Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | FERNANDA PROENÇA FERNANDES | ||
Descritores: | DIREITO DE PROPRIEDADE REGISTO | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 05/23/2019 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 1.ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | Sumário (da relatora): I – Tendo os réus obtido registo da sua aquisição, esse seu direito não pode ser afastado por um qualquer facto jurídico anterior não registado, como é o caso da aquisição de 1/15 da propriedade por parte dos autores/recorrentes. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório. (…) , casados entre si, residentes em (…) em Chaves, intentaram no actual Juízo Local Cível de Chaves, (…) , Comarca de Vila Real, a presente acção declarativa de condenação, agora de processo comum, contra (…) casados entre si, residentes na Rua (…) Chaves;(…) , casados entre si, residentes na Av. (…) em Chaves; (…) solteiro, maior, residente na (…) em Setúbal, e(…) , casados entre si, residentes na R. (…) em Chaves. Peticionaram se declare o reconhecimento do seu direito de propriedade sobre um quinze avos do prédio rústico inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n.º ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ... (freguesia de ...), bem como a consequente ineficácia das vendas posteriores de tal prédio rústico na parte respeitante àquela proporção de que são proprietários, com a alteração em conformidade do registo predial. Peticionaram ainda, nesta sequência, que os réus se abstenham de realizar qualquer trabalho ou intervenção no imóvel sem autorização dos autores, bem como o pagamento, por parte dos réus, de todos os prejuízos que consideram ter sofrido com a perda das árvores e do mato existentes em tal prédio rústico (cerca de 1.000,00 euros), quer com os honorários e despesas associados ao recurso a juízo que os autores fixam, globalmente, em 2.500,00 euros, bem como no pagamento de juros, à taxa legal, contados desde a citação e até efectivo pagamento. Fundamentando tais pretensões e em síntese, alegaram os autores que por escritura pública de compra e venda, datada de 29 de Agosto de 1980, outorgada no Cartório Notarial de Chaves, os réus J. R. e M. F. venderam aos autores um quinze avos indivisos do prédio rústico composto de terra de cultivo no lugar de ..., tendo os autores, entretanto e na sequência de buscas efectuadas, tomado conhecimento que em 13 de Janeiro de 2005, foram realizadas duas escrituras de compra e venda no Cartório Notarial de Chaves, entre os primeiros e os segundos réus e entre o terceiro e os quartos réus, onde os primeiros réus declararam vender ao réu A. L. e o terceiro réu R. P. declarou vender ao quarto réu marido, metade indivisa do predito prédio rústico, situado no lugar de .... Mais alegaram os autores que pelo mês de Outubro de 2008, tomaram conhecimento que o réu G. N., arbitrariamente, realizou trabalhos de terraplanagem no mesmo prédio rústico sem autorização/conhecimento dos autores, apropriando-se das árvores e do mato que ali se encontravam e dando-lhes destino desconhecido, provocando aos autores prejuízo não inferior a € 1.000,00. Os réus A. L., L. L., G. N. e I. T. contestaram, impugnando os factos alegados pelos autores e pugnando pela improcedência da acção, invocando entre o mais, desconhecer, sem culpa, toda a factualidade inerente à compra invocada pelos autores, designadamente a outorga da escritura pública correspondente. A fls. 87 a 88 dos autos foi proferido despacho no qual se decidiu julgar verificada a excepção dilatória de falta de personalidade judiciária dos réus J. R. e M. F. e, consequentemente, se indeferiu liminarmente a petição inicial relativamente aos mesmos réus. Os autores deduziram incidente de intervenção principal provocada das heranças ilíquidas e indivisas abertas por óbito de J. R. e M. F., tendo-se proferido despacho de deferimento do predito incidente e determinado a citação dos intervenientes/chamados. Por duas vezes foi designada data para realização da audiência prévia, tendo em vista o conhecimento imediato do mérito da causa, tendo sido proferidos os despachos saneadores sentença de fls. 238 e ss. datado de 25/05/2016 e de fls. 302 e ss. datado de 13/06/2017, dos quais houve interposição de recurso pelos autores, tendo sido ambos anulados por acórdãos do Tribunal da Relação de Guimarães de 16/02/2017 a fls. 273 e ss. e 18/01/2018 a fls. 334 e ss., com os fundamentos ali descriminados. Corrigidos os vícios apontados por tais acórdãos, a fls. 359 e ss. vieram os autores requerer a ampliação do pedido. Tal requerimento foi indeferido por despacho de fls. 374 e ss. proferido 03/07/2018, com o seguinte teor: “- Da Ampliação do Pedido Notificados para se pronunciar sobre a contestação apresentada pelos RR. vieram os AA. a fls. 359 e ss. proceder à ampliação do pedido. Alegam em síntese que a venda operada pelos RR. da totalidade do imóvel é nula por se tratar de bens alheios pelo que o registo não pode ser válido. Contudo, caso o Tribunal venha a aceitar que o registo é válido e eficaz e que se sobrepõe à nulidade do contrato que lhe está subjacente, sempre estaríamos em presença de um enriquecimento sem causa, abusivo e ilegítimo, pelo que devem os herdeiros de J. R. e de M. F. e o co-R. R. P., serem condenados a pagar aos AA. o valor correspondente