Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1227/19.6YIPRT.G1
Relator: JOSÉ CRAVO
Descritores: CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
REVOGAÇÃO
EXCLUSIVIDADE
CLÁUSULA CONTRATUAL GERAL
COMUNICAÇÃO
INFORMAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/27/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I- O preceituado no art. 640 do CPC em conjugação com o que se dispõe no art. 662º do mesmo diploma legal permite a este Tribunal de instância julgar a matéria de facto.

II- O Tribunal da Relação pode alterar a matéria de facto fixada dentro do respeito pelo princípio da livre apreciação das provas, atribuído ao julgador em 1.ª instância e dentro do restrito papel da Relação, em sede de reapreciação da matéria de facto, aos casos excepcionais de manifesto erro na apreciação da prova, de flagrante desconformidade entre os elementos probatórios disponíveis e a decisão do tribunal recorrido sobre matéria de facto.

III- Salvo estipulação em contrário, o contrato de mediação imobiliária deve considerar-se revogável.

IV- O regime jurídico da mediação imobiliária não impõe a sujeição da mediação ao regime de exclusividade, nem prevê a aplicação desse regime no caso de silêncio das partes.

V- A cláusula contratual geral aposta num contrato de mediação imobiliária que sujeita o contrato a exclusividade não cabe na previsão da al. a) do art. 3º da LCCG.

VI- Não se mostram satisfeitas as exigências de comunicação e de informação das cláusulas ao contraente aderente, no que concerne à obrigação de pagamento da remuneração à mediadora em regime de exclusividade se o aderente desistir de negócio para o qual a mediadora encontrara interessado, se no contrato de mediação imobiliária:
a) O texto expresso no contrato só reportava o pagamento da remuneração aos momentos de concretização efetiva do negócio mediado;
b) Quanto aos efeitos da contratação da mediadora em regime de exclusividade, no contrato apenas se afirma que “Nos termos da legislação aplicável, quando o contrato é celebrado em regime de exclusividade só a Mediadora contratada tem o direito de promover o negócio objecto do contrato de mediação durante o respectivo período de vigência” (nº 2 da cláusula 4ª), omitindo-se, afinal, o efeito mais relevante e gravoso para o cliente-aderente, que é a sujeição à obrigação de pagamento da remuneração no caso de desistência da celebração de contrato com cliente angariado pela mediadora.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães
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1 RELATÓRIO

Imobiliária ..., Mediação Imobiliária Sociedade Unipessoal Ldª, com sede em Guimarães, intentou contra A. M., residente em Guimarães, injunção que seguiu os seus termos como acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias, destinada a obter a condenação desta no pagamento da quantia de € 11.114,50, devida por serviços de mediação imobiliária, correspondentes a € 8,750.00 (oito mil setecentos e cinquenta euros), aos quais acrescem o Iva à taxa legal de 23%, totalizando o valor final de € 10,762.50 (dez mil e setecentos e sessenta e dois euros e cinquenta cêntimos), a título de remuneração.
Alegou, em síntese, que a R. fez cessar o contrato numa altura em que existia um negócio em carteira, pelo que é devida a remuneração.

A R. deduziu oposição, concluindo pela improcedência do pedido, alegando que só estaria interessada na venda, quando a agência encontrasse uma casa para mudar, e, por a A. não mostrar interesse nesta procura, deu-lhe conhecimento verbal que já não tinha interesse na venda, em setembro de 2018 e por carta registada com aviso de receção, de 10 de outubro de 2018, denunciou também por escrito o contrato de mediação imobiliária celebrado, não tendo havido qualquer proposta ou celebração de contrato promessa, que importasse o pagamento da comissão.
Acrescenta que o contrato celebrado não foi nessas cláusulas sujeito a qualquer negociação, e que se omitiu o efeito mais relevante e gravoso para o cliente aderente, que era a sujeição à obrigação de pagamento da remuneração no caso de desistência da celebração de contrato com cliente angariado pela mediadora, pelo que é proibida e excluída ao abrigo do princípio da boa-fé.

A A. apresentou resposta por escrito e conclui pela improcedência da exceção, alegando que a R. conhecia todas as cláusulas contratuais.

Em virtude da oposição apresentada, os autos foram, como já supra referido, remetidos à distribuição como acção (1) declarativa especial para cumprimento de obrigações.

Foi designada data para a audiência de julgamento, a qual decorreu com observância do pertinente formalismo legal.

No final, foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente, por não provada, tendo em consequência absolvido a R. A. M. do pedido e condenado a A. nas custas.
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Inconformada com essa sentença, apresentou a A. Imobiliária ..., Mediação Imobiliária Sociedade Unipessoal Ldª recurso de apelação contra a mesma, cujas alegações finalizou com a apresentação das seguintes conclusões:

PRIMEIRA: O ponto 4. da matéria de facto considerada como provada na sentença recorrida deve ser alterado porque:
- Quem enviou a carta em causa foi a ré e não a autora;
- A carta em causa não configura uma denúncia, mas antes a resolução ou revogação unilateral do contrato de mediação;
- O conceito jurídico de denúncia nunca deveria constar como facto provado.
SEGUNDA: Em consequência, do ponto 4. da matéria de facto deve constar a remessa, pela ré à autora, da carta junta a fls. 37 e do respetivo teor.
TERCEIRA: Parte dos factos considerados como provados no ponto 6. da matéria de facto estão em contradição com a fundamentação na medida em que se dá como provado que a ré pretendia, em simultâneo, vender uma casa e comprar outra e na fundamentação consta, designadamente que, «não havia qualquer hipótese de comprar antes de vender, uma vez que não tinha quantia disponível, nem sequer para sinalizar, e seria o dinheiro da venda o utilizado, sem recurso a crédito».
QUARTA: Assim, do ponto 4. da matéria de facto deve constar, apenas o seguinte: «A ré pretendia comprar outra habitação, o que foi transmitido à autora».
QUINTA: O ponto 9. da matéria de facto não deve ser considerado como provado, tendo em conta os seguintes meios de prova:
• Depoimento da requerida A. M., prestado no dia 23.09.2019, gravado com início às 14:57:17 e termo às 15:35:29, ficheiro 20190923145715_5672120_2870583.wma – 00:00:01 a 00:38:12 – sobretudo as passagens 17:05, 17:20, 18:01 18:13 e 17:20;
• Depoimento da testemunha R. A., prestado no dia 23.09.2019, com início às 16:13:52 e termo às 17:37:09, ficheiro 20190923161351_5672120_2870583.wma – 00:00:01 a 00:23:17 – sobretudo as passagens ao minuto 3:54, 4:02, 4:24, 4:29, 4:45, 4:58, 5:04, 5:07, 5:11, 5:13, 5:54 e 6:32;
• Depoimento de J. M., prestado no dia 23.09.2019, gravado
com início às 16:38:00 e termo às 16:55:07, ficheiro 20190923163758_5672120_2870583.wma – 00:00:01 a 00:17:08 – sobretudo as passagens 2:58, 3:04, 3:05, 3:06, 3:12, 3:24, 3:30, 3:34 e 3:43;
SEXTA: Resulta das al.s a) e b), do n.º 2, do art.º 5.º do C.P.C. que, mesmo que não alegados diretamente pelas partes, o juiz deve considerar os factos instrumentais que resultem da instrução da causa e os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar.
SÉTIMA: Porque fundamental para a boa decisão da causa, deveria ter sido considerado como provado o seguinte facto instrumental:
«Durante a execução do contrato de mediação, a autora aceitou vender o imóvel objeto de mediação por EUR 165.000,00».
OITAVA: Impõe que este facto seja considerado como provado, os seguintes meios de prova:
• Depoimento da requerida A. M., prestado no dia 23.09.2019, gravado com início às 14:57:17 e termo às 15:35:29, ficheiro 20190923145715_5672120_2870583.wma – 00:00:01 a 00:38:12 – sobretudo as passagens 27:50, 27:58, 28:02, 28:04, 28:07, 34:15 a 37:57;
• Depoimento da testemunha R. A., prestado no dia 23.09.2019, com início às 16:13:52 e termo às 17:37:09, ficheiro 20190923161351_5672120_2870583.wma – 00:00:01 a 00:23:17 – sobretudo as passagens ao minuto 12:57 a 13:55;
NONA: Também, como facto instrumental, deverá acrescer à matéria de facto o seguinte:
«O contrato de mediação referido em 1. foi lido e o respetivo conteúdo foi explicado à autora, à qual foi dada a hipótese de pedir os esclarecimentos que tivesse por conveniente».

