Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
318/12.0GCBGC.G2
Relator: FÁTIMA FURTADO
Descritores: DECLARAÇÕES DE CO-ARGUIDO
VALORAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/21/2024
Votação: UNANIMIDADE COM * DEC VOT
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO PENAL
Sumário:
I. Nada impede que um arguido preste declarações sobre factos de que possua conhecimento e que constituam objeto da prova, mesmo que incriminatórios de coarguido que tenha exercido o direito ao silêncio ou que se encontrava fisicamente ausente na audiência de julgamento.
II. As declarações do arguido incriminatórias do coarguido só poderão ser valoradas quando acompanhadas de outros meios de prova que apontem para a sua veracidade, ainda que circunstancialmente, por o arguido ser um sujeito processual que não está sujeito a juramento e ao dever de verdade, nem aos efeitos da sua inverdade decorrentes da ameaça penal para as falsas declarações.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.
(Secção Penal)

I. RELATÓRIO

No processo comum coletivo n.º 318/12...., do Juízo Central Criminal de Bragança, Juiz ..., do Tribunal Judicial da Comarca de Bragança, foram submetidos a julgamento os arguidos AA e outros, todos com os demais sinais dos autos.

O acórdão, proferido e depositado a 21 de novembro de 2016, tem o seguinte dispositivo:

«Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes que constituem o Tribunal Colectivo em:
1) Julgar a acusação parcialmente provada e procedente, nos termos sobreditos e, consequentemente:
A). Absolvem os arguidos BB, CC, DD, EE, FF, GG, HH, da prática dos crimes que lhe eram imputados.
B). Absolvem o arguido AA da reincidência.
Absolvem o mesmo arguido da prática de 3 dos crimes de furto qualificado que lhe eram imputados (P. 335/12...., 147/12...., 19/13....);
Absolvem o mesmo arguido da prática de 1 crime de furto qualificado p. e p. pela al. e) do n° 2 do art. 204.º CP (P l/13.9GBMCD); mas,
Condenam o mesmo arguido pela prática de 1 crime de furto qualificado p. e p pela al. f) do nº 1 do art. 204º CP, na pena parcelar de um ano e dez meses de prisão;
Condenam o mesmo arguido pela prática de 2 crimes de furto qualificado p. e p pela al. e) do n° 2 do art. 204° CP, nas penas parcelares de dois ano e oito meses de prisão (P. 338/12....) e de três anos de prisão (P.318/12.... (a))
Absolvem o mesmo arguido da prática de 1 crime de furto qualificado na forma tentada, p. e p pela al. e) do nº 2 do art. 204º, 22º, 23º, do CP (P. 318/12.... (b)); mas,
Condenam o mesmo arguido pela prática de 1 crime de furto qualificado na forma tentada, p. e p pela al. f) do n° 1 do art. 204º, 22º, 23º e 73º CP, na pena parcelar de oito meses de prisão.
Em cúmulo jurídico, condenam o arguido AA na pena única de 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de prisão efectiva.
C). Absolvem o arguido II da reincidência.
Absolvem o mesmo arguido da prática de 3 dos crimes de furto qualificado que lhe eram imputados (P. 335/12...., 147/12...., 19/13....);
Absolvem o mesmo arguido da prática de 1 crime de furto qualificado p. e p pela al. e) do nº 2 do art. 204º CP (P 1/13....); mas,
Condenam o mesmo arguido pela prática de 1 crime de furto qualificado p. e p pela al. f) do nº 1 do art. 204º CP, na pena parcelar de 1 (um) ano e 7 (sete) meses de prisão;
Condenam o mesmo arguido pela prática de 1 crime de furto qualificado p. e p pela al. e) do nº 2 do art. 204º CP, na pena parcelar de dois anos e dez meses de prisão (P. 318/12.... (a));
Absolvem o mesmo arguido da prática de 1 crime de furto qualificado na forma tentada, p. e p pela al. e) do nº 2 do art. 204º, 22º, 23º, do CP (P-b).31 8/12.OGCBGC); mas,
Condenam o mesmo arguido pela prática de 1 crime de furto qualificado na forma tentada, p. e p pela al. f) do nº 1 do art. 204º, 22º, 23º e 73º CP, na pena parcelar de sete meses de prisão.
Em cúmulo jurídico, condenam o arguido II na pena única de 3 (três) anos e 3 (três) meses de prisão efectiva.
D). Absolvem o arguido JJ da prática de 3 dos crimes de furto qualificado que lhe eram imputados (P. 335/1 ..., 338/12...., 1/13....);
Condenam o mesmo arguido pela prática de 1 crime de furto qualificado p. e p pela al. e) do nº 2 do art. 204º CP, na pena parcelar de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão (P. 318/12....));
Absolvem o mesmo arguido da prática de 1 crime de furto qualificado na forma tentada, p. e p pela al. e) do nº 2 do art. 204º, 22º, 23º, do CP (P. 31 8/12.OGCBGC-b)); mas,
Condenam o mesmo arguido pela prática de 1 crime de furto qualificado na forma tentada, p. e p pela al. f) do nº 1 do art. 204º, 22º, 23º e 73º CP na pena parcelar de 7 (sete) meses de prisão.
Em cúmulo jurídico, condenam o arguido JJ na pena única de 3 (três) anos de prisão, suspensa na sua execução por igual prazo.
E). Absolvem o arguido KK da prática de 1 crime de furto qualificado p. e p pela al. e) do nº 2 do art. 204º CP (P. 1/13....); mas,
Condenam o mesmo arguido pela prática de 1 crime de furto qualificado p. e p pela al. f) do n° 1 do art. 204º CP, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual prazo, sob condição de pagar a quantia infra arbitrada ao demandante LL, no prazo da suspensão.
F). Condenam o arguido MM pela prática de 1 crime de receptação p. e p. pelo art. 231º/1 CP, na pena de 220 dias de multa;
Absolvem o arguido MM da prática de 3 crimes de detenção de arma proibida; mas,
Condenam o mesmo arguido pela prática de um 1 só crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos arts. 86º/1-c), 2º/1-ar) e 3º/6 da Lei 5/2006 de 23/2, na pena de 220 dias de multa,
Em cúmulo jurídico, condenam o arguido MM na pena única de 330 (trezentos e trinta dias de multa) à taxa diária de 5 € (cinco euros) o que perfaz a multa de 1.650 € (mil seiscentos e cinquenta euros) ou em 220 (duzentos e vinte) dias de prisão subsidiária.
Custas criminais pelos arguidos condenados, com taxa de justiça que se fixa em 5 UC’s para o arguido AA, 4 UC’s para o arguido II, 3 UC’s para os restantes, sem prejuízo da redução a 1/2 pela confissão, quanto ao arguido KK, e dos apoios judiciários eventualmente concedidos.
*
II. Julgar o pedido cível deduzido pelo demandante LL parcialmente procedente.
Consequentemente condenam os arguidos/demandados AA, II e KK a pagarem ao demandante LL a quantia de 2.000 € (dois mil euros).
Sem custas.
*
III. Restitua-se, quando e se reclamado, nos termos resultantes do art. 186º/3 e 4 CPP, ao arguido HH, o veículo Fiat ..-GJ-.. apreendido.
Quanto aos objectos apreendidos a fls. 339 e ss., deverão ser entregues a quem os reclamar e comprovar a sua proveniência.
Quanto à arma ..., deverá ser restituída ao NN, conquanto, após notificado nos termos e para os efeitos do referido art. 186º/3 e 4 CPP e no prazo de prescrição a favor do Estado demonstre ter licença de uso e porte ou de detenção ao domicílio.
*
Após trânsito:
(i) Passe mandados de condução do arguido AA ao EP para cumprimento da respectiva pena.
(ii) Solicite ao P. à ordem do qual o arguido II cumpre pena o oportuno ligamento à ordem dos presentes.
*
(ui) Proceda-se (salvo se já o tiverem sido à ordem de outo processo) à recolha das amostras do perfil de ADN dos arguidos OO, II e JJ, o que se defere ao Instituto Nacional de Medicina Legal, 1. P. (Deliberação n.º ...08); comunique-se ao INML.
Remeta boletins.
Deposite o acórdão.
Notifique e DN»
*
Inconformado, o arguido AA interpôs recurso, apresentando a competente motivação que remata com as seguintes conclusões:

