Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | JOSÉ CRAVO | ||
Descritores: | EMBARGOS DE EXECUTADO IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO PROVA PERICIAL EXECUÇÃO PARA ENTREGA DE COISA CERTA BENFEITORIA INVENTÁRIO | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 11/25/2021 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | APELAÇÃO IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 2.ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | I – O preceituado no art. 640º do CPC em conjugação com o que se dispõe no art. 662º do mesmo diploma legal permite ao Tribunal da Relação julgar a matéria de facto. II – As benfeitorias feitas por terceiros, ou mesmo por um herdeiro, em bens da herança, que não possam ser por eles levantadas deverão figurar na relação de bens, mas a sua verba não será tida como efectiva dívida da herança mas como valor dedutível ao acervo dos bens adjudicados ao interessado respectivo, a determinar por avaliação e atento o benefício que trouxeram aos prédios em causa, segundo as regras do enriquecimento sem causa. III – O inventário é o lugar próprio para o efeito, caso em que o mapa da partilha contemplará a situação. IV – Não tendo aqueles invocado o seu direito a benfeitorias no inventário até ao trânsito em julgado da sentença homologatória do mapa da partilha, não ficam impedidos de vir a invocar e provar esse seu direito por meio adequado e em momento posterior, mas não pode(m) obstar aos efeitos daquela sentença, enquanto título executivo, (…), maxime quando pendem já execuções e a elas se não opuseram com os fundamentos previstos no quadro dos arts. 728º e 729º do Código de Processo Civil. | ||
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Decisão Texto Integral: | Relator: Des. José Cravo 1º Adjunto: Des. António Figueiredo de Almeida 2º Adjunto: Desª Maria Cristina Cerdeira Apelação (1ª espécie) * Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães* 1 – RELATÓRIOA. C. e M. C. deduziram oposição (1), por embargos, à execução para entrega de coisa certa intentada por M. L. e J. D., pedindo, a final, que: a) Se condenem os Exequentes a pagar aos Executados o valor de todas as obras e benfeitorias, úteis ou necessárias, alegadas na oposição, na quantia de 33.750,00 € (trinta e três setecentos e cinquenta euros), acrescida de juros legais que se vencerem a partir da presente data até integral pagamento; b) Se ordene a imediata suspensão dos termos da execução; c) Se reconheça aos Executados o direito de retenção sobre os imóveis cuja entrega é peticionada até que seja pago o valor das obras e benfeitorias ou o valor que se vier a apurar, com os correspondentes juros; d) Se ordene o diferimento da desocupação dos imóveis reivindicados pelo prazo máximo legalmente admissível; e) Se ordene a imediata suspensão da execução, a qual se deverá manter pelo prazo concedido para o deferimento da desocupação. Alegam para tanto, em síntese, que: Os prédios cuja entrega é peticionada na execução foram adjudicados aos Exequentes no âmbito do processo de Inventário, por óbito de A. D. falecida em -.01.1999, que correu termos sob o n.º 109/07.0TBBCL, e constituem, há mais de 30 anos, a casa de habitação dos Executados que ali coabitaram com a inventariada; Os Executados, desde há mais de 30 anos e até ao presente, realizaram, com autorização quer da inventariada quer dos ora Exequentes, diversas benfeitorias necessárias à conservação do prédio urbano, que evitaram e visaram evitar a sua deterioração, como também aumentaram o valor efectivo, real e venal; Bem como edificaram, no prédio rústico destinado a logradouro, uma estrutura de tijolo e cimento destinada ao acolhimento e criação de animais domésticos e plantaram ainda diversas árvores de frutos; O custo e valor dessas obras ascende a 33.750,00 € (trinta e três mil setecentos e cinquenta euros). Tais obras têm carácter permanente, estão incindivelmente ligadas ao solo do prédio, não podendo ser levantadas do prédio sem detrimento deste ou daquelas; E visaram permitir a utilização da habitação e terreno aos fins a que se destinavam, aos quais eram necessárias, para além de lhes aumentarem o seu valor e assegurarem a sua conservação. No indicado prédio urbano, destinado à habitação, residem actualmente os Executados, M. C. e marido A. C., bem como um filho, C. C., e um neto, C. A., num total de quatro pessoas. A executada M. C. é uma pessoa de parca formação, não sabendo ler nem escrever, não labora, e apenas aufere mensalmente a quantia de 254,00 € que lhe é atribuída pela Segurança Social; O Executado A. C. encontra-se doente e acamado desde há vários anos, padecendo de uma incapacidade manifestamente superior a 60%, recebendo mensalmente a quantia de 490,87 € da Segurança Social, quantia que reverte, em exclusivo, para as despesas médicas e medicamentosas que necessita. O filho dos Executados, C. C., é portador de doença do foro neurológico, o que o impossibilita de laborar, recebendo este da Segurança Social, por via da incapacidade de que padece, a quantia de cerca de 200,00 € mensais. O neto dos Executados, C. A., de 20 anos de idade, começou recentemente a laborar, não auferindo quantia superior ao salário mínimo. * Os Embargados/exequentes M. L. e J. D., apresentaram contestação, impugnando a factualidade alegada pelos Embargantes e pugnando pela improcedência dos embargos deduzidos.Defendem os Exequentes que no âmbito do processo de Inventário que correu termos sob o n.º 109/07.0TBBCL foi a Embargante mulher quem exerceu as funções de cabeça de casal e, nessa qualidade, apresentou a relação de bens sem que fossem aí mencionadas quaisquer benfeitorias nos imóveis em causa nos autos, nem ao longo do processo de inventário foi essa questão suscitada; por isso, tendo sido já realizada a partilha e homologada por sentença transitada em julgado, ficou precludido o direito dos Oponentes a invocarem as benfeitorias na fase executiva. Quanto ao mais, os Embargados arguem que os Executado(a)(s) receberam tornas no âmbito do processo de inventário e dispõem de rendimentos suficientes para obterem uma habitação condigna, tendo ademais vivido em casa alheia, de forma gratuita, durante mais de 30 anos, pelo que conseguiram reunir poupanças ao longo da vida, inexistindo qualquer fundamento para o diferimento da desocupação dos imóveis. * Foi proferido despacho saneador, no âmbito do qual foi ordenado, com carácter de urgência, se solicitassem aos serviços da Segurança Social a elaboração do relatório social sobre os Embargantes e foi decidido que até à junção desse relatório ficava a execução suspensa, quer quanto ao diferimento da desocupação, quer quanto à venda do prédio urbano cuja entrega é peticionada (isto, independentemente de se reconhecer entretanto, ou não, a existência das benfeitorias alegadamente realizadas pelos embargantes e de o exequente vir a prestar caução pelo valor das mesmas).* O Embargante/ Executado A. C. faleceu no dia - de Março de 2015, no estado de casado, sucedendo-lhe, como únicos e universais herdeiros, a sua esposa – também executada – e os seus filhos, C. C., L. M., A. M., M. F. e D. C., os quais foram habilitados a prosseguir nos autos em substituição do falecido, por sentença proferida, em 16-10-2017, no apenso B.* Foi proferido despacho saneador tabelar.Procedeu-se à realização da audiência final com observância estrita das formalidades legais, como consta da respectiva acta. * No final, foi proferida sentença, tendo-se decidido nos seguintes termos:Nestes termos, julgo totalmente improcedente os presentes Embargos de Executado, ordenando o normal prosseguimento da execução. Adverte-se, contudo, o Sr. (ª) Agente de Execução que enquanto se mantiver em vigor o regime excepcional previsto no actual art.º 6º-E, n.º 7, al. b), da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março na sua actual redacção (introduzida pela Lei n.º 13-B/2021, de 05/04), não deverá ser realizada a entrega, uma vez que os imóveis em causa nos autos correspondem à casa de morada de família da Executada. * Custas a cargo dos Embargantes, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficiem. * Registe e notifique. Comunique ao(à) Sr. (ª) Agente de Execução. * Inconformada com essa sentença, apresentou a executada/embargante M. C. recurso de apelação contra a mesma, cujas alegações finalizou com a apresentação das seguintes conclusões:I. Vem o presente recurso interposto da sentença que antecede, a qual julgou improcedentes os embargos. II. A factualidade considerada provada, por si só, impunha uma diferente solução jurídica, com a consequente procedência dos embargos, pelo que a sentença em crise não enquadra uma correta interpretação e aplicação do direito aos factos provados. III. Como ponto prévio, decorre dos autos, por douto despacho datado de 17.11.2014 foi determinada a suspensão da presente execução, decisão da qual não foi interposto recurso, admissível nos termos da alínea b) do n.