Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
4277/24.8T8VCT.G1
Relator: LÍGIA VENADE
Descritores: IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
DECLARAÇÕES DE PARTE
INSOLVÊNCIA
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DO PEDIDO
RESPONSABILIDADE CIVIL
DOLO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/24/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I A eventual falta de mérito da motivação da matéria de facto, a maior ou menor argumentação, a pior ou melhor expressão do modo como o julgador chegou à sua convicção, nomeadamente a eventual falta de juízo crítico (bastante) sobre cada um dos meios de prova, é de analisar a propósito da impugnação da matéria de facto, podendo conduzir ao êxito da pretensão da recorrente, mas não faz incorrer a sentença em nulidade por falta de fundamentação.
II Não tendo o legal representante da requerente (requerida no incidente em apreço) prestado depoimento de parte (e não havendo confissão enquanto meio de prova vinculada), nada impede que as suas declarações sejam o suporte de factos que lhe são desfavoráveis, ponderadas como meio de prova livre, e desde que fundamentado o raciocínio probatório.
III No art.º 22º do CIRE prevê-se a dedução de pedido infundado de insolvência, o que constitui uma forma de exercício abusivo do direito de ação, estruturalmente semelhante à figura da litigância de má fé, prevista no art.º 542º do C.P.C.; mas aquele é um regime especial relativamente a esta figura, tendo um âmbito de aplicação diverso, desde logo no que respeita ao elemento subjetivo, restringindo a sua aplicação aos casos de dolo do lesante.
IV A ilicitude da conduta resulta da falta de evidência e prova de qualquer dos factos índices previstos no art.º 20º, n.º 1, do CIRE. Resulta também de terem sido alegados factos que se sabia serem falsos.
V A culpa, na modalidade de dolo eventual, resulta do facto de a requerente saber que a propositura da ação podia ter repercussões na imagem da requerida, com o que se conformou, e portanto agiu; representou a verificação do resultado na esfera da requerida como consequência possível da sua conduta e atuou, conformando-se com essa verificação; não visando diretamente a violação da norma, soube que ao agir daquela forma tal pode implicar uma inobservância voluntária do elemento comportamental que o sentido da norma pretende induzir na generalidade das pessoas.
VI Os danos decorrentes da conduta podem assumir vertente patrimonial e vertente não patrimonial. Relativamente aos danos não patrimoniais, mostrando-se afetadas a imagem e a credibilidade comercial da requerida, é possível a sua ressarcibilidade mesmo sendo a ofendida uma sociedade comercial e ainda que não haja reflexo direto no seu património.
Decisão Texto Integral:
Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

I   RELATÓRIO.

EMP01... COMÉRCIO DE EQUIPAMENTOS DE FRIO E AR CONDICIONADO, LDA., intentou ação, ao abrigo dos art.ºs 20º e 25º do Código de Insolvência e de Recuperação de Empresas, a requerer a declaração de insolvência de EMP02..., UNIPESSOAL LDA.

Para tanto alegou (vai aqui reproduzir-se a peça inicial dada a sua relevância para a decisão a proferir):

