Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1387/11.5TBBCL.G1
Relator: CONCEIÇÃO BUCHO
Descritores: CONTRATO
TAXA DE JURO
RISCO NAS OBRIGAÇÕES
ALTERAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS
CONTRATO DE SWAP DE TAXA DE JURO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/31/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I - O contrato de swap da taxa de juro é um contrato a prazo, onde as prestações das partes são diferidas para datas futuras, onde podem existir momentos regulares de troca de fluxos financeiros ou existir apenas um só momento de fluxos financeiros no final do prazo.
II - Apesar de ser um contrato aleatório, verificando-se uma alteração anormal das circunstâncias que se traduz num profundo desequilíbrio entre as prestações, o mesmo pode ser resolvido nos termos do disposto no artigo 437º do Código Civil.
Decisão Texto Integral: Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães.

I - "F… Lda." intentou a presente acção de condenação, com a forma ordinária, contra o "Banco…, S.A, alegando, em síntese, que no 1º semestre de 2008 celebrou com a ré um contrato de locação financeira imobiliária que teve por objecto um pavilhão industrial; na sequência da celebração desse contrato, um responsável da dependência de Braga do réu incentivou a autora a celebrar um outro contrato com vista a fixar a taxa de juro dentro de determinados limites/barreiras, pois a prestação paga pela autora no contrato de locação financeira estava indexada à taxa Euribor e temia-se que essa taxa continuasse a subir. Aquele responsável referiu à autora que no contrato de taxa de juro que lhe pretendia propor fixava-se um limite da taxa de juro dentro da qual a autora apenas pagava a taxa de juro prevista no contrato, ou seja 4,55%, sendo que se essa taxa aumentasse até ao limite de 5,15%, a autora pagaria sempre aquela taxa inicial de 4,55%. Caso a taxa de juro ultrapassasse aquele limite, a autora teria que pagar a taxa de juro correspondente, perdendo todo e qualquer benefício. Nesse caso, o réu poderia fazer cessar o contrato;
correspondentemente, caso a taxa de juro descesse até aos 3,95%, a autora continuaria a pagar a taxa de 4,55%, retirando daí o réu um benefício de 0,60%; e, caso a taxa de juro descesse abaixo dos 3,95%, a autora teria então também o direito de fazer cessar de imediato o contrato, por forma a pagar a taxa de juro real e efectiva. Com esta explicação do réu, a autora ficou convencida que o réu podia denunciar o contrato a partir da taxa de juro dos 5,15% e a autora, por sua vez, também o poderia fazer a partir dos 3,95%, e só por isso aceitou celebrar com o réu o referido contrato, o que aconteceu em 8/8/2008. Acresce que o contrato em causa foi apresentado à autora antecipadamente redigido pelo réu, com as condições que o réu aí pretendeu colocar; a autora apenas se limitou a assinar, nada lhe tendo sido lido, nem explicado. O legal representante da autora é pessoa muito simples, que tem apenas a instrução básica e nunca tinha contratado qualquer operação bancária especial ou complexa, sendo certo que nunca a autora se apercebeu que o contrato que assinava poderia acarretar qualquer risco e, consequentemente, a perda de valores significativos. Acontece que a partir do mês de Janeiro de 2009 a taxa de juro começou a descer a um ritmo acelerado, ultrapassando o limite de 3,95% e, em 29/6/2009, o réu debitou à autora o total de € 6.660,63. Nessa altura, a autora comunicou ao réu que pretendia imediato fim ao contrato, tendo o réu esclarecido que para o fazer teria de pagar um valor superior a € 50.000,00.
Mais alega a autora que crise económica e financeira que se instalou a partir de 15/9/2008, fez descer deforma acentuada as taxas de juro, pelo que o contrato celebrado sofreu um grande e repentino desequilíbrio, sendo certo que as circunstâncias que despoletaram a descrita crise financeira e económica não eram de modo algum previsíveis e, por isso, não podiam estar cobertas pelos riscos próprios do contrato.
Assim, a referida alteração anormal das circunstâncias permitirá sempre à autora pedir a resolução do contrato de taxa de juro em discussão nestes autos.
Com estes fundamentos, a autora pede que se declare nulo e de nenhum efeito o contrato objecto desta acção, condenando-se o réu a restituir a quantia de € 44.709,38, acrescida dos juros de mora que se vencerem a partir da citação; caso assim não se entenda, que se anule o contrato de swap de taxa de juro por erro na transmissão da declaração e erro sobre o objecto do negócio ou, caso assim não se entenda, que se declare resolvido o contrato por alteração anormal das circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar e, em qualquer um dos casos, ordenando-se a restituição à autora da quantia de e 44.709,38, acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento.