º 2 do art. 853º do Código de Processo Civil, pelo que tal decisão transitou em julgado. IV. De acordo com tal decisão, a presente execução manter-se-á suspensa até que ocorra o trânsito em julgado da decisão final que vier a ser proferida quanto à matéria da oposição à execução, nomeadamente quanto ao pedido de condenação dos Embargados no pagamento das benfeitorias. V. O objeto do presente recurso cinge-se à apreciação da questão de saber se aos Executados/Embargantes assiste o direito a ser indemnizados pelo valor das benfeitorias realizadas nos imóveis cuja entrega é peticionada pelos Exequentes/Embargados, e em caso afirmativo, o valor da indemnização que lhes é devida. VI. De acordo com a matéria de facto dada como provada, os Executados e a sua família desde há mais de 30 anos habitam no prédio urbano identificados em 1. dos factos provados e usufruem do prédio rústico, que constitui o seu logradouro, o que sempre fizeram com a permissão da falecida A. D.. VII. Mais está provado que, após o óbito da Inventariada, ocorrido em 21.01.1999, os Executados permaneceram na dita habitação e logradouro, o que sucede até ao presente, e também que após o óbito os Embargantes realizaram obras na habitação, nomeadamente “as paredes das divisórias foram cerzitadas, areadas e rebocadas, com exceção da cozinha, cujas paredes se encontram em bloco de cimento; os pavimentos das divisórias foram cimentados e colocada tijoleira.”, obras com um valor não concretamente apurado, mas sempre inferior a € 9.122,58. VIII. Por outro lado, ficou também provado que os Executados cimentaram ainda o acesso à habitação, obra essa que acarretou um custo que ascenderá a € 1.373,50, conforme decorre da prova pericial realizada. IX. Com relevância para o presente, ficou também provado na sentença em crise que as obras descritas: - “…encontram-se alicerçadas no pavimento, não sendo possível o seu levantamento do prédio sem detrimento deste ou daquelas”; - “…evitaram a deterioração do prédio; Bem como aumentaram o seu valor em quantia não concretamente apurada mas inferior à soma dos valores referidos em 9 e 11”. - “As obras referidas em 8 e 10 visaram permitir a utilização da habitação aos fins a que se destinava, aos quais eram necessárias”. - vide factos provados sob os pontos 12 a 15 da sentença. X. Não obstante a aludida factualidade considerada como provada, o Tribunal “a quo” julgou os embargos improcedentes, desde logo, com fundamento no entendimento de que os embargos, com fundamento em benfeitorias, não são legalmente admissíveis, pois tendo a Embargante M. C. assumido as funções de cabeça de casal no inventário instaurado por óbito de A. D., falecida em -.01.1999, aí deveria ter relacionado as mesmas como passivo e reclamar o seu pagamento, estando-lhe vedada a possibilidade de reclamar indemnização por benfeitorias em sede de oposição à execução para entrega de coisa certa. Salvo o devido respeito, que é muito, tal entendimento não se poderá manter. XI. Desde logo, como resulta da matéria de facto dada como verificada, as benfeitorias dadas como provadas foram realizadas pelos Embargantes em data não concretamente apurada, mas ficou provado que foram realizadas após o óbito da Inventariada – vide ponto 8 e seguintes dos factos provados. XII. Estabelece o artigo 2068º do CC que “a herança responde pelas despesas com o funeral e sufrágios do seu autor, pelos encargos com a testamentária, administração e liquidação do património hereditário, pelo pagamento das dívidas, e pelo cumprimento dos legados.” XIII. Este artigo trata especificamente da enumeração das dívidas que são da responsabilidade da herança (que recaem sobre os bens deixados pelo falecido). XIV. No passivo da herança compreendem-se as dívidas do de cuius existentes à data da sua morte e certas despesas posteriores relacionadas com o falecimento ou com a administração e liquidação do seu património. XV. Por exemplo, as despesas do funeral e o sufrágio do seu autor surgem após a morte, mas estão intimamente relacionados com os fins do próprio defunto. Os encargos com a testamentária, a administração e a liquidação do património hereditário também surgem após a morte. Mas constituem encargos da própria herança e, por isso, por eles devem responder. XVI. Escrevem Pires de Lima e A. Varela em anotação ao artigo 2068º do CC, depois de considerarem que esta disposição legal trata especificamente da enumeração das dívidas da herança e que nele se consagra uma dualidade de situações: “ao lado do pagamento das dívidas do falecido, em que há uma verdadeira sucessão nas relações creditórias de que o de cuius era titular passivo, surge o cumprimento dos legados (....) e ainda as despesas, também de duas espécies e de igual modo nascidas ou constituídas depois de expirada a vida do finado: primeiro, as despesas com o funeral e sufrágios do autor da herança; depois, as despesas com a testamentária e com a administração e liquidação do património hereditário....” XVII. Mas aí não se incluem as benfeitorias feitas em bens da herança após o falecimento do inventariado. XVIII. De facto, nada justifica que no inventário se relacionem benfeitorias feitas após o óbito em prédios da herança, quer sejam feitas pelos herdeiros quer por outras pessoas alheias à herança. XIX. A herança responde, além do mais, pelo pagamento das dívidas do falecido, ou seja, as contraídas em vida pelo autor da herança. Ora, as benfeitorias realizadas após a morte não podem ser consideradas dívidas do falecido. XX. Pelos encargos posteriores ao falecimento, a herança apenas responde pelas despesas referidas no citado artigo 2068º do CC, existindo uma grande diferença entre as dívidas contraídas antes e depois do falecimento. As primeiras são dívidas da herança, pois se tratam de relações jurídicas patrimoniais da titularidade do falecido e existentes à data da morte; o mesmo não sucede, naturalmente, com as outras. XXI. O processo de inventário destina-se a pôr termo à comunhão hereditária ou a relacionar os bens que constituem objeto de sucessão e que devam ser partilhados entre os herdeiros. XXII. No caso em apreço ficou provado que os Executados/Embargantes e a sua família desde há mais de 30 anos que habitam no prédio urbano identificado e usufruem do prédio rústico que constitui o seu logradouro, o que sempre fizeram com a permissão da falecida e inventariada A. D., com a qual coabitaram até ao seu óbito, ocorrido em -.01.1999, tendo após o decesso permanecido na habitação e logradouro, o que sucede até ao presente, e também foi após o óbito que realizaram diversas obras na habitação, nomeadamente as paredes das divisórias foram cerzitadas, areadas e rebocadas, com excepção da cozinha, cujas paredes se encontram em bloco de cimento, os pavimentos das divisórias foram cimentados e colocada tijoleira, obras com um valor não concretamente apurado, mas sempre inferior a € 9.122,58, tendo ainda cimentado o acesso à habitação, cujo custo ascenderá a € 1.373,50. XXIII. Também ficou provado que as obras descritas e provadas encontram-se alicerçadas no pavimento, não sendo possível o seu levantamento do prédio sem detrimento deste ou daquelas, evitaram a deterioração do prédio, e aumentaram o seu valor em quantia não concretamente apurada, mas inferior à soma dos valores referidos, e provado também que tais obras visaram permitir a utilização da habitação aos fins a que se destinava, aos quais eram necessárias. XXIV. Ora, em processo de inventário devem ser relacionadas e descritas as benfeitorias feitas em vida do inventariado, havendo apenas que ter em consideração, quanto ao passivo, o de carácter excecional (art.