acordo entre o devedor e os seus credores em resultado das negociações entre eles estabelecidas.
A violação de normas referentes ao conteúdo do plano prende-se com a substância do plano de recuperação (aquilo que ele contém ou deve conter) e, portanto, essa violação será não negligenciável sempre que tal se deva concluir por aplicação do critério supra mencionado (quando se revele aplicável) e, de um modo geral, sempre que ela acarrete um resultado que a lei não permite, seja porque o conteúdo do plano viola disposições legais de carácter imperativo, seja porque viola regras legais que, apesar de não serem imperativas, visam tutelar e proteger determinados direitos sem que os respectivos titulares tivessem consentido ou renunciado à tutela que a lei lhes confere. A violação dessas normas será, portanto, não negligenciável sempre que ela possa afectar/prejudicar a salvaguarda dos interesses - sejam eles do devedor ou dos credores - que sejam dignos de protecção legal(os sublinhados são nossos). Neste aresto ainda se precisa que “Cabendo ao juiz o poder/dever de controlar a legalidade do processo e do plano de recuperação (seja nos seus aspectos formais, seja nos seus aspectos materiais ou substanciais), já não lhe cabe, contudo, o poder/dever de avaliar a credibilidade e viabilidade do plano apresentado, exceptuando os casos em que ele seja manifestamente inviável ou inexequível e que, como tal, se evidencie como manifestamente dilatório”.
E tem sido neste sentido que a jurisprudência se tem vindo a pronunciar, como se dá nota no já citado Ac. desta RG de 04/04/2024[31]: “De acordo com RL 28.01.2016 (1702-15.2T8SNT.L1-8), relatado por Ilídio Sacarrão Martins, na falta de um critério legal, deve entender-se que «são não negligenciáveis todas as violações de normas imperativas que acarretem a produção de um resultado que a lei não autoriza.» Em RG de 05.02.2015 (6193/13.0TBBRG-F.G1), relatado por Filipe Caroço, entendeu-se que são «não negligenciáveis todas as violações de normas imperativas que acarretam a produção dum resultado que a lei não autoriza, assim como todas as violações de normas que interfiram com a justa salvaguarda dos interesses/posições dos credores». Em RC 22.01.2019 (54/18.3T8SEI-A.C1), relatado por Maria Catarina Gonçalves, definiu-se a violação não negligenciável como a que corresponde a uma violação grave das normas legais aplicáveis, ou seja, «quando acarrete um resultado que a lei não permite em virtude de o conteúdo do plano violar disposições legais de carácter imperativo ou quando a violação se reporta a regras ou normas legais que, apesar de não serem imperativas, visam tutelar e proteger determinados direitos sem que os respetivos titulares tivessem consentido ou renunciado à tutela que a lei lhes confere e sempre que a violação seja suscetível de afetar ou prejudicar a salvaguarda dos interesses – sejam eles do devedor ou dos credores – que sejam dignos de proteção legal». No mesmo sentido, RG de 25.02.2016 (1030/14.0T8VNF.G1), relatado por António Figueiredo de Almeida, RL 09.09.2022 (21668/21.9T8LSB.L1-1) e RL 18.10.2022 (28316/21.5T8LSB-A.L1-1), ambos relatados por Fátima Reis Silva (…)”.
Podemos, assim e como regra, concluir que constituem vícios não negligenciáveis (ou não desculpáveis) aqueles que configurem inequivocamente uma violação de normas imperativas, cujo resultado seja ilegal e insusceptível de ser suprido com o consentimento dos tutelados, ou seja, aqueles que representem violações destas normas imperativas e acarretem a produção de um resultado que a lei não autoriza (veda/impede)[32].
Um dos casos que pode configurar precisamente uma violação não negligenciável das normas aplicáveis ao conteúdo do acordo de pagamento aprovado é a violação do princípio da igualdade de tratamento dos credores.

O princípio par conditio creditorum está consagrado no já citado art. 194º:
“1 - O plano de insolvência obedece ao princípio da igualdade dos credores da insolvência, sem prejuízo das diferenciações justificadas por razões objectivas.
2 - O tratamento mais desfavorável relativamente a outros credores em idêntica situação depende do consentimento do credor afectado, o qual se considera tacitamente prestado no caso de voto favorável.
3 - É nulo qualquer acordo em que o administrador da insolvência, o devedor ou outrem confira vantagens a um credor não incluídas no plano de insolvência em contrapartida de determinado comportamento no âmbito do processo de insolvência, nomeadamente quanto ao exercício do direito de voto”
.

Importa começar por ter presente que o princípio da igualdade dos credores encerra em sim mesmo um conceito indeterminado cujo preenchimento requer uma ponderação casuística[33].
Analisando este normativo, referem Carvalho Fernandes e João Labareda[34] que “A letra do nº1 procurou acolher de uma forma evidente as duas facetas em que se desdobra o princípio da igualdade, traduzidas na necessidade de tratar igualmente o que é semelhante e de distinguir o que é distinto, sem prejuízo do acordo dos credores atingidos, em contrário”.
Em face da respectiva consagração constitucional (art. 13º da C.R.P.), entende-se que o princípio da igualdade tem dois sentidos: um negativo, através do qual se veda privilégios (situações de vantagem não fundadas) e discriminações (situações de desvantagem); e um positivo que se traduz em três vertentes que se consubstanciam no tratamento igual de situações iguais (ou tratamento semelhante de situações semelhantes, no tratamento desigual de situações substancial e objectivamente desiguais, e no tratamento em moldes de proporcionalidade das situações relativamente iguais ou desiguais[35].
