Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
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| Relator: | CONCEIÇÃO SAMPAIO | ||
| Descritores: | NULIDADE DE SENTENÇA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO EMPREITADA CO-EMPREITADA SUB-EMPREITADA | ||
| Nº do Documento: | RG | ||
| Data do Acordão: | 02/02/2023 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | APELAÇÃO IMPROCEDENTE | ||
| Indicações Eventuais: | 3ª SECÇÃO CÍVEL | ||
| Sumário: | I - Todo o regime da empreitada no Código Civil assenta na relação entre o dono da obra e o empreiteiro, sendo este quem perante aquele responde pela execução do contrato. Ao regular a responsabilidade dos subempreiteiros, a norma contida no artigo 1226.°, do Código Civil limita-se a atribuir ao empreiteiro direito de regresso, sem estabelecer quaisquer distinções em função da modalidade da subempreitada ou das suas especificidades. II - A ligação funcional entre o contrato de subempreitada e o contrato de empreitada faz muitas vezes repercutir as vicissitudes da execução deste naquele, considerando-se estar em causa um fenómeno de conexação internegocial, com reflexos no regime jurídico dos dois contratos. Assim, as consequências do cumprimento defeituoso da prestação por parte do subempreiteiro repercutem-se necessariamente no contrato de empreitada e desencadeiam reações do dono da obra perante o empreiteiro que, por sua vez, tem de reagir junto do subempreiteiro. III - Ao dono da obra bastará provar a existência do defeito, presumindo-se a culpa do empreiteiro, o qual, para afastar a sua responsabilidade terá que demonstrar que o cumprimento defeituoso não procede de culpa sua. IV - O empreiteiro tem de provar a causa do defeito, a qual para o exonerar lhe deve ser completamente estranha, o que bem se compreende pelo domínio que necessariamente teve do processo de execução da obra, ainda que a existência dos defeitos seja imputável a alguém que interveio na realização da obra, por sua iniciativa, seja este colaborador, auxiliar ou subempreiteiro. | ||
| Decisão Texto Integral: | Recurso de Apelação Proc. Nº1764/21.3T8BCL.G1 3ª Secção Cível ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I- RELATÓRIO AA instaurou a presente ação contra BB, peticionando a condenação deste a eliminar os defeitos da obra ou, em alternativa, e caso não proceda o réu à sua respetiva reparação, a sua condenação a pagar o custo pela execução dos trabalhos que o autor tenha de suportar, a liquidar em execução de sentença. Para tanto, alega, em suma, que celebrou com o réu um contrato de empreitada no âmbito do qual este procedeu à construção de um edifício no prédio do autor, porém, a obra executada padece de patologias que condicionam a sua normal utilização, tendo as mesmas sido denunciadas ao réu, não tendo, porém, sido reparadas. O réu apresentou contestação, alegando, em síntese, que os trabalhos invocados não foram executados por si, mas por outros empreiteiros contratados pelo autor. A final foi proferida sentença que julgou a ação totalmente procedente, por provada, e, em consequência: a. Condenou o réu a proceder à eliminação dos defeitos descritos sob os n.ºs ... e ...2 da matéria de facto provada, no prazo de 15 (quinze) dias úteis; b. Caso não proceda a tal eliminação, condenou-se o réu a pagar ao autor a quantia que se venha a apurar em liquidação de sentença, referente ao custo da eliminação de tais defeitos, que este tenha de suportar. * Inconformado com a sentença, o réu interpôs recurso, finalizando com as seguintes conclusões:Da nulidade da sentença recorrida: I) Na sentença recorrida, após elencar os factos dados como provados e não provados, exarou o Tribunal a quo que: “A demais matéria descrita quer na petição inicial quer na contestação contém alegações de direito ou conclusivas ou matéria irrelevante para a decisão da causa, ou traduz a mera negação de facticidade formulada positivamente no elenco de factos provados”; II) No entanto, em sede contestatória, o recorrente alegou, entre outros, nos artigos 33º, 34º, 36º, 37º, 57º e 58º, factos cuja apreciação era essencial para a boa decisão da causa; III) Assim sendo, não cumpriu o Tribunal a quo a obrigação expressamente prevista na lei no sentido da enumeração tanto dos factos provados como não provados, cuja razão é precisamente a certeza da consideração de toda a matéria factual integrada no objecto do processo e submetida a discussão e julgamento e não havendo a aludida matéria sido “apreciada e levada ao elenco factual que, em função da ponderação probatória que efectuou, o julgador considerou provado ou não provado”, a sua omissão constitui fundamento de nulidade da sentença recorrida, a qual expressamente se argui; Da impugnação da matéria de facto dada como provada e não provada: IV) Os factos dados como provados nos nºs. 7, 8, 9, 11, 12, 13 e 17 e os factos dados como não provados e referidos nas alíneas b), c), d), e), f), g), h), i), j), k), l), m), n), o), p) e q) não correspondem à prova produzida nos presentes autos e, nessa medida, devem ser alterados nos termos que infra se deixam consignados; V) Não obstante a diversa factualidade que, no entendimento do Recorrente, se encontra indevidamente julgada e acima referida, a verdade é que a mesma pode ser analisada em dois grandes conjuntos de factos: os factos relativos à responsabilidade pela construção do edifício em causa nos presentes autos e seu pagamento (factos provados 7, 8 e 17 e factos não provados referidos nas alíneas b) a j) da sentença recorrida) e os factos relativos aos alegados defeitos propriamente ditos (factos provados 9 e 11 a 13 e factos não provados referidos nas alíneas k) a q) da sentença recorrida); VI) Tendo em conta a factualidade referente à construção do edifício e seu pagamento, o tribunal aderiu por inteiro à versão dos factos trazida pelo autor, tendo, nessa medida, dado como provados os factos 7, 8 e 17 e dado como não provados os factos referidos nas alíneas b) a j) da sentença recorrida, o que, de forma alguma, corresponde à prova realizada nos presentes autos; VII) Motiva o tribunal recorrido a sua convicção, em primeiro lugar, com base no depoimento de parte do autor, meio probatório destinado a obter a confissão de factos desfavoráveis à parte em questão, e com base nas declarações de parte do réu, meio probatório destinado à produção de prova que sustente os factos alegados por essa parte, pelo que o tribunal recorrido, relativamente a ambos os meios probatórios, os valorizou no sentido oposto àquele que resultaria da ratio que os criou, valorando o depoimento de parte do Autor em sentido favorável ao Autor e valorando as declarações de parte do Réu em sentido desfavorável ao Réu; VIII) A versão dos factos apresentada pelo autor não foi corroborada por nenhum dos demais depoimentos realizados em sede de audiência de discussão e julgamento, visto que do depoimento da testemunha CC, arrolada pelo autor, resulta evidente que o mesmo desconhece qualquer facto relativo à execução da obra em causa, não a tendo acompanhado (minutos 27:50 a 28:00 do seu depoimento) e do depoimento da testemunha DD, igualmente arrolada pelo autor e sua esposa, resulta, tal como consta da sentença recorrida, o desconhecimento total da maioria dos factos, designadamente quanto ao acordado, apenas tendo deposto no sentido de que viu o réu na obra durante a sua execução; IX) Em sentido oposto, tal versão dos factos apresentada pelo autor foi absoluta e definitivamente contrariada pelos demais depoimentos apresentados em sede de audiência de discussão e julgamento, desde logo pelas declarações de parte do Réu (minutos 50:00 a 51:30, 53:30 a 59:45, 52:00 a 52:30 e 1:00:00 a 1:00:35 do seu depoimento) e pelo depoimento da testemunha EE que foi a pessoa responsável pela elaboração de todo o projeto referente à obra ora em causa e aquela que acompanhou e fiscalizou a execução da mesma nos termos do projeto aprovado, a qual confirmou a versão dos factos trazida pelo réu aos presentes autos quanto ao que levou a que autor e réu decidissem, já no decurso da obra, que não seria o réu a realizar a integralidade da mesma (minutos 6:40 a 9:30 e 18:45 a 20:15 do seu depoimento) e explanou as diversas entidades que andaram a trabalhar na obra do autor e