º 2068º CC), as obrigações do falecido existentes à data da sua morte. XXV. Assim, as benfeitorias realizadas por terceiros, ou mesmo por um herdeiro, em bens da herança, após o óbito do inventariado, constituem matéria alheia ao inventário e, por isso, não devem ser relacionadas como passivo da herança, pois não são dívidas da herança, pelo que não devem como tal ser relacionadas. XXVI. Consequentemente apenas relevam para efeitos de inventário as benfeitorias realizadas em vida do autor da herança, pelo que só estas devem ser relacionadas. XXVII. Logo, contrariamente ao defendido na decisão em crise, resultando provado que as benfeitorias foram realizadas após o óbito, a cabeça de casal e Embargante M. C. não só não estava obrigada a relacioná-las no processo de inventário como tal relacionação seria legalmente inadmissível. XXVIII. Neste sentido, vide Ac. do TRL, datado de 24.05.2005, proferido no processo 10145/2004-7, de cujo sumário resulta o seguinte: “1) As benfeitorias realizadas por terceiros, ou mesmo por um herdeiro, em bens da herança, em data posterior ao falecimento do “de cuius”, constituem matéria alheia ao inventário e, por isso, não devem ser relacionadas como passivo da herança. 2) Apenas relevam para efeitos de inventário as benfeitorias realizadas em vida do autor da herança, pelo que só estas devem ser relacionadas.” XXIX. Por outro lado, tratando-se de benfeitorias realizadas após o óbito da inventariada, como ficou provado que o foram, também os benfeitorizantes não deverão ser considerados como de má-fé, não havendo qualquer matéria de facto provada que aponte ou indicie nesse sentido. XXX. Pelo contrário, do cotejo dos elementos dos autos resulta que os benfeitorizantes executaram as benfeitorias de boa-fé, pois está provado que os Executados/Embargantes e a sua família desde há mais de 30 anos que habitam no prédio urbano identificado e usufruem do prédio rústico que constitui o seu logradouro, o que sempre fizeram com a permissão da falecida e inventariada A. D., com a qual coabitaram até ao seu óbito, ocorrido em 21.01.1999, tendo após o decesso permanecido na habitação e logradouro, o que sucede até ao presente, e também foi após o óbito que realizaram diversas obras na habitação, nomeadamente as paredes das divisórias foram cerzitadas, areadas e rebocadas, com exceção da cozinha, cujas paredes se encontram em blocos de cimento, os pavimentos das divisórias foram cimentados e colocada tijoleira, ficando ainda provado que as obras descritas encontram-se alicerçadas no pavimento, não sendo possível o seu levantamento do prédio sem detrimento deste ou daquelas, evitaram a deterioração do prédio, e aumentaram o seu valor em quantia não concretamente apurada, mas inferior à soma dos valores referidos, e provado também que tais obras visaram permitir a utilização da habitação aos fins a que se destinava, aos quais eram necessárias. XXXI. Como resulta da descrição das obras efetuadas, as benfeitorias em causa foram necessárias, destinadas a conferir à habitação um mínimo de condições de habitabilidade que, ainda assim, se consideram primitivas segundo um critério de senso comum e normalidade da vida, pois limitaram-se a cerzitar, arear e rebocar as paredes divisórias da habitação, estando a cozinha ainda em blocos de cimento, colocação cimento e tijoleira nos pavimentos das divisórias, e ainda cimentaram o acesso à habitação, o que bem demonstra a necessidade e essencialidade de tais obras para criar mínimas condições de habitabilidade e conforto, e que conduzem à conclusão de tais obras foram executadas de boa-fé. XXXII. Quanto ao entendimento, vertido na decisão em crise, de que os Embargantes não provaram que houvessem despendido qualquer quantia nas obras mencionadas em 8 e 10 dos factos provados, salvo o devido respeito, tal prova em nada releva para a fixação de indemnização por benfeitorias, pois já se encontra provado que foram os Embargantes que realizam as obras, e o valor das mesmas encontra-se provado através da prova pericial realizada. XXXIII. A indemnização por benfeitorias não depende da prova efetiva do dispêndio de determinada quantia monetária, pois, em bom rigor, as obras em causa até poderiam ter sido executadas com recurso a mão de obra disponibilizada pelos próprios Embargantes/Executados, atenta a sua humilde e parca condição económica e social, e o valor a ressarcir pelas benfeitorias necessárias a que o possuidor tem direito, por as ter realizado e não as poder levantar sem detrimento da coisa, como é o caso, corresponderá ao acrescento que as benfeitorias trazem ao património do enriquecido. XXXIV. A diferença entre a situação atual do beneficiado e a situação (hipotética) em que ele se encontraria se as benfeitorias não tivessem sido realizadas, é apenas um dos limites a que se recorre para o cálculo do valor a ressarcir pelas benfeitorias necessárias que não podem ser levantadas. XXXV. No caso concreto, de acordo com as perícias realizadas e a matéria de facto dada como provada, ficou demonstrado que, após o óbito da inventariada, os Embargantes realizaram, na habitação, as seguintes obras: - as paredes das divisórias foram cerzitadas, areadas e rebocadas, com exceção da cozinha cujas paredes se encontram em bloco de cimento, e colocação cimento e tijoleira nos pavimentos das divisórias e que tais obras têm um valor não concretamente apurado, mas sempre inferior a € 9.122,58. XXXVI. Nesta temática, a sentença em crise, para considerar provado que tais obras executadas têm um valor não concretamente apurado, mas sempre inferior a € 9.122,58, socorreu-se do relatório pericial coletivo, apresentado nos autos em 21.09.2020, que considera aquele como o valor global para a edificação das paredes em blocos de cimento, devidamente cerzitadas, areadas e rebocadas, a construção da cobertura em estrutura de madeira, ripas em madeira e telha em cerâmica, com lage aligeirada de teto, construída por vigotas, tijoleira, malha de aço e betão, e engloba também o valor da execução do pavimento em cimento e tijoleira. XXXVII. Daí que, considerando que apenas ficou provado que os Executados, de entre as obras às quais corresponde o valor global de € 9.122,58, apenas cerzitaram, arearam e rebocaram as paredes das divisórias foram, com exceção da cozinha, e colocaram cimento e tijoleira nos pavimentos das divisórias, aquela perícia não discriminou o valor concreto destas obras, daí a resposta dada a tal matéria de facto. XXXVIII. Contudo, nesta parte, deveria o Tribunal a quo ter-se socorrido do resultado da primeira perícia, realizada em modo singular (conforme relatório apresentado nos autos em 12.04.2019), segundo a qual o valor da execução de paredes em blocos de cimento, cerzitadas, areadas e rebocadas, ascende ao valor de 4.400,00 €, e a execução do pavimento em cimento e tijoleira ascende ao valor de 1.300,00 €. XXXIX. E com recurso ao resultado da primeira perícia realizada, deverá alterar-se a resposta dada à matéria de facto dada como provada sob o ponto 9, o qual deverá considerar-se provado com a seguinte redação: O custo das obras referidas em 8 ascende ao valor de € 5.700,00. XL. Sem prejuízo do exposto, para o caso de assim não se entender, deverá, na procedência dos embargos e com vista ao efetivo apuramento do valor das benfeitorias descritas em 8 dos factos provados, ordenar-se que o processo baixe novamente à 1ª instância a fim dos peritos concretizarem o valor de tais obras e ser proferida sentença em conformidade com os valores que vierem a ser atribuídos a tais benfeitorias. XLI. Por outro lado, ficou ainda provado que os Executados cimentaram o acesso à habitação, obra a que corresponde um custo de € 1.373,50 – vide pontos 10 e 11 dos factos provados. XLII. Mais ficou provado que as referidas obras encontram-se alicerçadas no pavimento, não sendo possível o seu levantamento do prédio sem detrimento deste ou daquelas, evitaram a deterioração do prédio, e aumentaram o seu valor, e visaram permitir a utilização da habitação aos fins a que se destinava, aos quais eram necessárias. XLIII. Assim, estão preenchidos os pressupostos e provados os factos necessários à fixação de indemnização, por benfeitorias, a favor dos Executados/Embargantes. XLIV. A sentença recorrida efetuou uma errada aplicação do direito aos factos considerados provados, violando, entre outros, o artigo 860º do CPC e artigo 2068º do CC. XLV. Termos em que deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que em face da factualidade considerada provada pelo Tribunal “a quo”, e na procedência da alteração da resposta dada à matéria de facto constante do ponto 9, julgue procedente os embargos e, em consequência: a) Julgue admissíveis os presentes embargos (art. 860º n.