A jurisprudência do TC tem vindo, de forma sistemática, a sustentar que o princípio da igualdade obriga a que se trate como igual o que for necessariamente igual e como diferente o que for essencialmente diferente, e que este princípio não impede a diferenciação de tratamento, impedindo sim e apenas a diferenciação (discriminação) arbitrária e irrazoável (isto é, proíbe distinções de tratamento que não tenham uma justificação e um fundamento materiais). Como se refere no Ac. do TC de 245/2000[36], “Efectivamente, tem, de há muito, vindo a afirmar este Tribunal que é «sabido que o princípio da igualdade, entendido como limite objectivo da discricionariedade legislativa, não veda à lei a realização de distinções. Proíbe-lhe, antes, a adopção de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias - e assumem, desde logo, este carácter as diferenciações de tratamentos fundadas em categorias meramente subjectivas, como são as indicadas, exemplificativamente, no n.º2 do artigo 13º da Lei Fundamental -,ou seja, desigualdades de tratamento materialmente infundadas, sem qualquer fundamento razoável (…) ou sem qualquer justificação objectiva e racional. Numa expressão sintética, o princípio da igualdade, enquanto princípio vinculativo da lei, traduz-se na ideia geral de proibição do arbítrio (…)», ou, dito ainda de outra forma, o «princípio da igualdade (...) impõe se dê tratamento igual ao que for essencialmente igual e se trate diferentemente o que diferente for. Não proíbe as distinções de tratamento, se materialmente fundadas; proíbe, isso sim, a discriminação, as diferenciações arbitrárias ou irrazoáveis, carecidas de fundamento racional»”.
O princípio da igualdade dos credores constitui uma trave mestra e estruturante na regulação do plano de insolvência, do plano de recuperação ou do acordo de pagamento, tendo o art. 194º uma natureza imperativa («obedece»), mas não em termos absolutos («sem prejuízo»): com efeito, este normativo não impõe sempre uma identidade de tratamento entre créditos com idêntica classificação (podendo existir diferenciações em função de concretas circunstâncias) e não implica sempre uma solução de tratamento diferenciado entre créditos de natureza diversa; acresce que assume grande relevância ter sempre subjacente os critérios de proporcionalidade e de diferenciações ditadas/justificadas por razões objectivas e mostra-se necessária a anuência dos credores visados por tal tratamento desfavorável e que se encontrem em situação idêntica à de outros credores que beneficiem de um acordo mais favorável (cfr. o nº2 do preceito)[37].
Nesta mesma linha de entendimento, explica-se no já citado Ac. desta RG 06/02/2020[38]: “Estando-se perante uma norma de carácter imperativo, «trave basilar e estruturante na regulação do plano de insolvência», cuja «afectação traduz, por isso, seja qual for a perspectiva, uma violação grave - não negligenciável - das regras aplicáveis», não tem porém a mesma carácter absoluto (…) em situações objectivamente justificáveis, poderá o princípio da igualdade dos credores «sofrer afrouxamentos ou restrições», como desde logo «decorre do texto constitucional que contempla, a par do princípio da igualdade (art. 13.º da CRP), o princípio da proporcionalidade (art. 18.º, n.º 2, da CRP) e de proibição do arbítrio, coenvolvidos na legalidade do exercício de direitos e deveres, como é apanágio do estado de Direito baseado na dignidade da pessoa humana (art. 1.º da CRP)» (Ac. do STJ, de 25.03.2014…)”.
Quanto às circunstâncias que podem ser atendidas em concreto para justificar tratamento diferenciado, salientam Carvalho Fernandes e João Labareda[39]: “A razão objectiva porventura mais clara que fundamenta a diferença de tratamento dos credores assenta na distinta classificação dos créditos, nos termos em que agora está assumida no art.º 47º do Código (…). Para além disso, dentro da mesma categoria há motivos para destrinçar, conforme o grau hierárquico que couber aos vários créditos. Mas, a ponderação das circunstâncias de cada situação pode justificar outros alinhamentos, nomeadamente tendo em conta as fontes do crédito. O que está vedado é, na falta de acordo dos lesados, sujeitar a regimes diferentes, credores em circunstâncias idênticas”.
Portanto, entre as circunstâncias a atender revelam as classes de créditos definidas no art. 47º/4 do C.I.R.E. (“a) ‘Garantidos’ e ‘privilegiados’ os créditos que beneficiem, respectivamente, de garantias reais, incluindo os privilégios creditórios especiais, e de privilégios creditórios gerais sobre bens integrantes da massa insolvente, até ao montante correspondente ao valor dos bens objecto das garantias ou dos privilégios gerais, tendo em conta as eventuais onerações prevalecentes; b) ‘Subordinados’ os créditos enumerados no artigo seguinte, excepto quando beneficiem de privilégios creditórios, gerais ou especiais, ou de hipotecas legais, que não se extingam por efeito da declaração de insolvência; c) ‘Comuns’ os demais créditos”), o respectivo grau hierárquico dentro da respectiva classe (categoria), e diversidade das suas fontes.
Deste modo, podemos assentar que: o princípio da igualdade dos credores consagrado no art. 194º consubstancia uma trave mestra e estruturante na regulação do acordo de pagamento e abrange as duas dimensões em que se desenvolve o princípio da igualdade: impõe que se trate como igual o que for necessariamente igual e impõe que como diferente o que for essencialmente diferente; este normativo tem um carácter imperativo, mas não em termos absolutos já que a 2ªparte do nº1 permite que existam «diferenciações justificadas por razões objectivas»; e entre as circunstâncias que podem ser atendidas em concreto para justificar o tratamento diferenciado, revelam as distintas classes de créditos definidas no art. 47º/4 do C.I.R.E., o respectivo grau hierárquico dentro da mesa categoria, e diversidade das suas fontes, mas também o consentimento do credor afectado previsto no nº2.
Porém, no apuramento da existência das razões objectivas para um concreto tratamento diferenciado tem que se observar o princípio da proporcionalidade e atentar na proibição do arbítrio.