«1 – Vem o presente recurso interposto do Acórdão proferido nestes autos que julga a acusação parcialmente provada e procedente e;
“B). (…)
Condenam o mesmo arguido pela prática de 1 crime de furto qualificado p. e p pela al. f) do nº 1 do art. 204º CP, na pena parcelar de um ano e dez meses de prisão;”
“Condenam o mesmo arguido pela prática de 2 crimes de furto qualificado p. e p pela al. e) do nº 2 do art. 204º CP, nas penas parcelares de dois ano e oito meses de prisão (P. 338/12....) e de três anos de prisão (P. 3 18/12.OGCBGC)”
(…)
“Condenam o mesmo arguido pela prática de 1 crime de furto qualificado na forma tentada, p. e p pela al. f) do nº 1 do art. 204º, 22º, 23º e 73º CP, na pena parcelar de oito meses de prisão.”
“Em cúmulo jurídico, condenam o arguido AA na pena única de 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de prisão efetiva.”
 “Decide ainda”
“Julgar o pedido cível deduzido pelo demandante LL parcialmente procedente.”
“Consequentemente condenam os arguidos/demandados AA … a pagarem ao demandante LL a quantia de 2.000 € (dois mil euros).
2 – Visa o presente recurso apreciar a decisão proferida sobre a matéria de facto e a sua falta de fundamentação; Insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, vício da alínea a) do nº 2 d artº 410º do CPP; Vício de erro notório na apreciação da prova – alínea c) do nº 2 do artº 410º do CPP; Falta de fundamentação da medida da pena- nulidade prevista no artº 379º nº 2 al. a) do CPP; Falta de fundamentação do cúmulo jurídico – nulidade prevista no artº 379º nº 2 al b) do CPP:  falta de fundamentos para a condenação criminal e em sede de pedido cível.
3 - Como é jurisprudência assente e pacífica, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso – deteção de vícios decisórios ao nível da matéria de facto emergentes da simples leitura do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, previstos no art. 410.º, n.º 2, do CPP (neste sentido, Acórdão do Plenário das Secções Criminais do STJ, de 19-10-1995, proferido no processo n.º 46580, Acórdão 7/95, publicado no DR, I Série – A, n.º 298, de 28-12-1995, e BMJ 450, p. 72, que no âmbito do sistema de revista alargada fixou jurisprudência, então obrigatória, no sentido de que “É oficioso, pelo tribunal de recurso, o conhecimento dos vícios indicados no art. 410.º, n.º 2, do CPP, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito”, bem como o AUJ 10/2005, de 20-10-2005, DR, Série I-A, de 07-12-2005, em cuja fundamentação se refere que a indagação dos vícios faz-se “no uso de um poder-dever, vinculadamente, de fundar uma decisão de direito numa escorreita matéria de facto”) e verificação de nulidades, que não devam considerar-se sanadas, nos termos dos artºs. 379.º, n.º 2 e 410.º, n.º 3, do CPP – é pelas conclusões que se delimita o conhecimento do presente recurso.
4 - A decisão condenatória é omissa quanto a factos pessoais do arguido, estando assim ferida de vício de insuficiência da matéria de facto provada (art. 410º, nº 2, al. a) do CPP).
5 – No Acórdão recorrido falta o exame crítico das provas e verifica-se insuficiência de fundamentação e a que existe assenta, quase na sua totalidade, no depoimento da coarguida BB, o que se mostra inadmissível.
6 - A motivação de facto tem de assegurar que o processo de decisão seja inteligível, de forma sucinta, ainda que tão completa quanto possível, o que importará maiores e melhores informações e explicações sempre que a complexidade do “thema decidendum“ e da prova que sobre ele tenha versado tal imponham.
7 - Uma primeira constatação que se impõe é a de que o Tribunal não fundamentou a sua convicção quanto à matéria de facto provada e não provada, à luz das regras da experiência comum e do princípio da livre convicção do julgador, consagrado no artº 127° do C. P. Penal. Este princípio não deve, nem pode ser entendido como a atribuição ao juiz de um poder discricionário na apreciação da prova com vista à fixação da matéria de facto provada e não provada, mas deve ser perspetivado como o meio ao alcance do julgador para cumprir com o dever de alcançar a verdade material.
8 - A livre convicção não se pode confundir com a íntima convicção do julgador pois a lei impõe-lhe que extraia das provas um convencimento lógico e motivado, que avalie as provas com sentido de responsabilidade e bom senso e que as valore segundo parâmetros da lógica do homem médio e as regras de experiência ("a prova, mais do que uma demonstração racional, é um esforço de razoabilidade").
9 - É conhecida a clássica distinção entre prova direta e prova indireta ou indiciária: a primeira incide diretamente sobre o facto probando, enquanto esta última incide sobre factos diversos do tema de prova, mas que permitem, a partir de deduções e induções objetiváveis e com o auxílio de regras da experiência, uma ilação da qual se infere o facto a provar.
10 – Não consta do Acórdão recorrido uma explicação suscita e clara dos factos provados e não provados. Fazendo-se na maior parte das vezes referências vagas, genéricas e com recurso a juízos meramente conclusivas.
11 – Não se conseguindo encontrar uma relação direta entre os factos provados e o recorrente, pelo que, não resulta assente que o recorrente tenha cometido os crimes que lhe são imputados.
12- A fundamentação do acórdão da 1ª instância é manifestamente insuficiente, pois trata-se de factos dados como provados por via de declarações de coarguido, incriminatórias para o recorrente , não tendo sido feito o exame crítico das declarações  destes, nem de outros elementos de prova que o pudessem corroborar, não devendo ter sido valorado contra si tais depoimentos dos coarguidos, por não ter sido feita a necessária corroboração das suas declarações com elementos de prova externos e autónomos.
13 - Não existem outras provas além do depoimento da coarguida BB que permitam corroborar aqueles.
14 – Verificando-se assim pela absoluta falta e/ou insuficiência de motivação da decisão proferida sobre a matéria de facto, de acordo com a ponderação de cada um dos factos supra referidos.
15 - As declarações de um arguido em prejuízo de outro arguido não podem ser utilizadas como prova.
16 - Como se pode verificar pela análise da factualidade considerada provada e da sua falta de motivação ou insuficiência, essencialmente assenta no depoimento da coarguida. Que, sublinhe-se, encontra-se de relações cortadas com o aqui recorrente e face aos seus conflitos no passado não se pode deixar de ponderar a intenção de o prejudicar.
17 - Enquanto o arguido tem direitos de defesa, designadamente o direito ao silêncio, a testemunha tem o dever de responder com verdade.
18 - A valoração probatória das declarações dos coarguidos tem uma limitação, a de não poderem valer como meio de prova em prejuízo de outro co-arguido quando, a instâncias deste outro co-arguido, o primeiro se recusar a responder no exercício do direito ao silêncio. Do que se trata, aqui, é de retirar valor probatório a declarações subtraídas ao contraditório – artº 345º nº 4, aditado pela Lei nº 48/2007, de 29 de Agosto.
19 - Para as declarações do arguido poderem valer contra o co-arguido, este tem de ter a possibilidade efetiva de o poder contraditar ou contra-instar em audiência de julgamento. Tem de lhe ser assegurado o exercício de um contraditório pela prova.
20 – Consequentemente, o tribunal a quo deve, por cautela, reabrir a audiência reconfirmando se os arguidos se mantêm ou não no uso do seu direito ao silêncio ou se dispõem a responder a perguntas do tribunal ou dos outros coarguidos especificamente sobre as suas declarações prestadas em audiência de julgamento.
21 - Mantendo-se em silêncio ou em recusa de resposta, o tribunal deve reformular a fixação da matéria de facto, expurgando da sua fonte de convicção as declarações incriminatórias de coarguidos que estes não confirmassem nas suas próprias declarações e apenas com base na restante prova produzida e nas declarações autoincriminatórias dos próprios arguidos, formar então a sua convicção e explicar os fundamentos da mesma, decidindo depois de direito em conformidade.
22 - Conforme resulta da leitura do Acórdão recorrido, nenhuma referência consta que os coarguidos tenham respondido a pedidos de esclarecimento solicitados por outros coarguidos, designadamente pelo aqui recorrente.
23 - Assim sendo, não é admissível a valorização dos depoimentos prestados por outros arguidos para incriminar qualquer dos coarguidos, designadamente o aqui recorrente.
24– Padece ainda o Acórdão recorrido da falta de critério de escolha da pena – nulidade de omissão de pronúncia artº 379º nº al. a) do Código de Processo Penal.
25 – As mesmas razões e fundamentos que constam do Acórdão recorrido para absolver o arguido dos crimes que lhe eram imputados, são precisamente extensíveis aos crimes de que o arguido se encontra condenado. Não subsistindo qualquer razão diferenciado para absolvição por uns crimes e condenação por outros.
26 - O art.º 70º do C.P. estabelece, com clareza, uma preferência pelas penas não detentivas, sempre que tal se mostre possível
27 - Neste ponto, além da explícita referência ao comando aplicável, as decisões não se demoram prolongadamente na fundamentação dogmática da opção tomada. É possível, não obstante, recolher elementos que justificam a preferência pela pena não privativa de liberdade, o que não se verifica no caso sob apreciação.
28 – Há a necessidade de os acórdãos fundamentarem, sempre, a opção pela pena privativa ou não privativa de liberdade. Sob pena de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do art.º 379º nº1 al. a) do Código de Processo Penal;
29 - Como tal não se verifica no Acórdão recorrido, deve ser conhecida a correspondente nulidade e ordenada a baixa ao tribunal recorrido, uma vez que, não se encontram verificados os pressupostos para a renovação da prova no Tribunal Superior – artº 430 do CPP.
30 - Na medida em que o art.º 70º do C.P. elege como critério da escolha da pena a melhor prossecução das finalidades da punição, na aplicação deste preceito importa, naturalmente, ter em atenção o disposto no art.º 40º do mesmo C.P.. O qual atribui à pena, sempre, um fim utilitário, pelo menos de acordo com a leitura largamente maioritária que é feita do preceito. Assim sendo, a culpa, ou o grau de culpa, não são realidades a ponderar especificamente na tarefa de escolher a espécie da pena, antes têm o seu campo de incidência, privilegiado, na escolha da medida da pena.
31 - Daí que importe ver, se a opção pela pena de prisão se mostra necessária, adequada e proporcionada, ao serviço dos objetivos da prevenção geral e especial.
32 - E, se em regra são razões de prevenção especial que respondem pela não aplicação da prisão, em nome de uma melhor reinserção social do arguido, também geralmente são motivos de prevenção geral, que afastam a aplicação de uma pena de substituição, não detentivas.
33 - O art.º 71º do C.P. estabelece no seu nº 1 a orientação base para a medida da pena a aplicar: “A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção”. No nº 2 do preceito faz-se referência às “circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuseram a favor do agente ou contra ele.” O nº 3, por último, obriga a explicitar na sentença os fundamentos da medida da pena que se elegeu.
34 - A referida exigência, de fundamentação da concreta pena aplicada, no que diz respeito à sua medida, está ao serviço da respetiva sindicabilidade em sede de recurso (nº3 do art.º 71º do C.P.).
35 - Sempre que o procedimento adotado se tenha mostrado incorreto, como é o caso no Acórdão recorrido, não se tenham eleito os fatores que se deviam ter em conta para quantificar a pena, a ponderação do grau de culpa que o arguido pode suportar, não tenha sido feita, e a apreciação das necessidades de prevenção reclamadas pelo caso mereçam reparos, sempre que isto seja objeto de crítica, então o “quantum” concreto de pena já escolhido não deve manter-se intocado.
36 - Depois de selecionados os elementos de facto que preenchem o tipo legal (tipo fundamental, qualificado ou privilegiado), momento em que só interessa ver se ocorreu um crime, e qual, transita-se para outro momento em que se pondera, já, qual a consequência do crime praticado. Aqui se inclui a escolha da medida da pena a aplicar, suportada por elementos de facto que estão para além daqueles elementos típicos.
37 - Ora, o ponto a salientar é que, neste momento, não haverá que distinguir duas fases, elegendo primeiro a medida da pena, fruto do jogo das circunstâncias gerais, e aferindo depois a compatibilização da medida da pena escolhida, com a ponderação da culpa do agente e das exigências de prevenção, como se fossem valências independentes.
38 - Na verdade, o peso das circunstâncias estabelece com a ponderação da culpa e das exigências de prevenção uma relação de convergência. De tal modo que, por um lado, essas circunstâncias fundamentam a reflexão e conclusões a que se chegue em matéria de prevenção e limite imposto pela culpa, e, por outro lado, nenhuma circunstância que interesse à ponderação da medida da pena deixará de se repercutir naquela reflexão.
39 - O grau de culpa e as exigências de prevenção não são variáveis autónomas em relação ao peso das circunstâncias;
40 – Assim, face às antecedentes conclusões, o Acórdão recorrido também não respeita estas regras na medida da pena.
41 - Ainda que se considere não se encontrar demonstrada a prática dos crimes que são imputados ao recorrido, na verdade é manifestamente insuficiente a ponderação se encontra para aplicação de uma pena privativa da liberdade.
42 - Da mesma forma que nenhuma ponderação se encontra para o cúmulo jurídico e a condenação do recorrente na pena única de quatro anos e dois meses de prisão efetiva.
43 – Verifica-se assim, no Acórdão recorrido, a falta de fundamentação do cúmulo jurídico – da nulidade prevista no artº 379º nº 2 al. b) do Código de Processo Penal.
44 - Na elaboração do cúmulo jurídico de penas (art. 77º, nº1 do CP), o Tribunal tem de proceder a uma reavaliação dos factos em conjunto com a personalidade do arguido, o que exige uma fundamentação especial da pena única, na sentença, que não está cumprido no caso sob apreciação.
45 - A ausência da suscitada fundamentação integra a nulidade de sentença prevista no art. 379º, nº2-b) do Código de Processo Penal.
46 - No caso em apreciação, o Tribunal, sem proceder no acórdão a qualquer fundamentação, condenou o arguido numa pena única de 4 anos e 2 meses de prisão, desconhecendo-se assim quais as circunstâncias que, em concreto, relevaram naquela decisão, qual a apreciação que delas terá sido feita. Nenhuma razão foi invocada e nenhuma explicação foi dada no acórdão.
47 – Na elaboração do cúmulo jurídico de penas “tudo deve passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência criminosa ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta.
48 - De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente - exigências de prevenção especial de socialização.
49 - A reponderação na determinação da pena única respeita, porém, o princípio da proibição da dupla valoração - art. 72º, nº2 do Código Penal.
50 - Como princípio extensível a todas as operações de determinação da pena, ele deve repercutir-se ao longo de todo o processo aplicativo da pena.
51 - A personalidade do arguido exige, no caso presente, uma atenção redobrada. Contudo nada consta a este respeito no Acórdão recorrido.
 52 – A generalidade dos fatores relativos à personalidade do agente poder-se-á dizer que relevam para a medida da pena preventiva, geral e especial.
53 - É assim que, não só as condições pessoais e económicas do agente, como as qualidades da personalidade, ganham relevo neste contexto.
55 – Nada do que atrás se refere e conclui se encontra apreciado e ponderado no Acórdão recorrido.
56 - Sem prejuízo do que atrás se conclui, as penas de prisão parcelares, mostram-se infundadas, excessivas e desproporcionadas, apresentando-se em desconformidade com os critérios estabelecidos no artº 71º do Código Penal.
57 – Não se encontrando provado que o recorrente cometeu os crimes que lhe são imputados, não pode ser condenado com qualquer pena.
58 – Contudo, na hipótese que apenas se admite como tal, que o Acórdão recorrido não padece de todos os vícios que aqui lhe são imputados ou mesmo de alguns deles e que o recorrente cometeu os crimes ou alguns dos que lhe são imputados, sempre se verifica falta de elementos que permitam a determinação de uma pena de prisão efetiva.
59 – Ainda assim, mesmo que não se acolhesse a posição do aqui recorrente, nunca será de manter uma pena privativa da liberdade;
 60 – Não podendo deixar de se ponderar que o recorrente não praticou qualquer conduta ilícita, pelo menos, nos últimos sete anos, encontra-se social e economicamente reinserido; trabalha, vive em união de facto e conduz toda a sua vida pelos padrões sociais e jurídicos normais. Situação esta que não sendo possível ser avaliada pelo Tribunal de recurso, deve determinar a baixa do processo para reabertura da audiência de julgamento e apreciação desta atual situação do arguido.
61 – Pelo que, uma pena privativa da liberdade mostra-se totalmente desadequada à atual realidade, não carecendo o arguido de alguma medida de ressocialização.
62 - Quando muito, não se absolvendo o recorrente de todos os crimes que lhe são imputados, a aplicação de uma pena suspensa na sua execução seria suficiente e produziria os efeitos considerados adequados para uma prevenção geral e especial, face ao que consta do Acórdão recorrido. Ou, outra medida alternativa à prisão efetiva.
63- A aplicação de uma pena efetiva de prisão ao recorrente, implicaria apenas um retrocesso em todo o processo de vida sem qualquer beneficio para si nem para a comunidade.
63 – Por fim, também no que respeita ao pedido cível não se encontram razões para a condenação do recorrente. Não só pela ausência para uma condenação criminal mas, total fundamento para a condenação que consta do Acórdão recorrido.
64 - Pelas razões aqui explanadas o Acórdão recorrido faz errada interpretação e aplicação das normas supra indicadas.
64 – Deve assim ser revogado o decidido no Acórdão recorrido absolvendo-se o recorrente dos crimes em que se encontra condenado.
65 – Casso assim se não entenda, deve ser ordenada a baixa dos autos ao Tribunal de primeira instância para apreciação das questões que foram omitidas, conforme se concluía atrás.
66- Ainda, se este não for o entendimento acolhido neste Tribunal de recurso, deve revogar-se a pena efetiva de prisão aplicada ao arguido, por manifestamente se apresentar desadequada à atual realidade, aplicando a suspensão da pena ou outra medida que não seja privativa da liberdade.»
*
O Senhor Procurador da República que representou o Ministério Público na 1ª instância respondeu, pugnando pela manutenção da sentença recorrida, apresentando as seguintes conclusões:

«1.º Bem andou o Tribunal a quo ao decidir condenar o arguido nas respetivas penas parcelares, e em cúmulo jurídico na pena de 4 anos e 2 meses de prisão efetiva, sendo tal pena o resultado de uma ponderação fundamentada, justa, adequada e proporcional da medida concreta da pena.
2.º O tribunal “a quo”, efetuou a apreciação da prova com recurso às regras de experiência, de forma objetiva e motivada, seguindo um processo lógico e racional, e explicou a razão das opções tomadas e da sua convicção; a sua lógica e raciocínio.
3.º A decisão recorrida não se mostra ilógica, arbitrária ou notoriamente violadora das regras da experiência comum, sendo que é o tribunal de 1ª instância que está em melhores condições para fazer um adequado uso do princípio da imediação e da livre apreciação da prova.
4.º O recorrente não indicou, em concreto, quais os factos relevantes para a boa decisão da causa que ficaram por apurar e que resultem do texto da sentença, por si só, ou em conjugação com as regras da experiência comum.
5.º A decisão encontra-se devidamente fundamentada estribando-se em provas legalmente válidas, as quais foram valoradas de forma racional, lógica, objetiva, e de harmonia com a experiência comum à luz dos critérios do artº 127º do Código de Processo Penal.
6.º Não se vislumbra que tenham ficado factos por apurar, sendo que todos os factos dados como provados pelo Tribunal “a quo”, preenchem todos os elementos constitutivos dos crimes pelos quais o arguido foi condenado.
7.º O acórdão considerou as condições pessoais do condenado, que são as que foram dadas como provadas no ponto 12 da matéria de facto provada, bem como os seus antecedentes criminais.
8.º Os factos dados como provados por via de declarações de coarguida podiam ter sido dados como provados, bem como podiam ter sido valoradas, como o foram, tais declarações, que foram sujeitas ao exame critico e concatenadas com os demais elementos de prova.
9.º Não se vislumbra a existência dos vícios de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada nem do erro notório na apreciação da prova.
10.º Quer a medida das penas parciais, quer a pena aplicada em cúmulo jurídico se encontram fundamentadas, tendo sido ponderado os fatores de determinação da escolha e medida concreta da pena, plasmados nos artigos 40.º, 70.º, 71.º e 72º, todos do Código Penal, pelo que a pena aplicada ao aqui arguido e recorrente é justa, proporcional e adequada.
11.º Encontra-se ainda devidamente fundamentada a condenação em pedido cível.
12.º Nestes termos, e nos melhores em Direito, deve o presente recurso ser rejeitado, por inadmissível, ou caso assim não se entenda, ser julgado totalmente improcedente e consequentemente ser mantida, na totalidade a decisão recorrida.»
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Nesta Relação, a Exma. Senhora Procuradora-Geral adjunta emitiu parecer, igualmente no sentido de que o recurso do arguido deverá ser considerado improcedente.