º 1 CPC), com fundamento em benfeitorias a que os Executados/Embargantes têm direito; b) Condene os Embargados/Exequentes, atenta a matéria de facto considerada provada nos pontos 7 a 15 da sentença, com a alteração reivindicada quanto à resposta dada à matéria de facto constante do ponto 9, a pagar aos Executados/Embargantes, a título de indemnização pelas benfeitorias por estes realizadas nos imóveis cuja entrega é peticionada, a quantia global de € 7.073,50 (sete mil e setenta e três euros e cinquenta cêntimos) assim apurada: - a quantia de € 4.400,00 (quatro mil e quinhentos euros) correspondente ao custo da execução de paredes em blocos de cimento, cerzitadas, areadas e rebocadas, com exceção da cozinha; - a quantia de € 1.300,00 (mil e trezentos euros) correspondente ao custo da execução do pavimento em cimento e tijoleira; - a quantia de € 1.373,50 (mil trezentos e setenta e três euros e cinquenta cêntimos), corresponde ao custo da cimentação do acesso à habitação; c) Reconhecer aos Executados/Embargantes o direito de retenção sobre os imóveis cuja entrega se peticiona até que seja pago o valor de € 7.073,50 (sete mil e setenta e três euros e cinquenta cêntimos), correspondente ao valor das benfeitorias constantes dos pontos 8 e 10 dos factos provados. XLVI. Sem prejuízo do exposto, caso se venha a entender que as perícias realizadas não dão cabal resposta quanto ao valor das obras provadas e descritas no ponto 8 dos factos provados, deverá ser julgado procedente o presente recurso, e com vista ao apuramento do quantum indemnizatório relativo a tais obras, deverá anular-se a decisão proferida sobre o ponto factual 9, a fim de vir a ser reponderada pela 1ª instância sobre o mesmo e suprida tal resposta. TERMOS EM QUE, CONCEDENDO PROVIMENTO AO RECURSO, FARÃO VOSSAS EXCELÊNCIAS A HABITUAL JUSTIÇA. * Foram apresentadas contra-alegações, nas quais se finalizou com a apresentação das seguintes conclusões: a) - Não assiste razão à Recorrente quanto à pretendida manutenção da suspensão da execução. b) - O recurso interposto pela Embargante, não se enquadrando em nenhuma das situações previstas no artigo 647º, n.º 3 do Código de Processo Civil, tem efeito meramente devolutivo. c) - manter a execução suspensa até ao trânsito em julgado da douta decisão do Tribunal a quo equivaleria a conferir efeito suspensivo ao recurso, ao arrepio do disposto no 647º do Código de Processo Civil. d) - o artigo 860º, n.º 3 do Código de Processo Civil é claro ao afirmar que, no caso de execução fundada em sentença, a oposição com fundamento em benfeitorias não é admitida quando o executado não tenha oportunamente feito valer o seu direito a elas. e) - Neste sentido, a Embargante, não o tendo feito no inventário, não podia vir invocar tais benfeitorias em sede de oposição à execução. f) - De acordo com o artigo 1345º, n.º 5, 2ª parte do Código de Processo Civil revogado pela Lei n.º 41/2013 de 26 de Junho, aplicável ao inventário em causa, as benfeitorias efectuadas por terceiros em prédio da herança são descritas na relação de bens como dívidas, quando não possam ser levantadas por quem as realizou. g) -Tal norma não opera qualquer distinção entre benfeitorias realizadas antes do óbito do de cujus ou realizadas após esse evento, relevando apenas que as mesmas tenham sido efectuadas em prédio da herança. h) - Se as benfeitorias não são dívidas da herança, questiona-se de quem sejam. i) - A Embargante podia perfeitamente fazer valer o seu alegado direito em sede de inventário, e não o fez. j) - As alegadas benfeitorias não foram realizadas em vida da Inventariada, sendo assim irrelevante que a mesma tenha permitido à Embargante residir no local, k) - Não podendo, por essa razão, considerar-se que as benfeitorias tenham sido efectuadas de boa fé. 1) - A Embargante não alegou como foram pagas as benfeitorias ou se as mesmas foram executadas com mão de obra disponibilizada pelos próprios. m) - Sem prejuízo da inadmissibilidade dos embargos com fundamento em benfeitorias, andou bem o Tribunal a quo ao considerar que não estão preenchidos os requisitos para a indemnização e o direito de retenção invocados pela Embargante. NESTES TERMOS E nos demais que Vossas Excelências doutamente suprirão será feita JUSTIÇA * A Exmª Juiz a quo proferiu despacho a admitir o recurso interposto, providenciando pela sua subida a este Tribunal. * Facultados os vistos aos Exmºs Adjuntos e nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir.* 2 – QUESTÕES A DECIDIRComo resulta do disposto no art. 608º/2, ex. vi dos arts. 663º/2, 635º/4, 639º/1 a 3 e 641º/2, b), todos do CPC, sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex officio, este Tribunal só poderá conhecer das que constem nas conclusões que, assim, definem e delimitam o objecto do recurso. Assim, consideradas as conclusões formuladas pela apelante - a executada/embargante -, esta pretende: - se altere a resposta dada à matéria de facto dada como provada sob o ponto 9., o qual deverá ter a seguinte redacção: O custo das obras referidas em 8 ascende ao valor de € 5.700,00 (cfr. conclusão XXXIX das alegações); - que seja reapreciada a decisão de mérito da acção. * 3 – OS FACTOS A) Factos provados: Discutida a causa, com relevo para a decisão a proferir, resultou provada a seguinte matéria de facto: 1. M. L. e J. D. instauraram a execução de que estes autos são apenso, contra A. C. e M. C. destinada à entrega dos seguintes prédios: a) - prédio urbano em propriedade total sem andares nem divisões susceptíveis de utilização independente, designado por casa de um pavimento e quatro dependências, destinada a habitação, sita no lugar …, freguesia de ..., concelho de Barcelos, inscrita na matriz predial urbana sob o n.º .., descrita na competente Conservatória do Registo Predial sob o n.º …, a confrontar do norte com caminho público, do sul com M. S., do nascente com caminho público e do poente com F. P.; b) - prédio rústico designado por cultura e olivais, sito no lugar …, freguesia de ..., concelho de Barcelos, inscrito na matriz predial rústica sob o n.º …, não descrito na Conservatória do Registo Predial, a confrontar do norte com estrada, do sul com F. P., do nascente com M. S. e do poente com F. P.. 2. Fundaram a sua pretensão na sentença homologatória da partilha proferida, no dia 03/06/2009, no âmbito do processo de Inventário que correu termos sob o n.º 109/07.0TBBCL, pelo extinto 4º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Barcelos, no âmbito do qual lhes foram adjudicados 19/20 dos prédios referidos em 1, prédios esses dos quais já eram comproprietários dos restantes 1/20. 3. O processo de Inventário referido em 2. foi instaurado por óbito de A. D., falecida em -/01/1999, e com última residência na Rua …, n.º …, freguesia de .... 4. Os Executado(a)(s) e sua família, há mais de 30 anos, habitam no prédio urbano identificados em 1. e usufruem do prédio rústico, que constitui o seu logradouro; 5. Com a permissão da falecida inventariada A. D., enquanto proprietária de 19/20 de cada um dos imóveis reivindicados; 6. A qual até ao seu óbito (ocorrido em -.01.1999), coabitou com os Executados e sua família; 7. Tendo os Executados, após o indicado óbito, permanecido na dita habitação e logradouro, o que sucede até ao presente. 8. Após o óbito da inventariada, em data não concretamente apurada, os Embargantes realizaram as seguintes obras na habitação referida em 1. a): - as paredes das divisórias foram cerzitadas, areadas e rebocadas, com excepção da cozinha cujas paredes se encontram em bloco de cimento; - os pavimento das divisórias foram cimentados e colocada tijoleira. 9. O custo das obras referidas em 8 ascenderá a valor não concretamente apurado, mas sempre inferior a €9.122,58. 10. Os Executados cimentaram ainda o acesso à habitação. 11. O custo da obra referida em 10 ascenderá a €1.373,50. 12. As obras referidas em 8 e 10, encontram-se alicerçadas no pavimento, não sendo possível o seu levantamento do prédio sem detrimento deste ou daquelas; 13. As obras referidas em 8 e 10 evitaram a deterioração do prédio; 14. Bem como aumentaram o seu valor em quantia não concretamente apurada mas inferior à soma dos valores referidos em 9 e 11. 15. As obras referidas em 8 e 10 visaram permitir a utilização da habitação aos fins a que se destinava, aos quais eram necessárias. 16. No prédio urbano, destinado à habitação, residiam, à data da apresentação dos presentes Embargos de Executado, os Executados/ Embargantes, um filho, C. C., e um neto, C. A., num total de quatro pessoas. 17. O Embargante/ Executado A. C. faleceu no dia - de Março de 2015. 