O réu contestou, alegando que a celebração do contrato foi precedida de vários contactos entre autora e réu, com inúmeras trocas de correspondência, e uma reunião onde foram explicadas à autora as vantagens e desvantagens da cobertura da taxa de juro, com a proposta de várias soluções; acresce que o legal representante da autora sempre se fez acompanhar de alguém que se apresentava como assessor para estas matérias. Mais alega que o contrato de swap em questão cobre, nos seus precisos termos, o risco de variação de taxa de juro, mas não defende a autora de qualquer variação da taxa de juro, pelo que a ré impugna tudo o que a autora alega em contrário, defendendo que nunca fez crer à autora que esta poderia denunciar o contrato a partir dos 3,95%. Mais defende o réu que atenta a natureza do contrato de swap, o risco de alteração das taxas de juro não pode ser excluído do contrato, razão pela qual deve improceder o pedido de resolução por alteração das circunstâncias. Mais alega que a autora aceitou as consequências benéficas do contrato que agora pretende declarar nulo, pelo que a sua conduta excede os limites impostos pela boa-fé e pelos bons costumes, representando um grosseiro exercício do direito na modalidade de venire contra factum proprium.
A ré conclui pela improcedência da acção e pede a sua absolvição do pedido.
A autora replicou sem novidade.

Os autos prosseguiram e foi então proferida sentença na qual se decidiu:

Pelo exposto, julgo a acção procedente e, em consequência, declaro a resolução do contrato de swap de taxa de juro com barreira celebrado pelas partes, condenando o réu a restituir à autora a quantia de € 44.709, 38 acrescida dos juros de mora que se vencerem desde a citação até efectivo cumprimento.

Inconformado o réu interpôs recurso, cujas alegações terminam com as seguintes conclusões:
I. A sentença de que ora se recorre enferma de erro de julgamento, designadamente por incorrecta aplicação e interpretação de normas jurídicas, maxime do art. 437.º do Código Civil (doravante, o CC);
II Na parte em que procede à resolução do contrato de SWAP por alteração das circunstâncias, a decisão de que ora se recorre a) assenta numa aplicação forçada - e portanto, necessariamente indevida - ao caso Sub Júdice do instituto da alteração das circunstâncias, previsto e regulado no art. 437.º e segs. do Código Civil; b) desconsidera o facto de estar em causa a resolução de um contrato de execução periódica, do qual resulta a exclusão das prestações já realizadas entre as partes do âmbito de eficácia da resolução;
iii. A subsunção do acervo factual dado como provado, ao conjunto de pressupostos de cujo preenchimento depende a aplicação do instituto da alteração das circunstâncias, é inadequada e revela, portanto, uma incorrecta apreensão pelo tribunal a quo da configuração financeira do contrato de SWAP que subjaz aos presentes autos;
iv. A afirmação de que a “repentina e acentuada descida da taxa de juro, como consequência da já mencionada crise financeira e económica, que não era de modo algum previsível, reflectisse directa e intrinsecamente no contrato de swap de taxa de juro, que tinha precisamente na sua essência e base a taxa de juro” (mantenha-se, ou não, apesar da impugnação a que se procedeu, o ponto 36 da matéria de facto dada como provada), deve ser entendida cum grano salis;
v. A “essência” do contrato de SWAP reside no risco subjacente à variação da taxa de juro;
vi. Qualquer variação – seja ela ascendente ou descendente – da taxa de juro, e independentemente do que a motivou, não pode, por isso, deixar de considerar-se abrangida pelo álea (ou risco) própria do contrato de SWAP;
vii. Sendo essa variação que, por referência às barreiras – de valor de taxa de juro – acordadas entre as partes, irá ditar a maior ou menor onerosidade do contrato para cada uma delas;
viii. O SWAP de taxa de juro é um tipo contratual marcadamente aleatório e a principal consequência da classificação do contrato de SWAP na categoria dos contratos aleatórios é a não aplicação do regime do 437.º do Código Civil sobre resolução com base na alteração das circunstâncias, em face de uma inesperada e grave evolução, para uma ou outra das partes, das taxas adotadas como referentes do contrato de SWAP celebrado;
ix. Não deverá ser considerada como alteração das circunstâncias para efeitos do art. 437.º do Código Civil uma qualquer e inesperada reviravolta nas taxas de juro ou câmbio de mercado, pois neste caso a alteração verificada encontra-se abrangida pelo risco inerente e pela própria finalidade do negócio;
x. Do teor do contrato de SWAP dos autos resulta claro e inequívoco que o risco de variação descendente da Euribor - independentemente da extensão dessa variação - foi expressa e
contratualmente assumido pelas partes;
xi. Qualquer variação da Euribor 3 meses abaixo da barreira contratada de 5,15% representa a concretização do risco a que as partes do contrato de SWAP se sujeitaram por via da respectiva celebração;
xii. Tendo o recorrido celebrado o contrato de SWAP contando com a possibilidade de, em caso de evolução desfavorável (à luz do contrato) das taxas de juro, vir a suportar uma taxa fixa de 4, 55%, a atual aplicação de tal taxa não é mais do que a concretização de um risco que foi contratualmente previsto e assumido;