pelo mesmo diretamente contratados, confirmando, genericamente, o alegado em 38º e 44º a 50º da contestação apresentada (minutos 22:10 a 25:00 do seu depoimento); X) Esta versão (do réu) dos factos resulta ainda confirmada pelo depoimento da testemunha FF, a qual depôs de forma absolutamente positiva no sentido de que quem escolheu e pagou a pedra foi o autor (minutos 2:50 a 3:55 do seu depoimento), de que o negócio de venda do granito foi celebrado pela empresa para a qual trabalha diretamente com o autor (minutos 4:30 a 4:35 do seu depoimento) e de que o autor pagou todos os fornecimentos à G..., tendo visto vários cheques passados autor para proceder a tais pagamentos (minutos 6:05 a 6:30, 6:40 a 7:20 e 9:15 a 9:45 do seu depoimento); XI) No mesmo sentido, a testemunha GG corroborou na íntegra a versão dos factos trazida pelo réu aos presentes autos, no sentido de que iniciou os trabalhos na obra do autor a pedido do réu para fazer a terraplanagem necessária à execução da obra, confirmando assim que os trabalhos de terraplanagem e movimentação de terras foram da responsabilidade do réu e tal como o mesmo admitiu em 38º da contestação apresentada, de que já no decurso da execução da obra foi contactado diretamente pelo autor e na sequência de recomendação do réu para executar todos os trabalhos de pavimentação exterior da referida obra e de que foi ao autor a quem faturou a execução desses trabalhos de pavimentação exterior, tendo sido o mesmo quem os pagou, sem qualquer intervenção do réu, confirmando, assim e na íntegra, o alegado pelo réu em 50º da contestação apresentada (minutos 3:00 a 4:00, 4:40 a 4:57 e 8:38 a 9:20 do seu depoimento); XII) Ainda neste sentido, atente-se no depoimento da testemunha HH que confirmou a entrega de diversas matérias-primas (cimento, areia, tijolo, etc..) na obra do autor, tendo afirmado perentoriamente que todos os pagamentos dessas matérias-primas foram feitos pelo autor através de cheques que passaram diretamente pela sua mão, admitindo que alguns deles (dos cheques do autor) lhe possam ter sido entregues diretamente pelo réu, mas afirmando que outros lhe foram entregues pelo autor (minutos 2:30 a 4:32 do seu depoimento); XIII) Não só o autor não apresenta qualquer prova testemunhal que confirme e corrobore a sua versão dos factos, como o réu apresentou ampla prova testemunhal que confirma que o autor procedeu diretamente à contratação de diversas entidades para proceder à execução de trabalhos que haviam sido inicialmente orçamentados pelo réu, bem como procedeu à aquisição e pagamento de diversas matérias-primas que nos termos do orçamento apresentado pelo réu seriam da sua responsabilidade, pelo que não podem restar quaisquer dúvidas que, em face da prova testemunhal produzida, a versão dos factos trazida pelo réu aos presentes autos e já acima sintetizada resultou amplamente provada, por oposição à prova (não) produzida pelo autor relativamente à sua versão dos factos; XIV) Tal convicção sai ainda mais reforçada se nos debruçarmos sobre a prova documental produzida, nomeadamente no que diz respeito aos pagamentos efetuados, sendo que o autor não apresenta um único cheque, uma única transferência bancária, rigorosamente nada que comprove efetivamente a realização de pagamentos ao réu, assentando toda a sua alegação no documento nº. ... junto com a petição inicial, tendo sido igualmente com base nesse único elemento de prova que o tribunal assentou toda a motivação no sentido de dar como provado o facto 8 elevado à categoria dos factos provados; XV) O réu em sede de contestação procedeu à impugnação do conteúdo e da virtualidade probatória de todos os documentos juntos pelo autor na Petição Inicial (o que inclui, naturalmente, o documento nº. ... pelo mesmo junto), bem como alegou factos que contrariam de forma manifesta e frontal que o autor tenha pago toda a obra ao réu (designadamente os factos alegados em 30º a 37º da contestação), não tendo impugnado a sua assinatura no referido documento porque, efetivamente, o mesmo assinou tal documento; XVI) O facto de não ter impugnado a sua assinatura constante do referido documento, contrariamente ao referido na sentença proferida, não quer dizer que o referido documento prove que o autor fez todos os pagamentos dele constantes ao réu, visto que o mesmo representa um mapa de pagamentos feito pelo autor e não um mapa de recebimentos do réu, sendo que do referido documento consta igualmente a assinatura do Engenheiro EE, o qual, em sede de depoimento por si prestado (minutos 9:30 a 10:40 do seu depoimento), confirmou a autoria de tal assinatura, e isso não pode levar à conclusão que o referido Engenheiro também recebeu as referidas quantias; XVII) O documento ... junto com a Petição Inicial constitui um mero “mapa de controle de obra” no que diz respeito aos pagamentos desenvolvidos pelo autor, algo que foi confirmado de forma absolutamente taxativa pela testemunha EE que explicou o contexto em que tal documento foi elaborado pelo autor, no sentido de poder ir controlando o que efetivamente gastava no desenvolvimento da obra, pois ele queria registar quanto ia gastando por forma a não ultrapassar o valor inicialmente acordado com o réu para a execução da obra (minutos 9:30 a 10:40 e 13:25 a 14:00 do seu depoimento), pelo que o documento em causa mais que atestar a versão dos factos do Autor, como erradamente se considerou na sentença recorrida, vem corroborar a versão dos factos do réu; XVIII) Tendo o réu impugnado o conteúdo e virtualidade probatória de tal documento, tendo o mesmo alegado em sede de contestação factos que contrariam frontalmente a interpretação que o tribunal recorrido do mesmo retirou e tendo resultado da prova testemunhal produzida o contexto e objetivos inerentes a tal documento, não poderia o mesmo, por si só, sustentar a prova do facto provado 8, especialmente quando tal facto provado vai em manifesta oposição com toda a demais prova testemunhal e documental produzida; XIX) No que à prova testemunhal diz respeito, diversas testemunhas depuseram no julgamento do presente processo, testemunhando que o autor lhes fez a si pagamentos de matérias-primas e de trabalhos que inicialmente haviam sido orçamentados pelo réu, designadamente a testemunha II (minutos 2:50 a 3:55, 4:30 a 4:35, 6:05 a 6:30, 6: 40 a 7:20 e 9:15 a 9:45 do seu depoimento), a testemunha GG (minutos 3:00 a 4:00, 4:40 a 4:57 e 8:38 a 9:20 do seu depoimento) e a testemunha HH (minutos 2:30 a 4:50 do seu depoimento); XX) Quanto à prova documental apresentada nos presentes autos, nomeadamente dos documentos juntos pelo réu na sua contestação com os nºs. 12 a 34 (essa sim não especificamente impugnada pelo autor) resulta que os serviços de pavimentação exterior foram efetuados e faturados pela empresa C..., Lda (documentos ...2 a ...4 juntos com a contestação), que o autor adquiriu à empresa G... todos os granitos para colocar na obra em questão (documentos ...5 a ...4 juntos com a contestação) e que o autor adquiriu à empresa A..., Lda os materiais de construção (cimento, ferro, tijolo, malha, arame, areia, brita, vigas, tijoleira, tela picotada, etc..) que foram utilizados na obra em análise (documentos ...5 a ...4 juntos com a contestação), documentos que foram absolutamente ignorados pelo tribunal recorrido na sentença proferida, não fazendo a ela qualquer referência, nem aventando uma hipótese que a tornasse compatível com a versão dos factos do Autor a que o referido tribunal deu integral acolhimento – foi como se os documentos em causa não existissem no processo e não tivessem de ser ponderados; XXI) Tal prova documental é absolutamente arrasadora da versão dos factos trazida pelo Autor e vem a mesma corroborar integralmente o depoimento das testemunhas apresentadas e relacionadas com as empresas em causa e a versão dos factos trazida pelo Réu; XXII) Ainda em sede de prova documental, o réu procedeu à junção de todas as faturas que foram por si emitidas ao autor, correspondentes aos pagamentos que o autor lhe desenvolveu e aos serviços prestados, das mesmas resultando claramente que o réu não faturou ao autor nem o autor a si lhe pagou todo o valor por si orçamentado para a execução, na íntegra, da obra em causa; XXIII) Tendo em conta tudo quanto acima se evidenciou