a 1/15 do imóvel, ou seja, se venderam o imóvel, na totalidade, por € 299.278,72, por aplicação de uma regra proporcional, devem ser condenados a entregar aos AA. 1/15 do preço, o que perfaz a importância de €19951,91. Pretendem por isso os AA. a ampliação do pedido, a título subsidiário, e pedem a condenação dos Chamados (herdeiros de J. R. e de M. F.) e do co-R. R. P., no pagamento de 1/15 do preço do imóvel, ou seja, € 19.951,91, acrescidos de juros, à taxa legal, contados de 13 de Janeiro de 2005 e até efectivo pagamento. Em resposta, vieram os RR. insurgir-se contra a requerida ampliação do pedido uma vez que os AA. pretendem transformar uma acção de natureza real numa acção de natureza obrigacional com pedidos totalmente diferentes, sendo certo que não há propriamente uma ampliação do pedido mas sim a dedução de novos pedidos a título subsidiário. Alegam ainda os RR. que mesmo que se admitam os referidos pedidos, o enriquecimento peticionado já estaria prescrito e nunca teriam os AA. direito ao valor do enriquecimento pelo valor das vendas operadas pelos RR. mas quando muito, tão só pelo valor da compra dos 1/15 pelo preço de 50.000,00 escudos, ou seja, € 250,00. Vejamos então se é de admitir a ampliação do pedido. Sendo apresentada, a petição inicial é dada a conhecer ao réu através da citação e a partir desse momento a instância torna-se estável quanto às pessoas e quanto ao objecto – artigo 260º do Código de Processo Civil que consagra o princípio da estabilidade da instância. Este princípio admite, porém, algumas excepções tanto do lado subjectivo (caso dos artigos 311º e segs, 351º e segs do mesmo código) como do lado objectivo. Dispõe o artigo 264º da lei processual civil que o pedido e a causa de pedir podem ser livremente modificados em qualquer altura desde que não sejam afectadas as boas condições do julgamento da causa quando o autor e réu estejam de acordo. Não havendo acordo só poderá haver modificações objectivas nos termos estabelecidos no artigo 265º do Código de Processo Civil. Preceitua o n. º2 (1ª parte) deste normativo que o autor pode em qualquer altura reduzir o pedido e pode ampliá-lo até ao encerramento da discussão em 1ª instância se ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo. Põem-se dois limites á ampliação: um limite de tempo e um limite de qualidade ou de nexo. Limite de tempo: a ampliação é inadmissível depois de encerrada a discussão na primeira instância. Limite de qualidade ou de nexo: a ampliação há-de ser o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo, quer-se dizer a ampliação há-de estar contida virtualmente no pedido inicial. A ampliação pressupõe que dentro da mesma causa de pedir a pretensão primitiva se modifica para mais (cf. neste sentido Prof. Alberto dos Reis em Com III pp 94 e ss). No caso dos autos, não existe qualquer desenvolvimento dos pedidos primitivos mas antes a dedução de novo pedido a título subsidiário e para o caso de o primeiros não procederem e com uma causa de pedir completamente distinta, com absoluta convolação da relação jurídica subjacente. Nos pedidos formulados primitivamente, a causa de pedir assenta na existência de um direito de propriedade dos AA. sobre 1/15 do prédio rústico em causa pretendendo aqueles, além do mais, que o Tribunal reconheça tal direito e declare ineficazes as vendas operadas entre os RR. na parte respeitante a esses 1/15 pertença dos AA. rectificando-se os registos e conformidade. Temos pois que a pretensão formulada pelos AA. nesta acção opera no plano dos direitos reais, levando caso, no plano do mérito da causa, procedam os termos alegados pelos AA. à definição e concretização, do seu direito de propriedade sobre o dito imóvel. No pedido agora formulado a título subsidiário os AA. invocam a figura ou instituto geral do enriquecimento sem causa, no qual a causa de pedir deixa de ser o direito de propriedade dos AA. para passar a ser a existência de um enriquecimento na esfera dos RR. mediante um empobrecimento na dos AA. sem qualquer causa justificativa, passando assim de um direito real para uma pretensão puramente obrigacional. Tratam-se de vias jurídicas profundamente diversificadas para obter a tutela de determinado interesse patrimonial, implicando, aliás, a formulação de pretensões materiais perfeitamente diversificadas: é que a construção fundada no instituto do enriquecimento sem causa, implica necessariamente a formulação de uma pretensão de natureza creditória ou obrigacional, que é co natural a tal instituto, que apenas pode originar uma obrigação de restituir ao empobrecido aquilo com que injustamente se locupletou, nos termos do art. 473º do C.C. Em suma: as pretensões materiais formuladas para além de representarem vias jurídicas alternativas e estruturalmente diferenciadas para alcançar a tutela jurídica de determinados interesses patrimoniais, assentes em pressupostos legais perfeitamente autónomos, implicariam a formulação de pedidos estruturalmente diferentes, envolvendo a via agora seguida pelos AA. a formulação de pedidos de reconhecimento e condenação numa obrigação de restituir determinados valores patrimoniais, ao passo que os pedidos formulados na PI primitiva operam antes no plano dos direitos reais, envolvendo um imediato reconhecimento do direito de propriedade. E, assim sendo, a dedução de pretensões materiais