Explica-se no Ac. do STJ de 25/03/2014[40] que  A parte final do art. 194º, nº1, do CIRE foi ditada por razões de ordem pública convocando o princípio constitucional da proporcionalidade. Como ensina “Jorge Reis Novais (…) «Por sua vez, a observância ou a violação do princípio da proporcionalidade dependerão da verificação da medida em que essa relação é avaliada como sendo justa, adequada, razoável, proporcionada ou, noutra perspectiva, e dependendo da intensidade e sentido atribuídos ao controlo, da medida em que ela não é excessiva, desproporcionada, desrazoável. Nesta aproximação de definição podem intuir-se, em primeiro lugar, a relativa imprecisão e fungibilidade dos critérios de avaliação; em segundo lugar, o permanente apelo que eles fazem a uma referência axiológica que funcione como terceiro termo na relação e onde está sempre presente um sentido de justa medida, de adequação material ou de razoabilidade, por último, a importância que nesta avaliação assumem as questões competenciais, mormente o problema da margem de livre decisão ou os limites funcionais que vinculam legislador, Administração e juiz» (…) Como se afirma no Acórdão n.º40/07 (…) «O princípio da proporcionalidade, em sentido lato, pode (...) desdobrar-se analiticamente em três exigências da relação entre as medidas e os fins prosseguidos: a adequação das medidas aos fins; a necessidade ou exigibilidade das medidas e a proporcionalidade em sentido estrito, ou «justa medida»” (o sublinhado é nosso).
Este apelo ao juízo de proporcionalidade tem sido sustentado também nesta RG:
- o citado Ac. de 06/02/2020[41] - “Acentua-se, nesta última ponderação, a importância do princípio da proporcionalidade (enquanto elemento intrínseco do princípio de igualdade dos credores), que deverá ser respeitado na diferença admissível para créditos de natureza diversa”;
- o Ac. de 31/03/2022[42] - “O principio da igualdade a que se refere o art.º 194º do CIRE: a) impõe que os credores que estão em idênticas circunstâncias, nomeadamente tendo em consideração a idêntica natureza do crédito - garantido, privilegiado, comum ou subordinado, tal como definidos nos termos do art.º 47º do CIRE – sejam tratados de forma igual; b) admite que os credores que não estão em idênticas circunstâncias, nomeadamente tendo em consideração a diferenciação com base natureza do crédito - garantido, privilegiado, comum ou subordinado, tal como definidos nos termos do art.º 47º do CIRE – sejam tratados de forma desigual, desde que a referida diferenciação observe o principio da proporcionalidade(o sublinhado é nosso);
- e o Ac. de 10/09/2020[43] - “Conforme se estabelece na segunda parte do n.º 1 do art. 194º, do CIRE, tal princípio da igualdade (par conditio creditorum) não configura para os credores um direito absoluto, podendo, num regime de exceção, e em casos de situações objetivamente justificáveis, sofrer afrouxamentos ou restrições, como decorre do texto constitucional que contempla, a par do princípio da igualdade (art. 13º da CRP), o princípio da proporcionalidade (art. 18º, n.º 2, da CRP) e de proibição do arbítrio. Assim, os valores inerentes ao referido princípio da igualdade têm necessariamente que conter critérios de proporcionalidade, mesmo na diferença admissível nas soluções preconizadas para créditos de natureza igualmente diversa” (os sublinhados são nossos), e no qual se concretiza que “para além da justificação objetiva de tratamento diferenciado, resultante dos três critérios atrás enunciados (distinta classificação dos créditos; grau hierárquico dentro da mesma categoria de créditos; e a diversidade das fontes de crédito), aliados às limitações/imposições legais aplicáveis a determinados créditos (v.g. créditos do Estado e da Segurança Social), importa ainda ponderar, em respeito do princípio da proporcionalidade (intrínseco ao princípio da igualdade dos credores) designadamente: i) a percentagem de redução operada para o valor de capital em dívida dos créditos comuns; ii) o valor dos créditos garantidos e das respetivas garantias reais que lhes estão subjacentes; iii) o valor dos créditos garantidos ou privilegiados em contraposição com o montante dos créditos comuns na globalidade da dívida reconhecida a todos os credores; iv) e os prazos de pagamento previstos para cada um destes créditos, consoante a sua natureza”.

Na mesma linha de entendimento o Ac. da RC de 06/10/2020[44] (“O simples facto de nos encontrarmos perante distintas classes de créditos não justifica, por si só, todo e qualquer tratamento diferenciado, havendo que articular o princípio da igualdade com o princípio da proporcionalidade e da proibição de arbítrio”) e o Ac. da RE de 24/05/2018[45] (“Neste domínio, a par do princípio da igualdade, é de atender à dimensão da proporcionalidade e da proibição do arbítrio como factores de correcção de eventuais injustiças no tratamento dos credores, o qual deve ser tendencialmente paritário”).
Expostas estas considerações jurídicas, analisemos o caso dos autos.
Na sentença recorrida, o Tribunal a quo recusou a homologação do acordo de pagamento aprovado por entender que o mesmo viola o princípio da igualdade de tratamento dos credores consagrado no art. 194º, sustentando (no segmento que tem relevância para o objecto do presente recurso) que:
“Num primeiro momento, dir-se-á que o tratamento dos credores não se afigura igualitário, já que o mesmo afecta de forma desigual as diversas categorias de credores e, ainda, impõe a vontade do grande credor aos demais, sem um motivo que se afigure atendível.
Concretizando, há logo, como referido, um diferença substancial entre os credores, verificando-se um perdão de cerca de 29,11% dos créditos privilegiados (sendo grande parte deste valor juros vencidos), em detrimento dos créditos comuns, cujo perdão atinge os 90%, a serem pagos apenas ao fim de 21 anos, ao passo que quer os do Estado (embora, aqui, menos preponderante, visto que o seu valor é de 326,56 € [trezentos e vinte e seis euros e cinquenta e seis cêntimos]) são pagos de imediato e os privilegiados ao fim de um ano após homologação do plano.