18. A executada M. C. é uma pessoa de parca formação, não sabendo ler nem escrever, não labora, e apenas aufere mensalmente a pensão por velhice de 259,36€; 19. O filho C. C. encontra-se reformado por invalidez, auferindo uma pensão por invalidez de €217,17 a que acresce um complemento por dependência de 99,77€. 20. O neto dos Executados, C. A., auferia, à data da apresentação dos Embargos de Executado, o salário de €485,00. 21. A Embargante M. C. desempenhou no âmbito do processo de inventário referido em 2, as funções de cabeça de casal; 22. Tendo aí apresentado a relação de bens, por requerimento de 19 de Abril de 2007, da qual fez constar, como verbas n.º 2 e n.º 3, 19/20 dos prédios referidos em 1. a) e b), respectivamente. 23. Nessa relação de bens não foi descrito qualquer passivo, designadamente, quaisquer benfeitorias realizadas nos prédios que constituíam as verbas n.º 2 e n.º 3. 24. Na diligência de declarações complementares de cabeça de casal realizada, em 20 de Abril de 2007, no âmbito do processo de inventário referido em 2, a cabeça de casal (ora Embargante M. C.) declarou que a inventariada, sua irmã, A. D. faleceu sem deixar passivo a partilhar e que os bens a partilhar são os que constam da relação de bens já junta aos autos 25. Nesses autos de inventário, na sequência de uma reclamação à relação de bens, a cabeça de casal, ora Embargante, apresentou, em 10/10/2008, nova relação de bens, no âmbito da qual não foi descrito qualquer passivo. 26. Nesses autos de inventário, a cabeça de casal, ora Embargante, apresentou, em 27/10/2008, requerimento de forma à partilha, no âmbito do qual menciona que «Não foi descrito passivo (…)». 27. Ao longo do processo de inventário referido em 2. nunca a ora Embargante fez menção a benfeitorias que houvessem sido realizadas nos prédios referidos em 1. a) e b). * B) Factos não provados:Não se provaram outros factos com relevo para a decisão da causa, designadamente: a) - que os próprios Exequentes, enquanto proprietários de 1/20 dos mesmos prédios, houvessem consentido em que os Embargantes residissem e fruíssem os imóveis referidos em 1; b) Que desde há mais de 30 anos e até ao presente, os Executados realizaram diversas benfeitorias necessárias à conservação do prédio urbano, que evitaram e visaram evitar a sua deterioração, como também aumentaram o valor efectivo, real e venal desse prédio, concretamente, que: - os Executados houvessem remodelado e ampliado a habitação, tendo transformado cobertos destinados ao acolhimento de animais em divisórias destinadas à habitação; - e que para o efeito, edificaram paredes em blocos de cimento; bem como procederam à construção da cobertura com cimento e telhas; dotaram a habitação com várias divisórias; dotaram a habitação de instalação elétrica, abastecimento de água e escoamento de águas pluviais; c) - que os Executado(a)(s) houvessem pago as obras que realizaram e que se deram por provadas sob os n.ºs 8 e 10 dos factos provados e que tivessem despendido com as mesmas a quantia de 30.000,00 € (trinta mil euros); d) – que os Executados com as obras destinadas a cimentar o acesso à habitação, houvessem despendido cerca de 2.500,00 € (dois mil e quinhentos euros). * C) Motivação de facto:Os factos que se mostram provados resultam da análise crítica e conjugada de toda a prova produzida em audiência de julgamento, à luz das regras da experiência comum e do normal suceder, tendo sempre presente as regras da distribuição do ónus da prova. Quanto aos factos provados: A matéria ínsita nos n.ºs 1 e 2 resultam do cotejo do requerimento executivo, da certidão da sentença oferecida à execução, bem como da consulta do processo de Inventário que correu termos sob o n.º 109/07.0TBBCL, pelo extinto 4º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Barcelos, nomeadamente da relação de bens aí apresentada, da acta da conferência de interessados e do mapa final da partilha. Já os factos sob os n.ºs 3, 21 a 27 mostram-se patenteados no mencionado Processo de Inventário, concretamente nas peças processuais de que se ordenou fosse extraída certidão. A circunstância de os Embargantes e sua família habitarem o prédio urbano referido em 1 a) e usufruírem também do prédio rústico referida em 1 b), há mais de 20 anos, com permissão da inventariada, que com eles coabitou até ao seu decesso – matéria ínsita nos n.ºs 4 a 6 – foi confirmada pelo Embargante/habilitado L. M., tendo as suas declarações sido, neste conspecto, corroboradas pela testemunha arrolada pelos Exequentes/Embargado(a)(s) M. F.. Relativamente às obras que os Embargantes alegam ter feito, a expensas suas, nos prédios adjudicados aos Exequentes, as declarações de parte do Embargante/habilitado L. M. foram muito pouco consistentes. Com efeito, o filho dos Embargantes revelou dificuldades em precisar em concreto que obras foram realizadas na habitação, sendo que as únicas a que fez menção com maior assertividade foram as respeitantes ao revestimento das paredes que antes se encontravam em tijolo, à alegada colocação de um telhado e à colocação de pavimento de tijoleira. De todo o modo, o filho dos Embargantes não foi capaz de situar a data aproximada da realização dessas alegadas obras, ora dizendo que foram realizadas antes do falecimento da inventariada, ora mencionando já que foram posteriores ao seu decesso. Note-se ainda que o declarante chegou a afirmar que foi feito um pavimento em cimento há 5 ou 6 anos, mas, ao mesmo passo, referiu que todas as obras foram feitas antes das partilhas, quando estas comprovadamente foram realizadas há mais de 10 anos (veja-se a data da sentença homologatória das partilhas e do acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães que a confirmou, datado de 29/03/2011 de que se ordenou fosse extraída certidão e junta a estes autos). Assim, no que se refere às obras levadas a cabo pelos Embargantes, a convicção do Tribunal foi alcançada pelo joeirar do depoimento da testemunha dos Embargados e do seu confronto com o teor do relatório pericial (resultado da perícia colegial produzida nestes autos). Vejamos. A testemunha M. F. afiançou que é vizinho dos Embargantes e que conhece a casa em questão desde criança, acrescentando ainda que conhecia muito bem a inventariada, por terem idades próximas, e que, inclusivamente, chegou a levá-la várias vezes à casa de saúde. A testemunha afirmou também que a inventariada A. D. esteve emigrada em França e que na década de 80 fez algumas melhorias na casa. Asseverou ainda a testemunha que trabalhou como avaliador e que, após o falecimento da inventariada A. D., no mês de Setembro subsequente, se deslocou ao prédio em causa nestes autos para avaliar a casa, tendo constatado que, nessa altura, as divisórias “estavam em rústico”, isto é, não se encontravam nem rebocadas nem pintadas; que o corredor era em cimento; que o chão do quarto da inventariada era em soalho e que a entrada a partir do portão tinha má aparência. Deu ainda conta a testemunha que, após essa data, não voltou lá a entrar. Ora, compulsado o relatório apresentado pelos Sr.s Peritos, é possível surpreender que, efectivamente, na presente data, as paredes das divisórias encontram-se cerzitadas, areadas e rebocadas, com excepção da cozinha cujas paredes se encontram em bloco de cimento; todas as divisões têm pavimento em cimento e tijoleira; e o acesso à habitação encontra-se cimentado. Assim, não havendo qualquer razão para duvidar do depoimento da testemunha M. F., que nos pareceu isento e merecedor de credibilidade, é manifesto, no cotejo com o relatório pericial, que as obras a que aludimos terão sido realizadas após o óbito da inventariada (desconhecendo-se, todavia, se o foram antes ou após a sentença de partilha em execução nestes autos). E se assim foi, como se nos afigura transparente que terá sido, então no que às mesmas diz respeito, dizem-nos as regras da experiência comum e do normal suceder que apenas poderão ter sido levadas a cabo pelos Embargantes, como afirmado pelo habilitado, pois que foram estes que continuaram a residir na casa após a inventariada falecer. E daí os factos provados sob os n.ºs 8 e 10. Ademais, quanto ao custo a que ascenderá a realização das obras em questão (n.ºs 9 e 11), e bem assim quanto à matéria sob os n.ºs 12 a 15 levou-se em consideração a perícia colegial, pois que se tratam de questões técnicas às quais os Sr.s Peritos se encontram especialmente habilitados a responder. Já quanto à necessidade de realização dessas obras com vista a melhorar as condições de habitabilidade (que são ainda assim muito precárias segundo o relatório social junto aos autos) - n.