xiii. A tónica deve, por isso, ser dada ao impacto que a variação das taxas de juro comporta no conteúdo debitório do contrato, ou, dito por outras palavras, no conteúdo debitório que seria previsível e expectável à luz do clausulado contratual;
xiv. No caso concreto, tal impacto resumiu-se – e resume-se - ao simples desencadear da “operacionalidade” de um elemento contratual relativamente ao qual a Recorrida manifestou a sua expressa anuência, a saber: a aplicação da já referida taxa “fixa” de 4, 55%, que mais não é do que a concretização de um risco a que o Recorrido contratualmente se sujeitou - risco previsível e objecto, afinal, de previsão no próprio contrato;
xv. Não assiste, por isso, razão ao Tribunal a quo quando afirma: “para a autora, as consequências do cumprimento do contrato ultrapassam o grau de risco nele previsto e com que as partes poderiam razoavelmente contar”;
xvi. Ademais, ao reconhecer, para efeitos do art. 437.º do C.C., que “o referido contrato sofreu um grande e repentino desequilíbrio, verificando-se que a autora, no curto espaço de 3 meses, passou a ter um encargo e um prejuízo grave decorrente desse contrato - pontos 35 a 38 dos factos” (destaque nosso), o tribunal a quo desconsiderou o facto de estar em causa um contrato desprovido de uma “estrutura de onerosidade“ (ou de um “ponto de equilíbrio”
entre prestações) pré-determinada;
xvii. No momento da celebração do contrato de SWAP as partes assumem o risco de realizar pagamentos futuros segundo regras pré-fixadas e de acordo com a evolução do mercado e, consequentemente, sujeitando-se ambas a perder (nisto consiste a onerosidade do contrato);
nenhuma sabe, contudo, qual o valor exato das prestações que terá de efetuar, nem sequer se vai ter de efetuar alguma prestação;
xviii. Por conseguinte, em face da impossibilidade de determinação, no contrato de SWAP, da respetiva estrutura de onerosidade (ou da medida de equivalência entre as prestações das partes), sempre terá de concluir-se pela inexistência de um ponto de referência (ou um termo de comparação) com base no qual possa afirmar-se que o contrato está em desequilíbrio, e muito menos em “grande” desequilíbrio – sem a identificação do qual, salvo melhor opinião, não pode considerar-se aplicável o instituto da alteração das circunstâncias;
xix. De todo modo, se a existência de um prejuízo é condição necessária da aplicação dos art.s 437.º a 439.º do CC, não será qualquer prejuízo que o lesado pode invocar, tornando-se necessário que ele atinja certa dimensão;
xx. O prejuízo só justifica a resolução ou modificação do contrato quando se verifique um profundo desequilíbrio do contrato, sendo intolerável, em conformidade com a boa fé, que o lesado o suporte - torna-se, pois, necessária verificação de dano grave, considerável ou descomunal;
xxi. A natureza aleatória sui generis do contrato dos autos afasta, assim, o grau mínimo de certeza exigível para uma justa e razoável aplicação do instituto da alteração das circunstâncias;
xxii. O contrato de SWAP é um contrato de execução periódica;
xxiii. O art. 434.º, n.º2, do C.C., excepciona da eficácia resolutiva as prestações - já - efectuadas por força da execução de contrato de execução periódica;
xxiv. A questão que se coloca é, portanto, a de saber se ao abrigo do contrato de SWAP dos autos foram realizadas prestações relativamente às quais a alteração das circunstâncias - v.g. a descida acentuada das taxas de juro, dado que o conceito de crise não é naturalmente, um conceito operativo -, torna legítima a respetiva abrangência pela eficácia resolutiva;
xxv. Enquanto causa específica de resolução, o instituto da alteração das circunstâncias depende da confluência de vários fatores, nomeadamente: i) do carácter imprevisível e/ou “anormal” da alteração das circunstâncias; ii) de que a exigência das obrigações pela parte lesada “afecte gravemente os princípios da boa fé; e iii) de que alteração não se encontre coberta pelos riscos próprios do contrato” (cf. art 437.º, n.º1, do C.C.);
xxvi. Admitindo que a alteração da taxa de juro traduzida numa descida “repentina e acentuada das taxas de juro” provocada pela crise financeira mundial será concebível como alteração das circunstâncias relevantes, necessário será determinar a partir de quando pode afirmar-se que: a) o impacto dessa descida no âmbito debitório do contrato, tornou o cumprimento das obrigações dele emergentes “gravemente” contrário aos “princípios da boa fé” e que b) a extensão da variação das taxas extravasou do risco próprio do contrato (cf. art. 437.º, nº 1, do C.C.);
xxvii. Pois, apenas a partir da verificação cumulada dos mesmos poderá afirmar-se que entre as prestações realizadas e a causa da resolução – v.g. a alteração das circunstâncias - existe um vínculo que legitima a resolução de todas elas (cf. art. 434.º, n.º 2, do C.C.);
xxviii. A decisão de primeira instância é omissa sobre o momento (ou valores de taxa de juro, ou prestações), a partir do qual o tribunal deu todos e cada um dos pressupostos do n.º 1 do artigo 437.º por verificados;