“A – DO CRÉDITO DA REQUERENTE:
1. A Requerente é uma sociedade por quotas que se dedica ao comércio, importação, exportação e instalação de sistemas de aquecimento, ventilação, refrigeração ou climatização nomeadamente aparelhos de frio e ar condicionado, bem como de máquinas e equipamentos para a indústria hoteleira e assistência técnica neste âmbito, com carácter habitual e intuito lucrativo, cfr. doc. n.º 1 que ora se junta e se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos efeitos legais.
2. Por sua vez, a Requerida dedica-se à Indústria de panificação, pastelaria e confeitaria, café, snack-bar, com carácter habitual e intuito lucrativo, cfr. doc. n.º 2 que ora se junta e se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos efeitos legais.
3. No âmbito do exercício da sua atividade comercial, a Requerente adjudicou à Requerida o fornecimento e montagem de equipamentos vários, com vista à abertura de um novo espaço comercial.
4. Tal fornecimento e montagem, teve por base a fatura proforma nº 29122_03, datada de 15/03/2022, na qual se encontram discriminados os equipamentos a fornecer e a montar, no valor total de €164.442,45 (cento e sessenta e quatro mil, quatrocentos e quarenta e dois euros e quarenta e cinco cêntimos), cfr. doc. n.º 3 que ora se junta e se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos efeitos legais.
5. Sucede que, a Requerida celebrou com o Banco 1..., S.A., um contrato de locação financeira, mediante o qual a referida instituição financeira se comprometeu a adquirir diretamente à Requerente parte dos equipamentos constantes na mencionada fatura proforma e, consequentemente ceder a sua utilização à Requerida, com o pagamento da correspondente renda devida pela utilização.
6. Nessa sequência, a Requerente celebrou com o Banco 1..., S.A., a 10 de agosto de 2023, um contrato de compra e venda, através do qual a referida instituição bancária procedeu à compra dos equipamentos constantes na fatura proforma n.º ...3, de 15/05/2023, cfr. doc. n.º 4 que ora se junta e se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos efeitos legais.
7. Tendo a Requerente recebido o valor, pago diretamente pelo Banco 1..., S.A., de €126.985,86 (cento e vinte e seis mil novecentos e oitenta e cinco euros e oitenta e seis cêntimos).
8. Por sua vez, a mão-de-obra, materiais e demais equipamentos que não foram adquiridos pelos Banco 1..., S.A., foram diretamente adquiridos pela Requerida.
9. Materiais que se encontram devidamente discriminados nas seguintes faturas: ...09, emitida e vencida a 11/10/2023, no valor de €11.656,40; ...4, emitida e vencida a 30/01/2024, no valor de €12.272,46 e ...60, emitida e vencida a 23/02/2024, no valor de €13.527,72 e, que ascendiam à quantia de €37.456,58 (trinta e sete mil, quatrocentos e cinquenta e seis euros e cinquenta e oito cêntimos), cfr. doc. n.º 5 que ora se junta e se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos efeitos legais.
10. Sucede que, a Requerente procedeu à entrega e colocação em obra de todos os equipamentos constantes da fatura proforma.
11. Contudo, a obra não tinha instalado eletricidade trifásica, pelo que não era possível testar os equipamentos,
12. Tendo a Requerente de voltar a carregar alguns os equipamentos para armazém com vista a testar o bom funcionamento dos mesmos.
13. No entanto, relativamente aos equipamentos adquiridos diretamente pela Requerida, titulados pelas identificadas faturas em 9., a Requerida não procedeu ao seu pagamento.
14. Ora, apesar de várias vezes instada para o efeito, a Requerida não procedeu ao pagamento das mencionadas faturas.
15. Motivo pelo qual a Requerente exigiu que o pagamento fosse efetuado com a reentrega e colocação dos materiais, o que foi sucessivamente atrasado e impedido pela Requerida, que por um lado afirmava que entregava um cheque bancário, por outro, já nada entregava…
16. Manteve, pois, o comportamento manifestamente inadimplente e incumpridor,
17. Pelo que a Requerente não procedeu à colocação e instalação dos materiais e equipamentos adjudicados pela Requerida, sem que esta garantisse que ia pagar.
18. De facto, a Requerente já tinha adquirido os equipamentos em apreço e, detinha disponibilidade imediata de os colocar e instalar em obra, como o fez,
19. No entanto, a Requerida foi protelando o pagamento,
20. Motivo pelo qual a Requerente não recolocou nem reinstalou os equipamentos,
21. por culpa claramente imputável à Requerida.
22. Aliás, para surpresa da Requerente, a Requerida, sem qualquer fundamento procedeu à resolução do contrato em apreço, cfr. doc. n.º 6 que ora se junta e se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos efeitos legais
23. Correspondendo a uma resolução claramente ilícita e ilegal.
24. Na verdade, a Requerente não recebeu o pagamento dos equipamentos adquiridos pela Requerida e, titulados pelas faturas supra identificadas.
25. Ficando a Requerente completamente fragilizada com esta situação, porquanto para além da resolução do contrato em apreço, adquiriu os equipamentos solicitados pela Requerida, tendo efetivamente um prejuízo com tal aquisição.
26. Valor que se cifra na quantia de €37.456,58 (trinta e sete mil, quatrocentos e cinquenta e seis euros e cinquenta e oito cêntimos).
27. Não detendo a Requerida qualquer fundamento válido para lançar mão do mecanismo legal da resolução do contrato,
28. Quando a Requerente não procedeu à instalação dos equipamentos, porque a Requerida não procedeu ao seu pagamento.
29. Inexistindo qualquer conduta censurável da Requerente que possa fundamentar validamente a resolução operada.
30. Acresce que, no decurso da execução de fornecimento e montagem dos equipamentos verificou-se, por parte da Requerida, a necessidade de proceder a trabalhos a mais, os quais foram requeridos e aprovados pela Requerida.
31. De facto, a execução desses trabalhos mostrou-se necessária à execução da empreitada, com o ajustamento de medidas dos equipamentos à realidade em obra.
32. Sendo imprescindíveis para a conclusão e bom funcionamento dos trabalhos e da empreitada.
33. Sendo que, os trabalhos a mais requeridos pela Requerida foram os seguintes: (…)
34. Assim sendo, a Requerente executou todos os trabalhos nos termos e condições contratualmente fixados, sempre de acordo com as ordens e instruções da Requerida, a qual acompanhou a execução de uma forma permanente.
35. A Requerente executou a empreitada, tendo a mesma realizado todos os trabalhos que lhe foram adjudicados e tendo cumprido integralmente com as obrigações que sobre si impendiam.
36. Ora, como já referido, até à data de hoje, e apesar de interpelada para o efeito, a Requerida não efetuou o devido pagamento à Requerente por conta de tais trabalhos.
37. Ou seja, os trabalhos constantes e aqui discriminados, foram integralmente executados pela Requerente, e recebidos pela Requerida, mas ainda não procedeu a mesma ao pagamento integral do que é devido.
38. Sendo certo que, todos os materiais foram aplicados e todos os trabalhos foram executados com o acordo da Requerida e validação in loco pela fiscalização.
39. A Requerente executou todos os trabalhos nos termos e condições contratualmente fixados, sempre de acordo com o estipulado, no projeto e com as ordens e instruções da Requerida.
40. Tendo executado todos os trabalhos de empreitada de acordo com a legis artes e as melhores regras da construção, atuação com que sempre pautou todos os seus trabalhos.
41. Com efeito, a Requerente emitiu a fatura n.º ...89, emitida e vencida a 28/05/2024, no montante de €24.353,75 (vinte e quatro mil, trezentos e cinquenta e três euros e setenta e cinco cêntimos), (cfr. doc. n.º 7 que ora se juntam e se dão por integralmente reproduzidos para todos os devidos efeitos legais).
42. Acresce que, além da quantia supra reclamada que constitui uma obrigação pecuniária, assiste também ao credor o direito a peticionar juros calculados à taxa comercial em vigor, até efetivo e integral pagamento (cfr., artigos 805.º, n.º 1, 806.º e 559.º do Código Civil).
43. Sendo certo que, a este valor em divida, acrescem os juros de mora vencidos à taxa legal em vigor, que na presente data perfazem o montante de € 1.341,20 (mil, trezentos e quarenta e um euros e vinte cêntimos).
44. Sendo certo, que em relação à mencionada fatura a Requerida não procedeu ao seu pagamento.
45. Pelo que, se encontra em dívida o montante de €63.151,53 (sessenta e três mil, cento e cinquenta e um euros e cinquenta e três cêntimos), a título de aquisição dos materiais adjudicados pela Requerida e não colocados por culpa a si imputável e trabalhos a mais, conforme supra alegado.
46. A Requerida foi, por diversas vezes, interpelada para proceder ao pagamento da quantia em dívida, mas sem qualquer sucesso.
47. Assim, é a Requerente credora da quantia de €63.151,53 (sessenta e três mil, cento e cinquenta e um euros e cinquenta e três cêntimos), em relação à Requerida.
48. Sendo que o crédito da Requerente tem natureza de crédito comum, conforme o preceituado no disposto na alínea c) do n.º 4 do artigo 47.º do CIRE.