Impõe que este facto seja considerado como provado os seguintes meios de prova:

• Depoimento da requerida A. M., prestado no dia 23.09.2019, gravado com início às 14:57:17 e termo às 15:35:29, ficheiro 20190923145715_5672120_2870583.wma – 00:00:01 a 00:38:12 – sobretudo as passagens 17:05, 17:20, 18:01 18:13, 17:20 e 19:03 a 19:22;
• Depoimento da testemunha R. A., prestado no dia 23.09.2019, com início às 16:13:52 e termo às 17:37:09, ficheiro 20190923161351_5672120_2870583.wma – 00:00:01 a 00:23:17 – sobretudo as passagens ao minuto 3:54, 4:02, 4:24, 4:29, 4:45, 4:58, 5:04, 5:07, 5:11, 5:13, 5:54 e 6:32;
• Depoimento de J. M., prestado no dia 23.09.2019, gravado com início às 16:38:00 e termo às 16:55:07, ficheiro 20190923163758_5672120_2870583.wma – 00:00:01 a 00:17:08 – sobretudo as passagens 2:58, 3:04, 3:05, 3:06, 3:12, 3:24, 3:30, 3:34 e 3:43;
DÉCIMA: A ação foi julgada improcedente com um argumento que nem a ré invocou, isto é, que o valor da proposta de compra era inferior ao valor acordado contratualmente.
DÉCIMA PRIMEIRA: Mesmo que não se considere como provado que durante a execução do contrato de mediação, a autora aceitou vender o imóvel objeto de mediação por EUR 165.000,00, o valor da proposta não foi o motivo pelo qual a ré não aceitou a proposta.
DÉCIMA SEGUNDA: A ré, quando lhe foi apresentada uma proposta que, pelo menos, pouco tempo antes, ia de encontro aos seus desejos, desistiu da venda do imóvel, por, segundo escreveu na carta de resolução do contrato, ter perdido o interesse na venda «em resultado de alterações a nível pessoal e no setor imobiliário».
DÉCIMA TERCEIRA: Acontece que, a desistência ou a revogação unilateral dos serviços de mediação apenas surgiu no momento em que foi apresentada à ré uma concreta proposta, de acordo com o que exigia.
DÉCIMA QUARTA: Assim, a ré recusou a celebração do contrato com os interessados angariados pela autora, nas condições que a própria tinha imposto, pelo que, nos termos do disposto no art.º 799.º do Código Civil presume-se a respetiva culpa.
DÉCIMA QUINTA: A sentença recorrida violou ou não fez uma correta interpretação do disposto nos art.ºs 19.º da Lei 15/2013, de 08.02 e 798.º e 799.º do Código Civil.

Nestes termos e nos melhores doutamente supridos,
Deve o presente recurso ser julgado procedente e revogada a sentença recorrida, alterando a matéria de facto nos termos supra expostos. Deve, ainda, a ação ser julgada procedente em conformidade com o pedido formulado no requerimento de injunção.
Tudo como é de JUSTIÇA.
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Não consta dos autos terem sido apresentadas contra-alegações.
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A Exmª Juiz a quo proferiu despacho a admitir o interposto recurso, providenciando pela subida dos autos.
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Facultados os vistos aos Exmºs Adjuntos e nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir.
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2QUESTÕES A DECIDIR

Como resulta do disposto no art. 608º/2, ex. vi dos arts. 663º/2; 635º/4; 639º/1 a 3; 641º/2, b), todos do CPC, sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex officio, este Tribunal só poderá conhecer das que constem nas conclusões que, assim, definem e delimitam o objecto do recurso.

Consideradas as conclusões formuladas pela apelante, pretende que:

I - se altere a matéria de facto quanto ao decidido no ponto 4. dos factos provados, que entende dever ter outro teor (conclusões e );
II - se altere a matéria de facto quanto ao decidido no ponto 6. dos factos provados, que entende dever ter outro teor (conclusões e );
III - se altere a matéria de facto quanto ao decidido no ponto 9. dos factos provados, que entende não se ter provado (conclusão );
IV - se adite à matéria de facto provada, um novo facto cujo teor indica (conclusões e );
V - se adite à matéria de facto provada, mais um novo facto cujo teor indica (conclusão );
VI – reapreciação da decisão de mérito da acção (conclusões 10ª a 15ª).
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3 – OS FACTOS

A - Factos Provados

Resultaram provados os seguintes factos:

1.º Por contrato denominado de mediação imobiliária, celebrado a 13 de abril de 2017, a Autora obrigou-se a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra, pelo preço de 175.000,00 (cento e setenta e cinco mil euros), do prédio propriedade da Ré, prédio urbano, destinado a uma habitação, composto por cinco assoalhadas, sito na freguesia de …, concelho de Guimarães, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ….
2.º De acordo com a cláusula 4.ª, a Ré contratou a mediadora, aqui Autora, em regime de exclusividade, constando do n.º 2 que “quando o contrato é celebrado em regime de exclusividade só a mediadora contratada tem o direito de promover o negócio objeto do contrato de mediação durante o respetivo período de vigência”.
3.º O prazo de duração do contrato celebrado era de 12 meses contados a partir da sua data de celebração, renovando-se automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, não sendo denunciado por qualquer das partes contratantes através de carta registada com aviso de receção ou por outro meio equivalente, com antecedência mínima de dez dias em relação ao seu termo.
4.º A Autora, por carta registada datada de 10 de outubro de 2018, veio denunciar o contrato, com efeitos imediatos, deixando de ter interesse na venda do imóvel.
5.º Em meados de setembro foi apresentada uma proposta para aquisição do imóvel por 165.000 €, tendo sido dado prazo para a Ré aceitar, tendo esta logo recusado, afirmando que já não tinha interesse no negócio, pois não tinha ainda para onde ir morar e que as condições de vida mudaram.
6.º A Ré pretendia comprar outra casa de habitação, pretendendo mudar na mesma ocasião da venda, o que foi transmitido à Autora.
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7.º Nos termos da cláusula 2.ª, n.º 3 “O vendedor obriga-se a pagar à mediadora a título de remuneração da percentagem de 5% calculada sobre o preço pelo qual o negócio é efetivamente concretizado, sendo que este valor nunca poderá ser inferior a € 3.000,00 (três mil euros), exceto se for arrendamento, em que o valor da remuneração será igual ao valor de uma renda, valores esses a que acresce o IVA à taxa legal.
8.º O documento subscrito pelas partes como contrato é um impresso com texto pré-escrito, com alguns espaços em branco para ajustamento ao caso concreto, tais como para a identificação das partes, do imóvel a transacionar, identificação do negócio a mediar e indicação do respetivo preço, valor da remuneração e modo do seu pagamento, sendo o resto inalterável e utilizado para todos os clientes.
9.º A Autora não informou a Ré que seria igualmente devida a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação, não se concretizasse por causa imputável ao cliente proprietário.
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B - Factos Não Provados