no sentido da prova produzida nos presentes autos, no que diz respeito aos factos relativos à responsabilidade pela construção do edifício em causa nos presentes autos e seu pagamento (factos provados 7, 8 e 17 e factos não provados referidos nas alíneas b) a j) da sentença recorrida), entende o recorrente que o Tribunal recorrido incorreu em evidente e patente erro de julgamento, devendo a factualidade não provada referida nas alíneas b) e j) da sentença recorrida ser elevada à categoria dos factos dados como provados e devendo os factos provados 7, 8 e 17 serem considerados como factos não provados; deveria igualmente a factualidade alegada pelo réu em 33º, 34º, 36º e 37º da contestação por si apresentada e sobre a qual o tribunal recorrido não se pronunciou, ser considerada como provada tendo em conta a prova acima aduzida; XXIV) Relativamente à factualidade relativa aos alegados defeitos propriamente ditos, o tribunal recorrido na sentença proferida aderiu quase na íntegra à versão dos factos do autor, considerando verificadas 9 das 10 apontadas patologias e, nessa medida, condenando o réu na sua reparação integral, dando, assim, como provados os factos 9 e 11 a 13 da sentença recorrida e como não provados os factos referidos nas alíneas k) a q), o que, de forma alguma, corresponde à prova realizada nos presentes autos; XXV) O tribunal recorrido, tendo em conta o facto provado 9 da sentença recorrida, apenas reconheceu a existência de 9 dessas alegadas patologias, não dando como provada a suposta patologia nº. 3 referida no relatório apresentado pelo autor, ou seja, as “fachadas de granito colado ao suporte”, nos termos da qual alegadamente as fachadas se encontravam coladas diretamente ao suporte com junta aberta permitindo a entrada de água para o suporte e para o interior, mas não obstante não reconhecer a referida patologia (facto provado nº. 9), facto é que o tribunal recorrido dá como provado em 12 que “os defeitos existentes no edifício estão a provocar: nas fachadas revestidas em placas de granito colado ao suporte” a “degradação dos materiais de revestimento e acabamento interiores dos compartimentos”; XXVI) Existe, a este respeito, uma manifesta contradição entre a factualidade provada em 9 e em 12, pois se não considerou o tribunal recorrido como existente a apontada patologia nº. 3 referida no relatório técnico apresentado, não poderia considerar que tal não defeito estaria a provocar danos, designadamente a “degradação dos materiais de revestimento e acabamento interiores dos compartimentos”; XXVII) Por outro lado, mesmo tendo em conta o próprio relatório técnico apresentado é evidente que a suposta patologia em causa (as fachadas de granito estarem coladas diretamente ao suporte com junta aberta) não corresponde a qualquer específica patologia no sentido de configurar um defeito de construção, visto que do mesmo relatório consta como causa da mesma uma “opção construtiva”, algo que foi confirmado pelo próprio relator de tal relatório técnico, o Engenheiro CC, que confirmou que tal colagem com juntas abertas não se tratava de um defeito de construção mas sim de uma opção tomada durante a construção do edifício, opção essa que, no seu entendimento, acarretava riscos futuros em face da possível acumulação de águas, dizendo igualmente que quem deve ter tomado tal opção foi o projetista que desenvolveu o projeto (minutos 31:20 a 33:30 do seu depoimento); XXVIII) O réu, em sede de declarações de parte, confirmou que tal colagem do granito nos termos em que foi feita constituiu uma opção construtiva, opção essa que foi tomada pelo próprio autor, o qual considerava o granito como um material nobre e, nessa medida, não quis cimento nas juntas, dizendo expressamente que não reconhecia aqui qualquer defeito de construção (minutos 01:02:50 a 1:05:00 do seu depoimento), declarações corroboradas pelo depoimento da testemunha EE que confirmou que a decisão de manter as juntas abertas foi tomada pelo Autor, tendo inclusivamente a testemunha sugerido que, não querendo o autor cimento nas juntas, deveria o mesmo optar por um sistema de fachadas ventiladas, chamando à atenção do autor para o risco que corria com a opção que estava a tomar, algo que não o fez mudar de opinião, mantendo a sua decisão de colagem do granito na parede e sem o preenchimento das juntas com cimento (minutos 27:00 a 28:55 do seu depoimento); XXIX) Da conjugação dos referidos depoimentos e do relatório técnico apresentado, independentemente da questão do autor da tomada de decisão sobre a referida opção construtiva (tenha sido ele o autor ou o Engenheiro Projetista), certo é que não se poderá qualificar tal opção como um defeito construtivo e muito menos imputá-lo ao aqui réu que nenhuma intervenção teve em tal opção; XXX) Quanto às alegadas patologias nºs. 1 e 2 referidas no relatório técnico e consideradas como provadas na sentença recorrida (assentamento do pavimento exterior na zona do estacionamento e do passeio público), as quais teriam como causas, tendo em conta o relatório apresentado, a má compactação e materiais empregues, a sua consideração, pelo tribunal recorrido, como defeito de construção e a condenação do Réu à sua reparação, é o exemplo flagrante da pouca atenção que o tribunal recorrido pôs na apreciação da prova desenvolvida, pois se há matéria sobre a qual todas as pessoas inquiridas em sede de audiência de discussão e julgamento estiveram de acordo, é a de que tais assentamentos, que efetivamente aconteceram, decorreram da má compactação e dos materiais empregues aquando da execução, pelos Serviços Municipalizados, dos trabalhos de saneamento na rua em causa, nada tendo que ver com os trabalhos desenvolvidos para o Autor de assentamento do pavimento exterior; XXXI) É o próprio Engenheiro CC quem admite que esta patologia se deveu à execução do ramal de saneamento público pelos serviços municipalizados, visto que para abrirem a vala para assentar a tubagem, o solo não foi devidamente consolidado o que provocou o assentamento e, por força disso, até o piso da própria estrada acabou por assentar também (minutos 29:00 a 31:20 do seu depoimento); este depoimento foi confirmado pelo Réu em sede de declarações de parte (minutos 1:01:00 a 1:02:50 do seu depoimento), pelo Engenheiro EE (minutos 25:30 a 26:30 do seu depoimento) e pela testemunha GG (minutos 4:00 a 4:40 do seu depoimento) e bem assim resulta da fotografia nº. 1 do relatório técnico apresentado, na qual é perfeitamente visível o assentamento da via pública decorrente de tais trabalhos realizados pelos Serviços Municipalizados; XXXII) No que diz respeito às patologias nºs. 4 e 5 referidas no relatório técnico e consideradas como provadas na sentença recorrida (fissuração das fachadas em reboco pintado e a degradação do revestimento e acabamento em tinta), a testemunha Engenheiro CC no depoimento por si prestado confirmou que uma das causas de tais patologias foi a qualidade da tinta utilizada (minutos 29:30 a 30:35 do seu depoimento), o que, de forma alguma, pode ser considerado como um defeito de construção, sendo que o réu, nas declarações de parte por si prestadas, afirmou que o autor contribuiu de sobremaneira para a ocorrência da fissuração nas paredes de reboco, visto que para mostrar no âmbito do processo referido em 14 a 16 dos factos provados as infiltrações, andou a projetar água na cobertura fazendo-a escorrer pelas paredes abaixo e levando assim à deterioração das mesmas, tendo inclusivamente referido que foi sugerido ao autor colocar capoto nas paredes em causa, algo que ele recusou, assumindo, naturalmente, o risco das mesmas se degradarem com maior facilidade (minutos 1:5:00 a 1:8:00 do seu depoimento); XXXIII) Relativamente à patologia nº. 6 do relatório técnico e considerada como assente pelo tribunal recorrido (desvão sanitário ventilado desnivelado), nenhuma prova foi desenvolvida no sentido de que o réu foi o responsável pela execução do referido desvão sanitário, visto que tanto a testemunha CC (minutos 36:00 a 37:00 do seu depoimento), como a testemunha EE (minutos 30:50 a 32:45 do seu depoimento), confirmaram que o desvão sanitário em causa não estava no projeto desenvolvido, sendo que esta última testemunha referiu ainda que foi o autor quem desenhou o desvão em causa