Ora, se por um lado credores há que aceitaram (por terem votado favoravelmente), por que motivo fosse, o perdão de uma divida de 1 739 285,90 € (um milhão setecentos e trinta e nove mil duzentos e oitenta e cinco euros e noventa cêntimos) e de 37 062,27 € (trinta e sete mil e sessenta e dois euros e vinte e sete cêntimos), a verdade é que outros há que votaram contra (tendo requerido a não homologação do plano), cujos créditos não são de valor insignificante (apenas o sendo, quando relativamente ao maior credor, que, sozinho, representa 77,09% do capital em dívida), situando-se todos em valores superiores a trinta mil euros.
Mais, estes credores terão de esperar cerca de 21 anos até verem os seus créditos se vencerem, o que, se traduz, num segundo incomensurável sacrifício para estes.
Ora, não se vislumbra, do plano, quais as razões que levam a este tratamento diferenciados (na verdade, nem se percebe ao certo como é que se decidiu, em concreto, chegar àqueles perdões).
Na verdade, estes surgem, pura e simplesmente, enunciados no plano (assim como todos os perdões). Note-se que se compreende que a aprovação de um plano de acordo de pagamentos tem, necessariamente, de trazer modificações às relações existentes entre devedor e credores. Mas é, precisamente, por isso que se exige que tais alterações sejam objectivamente justificáveis, por forma a que se compreenda as suas razões de ser e os critérios que levaram ao tratamento diferenciados na satisfação dos vários créditos (e, ainda, no sacrifício do seu crédito perante os interesses do devedor).
Há, ainda, a particularidade de, na aprovação deste plano, nem os credores titulares de créditos privilegiados nele hajam consentido (o que, em parte, se percebe, por também serem titulares de créditos comuns), mas tal também tem lugar porquanto, na verdade, há, basicamente, um credor que, sozinho, aprova o plano elaborado, impondo a sua vontade (no caso, benevolência) sobre os demais.
Por estes motivos, considera-se que se não se encontra preenchido este requisito (…)”.
Em sede de recurso, os Devedores/Recorrentes invocam, essencialmente, que: «no caso concreto a diferenciação se mostra objectivamente justificada, não sendo excessiva, desproporcionada ou desrazoável, isto porque, desde logo, resulta do próprio plano que os devedores apenas têm como património um único imóvel que por sua vez, se encontra como garantia do credor garantido - o que por si só deveria bastar para se responder à pergunta/comentário tecido pelo SR. Juiz acerca de não se perceber o voto favorável do maior credor»; «é facilmente compreensível que qualquer credor comum minimamente interessado em receber, se aperceba que o plano apresentado (ainda com as diferenciações de tratamento nele plasmadas) é mais benéfico para todos os credores comuns do que a ausência de um, pois em caso de execução ou de insolvência dos devedores (e tendo estes como único património um imóvel, que pode nem sequer garantir o crédito garantido) apenas o credor garantido iria ser ressarcido dos seus créditos, (ou de parte deles) ficando os credores comuns, sem nada»; «parece-nos muito razoável que se tratem de forma diferente os créditos contraídos junto do estado (já que os trata a Lei como créditos indisponíveis), dos credores garantidos e dos créditos comuns, pois é importante acautelar o equilíbrio do sistema financeiro dos bancos, pela razão crucial de ser esse o motor essencial ao funcionamento/financiamento da economia»; e «os devedores apenas tinham um bem imóvel, cujo valor patrimonial nem sequer era suficiente para pagar a totalidade da dívida ao credor garantido, cremos que o perdão aplicado aos credores comuns se encontra justificado objectivamente, inexistindo assim qualquer violação do princípio da igualdade de tratamento entre os credores» (cfr. conclusões 4ª a 10ª).
Perante o teor das conclusões formuladas, entendemos que os Devedores/Recorrentes não deduziram um argumento juridicamente válido e fundado para colocar em causa o entendimento do Tribunal a quo de que o acordo de pagamento aprovado viola o princípio da igualdade de tratamento de credores, e isto mesmo apesar de não se subscrever um dos pontos da fundamentação da sentença recorrida.
Efectivamente e começando já por esta última referência, constata-se que o Tribunal a quo considerou existir um tratamento desigual entre os «créditos do Estado» (mais correctamente da Instituto de Segurança Social, IP - crédito privilegiado no valor total de € 306,61 e crédito comum no valor total de € 19,95) e os restantes credores, designadamente porque aqueles são pagos na totalidade (e de imediato), enquanto se verifica um perdão de cerca de 29,11% relativamente aos privilegiados (e são pagos ao fim de um ano) e um perdão de 90% relativamente aos comuns (e são pagos ao fim de 21 anos).
Ora, carece de fundamento legal a invocação de tratamento desfavorável entre os créditos da Segurança Social e os créditos garantidos e comuns já que, óbvia e inequivocamente, o credor Segurança Social (tal como o credor Estado) não está na mesma posição que os credores garantidos ou comuns, por força das limitações/imposições legais que são aplicáveis quer aos créditos do Estado quer aos créditos da Segurança Social.
Com efeito, as contribuições para a segurança social, e as respectivas dívidas decorrentes da sua falta de pagamento, assumem uma natureza tributária, sendo-lhes aplicável o regime da Lei Geral Tributária (Dec.-Lei nº398/98, de 17/12, com a redacção decorrente das sucessivas alterações)[46] e, nomeadamente, o disposto no seu art. 30º, por força do qual “O crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária” (nº2) e “O disposto no número anterior prevalece sobre qualquer legislação especial” (nº3), tal como o disposto no nº3 do seu art. 36º, nos termos do qual “A administração tributária não pode conceder moratórias no pagamento das obrigações tributárias, salvo nos casos expressamente previstos na lei”. Daqui decorre que o crédito (tributário) das contribuições para a segurança social tem carácter indisponível e prevalece sobre qualquer legislação especial, nomeadamente a contida no C.I.R.E. Neste sentido, afirma-se no Ac. desta RG de 31/03/2022[47] que “as dívidas por contribuições devidas à segurança social tem natureza de créditos tributários, prevalecendo o seu carácter indisponível sobre qualquer legislação especial (nomeadamente, a contida no CIRE); e, por isso, não podem as condições do seu pagamento ser alteradas por terceiros (nomeadamente, por deliberação de credores do devedor, no âmbito da aprovação de um plano de revitalização), sob pena de nulidade, por violação de norma imperativa” e, neste enquadramento, decidiu-se no Ac. desta RG de 19/01/2023[48] que “A violação do princípio da igualdade prevista no artº 194º, do CIRE, pressupõe tratamento desfavorável entre credores de igual natureza, que estejam na mesma situação. Daí que não se possa comparar créditos da Segurança Social e da Autoridade Tributária, por força do princípio da indisponibilidade dos créditos tributários, previsto pelo artº 30º, nº2 e 3 da LGT, com créditos garantidos, para fundar uma pretensa desigualdade ilícita consubstanciada no peso relativo dos créditos dos primeiros”.