Não resultaram provados outros factos relevantes, excluindo considerações, conclusões jurídicas, designadamente que o contrato ficou sujeito à condição de a Autora encontrar imóvel para a Ré comprar; que a Ré foi informada que, em virtude da existência da cláusula de exclusividade, a desistência de uma venda implicaria a cobrança da remuneração.
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C – Motivação

A convicção do Tribunal, que permitiu concluir pela prova dos factos que antecedem, tomou por base a ponderação crítica e confronto entre os meios de prova produzidos, as regras da experiência e o senso comum, tendo em conta as regras próprias da repartição do ónus da prova.
Em primeiro lugar, e atendendo à contestação e petição, resultaram provados por acordo os factos indicados nos artigos 1.º a 4.º e 7.º, no que se refere à celebração do contrato de mediação com a Ré e denúncia do contrato, atendendo ainda aos documentos juntos, contrato de mediação imobiliária junto a fls. 31 e carta de denúncia a fls. 37.
No contrato escrito não ficou estipulada qualquer cláusula, como se constata da simples leitura. Por outro lado, do confronto dos depoimentos da Autora e da comercial que celebrou o contrato em nome da Autora, R. A., podemos concluir que, a Ré falou logo que precisava de um apartamento para morar, mas não havia qualquer hipótese de comprar antes de vender, uma vez que não tinha quantia disponível, nem sequer para sinalizar, e seria o dinheiro da venda o utilizado, sem recurso a crédito.
Assim, afigura-se-nos lógico que a Ré teria de vender o seu imóvel antes de comprar um novo, ainda que com um período mais alargado entre a celebração do contrato promessa e a venda, de molde a permitir sinalizar uma compra, pelo que, além de não ficar a constar do documento escrito, a condição não seria sequer possível.
Por outro lado, a própria Ré veio reconhecer que, não ficando estipulado entre as partes, poderia ir procurando por si ou por outros terceiros um novo apartamento.
O depoimento destas pessoas foi também coincidente no facto de o contrato já se encontrar escrito, encontrando-se apenas com alguns espaços para negociar ou simplesmente preencher, como também se pode concluir da simples análise do documento, sendo que a cláusula de exclusividade não é suscetível de negociação entre as partes, sendo sempre colocada no contrato utilizado pela Autora.
Por ambas foi descrita de forma coincidente que os termos do contrato foram lidos e explicados, sendo que não consta dos termos do contrato que a remuneração seria devida se houvesse desistência da celebração de um contrato, pelo que negado também pelo filho da Ré (que também estaria presente na altura da negociação), não se pode considerar que a Ré foi informada e esclarecida, tanto mais que se nos afigurou como sincero o depoimento quando afirmou que apenas depois de desistir é que tal lhe foi dito – incumbindo o ónus de tal comunicação e informação à Ré tal não se pode dar como provado.
A questão final prendia-se com a existência de um interessado e os termos dessa negociação, tendo sido relevante o depoimento consistente e coerente da própria Ré, do interessado, C. C. e do mediador, P. F.. Foram agendadas reuniões para acertar os termos do negócio com a Ré, mas esta antes mesmo de se encontrar com os interessados, manifestou a vontade de desistir, tendo depois remetido a denúncia escrita.
Os factos relevantes não provados, excluindo matéria de direito e conclusiva e outros factos instrumentais, resultaram de não se ter realizado qualquer prova sobre os mesmos.

[transcrição dos autos].
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4 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO E DE DIREITO

I) - Alteração da matéria de facto: outro teor para o ponto 4. dos factos provados (conclusões e )

Diverge a apelante da decisão da matéria de facto quanto ao decidido no ponto 4. dos factos provados, propondo a correcção do seu teor.
Indica o sentido da decisão e os elementos de prova em que fundamenta o seu dissenso, indicando o documento pertinente (carta junta a fls. 37).
Mostram-se, assim, cumpridos todos os ónus impostos pelo art. 640º do CPC, não só os que constam das três alíneas do n.º 1 como igualmente o imposto pela alínea a) do n.º 2.
Cumpre, pois, apreciar.
O art. 662º do actual CPC regula a reapreciação da decisão da matéria de facto de uma forma mais ampla que o art. 712º do anterior Código, configurando-a praticamente como um novo julgamento.
Assim, a alteração da decisão sobre a matéria de facto é agora um poder vinculado, verificado que seja o circunstancialismo referido no nº 1, quando os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
A intenção do legislador foi, como fez constar da “Exposição de Motivos”, a de reforçar os poderes da Relação no que toca à reapreciação da matéria de facto.
Assim, mantendo-se os poderes cassatórios que permitem à Relação anular a decisão recorrida, nos termos referidos na alínea c), do nº 2, e sem prejuízo de se ordenar a devolução dos autos ao tribunal da 1ª. Instância, reconheceu à Relação o poder/dever de investigação oficiosa, devendo realizar as diligências de renovação da prova e de produção de novos meios de prova, com vista ao apuramento da verdade material dos factos, pressuposto que é de uma decisão justa.
As regras de julgamento a que deve obedecer a Relação são as mesmas que devem ser observadas pelo tribunal da 1ª. Instância: tomar-se-ão em consideração os factos admitidos por acordo, os que estiverem provados por documentos (que tenham força probatória plena) ou por confissão, desde que tenha sido reduzida a escrito, extraindo-se dos factos que forem apurados as presunções legais e as presunções judiciais, advindas das regras da experiência, sendo que o princípio basilar continua a ser o da livre apreciação das provas, relativamente aos documentos sem valor probatório pleno, aos relatórios periciais, aos depoimentos das testemunhas, e agora inequivocamente, às declarações da parte – cfr. arts. 466º/3 e 607º/4 e 5 do CPC, que não contrariam o que acerca dos meios de prova se dispõe nos arts. 341º a 396º do CC.
Deste modo, é assim inequívoco que a Relação aprecia livremente todas as provas carreadas para os autos, valora-as e pondera-as, recorrendo às regras da experiência, aos critérios da lógica, aos seus próprios conhecimentos das pessoas e das coisas, socorrendo-se delas para formar a sua convicção.
Provar significa demonstrar, de modo que não seja susceptível de refutação, a verdade do facto alegado. Nesse sentido, as partes, através de documentos, de testemunhas, de indícios, de presunções etc., demonstram a existência de certos factos passados, tornando-os presentes, a fim de que o juiz possa formar um juízo, para dizer quem tem razão.
Como dispõe o art. 341º do CC, as provas têm por função a demonstração da realidade dos factos.
E, como ensina Manuel de Andrade (2), aquele preceito legal refere-se à prova “como resultado”, isto é, “a demonstração efectiva (…) da realidade dum facto – da veracidade da correspondente afirmação”.
Não se exige que a demonstração conduza a uma verdade absoluta (objetivo que seria impossível de atingir) mas tão-só a “um alto grau de probabilidade, suficiente para as necessidades práticas da vida”.
Quem tem o ónus da prova de um facto tem de conseguir “criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto”, como escreve Antunes Varela (3).
Na situação sub judicio os factos em investigação admitem a prova testemunhal.
Ora, como acima se referiu, o valor probatório dos depoimentos das testemunhas, nos termos do disposto no art. 396º do CC, está sujeito à livre (e conscienciosa) apreciação do julgador.
Sendo admitida prova testemunhal (e na medida em que o seja), é igualmente permitido o recurso às presunções judiciais, de acordo com o disposto no art. 351º do CC, que são ilações que o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido – cfr. art. 349º, ainda do C C
O julgador, usando as regras da experiência comum, do que, em circunstâncias idênticas normalmente acontece, interpreta os factos provados e conclui que, tal como naquelas, também nesta, que está a apreciar, as coisas se passaram do mesmo modo.
Como ensinou Vaz Serra (4) “ao procurar formar a sua convicção acerca dos factos relevantes para a decisão, pode o juiz utilizar a experiência da vida, da qual resulta que um facto é a consequência típica de outro; procede então mediante uma presunção ou regra da experiência, ou de uma prova de primeira aparência”.
Ou seja, o juiz, provado um facto e valendo-se das regras da experiência, conclui que esse facto revela a existência de outro facto.
O juiz aprecia livremente as provas e decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto – cfr. art. 607º/5 do CPC, cabendo a quem tem o ónus da prova “criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto”, como refere Antunes Varela (5).
Se se instalar a dúvida sobre a realidade de um facto e a dúvida não possa ser removida, ela resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita, de acordo com o princípio plasmado no art. 414º do CPC, que, no essencial, confirma o que, sobre a contraprova, consta do art. 346º do CC.
De acordo com o que acima ficou exposto, cumpre, pois, reapreciar a prova e verificar se dela resulta, com o grau de certeza exigível para fundamentar a convicção, o que a apelante pretende neste recurso.
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Como já referido supra, pretende a apelante a alteração do teor do ponto 4. dos factos provados.
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Vejamos então o facto em questão.