xxix. Esse momento é fundamental para uma aplicação do instituto da alteração das circunstâncias conforme com o sentido normativo do art. 434.º,n.º2, do C.C.;
xxx. Assim, quanto ao momento da verificação do requisito de que a “exigência das obrigações assumidas pela parte ofenda gravemente o principio da boa fé”, deverá tomar-se em consideração, entre outros, o facto de o prejuízo só justificar “a resolução ou modificação do contrato quando se verifique um profundo desequilíbrio do contrato, sendo intolerável, em conformidade com a boa fé, que o lesado o suporte. Torna-se, pois, necessária verificação de dano grave, considerável ou descomunal”;
xxxi. No caso Sub Judice a apreciação da questão de saber se a exigência do cumprimento das obrigações contratuais do Recorrido ofende gravemente a boa fé, não pode desligar-se da estrutura de onerosidade que as partes inicialmente conjeturaram para o contrato de SWAP;
xxxii. Todavia, dada a natureza aleatória do mesmo, tal estrutura não é, nem nunca foi, passível de ser determinada ex ante, e muito menos determinada com precisão;
xxxiii. Assim sendo, só a indemonstrada manutenção do contrato - com a estrutura de onerosidade atual - até ao seu termo de vigência poderia chocar de frente com aquele princípio;
xxxiv. Se, por hipótese, subissem as taxas de juro, a aplicação da “cláusula” rebuc sic standibus aos presentes autos não iria sequer ser hipotisada porque, nessa situação, estaríamos perante a mais elementar e “equilibrada” concretização de risco de variação de taxas que o contrato de SWAP cobre;
xxxv. Não sendo assim, a ausência de uma estrutura de onerosidade (ou de um ponto de equilíbrio entre prestações) contratualmente (pré) determinada e, bem assim, de uma equivalência necessária entre prestações, impõe a afirmação de que apenas a manutenção – nos termos actuais - da exigência do cumprimento das obrigações emergentes do contrato de SWAP, até ao termo do respectivo prazo de vigência, poderia, eventualmente, ser qualificada como gravemente ofensiva da “boa fé”;
xxxvi. No limite, a resolução do contrato dos autos apenas deverá ser decretada com eficácia ex nunc, assim salvaguardando as prestações já realizadas entre as partes (cf. art. 434, n.º 2);
xxxvii. Como bem salientou o tribunal a quo na sua decisão: “(…)o contrato de swap de taxas de juro envolve o risco de oscilações nas taxas de juro e disso foi a autora informada”.
xxxviii. A estipulação contratual de uma taxa fixa de 4,55%, revela que as partes contemplaram, aquando da celebração do contrato, a possibilidade - e o risco - de a Euribor a 3 Meses vir a descer abaixo daquele valor.
xxxix. A sentença é omissa quanto aos valores de taxa de juro a partir dos quais o risco próprio do contrato foi ultrapassado.
xl. Atento o teor da cláusula primeira do contrato celebrado, em especial onde se procede à fixação de uma taxa (fixa) de 4,55%, o entendimento de que o SWAP não cobre o risco de variações das taxas de juro abaixo desse valor, ofende claramente a letra e o espírito daquele contrato.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II – É pelas conclusões do recurso que se refere e delimita o objecto do mesmo, ressalvadas aquelas questões que sejam do conhecimento oficioso – artigos 684º e 685-A Código de Processo Civil -.

Em 1ª instância foi dada como provada a seguinte matéria de facto:

1. A autora é uma empresa industrial que fabrica peúgas para exportação - Al. A) da Matéria de Facto Assente.
2. Em 2008, a autora celebrou com o réu um contrato de locação financeira imobiliária que teve por objecto um pavilhão industrial, sito em …, Barcelos - Al. B) da Matéria de Facto Assente.
3. Em Julho de 2008, o responsável da dependência de Braga do réu, Dr. Pedro …, apareceu na sede da autora incentivando-a a celebrar um outro contrato - Al. C) da Matéria de Facto Assente.
4. Esse responsável do réu referiu à autora que um tal contrato tinha a ver com o facto de a taxa de juro dos empréstimos bancários se encontrar nessa altura muito alta (4,40%) - Al. D) da Matéria de Facto Assente.
5. E daí a conveniência em celebrar um contrato que fixasse essa taxa de juro dentro de determinados limites/barreira, isto porque, a prestação referente ao contrato de locação se encontrava indexada à taxa Euribor e, como essa taxa estava alta (e temia-se que continuasse a subir), essa prestação tinha tendência também para subir - Al. E) da Matéria de Facto Assente.
6. Ou seja, em vez de se correr o risco das suas prestações do contrato de locação subirem sem limite, por efeito desse contrato, fixar-se-ia um limite/barreira dentro do qual a autora pagaria sempre a mesma taxa de juro - Al. F) da Matéria de Facto Assente.
7. Sendo que, caso a taxa de juro subisse para além desse limite/barreira, a prestação da autora referente ao contrato de locação manter-se-ia exactamente no mesmo valor - Al. G) da Matéria de Facto Assente.
8. Esse responsável do réu referiu à autora que, no contrato de taxa de juro que lhe pretendia propor, fixava-se um limite/barreira da taxa de juro, dentro do qual, a autora apenas pagava a taxa de juro base prevista no contrato - Al. H) da Matéria de Facto Assente.