e o mandou fazer, visto que inicialmente estava previsto apenas levar uma tela; no mesmo sentido o réu, nas suas declarações de parte, referiu que não desenvolveu o desvão em causa, tendo apenas procedido, a pedido do autor, ao rebaixamento do terreno em mais 30 cms, algo que fez com a utilização de uma máquina durante cerca de hora e meia (minutos 1:8:00 a 1:10:40); por outro lado, nem do orçamento junto aos presentes autos relativo aos trabalhos acordados entre autor e réu, nem de nenhum outro documento resulta qualquer referência ao desvão sanitário em causa; XXXIV) Já no que respeito à patologia nº. 7 do relatório técnico e considerada como assente pelo tribunal recorrido (ausência de impermeabilização das soleiras), quer a testemunha EE (minutos 33:10 a 33:40 e 45:00 a 45:15 do seu depoimento), quer o próprio Réu, nas suas declarações de parte (minutos 1:10:40 a 1:11:50) foram absolutamente taxativos no sentido de que a referida impermeabilização existe, pois foi pelo Réu colocada uma tele líquida impermeabilizante ao nível das soleiras, pelo que não se pode aceitar que tenha sido o Réu condenado a reparar uma suposta patologia quando a prova produzida aponta necessariamente no sentido de que a patologia em causa não se verifica; XXXV) No que respeita à patologia nº. 8 do relatório técnico e considerada como assente pelo tribunal recorrido (fissuração dos muros de vedação exteriores), mesmo tendo em conta o próprio relatório técnico apresentado é evidente que a suposta patologia em causa não corresponde a qualquer específica patologia, visto que do mesmo relatório consta como causa da mesma um “erro de projeto na localização dos pilares e na ausência de juntas de esquartelamento”, o que significa que, mesmo para o técnico que elaborou tal relatório, a suposta patologia resulta na verdade de um erro de projeto, não representando por isso qualquer defeito de construção, algo que foi confirmado pelo próprio relator de tal relatório técnico, o Engenheiro CC, que confirmou que não estando previsto nenhuma junta de esquartelamento no projeto, quem executou o muro fê-lo, e bem, seguindo o projeto, pelo que se tratará de um erro de projeto e não de uma patologia de construção da responsabilidade do construtor (minutos 38:55 a 41:25 do seu depoimento); XXXVI) O réu, em sede de declarações de parte, explicou que não foi o mesmo quem desenvolveu o muro em causa e que tal muro estava projetado sem juntas de esquartelamento e deveria ser constituído por uma parte em bloco encimada por uma estrutura em rede, tendo o Réu pedido ao Sr. JJ (que foi quem fez tal muro) para o executar todo em bloco (minutos 01:11:50 a 1:13:30 do seu depoimento), sendo que no mesmo sentido foi o depoimento da testemunha EE que confirmou que não foi o Réu quem realizou tal muro e que o mesmo foi projetado com 40cms em bloco encimado por rede, algo que o autor acabou por decidir que deveria ser feito de maneira diferente, ou seja, todo o muro em bloco e sem rede; confirmou igualmente, enquanto autor do projeto de execução do muro em causa, que no projeto não estavam previstas quaisquer untas de dilatação ou de esquartelamento relativamente ao referido muro (minutos 33:40 a 36:50 do seu depoimento); XXXVII) Da conjugação dos referidos depoimentos e do relatório técnico apresentado, independentemente da questão da autoria da execução do referido muro, certo é que não estava projetada a execução de quaisquer juntas de esquartelamento, pelo que de forma alguma se pode apontar tal patologia à execução do muro em causa, mas sim, quando muito, ao projeto desenvolvido, não se podendo, assim, qualificar tal patologia como um defeito construtivo e muito menos imputá-lo ao aqui Réu que nenhuma intervenção teve em tal projeto; XXXVIII) No que às patologias nºs. 9 e 10 do relatório técnico concerne e consideradas como assente pelo tribunal recorrido (pendente inadequada dos pavimentos exteriores em cubo de granito e coletores exteriores assoreados), as mesmas, mais uma vez, não correspondem a qualquer defeito construtivo, tendo, relativamente a ambas as matérias, a testemunha GG no seu depoimento “assumido a paternidade” por tais situações, desonerando o réu de qualquer responsabilidade, dizendo que foi a sua empresa quem desenvolveu os pavimentos exteriores e que foi a mesma quem, no final, procedeu à sua lavagem e limpeza que, supostamente, levou ao entupimento dos coletores de águas pluviais; referiu ainda que a pendente foi efetuada nos termos solicitados pelo Autor e que a limpeza desenvolvida não provocou qualquer entupimento (minutos 5:00 a 5:50 e 6:15 a 7:00 do seu depoimento); XXXIX) A testemunha CC (minutos 42:00 a 42:45 do seu depoimento) confirmou, relativamente à patologia 10, que a mesma resulta do deficiente trabalho de limpeza de quem executou o pavimento exterior, tendo a testemunha EE (minutos 37:15 a 37:40 do seu depoimento) confirmado que, relativamente à patologia 9, não foi o Réu quem desenvolveu tais trabalhos de assentamento dos pavimentos exteriores e que o Autor foi quem definiu a referida pendente, e que, relativamente à patologia 10, a mesma não configura qualquer patologia mas decorre da responsabilidade de manutenção dos coletores limpos que recai sobre o Autor (minutos 37:40 a 38:30 do seu depoimento); o Réu, nas suas declarações de parte e no que toca à patologia 9, reforçou que não foi o responsável pela execução dos pavimentos exteriores, não reconhece a existência de qualquer vício visto que foi o Autor quem definiu a pendente abaixo do que se encontrava projetado, tendo sido informado pela empresa executante dos pavimentos exteriores que a pendente deveria ser no mínimo de 1 cm por metro, algo que foi rejeitado pelo Autor (minutos 1:15:20 a 1:17:06 do seu depoimento) e quanto à patologia 10, não tendo sido responsável pela limpeza dos pavimentos exteriores, assegurou que uma vez concluída a obra fizeram testes aos coletores exteriores e os mesmos não estavam entupidos, pelo que se estão agora tal deriva da falta de manutenção desenvolvida pelo Autor (minutos 1:17:06 a 1:19:05 do seu depoimento); XL) Da prova produzida quanto às referidas patologias não se pode considerar as mesmas como quaisquer defeitos ao nível da execução dos trabalhos, sendo a patologia 9 decorrente da opção consciente tomada pelo autor no sentido de querer um desnível no pavimento inferior ao que estava no projeto e a patologia 10 decorrente da falta de manutenção e limpeza que o autor deveria desenvolver aos coletores de águas pluviais; XLI) Tendo em conta tudo quanto acima se evidenciou no sentido da prova produzida nos presentes autos, no que diz respeito aos factos relativos às supostas patologias verificadas na obra em causa nos presentes autos (factos provados 9 e 11 a 13 e factos não provados referidos nas alíneas k) a q) da sentença recorrida), entende o recorrente que o Tribunal recorrido incorreu em evidente e patente erro de julgamento, devendo a factualidade não provada referida nas alíneas k) a q) da sentença recorrida ser elevada à categoria dos factos dados como provados e devendo os factos provados 9 e 11 a 13 serem considerados como factos não provados; deveria igualmente a factualidade alegada pelo réu em 57º e 58º da contestação por si apresentada e sobre a qual o tribunal recorrido não se pronunciou, ser considerada como provada tendo em conta a prova acima aduzida; Do Direito XLII) Se tomarmos em consideração a prova produzida nos presentes autos relativamente à factualidade inerente à responsabilidade pela construção do edifício ora em análise e seu pagamento, deverá a factualidade não provada referida nas alíneas b) e j) da sentença recorrida ser elevada à categoria dos factos dados como provados, deverão os factos provados 7, 8 e 17 serem considerados como factos não provados e deverá a factualidade alegada pelo Réu em 33º, 34º, 36º e 37º da contestação por si apresentada e sobre a qual o tribunal recorrido não se pronunciou, ser considerada como provada; XLIII) Perante tal factualidade que resulta, inequivocamente, da prova produzida, mesmo que se considerassem como verificadas as patologias referidas em 9 dos factos provados (o que não se aceita nem concede), tendo em conta que as mesmas não decorriam de nenhum dos trabalhos efetivamente realizados pelo