estruturalmente diversificadas, operando umas no plano obrigacional e outras no plano do reconhecimento e concretização dos direitos reais, tem de concluir-se que ambas as pretensões visam realizar formas de tutela material diferentes, obtidas através de pedidos prática e juridicamente bem diferenciados - que se não podem consequentemente reconduzir à realização do mesmo e específico efeito prático jurídico – ocorrendo assim, no plano objectivo, uma diferenciação material dos pedidos formulados. Deste modo é nosso entendimento que o pedido agora formulado não consubstancia um desenvolvimento ou ampliação dos pedidos primitivos, antes implicando a convolação para uma relação jurídica diversa, pelo que não se admite a requerida ampliação do pedido, nos termos do disposto nos artigos 260º e 265º nº 2 do CPC. Custas do incidente pelos AA. as quais se fixam em 1 UC (cfr. artigo 7º, n.º 4 do Regulamento das Custas Processuais, por referência ao que se encontra estabelecido na tabela II anexa a tal Regulamento, aprovado pelo Decreto – Lei n.º 34/2008, de 31 de Dezembro). Notifique.” * Procedeu-se à realização de audiência prévia, com o objectivo de conhecer imediatamente do mérito da causa tendo sido então facultada às partes a discussão de facto e de direito, sendo que estas reiteraram o vertido nos seus articulados.Após a realização de tal audiência prévia, foi proferido então saneador sentença, com o seguinte dispositivo: “Decisão Pelo exposto, julgo a acção totalmente improcedente por não provada e, em consequência absolvo os Réus e os Intervenientes Principais de todos os pedidos formulados. Custas pelos Autores (art. 527º nº 1 do C.P.C.). Registe e Notifique.” * Inconformados com esta decisão, bem como com a que não admitiu a ampliação do pedido dela interpuseram recurso os autores, os quais, a terminar as respectivas alegações, formularam as seguintes conclusões:“Conclusões 1. Na sequência da notificação da contestação junta a fls…, os Recorrentes/Apelantes vieram requerer a ampliação do pedido. 2. Assim, a título subsidiário, pediram a condenação dos Chamados (herdeiros de J. R. e de M. F.) e do co-R. R. P., no pagamento de 1/15 do preço do imóvel; ou seja, € 19951,91, acrescidos de juros, à taxa legal, contados de 13 de Janeiro de 2005 e até efectivo pagamento. 3. A M.ma Julgadora a quo não atendeu à pretensão dos Recorrentes/Apelantes, por entender que o pedido formulado não consubstancia um desenvolvimento ou ampliação dos pedidos primitivos, antes implicando a convolação para uma relação jurídica diversa… 4. A ampliação do pedido, a título subsidiário, e a condenação dos Chamados (herdeiros de J. R. e de M. F.) e do co-R. R. P., no pagamento de 1/15 do preço do imóvel; ou seja, € 19951,91, acrescidos de juros, à taxa legal, contados de 13 de Janeiro de 2005 e até efectivo pagamento, em resultado da venda de um bem que, manifestamente, pertence aos Recorrentes/Apelantes, constitui um desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo. 5. Não estamos na presença de uma nova causa de pedir, nem da convolação da relação jurídica subjacente. 6. Os Recorrentes/Apelantes, em face da, aliás, douta, contestação de fls… e atenta a matéria, ali, invocada (quanto à exacerbada proteção do registo e dos terceiros, de boa fé, para efeitos de registo, “contra tudo e contra todos”), procuram acautelar o seu direito e, no mínimo, a título subsidiário, vêm exigir que os vendedores (que venderam o que não lhes pertencia) lhes paguem o correspondente a 1/15 do preço que embolsaram…nada mais justo, racional e razoável !!! 7. Pelo que a M.ma Julgadora a quo interpretou de modo incorrecto e deficiente o disposto no artigo 265º., nº. 2 CPC, Sem prescindir, 8. A douta decisão recorrida sustenta, sem mais, que, uma vez que os RR. registaram, em primeiro lugar, o respectivo direito de propriedade, é o seu direito que prevalece e produz efeitos contra terceiros, não o direito dos Autores. 9. Tal decisão é injusta, arbitrária e não leva em consideração a causa de pedir e a prova documental junta aos autos, 10. Os Recorrentes/Apelantes sustentam a sua pretensão numa escritura pública de compra e venda, através da qual adquiriram 1/15 indivisos de um prédio rústico e referem que a posteriori foram outorgadas escrituras de compra e venda da totalidade do imóvel e que, por isso, ofendem o direito dos Recorrentes/Apelantes... 11. Os Recorrentes/Apelantes invocam a existência de uma escritura de compra e venda - o que constitui uma forma de aquisição derivada e que não pode ser desvalorizada/omitida pelo Julgador; tanto mais que, ninguém questionou, por qualquer forma, a escritura, em causa, ou o direito dos Recorrentes/Apelantes. 12. Assim, temos que concluir que, quando muito, os Recorridos/apelados, que outorgaram na qualidade de vendedores, em 13/1/2005 (data em que celebraram a escritura de compra e venda da totalidade do imóvel), só poderiam dispor de 14/15 indivisos do imóvel. Ou seja, ao tempo, os vendedores apenas eram proprietários de 14/15 do prédio rústico, em causa. 13. Constando de tal(ais) escritura(s) a totalidade do imóvel, terá que concluir-se que estamos na presença de uma venda, parcial, de bens alheios (princípio nemo plus iuris transferre potest quam ipse habet; ou seja, ninguém pode dispor do que, pura e simplesmente, não lhe pertence). 