9. Em 08.08.2008, o réu apresentou e solicitou à autora que assinasse o referido contrato de taxa de juro, tendo ficado a constar do mesmo, designadamente, o seguinte:
CONTRATO DE SWAP DE TAXA DE JURO COM BARREIRA
Entre:
a).. Primeiro Contratante:
BANCO, S.A. (…)
b).. Segundo Contratante:
F…, LDA, (…)
É celebrado e reciprocamente aceite de boa-fé, o presente contrato de swap de taxa de juro com barreira, o qual se rege pelo clausulado subsequente (…):
CLÁUSULA PRIMEIRA (Objecto)
Pelo presente contrato, acordam o Banco e a Cliente, em contratar um instrumento financeiro derivado denominado Swap de taxa de juro com barreira, ao abrigo do qual as partes ficam obrigadas a efectuar entre si pagamentos, nos termos e condições previstos na ficha técnica que se transcreve infra e no contrato que ora se celebra:
a).. Instrumento financeiro contratado: Swap de taxa de juro com barreira
b).. Valor nocional inicial: € 600 000,00 (seiscentos mil euros)
(…)
Sendo que:
i).. Se a Euribor a 3 meses, for igual ou inferior a 5,15%, a taxa variável cliente, será de 4,55%
ii).. Se a Euribor a 3 meses, for superior a 5,15%, a taxa variável cliente, será a referida Euribor a 3 meses
(…)
CLÁUSULA SEGUNDA
(Vigência)
1.. O presente contrato vigorará, por 5 anos, com início em 8 de Agosto de 2008 e termo em 2 de Agosto de 2013
2.. Não obstante o exposto no ponto anterior desta cláusula, a cliente poderá solicitar ao Banco o cancelamento antecipada total da operação ora contratada, mediante comunicação escrita, observando um pré-aviso de 10 dias úteis – com referência à data em que pretenda que tal cancelamento se torne eficaz – devendo tal comunicação ser entregue na agência … Braga, do Banco, aplicando-se neste caso, o disposto nas cláusulas Terceira e Quarta infra
CLÁUSULA TERCEIRA
(Processamento do cancelamento do derivado financeiro)
1.. Na sequência do previsto na cláusula anterior, o cancelamento antecipado da operação nos termos do seu n.º 2 ou a actualização extraordinária – por redução – do valor nocional, implicará o cancelamento total ou parcial desta operação, sendo que, tal cancelamento originará o apuramento do correspondente “valor do
mercado”, com referência à data da cessação da operação e que poderá ser negativo ou positivo para a Cliente
(…)
CLÁUSULA QUINTA
(Declarações da Cliente)
1.. A Cliente declara perante o Banco que:
a).. Celebra com o Banco este contrato com a finalidade de cobrir o risco inerente a potenciais aumentos de taxas de juro compensatórias (…)
DECLARAÇÃO FINAL
A Cliente declara que solicitou ao Banco a celebração da presente operação de Derivado Financeiro com as características que se encontram plasmadas neste contrato, nomeadamente as constantes nas Cláusulas Primeira, Terceira e Quarta.
A Cliente declara ainda que, realizou a sua própria avaliação/valoração da operação objecto deste contrato, nomeadamente, sobre a conveniência e oportunidade de celebrar o mesmo - tendo-se munido de assessoramento jurídico, financeiro e fiscal externo ao Banco – reconhecendo expressamente, que as características da operação se ajustam aos seus objectivos de financiamento e que os riscos associados à mesma adaptam-se ao seu perfil.
Mais reconhece a Cliente, ter sido informada das condições associadas a eventuais cenários de alteração de taxa de juro, pelo que, é capaz de avaliar as vantagens e inconvenientes financeiros do contrato e que, em consequência, entende, assume e aceita plenamente os termos, condições e riscos inerentes ao mesmo e à operação que constitui o seu objecto. Em especial, a Cliente assume e entende as consequências de um eventual cancelamento antecipado do Derivado Financeiro a que este contrato se refere - particularmente, as cláusulas Terceira, Quarta e Sétima, cujo teor declara entender na íntegra – estando consciente de que o mesmo, pode ocasionar-lhe um valor económico que implique uma perda superior ao possível benefício obtido até ao momento do referido cancelamento antecipado (…) - cfr. doc. n.º 1 junto com a p.i. que se reproduz para os devidos efeitos - Al. I) da Matéria de Facto Assente.
10. Este contrato de taxa de juro foi apresentado à autora já antecipadamente redigido pelo réu e com todas as condições que o réu entendeu aí colocar - Al. J) da Matéria de Facto Assente.
11. A autora nunca discutiu antes com o réu quaisquer das condições específicas desse contrato, a não ser a fixação da taxa de juro e o limite/barreira a partir do qual o contrato podia ser denunciado - Al. K) da Matéria de Facto Assente.
12. De Agosto a Dezembro de 2008, a autora pagou sempre a taxa de juro a 4,55% tal como contratado - Al. L) da Matéria de Facto Assente.
13. Relativamente ao período de tempo em que essa taxa ultrapassou os 5,15%, o réu não creditou qualquer valor a favor da autora, e também não denunciou o contrato - Al. M) da Matéria de Facto Assente.
14. A partir do mês de Janeiro do ano de 2009, a taxa de juro começou a descer a um ritmo acelerado, ultrapassando mesmo o limite/barreira dos 3,95% contratado - Al. N) da Matéria de Facto Assente.
15. Em 29.06.2009 o réu debitou à autora, de uma só vez, os seguintes valores: € 331,90, € 353,57, € 352,35, € 1235,34, € 1362,89, € 92,95, € 1401,85 e € 1529,78, num total de € 6 660,63, cfr. doc.ºs n.ºs 2 a 9 juntos com a p.i., que se reproduzem para os devidos efeitos - Al. O) da Matéria de Facto Assente.