Deste modo, não se subscreve este ponto da fundamentação da sentença recorrida, considerando-se que a diferenciação de tratamento entre os créditos da Segurança Social e os créditos garantidos e comuns (que resulta do acordo de pagamento aprovado), por força do princípio da indisponibilidade dos créditos tributários, tem uma justificação objectiva (legal) e, por via disso, não consubstancia uma violação do princípio da igualdade previsto no art. 194º (assistindo, portanto, razão aos Devedores/Recorrentes quanto ao alegado na 1ª parte da conclusão 9ª).
Porém, analisando o acordo de pagamento aprovada quanto à desigualdade de tratamento entre os créditos garantidos e os créditos comuns constata-se que atinge um total grau de desproporcionalidade injustificado que impõe concluir pela violação do referido princípio.
Concretizando.
À partida, a consagração de um regime distinto de tratamento, mais favorável, quanto aos créditos garantidos em confronto o previsto para os créditos comuns, uma vez que respeita a diferentes classes de créditos mostrar-se-ia perfeitamente justificada em face da lei já que, como supra se explanou, a circunstância concernente à distinção de classes de créditos integra uma «razão objectiva» para justificar o tratamento diferenciado.
Sucede que, no caso em apreço, a diferença tem que ser qualificada como descomunal, abissal e de enorme desproporção, não se encontrando no teor do acordo de pagamento aprovado uma única razão/justificação para tal situação
Para os créditos garantidos (EMP04... STC, SA com três créditos garantidos nos valores totais de € 12.199,73, de € 43.473,15 e de € 98.456,46 respectivamente; e EMP05..., SA com um crédito garantido no valor total de € 121.391,41), prevê-se: perdão dos juros de mora e outras despesas decorrentes da mora ou incumprimento dos créditos garantidos, no montante total de € 80.193,88; perdão de juros vencidos entre a data da reclamação de créditos e a data do trânsito em julgado da Sentença de Homologação do Plano; estabelecimento de um período de carência para pagamento de capital e juros vincendos de um ano com início no mês seguinte ao do trânsito em julgado da decisão que vier a homologar o presente acordo de credores; pagamento de 100% do capital em dívida no montante de € 195.326,87€, em 240 prestações mensais e sucessivas, vencendo-se a primeira no último dia útil do ano seguinte ao do término da carência de pagamentos estabelecida imediatamente acima, sendo que as primeiras 239 serão no valor de € 602,68 (e incluem amortização de capital e juros) a ratear proporcionalmente pelos credores garantidos na direta proporção do seu crédito sobre a totalidade dos créditos garantidos,  e a 240º será no valor de € 179.955,57 (inclui amortização de capital e juros vincendos), a título de “valor residual”; e pagamento de juros vincendos, a liquidar após o último dia útil do ano seguinte ao do trânsito em julgado da Sentença de Homologação do Plano, resultante da Euribor 12M acrescida de um spread de 0,33, ao ano (Refª Euribor a 12M em 28 de Abril de 2023 é de 3,88%).
Para os créditos comuns e para o crédito subordinado, prevê-se: perdão dos juros de mora e outras despesas decorrentes da mora ou incumprimento, no montante total de € 479.376,96; perdão de juros vencidos entre a data da reclamação de créditos e a data do trânsito em julgado da Sentença de Homologação do Plano; perdão de juros vincendos; perdão incondicional de 90% do capital reclamado (o que equivale a € 1.350.096,94); pagamento de 10% do capital em dívida no montante de € 151.121,88, em 2 prestações anuais, iguais e sucessivas, de € 75.560,94, cada uma, vencendo-se a primeira no último dia útil do ano seguinte ao do último pagamento efetuado aos credores garantidos (ou seja, no mínimo 1 ano após os 20 anos que irão demorar a pagar as prestações dos créditos garantidos) e a segunda em igual dia do ano subsequente, ambas a ratear na proporção direta com os créditos comuns reclamados entre os respetivos credores.
Inexiste no teor do acordo de pagamento (em nenhum dos seus «capítulos», incluindo o relativo aos «princípios orientadores do plano») qualquer explicação mínima para tão enorme e gritante diferença de tratamento: relativamente à salvaguarda total do capital dos créditos garantidos e ao perdão quase integral do capital dos créditos comuns (e subordinado), sendo que o valor do capital daqueles é € 195.326,87 e o valor do capital destes é apenas de € 151.121,88€ (após uma redução no montante de € 1.350.096,94); relativamente ao início do pagamento dos créditos comuns (e subordinado) ocorrer, no mínimo, 21 anos depois do trânsito em julgado da decisão de homologação do acordo mesmo apesar do seu reduzido montante (apesar da sua enorme redução) e só ficarem integralmente pagos, no mínimo, ao fim de 22 anos; e relativamente ao vencimento de juros vincendos quanto aos créditos garantidos e à inexistência de quaisquer juros vincendos quanto aos créditos comuns (e subordinado), mesmo apesar de serem reduzidos em mais de 90% do capital e só começarem a ser pagos daqui a mais de 21 anos.
Frise-se que a simples circunstância de se estar perante distintas classes de créditos constitui uma justificação/razão objectiva, por si só, para todo e qualquer tipo tratamento diferenciado, havendo sempre que articular o princípio da igualdade com o princípio da proporcionalidade e da proibição do arbítrio, todos comprometidos com a legalidade do exercício de direitos e deveres.