Foi cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, sem resposta.
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Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
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II. FUNDAMENTAÇÃO

Conforme é jurisprudência assente, o âmbito do recurso delimita-se pelas conclusões extraídas pelo recorrente a partir da respetiva motivação, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer[1].

1. Questões a decidir:

A. Vício da insuficiência da matéria de facto provada para a decisão, por total omissão de factos sobre a pessoa do recorrente (artigo 410.º, nº 2, al. a) do Código de Processo Penal).
B. Falta ou insuficiência de fundamentação da matéria de facto provada; erro notório na apreciação da prova (artigo 410.º, nº 2, al. c) do Código de Processo Penal); consideração indevida das declarações incriminatórias da coarguida BB.
C. Nulidade do acórdão por omissão de pronúncia quanto ao critério da escolha da pena e quanto à fundamentação da pena única (artigo 379.º, nº1 al. a) do Código de Processo Penal).
D. Discordância da aplicação de pena de prisão efetiva (por se apresentar mais ajustada à realidade a suspensão da sua execução).
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2. Factos Provados

Segue-se a enumeração dos factos provados, não provados e respetiva motivação, constantes do acórdão recorrido.
«Da audiência de julgamento, resultaram provados, com relevo (e apenas estes), os seguintes factos:
1. (335/12....)
Em dia e hora não concretamente apuradas, mas entre os dias 22/10 e 22/12, de 2012, indivíduo (s) cuja identidade não foi possível apurar, dirigiu-se(ram-se) à residência de PP, sita na Rua ..., em ..., ..., para daí retirar os objectos e valores que encontrasse (m) e lhe (s) despertassem interesse, a fim de os retirar e fazer seu(s).
Assim, estroncou (aram) a portada e a janela de acesso pela parte traseira da casa, a cerca de 1,20m de altura, por onde se introduziu (ram) no interior da habitação.
Uma vez ali dentro, retirou (aram) uma arma de pressão no valor de 150,00€ e da garagem da residência, uma máquina de lavar marca ..., no valor de 203,24€ que pertencia (m) ao ofendido, fazendo-os seu (s).
2. (338/12....)
Em dia e hora não concretamente apurados, mas entre o Natal de 2012 e 8/1/2013, o arguido AA juntamente com outros (s) indivíduo (s) de identidade (s) não apurada (s), dirigiu-se à residência de NN, sita na Urbanização ..., em ..., ..., para daí retirar os objectos e valores que encontrasse e lhe despertasse interesse, a fim de os retirar e fazer seus.
Na execução do seu propósito pré-determinado, o arguido e o (s) referido (s) indivíduo (s) arrombaram a porta da entrada da habitação, com recurso a um pé de cabra ou ferramenta similar, e introduziram-se no interior da habitação e percorreram todos os compartimentos que remexeram.
Levaram consigo e fizeram seus: uma arma, espingarda caçadeira, marca ..., ...81..., calibre 12, 2 canos, com 75 cms de comprimento (acondicionada em estojo próprio da marca), registada em nome de QQ; dois LCD’s; duas caixas contendo inúmeros pares de calças de homem e senhora, marcas ... e ..., ainda etiquetadas; uma consola Playstation e uma consola Xbox e respectivos jogos; relógios de pulso de homem, quantidade e marcas desconhecidas; carteiras de senhora, também quantidade e marcas desconhecidas.
O arguido, agindo em comunhão de esforços e intenções com o (s) referido (s) indivíduos (s), quis entrar na habitação para dela retirar e fazer seus os referidos bens, de valor muito superior a 1 Uc, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam e que, ao assim actuar, fazia-o contra a vontade e sem autorização do respectivo dono.
Actuou de forma livre deliberada e consciente bem sabendo ser a sua conduta proibida e punida por lei penal.
3. (318/12....)
(a) Os arguidos JJ, AA e II resolveram assaltar a residência de RR e SS, sita na Rua ..., ..., ....
No dia 02/12/2013, a arguida BB, acompanhada pelo arguido AA, e deslocando-se no carro da avó do AA, foi à localidade de ... a mando do JJ, a fim de confirmar a ausência dos proprietários da residência, e, designadamente, da SS, visto que trabalhando em ..., às 15 h, não seria suposto estar em casa.
Aí chegados, a arguida estacionou a viatura, em local afastado, e, a mando do AA, foi rondar a casa, tendo verificado que o carro dos donos, o ..., não se encontrava na garagem; porém, porque não quisesse que o assalto viesse a ser levado a cabo, referiu ao AA que o veículo encontrava-se lá.
Os arguidos JJ, AA e II voltaram ao local para controlarem/vigiarem os referidos proprietários, não avançando com o assalto porque os donos estavam em casa.
Posteriormente, entre as 14h30m do dia 04 de Dezembro e as 03h00 do dia 05 de Dezembro de 2012, os arguidos JJ, AA e II, em comunhão de esforços, deslocaram se à referida residência para daí retirarem os objectos e valores que encontrassem e lhes despertassem interesse, a fim de os retirarem e fazer seus.
Simultaneamente mandaram as arguidas BB e CC irem a ..., para controlarem os movimentos da SS, o que, porém, aquelas, apesar de se terem deslocado a ..., acabaram por não fazer.
Aí chegados, os arguidos, em execução do plano elaborado partiram o fecho das portadas da janela da varanda da cozinha, e por aí introduziram-se no interior da habitação e percorreram-na até chegarem a dois quartos que remexeram.
Levaram consigo e fizeram seus: um fio de ouro grosso com argolas com cerca de 1,5cm de espessura e uma medalha em ouro maciço com a cara de Cristo em relevo (350g), no valor de 14.000,00€; um fio em ouro de malha batida com 0,5cm de espessura (100g), no valor de 4.000,00€.
b) De seguida, os mesmos arguidos JJ, AA e II, em comunhão de esforços, dirigiram-se a uma garagem também dos ofendidos RR e SS, sita a cerca de 500 metros da casa, para daí retirar os objectos e valores que encontrassem e lhes despertassem interesse, a fim de os retirar e
fazer seus.
Aí chegados, os arguidos tentaram entrar no Jipe marca ..., forçando a janela do lado direito, não o logrando, no entanto.
Os arguidos ao agirem da forma descrita em a), actuaram de forma deliberada, livre e consciente, em comunhão de esforços e intenções, com o propósito de retirar e fazer seus os referidos bens, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam, e quiseram entrar naquela habitação da forma descrita, bem sabendo que, quer ao aí entrarem quer ao retirarem o dinheiro, agiam contra a vontade e sem autorização e contra a vontade do respectivo dono.
Os arguidos ao agirem da forma descrita em b), quiseram retirar e fazer seu o veículo supra descrito, agindo deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo que, ao aí entrarem com o referido propósito, agiam contra a vontade e sem autorização do respectivo dono, só não tendo conseguindo concretizar os seus intentos por motivos alheios à sua vontade.
Após, o arguido II contactou por telemóvel à arguida CC, para que fossem, ela e a arguida BB, á frente deles, servindo de batedoras, o que fizeram.
As arguidas CC e BB, ao servirem de batedoras, bem sabiam que estavam a ajudar os referidos arguidos a manterem os referidos objectos em sua posse durante o percurso de volta, actuando de forma deliberada livre e consciente.
Os arguidos bem sabiam serem tais descritas condutas proibidas e puníveis por lei penal.
4. (147/12....)
Entre 23/12 e as 16 h de 25/12, indivíduos de identidades não apuradas dirigiram-se à residência do ofendido TT, sita na localidade de 5. ..., ..., ..., e, aí chegados, estroncaram uma janela da habitação, e por aí introduziram-se no interior da habitação e percorreram-na remexeram todos os compartimentos, e lançaram mão deles se apropriando de: dois fios de ouro grosso, no valor de 700,00€ (setecentos euros); uma pulseira em ouro, no valor de 350,00€ (trezentos e cinquenta euros); uma máquina de apertar parafusos, no valor de 195,00€ (cento e noventa e cinco euros); dois brincos em ouro, no valor de 200,00€ (duzentos euros); cinco garrafas de Whisky, no valor de 100,00 (cem euros); várias facturas de despesas de farmácia referentes ao ano de 2012 e documentos de contas a prazo da Banco 1...; três medalhas em ouro, prata e cobre, cada uma, de condecoração da GNR e um saco de trigo no valor de 20,00€ (vinte euros).
5. (1/13....)
Um indivíduo de identidade não apurada, residente em ..., localidade próxima de ..., indicou ao AA a casa do ofendido LL, como um bom alvo, mostrando-lhe a dita casa.
Na noite do dia 6 para o dia 7 de Janeiro de 2013, os arguidos, AA, II e KK, conhecido pela alcunha “UU”, em comunhão de esforços, dirigiram-se à residência do ofendido LL, sita Rua ..., ..., ..., para daí retirarem os objectos e valores que encontrassem e lhes despertassem interesse, a fim de os retirar e fazer seus.
Os arguidos entraram pela porta da garagem da habitação, para o interior da garagem, introduzindo no interior da garagem o veículo ..., modelo ..., matrícula ..-GJ-.., de cor ..., propriedade de HH, tendo retirado daí e carregado para o veículo os seguintes objectos: um cofre de cor ..., com cerca de 1,40rn de altura e 0,70rn de largura, com o peso aproximado de 600kg.
Para carregarem o cofre, tiveram que utilizar uma escora de uma obra que existia ali perto.
Ao carregarem o cofre, um dos arguidos, o KK, magoou-se num dedo.
O cofre continha os documentos de uma espingarda de caça marca “...”, com o n.º de série ...27; três cadernetas e um livro de cheques da Banco 1..., duas cadernetas e um livro de cheques da Banco 2..., em nome de LL, 100,00€ (cem euros) em notas, 200,00€ (duzentos euros em moedas, 12 (doze) munições de 6,35mm, uma promissória de 80.000,00€ (oitenta mil euros) em nome de LL, uma promissória de 35.000,00€ (trinta e cinco mil euros) em nome de VV, o Bilhete de Identidade de VV e várias ferramentas que não estão especificadas; uma máquina varejadora de azeitona, marca ...; e num outro compartimento interior da garagem onde também acederam, retiraram uma espingarda de caça, classe D, com o n.º de livrete ...31, calibre l2mm, marca ..., com o n.º de série ...79, registada em nome do filho do ofendido, WW.
O cofre, as ferramentas, a máquina varejadora, a arma ... e o dinheiro subtraído perfaziam a sorna de 2.000 €.
Os arguidos actuaram de forma deliberada, livre e consciente, em comunhão de esforços e intenções, com o propósito de retirar e fazer seus o cofre e objectos/Valores que nele encontrassem, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam, e que, ao entrarem na habitação com o propósito de dela retirarem e fazerem seus o cofre e objectos/valores, agiam contra a vontade e sem autorização do respectivo dono, bem sabendo serem tais condutas proibidas e punidas por lei penal.
Dali, foram os arguidos para casa da arguida GG, onde a arguida BB fez um curativo na mão do arguido KK.
Posteriormente abriram o cofre com uma rebarbadora, retiraram os objectos supra descritos que este continha e levaram o cofre para o ..., junto a ... — ..., ..., onde o abandonaram.
No dia 16 de Janeiro de 2013, pelas 15h30rn foi encontrado o cofre arrombado e com as dobradiças cortadas, vazio, no ..., junto a ... — ..., ... e que, após reconhecimento, foi entregue ao ofendido LL.
6. (19/13....)
Entre o dia 27 e o dia 28 de Janeiro de 2013, indivíduos de identidades não apuradas dirigiram-se à residência dos ofendidos XX e YY, sita na Rua ..., em ..., ..., para daí retirar os objectos e valores que encontrassem e lhes despertassem interesse, a fim de os retirar e fazer seus.
Aí chegados, os indivíduos, em execução do plano elaborado estroncaram uma porta de acesso à casa das máquinas da residência e no interior desta, arrombaram outra porta, partindo o vidro da mesma, de acesso à garagem, sem que, no entanto, dali retirassem alguma coisa.
Com auxílio de uma chave de fendas, estroncaram uma porta situada na parte de trás da casa de acesso a um dos quartos, e por ali entraram para a parte de cima da habitação, e no interior da mesma e percorreram-na remexeram todos os compartimentos.
Levaram consigo e fizeram seus: um LCD marca ..., no valor de 500,00€ (quinhentos euros); uma espingarda marca ..., n.º ...49, calibre 12 (livrete de fls. 186 e 187); um aspirador ..., valor de 276,00€ (duzentos e setenta e seis euros); um relógio de pulso marca ..., no valor de 200,00€ (duzentos euros); um tapete de arraiolos, no valor de 1.700,00€ (mil e setecentos euros); um fio em ouro com uma medalha grossa, no valor de 750,00€ (setecentos e cinquenta euros); seis pulseiras de criança, no valor de 300,00€ (trezentos euros); um anel, no valor de 90,00€ (noventa euros); um casaco em pele ..., no valor de 5.000,00€ (cinco mil euros); um casaco em pele, no valor de 400,00€; quatro garrafas de Whisky, no valor de 100,00€ (cem euros); quatro caixas de 6 garrafas cada (24 garrafas) de espumante, no valor de 270,00€ (duzentos e setenta euros); um saco de ... de senhora, no valor de 120,00€ (cento e vinte euros); três salvas de prata, no valor de 600,00€ (seiscentos euros); um robot de cozinha “...”, no valor de 400,00€ (quatrocentos euros); um serviço de louça da ..., no valor de 1.200,00€ (mil e duzentos euros); dois edredons de cama de casal, no valor de 600,00€ (seiscentos euros); uma toalha de linho antigo e algodão feita à mão, no valor de 1.500,00€ (mil e quinhentos euros); uma colcha de algodão feita à mão, no valor de 700,00€ (setecentos euros); dois comandos de um jogo de consola WII, no valor de 120,00€ (cento e vinte euros).
7. No dia 30 de Maio de 2013, pelas 14h30, foram entregues pela arguida BB:
Uma consola marca ..., com o n.º de série ...63, de cor ...;
Um leitor de DVD de jogos da WII, marca ..., com o n.º de série ...63, de cor ...;
Um carregador da WII, marca ..., modelo ... de cor ..., respectivos cabos também marca ... e de cor ...;
Um cabo USB de cor ... e outra;
Um comando da WII, marca ..., modelo ..., de cor ...;
Um comando da WII, formato pistola, com os dizeres ..., modelo ...09 de cor ...;
Um comando da WII, formato volante, marca ..., modelo ..., de cor ... e outra;
Um DVD da WII, marca ..., de cor ... com os dizeres WIISPORTS;
Um DVD da WII, marca ..., de cor ... com os dizeres WIIPLAY;
Um DVD da WII, marca ..., de cor ... e outras, com os dizeres MARIOKART WII;
Um DVD da WII, marca ..., de cor ... e outras, com os dizeres SUPER MÁRIO BROS.WII, dentro de uma caixa plástica de cor ...;
Um DVD da WII, marca ..., de cor ... e outras, com os dizeres SUPER MÁRIO GALAXY WII, dentro de uma caixa plástica de cor ...;