A Meritíssima Juiz a quo considerou provado entre outros que:

4.º A Autora, por carta registada datada de 10 de outubro de 2018, veio denunciar o contrato, com efeitos imediatos, deixando de ter interesse na venda do imóvel.

Na motivando de tal decisão, o tribunal consignou o seguinte:

A convicção do Tribunal, que permitiu concluir pela prova dos factos que antecedem, tomou por base a ponderação crítica e confronto entre os meios de prova produzidos, as regras da experiência e o senso comum, tendo em conta as regras próprias da repartição do ónus da prova.
Em primeiro lugar, e atendendo à contestação e petição, resultaram provados por acordo os factos indicados nos artigos 1.º a 4.º e 7.º, no que se refere à celebração do contrato de mediação com a Ré e denúncia do contrato, atendendo ainda aos documentos juntos, contrato de mediação imobiliária junto a fls. 31 e carta de denúncia a fls. 37.
Com o que discorda a apelante, que pretende a alteração do teor do ponto 4. dos factos provados, de forma a constar a remessa, pela R. à A., da carta junta a fls. 37 e do respetivo teor. Isto porque, desde logo, existe um lapso de escrita, já que quem enviou a carta em causa foi a ré e não a autora; depois porque a carta em causa não configura uma denúncia, mas antes a resolução ou revogação unilateral do contrato de mediação, pelo que o conceito jurídico de denúncia nunca deveria constar como facto provado.

Quid iuris?

Antes de mais, diga-se que tem razão a apelante quanto ao lapso de escrita, já que, como melhor resulta da referida carta junta a fls. 37, quem a enviou foi a R. e não a A. O que configura um manifesto lapso de escrita, susceptível de rectificação (cfr. art. 614º do CPC) e não um erro de julgamento. Rectificação que se fará infra.
Já quanto à questão do conceito jurídico, que não deve constar como facto provado por estar incorrecto, pois a carta em causa não configura uma denúncia, mas antes a resolução ou revogação unilateral do contrato de mediação, existe alguma confusão por parte da apelante. Efectivamente, estando em causa um facto, traduz o mesmo o conteúdo da ocorrência em causa, pois na carta enviada pela R., é esta que refere expressamente pretender com a dita carta denunciar o referido Contrato de Mediação Imobiliária celebrado a 13 de abril de 2017, com efeitos imediatos, pois devido a alterações a nível pessoal bem como as sentidas no setor imobiliário, deixei de ter interesse na venda do identificado imóvel. Ora, se a carta em causa não configura uma denúncia, mas antes a resolução ou revogação unilateral do contrato de mediação, já é questão de direito, assim tendo sido considerado na sentença, como melhor resulta de fls. 7, nos 3º e 4º § (6). Logo, a apelante vem suscitar uma falsa questão, já que não reflectida na decisão jurídica da causa.
Todavia, para obstar a qualquer dúvida, admitindo-se que a redacção dada ao ponto em causa não satisfaça plenamente, além da referida rectificação do ponto 4. em causa, será dado nova redacção ao mesmo, de forma a que não se suscitem quaisquer equívocos.
Logo, porque todos os elementos convocados pelo tribunal a quo constam do processo, e porque se entende que da sua conjugação e devida ponderação se impõe a revaloração correspondente (cfr. art. 662º/1 do CPC), entende-se dar ao ponto 4. da matéria de facto provada o seguinte teor:
4.º A Ré, por carta registada enviada à Autora e datada de 10 de outubro de 2018, refere pretender denunciar o contrato referido em 1., com efeitos imediatos, pois deixara de ter interesse na venda do imóvel.

II) - Alteração da matéria de facto: outro teor para o ponto 6. dos factos provados (conclusões e )

Diverge a apelante da decisão da matéria de facto quanto ao decidido no ponto 6. dos factos provados, propondo a correcção do seu teor.
Indica o sentido da decisão e os elementos em que fundamenta o seu dissenso, in casu, a contradição com a respectiva fundamentação.
Mostram-se, assim, cumpridos todos os ónus impostos pelo art. 640º do CPC, não só os que constam das três alíneas do n.º 1 como igualmente o imposto pela alínea a) do n.º 2.
Cumpre, pois, apreciar.
Como já referido, pretende a apelante a alteração do teor do ponto 6. dos factos provados.
Mas vejamos o facto em causa.

A Meritíssima Juiz a quo considerou provado entre outros que:

6.º A Ré pretendia comprar outra casa de habitação, pretendendo mudar na mesma ocasião da venda, o que foi transmitido à Autora.

Na motivando de tal decisão, o tribunal consignou o seguinte:

No contrato escrito não ficou estipulada qualquer cláusula, como se constata da simples leitura. Por outro lado, do confronto dos depoimentos da Autora e da comercial que celebrou o contrato em nome da Autora, R. A., podemos concluir que, a Ré falou logo que precisava de um apartamento para morar, mas não havia qualquer hipótese de comprar antes de vender, uma vez que não tinha quantia disponível, nem sequer para sinalizar, e seria o dinheiro da venda o utilizado, sem recurso a crédito.
Assim, afigura-se-nos lógico que a Ré teria de vender o seu imóvel antes de comprar um novo, ainda que com um período mais alargado entre a celebração do contrato promessa e a venda, de molde a permitir sinalizar uma compra, pelo que, além de não ficar a constar do documento escrito, a condição não seria sequer possível.
Por outro lado, a própria Ré veio reconhecer que, não ficando estipulado entre as partes, poderia ir procurando por si ou por outros terceiros um novo apartamento.
Com o que discorda a apelante, que pretende a alteração do teor do ponto 6. (7) dos factos provados, pois parte dos factos considerados como provados no ponto 6 da matéria de facto estão em contradição com a fundamentação na medida em que se dá como provado que a ré pretendia, em simultâneo, vender uma casa e comprar outra e na fundamentação consta, designadamente que, «não havia qualquer hipótese de comprar antes de vender, uma vez que não tinha quantia disponível, nem sequer para sinalizar, e seria o dinheiro da venda o utilizado, sem recurso a crédito». Pretende, pois, que do ponto 6. conste apenas o seguinte: «A ré pretendia comprar outra habitação, o que foi transmitido à autora».
Que dizer?
Começa-se já por dizer que a questão suscitada não é a que está consignada na sentença recorrida. Inexistindo, pois, qualquer contradição entre o que está consignado no ponto 6. e o que consta da fundamentação. Isto porque, se o que consta da fundamentação não suscita qualquer dúvida nem é questionado pela recorrente, o que consta consignado no ponto 6. era a pretensão da R. que a própria transmitiu à A., ainda que tal não fosse exequível, tal como lhe foi explicado e a mesma entendeu (não poderia comprar sem vender primeiro, atendendo a que não tinha quantia disponível, nem sequer para sinalizar).
Como assim e sem necessidade de mais considerações, porque não ocorre qualquer contradição, não procede a impugnação desta matéria de facto.