14. Os transmitentes/vendedores não podem vender o mesmo imóvel, em momentos distintos, a pessoas diferentes… 15. A presunção do registo mostra-se, assim, ilidida por prova em contrário; designadamente, pela escritura de compra e venda outorgada em 29 de Agosto de 1980. 16. Ou seja, ao invés de julgar a acção improcedente, impunha-se que a M.ma Julgadora a quo julgasse, liminarmente, provados e procedentes, os pedidos, supra, elencados e constantes das alíneas a) a e) dos pedidos. 17. Ao decidir de modo diverso, a M.ma Julgadora a quo violou o preceituado nos artº.s 341º. e ss., 349º. e ss., 874º. e ss. e 892º. e ss. todos do Cód. Civil e 265º., nº. 2 CPC. Nestes termos, e nos mais e melhores de direito, deverá este Venerando Tribunal da Relação revogar as doutas decisões recorridas e, em consequência, as mesmas substituídas por douto Acórdão que julgue provados e procedentes os pedidos constantes das alíneas a) a e) do pedido e remeta a apreciação dos demais pedidos para a audiência de discussão e julgamento que vier a ter lugar; ou, caso, assim, se não entenda, se permita aos Recorrentes/Apelantes a ampliação do pedido e a consequente condenação dos Chamados nos termos, ali, requeridos. Assim se fará, cremos, equilibrada e sã Justiça”. * Os réus contestantes apresentaram contra-alegações, terminando as mesmas com as seguintes conclusões, que se transcrevem:“Conclusões: I. Os pedidos das alíneas f) e g) de natureza pecuniária e indemnizatória nada têm a ver com os contratos celebrados, pois tendo os autores configurado uma ação de natureza real pedindo, basicamente o reconhecimento do direito de propriedade sobre o imóvel, a ineficácia da escritura de compra e venda e a alteração do registo (não o cancelamento). II. Quando os autores verificaram que estes pedidos iriam naufragar, porque os novos compradores compraram, registaram, entraram na posse e fizeram obras, não podendo, por essa via, obter o que pediram mudaram o pedido que, comprovadamente não emerge dos primeiros. III. Em bom rigor o aditamento ao pedido nada tem a ver com os anteriores, configurando não propriamente uma ampliação mas antes um pedido subsidiário que deveria ter sido formulado na douta p.i. peça totalmente configurada pelos autores. IV. Confrontados os pedidos, verificamos que não estamos em presença de um pedido ampliado mas sim subsidiário que ao não ser feito na p.i. fica precludido. V. A aceitar-se que há ampliação, verificamos que este nada tem a ver com os anteriores pedidos - natureza real daqueles, natureza obrigacional destes. VI Os autores recorrentes nunca estiveram na posse do prédio vindo muito mais de vinte anos após a sua compra invocar direitos que se encontram prescritos. VII Não podem os réus serem condenados tendo como referência o valor do prédio em 2005 mas o valor consignado na escritura de compra e venda coisa que não é pedida; os RR. venderam aos autores 1/15 do prédio pelo preço de 50.000,00 escudos, ou seja 250,00 €. VIII Sendo a partir deste preço que teria de ser determinada a hipotética indemnização e não com referência ao valor do prédio que já não existe tendo sido loteado, feitas construções etc. IX Tal hipotético direito estaria sempre prescrito. X Os vendedores J. R. e mulher e D. F. e marido venderam 1/15 do prédio em crise nos autos em 1980. XI O prédio continuou na sua posse e seus herdeiros até 2005 para além de sempre ter estado registado a seu favor. XII Nunca os recorrentes entraram na posse do prédio, facto que, em coerência nunca alegaram, nunca souberam qual era a sua parte porque o prédio continuou indiviso nem em momento algum o registaram na proporção adquirida a seu favor. XIII Ora não tendo alegado atos de posse, não beneficiando de qualquer presunção registral não poderia os recorrentes obter a procedência dos presentes autos. Outrossim, XIV A improcedência dos pedidos de reconhecimento do direito de propriedade tem como consequência a improcedência de qualquer pedido de indemnização seja a que título for. XV Quanto ao mais, aderimos na íntegra aos fundamentos exarados na douta sentença proferida pelo tribunal a quo e ainda os constantes do despacho que indeferiu a ampliação do pedido. Termos em que, deve a douta sentença e bem assim o despacho de indeferimento da ampliação do pedido serem confirmados assim se fazendo, como sempre Justiça”. * O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos, e com efeito meramente devolutivo.* Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.* II. Questões a decidir.Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal consistem em: - saber se é admissível a requerida ampliação do pedido; - saber se deve a acção proceder julgando-se provados e procedentes os pedidos constantes das alíneas a) a e) do pedido e remetida a apreciação dos demais pedidos para a audiência de discussão e julgamento que vier a ter lugar. * III. Fundamentação de facto.Na decisão sob recurso foram dados como provados os seguintes factos: “1. O prédio rústico sito na ..., freguesia de ..., concelho de Chaves, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n.º ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º ... (freguesia de ...) foi objecto da escritura de habilitação e partilha outorgada no Cartório Notarial de Chaves, em 14 de Abril de 1980, constante do livro ..