Deste modo, o tratamento muito mais desfavorável que resulta do acordo de pagamento aprovado para aos créditos comuns (e subordinado) relativamente aos créditos garantidos, porque não está minimamente justificado e explicado, apresenta-se como uma medida injustificada, irrazoável, discriminatória e arbitrária.
Para além de nada estar consignado no acordo de pagamento aprovado nesse sentido (e saliente-se que, nas alegações do recurso, também não se faz qualquer referência a qualquer segmento do acordo de pagamento onde conste alguma justificação), a alegação dos Devedores/Recorrentes no sentido de que «a diferenciação se mostra objectivamente justificada, porque, desde logo, resulta do próprio plano que os devedores apenas têm como património um único imóvel que por sua vez, se encontra como garantia do credor garantido» e de que «é facilmente compreensível que qualquer credor comum minimamente interessado em receber, se aperceba que o plano apresentado (ainda com as diferenciações de tratamento nele plasmadas) é mais benéfico para todos os credores comuns do que a ausência de um, pois em caso de execução ou de insolvência dos devedores apenas o credor garantido iria ser ressarcido dos seus créditos, (ou de parte deles) ficando os credores comuns, sem nada», revela absolutamente insusceptível de constituir uma «razão objectiva» à face da lei: com efeito, a invocação de que no património do devedor apenas existe um bem imóvel cujo valor não é suficiente para satisfazer os créditos garantidos induz qualquer critério de proporcionalidade para aqueles créditos serem pagos integralmente quanto ao respectivo capital e lhe acresçam juros vincendos e para que os créditos comuns (e subordinado) sejam eliminados em 90% do capital, e sem o acréscimo de juros vincendos; e também não induz qualquer critério de proporcionalidade para os créditos comuns (e subordinado) só comecem a ser pagos mais de 21 anos depois do trânsito em julgado da decisão de homologação do acordo de pagamento. Mais: nem se entende a referência ao bem imóvel, uma vez que, como consta do acordo de pagamento aprovado (cfr. capítulo IX - «6.Cumprimento do Plano»), os Devedores/Recorrentes comprometem-se a efectivar os pagamentos aos credores «através dos rendimentos que por si vierem a ser auferidos» e não através do valor do imóvel, pelo que continua a inexistir qualquer justificação objectiva e proporcional para uma redução de 90% no capital de uns créditos enquanto se salvaguarda 100% do capital de outros (mais se saliente que igualmente continua a não ser explicado porque é que a redução é de 90% e não de 70% ou 50%).
Também a alegação dos Devedores/Recorrentes no sentido de que «é importante acautelar o equilíbrio do sistema financeiro dos bancos, pela razão crucial de ser esse o motor essencial ao funcionamento/financiamento da economia» se mostra totalmente irrelevante para efeitos de justificação objectiva e proporcional do supra referido tratamento enormemente diferenciado entre créditos garantidos e créditos comuns consagrado do acordo de pagamento aprovado (independentemente da correcção do alegado, continua a não existir qualquer explicação para a redução de 90% do capital destes últimos créditos).
Os Devedores/Recorrentes igualmente alegaram que «o plano apresentado, com as diferenças nele plasmadas, significativas ou não, era o resultado da vontade dos próprios credores que o negociaram, votaram e quiseram aprovar o plano» (cfr. conclusão 3ª). Esta alegação não se mostra correcta em face do que foram os votos expressos pelos credores: com efeito, três credores votaram a favor do acordo (EMP03..., Lda, CC e Instituto de Segurança Social, IP) e quatro credores votaram contra o acordo (EMP04... STC, SA, EMP05..., SA, EMP06... - STC, SA, e EMP07..., SA), sendo que nestes credores estão os titulares dos créditos garantidos. Ora, como muito bem se salienta na sentença recorrida, «há, basicamente, um credor que, sozinho, aprova o plano elaborado, impondo a sua vontade (no caso, benevolência) sobre os demais» (EMP03..., Lda - 77,09%), sendo que este credor comum podia ter dado consentimento a um tratamento mais desfavorável relativamente aos outros credores comuns (nos termos do nº2 do art. 194º),  mas não é isso que ocorre no acordo de pagamento aprovado, sendo certo que os outros credores comuns afectados não deram tal tipo de consentimento (votaram contra). Mas efectivamente relevante é que, como se decidiu no Ac. do STJ de 24/11/2015[49], o “vetor que regula para o caso é o da igualdade tendencial dos credores e não o da importância ou essencialidade dos votos de certos credores para que o plano possa ser aprovado”. Deste modo, a aprovação do acordo de pagamento por um credor com mais de 77% dos votos não é relevante para assegurar o respeito pelo princípio da igualdade do tratamento de credores.
Por fim, os Devedores/Recorrentes ainda alegam que «a decisão recorrida mostra-se em contradição com o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, no Processo nº 3316/19.9T8CBR.C1.S1, datado de 07-09-2020» (cfr. conclusão 13ª), alegação que se mostra incorrecta. Na verdade, neste aresto conclui-se pela não violação do princípio da igualdade o acordo de pagamento no caso de tratamento diferenciado entre créditos garantidos e créditos comuns limitado ao início do pagamento do capital e ao perdão de juros, o que, obviamente, não tem qualquer semelhança com o tratamento diferenciado no caso em apreço em que há uma salvaguarda de 100% do capital dos créditos garantidos e uma redução de 90% do capital dos créditos comuns.