III) - Alteração da matéria de facto: eliminação do ponto 9. dos factos provados (conclusão )

Diverge a apelante da decisão da matéria de facto quanto ao decidido no ponto 9. dos factos provados, que entende não se ter provado.
Indica o sentido da decisão e os elementos de prova em que fundamenta o seu dissenso, transcrevendo e indicando os trechos dos depoimentos das testemunhas R. A. e J. M. e das declarações de parte da requerida A. M., em que se baseia.
Mostram-se, assim, cumpridos todos os ónus impostos pelo art. 640º do CPC, não só os que constam das três alíneas do n.º 1 como igualmente o imposto pela alínea a) do n.º 2.
Cumpre, pois, apreciar.
Como já referido, pretende a apelante a eliminação do ponto 9. dos factos provados, que entende não se ter provado.
Mas vejamos o facto em causa.

A Meritíssima Juiz a quo considerou provado entre outros que:

9.º A Autora não informou a Ré que seria igualmente devida a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação, não se concretizasse por causa imputável ao cliente proprietário.

Na motivando de tal decisão, o tribunal consignou o seguinte:

Por ambas foi descrita de forma coincidente que os termos do contrato foram lidos e explicados, sendo que não consta dos termos do contrato que a remuneração seria devida se houvesse desistência da celebração de um contrato, pelo que negado também pelo filho da Ré (que também estaria presente na altura da negociação), não se pode considerar que a Ré foi informada e esclarecida, tanto mais que se nos afigurou como sincero o depoimento quando afirmou que apenas depois de desistir é que tal lhe foi dito – incumbindo o ónus de tal comunicação e informação à Ré tal não se pode dar como provado.
Com o que discorda a apelante, que entende não dever ser considerado como provado tal ponto 9., tendo em conta os supra indicados meios de prova.

Quid iuris?

Diga-se, desde já, impor-se a eliminação deste ponto 9. dos factos provados, ainda que por razões diferentes das invocadas pela recorrente, a quem não assiste qualquer razão.
Com efeito, revisitada a respectiva prova produzida, in casu, ouviram-se as gravações integrais dos depoimentos das testemunhas R. A. e J. M. e das declarações de parte da requerida A. M., quanto à factualidade aqui em questão, não se adquiriu convicção diferente daquela obtida pelo tribunal da 1ª instância, isto é, tal como já consta dos factos não provados e a recorrente não pôs em causa, que a Ré tivesse sido informada que, em virtude da existência da cláusula de exclusividade, a desistência de uma venda implicaria a cobrança da remuneração. É que, como melhor se expõe infra em VI) - Reapreciação da decisão de mérito da acção, sendo sobre o contratante que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais – estando o adoptado regime da exclusividade sujeito ao controlo próprio da LCCG –, que cabe o “ónus da prova da comunicação adequada e efectiva” (nº 3 do art. 5º da LCCG), não logrou a A. fazer essa prova. Logo, incumbindo a prova dos factos constitutivos, sejam eles positivos ou negativos, à parte que invoca o direito, não tendo logrado a A. fazer essa prova como já resulta dos factos não provados, também não tem de constar dos factos provados o correspectivo facto negativo, como se estivesse em causa um facto impeditivo do direito da A. e o ónus da prova coubesse à R. (cfr. art. 342º/2 do CC).

Em suma, temos, pois, que não se apurou que a A. tivesse informado a R. que a remuneração também seria devida se o negócio visado no contrato de mediação não se concretizasse por causa imputável ao cliente proprietário, ou seja, se houvesse desistência da celebração de um contrato por parte da R., já que o facto em causa é o resultado conjugado de toda a prova produzida em audiência de julgamento, tal como particularmente consignado na motivação relativamente a esta questão. É que, sendo consensual que os termos do contrato de mediação imobiliária foram lidos e explicados à R., não constam do contrato os efeitos para a empresa e para o cliente decorrentes do regime de exclusividade adoptado, para além do referido no n.º 2 que “quando o contrato é celebrado em regime de exclusividade só a mediadora contratada tem o direito de promover o negócio objeto do contrato de mediação durante o respetivo período de vigência”. Assim, face à convincente negação da R. nas suas declarações de parte relativamente à específica questão da informação sobre a remuneração em caso de desistência, o que foi confirmado pela testemunha J. M. que estava presente aquando da celebração do contrato e tendo sido genérico o depoimento da testemunha R. A. – estando a ser celebrado um contrato de mediação imobiliária para a venda de uma casa da R., explicou a esta em que consistia o regime de exclusividade, o que não é bastante para se incluir a específica questão da não concretização por causa imputável ao cliente proprietário –, não se pode considerar que a R. tenha sido concretamente informada e esclarecida quanto a esta particular questão.
Temos, pois, que a apelante, no essencial, dissente da decisão, louvando-se na sua divergência sobre a apreciação e valoração da prova. No que não tem razão, pois, como perfeitamente resulta dos autos, quer na motivação da decisão sobre a matéria de facto, quer na fundamentação jurídica, o tribunal recorrido elencou de forma clara e exaustiva os seus argumentos, com os quais se concorda.
Logo, porque todos os elementos convocados pelo tribunal a quo constam do processo e foram devidamente ponderados, constando já dos factos não provados que a Ré tivesse sido informada que, em virtude da existência da cláusula de exclusividade, a desistência de uma venda implicaria a cobrança da remuneração, entende-se eliminar o ponto 9. dos factos provados.

IV) - Alteração da matéria de facto: ser aditada à matéria de facto provada, um novo facto cujo teor indica (conclusões e )

Porque fundamental para a boa decisão da causa, a apelante entende que devia ter sido dado como provado o seguinte facto:

«Durante a execução do contrato de mediação, a ré (8) aceitou vender o imóvel objeto de mediação por € 165.000,00».

Indica o sentido da decisão e os elementos de prova em que fundamenta o seu dissenso, transcrevendo e indicando os trechos do depoimento da testemunha R. A. e das declarações de parte da requerida A. M., em que se baseia.
Mostram-se, assim, cumpridos todos os ónus impostos pelo art. 640º do CPC.
Cumpre, pois, apreciar.
Como já referido, porque fundamental para a boa decisão da causa e ter resultado da sua instrução, nos termos do art. 5º/2 do CPC, pretende a apelante que seja aditado à matéria de facto provada, um novo facto com o teor supra indicado.
Assentando a sua pretensão no depoimento da testemunha R. A. e nas declarações de parte da requerida A. M..
Quid iuris?

Pretende a recorrente que se dê como provado que Durante a execução do contrato de mediação, a ré aceitou vender o imóvel objeto de mediação por € 165.000,00.
No que tem razão, já que tal facto resultou efectivamente da instrução da causa. Sendo que tal facto ajuda a entender o ponto 5. dos factos provados em face do teor do ponto 1. e é pertinente para o cálculo da remuneração da percentagem dos 5% a que se alude no ponto 7. dos factos provados.
Com efeito, revisitada a respectiva prova produzida e tal como bem referido pela apelante, resultou quer do depoimento da testemunha R. A., quer das declarações de parte da requerida A. M., que durante a execução do contrato de mediação, a ré aceitou vender o imóvel objeto de mediação por € 165.000,00, pois decorrido largo tempo (veja-se que a execução do contrato de mediação se prolongou por mais de 17 meses) lhe foi dito que não estamos a conseguir vender, vamos baixar a ver se conseguimos, (…). Não fazendo qualquer sentido o raciocínio da recorrida que tal baixa de valor fora para um concreto negócio, negócio esse que não logrou concretizar, nem se apurou, tendo antes resultado que a baixa do valor aceite pela recorrida se destinava a encontrar interessados o que até aí se não revelara possível.
Logo, porque todos os elementos convocados pelo tribunal a quo constam do processo, e porque se entende que da sua conjugação e devida ponderação se impõe a revaloração correspondente (cfr. art. 662º/1 do CPC), entende-se aditar o ponto 9. à matéria de facto provada, com o seguinte teor:
9.º Durante a execução do contrato de mediação, a ré aceitou vender o imóvel objeto de mediação por € 165.000,00.