-D, folhas 50 verso a 56 verso, por óbito de A. A., escritura esta que se encontra junta a fls. 50 e ss. e cujo teor ora se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais. 2. O prédio identificado em 1., descrito na verba n.º 8 daquela escritura de habilitação e partilha, coube, na proporção de metade indivisa, a D. F. e, igualmente na proporção de metade indivisa, a M. F.. 3. No dia 29 de agosto de 1980 foi celebrada escritura pública de compra e venda entre os primeiros RR. J. R. e M. F. e os AA. F. F. e T. N., mediante a qual aqueles venderam a estes, pelo preço de cinquenta mil escudos, “um quinze avos indivisos de um prédio rústico composto de terra de cultivo no lugar de ..., que confina de norte com o caminho de consortes, de nascente com A. S., de sul com F. R. e de poente com D. F., inscrito na matriz predial rústica da freguesia de ... sob o artigo ...”, conforme resulta do documento de fls. 9 e ss. cujo teor se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais. 4. Os AA. não registaram a seu favor, na Conservatória do Registo Predial, a aquisição identificada em 3). 5. Por sua vez, a metade indivisa do prédio que coube a D. F., com a morte desta e do seu marido J. P., ocorridas, respectivamente, em 08.09.2001 e 17.03.1997, passou a integrar a respectiva herança, da qual o R. R. P. era o único herdeiro habilitado. 6. Em 13 de Janeiro de 2005 foi outorgada escritura pública de compra e venda relativa à metade indivisa do prédio rústico referido em 1. pertencente ao R. R. P., na qual este declarou vender tal imóvel aos RR. G. N. e I. T., pelo preço de 149.639,36 euros, conforme resulta do documento junto a fls. 13 e ss. dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais. 7. Em 13 de Janeiro de 2005 foi outorgada escritura pública de compra e venda da metade indivisa do prédio rústico referido em 1. pertencente aos RR. J. R. e M. F., na qual estes declararam vender tal imóvel aos RR. A. L. e L. L., pelo preço de 149.639,36 euros, conforme resulta do documento junto a fls. 17 e ss. dos autos, cujo teor ora se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais. 8. Em 14 de Janeiro de 2005, os Réus G. N. e I. T. e os RR. A. L. e L. L. requereram o registo a seu favor das proporções que adquiriram no dia anterior, conforme resulta da certidão de registo predial junta aos autos a fls. 63, cujo teor ora se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais.”. E foi considerado não provado o seguinte facto: “A. Os RR. J. R. e M. F. requereram, em 30 de Março de 1987, o registo a seu favor, na Conservatória do Registo Predial de Chaves, de metade indivisa do prédio identificado em 1. dos factos provados, com base na escritura de habilitação e partilha referida em 1. e 2. dos factos provados”. * IV. Fundamentação de direito.Delimitadas que estão, sob o n.º II, as questões essenciais a decidir, é o momento de as apreciar. A primeira questão que se coloca, consiste em saber se é admissível a requerida ampliação do pedido. Prevê o artigo 260º do Código de Processo Civil que “citado o réu, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei”. Daqui decorre o princípio da estabilidade da instância que, torna firmes, após a citação, os elementos essenciais da causa. Ou seja, após a citação, só nos casos processualmente delimitados e mediante a verificação dos respectivos pressupostos, pode ocorrer uma modificação subjectiva ou objectiva da causa. Interessando ao caso dos autos, apenas a alteração objectiva do pedido, temos que esta (ampliação do pedido) pode verificar-se até ao encerramento da discussão em 1.ª instância, se for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo (artigo 265º, nº 2, do Código de Processo Civil). Diga-se ainda que a ampliação do pedido pressupõe, a emanação da mesma causa de pedir, uma vez que só é permitida se constituir desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo. Assim, a ampliação pressupõe que, dentro da mesma causa de pedir, a pretensão inicial se modifique para um mais. Como escreveu Alberto dos Reis, in “Comentário ao Código de Processo Civil”, III, págs. 93/94 (com argumentos perfeitamente aplicáveis ao actual art. 265º do C.P.Civil): “A ampliação pressupõe que dentro da mesma causa de pedir a pretensão primitiva se modifica para mais, o que permite distingui-la da cumulação de pedidos em que a um pedido fundado em determinado facto se junta um outro, fundado em facto diverso, ou seja em acto ou facto jurídico diferente com individualidade e autonomia perfeitamente diferenciada dos pedidos primitivos”… “A ampliação do pedido prevista na 2ª parte do nº 2 do artº 273º pressupõe que o pedido formulado esteja virtualmente contido no pedido inicial e na causa de pedir da acção, isto é, que dentro da mesma causa de pedir o pedido primitivo se modifique para mais.”