Um DVD da WII, marca ..., de cor ... e outras, com os dizeres MÁRIO PARTY8, dentro de uma caixa de plástico de cor ...;
Um DVD da WII, marca ..., de várias cores, com os dizeres DONKEY KONG COUNTRY RETURNS WII e respectiva caixa;
Um DVD da WII, marca ..., de várias cores com os dizeres SUPER MÁRIO GALAXY2 e respectiva caixa;
Um DVD da WII, marca ..., de várias cores, com os dizeres SONIC COLOURS e respectiva caixa;
Um DVD da WII, marca ..., de várias cores, com os dizeres MARIO&SONIC NOS JOGOS OLÍMPICOS DE INVERNO e respectiva caixa.
8. Os bens subtraídos eram divididos ou vendidos para proveito dos que participaram nos factos respectivos.
O ouro era vendido nas casas de compra e venda de ouro, mormente em ..., visto nesta cidade existir uma casa de compra e venda de ouro e não exigirem identificação a quem aí ia vender.
O ouro subtraído furtado na residência... ...2...), foi vendido pelo JJ, pelo AA, acompanhados da co-arguida EE, numa casa de compra e venda de ouro, sita na cidade ....
9. Para além disso, os arguidos JJ, AA, EE, GG, CC e II, entre 2011 e finais de 2012 fizeram várias vendas de ouro, nas casas de compra e venda desse produto (ouro).
As arguidas GG e CC, efectuaram ainda vendas de ouro no ano de 2013.
Designadamente:
Entre ../../2012 e ../../2012, o arguido JJ vendeu diversos objectos em ouro na “EMP01... Unipessoal, Lda.”, sita na Rua ... em ...;
Entre ../../2012 e ../../2012, a arguida CC, vendeu 3 moedas em ouro na EMP02..., Lda.”, sita na Rua ..., ..., ... ...;
Entre ../../2012 e ../../2012, o arguido II, vendeu vários objectos em ouro na “EMP03..., Lda.”, sita na Av. ... ...;
Entre ../../2013 e ../../2013, a arguida CC, vendeu diversos objectos em ouro na “EMP03..., Lda.”, sita na Av. ... ...;
Entre ../../2013 e ../../2013, a arguida GG, vendeu diversos objectos em ouro na Ourivesaria “EMP03..., Lda.”, sita na Av. ... ...;
Entre ../../2013 e ../../2012, a arguida CC, vendeu diversos objectos em ouro na “EMP03..., Lda.”, sita na Av. ..., ..., ... ...;
Entre ../../2013 e ../../2013, a arguida GG, vendeu vários objectos em ouro na “EMP04... Sociedade Unipessoal, Lda.”, sita na Rua ..., Sala ..., ... ....
10. O arguido MM no dia 6/8/20 13, detinha na sua residência do arguido, sita na Rua ..., ...:
(i) uma ..., n° ...81..., calibre 12, 2 canos, registada em nome de QQ e respectivo estojo;
(ii) 51 cartuchos de caça, de várias marcas e cores, calibre 12, 47 carregados com chumbo, 3 carregados com zagalote e um carregado com bala;
A arma estava acondicionada num estojo próprio, em plástico de cor ..., com a marca ..., e havia sido subtraída, juntamente com o estojo, pelo arguido AA nos termos constantes do facto provado 2).
O arguido MM recebeu a arma (e estojo) do arguido AA, com o propósito de obter com isso para si vantagem patrimonial, ciente da descrita proveniência ilícita contra o património, sem que fosse titular de licença de uso e porte para qualquer uma delas ou outra qualquer arma de fogo.
O arguido MM sabia bem que não podia adquirir, deter, transportar, guardar, portar ou usar as armas de fogo e as munições referidas uma vez que para tal não estava licenciado nem autorizado.
Agiu sempre de forma deliberada livre e consciente, bem sabendo ser a sua conduta proibida e punida por lei penal.
11. O arguido AA é filho da arguida GG a qual vive maritalmente com o arguido HH.
A EE é esposa do arguido JJ.
O AA e a BB viviam juntos, à data.
12. O arguido AA apresentou sempre, na escola, um comportamento rebelde, tendo apresentado uma reprovação, aquando da frequência do 8º ano de escolaridade, motivada por dificuldades de aprendizagem, tendo abandonado o sistema de ensino oficial, para ingressar num curso profissional de Bar e Mesa, ministrado pelo Centro de Formação Profissional que lhe conferiu o 9º ano de escolaridade, tendo então abandonado a escola.
Não obstante, nunca desenvolveu uma actividade profissional regular, contentando-se, a maior parte das vezes, em ajudar os pais no café e, de forma episódica, trabalha como empregado de bar e mesa.
O seu relacionamento com a arguida BB acabou por causa dos maus tratos que aquele lhe infligia.
O arguido revela imaturidade, impulsividade, não se preocupando com as consequências dos seus actos.
O arguido encontra-se actualmente em parte incerta de ..., foragido á Justiça, tendo sido declarado contumaz.
Do seu CRC constam as seguintes condenações:
- pela prática de 1 crime de furto qualificado, p.e p. pelo art. 204º/2-e) CP, cometido em 31/3/2011, sentença de 14/6/2012, transitada em 3/9/2012, pena de 2 anos e 2 meses de prisão, suspensa na sua execução, por igual prazo (PCS 538/11.... de ...);
- pela prática de 1 crime de violência doméstica, cometido em 19/4/2013, por sentença de 15/7/2013, transitada em 30/9/2013, pena de 2 anos e 2 meses de prisão, suspensa na dia execução por igual prazo, com regime de prova e condições.
- pela prática de 1 crime de receptação e de 1 crime de burla, cometidos em 28/3/2012, por acórdão de 13/11/2013, transitado em 13/12/2013, pena única de 1 ano e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução, por igual prazo e mediante regime de prova e condições;
- pela prática de 1 crime de furto qualificado, do art. 204°/2-e) CP, praticado a 23/12/201 3, 3 anos e 10 meses de prisão, suspensa por igual período, com regime de prova.
Tem mais processos pendentes, com condenações já proferidas embora não transitadas, ainda.
13. A arguida BB provém de um humilde agregado familiar.
Frequentou a escola até perfazer o 10º ano, e, após a ter frequentado sem sucesso um curso técnico-profissional equivalente ao 12º ano de escolaridade, desistiu dos estudos devido a desmotivação, com 18 anos de idade.
À data dos factos vivia com o AA, e ajudava a mãe deste no café onde trabalhava sem auferir qualquer rendimento, e era controlada, sofrendo ainda de violência doméstica.
Terminada a relação com o arguido AA, voltou para casa dos pais, e foi seguida em neurologia, tomando, ainda agora, medicação antidepressiva.
Após um período de actividade profissional, mantida durante cerca de catorze meses, ficou desempregada.
Iniciou novo relacionamento, em Abril de 2014, e, após residência com o companheiro, em ..., em caso dos pais deste, mudou-se com ele para ..., tendo nascido um filho dessa relação, que conta com cerca de 10 meses de idade.
Trabalha como auxiliar num lar de idosos.
Do seu CRC nada consta.
14. O arguido II:
Iniciou as aprendizagens escolares em idade própria e teve um percurso escolar regular até ao 8° ano de escolaridade. Contudo começou por revelar nessa fase alguma desmotivação para os estudos e optou por seguir o ensino via técnico profissional, tendo alcançado a equivalência ao 9º ano de escolaridade através de um curso de “Electricidade”.
Veio, porém, a abandonar os estudos logo depois, contava cerca de 16 anos de idade; nesta fase, inicia-se nos consumos de haxixe.
À data dos factos, vivia juntamente com a CC, com a qual habitava num anexo adjacente à casa dos avós maternos em ..., alojamento com condições razoáveis de habitabilidade e conforto, cedido graciosamente pela família.
Estava desempregado, embora, esporadicamente, trabalhasse na sucata/ferro velho.
Pese embora o apoio incondicional da progenitora e avós, e pese embora fosse seguido pela DGRS, o arguido continuou a trabalhar de forma muito irregular, confrontando-se várias vezes com o sistema de Justiça, até que em Junho de 2016, o arguido dá entrada no EP à ordem do P. 51/14.... para cumprir pena de 2 anos e 8 meses de prisão; no EP assume comportamento normativo.
Ao nível da sua personalidade, deixa transparecer permeabilidade a influências externas e dificuldades ao nível do autocontrolo, condições que não tem conseguido inverter/contrariar com vista à resolução dos seus problemas.
Do seu CRC constam as seguintes condenações:
- por crime de furto qualificado cometido a 5/9/2011, pena de 2 anos e 8 meses de prisão suspensa por igual prazo e com regime de prova, várias por sentença de 27/4/2012 transitada em julgado em 1/6/2012 (PCS 447/11.... do então 2º J TJ ...);
- por crime de furto qualificado cometido em Setembro de 2012, pena de 2 anos de prisão suspensa com regime de prova, por acórdão de 2/10/2013, transitado a 2/11/2013 (PCC 2296/1 ...).
- por crime de condução em estado de embriaguez, multa;
- por crime de furto qualificado (p. p. pelo art. 204º/2-e) CP), praticado a 9/2/2014, sentença transitada a 18/4/2016, pena de 2 anos e 8 meses de prisão efectiva.
15. Arguidos JJ e EE:
O arguido JJ é oriundo de um agregado de humilde condição, que emigrou muito cedo; regressado ao País, o arguido enfrentou grandes dificuldades de aprendizagem, fruto das diferenças linguísticas e do seu desinteresse — abandonou a escola aos 15 anos, com o 7º ano concluído.
Começou, então, designadamente, a trabalhar na construção civil e depois cumpriu o
serviço militar.
Iniciou o consumo de haxixe por volta dos 18 anos, o qual se tornou intenso.
Por força duma condenação entretanto sofrida, passa a ser acompanhado pela DGRS, e nesse contexto deixou os consumos.
A arguida EE frequentou a escola até ao 7º ano de escolaridade, e, com cerca de 14 anos abandona os estudos, passando a trabalhar.
Com 17 anos de idade, EE contrai matrimónio, do qual nasceram dois filhos, que contam actualmente com 13 e 15 anos.
O casal divorciou-se após 14 anos de convivência.
Os arguidos conheceram-se, então, e passaram a viver em união de facto, contraindo mais tarde matrimónio, tendo nascido desta relação uma filha que tem actualmente 18 meses de vida.
À data dos factos que estão na origem do presente processo judicial penal, o arguido residia com a EE, com os dois filhos menores desta, vieram a contrair casamento em ../../2013, tendo uma filha em comum com 3 anos de idade.
Trabalhavam regularmente, ele para um empreiteiro e ela num lar, mas ficaram desempregados, pelo que, em Janeiro de 2016, emigrou, juntamente com a EE — os filhos da EE e a do casal ficaram com familiares — para ..., onde trabalha como manobrador de máquinas; uma vez que a EE
 também trabalha, embora sazonalmente, na hotelaria, o casal goza de uma situação económica estável.
O arguido JJ já foi condenado, por acórdão transitado em julgado a 7/2/201 1, pela prática, em 15/9/2009, de um crime de tráfico de menor gravidade, na pena de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual prazo e mediante regime de prova.
A arguida não tem antecedentes criminais.
17. O arguido FF frequentou a escola normal até ao 6º ano, altura em que começou a apresentar um absentismo elevado sendo integrado num curso ..., que concluiu, com equivalência ao 9º ano, após o que abandonou a escola e começou a trabalhar à jeira, numa sucata, vivendo com os avós e a mãe em Gostei, ....
À data dos factos, estava desempregado.
Em Agosto de 2014, vai com a mãe viver para ... e, após ter trabalhado uns meses numa empresa de castanhas, voltou a ficar inactivo, até que, em início de 2016, obteve colocação na empresa “EMP05...” trabalhando no Hospital ....
Conta com uma condenação, transitada em julgado em 2/10/20 13, por furto qualificado tentado, cometido em Setembro de 2012, em pena de 2 anos e 4 meses de prisão, suspensa na sua execução, por igual prazo e regime de prova.
18. O Arguido KK é de modesta condição socioeconómica.
Frequentou a escola até perfazer o 12º ano, o que ocorreu quando tinha cerca de 21 anos.
Após a frequência de vários cursos de formação, emigrou uns meses, para ....
À data dos factos residia com os pais, em ..., e estava desempregado, pelo que a sua subsistência dependia do apoio que os seus pais lhe prestavam.
Presentemente, vive com a mãe (o pai faleceu-lhe), mantendo-se desempregado, embora, sempre que possa, faça formação profissional no IEFP.
Actualmente o arguido ao nível de ocupação de tempos livres referiu-nos que se afastou do anterior grupo de pares, passando a partilhá-los com rapazes de idade próxima da sua e da namorada, a qual se encontra a frequentar um curso superior no Instituto Politécnico ... (...), considerando ser uma boa influência na sua vida.
Denota capacidade para antecipar as consequências dos seus actos a curto/médio prazo e competências para delinear um projecto de vida futuro enquadrado socialmente.
Confessou o essencial dos factos.
Não tem antecedentes criminais.
19. O arguido MM é de modesta condição socioeconómica.
Após a 4ª classe, abandonou os estudos e foi ajudar os pais na agricultura e após os 16 anos foi trabalhar nas obras.
Contraiu casamento, do qual nasceram 3 filhos, dois deles maiores, que emigraram para ..., sendo que o 3º conta actualmente com 17 anos e vive com o arguido e mulher.
O arguido trabalha nas obras, auferindo 540 € mensais e a esposa trabalha como cozinheira auferindo 600 € mensais; a principal despesa do casal é constituída pelo crédito habitação, no valor de 800 € mensais.
Está bem inserido na sociedade.
Do seu CRC nada consta.
20. O arguido DD é de modesta condição socioeconómica.
Concluído o 7º ano, o arguido abandonou os estudos, em relação aos quais sempre demonstrou desinteresse; passou a conviver com os seus pares, de má influência sobre ele, mostrando-se inactivo laboralmente.
Porém, graças à intervenção da sua irmã, ZZ, que foi viver para um local mais afastado da cidade, logrou afastar-se das referidas companhias.
A partir de Fevereiro de 2015, criou a sua própria empresa de corte de madeira.
Goza do apoio familiar.
Do seu CRC nada consta.
21. Os arguidos HH e GG são de modesta condição socioeconómica.
Ela concluiu o 8º ano de escolaridade; ele, o 1º ciclo.
A arguida, quando tinha 16 anos, engravidou e desistiu dos estudos, casando com o pai do filho, AA.
Mais tarde, teve outro filho de outra relação, até que conheceu o arguido HH, com quem vive em união de facto, há cerca de 10 anos.
Exploraram dois cafés, sendo que o último, o «Alternativa» foi explorado entre finais de 2012 até 2014.
Depois, começou a trabalhar num lar, enquanto o arguido HH trabalhou como mecânico.
Actualmente e desde ../../2015, o casal e o filho mais novo foram para ..., onde a arguida passou a tornar conta da avó materna e onde o HH arranjou emprego na mesma área da mecânica.
Mostram-se bem inseridos socialmente e são todas por pessoas trabalhadoras.
Dos CRC’s respectivos, nada consta.
22. Com a sua conduta, descrita em 5), os arguidos AA, II e KK causaram ao demandante LL um prejuízo de 2.000€.
*
B) Factos Não Provados.