V) - Alteração da matéria de facto: ser aditada à matéria de facto provada, mais um facto cujo teor indica (conclusão )

Porque fundamental para a boa decisão da causa, a apelante entende que também devia ter sido dado como provado o seguinte facto:

«O contrato de mediação referido em 1. foi lido e o respetivo conteúdo foi explicado à ré (9), à qual foi dada a hipótese de pedir os esclarecimentos que tivesse por conveniente».
Indica o sentido da decisão e os elementos de prova em que fundamenta o seu dissenso, transcrevendo e indicando os trechos dos depoimentos das testemunhas R. A. e J. M. e das declarações de parte da requerida A. M., em que se baseia.
Mostram-se, assim, cumpridos todos os ónus impostos pelo art. 640º do CPC.
Cumpre, pois, apreciar.
Como já referido, porque fundamental para a boa decisão da causa e ter resultado da sua instrução, nos termos do art. 5º/2 do CPC, pretende a apelante que seja aditado à matéria de facto provada, um outro facto com o teor supra indicado.
Assentando a sua pretensão no depoimento das testemunhas R. A. e J. M., bem como nas declarações de parte da requerida A. M..
Quid iuris?

Pretende a recorrente que se dê como provado que O contrato de mediação referido em 1. foi lido e o respetivo conteúdo foi explicado à ré, à qual foi dada a hipótese de pedir os esclarecimentos que tivesse por conveniente.
Este facto é consensual, pois sem constar do elenco dos factos provados, consta já da motivação, por referência à testemunha R. A. e requerida A. M. que O depoimento destas pessoas foi também coincidente no facto de o contrato já se encontrar escrito, encontrando-se apenas com alguns espaços para negociar ou simplesmente preencher, como também se pode concluir da simples análise do documento, sendo que a cláusula de exclusividade não é suscetível de negociação entre as partes, sendo sempre colocada no contrato utilizado pela Autora. Por ambas foi descrita de forma coincidente que os termos do contrato foram lidos e explicados, (…).
Todavia, entende-se que o facto em questão é inócuo, não se vislumbrando em que sentido possa ser fundamental para a boa decisão da causa, já que nada acrescenta, pois, não tendo a A. logrado provar que a Ré foi informada que, em virtude da existência da cláusula de exclusividade, a desistência de uma venda implicaria a cobrança da remuneração, como consta dos factos não provados, depois da leitura do contrato e explicação do seu conteúdo, que esclarecimentos se pretendia que a R. tivesse pedido para além da eventual insuficiente explicação de tal conteúdo?
Logo, porque se trata de facto sem qualquer interesse para a decisão da causa, entende-se nada haver aqui a aditar.

VI) - Reapreciação da decisão de mérito da acção

Fixada a matéria de facto, depois de se ter examinado a sua reapreciação conforme pretendido na apelação, levando em conta as conclusões do recurso, passemos agora à reapreciação da decisão de mérito da acção.
Estamos efectivamente perante um contrato de mediação imobiliária, contrato de prestação de serviço nominado, previsto e regulado pela Lei nº 15/2013, de 8-02 (vulgo RJAMI), onde a mediadora assume a incumbência, em nome dos seus clientes, de procurar destinatários para a realização de negócio sobre bens imóveis (art. 2º do RJAMI).
Trata-se de um contrato formal, que tem de ser reduzido obrigatoriamente a escrito e, nos termos do art. 16º/2 do RJAMI, além da forma escrita, do contrato têm de constar obrigatoriamente determinados elementos aí enunciados, nomeadamente, a referência ao regime de exclusividade, quando acordado, com especificação dos efeitos que do mesmo decorrem, quer para a empresa quer para o cliente [al. g)]. A não inclusão no contrato escrito do previsto em qualquer das alíneas deste nº 2, determina a nulidade do contrato, nos termos previstos no nº 5, “não podendo esta, contudo, ser invocada pela empresa de mediação”.

Suscitou a recorrente a questão do conceito jurídico de denúncia que constava do ponto 4. dos factos provados, já que a carta aí em causa não configura uma denúncia, mas antes a resolução ou revogação unilateral do contrato de mediação. O que leva á questão de saber se a recorrida podia “denunciar” unilateral e antecipadamente o contrato de mediação imobiliária.
Ora, um dos princípios que caracterizam o regime geral dos contratos é o princípio da força vinculativa ou da obrigatoriedade e está consagrado no art. 406º do CC: “o contrato deve ser pontualmente cumprido, e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei.” O princípio da força vinculativa desenvolve-se através de outros três princípios: o da pontualidade, e os da irretractabilidade ou da irrevogabilidade dos vínculos contratuais e da intangibilidade do seu conteúdo. Os dois últimos fundem-se no que também se designa por princípio da estabilidade dos contratos. (10)
Todavia, o próprio art. 406º/1 do CC prevê desvios justificados à regra clássica «pacta sunt servanda». Na verdade, a relação jurídica validamente surgida de um contrato é susceptível de extinguir-se por resolução, revogação ou denúncia. (11)
A denúncia consiste na manifestação da vontade de uma das partes, em contratos de prestações duradouras, dirigida à sua não renovação ou continuação. Apresenta, assim, duas características: é exclusiva dos contratos com prestações duradouras e deve fazer-se para o termo do prazo da renovação destes, salvo tratando-se de contratos por tempo indeterminado (12).
Por sua vez, a revogação consiste na destruição do vínculo contratual mediante uma declaração dos contraentes, oposta à primitiva que lhe deu vida. Ao lado da revogação que resulte de comum acordo das partes, admite-se a que seja feita apenas por uma delas. Mas ainda quando se trate de revogação unilateral, o instituto não se confunde com a resolução, visto que opera «ex nunc», ou seja, apenas para futuro (13).
Assim, chegamos à conclusão que, ao caso em apreço, melhor se adequa o conceito de revogação unilateral do contrato, em vez de denúncia. Esta, por definição, opera após o termo do prazo de vigência do contrato, evitando a sua renovação ou seja, a denúncia não pode ser antecipada, apenas a revogação é que poderá ser antecipada e unilateral.
Ora, a possibilidade de revogação do contrato naturalmente que é aplicável ao contrato de mediação imobiliária. “Salvo estipulação em contrário, o contrato de mediação deve considerar-se revogável. Não se trata de uma aplicação analógica das regras do mandato e da comissão, mas de uma consequência da própria natureza do contrato, tal como ela é de presumir ser querida pelos contraentes, pois parece de presumir que o autor do encargo, ao celebrar o contrato de mediação, não quer privar-se da faculdade de prescindir dos serviços do mediador, já que pode oferecer-se-lhe oportunidade de realizar o negócio sem intermediário, ou aparecer-lhe outro intermediário mais conveniente, ou perder a confiança que depositara no primeiro, ou desistir do propósito de concluir o negócio; por outro lado, desde que o mediador só adquire direito à remuneração quando o negócio é concluído por efeito da sua intervenção...e a conclusão depende do autor do encargo, tem este o direito de revogação” (14).
No caso em apreço, o termo do contrato, celebrado em 13 de Abril de 2017, por um prazo de doze meses, não tendo sido denunciado pela forma prevista (15), renovou-se em 13 de Abril de 2018.
Assim, a comunicação feita pela R. à A., em 10-10-2018, por carta registada, configura-se como uma revogação do contrato que se tinha renovado e que estaria em vigor, até 12 de Abril de 2019.
Em tese, como se disse supra, a revogação do contrato é legal.
Porém, vejamos o que diz VAZ SERRA, a propósito: “pois que a retribuição do corretor só é de pagar aquando da realização do contrato tido em vista, mas a conclusão depende da vontade do dador do encargo, tem o dador do encargo a liberdade de resolver outra coisa, especialmente de concluir o contrato de outro modo sem a ajuda deste corretor ou revogar o contrato de corretagem.
Todavia, a revogação não pode fazer-se com a intenção de prejudicar a pretensão de provisão do corretor. De contrário, é de pagar a provisão...” (16)
Assim, sendo em princípio admissível a revogação do contrato de mediação, não podem valer os seus efeitos no sentido de a parte que interveio no contrato de mediação se querer eximir ao pagamento estipulado quando, pelas circunstâncias do caso, se verifique que a denúncia não constituiu senão um expediente, porventura grosseiro, destinado a dar ao denunciante a aparente liberdade negocial de contratar com a pessoa angariada sem qualquer responsabilização face ao mediador angariante”. (17)
Ora, como resulta dos factos que ficaram provados, perante a proposta para aquisição do imóvel feita por um interessado angariado pela mediadora, a R. recusou-a logo, afirmando que já não tinha interesse no negócio, pois não tinha ainda para onde ir morar e que as condições de vida mudaram. Lembrando-se que a Ré pretendia comprar outra casa de habitação, pretendendo mudar na mesma ocasião da venda.
Inequivocamente, pois, que estamos, in casu, perante uma situação de revogação unilateral do contrato.