. No caso dos autos, temos que a ampliação do pedido pretendida pelos autores/recorrentes, não emana da causa de pedir invocada na petição inicial, nem constitui o desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo. Com efeito, nos pedidos formulados primitivamente, a causa de pedir assenta na existência de um direito de propriedade dos autores sobre 1/15 do prédio rústico em causa nos autos pretendendo aqueles, além do mais, que o Tribunal reconheça tal direito e declare ineficazes as vendas operadas entre os réus na parte respeitante a esses 1/15 pertença dos autores, rectificando-se os registos em conformidade. Já na ampliação do pedido, deduzido a título subsidiário, invocam os autores o instituto do enriquecimento sem causa, no qual a causa de pedir deixa de ser o direito de propriedade dos autores para passar a ser a existência de um enriquecimento na esfera dos réus mediante um empobrecimento na dos autores, sem qualquer causa justificativa. Ora, como bem se refere na decisão recorrida, “as pretensões materiais formuladas para além de representarem vias jurídicas alternativas e estruturalmente diferenciadas para alcançar a tutela jurídica de determinados interesses patrimoniais, assentes em pressupostos legais perfeitamente autónomos, implicariam a formulação de pedidos estruturalmente diferentes, envolvendo a via agora seguida pelos AA. a formulação de pedidos de reconhecimento e condenação numa obrigação de restituir determinados valores patrimoniais, ao passo que os pedidos formulados na PI primitiva operam antes no plano dos direitos reais, envolvendo um imediato reconhecimento do direito de propriedade.” Assim, o pedido formulado na ampliação, não decorre dos pedidos anteriores. E não decorre, desde logo também, porque estamos perante um pedido subsidiário. E, sendo um pedido subsidiário, logicamente não se encontra virtualmente contido no pedido anterior, pois que o pedido subsidiário só se aprecia no caso de sucumbência dos pedidos principais. Ora, a ampliação do pedido, prevista no já referido art. 265º nº 2 do Código de Processo Civil, não serve para introduzir em juízo pedidos subsidiários que, desde logo (estivesse alegada a factualidade subjacente), poderiam ter sido deduzidos na petição inicial. Como se diz no Ac. da Relação de Évora de 28/06/2017, disponível em www.dgsi.pt: “O pedido pode ser ampliado até ao encerramento da discussão em 1ª instância, se a ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo, mas não se constituir uma mera decorrência da falta da sua formulação logo na petição inicial, altura em que o autor já sabia da existência das circunstâncias nas quais baseia tal ampliação”. Como se disse já, a ampliação do pedido pressupõe que, dentro da mesma causa de pedir, a pretensão primitiva se modifica para mais, sendo que o requerimento dos autores não configura uma ampliação jurídica dos pedidos primitivos, mas antes a formulação de um novo pedido, subsidiário, sendo que em momento algum da petição inicial foram alegados factos que suportem tal ampliação. A ser assim, a ampliação do pedido é inadmissível, nos termos do n.º 2 do art.º 265.º do Código de Processo Civil. Improcede, pois, nesta parte a apelação. * Passemos à segunda questão a conhecer.Com a instauração da presente acção, pretendem os autores, que lhes seja reconhecido o direito de propriedade sobre o prédio rústico em causa nos autos, na proporção de um quinze avos indivisos, sendo declarada a ineficácia das compras e vendas efectivadas pelos réus sobre o totalidade do mencionado prédio. Para tanto, e em suma, invocaram os autores que celebraram com os entretanto falecidos réus J. R. e M. F. uma escritura de compra e venda sobre o bem imóvel em causa nos presentes autos, o que ocorreu em 29 de Agosto de 1980. Dispõe o artigo 874.º do Código Civil que «Compra e venda é o contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa, ou outro direito, mediante um preço». Acrescenta o artigo 875.º do mesmo Código que este contrato, versando sobre bens imóveis, «só é válido se for celebrado por escritura pública ou por documento particular autenticado». De acordo com o disposto pelo artigo 408.º, n.º1 do Código Civil, a transferência de direitos reais sobre coisa determinada dá-se, em regra, por mero efeito do contrato. A ser assim, no âmbito da compra e venda, em regra, verifica-se o «efeito translativo automaticamente com a perfeição do acordo contratual» (Luís Menezes Leitão, Direito das Obrigações, volume III, 11.ª edição, Almedina, Coimbra, 2016, p. 19). Nessa medida, e considerando que se provou que os autores acordaram com os então proprietários, no respeito pela forma legal exigida, na venda de um quinze avos do prédio identificado em 1. dos factos provados, mediante o pagamento do correspondente preço, haveria que concluir-se, como se diz na decisão recorrida, de acordo com a regra, que os autores se tornaram proprietários do referido bem, na indicada proporção. Contudo, para além de tal factualidade, também se provou que os réus G. N. e I. T. adquiriram a proporção de metade daquele imóvel a R. P.; e que os falecidos J. R. e M. F., que antes tinham vendido aos autores, na proporção de um quinze avos, o supra referido prédio rústico, venderam novamente tal imóvel, em 13 de Janeiro de 2005, na proporção de metade, aos réus A. L. e L. L.. Para além disso provou-se que, a compra efectuada pelos autores nunca foi levada a registo, sendo que as compras efectuadas pelos réus o foram. A ser assim, estamos perante uma situação de dupla constituição de direitos sobre o mesmo objecto, de onde decorre que quer os autores, quer os réus adquirentes A. L. e L. L., são terceiros para efeitos de registo, ou seja, receberam do mesmo autor e sobre o mesmo objecto, direitos total ou parcialmente conflituantes. Como nos diz Manuel de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, vol. II, p. 19, terceiros para efeitos de registo são as pessoas que, relativamente a determinado