16. Nessa mesma altura, o réu enviou à autora 8 notas de débito referentes a esses valores, todas com a mesma data de 29.06.2009, sendo as 6 primeiras com data valor de 02.04.2009 e 2 com data de 04.05.2009 e 02.06.2009 - Al. P) da Matéria de Facto Assente.
17. Essas notas de débito não continham qualquer explicação sobre a forma como foi apurado o respectivo valor, as taxas de juro tidas em conta e os meses a que respeitavam - Al. Q) da Matéria de Facto Assente.
18. A autora questionou de imediato o réu sobre o débito destes valores, tendo-lhe este respondido que esse débito tinha a ver com o facto de a taxa de juro ter descido abaixo do limite/barreira de 3,95% - Al. R) da Matéria de Facto Assente.
19. E que esses valores respeitavam aos meses de Janeiro, Fevereiro e Março do ano de 2009 - Al. S) da Matéria de Facto Assente.
20. Estando por isso a autora obrigada a pagar-lhe a diferença entre a taxa de juro Euribor que se foi verificando ao longo desses três meses e a taxa de 4,55% fixada no contrato - Al. T) da Matéria de Facto Assente.
21. A autora comunicou logo ao réu que, tendo em conta esses débitos de valor considerável, e a tendência para a descida da taxa Euribor, pretendia pôr de imediato fim ao contrato - Al. U) da Matéria de Facto Assente.
22. O réu informou a autora de que, o cancelamento antecipado desse contrato implicava pagar ao réu um valor superior a € 50 000,00 (cinquenta mil euros) - Al. V) da Matéria de Facto Assente.
23. Nos meses subsequentes, o réu continuou a debitar à autora em cada mês a diferença entre a taxa de juro Euribor em vigor e a taxa de 4,55% fixada no contrato, tendo debitado à autora um total de € 38 048,75, referentes aos meses de Abril de 2009 a Abril de 2011, conforme documentos 10 a 29 da p.i. que se reproduzem para os devidos efeitos - Al. X) da Matéria de Facto Assente.
24. A autora tem pago esses valores apenas para não incorrer uma situação formal de incumprimento bancário, pois que, caso não pagasse, o réu comunicaria esse facto ao Banco de Portugal, que por sua vez o difundiria por todos os Bancos - Al. W) da Matéria de Facto Assente.
25. Essa informação, a ocorrer, poria de imediato em causa a credibilidade da autora junto de todos os Bancos e dos seus clientes, o que seria absolutamente desastroso para a sua estabilidade económica - Al. Y) da Matéria de Facto Assente.
26. O contrato foi celebrado em 08.08.2008 sem que fosse possível prever a crise económica e financeira que se instalou a partir de 15.09.2008 - Al. Z) da Matéria de Facto Assente.
27. A partir desta última data, e por efeito da falência do centenário e 4.º maior Banco de Investimento dos EUA (Lehman Brothers), percepcionou-se que muitos dos produtos bancários não tinham contrapartida em valores reais - Al. AA) da Matéria de Facto Assente.
28. O Lehman Brothers não resistiu à crise do mercado de crédito imobiliário de alto risco (subprime) - Al. BB) da Matéria de Facto Assente.
29. Tendo perdido 2,7 mil milhões de euros no 3.º trimestre de 2008, depois de ter sofrido fortes depreciações dos activos ao nível do seu portefólio de créditos imobiliários - Al. CC) da Matéria de Facto Assente.
30. A queda deste Banco, representa o momento em que a crise financeira se transformou em pânico global, e ameaçou tornar-se numa Grande Depressão comparável à de 1929 - Al. DD) da Matéria de Facto Assente.
31. O sistema financeiro, na realidade, não dispunha do capital que era suposto ter, uma vez que, muito do crédito que concedia não tinha contrapartida material - Al. GG) da Matéria de Facto Assente.
32. Ou seja e na prática, formalmente circulava muito mais dinheiro do que na realidade existia - Al. HH) da Matéria de Facto Assente.
33. A consciência de uma tal realidade, fez com que os Bancos repentinamente se contraíssem na concessão de crédito, afectando os particulares e empresas que, sem crédito, não podiam prosseguir a sua actividade - Al. II) da Matéria de Facto Assente.
34. Com o fim de combater a recessão e retomar a concessão de crédito, os Bancos Centrais de todo o mundo passaram a injectar no sistema bancário valores nunca até então imaginados - Al. JJ) da Matéria de Facto Assente.
35. Provocando com isso uma repentina e acentuada descida das taxas de juro - Al. KK) da Matéria de Facto Assente.
36. Ora, esse efeito reflectiu-se directa e intrinsecamente no contrato de swap de taxa de juro objecto desta acção, que tinha precisamente na sua essência e base a taxa de juro - Al. LL) da Matéria de Facto Assente.
37. Por esse efeito, o referido contrato sofreu um grande e repentino desequilíbrio, verificando-se que a autora, no curto espaço de 3 meses, passou a ter um encargo e um prejuízo grave decorrente desse contrato - Al. MM) da Matéria de Facto Assente.
38. As circunstâncias que despoletaram a descrita crise financeira e económica não eram de modo algum previsíveis, e continuam a ser absolutamente anormais - Al. NN) da Matéria de Facto Assente.