Não se provaram quaisquer outros factos com relevo (e só esses interessam) para a decisão, e, designadamente, não se provou que:

a) Os arguidos JJ, AA, II e FF, correspondem aos indivíduos que cometeram os factos referidos supra em 1) (335/12....), querendo assim fazer seus os referidos bens, bem sabendo que os mesmos não lhes pertenciam, que estavam no interior da residência do lesado onde bem sabiam não poder entrar sem para tal estarem autorizados pelo respectivo proprietário, agindo contra a vontade e sem autorização do respectivo dono.
b) Os arguidos JJ, II e FF correspondem aos indivíduos que a actuaram conjuntamente com o AA nos factos supra descritos em 2) (338/12....) querendo também aqueles retirar e fazer seus os referidos bens, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam, e quiseram entrar naquela habitação da forma descrita, bem sabendo que, quer ao aí entrarem quer ao retirarem o dinheiro, agiam contra a vontade e sem autorização do respectivo dono.
c) Para além do jipe ..., os arguidos pretendiam subtrair outros objectos e valores que encontrassem na garagem ou dentro do jipe.
d) Foram os arguidos JJ e EE quem indicaram ao AA a casa do LL, como sendo um bom alvo, mostrando-lhe a casa.
e) Os arguidos AA e DD são os indivíduos referidos supra em 4) (147/12....) e quiseram retirar e fazer seus os referidos bens, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam, e quiseram entrar naquela habitação da forma descrita, bem sabendo que, quer ao aí entrarem quer ao retirarem o dinheiro, agiam contra a vontade e sem autorização do respectivo dono.
Os arguidos AA, II, FF e JJ são os indivíduos referidos em 6) dos factos provados (19/13....) e quiseram retirar e fazer seus os referidos bens, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam, e quiseram entrar naquela habitação da forma descrita, bem sabendo que, quer ao aí entrarem quer ao retirarem o dinheiro, agiam contra a vontade e sem autorização do respectivo dono.
g) Os objectos supra referidos em 7) estavam na posse da arguida BB.
h) A arguida BB, ao receber os objectos referidos em 7) do arguido AA, quis com isso obter para si vantagem patrimonial assegurando a sua posse, ciente da respectiva proveniência ilícita.
i) O ouro vendido pelos arguidos, nos termos referidos em 9) dos factos provados, tinha sido obtido por factos ilícitos contra o património.
j) O dinheiro apurado com as vendas de ouro era também dividido pela GG e pelo seu companheiro HH, tendo esta perfeito conhecimento dos furtos praticados pelo seu filho, pelo JJ e pelos outros arguidos.
k) A arguida BB coabitou alguns meses com os arguidos AA, com a mãe deste (GG) e HH, sabendo perfeitamente o que se passava naquele meio familiar.
Faziam mesmo, modo de vida desta actividade.
l) Os arguidos GG, HH e CC, interagindo frequentemente com o AA por residirem na mesma habitação, tinham por missão a venda do ouro e outros objectos que recolhiam nesses assaltos e cujos proventos dividiam assim entre si.
m) O arguido MM deu dinheiro ao arguido AA aquando da entrega da arma.
*
C) Convicção.

O tribunal assentou a sua convicção com base na ponderação e análise crítica da prova (todo o acervo documental, por declarações, depoimentos, pericial...) produzida e/ou examinada em audiência, quer se trate de prova directa, i., é., da prova de factos que preenchem o tema da prova, quer de prova indirecta, i., é., da prova de factos que não integram o tema da prova, mas que permitem, concatenando-os com aqueles e com o auxílio das máximas da experiência comum, uma ilação quanto a factos constitutivos do tema da prova que não tinham sido objecto de prova directa (cfr., por todos, o estudo do Sr. Cons. Santos Cabral, Prova Indiciária e as novas formas de criminalidade, na revista Julgar, nº 17, 13 a 33), assim se cumprindo o comando do art. 127º CPP: “...a prova é apreciada segundo as regi-as da experiência e a livre convicção do julgador”.
O princípio da livre apreciação da prova reconduz-se à liberdade de decidir segundo o bom senso e a experiência de vida, temperados pela capacidade crítica de distanciamento e de ponderação — cfr., por ser muito desenvolvido, o Ac. do Supremo de 2/9/2012 —P. 233/O8JPBGDM.P3.S1, dgsi.