acto de alienação, adquirem do mesmo autor ou transmitente direitos total ou parcialmente incompatíveis. Foi sendo controverso, quer na doutrina, quer na jurisprudência, saber se os terceiros eram apenas os titulares de direitos incompatíveis provindos do mesmo transmitente ou todos os que, tendo obtido registo de um direito sobre determinado prédio, veriam esse direito ser arredado por qualquer facto jurídico anterior não registado ou registado posteriormente, ou ainda numa posição intermédia, apenas os que adquirem a título oneroso e de boa fé, ou seja, com desconhecimento da aquisição conflituante (cfr. neste sentido Acórdão desta Relação de Guimarães, de 20/04/2017, disponível in www.dgsi.pt). As divergências na jurisprudência foram uniformizadas pelo STJ por duas vezes, mas em sentido diferente: (i) no acórdão nº 15/97 de 20 de Maio (publicado no DR I série de 4/7/1997) considerou-se que «terceiros para efeitos de registo predial são todos os que, tendo obtido registo de um direito sobre determinado prédio, veriam esse direito a ser arredado por qualquer facto jurídico anterior não registado ou registado posteriormente»; (ii) no acórdão nº 3/99 de 18/5/99 (publicado no DR I Série, de 10/7/1999, reviu-se a doutrina daquele acórdão e formulou-se um acórdão unificador de jurisprudência do seguinte teor: «Terceiros, para efeitos do disposto no artigo 5º do Código de Registo Predial, são os adquirentes de boa fé, de um mesmo transmitente comum, de direitos incompatíveis, sobre a mesma coisa». Como se refere no Acórdão da Relação de Lisboa, de 08/03/2013, disponível in www.dgsi.pt, “este último acórdão uniformizador foi assumido normativamente pelo referido DL nº 533/99 que veio interpretar autenticamente e de forma restritiva o conceito de terceiros para fins de registo, pelo que se exige a sua observância por imposição do disposto nº 1 do artigo 13º do C.Civil”. Por seu turno, o Código do Registo Predial, influenciado por aquele último acórdão de fixação de jurisprudência, apresenta a seguinte definição de terceiros: “São aqueles que tenham adquirido de um autor comum direitos incompatíveis entre si”. No caso dos autos, temos que, quer os autores, quer os réus A. L. e L. L. adquiriram de um mesmo autor, direitos parcialmente incompatíveis entre si. O artigo 5º nº 1, do Código de Registo Predial, não tem como finalidade fazer depender a oponibilidade do direito real da prévia inscrição registral da aquisição a favor do seu titular, tendo antes por escopo proteger o terceiro que, confiado na aparência de uma situação registral desconforme à realidade substantiva, celebra um negócio jurídico inválido com o titular inscrito e regista a sua aquisição (cfr. neste sentido Acórdão da Relação de Coimbra de 08.11.2011, disponível in www.dgsi.pt). Como se escreveu no Acórdão do STJ de 21/06/2007, disponível in www.dgsi.pt.: “As situações prevenidas pelo conceito de terceiros para efeitos de registo, são situações em que ocorre uma relação triangular consubstanciada em dupla transmissão pelo mesmo alienante de um bem imóvel ou de um bem móvel sujeito a registo a um primeiro transmissário, que não inscreve no registo a aquisição, e depois a um segundo, que opera a respectiva inscrição registal. São situações de conflito entre dois adquirentes, é válido o primeiro negócio de transmissão e não o segundo, mas o primeiro adquirente não pode opor ao segundo a sua aquisição, porque ela não constava no registo, e o último não podia, dada a fé pública derivada do registo, conhecer que o alienante já não era o titular do direito em causa”. Assim, esta norma aplica-se apenas aos casos, como o dos autos, em que um facto sujeito a registo não foi registado (a venda aos aqui autores), provocando uma desconformidade do registo predial com a realidade substantiva subjacente. Por outro lado, a finalidade de tal norma, é proteger o terceiro que pratica um negócio jurídico de aquisição de um direito real com aquele que figura no registo como seu titular, embora realmente não o seja (cfr. neste sentido Acórdão da Relação de Coimbra de 08.11.2011, disponível in www.dgsi.pt). E, pese embora este segundo negócio jurídico se encontre ferido de nulidade (nas relações entre alienante e adquirente, por se tratar de um bem alheio), sendo ineficaz em relação ao proprietário, o facto é que, por força da fé pública resultante do registo predial, e verificados determinados pressupostos, protege-se o terceiro que registou a sua aquisição. Produzindo os factos sujeitos a registo os seus efeitos contra terceiros depois da data do respectivo registo, tendo os réus A. L. e L. L. obtido registo da sua aquisição, esse seu direito não pode ser afastado por um qualquer facto jurídico anterior não registado, como é o caso da aquisição de 1/15 da propriedade por parte dos autores/recorrentes. “O registo destina-se a facilitar e a conferir segurança ao tráfico imobiliário, garantindo aos interessados que, sobre os bens a que aquele instituto se aplica, não existem outros direitos senão os que o registo documento e publicita. Os direitos não inscritos no registo devem ser tratados como direitos 'clandestinos', que não produzem quaisquer efeitos contra terceiros”.(Cfr. Antunes Varela e Henrique Mesquita, Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 127.