Réu ao Autor, de forma alguma poderia ser o mesmo considerado responsável pela verificação das patologias em causa e condenado na sua eliminação, pelo que terá o Réu de ser absolvido dos pedidos contra o mesmo desenvolvidos; XLIV) Por outro lado, se tomarmos em consideração a prova produzida nos presentes autos relativamente à factualidade inerente às supostas patologias do edifício ora em análise, deverá a factualidade não provada referida nas alíneas k) e q) da sentença recorrida ser elevada à categoria dos factos dados como provados, deverão os factos provados 9 e 11 a 13 serem considerados como factos não provados e deverá a factualidade alegada pelo réu em 57º e 58º da contestação por si apresentada e sobre a qual o tribunal recorrido não se pronunciou, ser considerada como provada; XLV) Mesmo que se considerasse, ao arrepio da prova produzida, o réu como tendo sido o responsável pela execução de todos os trabalhos pelo mesmo orçamentados (o que não se aceita nem concede), sempre se teria de considerar, nos termos já defendidos nas presentes alegações de recurso e que se dão como reproduzidos por questões de economia processual, que apenas as patologias nºs. 4 e 5 se tratam de verdadeiros defeitos de construção pelos quais o Réu pudesse responder e, mesmo estes, em claro concurso de responsabilidades com o Autor, pelo que de forma alguma poderia ser o Réu condenado a eliminar as demais patologias objeto dos presentes autos; XLVI) Na procedência das presentes alegações de recurso deverá determinar-se a anulação da sentença recorrida e, consequentemente, deverá determinar-se a absolvição do réu dos pedidos contra o mesmo desenvolvidos; se assim não se entender, deverá ser determinada a procedência parcial da presente ação e condenado o réu a eliminar apenas as patologias melhor identificadas nos nºs. 4 e 5 do relatório técnico junto pelo autor com a Petição Inicial por si apresentada; XLVII) O Tribunal recorrido, com a douta sentença pelo mesmo proferida, andou manifestamente mal e, com tal decisão, violou, pelo menos, o disposto no artigo 1221º, do CC, do qual fez uma incorreta interpretação e aplicação ao caso concreto em apreço. * Foram apresentadas contra-alegações defendendo o recorrido a improcedência do recurso e a manutenção do decidido. * Foram colhidos os vistos legais.Cumpre apreciar e decidir. * II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSOAs questões decidendas a apreciar, delimitadas pelas conclusões do recurso, consistem em determinar se: - deve ser anulada a sentença por falta de fundamentação; - deve ser modificada a decisão proferida sobre a matéria de facto; - natureza da relação jurídica estabelecida entre as partes, distinção entre empreitada e subempreitada e obrigações decorrentes de uma e outra modalidade. * III - FUNDAMENTAÇÃO3.1. Os factos 3.1.1. Factos Provados A primeira instância com pertinência para a decisão considerou provados os seguintes factos: 1. O autor é dono e legítimo possuidor de um prédio urbano sito na Avenida ..., freguesia ..., concelho ..., destinado a serviços, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...57, e inscrito na matriz predial urbana respectiva sob o artigo ...33. 2. O réu dedica-se à actividade de construção civil e remodelação de edifícios, com escopo lucrativo. 3. Para o prédio descrito em 1., o autor detinha um projecto de construção de um edifício destinado a um salão de cabeleireira, licenciado pela Câmara Municipal ..., através do Alvará de Licença n.º 70/18, emitido em .../.../2018, para o qual foi emitida licença de construção n.º ...11.... 4. O autor solicitou ao réu um orçamento para a execução dos trabalhos solicitados para realização do projecto referido em 3. 5. Pelo réu foi apresentado, em 05.11.2017, o orçamento para realização da obra, que contemplava os seguintes trabalhos: movimento de terras, betão armado, alvenaria, cantarias, revestimentos, pavimentos, tectos e paredes interiores, carpintaria, pintura, arranjos exteriores – melhor descritos no orçamento de fls. 13 e 14 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. 6. O orçamento referido em 5., no valor de € 113.000,00, foi aprovado, tendo sido acordada a execução pelo réu da totalidade dos trabalhos constantes do mesmo. 7. O réu procedeu à construção do edifício tendo concluído o mesmo em Dezembro de 2018. 8. O autor pagou ao réu a totalidade do preço estipulado no contrato celebrado entre as partes. 9. Em meados de Julho de 2020, começaram a surgir algumas patologias no edifício, nomeadamente: - Assentamento do pavimento exterior na zona do estacionamento; - Assentamento do pavimento exterior na zona do passeio público; - Fissuração das fachadas em reboco pintado; - Degradação do revestimento e acabamento de tinta nas fachadas exteriores; - Desvão sanitário ventilado desnivelado; - Ausência de impermeabilização nas soleiras; - Fissuração dos muros exteriores; - Pendente inadequada dos pavimentos exteriores em cubo de granito; - Coletores exteriores de drenagem de águas pluviais assoreados. 10. Por esse motivo, em Julho de 2020, o autor solicitou um relatório de peritagem e parecer técnico, à empresa “Dr. B...”, sita na Rua ..., ..., ... .... 11. Tendo como suporte o relatório que veio a ser elaborado, o autor, em 18 de Agosto de 2020, por carta registada com aviso de recepção, denunciou ao réu os defeitos descritos em 9., solicitando a respectiva eliminação. 12. Os defeitos existentes no edifício estão a provocar: - No assentamento do pavimento exterior na zona do estacionamento público: acumulação de água no pavimento e degradação dos materiais; - No assentamento do pavimento exterior na zona do passeio público: acumulação de água no tardoz das placas por infiltração através das juntas das placas de granito; - Nas fachadas revestidas em placas de granito colado ao suporte: degradação dos materiais de revestimento e acabamento interiores dos compartimentos; - Na fissuração das fachadas em reboco pintado: fissuras no revestimento exterior provocando infiltração para o interior e consequentemente degradação dos materiais de revestimento e acabamento exteriores e interiores; - Degradação do revestimento e acabamento em tinta das fachadas exteriores: degradação do suporte e dos materiais de revestimento e acabamento; - No desvão sanitário ventilado: acumulação de água no desvão sanitário, e humidade nos elementos estruturais e de revestimento e acabamento por ascensão capilar; - Ausência de impermeabilização nas soleiras: presença de manchas de humidade no pavimento interior e degradação dos materiais de revestimento e acabamento; - Na fissuração dos muros de vedação exteriores: fissuração activa com degradação dos materiais de revestimento e acabamento; - Pendente inadequada dos pavimentos exteriores em cubo de granito: acumulação de água pluvial; - Nos colectores exteriores de drenagem de águas pluviais assoreados: deficiente escoamento das águas pluviais. 13. Os defeitos denunciados não foram reparados. 14. Em 24.10.2019, a empresa J..., Unipessoal Limitada, deu entrada contra o aqui autor de acção judicial, junto do Juízo Local Cível ..., a qual correu termos sob o n.º 3586/19...., peticionando o pagamento da quantia de € 11.630,45, por força dos trabalhos de colocação da cobertura da garagem e do edifício principal, desenvolvidos na obra de construção em causa nos presentes autos. 15. No âmbito da referida acção judicial, o aqui autor apresentou, em 20.12.2019, contestação com reconvenção, através da qual, entre outros argumentos, invocou um conjunto de defeitos na construção desenvolvida pela ali autora, peticionando, entre o mais, que esta fosse condenada a “eliminar os defeitos existentes na cobertura de edifício de forma a eliminar as infiltrações de água nas garagens e nas paredes do edifício, bem como eliminar a ferrugem da cobertura”. 16. Por sentença proferida a 25.06.2021, a referida acção foi julgada procedente, tendo o pedido reconvencional deduzido pelo aqui autor sido julgado improcedente. 17. Uma multiplicidade de diferentes intervenientes foram contratados pelo réu para executar a totalidade dos trabalhos constantes do orçamento referido em 5. 