Sobre a questão da remuneração da empresa, resulta da matéria provada que entre a A. e a R. foi celebrado um contrato com as características supra referidas, ou seja, um contrato mediante o qual a A. se obrigou a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra de um determinado imóvel da R., pelo preço que inicialmente foi fixado em € 175.000,00, desenvolvendo para o efeito as necessárias acções de promoção e divulgação. Em contrapartida a R. obrigou-se a pagar à A., a título de remuneração, a quantia de 5% calculada sobre o preço pelo qual o negócio fosse efetivamente concretizado, sendo que este valor nunca poderia ser inferior a € 3.000,00, exceto se fosse arrendamento, em que o valor da remuneração seria igual ao valor de uma renda, valores esses a que acresceria o IVA à taxa legal (cfr. cláusula 2ª, nº 3). O contrato teria uma validade de 12 meses contados a partir da sua data de celebração, renovando-se automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, não sendo denunciado por qualquer das partes contratantes através de carta registada com aviso de receção ou por outro meio equivalente, com antecedência mínima de dez dias em relação ao seu termo.
O documento subscrito pelas partes como contrato é, como dele resulta (cfr. ponto 8. dos factos provados), um impresso com texto pré-escrito, com alguns espaços em branco para ajustamento ao caso concreto, tais como para a identificação das partes, do imóvel a transacionar, identificação do negócio a mediar e indicação do respetivo preço, valor da remuneração e modo do seu pagamento.
Aparenta ser um modelo contratual que a A. apresenta a todos os seus clientes, utilizando-o invariavelmente no exercício da sua atividade.
Nele consta uma cláusula 4ª, onde se prevê que o contrato é em regime de exclusividade e refere ainda no nº 2 “Nos termos da legislação aplicável, quando o contrato é celebrado em regime de exclusividade só a Mediadora contratada tem o direito de promover o negócio objecto do contrato de mediação durante o respectivo período de vigência.”.
Ora, face ao apurado, diga-se, desde já que o contrato sub judice é, pelo menos quanto às supra referidas cláusulas 2ª e 4ª, um contrato de adesão, devendo aplicar-se-lhe o regime jurídico das cláusulas contratuais gerais. Assim, impunha-se à A. o cumprimento dos deveres de comunicação e de informação prescritos nos artigos 5º e 6º do Decreto-Lei nº 446/85, de 25-10 (vulgo LCCG, com as alterações publicitadas). Uma vez que não se provou que a A. tivesse cumprido esses deveres, quanto à explicitação dos termos em que era devida a remuneração acordada (nomeadamente que, uma vez que o contrato havia sido celebrado em regime de exclusividade, a remuneração seria devida se o negócio visado no contrato de mediação não se concretizasse por causa imputável ao cliente), tal cláusula deve ser excluída do contrato, não tendo assim a A. direito à remuneração ali prevista e reclamada.
Efectivamente, não impõe o RJAMI que os contratos de mediação imobiliária sejam sujeitos ao regime de exclusividade. E também não estipula que tal regime deve vigorar no contrato, no caso de as partes nada acordarem quanto a essa matéria. Ou seja, no contrato sub judice, a cláusula da exclusividade não resulta de norma imperativa em sentido estrito ou de norma supletiva. Dimana, tão só, da iniciativa da predisponente, a que a aderente deu assentimento pela subscrição formalizada no contrato.
A adesão ao regime de exclusividade não escapa, pois, ao controlo próprio da LCCG (cfr., neste sentido, Higina Orvalho Castelo (18)).
Nos termos do nº 3 do art. 1º da LCCG, “o ónus da prova de que uma cláusula contratual resultou de negociação prévia entre as partes recai sobre quem pretenda prevalecer-se do seu conteúdo.”
Ou seja, se alguma das partes quiser furtar ao regime da LCCG alguma cláusula contratual ou, mesmo, a totalidade de um contrato, por entender que no caso não ocorrem os pressupostos daquele regime, recai sobre si o ónus de demonstrar que tal ou tais cláusulas foram alvo de negociação prévia, isto é, que a respetiva fixação é fruto do clássico exercício da liberdade contratual tido em vista no art. 405º nº 1 do CC. Se não satisfizer essa exigência, a cláusula ou negócio sujeitar-se-á às restrições impostas pela LCCG.
Tal regra faz sentido em situações em que o negócio em causa aparenta ser de adesão ou conter cláusulas pré-determinadas. Se o contrato aparentar ter sido antecedido de negociação prévia e ninguém alegar o contrário, não se justifica trazer à liça o disposto no nº 3 do art. 1º da LCCG, uma vez que não se suscita a questão cuja resolução ele visa.
No caso dos autos, como se viu, o documento apresentado configura-se como um contrato de adesão, não tendo sido produzida prova em sentido contrário.
Nos termos do nº 1 do art. 5º da LCCG “as cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las.”
Tal comunicação “deve ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência” (nº 2 do art. 5º).
É sobre o contratante que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais que cabe o “ónus da prova da comunicação adequada e efectiva” (nº 3 do art. 5º).
Além da comunicação das cláusulas contratuais gerais, o contratante que a elas recorra “deve informar, de acordo com as circunstâncias, a outra parte dos aspectos nelas compreendidos cuja aclaração se justifique” (nº 1 do art. 6º), assim como “devem ainda ser prestados todos os esclarecimentos razoáveis solicitados” (nº 2 do art. 6º).
A violação destes deveres implica a exclusão da cláusula afectada.

Assim, nos termos do art. 8º da LCCG, “consideram-se excluídas dos contratos singulares:

a) as cláusulas que não tenham sido comunicadas nos termos do artigo 5.º;
b) as cláusulas comunicadas com violação do dever de informação, de molde que não seja de esperar o seu conhecimento efectivo;
c) as cláusulas que, pelo contexto em que surjam, pela epígrafe que as precede ou pela sua apresentação gráfica, passem despercebidas a um contratante normal, colocado na posição do contratante real;
d) as cláusulas inseridas em formulários, depois da assinatura de algum dos contratantes”.