º 15 – o Tribunal baseou-se essencialmente nas declarações de parte do Embargante/ habilitado, que neste particular se nos afiguram perfeitamente credíveis pois que vão de encontro às regras da experiência comum. A factualidade descrita sob os n.ºs 16, 18, 19 e 20, estribou-se no relatório social junto a estes autos pela SS, em 09/09/2014, sob a ref. 136973479. No que tange à matéria de facto não provada: As respostas restritivas ou negativas que foram dadas resultaram da ausência de prova minimamente segura sobre tal factualidade. Relativamente à al. a) o próprio Embargante/ habilitado, nas suas declarações, afirmou que nem sequer conheciam os Exequentes, seus tios, antes do falecimento da inventariada. Cumpre também destacar que no que tange às demais obras que os Embargantes alegavam ter realizado o seguinte: Desde logo, é inequívoco em face do relatório social que a habitação não foi dotada de várias divisórias (são apenas 3 e um corredor) e não existe escoamento/drenagem de águas pluviais, pelo que tais obras não existiram de todo. Quanto às demais não foi feita prova suficientemente convincente de que tivessem sido os Embargante mesmos a realizá-las, sendo que essas obras sempre poderão ter sido realizadas pela proprietária dos imóveis, a inventariada A. D.. Na verdade, embora o Embargante/ habilitado L. M. houvesse relatado que era a sua mãe, a aqui Embargante, quem custeava todas obras, justificando que a inventariada sua tia não teria condições económicas para as pagar; segundo as suas próprias declarações, os seus pais trabalhavam numa fábrica e faziam jornal, e já quanto à sua tia nada soube acrescentar sobre os rendimentos desta, confirmando tão só que a mesma esteve emigrada e que tinha bouças com pinheiros. Finalmente não lograram os Executado(a)(s)/ Embargantes comprovar que houvessem tido despesas com as obras referidas em 8 e 10 dos factos provados, não tendo sequer o filho destes, ora habilitado, conseguido explicar quem terá executado essas obras, e nem de mencionar qualquer quantia que os Embargantes tivessem pago pelas obras ou que tivessem suportado com a matéria prima necessária à sua realização. Trata-se, portanto, neste ponto, de uma absoluta falta de prova sobre tal materialidade. [transcrição dos autos]. * 4 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO E DE DIREITOApreciemos as questões suscitadas nas conclusões formuladas pela apelante. E fazendo-o, começamos pela questão relativa à alteração da matéria de facto. I) Da alteração da matéria de facto Diverge a apelante da decisão da matéria de facto, pretendendo a alteração da resposta dada à matéria de facto dada como provada sob o ponto 9, o qual deverá considerar-se provado com a seguinte redação: O custo das obras referidas em 8 ascende ao valor de € 5.700,00 (cfr. conclusão XXXIX das alegações). E isto porque entende que o Tribunal a quo se deveria ter socorrido do resultado da primeira perícia, realizada em modo singular (conforme relatório apresentado nos autos em 12.04.2019), segundo a qual o valor da execução de paredes em blocos de cimento, cerzitadas, areadas e rebocadas, ascende ao valor de 4.400,00 €, e a execução do pavimento em cimento e tijoleira ascende ao valor de 1.300,00 € (cfr. conclusão XXXVIII das alegações). Quid iuris? Como decorre do disposto no nº 1 do art. 640º do CPC, a parte que pretenda impugnar a decisão sobre a matéria de facto deve, sob pena de rejeição do recurso, especificar: a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. Ainda em honra dos princípios da cooperação, da lealdade e da boa-fé processuais, que enformam aquele dever, incumbe também à parte recorrente, igualmente sob pena de imediata rejeição do recurso, indicar com exactidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, no caso de os meios probatórios terem sido gravados, como lho impõe a alínea a) do nº 2 daquele art. 640º. A parte recorrida deverá, ainda que sem qualquer cominação se o não fizer, indicar os concretos meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e indicar, com igual exactidão, as passagens da gravação em que se funda, nos termos referidos na alínea b) do nº 2, do mencionado art. 640º. No caso em apreço, apesar da forma pouco clara e insatisfatória como o faz, sem sequer elucidar qual a relevância do facto em causa para a apreciação do mérito da causa (v.g., indicando qual o tema da prova em causa), consideramos que se mostram minimamente cumpridos todos os ónus impostos pelo art. 640º do CPC (cfr. as três alíneas do n.º 1), pois a apelante indica o concreto ponto de facto que considera incorrectamente julgado (o art. 11º da contestação), os concretos meios probatórios que concorrem para a motivação (os documentos nºs 1 a 4, juntos com a contestação) e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre a questão de facto impugnada (o ponto de facto a aditar deve ter a seguinte formulação: a R. padece de doenças graves, sendo doente oncológica e padecendo de doença autoimune, com recurso a sequentes consultas de especialidade). Cumpre, pois, apreciar. O art. 662º do actual CPC regula a reapreciação da decisão da matéria de facto de uma forma mais ampla que o art. 712º do anterior Código, configurando-a praticamente como um novo julgamento. Assim, a alteração da decisão sobre a matéria de facto é agora um poder vinculado, verificado que seja o circunstancialismo referido no nº 1, quando os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. A intenção do legislador foi, como fez constar da “Exposição de Motivos”, a de reforçar os poderes da Relação no que toca à reapreciação da matéria de facto. Assim, mantendo-se os poderes cassatórios que permitem à Relação anular a decisão recorrida, nos termos referidos na alínea c), do nº 2, e sem prejuízo de se ordenar a devolução dos autos ao tribunal da 1ª. Instância, reconheceu à Relação o poder/dever de investigação oficiosa, devendo realizar as diligências de renovação da prova e de produção de novos meios de prova, com vista ao apuramento da verdade material dos factos, pressuposto que é de uma decisão justa. As regras de julgamento a que deve obedecer a Relação são as mesmas que devem ser observadas pelo tribunal da 1ª Instância: tomar-se-ão em consideração os factos admitidos por acordo, os que estiverem provados por documentos (que tenham força probatória plena) ou por confissão, desde que tenha sido reduzida a escrito, extraindo-se dos factos que forem apurados as presunções legais e as presunções judiciais, advindas das regras da experiência, sendo que o princípio basilar continua a ser o da livre apreciação das provas, relativamente aos documentos sem valor probatório pleno, aos relatórios periciais, aos depoimentos das testemunhas, e agora inequivocamente, às declarações da parte – cfr. arts. 466º/3 e 607º/4 e 5 do CPC, que não contrariam o que acerca dos meios de prova se dispõe nos arts. 341º a 396º do CC. Deste modo, é assim inequívoco que a Relação aprecia livremente todas as provas carreadas para os autos, valora-as e pondera-as, recorrendo às regras da experiência, aos critérios da lógica, aos seus próprios conhecimentos das pessoas e das coisas, socorrendo-se delas para formar a sua convicção. Provar significa demonstrar, de modo que não seja susceptível de refutação, a verdade do facto alegado. Nesse sentido, as partes, através de documentos, de testemunhas, de indícios, de presunções etc., demonstram a existência de certos factos passados, tornando-os presentes, a fim de que o juiz possa formar um juízo, para dizer quem tem razão. Como dispõe o art. 341º do CC, as provas têm por função a demonstração da realidade dos factos. E, como ensina Manuel de Andrade (2), aquele preceito legal refere-se à prova “como resultado”, isto é, “a demonstração efectiva (…) da realidade dum facto – da veracidade da correspondente afirmação”. Não se exige que a demonstração conduza a uma verdade absoluta (objetivo que seria impossível de atingir) mas tão-só a “um alto grau de probabilidade, suficiente para as necessidades práticas da vida”. Quem tem o ónus da prova de um facto tem de conseguir “criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto”, como escreve Antunes Varela (3). O julgador, usando as regras da experiência comum, do que, em circunstâncias idênticas normalmente acontece, interpreta os factos provados e conclui que, tal