18. O autor, com vista a demonstrar que os edifícios estariam a ser objecto de infiltrações pela cobertura, subiu à referida cobertura e com uma máquina de pressão de água projectou água para a cobertura. * 3.1.2. Factos Não provadosa) Na acção judicial referida em 15., o autor imputou todos e quaisquer defeitos de construção à deficiente execução da cobertura do edifício e garagens. b) Logo desde o início da obra e tendo em conta a postura de permanente vigilância por parte do autor, foram-se desenvolvendo atritos e fricções entre autor e réu no desenvolvimento do réu. c) O referido em b) levou a que o réu se recusasse a fazer a grande maioria dos trabalhos e solicitar ao autor que ele próprio adjudicasse os mesmos a outras entidades que merecessem mais a sua confiança. d) Assim, não obstante o facto de autor e réu terem acordado, em Novembro de 2017, na execução pelo réu da totalidade dos trabalhos constantes do orçamento aludido em 5., grande parte dos mesmos não foi executada pelo réu. e) Mas sim por outras entidades diferentes do réu e a quem o autor se dirigiu. f) Não tendo tais trabalhos sido pagos ao réu, mas antes pagos pelo autor directamente a essas entidades, que facturaram directamente ao autor. g) Dos trabalhos constantes do orçamento referido em 5., o réu apenas procedeu à execução dos seguintes trabalhos: - todos os trabalhos de movimentos de terras; - todos os trabalhos de betão armado; - no que diz respeito à alvenaria, apenas o fornecimento e execução das paredes exteriores; - todos os trabalhos de cantarias; - quanto aos trabalhos nos pavimentos, apenas os trabalhos referentes à regularização do pavimento do salão com argamassa de cimento e areia; - no que toca aos arranjos exteriores, apenas os trabalhos referentes ao muro de vedação frente à Rua .... h) Grande parte dos materiais utilizados na obra foram directamente adquiridos e pagos pelo autor aos correspondentes fornecedores. i) Designadamente, adquiriu o autor diretamente à empresa G..., LDA todas as peças em granito que foram aplicadas. j) Bem como adquiriu o autor diretamente à empresa A..., Lda os materiais de construção (cimento, ferro, tijolo, malha, arame, areia, brita, vigas, tijoleira, tela picotada, etc..) que foram utilizados na obra. k) Estava previsto inicialmente que parte do muro de vedação exterior seria executado em rede e assim foi orçamentado pelo réu, sendo que o autor, na sequência do desenvolvimento da obra, comunicou ao réu que o mesmo deveria ser todo desenvolvido em bloco. l) Tendo em conta a elevada extensão de tal muro, foi imediatamente o autor advertido pelo réu que, fazendo o mesmo exclusivamente em bloco, haveria o sério risco do mesmo começar a fissurar. m) O autor ignorou tal aviso e determinou que fosse o trabalho desenvolvido como tinha dito, ou seja toda a extensão do muro a ser feita em bloco. n) Aquando da aplicação das placas de granito (revestimento), o autor exigiu ao instalador que a mesma se fizesse sem que fosse colocado cimento nas juntas, pelo que deveriam as pedras ser coladas directamente ao suporte com junta aberta (sem cimento). o) As águas decorrentes da factualidade contida sob o n.º 20. acabaram por se infiltrar pelas paredes deteriorando de forma irreversível a tinta e o reboco das mesmas, visto que tal reboco não está preparado para absorver grandes quantidades de água. p) As paredes das garagens foram projectadas e desenvolvidas em tijolo simples e sem qualquer isolamento térmico, pelo que estão muito mais sujeitas a problemas de humidade e deterioração. q) Por forma a evitar/minimizar tais problemas, ainda antes de iniciar a obra, o réu propôs ao autor que as mesmas fossem revestidas a capoto, o que este prontamente recusou sublinhando que se tratavam de garagens onde não queria gastar muito dinheiro e que, portanto, não haveria qualquer problema. r) O réu desenvolveu e não facturou diversos trabalhos que não estavam contemplados no orçamento por si apresentado, uma vez que pretendia cessar quaisquer relações com o autor o mais rapidamente possível * Consignou-se, ainda, que a demais matéria descrita quer na petição inicial quer na contestação contém alegações de direito ou conclusivas ou matéria irrelevante para a decisão da causa, ou traduz a mera negação de facticidade formulada positivamente no elenco de factos provados.* 3.2. O Direito 3.2.1. Da nulidade da sentença Sustenta o recorrente que a sentença recorrida enferma da nulidade prevista no artigo 615º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil, porquanto o tribunal não fez constar do elenco de factos provados ou não provados matéria alegada na contestação cuja apreciação era essencial para a boa decisão da causa. Cremos, salvo o devido respeito, não assistir razão ao recorrente. O artigo 607º, n.º 4 do Código Processo Civil impõe que se elenquem (de forma fundamentada) quais os factos dados como provados e como não provados. Na enunciação desses factos, provados e não provados, cabem todos aqueles que interessem ao objeto do litígio, perspetivando-se sempre todas as possíveis soluções de direito (artigos 5º e 596º do Código Processo Civil). No caso presente, na decisão da matéria de facto, depois da enumeração dos factos provados e não provados, consignou-se que “a demais matéria descrita quer na petição inicial quer na contestação contém alegações de direito ou conclusivas ou matéria irrelevante para a decisão da causa, ou traduz a mera negação de facticidade formulada positivamente no elenco de factos provados”. Assim, o tribunal tomou posição sobre a demais matéria, considerou-a foi irrelevante para a decisão da causa. Se decidiu bem ou mal, já é outra questão. Donde, a factualidade ora trazida deverá ser apreciada em sede de fundamento para a modificabilidade da decisão de facto, e não de nulidade da sentença. Destarte, a sentença recorrida não enferma de vício que a torne nula. * 3.2.2. Da modificabilidade da decisão sobre a matéria de factoNos termos do artigo 662º, do Código de Processo Civil, a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. Todavia, a impugnação só deve ser atendida se a alteração da decisão de facto conformar um enquadramento jurídico tal que conduza a decisão diferente da anteriormente alcançada. O recorrente considera incorretamente julgados os factos dados como provados nos nºs. 7, 8, 9, 11, 12, 13 e 17 e os factos dados como não provados das alíneas b), c), d), e), f), g), h), i), j), k), l), m), n), o), p) e q). A impugnação efetuada pelo recorrente pode ser dividida em dois segmentos: um relativo à responsabilidade pela realização da obra (factos provados 7, 8 e 17 e não provados b) a j)) o outro respeitante aos defeitos da obra (factos provados 9, 11 a 13 e factos não provados k) a q)). Quanto à responsabilidade pela realização da obra, a versão dos factos trazida pelo réu é a de que as partes decidiram, já no decurso da obra, que não seria o réu a realizar a integralidade da mesma, tendo nessa conformidade o autor contratado diretamente diversas entidades que executaram trabalhos na obra. Para confirmar esta realidade invoca, além das suas declarações, o depoimento das testemunhas EE, FF, GG e HH e os documentos que consubstanciam faturas emitidas em nome do autor. Se é certo que dos enunciados meios de prova resulta que o fornecimento de diversos materiais foi faturado em nome do autor, e que os cheques passados para pagamento eram do autor, a verdade é que com segurança e firmeza nenhuma das testemunhas afirmou que quem contratou diretamente com elas foi o autor. Para o que releva, nenhuma das testemunhas referiu que assumiu autonomamente a execução de determinada obra, para a qual foi diretamente contratada pelo autor, sob a orientação de quem desenvolveram os trabalhos. Ao invés, todas as ligações tiveram a intervenção do réu, por todos assumido como o empreiteiro da obra, e por quem foram chamados para a execução de trabalhos por este definidos. Por outro lado, as faturas embora emitidas em nome do autor, não demonstram a factualidade que se propunham a demonstrar, não sendo, por si e enquanto tais, suficientes para atestar a contratação direta. Note-se que quanto ao fornecimento de materiais, do que decorre do depoimento da testemunha FF, o que houve afinal foi uma compra e venda, que não contende com os termos da empreitada em curso. Analisada toda a prova documental junta e os depoimentos e declarações