Duas notas:
Primeira:
Importa sublinhar que, enquanto a ocorrência dos factos (ou seja, que ocorreram os assaltos, períodos temporais, modus operandi, o que foi subtraído...) não sofreu, no essencial, grande discussão (temos os autos de notícia/denúncia, diligências dos OPC lavradas em autos, incluído autos de busca e apreensão, declarações dos ofendidos ou de pessoas que disso tinham conhecimento, relações de bens...), já as coisas foram opostas quanto à autoria, justamente porque em relação a grande maioria dos factos, não houve prova directa da autoria.
Neste conspecto, surgiu, como meio de prova «principal», a co-arguida BB, que prestou declarações incriminatórias de vários dos arguidos; e assumiu essa importância para a acusação por duas grandes razões (para além, evidentemente, da escassa prova directa): 1º quase todos os restantes arguidos se remeteram ao silêncio (caso dos co-arguidos GG, CC, II, EE, JJ, FF, HH; acabou por ser o caso, também, do AA que não compareceu ao julgamento); 2º os restantes arguidos que prestaram declarações em julgamento fizeram-no com referência a um único episódio, enquanto a arguida BB referiu-se a quase todos os furtos constantes da acusação (só não abrangeu o facto nº 7 da acusação).
As declarações prestadas por co-arguidos são perfeitamente valoráveis, conforme resulta a contrario sensu do art. 345º/4 CPP: “Não podem valer como meio de prova as declarações de um co-arguido em prejuízo de outro co-arguido quando o declarante se recusar a responder às perguntas formuladas nos termos dos n. 1 e 2”.
As perguntadas formuladas nos nºs 1 e 2 são as que incidem sobre “factos que lhe sejam imputados”.
Daqui resulta, pois, que se o co-arguido se recusar a responder ou a prestar esclarecimentos sobre os factos que lhe são imputados, as declarações incriminatórias que possa fazer sobre os restantes co-arguidos não são valoráveis.
O que se percebe.
Como escreve Clement Duran (citado no acórdão STJ a seguir mencionado), a imputação que um coacusado realiza contra outro coacusado tem o grande atractivo de que a faz quem aparece como um directo conhecedor do facto em juízo e incluso nada perde ou ganha ao incriminar o coacusado porque, assim, está a assumir a sua própria responsabilidade penal.
O campo privilegiado de actuação deste meio de prova corresponde, pois, quanto a nós, aos casos de comparticipação criminosa entre os co-arguidos (casos em que as declarações são prestadas, e para utilizar a expressão da RP — ac. de 15/4/2009, CJ, 2, 242 — contra os demais arguidos por um co-arguido que esteve envolvido na mesma actuação conjunta), pois, por um lado, só assim se obterá a prestação de declarações por quem seja um directo (e não em segunda mão) conhecedor do facto em juízo e, por outro porque só assim se poderá dizer que o relato da factualidade típica imputada ao co-arguido implicará tendencialmente, uma auto-responsabilização, ou, pelo menos e forçosamente, um esclarecimento de todo o circunstancialismo da actuação conjunta, na medida em que a descrição da forma como aconteceram os factos implica que o arguido tenha lá estado.
Por isso que o STJ, já no seu acórdão de 12/3/2008 (P. 08P694, Santos Cabral, dgsi) decidiu que “dizer em abstracto e genericamente que o depoimento do co-arguido só é válido se for acompanhado de outro meio de prova é uma subversão das regras da produção de prova, sem qualquer apoio na letra ou espírito da lei”, podendo tais declarações valer de per si, não deixando, de resto, de reconhecer o Supremo que “na maioria dos casos” tais declarações incriminatórias conduzem, outrossim, “à existência de uma auto inculpação”.
Nos restantes casos, em que ao co-arguido não é imputada, em comparticipação, a mesma factualidade, ou é imputada apenas parte dela e, em que, portanto, a incriminação dos outros co-arguidos não implica, nem uma auto - inculpação, mas nem sequer um esclarecimento do papel do arguido no facto do qual incrimina os restantes co-arguidos (casos em que não lhe é imputada a comparticipação no mesmo facto nem em conexo) ou no máximo um esclarecimento parcial (casos de imputação de parte dos mesmos factos ou de factos em parte conexos), é evidente que a necessidade de corroboração é particularmente aguda, tornando-se tanto mais premente quanto menor for a razão de ciência do co-arguido — ou seja, quanto maior for o seu distanciamento do circunstancialismo do facto imputado, maior, também, a necessidade de corroboração por elementos probatórios exteriores à arguida e objectivos.
A segunda nota é esta:
A prova dos factos atinentes aos crimes de receptação ficou irremediavelmente prejudicada pela forma como, na acusação, se encontram os mesmos narrados — na verdade, a «narrativa» acusatória, por tão vaga e genérica, não possibilitou a provada imputação concreta.
Designadamente:
- a acusação é totalmente omissa quanto ao «papel» da arguida EE, no que toca ao facto de ter acompanhado os co-arguidos II e JJ a ... quando estes lá foram vender ouro;
- é totalmente omissa quanto à origem/proveniência dos artigos e ouro, vendidos, isto é, omissa quanto à forma como foram à posse dos arguidos e donde provinham.
- quanto aos objectos referidos em 7), a acusação não refere a sua proveniência objectiva e concreta, contentando-se em afirmar que a arguida estava «ciente da sua proveniência ilícita» - o que é conclusivo, além de não se ver como a arguida poderia ter essa consciência, quando nem a acusação relata a proveniência dos mesmos, sendo ainda notório que a acusação «desloca» a questão da origem, do lado objectivo, concreto, para o lado subjectivo.
Daqui, portanto, a ausência de prova desses factos — acrescendo que face às declarações da arguida BB (o arguido AA ofereceu as consolas e jogos à irmã da arguida), ficou-se na dúvida sobre quem detinha os referidos objectos; é certo que a idade da dita irmã —3 ou 4 anos —faz duvidar daquela afirmação, mas não a toma impossível, além de que a explicação da arguida surge corroborada pelo depoimento de AAA (sua mãe, que confirmou que os referidos objectos foram para a filha mais nova, irmã da BB); pelo que a dúvida valorou-se evidentemente a favor da arguida.
Mais: os objectos em causa não constam da acusação, nem sequer de auto de notícia ou de denúncia, nem de relação de bens; de resto, nem o relatório de «informação» mas que é mais de diligência de fls. 715 e ss. é concludente, pois que o reconhecimento foi via telefone e mediante a remessa de fotografias, não tendo o reconhecimento obedecido ao formalismo do art. 147º ex vi do art. 148.º ambos do CPP, pelo que não pode valer como meio de prova nos termos do art. 147º/7 ex vi do art. 148º/3 ambos CPP e como o WW não depôs em julgamento, nem se pôde valorar como depoimento.
Daí, ter-se dado como provada a entrega à QNR dos jogos e consolas, pela arguida BB, mas não a proveniência dos mesmos nem logicamente o elemento subjectivo.
Também se deu por provada a materialidade das vendas de ouro referidas mormente em 9), até porque corroboradas pelas listagens remetidas pelas casas de compra e venda de ouro usado de fls. 675 e ss., mas não a proveniência do ouro nem logicamente o conhecimento da mesma por banda dos arguidos.
Daqui resultaram os factos provados 7), 2), 9) e os não provados g), h), i).
O facto provado nº 10) baseou-se nos docs. de fls. 156 e 156 v. que é o auto de notícia, quanto à subtracção da arma ... da residência do WW, onde de resto estava o livrete de manifesto da arma de fls. 157 em causa, 409 a 413 que correspondem aos autos de busca, apreensão, exame da arma e estojo, tudo conjugado com as declarações do arguido MM, quanto a ter ficado com a arma (e estojo), sem nada pagar (entrega esta também presenciada pela arguida BB, que, não obstante se referir a “venda”, não viu, naquela circunstância, qualquer entrega de dinheiro), mas que na parte restante não mereceu crédito, por a sua versão ofender frontalmente as regras da experiência comum e ser incoerente em si mesma: não queria a arma, mas ficou com ela; o AA não a queria e até a queria atirar ao lixo, mas o arguido prontificou-se então para lha guardar (!). De resto, que o arguido MM queria a arma (não se tratando sequer de mera guarda) resulta da circunstância de lhe terem sido apreendidos cartuchos/munições que não estavam com a arma, porquanto o estojo da mesma não comporta espaço para munições, conforme referido pela testemunha BBB cabo da GNR.
Que o arguido MM bem sabia da proveniência da arma resulta da própria circunstância em que a entrega ocorreu, designadamente, a entrega da arma desacompanhada do livrete de manifesto e de qualquer declaração de transmissão (e não podemos olvidar que o arguido MM foi militar, pelo que bem sabe da necessidade de tal documentação), e da circunstância de frequentar o café da mãe do AA, como ele próprio admitiu, e por isso bem sabia da actuação do arguido AA o qual como se verá, tinha «fama» de se «gabar», mormente dos assaltos.
A falta de licença, para além de confessada pelo arguido, resulta outrossim de fls. 388/389.
Passando agora à factualidade atinente aos furtos, e tendo presente o supra expendido quanto às declarações da co-arguida, importa ver facto a facto, e assim:
Relativamente ao facto nº 1, no que toca à materialidade da infracção, ou seja à própria ocorrência do assalto, o Tribunal baseou-se nos docs. de fls. 127/127v, 129, 132v, 140, 339, 340 (o que foi subtraído, modus operandi...), sendo que, quanto à data, o Tribunal baseou-se no depoimento de CCC (tomava conta da casa e tinha passado cerca de dois meses antes por lá).
Quanto à autoria, temos apenas as declarações da co-arguida BB, que relata uma conversa que terá ocorrido entre os arguidos JJ e AA, na qual aqueles teriam combinado levar a cabo um assalto à casa, que a co-arguida referiu ser rasteira, branca ou arnare1a, acrescentando que, posteriormente, no café, o AA terá contado a ocorrência do assalto. Mais referiu a arguida ter visto um compressor numa garagem arrendada pelo II e onde se encontrariam parte dos objectos furtados.
Porém, bem vistas as coisas, situamo-nos sempre no domínio do “relato do relato”, ou seja, da reprodução pela co-arguida BB de meras declarações de outros co-arguidos sem que aquela haja tornado parte no facto e, sobretudo, sem qualquer elemento exterior à arguida e objectivo - i. é, sem qualquer elemento que corrobore de forma significativa tais declarações e que não dependa das referidas declarações.
Isso é tanto mais importante quanto o arguido AA (este sobretudo, embora os outros a isso também não sejam imunes) foi descrito pela arguida BB e pelo arguido KK como um “gabarolas” que gostava de se «gabar das proezas», que gostava de alardear o cometimento de assaltos, pelo que maior premência ganhava a necessidade de comprovar a veracidade do relato (não sendo descabido pensar-se que o arguido AA poderá ter-se “gabado” de factos não levou a cabo).
Em suma, inexistem elementos probatórios objectivos e, portanto, verificáveis de per si, vale dizer cuja comprovação possa ser levada a cabo sem o contributo da arguida - pois quanto à suposta presença do compressor na garagem, para além de não estar estabelecido tratar-se do mesmo, a sua comprovação surge como impossível de levar a cabo a não ser acreditando na veracidade das declarações, que era precisamente o que se pretendia estabelecer. Neste conspecto parece evidente que o facto de a arguida identificar a casa (único dado objectivo) não é suficientemente significativo para servir de corroboração à execução do assalto por bando dos co-arguidos.
Relativamente ao facto n° 2, no que toca à materialidade da infracção, ou seja, à própria ocorrência do assalto, o Tribunal baseou-se nos docs. de fls. 156, 156v, 157, 165, 167-170 (o que foi subtraído, modus operandi...), e nas declarações de DDD, cunhado do WW, e lhe tomava conta da casa e precisou o período temporal em que os factos ocorreram e razão de ciência.
Quanto à autoria, e ao contrário do que ocorre no facto anterior, não só as declarações da arguida BB são mais pormenorizadas (de notar especialmente uma descrição precisa da casa, com menção a “moradia alta e clara” e “moderna” e “com portões cinzentos”, que corresponde efectivamente à casa em causa, como resulta de fls. 168 e que a arguida, após aquela descrição, reconheceu), como sobretudo temos um elemento probatório objectivo que liga directamente o arguido AA ao facto e que é constituído pela arma de fogo ..., que mais tarde entregou ao arguido MM, pois tal arma foi efectivamente subtraída da casa ora em referência (o que resulta logo da circunstância do livrete da arma estar na referida casa e foi logo, de resto, a fls. 156 dado notícia da subtracção da mesma). Ou seja, tal elemento, comprovável em si mesmo, vem corroborar as declarações da co-arguida em termos tais que lhe conferem suficiente credibilidade.
Relativamente ao envolvimento dos co-arguidos JJ e II, já falece o referido pressuposto, ou seja a presença quanto a eles do elemento objectivo que os ligue directamente à prática do facto e que seja verificável em si mesmo (por ex., a arguida BB referiu-se à existência de um LCD na casa do II como sendo proveniente do assalto à referida casa, vindo-lhe tal conhecimento de suposta conversa entre os dois EEE; sucede que, para além de não se poder comprovar nem a existência do LCD na casa do II nem a correspondência do mesmo com o que foi subtraído, a verdade é que, realizada busca a casa do II, nada foi apreendido por nata ter sido encontrado - cfr. fls. 423 e 424). No que respeita aos factos nos 3-a) e 3-b), no que toca à materialidade da infracção, ou seja à própria ocorrência do assalto, e tentativa do 2º, o Tribunal baseou-se nos docs. de fls. 20/20v, 23, 24, 26-28, conjugados com os depoimentos de RR ofendido/assistente que confirmou o assalto, o subtraído, dano no jipe e ocorrência dos factos na mesma circunstância, precisando a data e razão de ciência e de FFF, vizinha e que confirmou a ocorrência do assalto.
Na parte mais delicada da co-autoria, aqui a prova revelou-se mais exuberante pois as declarações da co-arguida BB surgem corroboradas por prova pericial, sendo de salientar, desde já, que aquelas declarações são prestadas pela co-arguida a quem era também imputado em comparticipação o cometimento dos factos. Assim, o relato da arguida BB (que nos dispensamos de reproduzir, salientando-se apenas que as vigilâncias dos arguidos à casa foram também corroboradas pelas testemunhas FFF, GGG, HHH, cerca de 2 dias antes, referindo-se ao carro fada III, avó do AA, muito reconhecível por ter o capô de cor diferente do restante) corresponde à factualidade que ficou provada quanto ao facto nº 3-a), vendo-se que aquela, porque participou nos factos, tem razão de ciência e, por isso, pormenoriza o seu relato, o que o credibiliza (por ex. no que toca à marca e modelo do veículo do casal dono da casa e, ainda, ao que foi subtraído), sendo de realçar que a arguida logo admitiu nas suas declarações não ter sabido, na altura, da ocorrência do facto n° 3-b) e que só mais tarde o mesmo foi comentado pelo AA, o que não deixa de demonstrar honestidade no relato, que só o toma mais isento.
Quanto ao facto nº 3-b), não obstante a co-arguida a ele se ter referido na sequência do relato do AA e, portanto, ser aqui também um “relato do relato”, este surge corroborado por um dado objectivo.
Com efeito, a arguida refere-se a uma “pegada” que o AA deixou na garagem onde se encontrava o jipe, acrescentando até que aquele lhe comentou a apreensão dos seus ténis, que surge confirmada de forma objectiva pelo auto de apreensão de fls. 79 dos autos, mostrando o AA preocupação com a ligação (que se lhe entolhava como fácil; se não o fosse, não se preocuparia) que se poderia estabelecer entre os mesmos e a pegada que a polícia encontrou na garagem, sinal de que era a sua. Mais, a fls. 80-82 estão fotografados os ténis apreendidos e a fls. 28/foto nº 8 ternos a “pegada” deixada na garagem.
Ora, se é certo que a perícia, cujo relatório consta a fls. 529 e ss., foi inconclusiva, ou seja, nem infirmou nem confirmou a correspondência em termos científicos da “pegada” com aquele concreto par de sapatilhas, não menos certo é que, como consta do relatório a pág. 4, verificou-se a existência da concordância formal entre o desenho da “pegada” e o da sola do ténis direito apreendido, sendo semelhantes os respectivos padrões; o que a perícia não conseguiu estabelecer foi a correspondência científica entre aquela “pegada” e a sola daquele concreto ténis apreendido, mas por falta de vestígios “com carácter individualizador” - o que, de todo o modo, também demonstra a correspondência no tamanho (n° 38), sendo notável a ausência de elementos que afastem a referida correspondência Concatenando o relato da co-arguida BB, designadamente a referência que lhe foi feita pelo JJJ, com a correspondência em termos de padrão entre a “pegada” e o ténis e em termos de verdade prático-jurídica, que é aquela que o Tribunal procura, obtemos o tal elemento individualizador que permite ultrapassar a dúvida razoável.
Uma última nota. No que toca à actuação das co-arguidas BB e CC, e que se encontra versada no facto provado n° 3-a), nada permite infirmar as declarações da arguida BB, designadamente o argumento esgrimido pelo MP no sentido de não ser crível que a mesma, acompanhada da CC, não tivesse efectivamente vigiado a SS em ..., enquanto os co-arguidos executavam o assalto, por não se atrever a desobedecer ao AA, de quem tinha medo, já que tal argumentação é opinativa/conclusiva, não afastando de forma inelutável a explicação da arguida BB, que até parece mais verosímil, porque vem na sequência de ter referido a presença do veículo dos proprietários na garagem, quando a viatura lá não estava, como forma encontrada de evitar o assalto - o que, de resto, o MP, embora sem o afirmar expressamente, não deixa de admitir implicitamente quando descreve o facto n° 3, parágrafo 3º, da acusação.
Diga-se ainda que esta matéria factual (a arguida ter ido a ... juntamente com a CC para vigiarem a SS) nem sequer consta da acusação.
O facto acrescentado quanto às arguidas terem servido de batedoras baseou-se nas declarações da co-arguida BB, o que, mais uma vez, reforça a credibilidade a atribuir-lhe.
O mesmo se diga quanto aos factos n.ºs 4) e 6).
Quanto ao nº 4:
Para além da materialidade das infracções (fls. 217: auto de notícia, quanto ao modus operandi, o que foi subtraído, data e presença da GNR no local n o dia 25/12/2012; 225 a 227: relatório técnico de inspecção; depoimento de TT, que a corroborou), termos apenas as declarações da co-arguida BB, que relatou que, em conversa com o AA e o HH, aquele apontou para a casa do ofendido dizendo que já «tinham feito a casa do polícia reformado”, “ele e o DD”.)
O arguido DD, em audiência, negou a prática dos factos — é certo que nem sempre de forma convincente, mas importa sublinhar que dessa circunstância não resulta a prova do contrário, pois sobre ele não impende o dever de falar, muito menos com verdade.
Tendo o arguido negado a prática dos factos — e o certo é que a testemunha ZZ, irmã do arguido, não deixa de corroborar a versão deste — e na ausência dos referidos elementos objectivos (o facto relatado pela arguida BB — o AA ter-se-á referido ás 5 garrafas de whisky, que se encontrariam na despensa do bar da mãe, como vindas de ... — é inverificável, pelo que tudo se resume, uma vez mais, às declarações da co-arguida; nem se diga que é notável que a arguida tenha «acertado» no nº de garrafas subtraídas da casa do TT, não podendo olvidar-se que tal conhecimento é, nesta fase, de fácil acesso, pois consta dos autos; e, convenhamos, a presença de garrafas de whisky num bar não será de per si motivos de admiração!), deu-se por não provada a autoria; é manifesto que nos situamos sempre e apenas na zona da possibilidade e nada mais.
Quanto ao facto nº 6 — a materialidade está provada documentalmente a fls. 185 a fls. 190 v. (auto de notícia, modus operandi..., livrete do manifesto), fls. 194 e 195 (relação de objectos furtados), 197 a 207 (relatório de inspecção da GNR), conjugado com o depoimento de XX, que torna conta da casa da cunhada, YY (é esta a dona da casa) que é emigrante, e confirmou o assalto — as coisas são ainda mais claras, porquanto aqui nem temos as declarações da coarguida que nem sequer sabia do assalto.
Quanto ao facto nº 5 (que correspondente ao facto n° 6 da acusação), este é aquele cuja prova se mostra mais incisiva e, assim, para além de a sua materialidade resultar dos docs. de fls. 25 1-253, 254, 258/258v, 259-264, 306-309 e 313/314 (auto de notícia quanto ao modus operandi, o que foi subtraído, auto de apreensão do cofre, reconhecimento e entrega do mesmo, relatório técnico de inspecção GNR e fotografias do cofre) conjugados com as declarações do demandante cível LL que confirmou a subtracção dos bens em causa, estragos no cofre, confirmando (o que credibiliza, note-se, as declarações dos co-arguidos BB e KK de seguida analisadas) quer a existência de um sujeito de ... que trabalhou para ele (referido pelos 2 co-arguidos, negando que tivessem sido o JJ e a EE) quer a presença de uma obra ali (que permitiu o uso da escora, como referi pelo KK), a autoria do mesmo resulta das declarações dos co-arguidos BB e KK.
Assim, a arguida BB relatou que, na noite dos factos, os co-arguidos AA, II e KK (este último conhecido por “UU”) pegaram no/a carro/carrinha do HH (pormenorizando que o/a empurraram sem ligar a ignição para o HH não ouvir; para além de credibilizar o relato, afasta qualquer conhecimento prévio do HH) e, mais tarde, o ... ligou-lhe dizendo-lhe para se preparar para fazer um curativo ao “UU” que se tinha magoado num dedo, o que de facto sucedeu, tendo a arguida feito o curativo àquele, o qual, questionado por ela, referiu-lhe “ter-se aleijado ao carregar o cofre”.
Como elemento que confere crédito de per si ao relato da co-arguida termos, desde logo, o facto de ter visto, na manhã do dia seguinte, o cofre, sem a porta, na garagem, tendo-lhe chamado a atenção o barulho da rebarbadora a cortar o aço, e ter-se referido a uma cor “meia azulada”. Mais referiu que os três co-arguidos carregaram o cofre e levaram-no “não sabe para onde”.
Ora, vistas as fotografias de fls. 279 e ss., salta imediatamente à vista que o interior do cofre é azul-turquesa, a tal cor “meia azulada” mencionada pela coarguida, percebendo-se a referência à cor do interior do cofre pois que o viu sem porta.
Para além disso, termos as declarações confessórias do co-arguido KK, que confirma a ocorrência dos factos tais quais se deram por provados e, designadamente, o uso, e a forma como foi feito, da carrinha do HH para carregar o cofre e que surge corroborado pelo teor do relatório pericial junto a fls. 648 e ss.
Na verdade, na sequência do relatório de diligência de fls. 269/270 com recolha de vestígios (confirmados de resto por KKK, GNR e LLL; cabo da GNR) e auto de apreensão do ... de fls. 290/291 (ver ainda fotografias do veículo de fls. 310-314) foi realizada perícia aos vestígios encontrados no local, e que constam do referido relatório de diligência e ainda das fotografias de fls. 278 e ss., com os danos existentes no veículo e descritos e visíveis nas fotografias de fls. 310 e ss. e com o estado em que se encontrava o cofre quando apreendido, perícia essa que admite, por um lado, que os danos no veículo são provenientes do cofre e, por outro lado, que os vestígios encontrados na garagem, designadamente os fragmentos de material, são idênticos ao material do para-choque traseiro do ..., o que, tudo conjugado, permitiu dar factualidade em apreço como provada.
De realçar que, quanto ás condições pessoais, familiares, económicas, o tribunal baseou-se nos relatórios sociais, conjugados com os depoimentos abonatórias das testemunhas AAA (arguida BB), MMM (HH), NNN e OOO (arguido MM), PPP (arguido KK), QQQ, ZZ (DD).
Baseou-se o outrossim o tribunal nos CRC’s, na certidão da sentença de violência doméstica.
Quanto aos factos não provados, já a eles nos referimos longamente, restando apenas acrescentar que os não referidos advieram da falta/insuficiência da prova quanto a eles produzida.»
***
3. APRECIAÇÃO DO RECURSO