como naquelas, também nesta, que está a apreciar, as coisas se passaram do mesmo modo. Como ensinou Vaz Serra (4) “ao procurar formar a sua convicção acerca dos factos relevantes para a decisão, pode o juiz utilizar a experiência da vida, da qual resulta que um facto é a consequência típica de outro; procede então mediante uma presunção ou regra da experiência, ou de uma prova de primeira aparência”. Ou seja, o juiz, provado um facto e valendo-se das regras da experiência, conclui que esse facto revela a existência de outro facto. O juiz aprecia livremente as provas e decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto – cfr. art. 607º/5 do CPC, cabendo a quem tem o ónus da prova “criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto”, como refere Antunes Varela (5). Se se instalar a dúvida sobre a realidade de um facto e a dúvida não possa ser removida, ela resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita, de acordo com o princípio plasmado no art. 414º do CPC, que, no essencial, confirma o que, sobre a contraprova, consta do art. 346º do CC. De acordo com o que acima ficou exposto, cumpre, pois, reapreciar a prova e verificar se dela resulta, com o grau de certeza exigível para fundamentar a convicção, o que a apelante pretende neste recurso. * Como já referido supra, pretende a apelante que seja alterada a resposta dada à matéria de facto dada como provada sob o ponto 9, o qual deverá considerar-se provado com a seguinte redação: O custo das obras referidas em 8 ascende ao valor de € 5.700,00. Isto porque entende que o Tribunal a quo se deveria ter socorrido do resultado da primeira perícia, realizada em modo singular (conforme relatório apresentado nos autos em 12.04.2019), segundo a qual o valor da execução de paredes em blocos de cimento, cerzitadas, areadas e rebocadas, ascende ao valor de 4.400,00 €, e a execução do pavimento em cimento e tijoleira ascende ao valor de 1.300,00 €.Ora, como é sabido, A segunda perícia não é uma nova perícia. A segunda perícia, dado que tem por objecto a averiguação dos mesmos factos sobre que incidiu a primeira e por finalidade a correcção da eventual inexactidão dos resultados desta, é, simplesmente, a repetição da primeira (artº. 487º, nº. 3 do NCPC). A segunda perícia não invalida a primeira, não a substitui, não exerce sobre ela o papel de recurso da primeira, subsistindo ambas, lado a lado, submetidas ao princípio da livre apreciação da prova, que permite ao Tribunal preferir o resultado da primeira em relação ao da segunda (6). In casu, o Tribunal a quo preferiu o resultado da segunda, como claramente resulta da motivação de facto: Assim, no que se refere às obras levadas a cabo pelos Embargantes, a convicção do Tribunal foi alcançada pelo joeirar do depoimento da testemunha dos Embargados e do seu confronto com o teor do relatório pericial (resultado da perícia colegial produzida nestes autos). (…) Ora, compulsado o relatório apresentado pelos Sr.s Peritos, é possível surpreender que, efectivamente, na presente data, as paredes das divisórias encontram-se cerzitadas, areadas e rebocadas, com excepção da cozinha cujas paredes se encontram em bloco de cimento; todas as divisões têm pavimento em cimento e tijoleira; e o acesso à habitação encontra-se cimentado. (…) Ademais, quanto ao custo a que ascenderá a realização das obras em questão (n.ºs 9 e 11), e bem assim quanto à matéria sob os n.ºs 12 a 15 levou-se em consideração a perícia colegial, pois que se tratam de questões técnicas às quais os Sr.s Peritos se encontram especialmente habilitados a responder. Opção que a recorrente não põe em causa, nem contesta a interpretação que o Tribunal a quo dela fez, quanto à matéria de facto provada e não provada, aceitando os demais factos cuja motivação nela (segunda perícia) se estriba. Logo, revela-se incoerente a sua pretensão, pois a perícia que é boa para fundamentar os demais factos que nele se baseiam, só não será para este facto cuja alteração ora pretende e a primeira perícia que anteriormente não serviu para motivar os outros factos, servirá agora só para este. Tudo sem qualquer justificação, pois deveria ela ter efectivado uma concreta e discriminada análise objectiva, crítica, lógica e racional de toda a prova, de sorte a convencer o tribunal ad quem da bondade da sua pretensão. O que não faz. Resultando evidente nos autos, que na motivação da decisão sobre a matéria de facto, o tribunal recorrido elencou de forma clara e exaustiva os seus argumentos. Logo, porque todos os elementos convocados pelo tribunal a quo constam do processo e foram devidamente ponderados, entende-se nada haver aqui a corrigir, decidindo-se pela improcedência da impugnação da matéria de facto. * II) Da reapreciação da decisão de mérito da acçãoFixada a matéria de facto, que não sofreu qualquer alteração depois de se ter examinado a sua reapreciação conforme pretendido na apelação, levando em conta as conclusões do recurso, passemos agora à também pretendida reapreciação da decisão de mérito da acção, pois entende a recorrente que a sentença incorre em erro de julgamento, uma vez que a factualidade considerada provada, por si só, impunha uma diferente solução jurídica, com a consequente procedência dos embargos. Entende o Tribunal a quo na sentença recorrida que os embargos, com fundamento em benfeitorias, não são legalmente admissíveis, pois tendo a Embargante M. C. assumido as funções de cabeça de casal no inventário instaurado por óbito de A. D., falecida em 21.01.1999, aí deveria ter relacionado as mesmas como passivo e reclamar o seu pagamento, estando-lhe vedada a possibilidade de reclamar indemnização por benfeitorias em sede de oposição à execução para entrega de coisa certa. Assentando este entendimento no disposto no art. 860º/3 do CPC, cujo teor é o seguinte: A oposição com fundamento em benfeitorias não é admitida quando, baseando-se a execução em sentença condenatória, o executado não haja oportunamente feito valer o seu direito a elas. A menos que invocassem que apesar das mesmas terem sido realizadas em data anterior à partilha, pois apenas nesse caso gozariam de direito de retenção, não tiveram oportunidade de requerer o seu pagamento no âmbito do processo de inventário. E para o caso de as benfeitorias terem sido posteriores à partilha, os embargos também não seriam legalmente admissíveis, pois os benfeitorizantes devem considerar-se de má fé, o que significa que não teriam, pela sua realização, direito de retenção (a sua admissão reconduzir-se-ia a um pedido reconvencional não permitido em sede de oposição à execução). Acresce que, os Embargantes não provaram sequer que houvessem despendido qualquer quantia com a realização das obras mencionadas em 8 e 10, sendo que essa prova era fulcral para a afirmação do seu direito à compensação pelas benfeitorias em causa. Discordando a recorrida, defende que Existe uma grande diferença entre as dívidas contraídas antes e depois do falecimento, e que As benfeitorias realizadas por terceiros, ou mesmo por um herdeiro, em bens da herança, após o óbito do inventariado, constituem matéria alheia ao inventário e, por isso, não devem ser relacionadas como passivo da herança, pois não são dívidas da herança, pelo que não devem como tal ser relacionadas. Acresce que, tratando-se de benfeitorias realizadas após o óbito da inventariada, como ficou provado que o foram, também os benfeitorizantes não deverão ser considerados como de má-fé, não havendo qualquer matéria de facto provada que aponte ou indicie nesse sentido, até porque ficou provado que as benfeitorias em causa foram necessárias. E Quanto ao entendimento, vertido na decisão em crise, de que os Embargantes não provaram que houvessem despendido qualquer quantia nas obras mencionadas em 8 e 10 dos factos provados, salvo o devido respeito, tal prova em nada releva para a fixação de indemnização por benfeitorias, pois já se encontra provado que foram os Embargantes que realizam as obras, e o valor das mesmas encontra-se provado através da prova pericial realizada. Secundando a sentença recorrida, os recorridos entendem que não lhe assiste razão. Quid iuris? Antecipando desde já a decisão, diremos que não assiste razão à recorrente, pois a sentença do Tribunal a quo que concluiu ser manifesto, que devem improceder os Embargos de Executado assentes na realização de benfeitorias e no suposto direito de retenção dos Embargantes, não merece qualquer reparo. Efectivamente, diga-se, antes de mais, não