Assinale-se que em casos semelhantes ao dos autos (plano de recuperação que salvaguarde integralmente o crédito do credor hipotecário e consagre um perdão de 90% do valor dos créditos comuns), a jurisprudência tem vindo a entender que o tratamento diferenciado deste grau não se acha justificado, ofendendo o princípio da igualdade, por tratamento intoleravelmente desproporcionado entre o credor garantido e os credores comuns. No Ac. da RP de 09/12/2014[50], decidiu-se que “Ofende o princípio da igualdade, por tratamento intoleravelmente desproporcionado entre o crédito do credor hipotecário e os demais créditos comuns, um plano de recuperação que salvaguarde integralmente aquele e elimine os demais em 90%, prevendo o pagamento dos 10% remanescentes ao longo de dez anos e sem juros”, e no Ac. da RP de 08/07/2015[51] entendeu-se que o plano de recuperação violava o princípio da igualdade dos credores quando se verificavam as seguintes circunstâncias: “o credor F… (credor garantido) recebe o capital mais juros remuneratórios contratuais vencidos até à data do trânsito em julgado da sentença que homologar o acordo, em 180 prestações mensais compostas por capital e juros, a dívida é onerada à taxa Euribor a 6 meses com um spread de 2,5%-cfr. número 6. dos factos provados. Os outros credores, como é o caso da D…: - não recebem juros vencidos ou vincendos; - o capital é reduzido em 90% (apenas recebem 10% do capital em dívida), em 150 prestações. De um lado, uns recebem todo o capital e juros. Do outro, aqueles que recebem apenas 10% do capital, sem juros. Dito doutro modo: a revitalização do devedor é conseguida à custa do sacrifício grave ou severo de apenas alguns credores. O conteúdo do plano não tem ínsito apenas um tratamento diferenciado, mas sobretudo um tratamento privilegiado de alguns credores. Há, pois, um tratamento desigual sem uma justificação material da desigualdade que, aliás, nem sequer está devidamente comprovada. Não é, portanto, possível identificar um fundamento racional e objectivo, justificador da distinção entre os credores, patente no plano de recuperação homologado”. Também o citado Ac. da RC de 06/10/2020[52] se pronunciou no sentido da violação do princípio da igualdade de tratamento dos credores quando, “sem que do plano de pagamentos seja feita constar qualquer justificação a tal respeito: - para os créditos garantidos da C..., SA., prevê-se o pagamento integral do capital e de 10% dos juros, a pagar em 328 meses, com uma mensalidade fixa de 1.200 €; - para os créditos comuns prevê-se o pagamento de apenas 10% do capital, em 27 prestações anuais de 972,00 €; - sendo os créditos garantidos no valor de 484.165,37 €, encontra-se previsto o seu pagamento integral, enquanto que, para os créditos comuns, no valor de 890.593,01 €, o plano prevê unicamente o pagamento de um montante global de 26.244,00 €”.
Nestas circunstâncias, não contendo o acordo de pagamento aprovado qualquer fundamento (causa) objectivo, racional, e razoável para explicar o tratamento diferenciado entre os créditos garantidos (salvaguarda de 100% do capital, pagamento em 240 prestações mensais a partir do trânsito em julgado da decisão de homologação do acordo, acrescidas de juros vincendos) e os créditos comuns e subordinado (perdão de 90% do capital, pagamento em duas prestações, vencendo-se a primeira, no mínimo, 21 anos após o trânsito em julgado da decisão de homologação do acordo e a segunda, no mínimo, 22 anos após esse trânsito, e sem juros vincendos), então tal diferenciação implica uma tratamento de enorme e descomunal desfavor dos créditos comuns (e subordinado) em relação aos créditos garantidos, o que se traduz numa medida totalmente desproporcional, discriminatória e até arbitrária e, por via disso, violadora do princípio da igualdade previsto no art. 194º do C.I.R.E
Consubstanciando tal princípio um limite objectivo da discricionariedade e/ou da liberdade de conformação do acordo de pagamento no âmbito do PEAP, então violação do princípio da igualdade de tratamento dos credores representa uma violação não negligenciável das normas aplicáveis ao conteúdo do acordo de pagamento aprovado para efeitos do disposto no art. 215º do C.I.R.E., o que conduza à recusa oficiosa a homologação do acordo de pagamento aprovado
Consequentemente, perante tudo o que supra se expôs e se concluiu, a resposta à presente questão, que no âmbito do recurso incumbe a este Tribunal ad quem apreciar, é necessariamente no sentido de que deve ser recusada a homologação do acordo de pagamento aprovado e apresentado pelos Devedores/Recorrentes em razão de se verificar uma violação não negligenciável das normas aplicáveis ao conteúdo daquele acordo de pagamento para efeitos do disposto no art. 215º do C.I.R.E. decorrente do tratamento diferenciado entre créditos garantidos e créditos comuns constante do acordo consubstanciar uma violação do princípio da igualdade de tratamento credores previsto no art. 194º do C.I.R.E.
Perante a resposta alcançada quanto à questão que se impunham decidir, deverá julgar-se improcedente o recurso de apelação interposto pelos Devedores/Recorrentes, mantendo-se a sentença recorrida (ainda que não o seja com base em todos os fundamentos consignados na mesma).
Improcedendo o recurso, uma vez que ficaram vencidos, as custas do presente recurso ficarão a cargo dos Devedores/Recorrentes (art. 527º/1 e 2 do C.P.Civil de 2013), sem prejuízo do benefício do apoio judiciário que lhes foi concedido.
* *
5. DECISÃO

Face ao exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pelos Devedores/Recorrentes e, em consequência, manter a sentença recorrida.
Custas do recurso pelos Devedores/Recorrentes, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário que lhe foi concedido.
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(O presente acórdão é assinado electronicamente)
 
Relator - Pedro Manuel Quintas Ribeiro Maurício;
1ºAdjunto - Fernando Manuel Barroso Cabanelas;
2ºAdjunto - José Alberto Martins Moreira Dias.



[1]A presente decisão é redigida segundo a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, mas respeita-se, no caso das transcrições, a grafia utilizada nos textos originais.
[2]António Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, 6ªedição actualizada, Almedina, p. 139.
[3]Ac. STJ de 07/07/2016, Juiz Conselheiro Gonçalves da Rocha, proc. nº156/12.0TTCSC.L1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.