º, p. 23). Acrescente-se ainda que, tal como está consagrada a norma do já referido artigo 5º, a boa-fé deve considerar-se irrelevante, devendo antes proteger-se aqueles que usam da má-fé para ultrapassar aqueles que, por incúria, negligência, desleixo ou até mesmo desconhecimento não cumpriram o seu dever de registar (cfr. neste sentido Acórdão desta Relação de Guimarães, de 20/04/2017, disponível in www.dgsi.pt). Com efeito, a segurança, celeridade e fluidez do comércio jurídico sobrepõe-se à ideia da justiça da boa ou má-fé. Neste sentido, Carlos Alberto Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 4º Ed. (reimp.), Coimbra Editora, Coimbra, 2012, pp. 368, afirma que “a segurança que se pretende garantir ao comércio jurídico seria fortemente afectada, se o terceiro, adquirente de quem tem um prédio registado a seu favor, ficasse exposto às delongas, às incertezas, aos gastos, eventualmente manobras inerentes a processos judiciais tendentes a provar que ele conhecia uma alienação anterior”. …, “só a inoponibilidade de actos não registados a terceiros, mesmo que de má-fé, motivará os interessados a promover o registo”. No caso dos autos, pese embora aquando da venda aos réus A. L. e L. L. da metade indivisa do prédio em causa, já os falecidos J. R. e M. F. não fossem proprietários da totalidade da parte que venderam, o facto é que os autores/recorrentes, adquirentes de 1/15 desse imóvel, não podem opôr o seu direito de propriedade aos réus A. L. e L. L., uma vez que não efectuaram o registo da sua aquisição. Assim, uma vez que foram os réus A. L. e L. L. que registaram, em primeiro lugar, o respectivo direito de propriedade, é o seu direito que prevalece e produz efeitos contra terceiros, não o direito dos autores/recorrentes. Já quanto ao negócio jurídico de compra e venda sobre a outra metade indivisa do prédio rústico, celebrado entre o réu R. P. e os réus G. N. e I. T., diz-se na decisão recorrida que: “… a este propósito, não pode deixar de ter-se em atenção a origem do direito do R. R. P.. Segundo se provou, a mãe deste R. (D. F.) recebeu, por herança, a metade indivisa do prédio em causa nos presentes autos que, posteriormente, também por herança, coube ao R. R. P., como único herdeiro após o falecimento do seu pai. E foi esta metade indivisa do prédio rústico que este R. vendeu aos RR. G. N. e I. T.. Assim, este negócio jurídico entre os RR. R. P. e os RR. G. N. e I. T. é totalmente alheio ao direito de propriedade que os AA. consideram ter sobre um quinze avos do prédio rústico melhor identificado no facto provado n.º1. É que, saliente-se, os AA. não podem pretender fazer valer qualquer direito sobre a totalidade do prédio rústico, visto que adquiriram o seu direito por transmissão de J. R. e M. F. que já só eram, eles próprios, titulares de metade indivisa e, como tal, nada mais do que isso poderiam transmitir aos Autores. Nessa medida, não se vislumbra em que medida o direito dos AA. pode ser incompatível com os direitos adquiridos pelos RR. G. N. e I. T.. A incompatibilidade existiria, apenas, entre o direito de propriedade dos RR. A. L. e L. L. e o alegado direito de propriedade dos Autores. Nessa medida, o negócio entre o R. R. P. e os RR. G. N. e I. T., tendo sido celebrado no respeito pela forma legalmente exigida, teve como efeito imediato a transferência da propriedade da outra metade indivisa do prédio rústico, a qual foi devidamente registada e, portanto, beneficia da presunção prevista no artigo 7.º do Código do Registo Predial. Aliás, em reforço desta tese, note-se que, mesmo que, por mera hipótese, fosse reconhecido aos AA. o direito de propriedade que estes invocam, nos termos supra mencionados, tal reconhecimento em nada contenderia com o direito dos RR. G. N. e I. T., que incidem sobre a outra metade, embora indivisa, do mesmo prédio rústico. Portanto, ainda que o direito dos AA. fosse válido e eficaz, poderia subsistir, a par do direito dos RR. G. N. e I. T., o que apenas implicaria uma simples situação de compropriedade. Porém, conforme supra se referiu, o direito dos AA. não é plenamente eficaz. Bem pelo contrário, tal direito não é oponível aos RR. A. L. e L. L., esses sim comproprietários daquele imóvel. E, sendo os RR. G. N. e I. T. alheios à cadeia de negócios que originou a presente acção, apenas são aqui demandados em virtude da pura e simples compropriedade do imóvel. Nessa medida, o direito invocado pelos AA. não poderia, em caso algum, ser-lhes oponível, não o sendo aos RR. A. L. e L. L.. Conclui-se, portanto, que, não sendo reconhecido aos AA. qualquer direito de propriedade sobre o bem imóvel, naufragam todos os pedidos formulados na sua PI.”. Concorda-se com tal argumentação, nada havendo a acrescentar à mesma, sendo de salientar que, nas suas alegações de recurso os autores/recorrentes, acabam por a não pôr em causa. Improcede pois, também nesta parte, o recurso. * V. Decisão.* Perante o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação, e, em consequência, confirmar a decisão recorrida. Custas do recurso, pelos autores/ recorrentes. * Guimarães, 23 de Maio de 2019 Assinado electronicamente por: Fernanda Proença Fernandes Heitor Gonçalves Amílcar Andrade (não assina por não se encontrar presente, tendo dado voto de conformidade) (O presente acórdão não segue na sua redacção as regras do novo acordo ortográfico, com excepção das “citações” efectuadas que o sigam) |