ser indiferente a data em que as obras em causa foram realizadas, se antes ou depois da partilha ocorrida em 3-06-2009, já que apenas ficou provado que ocorreram após o óbito da inventariada, ocorrida em 21-01-1999. Aliás, como assertivamente se refere na sentença recorrida, em rigor, os Embargantes nem sequer alegaram a data da realização dessas obras, limitando-se na sua p.i. a dizer de forma vaga que fizeram obras «desde há mais de 30 anos e até ao presente». É que, em caso algum poderia ocorrer a procedência da oposição à execução com base na realização de obras sobrevindas em data posterior à partilha, pois, nesse caso, os benfeitorizantes devem considerar-se de má fé, o que significa que não teriam, pela sua realização, direito de retenção (a sua admissão reconduzir-se-ia a um pedido reconvencional não permitido em sede de oposição à execução). Logo, não pode a recorrente dar como assente o que não alegou nem se provou, isto é, que as obras foram realizadas em data anterior à partilha, pelo que, desde logo, os embargos, com fundamento em benfeitorias, deveriam improceder. É que A oposição à execução para entrega de coisa certa com fundamento em benfeitorias só é de aceitar quando estas autorizem a retenção da coisa até ao embolso da sua importância (7). Mas nem na outra hipótese, de as obras terem sido realizadas em data anterior à partilha, os embargos, com fundamento em benfeitorias, poderiam proceder, pois não seriam, in casu, legalmente admissíveis. Tendo-se limitado a recorrente a esgrimir com a questão da grande diferença que existe entre as dívidas contraídas antes e depois do falecimento, lembrando o Ac. da RL de 24-05-2005 proferido no Proc. nº 10145/2004-7, que refere que As benfeitorias realizadas por terceiros, ou mesmo por um herdeiro, em bens da herança, após o óbito do inventariado, constituem matéria alheia ao inventário e, por isso, não devem ser relacionadas como passivo da herança, pois não são dívidas da herança, pelo que não devem como tal ser relacionadas. Ora, nunca foi essa a questão (descrição das benfeitorias como dívidas da herança), pois a decisão recorrida assentou no entendimento do disposto no art. 860º/3 do CPC, cujo teor é o seguinte: A oposição com fundamento em benfeitorias não é admitida quando, baseando-se a execução em sentença condenatória, o executado não haja oportunamente feito valer o seu direito a elas. Sabendo-se que no caso de benfeitorias realizadas por terceiros, ou mesmo por um herdeiro, em bens da herança, têm estes direito ao seu levantamento e, não sendo isso possível, direito a deduzir o respetivo valor pelo valor do benefício que trouxeram ao prédio, segundo as regras do enriquecimento sem causa, é o inventário o lugar próprio para o efeito, caso em que o mapa da partilha contemplará a situação, e não tendo invocado o seu direito a benfeitorias no inventário até ao trânsito em julgado da sentença homologatória do mapa da partilha, não ficam impedidos de vir a invocar e provar esse seu direito por meio adequado e em momento posterior, mas não podem obstar aos efeitos daquela sentença, enquanto título executivo (…) maxime quando pendem já execuções e a elas se não opuseram com os fundamentos previstos no quadro dos art.ºs 813º e 814º (8) do Código de Processo Civil (9). Logo, essas benfeitorias que não possam ser levantadas, deverão figurar na relação de bens mas a sua verba não será tida como efectiva dívida da herança mas como valor dedutível ao acervo dos bens adjudicados ao interessado respectivo, a determinar por avaliação e atento o benefício que trouxeram aos prédios em causa, segundo as regras do enriquecimento sem causa (10). Lembrando-se o regime jurídico estatuído no CPC de 1961 (com as alterações introduzidas pelo DL n.º 227/94, de 08.9 e pelo DL n.º 329-A/95, de 12.12), aplicável à situação dos autos e que não estabelece qualquer distinção entre benfeitorias realizadas antes do óbito do de cujus ou realizadas após esse evento, relevando apenas que as mesmas tenham sido efectuadas em prédio da herança: As benfeitorias pertencentes à herança são descritas em espécie, quando possam separar-se do prédio em que foram realizadas, ou como simples crédito, no caso contrário; as efectuadas por terceiros em prédio da herança são descritas como dívidas, quando não possam ser levantadas por quem as realizou (art.º 1345º, n.º 5 do referido Código). Assim, como bem se conclui na sentença recorrida, assiste razão aos exequentes em face dos factos provados, pois não tendo os Embargantes reclamado o pagamento das benfeitorias que tenham sido realizadas antes das partilhas no âmbito do processo de inventário, quando tiveram oportunidade de o fazer, não lhes é legítimo paralisar a execução para entrega dos imóveis com a invocação dessas benfeitorias e com o seu direito de retenção até ao pagamento do valor destas. Já se nos afigurando duvidoso o argumento, o que é despiciendo e inócuo em face do anteriormente referido, que é bastante para fazer improceder os embargos, que os Embargantes não provaram sequer que houvessem despendido qualquer quantia com a realização das obras mencionadas em 8 e 10. Argumento que se não reitera. E, não ocorrendo a procedência dos embargos, mostra-se prejudicado o conhecimento da pretensão da recorrente que consta da conclusão XL das alegações (E para o caso de assim não se entender, deverá, na procedência dos embargos e com vista ao efetivo apuramento do valor das benfeitorias descritas em 8 dos factos provados, ordenar-se que o processo baixe novamente à 1ª instância a fim dos peritos concretizarem o valor de tais obras e ser proferida sentença em conformidade com os valores que vierem a ser atribuídos a tais benfeitorias), que sempre seria de rejeitar, por extemporânea, pois há muito passou o momento para se reclamar ou pedir esclarecimentos ao relatório pericial. Nenhum reparo sendo de fazer, pois, à apreciação jurídica da causa que consta da sentença recorrida, uma vez que se mostra adequada e correcta face à factualidade apurada e aos normativos aplicáveis. Não merecendo, assim, a sentença do Tribunal a quo qualquer reparo. Improcede, pois, o recurso, com custas a pagar pela recorrente (art. 527º do CPC). * 5 – SÍNTESE CONCLUSIVA (art. 663º/7 CPC) I – O preceituado no art. 640º do CPC em conjugação com o que se dispõe no art. 662º do mesmo diploma legal permite ao Tribunal da Relação julgar a matéria de facto. II – As benfeitorias feitas por terceiros, ou mesmo por um herdeiro, em bens da herança, que não possam ser por eles levantadas deverão figurar na relação de bens, mas a sua verba não será tida como efectiva dívida da herança mas como valor dedutível ao acervo dos bens adjudicados ao interessado respectivo, a determinar por avaliação e atento o benefício que trouxeram aos prédios em causa, segundo as regras do enriquecimento sem causa. III – O inventário é o lugar próprio para o efeito, caso em que o mapa da partilha contemplará a situação. IV – Não tendo aqueles invocado o seu direito a benfeitorias no inventário até ao trânsito em julgado da sentença homologatória do mapa da partilha, não ficam impedidos de vir a invocar e provar esse seu direito por meio adequado e em momento posterior, mas não pode(m) obstar aos efeitos daquela sentença, enquanto título executivo, (…), maxime quando pendem já execuções e a elas se não opuseram com os fundamentos previstos no quadro dos arts. 728º e 729º do Código de Processo Civil. * 6 – DISPOSITIVO Pelo exposto, acordam os Juízes desta secção cível em julgar a presente apelação improcedente, assim se confirmando a decisão recorrida. Custas pela recorrente. Notifique. * Guimarães, 25-11-2021 (José Cravo) (António Figueiredo de Almeida) (Maria Cristina Cerdeira) 1. Tribunal de origem: Tribunal Judicial da Comarca de Braga, V.N.Famalicão - Juízo Execução - Juiz 2. 2. In “Noções Elementares de Processo Civil”, Coimbra Editora, págs. 191 e 192. 3. In “Manual de Processo Civil”, Coimbra Editora, pág. 420. 4. In B.M.J. nº 112, pág. 190. 5. Cfr. obra supracitada. 6. Neste sentido, vd. Ac. da RG de 7-06-2018, proferido no Proc. nº 3/14.8TJVNF.G2 e acessível in www.dgsi.pt. 7. Cfr. Ac. da RE de 28-02-2019, proferido no Proc. nº 1326/18.2T8SLV-B.E1 e acessível in www.dgsi.pt. 8. Hodiernamente 728º e 729º do CPC. 9. Cfr. Ac. da RG de 27-03-2014, proferido no Proc. nº 432/13.4TBBCL.G1 e acessível in www.dgsi.pt. 10. Neste sentido, vd. Ac. da RC de 21-02-2018, proferido no Proc. nº 658/08.2TBTND.C1 e acessível in www.dgsi.pt. |