39. O contrato referido no ponto 2 foi assinado no 2º semestre de 2008 e marcou o início da relação comercial/bancária entre autora e réu - resposta ao quesito 1º.
40. O referido nos pontos 3 a 8 aconteceu durante as negociações com vista à celebração do contrato de locação - resposta ao quesito 2º.
41. Em Julho de 2008, os responsáveis do réu que negociaram com a autora a celebração do contrato em causa referiram que se a taxa de juro aumentasse até determinado limite/barreira, a autora pagaria sempre a taxa de juro fixa prevista no contrato - resposta ao quesito 3º.
42. Caso a taxa de juro ultrapassasse esse limite/barreira, a autora teria de pagar a taxa de juro correspondente, perdendo pois todo e qualquer benefício - resposta ao quesito 4º.
43. Caso a taxa de juro descesse abaixo da taxa de juro contratada (fixa) a autora continuaria a pagar tal taxa, suportando a diferença - resposta ao quesito 6º.
44. Na sequência dos contactos mantidos com o réu, a autora assinou o acordo referido no ponto 9 - resposta ao quesito 9º.
45. O réu enviou o contrato à autora para, no dia seguinte, ser assinado, não lhe tendo lido a totalidade das cláusulas que o compunham - resposta ao quesito 10º.
46. O representante da autora é uma pessoa simples, que trabalha no dia a dia na produção de peúgas e nunca antes tinha contratado qualquer operação bancária complexa - resposta ao quesito 11º.
47. Na data da assinatura do referido contrato (8/8/08), a taxa de juro Euribor, a 3 meses, encontrava-se no valor de 4,966% e no dia 30/9/08 encontrava-se a 5,277%, tendo subido até ao valor de 5,395% em 9/10/08 - resposta ao quesito 18º.
48. Na sequência do referido no ponto 22 a autora insistiu com o réu para que encontrasse uma solução para o problema, pedindo-lhe que aceitasse a cessação do contrato - resposta ao quesito 19º.
49. O contrato de locação financeira e o referido no ponto 9 foram ambos assinados em 8/8/2008 e foram precedidos de vários contactos, envolvendo troca de correspondência, 3 reuniões (em 26/5/08, 9/6/08 e 13/6/08) para tratar do contrato de locação financeira e uma reunião (em 3/7/08) para apresentar à autora as várias modalidades de taxas de juro por que a autora poderia optar, nomeadamente, aquela que resultasse da celebração de um contrato de swap de taxa de juro com barreira, tendo sido explicadas as vantagens e desvantagens e conteúdo do referido contrato ao representante da autora, que se fazia acompanhar por um amigo, ex-bancário - resposta ao quesito 20º.

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Dispõe o art. 684º do Código de Processo Civil que “nas conclusões da alegação , pode o recorrente restringir, expressa ou tacticamente, o objecto inicial do recurso”.
Refere também o art. 685º-A do mesmo código que “ o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão”.
Resulta destas normas, como é, aliás, entendimento doutrinário e jurisprudencial uniforme, que a delimitação objectiva do recurso é feita pelas conclusões da alegação do recorrente pelo que não pode o tribunal “ ad quem” conhecer de questões naquelas não incluídas. cfr; entre outros, Calvão da Silva, Col. Jur. 1995, I, p. 7 a 14 e Ac. S.T.J. de 12/12/95 B.M.J. 452º, 385.
Assim, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sua sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente têm de se considerar definitivamente decididas, não podendo delas conhecer-se em recurso.
Daí que o tribunal de recurso apreciar questões que não se mostrem versadas nas conclusões a menos que se trate de matéria de conhecimento oficioso, a decisão respectiva incorre na nulidade por pronúncia indevida ( ou excessiva), prevista no art. 668º, nº 1, al d) – 2.ª parte – do Código de Processo Civil, aplicável por força do art. 716º, nº 1 do mesmo código.
No caso dos autos, o recorrente nas suas alegações suscitou questões que não transpôs para as conclusões, pelo que não serão apreciadas.

O contrato em causa nos autos é um contrato a prazo, não se tratando de um contrato de execução imediata, mas sim de um contrato onde as prestações são diferidas para datas futuras.
Como se refere na sentença recorrida, um swap é uma troca de fluxos financeiros, sendo um instrumento financeiro derivado.
O derivado é uma situação jurídica a prazo em que o tempo é elemento essencial do negócio, quer para a determinação do preço quer para o cumprimento das prestações, quer ainda para a transmissão da titularidade.
O swap da taxa de juro representa uma subcategoria do contrato de swap.
Amadeu Ferreira, (Sumários, p. 5,6) definiu swaps como contratos a prazo de permuta de fluxos financeiros futuros durante ou num período determinado, tendo por referência um activo financeiro. Os fluxos financeiros devem dar-se entre posições que são simétricas porque contrapostas.
Assim, podemos definir o swap da taxa de juro como um acordo de pagamento recíproco de juros baseados em diferentes índices, ou de taxa variável/taxa fixa, por certo período de tempo.
Temos assim que se trata de um contrato a prazo, oneroso, consensual, meramente obrigacional, sinalagmático (em sentido amplo) e aleatório.
A sua execução tanto pode ser parcelar, como final, sendo que no primeiro caso o contrato tem vários momentos regulares de troca de fluxos.