A. O vício da insuficiência da matéria de facto provada para a decisão.
O recorrente começa por invocar o vício da insuficiência da matéria de facto provada para a decisão, com o argumento de que a «A decisão condenatória é omissa quanto a factos pessoais do arguido»[2] .
Tal vício, previsto no artigo 410.º, nº 2, al. a) do Código de Processo Penal, corresponde a uma «lacuna no apuramento da matéria de facto indispensável para a decisão de direito, isto é, quando se chega à conclusão de que com os factos dados como provados não era possível atingir-se a decisão de direito a que se chegou, havendo assim um hiato nessa matéria que é preciso preencher»[3].
No caso em apreço, e no que respeita ao conhecimento da pessoa do arguido/recorrente AA, o Tribunal a quo teve o cuidado de solicitar à DGRSP Relatório Social sobre ele incidente (cf. artigos 1º, nº 1, al. g) e 370º, nº 1 do Código de Processo Penal), o qual, foi elaborado por técnicos e junto ao processo (cf. referência ...13, de 20.10.2016).
Tendo o teor desse relatório, assim como o CRC, sido depois considerados para prova dos factos descritos no ponto 12 dos Factos Provados, nos seguintes termos:
«12. O arguido AA apresentou sempre, na escola, um comportamento rebelde, tendo apresentado uma reprovação, aquando da frequência do 80 ano de escolaridade, motivada por dificuldades de aprendizagem, tendo abandonado o sistema de ensino oficial, para ingressar num curso profissional de Bar e Mesa, ministrado pelo Centro de Formação Profissional que lhe conferiu o 9º ano de escolaridade, tendo então abandonado a escola.
Não obstante, nunca desenvolveu uma actividade profissional regular, contentando-se, a maior parte das vezes, em ajudar os pais no café e, de forma episódica, trabalha como empregado de bar e mesa.
O seu relacionamento com a arguida BB acabou por causa dos maus tratos que aquele lhe infligia.
O arguido revela imaturidade, impulsividade, não se preocupando com as consequências dos seus actos.
O arguido encontra-se actualmente em parte incerta de ..., foragido à Justiça, tendo sido declarado contumaz.
Do seu CRC constam as seguintes condenações:
- pela prática de 1 crime de furto qualificado, p.e p. pelo art. 204º/2-e) CP, cometido em 31/3/2011, sentença de 14/6/2012, transitada em 3/9/2012, pena de 2 anos e 2 meses de prisão, suspensa na sua execução, por igual prazo (PCS 538/11.... de ...);
- pela prática de 1 crime de violência doméstica, cometido em 19/4/2013, por sentença de 15/7/2013, transitada em 30/9/2013, pena de 2 anos e 2 meses de prisão, suspensa na dia execução por igual prazo, com regime de prova e condições.
- pela prática de 1 crime de receptação e de 1 crime de burla, cometidos em 28/3/2012, por acórdão de 13/11/2013, transitado em 13/12/2013, pena única de 1 ano e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução, por igual prazo e mediante regime de prova e condições;
- pela prática de 1 crime de furto qualificado, do art. 204º/2-e) CP, praticado a 23/12/201 3, 3 anos e 10 meses de prisão, suspensa por igual período, com regime de prova.
Tem mais processos pendentes, com condenações já proferidas embora não transitadas, ainda.»
Perante o que, para além de não se poder considerar que a decisão condenatória é omissa quanto a factos pessoais do recorrente, também não se vislumbra que outras diligências poderiam ter sido realizadas com vista a um maior conhecimento da pessoa deste arguido, que embora regularmente convocado não compareceu à audiência nem apresentou/requereu qualquer tipo de prova, encontrando-se, então, em parte incerta de ....
Improcede assim este ponto do recurso.
***
B. Falta ou insuficiência de fundamentação da matéria de facto provada; erro notório na apreciação da prova (artigo 410.º, nº 2, al. c) do Código de Processo Penal); consideração indevida das declarações incriminatórias da coarguida BB.

Alega também o arguido AA que o acórdão recorrido padece de falta de exame crítico das provas, verificando-se insuficiência de fundamentação e, a que existe, assenta quase na sua totalidade nas declarações da coarguida BB, incriminatórias para o recorrente, sem que estejam corroboradas por outros elementos de prova externos e autónomos.
*
Nos termos do disposto nos artigos 379.º, n.º 1, al. a) e 374.º, nº 2, ambos do Código de Processo Penal, um dos requisitos da sentença/acórdão, cuja falta é cominada com nulidade, é efetivamente a exposição tanto quanto possível completa, ainda que sucinta, dos motivos que fundamentam a decisão de facto, com indicação e exame crítico das provas que serviram para fundar a convicção do tribunal.
No caso em apreço, a leitura da motivação do acórdão recorrido permite constatar que o Tribunal a quo não só elencou todas as provas em que se baseou e considerou relevantes, como indicou os motivos de credibilidade das mesmas, mencionando a razão de ciência das testemunhas e teor dos respetivos depoimentos, correlacionando-os entre si. E, sempre que se impunha, apreciou também as provas à luz das regras da experiência comum e da lógica.
Aliás, o ponto de discordância do recorrente circunscreve-se à valoração feita pelo Tribunal a quo das declarações da coarguida BB, na parte em que o incriminam, por fundamentaram a prova da autoria de factos integradores dos crimes pelos quais foi condenado.
E, realmente, da motivação consta que a prova de determinados factos teve por base as declarações daquela coarguida. Porém, sempre que tais declarações eram incriminatórias de um coarguido, designadamente do recorrente, só foram consideradas quando havia elementos objetivos que as corroboravam, como se alcança dos seguintes excertos retirados da motivação e relativos à pessoa do recorrente:
«… Relativamente ao facto nº 2 [338/12....] …
Quanto à autoria … não só as declarações da arguida BB são mais pormenorizadas (de notar especialmente uma descrição precisa da casa, com menção a “moradia alta e clara” e “moderna” e “com portões cinzentos”, que corresponde efectivamente à casa em causa, como resulta de fls. 168 e que a arguida, após aquela descrição, reconheceu), como sobretudo temos um elemento probatório objectivo que liga directamente o arguido AA ao facto e que é constituído pela arma de fogo ..., que mais tarde entregou ao arguido MM, pois tal arma foi efectivamente subtraída da casa ora em referência (o que resulta logo da circunstância do livrete da arma estar na referida casa e foi logo, de resto, a fls. 156 dado notícia da subtracção da mesma). Ou seja, tal elemento, comprovável em si mesmo, vem corroborar as declarações da co-arguida em termos tais que lhe conferem suficiente credibilidade.
… No que respeita aos factos n.ºs 3-a) e 3-b) [318/12....]
…Na parte mais delicada da co-autoria, aqui a prova revelou-se mais exuberante pois as declarações da co-arguida BB surgem corroboradas por prova pericial, sendo de salientar, desde já, que aquelas declarações são prestadas pela co-arguida a quem era também imputado em comparticipação o cometimento dos factos. Assim, o relato da arguida BB (que nos dispensamos de reproduzir, salientando-se apenas que as vigilâncias dos arguidos à casa foram também corroboradas pelas testemunhas FFF, GGG, HHH, cerca de 2 dias antes, referindo-se ao carro fada III, avó do AA, muito reconhecível por ter o capô de cor diferente do restante) corresponde à factualidade que ficou provada quanto ao facto nº 3-a), vendo-se que aquela, porque participou nos factos, tem razão de ciência e, por isso, pormenoriza o seu relato, o que o credibiliza (por ex. no que toca à marca e modelo do veículo do casal dono da casa e, ainda, ao que foi subtraído), sendo de realçar que a arguida logo admitiu nas suas declarações não ter sabido, na altura, da ocorrência do facto nº 3-b) e que só mais tarde o mesmo foi comentado pelo AA, o que não deixa de demonstrar honestidade no relato, que só o toma mais isento.
Quanto ao facto nº 3-b), não obstante a co-arguida a ele se ter referido na sequência do relato do AA e, portanto, ser aqui também um “relato do relato”, este surge corroborado por um dado objectivo.
Com efeito, a arguida refere-se a uma “pegada” que o AA deixou na garagem onde se encontrava o jipe, acrescentando até que aquele lhe comentou a apreensão dos seus ténis, que surge confirmada de forma objectiva pelo auto de apreensão de fls. 79 dos autos, mostrando o AA preocupação com a ligação (que se lhe entolhava como fácil; se não o fosse, não se preocuparia) que se poderia estabelecer entre os mesmos e a pegada que a polícia encontrou na garagem, sinal de que era a sua. Mais, a fls. 80-82 estão fotografados os ténis apreendidos e a fls. 28/foto nº 8 temos a “pegada” deixada na garagem.
Ora, se é certo que a perícia, cujo relatório consta a fls. 529 e ss., foi inconclusiva, ou seja, nem infirmou nem confirmou a correspondência em termos científicos da “pegada” com aquele concreto par de sapatilhas, não menos certo é que, como consta do relatório a pág. 4, verificou-se a existência da concordância formal entre o desenho da “pegada” e o da sola do ténis direito apreendido, sendo semelhantes os respectivos padrões; o que a perícia não conseguiu estabelecer foi a correspondência científica entre aquela “pegada” e a sola daquele concreto ténis apreendido, mas por falta de vestígios “com carácter individualizador” - o que, de todo o modo, também demonstra a correspondência no tamanho (n° 38), sendo notável a ausência de elementos que afastem a referida correspondência Concatenando o relato da co-arguida BB, designadamente a referência que lhe foi feita pelo JJJ, com a correspondência em termos de padrão entre a “pegada” e o ténis e em termos de verdade prático-jurídica, que é aquela que o Tribunal procura, obtemos o tal elemento individualizador que permite ultrapassar a dúvida razoável.
(…)
Quanto ao facto nº 5 [1/13....] …este é aquele cuja prova se mostra mais incisiva … Assim, a arguida BB relatou que, na noite dos factos, os co-arguidos AA, II e KK (este último conhecido por “UU”) pegaram no/a carro/carrinha do HH (pormenorizando que o/a empurraram sem ligar a ignição para o HH não ouvir; para além de credibilizar o relato, afasta qualquer conhecimento prévio do HH) e, mais tarde, o ... ligou-lhe dizendo-lhe para se preparar para fazer um curativo ao “UU” que se tinha magoado num dedo, o que de facto sucedeu, tendo a arguida feito o curativo àquele, o qual, questionado por ela, referiu-lhe “ter-se aleijado ao carregar o cofre”.
Como elemento que confere crédito de per si ao relato da co-arguida termos, desde logo, o facto de ter visto, na manhã do dia seguinte, o cofre, sem a porta, na garagem, tendo-lhe chamado a atenção o barulho da rebarbadora a cortar o aço, e ter-se referido a uma cor “meia azulada”. Mais referiu que os três co-arguidos carregaram o cofre e levaram-no “não sabe para onde”.
Ora, vistas as fotografias de fls. 279 e ss., salta imediatamente à vista que o interior do cofre é azul-turquesa, a tal cor “meia azulada” mencionada pela coarguida, percebendo-se a referência à cor do interior do cofre pois que o viu sem porta.
Para além disso, temos as declarações confessórias do co-arguido KK, que confirma a ocorrência dos factos tais quais se deram por provados e, designadamente, o uso, e a forma como foi feito, da carrinha do HH para carregar o cofre e que surge corroborado pelo teor do relatório pericial junto a fls. 648 e ss.
Na verdade, na sequência do relatório de diligência de fls. 269/270 com recolha de vestígios (confirmados de resto por KKK, GNR e LLL; cabo da GNR) e auto de apreensão do ... de fls. 290/291 (ver ainda fotografias do veículo de fls. 310-314) foi realizada perícia aos vestígios encontrados no local, e que constam do referido relatório de diligência e ainda das fotografias de fls. 278 e ss., com os danos existentes no veículo e descritos e visíveis nas fotografias de fls. 310 e ss. e com o estado em que se encontrava o cofre quando apreendido, perícia essa que admite, por um lado, que os danos no veículo são provenientes do cofre e, por outro lado, que os vestígios encontrados na garagem, designadamente os fragmentos de material, são idênticos ao material do para-choque traseiro do ..., o que, tudo conjugado, permitiu dar factualidade em apreço como provada….» (Negritos nossos)