[4]Cfr. Ac. desta RG 31/03/2022, Juiz Desembargador José Carlos Duarte, proc. nº805/21.9T8VNF.G2, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg
[5]Cfr. o citado Ac. RG 31/03/2022, Juiz Desembargador José Carlos Duarte.
[6]Juiz Desembargador Barateiro Martins, proc. nº760/19.5T8ACB.C1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrc.  
[7]Ac. STJ 04/07/2019, Juíza Conselheira Catarina Serra, proc. nº3774/17.6T8AVR.P1.S2, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrp
[8]In Lições de Direito da Insolvência, 2ªedição, Almedina, p. 632 e 633
[9]Cfr. Maria do Rosário Epifânio, in Manuel de Direito da Insolvência, 8ªedição, Almedina, p. 536 a 538.
[10]Cfr. Luís Manuel Teles de Menezes Leitão, in Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, 11ª edição, Almedina, p. 265 e Maria do Rosário Epifânio, in obra citada, p. 491.
[11]Cfr. Ac. desta RG 04/04/2024, Juiz Desembargador Gonçalo Oliveira Magalhães, proc. nº3999/23.5T8VNF.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg
[12]Cfr. o citado Ac. RG 31/03/2022, Juiz Desembargador José Carlos Duarte.
[13]Cfr. Ac. desta RG 28/06/2018, Juíza Desembargadora Maria Luísa Ramos, proc. nº6825/17.0T8VNF.G2, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg
[14]In obra citada, p. 539
[15]Cfr. Maria do Rosário Epifânio, in obra referida, p. 539 e Alexandre Soveral Martins, in Curso de Direito da Insolvência, Volume II, 3ªedição, Almedina, p. 383.
[16]In obra referida, p. 540.
[17]Juiz Desembargador Gonçalo Oliveira Magalhães, proc. nº3999/23.5T8VNF.G1.  
[18]Cfr. o citado Ac. desta RG 04/04/2024, Juiz Desembargador Gonçalo Oliveira Magalhães, proc. nº3999/23.5T8VNF.G1.
[19]Cfr. Alexandre Soveral Martins, in obra citada, p. 393.
[20]Cfr. Ac. STJ 07/09/2020, Juiz Conselheiro Pinto de Almeida, proc. nº3316/19.9T8CBR.C1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.   
[21]Cfr. Catarina Serra, in obra citada, p. 639; Maria do Rosário Epifânio, in obra citada, p. 550 e 5511; e Marco Carvalho Gonçalves, in Processo de Insolvência e Processos Pré-Insolvenciais, 2023, Almedina, p. 753. 
[22]In obra citada, p. 551.
[23]No mesmo sentido, Alexandre de Soveral Martins, in obra citada, p. 414.
[24]Juíza Desembargadora Maria Eugénia Pedro, proc. nº435/22.8T8VNF.G1 (no qual o aqui relator foi 1ºadjunto), disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.    
[25]Juíza Desembargadora Maria João Matos, proc. nº348/19.0T8VRL.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.    
[26]Ac. RE 22/02/2018, Juíza Desembargadora Albertina Pedroso, proc. nº494/18.8T8STB-A.E1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtre.   
[27]In Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 2009, Quid Juris, p. 713 e ss.
[28]In obra citada, p. 473.
[29]In Manuel de Direito da Insolvência, 8ªedição, Almedina p. 504.
[30]Juíza Desembargadora Maria Catarina Gonçalves, proc. nº6/17.0T8GRD-A.C1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrc.   
[31]Juiz Desembargador Gonçalo Oliveira Magalhães, proc. nº3999/23.5T8VNF.G1
[32]Cfr. Ac. RG 23/01/2020, Juiz Desembargador Jorge Teixeira, proc. nº510/15.6T8VNF.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.
[33]Cfr. Ac. STJ 07/02/2017, Juiz Conselheiro Nuno Cameira, proc. nº5512/15.9T8CBR.C1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj
[34]In obra citada, p. 712.
[35]Cfr. Jorge Miranda e Rui Medeiros, in Constituição da República Portuguesa Anotada, 1º Volume, 2ª edição, p. 166 e ss.
[36]Disponível em https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/.
[37]Cfr. Ac. RP 09/03/2021, Juíza Desembargadora Anabela Dias Silva, proc. nº2716/20.6T8OAZ.P1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrp
[38]Juíza Desembargadora Maria João Matos, proc. nº348/19.0T8VRL.G1.     
[39]In obra citada, p. 712.
[40]Juiz Conselheiro Fonseca Ramos, proc. nº6148/12.1TBBRG.G1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj
[41]Juíza Desembargadora Maria João Matos, proc. nº348/19.0T8VRL.G1.     
[42]Juiz Desembargador José Carlos Pereira Duarte, proc. nº805/21.9T8VNF.G2, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.
[43]Juiz Desembargador António Barroca Penha, proc. nº577/19.7T8MDL.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.
[44]Juíza Desembargadora Maria João Areias, proc. nº616/20.9T8ACB.C1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrc
[45]Juiz Desembargador Tomé de Carvalho, proc. nº2664/17.7T8STR.E1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.  
[46]Cfr. Ac. STA 18/11/2015, Juiz Conselheiro Pedro Delgado, proc. nº01509/13, disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.  
[47]Juíza Desembargadora Maria João Matos, proc. nº2728/21.2T8VCT.G1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.  
[48]Juiz Desembargador Fernando Cabanelas, proc. nº1980/22.0T8VCT.G1 (no qual o aqui relator foi 2ºadjunto), disponível em http://www.dgsi.pt/jtrg.
[49]Juiz Conselheiro José Rainho, Proc. nº212/14.0TBACN.E1.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.   
[50]Juiz Desembargador Rui Moreira, proc. nº166/14.2TJPRT.P1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrp.
[51]Juiz Desembargador Manuel Domingos Fernandes, proc. nº261/14.8TYVNG.P1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrp.
[52]Juíza Desembargadora Maria João Areias, proc. nº616/20.9T8ACB.C1.