prestados, não se nos afigura ser de alterar a factualidade apurada pelo Tribunal a quo. Concorre para a decisão da imodificabilidade da matéria de facto a circunstância de a impugnação da decisão de facto não se justificar a se, de forma independente e autónoma da decisão de mérito proferida, assumindo antes um caráter instrumental face à mesma. Tanto significa que a alteração dos factos pretendida pela parte tem de conformar um enquadramento jurídico tal que conduza a decisão diferente da anteriormente alcançada. Ou seja, a modificabilidade da decisão de facto só alcança justificação válida se, por essa via, se obtiver um efeito juridicamente útil ou relevante. No caso concreto, tal não ocorre. A faturação em nome do autor e o pagamento de alguns materiais feito por este em nada contendem com a solução jurídica consagrada na decisão, pois não desqualifica a subempreitada não afastando, por essa via, a responsabilidade do empreiteiro (como infra melhor se explanará). Definida a responsabilidade do réu pela execução da obra em causa, solucionada está a questão da imputação subjetiva pelos defeitos verificados, havendo que manter como provada a factualidade inserta nos pontos 7, 8 e 17 e como não provadas as alíneas b) a j). Quanto aos defeitos propriamente ditos, o depoimento da testemunha CC, engenheiro civil que elaborou o parecer técnico de fls. 19 e ss, tendo-o confirmado na íntegra, explicitou, de forma esclarecedora, circunstanciada e objetiva, as patologias que detetou na obra e suas causas. Este depoimento não foi abalado pelo depoimento da testemunha EE, nem pelas declarações do réu. Por outro lado, não resultou da prova produzida, que a causa de certas patologias seja decorrente da opção consciente tomada pelo autor, em alteração ao projetado, quanto a materiais, modos de execução e desníveis de pavimento. Evidencia-se que compete ao recorrente, enquanto empreiteiro, provar a causa do defeito, a qual para o exonerar de responsabilidade lhe deve ser completamente estranha. Finalmente, em causa não está o incumprimento pelo autor da sua contraprestação, o preço, pelos serviços prestados pelo réu, que justifique o aditamento da matéria alegada nos artigos 33, 34, 36, 37, 57 e 58 da contestação. As partes estão de acordo que o que foi contratado foi pago, dissentem é na imputação de quem é responsável pelo que foi executado. Pelo exposto, a impugnação terá de improceder. * 3.2.2. Natureza da relação jurídica estabelecida entre as partes, distinção entre empreitada e subempreitada e obrigações decorrentes de uma e outra modalidade.A questão posta no recurso reconduz-se a saber se a relação entre as partes ainda se mantém no domínio do contrato de empreitada, sendo o réu responsável perante o autor pelas subempreitadas contratadas ou, antes, se se situa já fora da extensão da empreitada, tratando-se de um negócio autónomo celebrado, exclusiva e diretamente, pelo autor com terceiros. Em termos jurídico-normativos, o recorrente subsume o caso sub judice àquela situação que pode ser identificada como de co-empreitada. Nesta, verifica-se uma cumulação de contratos de empreitada, tendo cada um o seu objeto próprio, mas concorrendo, no seu conjunto, para a realização da mesma obra. Será o caso de o dono da obra celebrar vários contratos de empreitada, cada qual com seu empreiteiro, adjudicando a cada um deles trabalhos diferentes da mesma obra. Verifica-se uma justaposição de contratos, havendo uma multiplicidade de empreiteiros, em que cada um deles mantém com o dono da obra uma relação direta, sendo, perante este, individualmente responsáveis pela conformidade com o que foi convencionado (artigo 1208º, do Código Civil). A realidade fáctica apurada não é de molde a tal conformação normativa, já que não há uma justaposição de contratos, mas sim uma sobreposição de contratos. O caso insere-se no âmbito de um único contrato de empreitada celebrado entre o autor e o réu, tendo este recorrido a terceiros para a execução de partes da obra. O recurso a terceiros, denominados de subempreiteiros, não deixa de envolver consequências relevantes no contexto da relação negocial primitiva. Para o apuramento da natureza desse envolvimento, haverá que ser feita a qualificação jurídica da subempreitada e de seguida avaliar as relações que em torno do contrato de subempreitada se desenvolvem, quer entre o empreiteiro e o subempreiteiro quer entre este e o dono da obra, e ainda as repercussões que a existência da subempreitada podem ter nas relações entre o dono da obra e o empreiteiro. A análise da realidade social revela que, com alguma frequência, o empreiteiro se socorre, na sua execução, do concurso de terceiros, para além daqueles com quem mantém, como é normal, um vínculo laboral. São, segundo a designação corrente, os subempreiteiros e os tarefeiros, estes últimos enquadráveis na designação genérica de auxiliares.[1] A noção de subempreitada é-nos dada pelo artigo 1213º, do Código Civil sendo definida como o contrato pelo qual um terceiro se obriga para com o empreiteiro a realizar a obra a que este se encontra vinculado, ou uma parte dela. Decorre deste preceito que a subempreitada pressupõe a pré-existência de um contrato de empreitada do qual se mantém distinto, muito embora ambos tenham uma parte comum, o empreiteiro. Apesar de manter toda a individualidade, os dois contratos, a empreitada e a subempreitada, estão ligados por um vínculo funcional, na medida em que "prosseguem a mesma finalidade; isto é, apesar de serem contratos distintos, visam ambos a realização do interesse do dono da obra. A subempreitada enquadra-se no projeto geral, e é de toda a conveniência que esteja com ele harmonizada, de forma a que a sua realização não inutilize o resultado a obter por meio deste"[2]. O contrato de subempreitada está necessariamente funcionalizado em relação ao contrato de empreitada, dependência que se verifica não só na sua formação, como na sua execução, pelo que as vicissitudes ocorridas num se refletirão necessariamente no outro[3]. Por isso mesmo a posição predominante é ocupada pelo contrato de empreitada, ao qual se desenrola uma dependência unilateral da subempreitada. Neste sentido, a subempreitada é comumente aceite como um subcontrato, contrato subordinado à empreitada ou derivado desta. Nos dizeres de Pedro Romano Martinez, a subempreitada é uma empreitada de «segunda mão» que entra na categoria geral do subcontrato, e em que o subempreiteiro é um «empreiteiro do empreiteiro», também adstrito a uma obrigação de resultado[4]. Na subempreitada são partes o empreiteiro e um terceiro, o subempreiteiro. Como afirma Carvalho Fernandes, “a imediata consequência a retirar deste ponto é a de o dono da obra ser alheio ao contrato de subempreitada, quaisquer que sejam as consequências que da sua existência possam emergir quanto às suas relações com o empreiteiro e, mesmo, com o subempreiteiro. Em suma, na subempreitada não há vínculo directo entre o dono da obra e o subempreiteiro.”[5] Todavia, como alerta o mesmo autor, “sob a designação genérica de subempreitada abarcam-se, na realidade da vida, situações muito diversas, fundadas, não tanto (…) no volume ou natureza dos trabalhos, mas antes no modo como se articulam os contratos de empreitada e de subempreitada[6]. E concretiza explicando que no fundo “está em causa a maior ou menor autonomia negocial do empreiteiro, tanto pelo que respeita à celebração do contrato de subempreitada, como à selecção do subempreiteiro. Podem verificar-se aqui várias formas de articulação da vontade do dono da obra com a do empreiteiro.”