Pelo que, contrariamente ao que alega o recorrente, as declarações da coarguida BB, na parte em que o incriminam e foram positivamente valoradas, não constituem o único material probatório incriminatório, antes sendo suportadas por outras provas que lhes conferem credibilidade.
De todo o modo, tendo o Tribunal a quo sustentado a prova dos factos incriminadores do recorrente essencialmente nas declarações daquela coarguida, face às objeções a esse propósito levantadas no recurso, somos reconduzidos para a questão da valoração das declarações do arguido na parte que incriminam um coarguido, já abundantemente tratada na doutrina e na jurisprudência.
Note-se que dizemos apenas valoração (e não também admissibilidade), uma vez que é hoje já entendimento jurisprudencial pacífico que nada impede que um arguido preste declarações sobre factos de que possua conhecimento direto e que constituam objeto da prova, quer esses factos digam respeito só a ele ou também a outros coarguidos (cf. artigos 140.º, n.º 2 e 128.º, ambos do Código de Processo Penal). E desde que essas declarações sejam submetidas ao contraditório exercido em julgamento, constituem meio de prova a apreciar livremente pelo tribunal (cf. artigo 127.º do Código de Processo Penal) mesmo contra coarguido que tenha exercido o direito ao silêncio ou que se encontrava ausente (como foi o caso do recorrente)[4], na medida em que não são prova proibida, nos termos dos artigos 125.º e 126.º do Código de Processo Penal.
A questão das declarações do arguido incriminatórias do coarguido situa-se assim atualmente já não ao nível da admissibilidade ou possibilidade de valoração, mas antes em sede do critério da valoração, relativamente ao que se perfilham essencialmente duas posições:
. a que admite a valoração de declarações de coarguido apenas quando acompanhadas de outros meios de prova (também denominada por teoria da corroboração);
. e uma outra que sustenta a avaliação da credibilidade das declarações do coarguido no concreto e de acordo com as regras de qualquer outro meio de prova, princípios da livre apreciação da prova e “in dubio pro reo” (desde que tenha sido possível o exercício do contraditório).
Quanto a nós, seguimos a primeira das orientações enunciadas, essencialmente por o arguido ser um sujeito processual que não está sujeito a juramento e ao dever de verdade, nem aos efeitos da sua inverdade decorrentes da ameaça penal para as falsas declarações.
Retomando o caso sub judice verificamos que, como já supra se aludiu, as declarações da coarguida BB nas partes em que incriminam o recorrente e foram valoradas positivamente, encontram-se sempre corroboradas por outras provas, que por com elas coincidirem, apontam para a sua veracidade.
Encontrando-se exteriorizado na motivação do acórdão o processo lógico que determinou a convicção quanto à matéria de facto, de forma absolutamente percetível e sem hiatos, sem erro patente de julgamento e sem utilização de meios de prova proibidos, inclusive com explicação clara da razão pela qual foi dado crédito às declarações incriminatórias da coarguida.
O que é feito sem que do texto da decisão recorrida, por si só ou em conjugação com as regras da experiência comum, resulte qualquer dos vícios previstos no nº 2 do artigo 410.º do Código de Processo Civil.
Improcedendo assim mais este ponto do recurso.
***
C. Nulidade do acórdão por omissão de pronúncia quanto ao critério da escolha da pena e quanto à fundamentação da pena única (artigo 379.º, nº1 al. a) do Código de Processo Penal).

Sustenta ainda o recorrente a nulidade do acórdão, nos termos do disposto nos artigos 374.º, nº 2 e 379º, nº 1, al. a), do Código de Processo Penal, por omissão de pronúncia quanto ao critério da escolha da pena e quanto à fundamentação da pena única.
Efetivamente, nos termos do artigo 374.º, nº 2, do Código de Processo Penal, um dos requisitos da sentença, cuja falta é cominada com nulidade, é precisamente a fundamentação, “que consta da enumeração dos factos provados e não provados, e uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que sucinta, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para fundar a convicção do tribunal”.
Na fundamentação se incluindo, assim, também as razões de facto e de direito que se reportam à escolha e determinação da sanção, na qual se inclui a pena única.
Sendo que, do acórdão recorrido, a propósito da escolha das penas consta o seguinte (fls. 57 e 58 do acórdão):
«Quando a lei prevê, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade deve dar-se preferência à segunda, mas apenas se adequada e suficiente para acautelar as finalidades da punição (…).
Como é sabido, o nosso Direito Penal tem uma concepção funcional e relativa da pena, que não encontra justificação em si mesma, mas sempre por
referência à protecção de bens jurídicos e à reintegração do agente na sociedade, sendo por isso estas as finalidades da punição.
São prementes as exigências de prevenção geral relativamente ao crime de furto qualificado, pela cada vez maior e inquietante frequência com que o mesmo é praticado, um pouco por toda a parte, e esta comarca não é, longe disso, excepção, gerando grande celeuma, mormente quando são visadas casas de habitação.
Verdadeiramente, poucos crimes há que induzam um tão grande sentimento de insegurança, o que tudo demanda firmeza na punição.
(…)

Vejamos, agora, cada arguido de per si.
AA:
Antes de mais, note-se que inexiste reincidência, desde logo e sem necessidade de maiores considerações porque falece o pressuposto da efectividade da pena de prisão — as penas até então sofridas foram sempre suspensas na sua execução.
São muito elevadas as exigências de ressocialização: para além de nunca ter desenvolvido uma actividade profissional regular, revela imaturidade, impulsividade, não se preocupando com as consequências dos seus actos.
Impressiona o n.º de condenações (quatro) já sofridas (tendo em conta, até, a idade do arguido), sendo que a penúltima data de 13/11/2013, tendo o acórdão transitado em 13/12/2013, o que significa que cometeu pelo menos parte dos crimes (factos 3º e 3º-a) entre o momento da leitura do acórdão e o do trânsito — o que é extraordinariamente significativo.
Está contumaz, foragido à Justiça.
Por isso que em relação aos furtos do n° 1 do art. 204° CP, se opta pela pena de prisão, por ser manifesto que a de multa não é nem adequada nem suficiente.» (Negritos nossos)

Por sua vez, quanto à determinação da pena única, pode ler-se o seguinte no acórdão recorrido (parte final de fls. 58 e fls. 59 do acórdão):
«E, valorando, em conjunto os factos e a personalidade do arguido — factos graves, que não se limitam aos crimes contra o património, pois já foi condenado por violência doméstica, vendo-se dos seus antecedentes que a sua actividade criminosa iniciou-se em Março de 2011, o que permite concluir que, se não se pode falar ainda em carreira criminosa (os factos ora em apreciação são muito próximos entre si), também não poderemos reconduzir completamente a actuação do arguido à mera pluri-ocasionalidade; a personalidade mostra uma preocupante indiferença pelo dever-ser jurídico-penal e pelos outros — e dentro da moldura do cúmulo, ajusta-se uma pena de 4 anos e 2 meses de prisão»

Dos excertos acabados de transcrever, logo se alcança que a escolha das penas e a determinação da pena única se encontram devidamente fundamentadas, com referência aos preceitos legais aplicáveis e ao circunstancialismo fático que depõe a favor do arguido e contra ele, que foi considerado relevante.
Não havendo de forma alguma insuficiente fundamentação nestes pontos.
Pode é entender-se que as razões invocadas pelo Tribunal não justificam as penas aplicadas, só que essa é uma questão que nada tem a ver com a falta de fundamentação e não é suscitada pelo recorrente.
Naufragando mais este ponto do recurso
***
D. Discordância da aplicação de pena de prisão efetiva por se apresentar mais ajustada à realidade a suspensão da sua execução.

Por fim, defende o recorrente que a pena única de 4 anos e 2 meses de prisão deveria ter sido suspensa na sua execução.
Não há realmente dúvida de que, considerando a concreta pena única aplicada, se impunha que o Tribunal ponderasse a possibilidade da sua suspensão, nos termos do artigo 50.º, do Código Penal.
E, no caso, o Tribunal a quo cumpriu esta obrigação, apreciando, sempre com referência aos factos apurados, a possibilidade de aplicação das penas substitutivas da prisão elencadas na lei, designadamente a pena de suspensão de execução da prisão (artigo 50º do Código Penal), concluindo que «não poderá, de jeito nenhum, quanto a nós, suspender-se a execução da pena, já por a tal obstarem as exigências de prevenção geral — a comunidade encararia a suspensão como um «perdão judicial» e em vez de administrar justiça, o tribunal administraria demência — já por face às exigências de prevenção especial, não ser viável — a não ser, salvo o devido respeito por melhor e mais avalizada opinião, em termos puramente formais e retóricos, a formulação de um juízo de prognose favorável. »
Efetivamente, relida a factualidade com relevância para este ponto que foi considerada provada, para além da juventude do recorrente, que contava apenas 22 e 23 anos à data dos factos, não se vislumbra qualquer outro fator a seu favor.
Como bem salienta o Tribunal a quo, apurou-se que o recorrente nunca desenvolveu uma atividade profissional regular, revela imaturidade, impulsividade, não se preocupando com as consequências dos seus atos.
Impressiona (em face da idade do recorrente) o número de condenações já sofridas, duas por furto qualificado, uma por violência doméstica e uma por recetação.
A penúltima das condenações data de 13.11.2013, tendo o acórdão transitado em 13.12.2013, o que significa que o arguido cometeu pelo menos parte dos crimes (factos 3° e 3°-a) entre o momento da leitura do acórdão e o do trânsito, o que é extraordinariamente significativo do seu alheamento de qualquer projeto de ressocialização.
Como se isso não bastasse, encontrava-se foragido à justiça.
Sendo que a homogeneidade da atuação do agente e dos bens jurídicos violados, bem como a forma como foram perpetrados os crimes, revelam uma personalidade com caraterísticas de desestruturação pessoal, com reflexos na persistência de crimes contra o património.
Circunstancialismo que não permitir fundar, com o mínimo de segurança, a prognose positiva exigida para a escolha da pena de substituição.
Igualmente com relevância para a questão em análise, há ainda que atentar que a conduta criminosa do arguido é de molde a gerar alarme social, na medida em que, como é sabido, a comunidade nutre um sentimento de forte insegurança perante crimes de furto qualificado perpetrados em residências. Sendo que, como tem entendido a doutrina e jurisprudência mais recentes, são sobretudo razões de prevenção geral que justificam o afastamento da suspensão da execução da pena de prisão neste tipo de crimes, salvo se razões ponderosas ditarem o contrário, o que não se verifica in casu.
Neste contexto, não é obviamente possível concluir que a simples ameaça da pena e a censura dos factos sejam suficientes para assegurar as finalidades da punição, designadamente que com ela seja atingido o grau mínimo imposto pelas exigências de reprovação e prevenção geral.
Surgindo como absolutamente justificado o juízo de afastamento do instituto da suspensão da execução da pena de prisão efetuado no acórdão recorrido.
***
III. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes desta secção penal do Tribunal da Relação de Guimarães, em julgar improcedente o recurso interposto pelo arguido AA.
Vai o recorrente condenado em custas, fixando-se em 4 (quatro) Ucs a taxa de justiça.
*
Guimarães, 21 de maio de 2024
(Texto integralmente elaborado pela relatora e revisto pelos seus signatários – artigo 94.º, n.º 2 do Código de Processo Penal –, encontrando-se assinado na primeira página, nos termos do artigo 19.º da Portaria nº 280/2013, de 26.08, revista pela Portaria nº 267/2018, de 20.09.)

Fátima Furtado (Relatora)
Anabela Varizo Martins – com declaração de voto. (1ª Adjunta)
Carlos Coutinho (2º Adjunto)

Declaração da de voto da 1ª Adjunta, Anabela Varizo Martins:
Voto a decisão relativamente à questão da valoração das declarações da co-arguida BB, com a seguinte ressalva:
Pese embora defenda que o depoimento incriminatório de co-arguido está sujeito às mesmas regras de outro e qualquer meio de prova, ou seja, aos princípios da investigação, da livre apreciação e do in dubio pro reo, afigura-se-me que, no caso concreto, como é sustentado na fundamentação supra exposta, tendo sido assegurados o funcionamento destes e o exercício do contraditório, nos termos preconizados pelo art.º 32º da CRP e conste da respectiva motivação explicação clara da razão pela qual foi dado crédito às declarações incriminatórias da co-arguida, nenhum argumento subsiste contra a validade de tal meio de prova, como foi decidido.


[1] Cfr. artigo 412º, nº 1 do Código de Processo Penal e Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, 2ª edição, Editorial Verbo, 2000, pág. 335, V.
[2] Cf. 4ª conclusão do recurso.
[3] Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 8ª ed., Lisboa, 2012, p. 74.
[4] A ausência do recorrente em audiência não comprometeu o direito ao contraditório, pois que se encontrou sempre presente o seu defensor, que teve real possibilidade de fazer as perguntas que entendesse necessárias para aquilatar da credibilidade das declarações da coarguida BB, como aliás era seu dever (artigos 63.º e 345.º do Código de Processo Penal). Sedo que, mesmo que fisicamente presente, sempre seria através do defensor que tinha de ser exercido o contraditório.