B – DOS PRESSUPOSTO DA INSOLVÊNCIA DA REQUERIDA:
49. Em face do exposto, deve, na presente data, a Requerida à Requerente o montante de €63.151,53 (sessenta e três mil, cento e cinquenta e um euros e cinquenta e três cêntimos).
50. A Requerida não procedeu, porém, ao pagamento daquele montante em dívida, não obstante ter sido por diversas vezes e de várias formas solicitado pela Requerente para que o fizesse.
51. Ora, a Requerente não logrou a obtenção do respetivo pagamento daquele montante, uma vez que a Requerida caiu em situação económica e financeira difícil, situação essa que se agravou,
52. e que determinou que ficasse sem disponibilidades financeira e de dinheiro,
53. e a impediram - e continuam a impedir - de pagar, nas datas dos respetivos vencimentos, as suas dívidas e outras responsabilidades contraídas.
54. Estas obrigações já se venceram e continuam a vencer-se, sem que a Requerida as tenha pago ou tenha perspetivas de o vir a fazer,
55. pois que a situação da Requerida, em termos patrimoniais, evidencia uma insuficiência dos valores ativos face às responsabilidades que esta tem pendentes quer perante a Requerente quer perante terceiros,
56. Assim, desconhecendo-se embora o montante exato a que ascendem as dívidas da Requerida, certo é que o seu passivo é, em muito, superior ao seu ativo.
57. De resto, a Requerida não possui, livre de ónus ou encargos, património penhorável capaz de pagar aquele crédito da aqui Requerente e de responder aos compromissos já vencidos por si assumidos perante outros credores.
58. Por isso, a Requerente, não vislumbra qualquer possibilidade de ver cobrado o seu crédito.
59. A Requerida manifesta uma insusceptibilidade de satisfazer obrigações que, pelo seu significado no conjunto do passivo e pelas próprias circunstâncias do cumprimento – dívidas com muito mais de noventa dias e mesmo cento e oitenta dias de vencimento - evidenciam a impotência de continuar a satisfazer a generalidade dos seus compromissos.
60. A Requerente tem conhecimento que outras sociedades que trabalharam na obra em apreço que não receberam o pagamento pela prestação de serviços.
61. Concretamente a sociedade EMP03..., Lda., EMP04... S.A. e EMP05....
62. Pelo que, a Requerida não terá ativo reconhecido que possibilite o pagamento das dívidas.
63. Assim, resulta de forma inequívoca que a situação da Requerida preenche os requisitos legais previstos nos artigos 3.º, n.ºs 1 e 2 e artigo 20.º, n.º 1, alíneas a) e b) do CIRE.
64. Sendo de conhecimento público que a Requerida se encontra a incumprir com as várias obrigações que tem, e que dado o seu valor e a inexistência de património por parte desta, se afigura impossível satisfazer pontual o cumprimento da generalidade das suas obrigações.
65. Pelo que, resulta que o indício de insolvência previsto no n.º 1 do artigo 3.º e na alínea b) do n.º 1 do artigo 20.º do CIRE, se encontra preenchido.
66. Face ao exposto, encontram-se reunidos os pressupostos de facto e de direito necessários para a declaração de Insolvência da Requerida.
(…)”.
*
Citada, a requerida apresentou oposição, onde, além do mais, suscitou a questão da interposição de uma ação infundada por parte da requerente, passível, nos termos do disposto no art.º 22º do CIRE, de conduzir à condenação da mesma a pagar uma quantia, a título de indemnização, sabendo a requerente que o requerimento de insolvência colocou em causa os seus bom nome e imagem.