[7] A subempreitada é um contrato do mesmo tipo da empreitada, ao qual se aplicam as mesmas regras[8]. Contudo, a grande relevância económico-social da subempreitada, situada no âmbito de contrato tão complexo como é a empreitada, nomeadamente pela sua projecção no tempo e pelo intuitus personae que por vezes o domina, faz com que as partes com frequência se ocupem da sua regulação[9]. Na verdade, movendo-nos no campo do direito privado, o principio da liberdade contratual e da prevalência da autonomia da vontade, consente aos interessados uma larga margem de conformação do conteúdo negocial. Assim, é perfeitamente possível aos interessados complementar ou afastar em vários domínios o quadro normativamente fixado para a subempreitada, em particular quanto ao regime das relações entre o dono da obra e o subempreiteiro[10]. Nada impede, pois, que no contrato de subempreitada se contenham estipulações que se afastem das correspondentes do contrato principal em aspetos relevantes, como sejam o objeto, preço, prazo de execução, etc. E é no exercício dessa liberdade negocial que, partindo a lei da regra de os materiais e utensílios necessários à execução da obra deverem ser fornecidos pelo empreiteiro, preveja a convenção em contrário, e assim poderem as partes estipularem que os materiais, ou parte deles, sejam faturados e pagos pelo dono da obra. E tal pode suceder quer no âmbito da empreitada quer da subempreitada, podendo esta projetar-se no conteúdo da situação contratual do dono da obra e, por reflexo, na do próprio empreiteiro. Contudo, não obstante estas estipulações com incidência na subempreitada, o empreiteiro não fica liberto da sua empreitada. A ligação funcional entre o contrato de subempreitada e o contrato de empreitada faz muitas vezes repercutir as vicissitudes da execução deste naquele, considerando-se estar em causa um fenómeno de conexação internegocial, com reflexos evidentes no regime jurídico dos dois contratos. Assim, as consequências do cumprimento defeituoso da prestação por parte do subempreiteiro repercutem-se necessariamente no contrato de empreitada e desencadeiam reações do dono da obra perante o empreiteiro que, por sua vez, tem de reagir junto do subempreiteiro[11]. Na verdade, todo o regime da empreitada, no Código Civil, assenta na relação entre o dono da obra e o empreiteiro, sendo este quem perante aquele responde pela execução do contrato[12]. Ao regular a responsabilidade dos subempreiteiros, a norma contida no artigo 1226.°, do Código Civil limita-se a atribuir ao empreiteiro direito de regresso, sem estabelecer quaisquer distinções em função da modalidade da subempreitada, ou das suas especificidades. Tendo presente os contornos definidores e limitadores do contrato e subcontrato apresentados, vejamos como regula a lei os defeitos da obra. O empreiteiro, tal como o subempreiteiro, está adstrito a uma obrigação de resultado – efetuar a obra completa e isenta de defeito - sendo responsável pelos vícios ou defeitos que a obra apresentar ou nela se venham a revelar. Assim é que, na execução da obra, o artigo 1208.º, do Código Civil dispõe que empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato. Como refere Pedro Romano Martinez, na empreitada o cumprimento será defeituoso quando a obra tenha sido realizada com deformidades, porque desconforme com o plano convencionado, ou com vícios, se as imperfeições verificadas excluam ou reduzam o valor da obra ou afetem a sua aptidão para o seu uso ordinário ou fim previsto no contrato[13]. Quanto a estes últimos, esclarece Cura Mariano que vícios são anomalias objetivas da obra, traduzindo-se em estados patológicos desta, independentemente das características convencionadas[14]. Se a obra apresenta defeitos, tem o empreiteiro e o subempreiteiro o dever de os eliminar, como decorre, respetivamente, do disposto nos artigos 1221º, nº 1 e 1226º do Código Civil. Recai sobre aquele que invoca a prestação inexata, no caso a existência de defeitos na obra, como fonte da responsabilidade, o ónus de demonstrar os factos que integram o incumprimento, competindo à outra parte fazer prova de que os defeitos verificados não procedem de culpa sua. Como defende Cura Mariano[15], ao dono da obra bastará provar a existência do defeito, presumindo-se a culpa do empreiteiro, o qual, para afastar a sua responsabilidade terá que demonstrar que o cumprimento defeituoso não procede de culpa sua. Este ónus de prova não se satisfaz com a simples demonstração que o empreiteiro, na realização da obra, agiu diligentemente, ficando o tribunal na ignorância de qual a causa e quem merece ser censurado pela verificação do defeito apontado pelo dono da obra. Nesta situação, continua a funcionar a presunção de que o devedor da prestação é o culpado. O empreiteiro tem de provar a causa do defeito, a qual lhe deve ser completamente estranha, o que bem se compreende pelo domínio que este necessariamente teve do processo executivo da prestação. Só assim se exonerará da responsabilidade pelo defeito existente na obra por si realizada[16]. Mais, o empreiteiro será responsável pela realização defeituosa da obra, independentemente de qualquer juízo de censura sobre a sua atuação pessoal, sempre que a existência dos defeitos seja imputável a alguém que interveio no processo de realização da obra, por sua iniciativa, seja este representante, trabalhador, colaborador, auxiliar ou subempreiteiro.[17] Portanto, tendo ficado provada a existência de defeitos, não tendo o recorrente como empreiteiro demonstrado que o cumprimento defeituoso não procede de culpa sua, é ele quem tem de assumir a responsabilidade pelos defeitos perante o dono da obra. Demonstrando-se que diferentes intervenientes foram contratados pelo empreiteiro para executar os trabalhos, ao dono da obra é indiferente tal circunstância, já que perante si é o empreiteiro que responde, sem prejuízo do direito que lhe assiste de exigir dos subempreiteiros a eliminação daqueles. * SUMÁRIO (artigo 663º n º7 do Código do Processo Civil)I - Todo o regime da empreitada no Código Civil assenta na relação entre o dono da obra e o empreiteiro, sendo este quem perante aquele responde pela execução do contrato. Ao regular a responsabilidade dos subempreiteiros, a norma contida no artigo 1226.°, do Código Civil limita-se a atribuir ao empreiteiro direito de regresso, sem estabelecer quaisquer distinções em função da modalidade da subempreitada ou das suas especificidades. II - A ligação funcional entre o contrato de subempreitada e o contrato de empreitada faz muitas vezes repercutir as vicissitudes da execução deste naquele, considerando-se estar em causa um fenómeno de conexação internegocial, com reflexos no regime jurídico dos dois contratos. Assim, as consequências do cumprimento defeituoso da prestação por parte do subempreiteiro repercutem-se necessariamente no contrato de empreitada e desencadeiam reações do dono da obra perante o empreiteiro que, por sua vez, tem de reagir junto do subempreiteiro. III - Ao dono da obra bastará provar a existência do defeito, presumindo-se a culpa do empreiteiro, o qual, para afastar a sua responsabilidade terá que demonstrar que o cumprimento defeituoso não procede de culpa sua. IV - O empreiteiro tem de provar a causa do defeito, a qual para o exonerar lhe deve ser completamente estranha, o que bem se compreende pelo domínio que necessariamente teve do processo de execução da obra, ainda que a existência dos defeitos seja imputável a alguém que interveio na realização da obra, por sua iniciativa, seja este colaborador, auxiliar ou subempreiteiro. * IV - DECISÃOPelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida. Custas pelo Recorrente. Guimarães, 2 de Fevereiro de 2023 Assinado digitalmente por: Rel. – Des. Conceição Sampaio 1º Adj. - Des. Elisabete Coelho de Moura Alves 2º - Adj. - Des. Fernanda Proença Fernandes [1] Neste sentido, Carvalho Fernandes, Da Subempreitada, In https://revistas.ucp.pt/index.php/direitoejustica/article/view/11042/10674, pag. 79. [2] Cf. Prof. Pedro Romano Martinez Direito das Obrigações, Parte Especial Contratos, 2ª edição, pag. 404. [3] Neste sentido, João Cura Mariano, Responsabilidade contratual do empreiteiro pelos defeitos da obra, Almedina, 4ª edição, pag. 186. [4] Pedro Romano Martinez. O Subcontrato, pág. 36. [5] Ob. Cit., pag. 81. [6] Ob. cit. pag. 84. [7] Ob. cit. pag. 84. [8] Pedro Romano Martinez, “O subcontrato”, pag. 37. [9] L. Carvalho Fernandes, ob. cit., pag. 80. [10] L. Carvalho Fernandes, ob. cit., pag. 81. [11] Neste sentido, Ac. da Relação de Guimarães de 30.09.2021, disponível em www.dgsi.pt. [12] L. Carvalho Fernandes, ob. cit., pag. 82. [13] In Contrato de Empreitada, pag. 189. [14] In Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, pag. 48 [15] In Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, pag. 58 [16] Neste sentido, também, o Acórdão da Relação de Lisboa de 21.02.2013, disponível em www.dgsi.pt. [17] Ob. cit., pag. 55. |