No caso dos autos, deu-se expressamente como não provado que que a Ré foi informada que, em virtude da existência da cláusula de exclusividade, a desistência de uma venda implicaria a cobrança da remuneração” (cfr. B - Factos Não Provados).
Ora, a prestação de tal informação era tanto mais importante quanto o texto expresso no contrato só reportava o pagamento da remuneração aos momentos de concretização efectiva do negócio mediado: “Nos termos da cláusula 2.ª, n.º 3 “O vendedor obriga-se a pagar à mediadora a título de remuneração da percentagem de 5% calculada sobre o preço pelo qual o negócio é efetivamente concretizado, sendo que este valor nunca poderá ser inferior a € 3.000,00 (três mil euros), exceto se for arrendamento, em que o valor da remuneração será igual ao valor de uma renda, valores esses a que acresce o IVA à taxa legal.” (cfr. ponto 7. dos factos provados).
E, quanto aos efeitos da contratação da A. em regime de exclusividade, no contrato apenas se afirma na cláusula 4ª, nº 2 que “quando o contrato é celebrado em regime de exclusividade só a mediadora contratada tem o direito de promover o negócio objeto do contrato de mediação durante o respetivo período de vigência” (cfr. ponto 2. dos factos provados). Omitindo-se, afinal, o efeito mais relevante e gravoso para o cliente-aderente, que era a sujeição à obrigação de pagamento da remuneração no caso de desistência da celebração de contrato com cliente angariado pela mediadora.
Acresce referir que, apesar da exclusão da cláusula afetada, nos termos do art. 9º da LCCG, os contratos com cláusulas excluídas por violação do dever de comunicação e/ou informação mantêm-se, “vigorando na parte afectada as normas supletivas aplicáveis, com recurso, se necessário, às regras de integração dos negócios jurídicos.” As “normas supletivas” que aqui seriam aplicáveis não são aquelas que, nos casos de angariação em regime de exclusividade, concedem à mediadora o direito à remuneração no caso de desistência do negócio por parte do cliente (trata-se de norma supletiva, porque nada obsta a que as partes convencionem solução mais favorável ao cliente da angariadora), mas as normas aplicáveis quando não há que considerar o regime de exclusividade, ou seja, a não exigibilidade de remuneração em caso de não concretização do negócio tido em vista no contrato de mediação. Sendo certo que, no caso destes autos, a A. não deixou de beneficiar da situação de exclusividade, ou seja, do monopólio, ao longo de mais de um ano, na busca de comprador para o imóvel em causa. E sendo certo, também, que nestes autos não está em apreciação o direito da A. a ser compensada pelas despesas eventualmente suportadas com a execução do contrato, pois a A. pede a condenação da R. no pagamento da remuneração objecto do contrato de mediação imobiliária em regime de exclusividade (e não das despesas que suportou).
Assim, ainda que com outros fundamentos, entende-se nada ser devido pela R. à A. pela revogação unilateral do contrato como decidido na sentença recorrida.

Improcede, pois, o recurso com custas a pagar pela recorrente (art. 527º do CPC).
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5 – SÍNTESE CONCLUSIVA (art. 663º/7 CPC)

I – O preceituado no art. 640 do CPC em conjugação com o que se dispõe no art. 662º do mesmo diploma legal permite a este Tribunal de instância julgar a matéria de facto.
II – O Tribunal da Relação pode alterar a matéria de facto fixada dentro do respeito pelo princípio da livre apreciação das provas, atribuído ao julgador em 1.ª instância e dentro do restrito papel da Relação, em sede de reapreciação da matéria de facto, aos casos excepcionais de manifesto erro na apreciação da prova, de flagrante desconformidade entre os elementos probatórios disponíveis e a decisão do tribunal recorrido sobre matéria de facto.
III – Salvo estipulação em contrário, o contrato de mediação imobiliária deve considerar-se revogável.
IV – O regime jurídico da mediação imobiliária não impõe a sujeição da mediação ao regime de exclusividade, nem prevê a aplicação desse regime no caso de silêncio das partes.
V – A cláusula contratual geral aposta num contrato de mediação imobiliária que sujeita o contrato a exclusividade não cabe na previsão da al. a) do art. 3º da LCCG.
VI – Não se mostram satisfeitas as exigências de comunicação e de informação das cláusulas ao contraente aderente, no que concerne à obrigação de pagamento da remuneração à mediadora em regime de exclusividade se o aderente desistir de negócio para o qual a mediadora encontrara interessado, se no contrato de mediação imobiliária:
a) O texto expresso no contrato só reportava o pagamento da remuneração aos momentos de concretização efetiva do negócio mediado;
b) Quanto aos efeitos da contratação da mediadora em regime de exclusividade, no contrato apenas se afirma que “Nos termos da legislação aplicável, quando o contrato é celebrado em regime de exclusividade só a Mediadora contratada tem o direito de promover o negócio objecto do contrato de mediação durante o respectivo período de vigência” (nº 2 da cláusula 4ª), omitindo-se, afinal, o efeito mais relevante e gravoso para o cliente-aderente, que é a sujeição à obrigação de pagamento da remuneração no caso de desistência da celebração de contrato com cliente angariado pela mediadora.
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6 – DISPOSITIVO

Pelo exposto, acordam os juízes desta secção cível em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pela recorrente e consequentemente manter a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.
Notifique.
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Guimarães, 27-02-2020

(José Cravo)
(António Figueiredo de Almeida)
(Maria Cristina Cerdeira)


1. Tribunal de origem: Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Guimarães - JL Cível - Juiz 2.
2. In “Noções Elementares de Processo Civil”, págs. 191 e 192.
3. In “Manual de Processo Civil”, Coimbra Editora, pág. 420.
4. In B.M.J. nº 112, pág. 190.
5. Obra supracitada.
6. Cujo teor é o seguinte: “A admissibilidade de revogação unilateral do contrato de mediação não é tema pacífico, quer na doutrina, quer na jurisprudência. Na opção por um dos entendimentos, seguimos o que a admite, como em qualquer contrato duradouro, e em especial, nos de mediação, nos quais o cliente mantem a liberdade de celebrar ou não o contrato inicialmente desejado (vide, Olga Marçal, ob.cit., p. 83). Em qualquer caso, se o cliente lançar mão da revogação unilateral, sem aceitação por parte do mediador só terá de remunerar o mediador, se celebrar o contrato visado com o destinatário angariado.
7. E não 4. como por lapso refere na conclusão QUARTA das suas alegações.
8. E não autora como por lapso refere na conclusão SÉTIMA das suas alegações.
9. E não autora como por lapso refere na conclusão NONA das suas alegações.
10. Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das Obrigações, 10.ª edição reelaborada, Almedina, p. 312-313.
11. Idem, p. 317.
12. Idem, p. 322.
13. Idem, p. 321.
14. Vaz Serra, Anotação ao Acórdão do STJ de 07-03-1967, RLJ, Ano 100.º, pp. 340/348.
15. Vide ponto 3. da matéria de facto provada: “O prazo de duração do contrato celebrado era de 12 meses contados a partir da sua data de celebração, renovando-se automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, não sendo denunciado por qualquer das partes contratantes através de carta registada com aviso de receção ou por outro meio equivalente, com antecedência mínima de dez dias em relação ao seu termo.
16. Idem, p. 346.
17. Vide Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11-11-2004, Processo n.º 5439/2004-8, disponível em www.dgsi.pt.
18. In “Regime Jurídico da Atividade de Mediação Imobiliária”, 2015, Almedina, pág. 100, onde se escreveu: “o teor das normas que o RJAMI [regime jurídico da atividade de mediação imobiliária] destina à regulação do acordo de exclusividade não impede que este acordo seja inserido em cláusula contratual geral e que os contratos de mediação com acordo de exclusividade possam ser simultaneamente contratos de adesão. As duas situações estão em planos distintos, ainda que intersetáveis: o regime de exclusividade previsto no RJAMI é estabelecido por causa do conteúdo da cláusula de exclusividade; a disciplina da LCCG é conferida por causa de um especial modo de formação do contrato (através de cláusulas contratuais gerais).