O contrato é aleatório e envolve risco, sendo o swap da taxa de juro um instrumento de cobertura de risco.
Ora numa operação de cobertura de risco à partida há uma protecção contra um risco real decorrente do normal desenrolar da actividade económica.
Sendo certo que o swap tem subjacente o risco de variação da taxa de juro, no caso dos autos, o que se verifica por um lado, é um desequilíbrio entre as prestações (da recorrida e do recorrente) não havendo, a nosso ver, um princípio de equilíbrio relativamente aquilo que se troca.
Ou seja, naquilo que é vantajoso para a recorrida é muito pouco vantajoso, e naquilo que lhe é prejudicial, é muito prejudicial, sendo a prestação do recorrente exactamente inversa.
Por outro lado, esse desequilíbrio foi extremamente agravado pela crise financeira, situação esta que não decorreu de um normal desenrolar da situação económica.
Com efeito, a situação que se desencadeou a partir de Setembro de 2008, foi uma situação excepcional, completamente anormal no sistema financeiro que agravou de forma profunda a situação (pré-existente) de desequilíbrio das prestações de tal modo que a sua manutenção feriria os princípios da boa fé que devem nortear a celebração dos contratos, e na qual as partes alicerçaram a decisão de contratar.
O disposto no artigo 437º do Código Civil pressupõe que se tenha produzido uma alteração anormal das circunstâncias que foram basilares para a decisão dos contraentes de tal modo que a base de negócio tenha desaparecido ou tenha sido substancialmente modificada; que a exigência das obrigações assumidas pela parte lesada afecte gravemente os princípios de boa fé; que tal exigência não esteja coberta pelos riscos próprios do contrato e que a parte lesada não esteja em mora no momento em que a alteração das circunstâncias se verificou.
E por isso, concordamos com a sentença recorrida quando conclui que “nas circunstâncias actuais a exigência das obrigações que do contrato decorrem para a autora não está coberta pelo risco próprio do contrato”. Efectivamente, os contratos swap são um instrumento financeiro especialmente vocacionado para a gestão do risco da taxa de juro; só que as alterações verificadas após Setembro de 2008, e a crise no sistema financeiro (que podemos considerar como um colapso à escala mundial) não pode ser considerada como risco normal, bem como as oscilações da taxa de juro (que se verificou com a falência do Lehman Brothers) como riscos próprios do contrato sob pena de se violarem gravemente os princípios da boa fé contratual.
Os contratos de execução periódica são aqueles cujo cumprimento se prolonga no tempo, durante o período da sua vigência operando as suas prestações momento a momento.
Como ensina Antunes Varela (in “Das Obrigações em Geral”, Vol. I, 5ª ed., pg. 88), “não se confundem com as obrigações duradouras, as obrigações fraccionadas ou repartidas. Dizem-se fraccionadas ou repartidas, as obrigações cujo cumprimento se protela no tempo, através de sucessivas prestações instantâneas, mas em que o objecto da prestação está previamente fixado, sem dependência da duração da relação contratual (como no caso do pagamento de preço a prestações). (…) Nas obrigações duradouras, a prestação devida depende do factor tempo (...) nas prestações fraccionadas, o tempo não influi na determinação do seu objecto, apenas se relacionando com o modo de execução”.
A qualificação referida, tem assinalável importância. Assim, no que respeita por exemplo aos efeitos da resolução do contrato, quando este é de “execução continuada ou periódica”, a resolução não abrange, em princípio, as prestações já efectuadas, operando somente quanto às futuras, contrariamente ao que acontece com as “prestações fraccionadas” (ver “Direito das Obrigações”, Mário Júlio Almeida Costa, pág. 466 e “Das Obrigações em Geral”, Vol. I, Antunes Varela, págs. 88 e 89). Isto acontece “porque as prestações continuadas ou periódicas se encontram idealmente ligadas ou adstritas às diversas fracções de tempo em que é possível dividir a sua duração, gozando assim as prestações já efectuadas e as que devem ser realizadas no futuro de certa independência entre si” (cf. Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, Vol. I, pág. 88).
No caso e como já se referiu, trata-se de um contrato a prazo, onde as prestações das partes são diferidas para datas futuras, onde podem existir momentos regulares de troca de fluxos financeiros ou existir apenas um só momento de fluxos financeiros no final do prazo, não se aplicando o disposto no n.º 2 do artigo 434º, do Código Civil, 1ª parte, pelo que a resolução deve operar desde 2/4/09 conforme foi decidido na sentença recorrida.

Em síntese: o contrato de swap da taxa de juro é um contrato a prazo, onde as prestações das partes são diferidas para datas futuras, onde podem existir momentos regulares de troca de fluxos financeiros ou existir apenas um só momento de fluxos financeiros no final do prazo.
Apesar de ser um contrato aleatório, verificando-se uma alteração anormal das circunstâncias que se traduz num profundo desequilíbrio entre as prestações, o mesmo pode ser resolvido nos termos do disposto no artigo 437º do Código Civil.

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III - Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirmam a sentença recorrida.
Custas pelo apelante.

Guimarães, 31 de Janeiro de 2013
Conceição Bucho
Antero Veiga
Maria Luísa Ramos