Alegou factualidade e concluiu:
“A. Deve a presente oposição ser julgada totalmente procedente, por provada, e a ação ser julgada totalmente improcedente, indeferindo-se a requerida declaração de insolvência da sociedade EMP02..., Unipessoal, Lda..
B. Deve ser condenada a requerente a pagar à requerida o montante indemnizatório peticionado no valor global de € 11.000,00, pelos factos e fundamentos supra vertidos, na presente oposição;
C. Subsidiariamente e quando assim se não entenda, na hipótese que não se concede de ser declarada a insolvência, requer-se seja admitido que a administração da massa insolvente seja assegurada pelo devedor, ao abrigo do disposto no artigo 224º do CIRE, com vista à apresentação de um plano de insolvência que preveja a continuidade da exploração da empresa pela requerida, no prazo de 30 dias após a sentença de declaração da insolvência. (…)”.
*
De seguida, foi proferido o seguinte despacho:
“Ao abrigo da previsão do art.º 3.º, n.º 3 do CPC, notifique-se a Requerente com vista a exercer o contraditório quanto à matéria incidental (litigância de má fé e dedução de pedido infundado) arguida nos autos.”
*
A requerente apresentou articulado, terminando com as seguintes afirmações:
“55. Pelo que, se impugnam para todos os devidos efeitos legais os documentos juntos pela Requerida no sentido que esta lhes pretende atribuir.
56. Ademais a Requerente para além de não litigar com má-fé, deduziu um pedido de insolvência válido, devidamente fundamentado, atento os conhecimentos que detinha.
57. Devendo ser decretada a insolvência da Requerida e, consequentemente não ser a ora Requerente condenada no pagamento de qualquer indemnização à Requerida, por alegada litigância de má-fé, quer por alegada dedução de pedido infundado.”.
*
Foi designada data para realização de audiência de julgamento.
Em ata foi feito o saneamento tabelar do processo, foi fixado o valor da causa em € 5.001,00, foi definido o objeto do litígio e foram elencados os temas de prova.
Admitida e produzida a respetiva prova, foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo:
“Em face do exposto, e nos termos do art.º 3.º do CIRE, decide-se:
i. julgar improcedente a presente acção especial de declaração de insolvência e, em consequência, absolver a Requerida EMP02... – Unipessoal, Ld.ª do pedido;
ii. julgar procedente o incidente de dedução de pedido infundado, e, em consequência, condenar a Requerente EMP01... – Comércio de Equipamentos de Frio e Ar Condicionado, Lda. em indemnização a pagar à Requerente pelos danos patrimoniais e não patrimoniais pela mesma sofridos, a liquidar em execução de sentença.
Custas pela Requerente [art.º 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC].
Registe e notifique.”
*
Inconformada, a requerente apresentou recurso com alegações que terminam com as seguintes
-CONCLUSÕES-(que se reproduzem)

“1. Por sentença proferida pelo Tribunal recorrido foi decidido o seguinte “Em face do exposto, e nos termos do art.º 3.º do CIRE, decide-se:--- i. julgar improcedente a presente acção especial de declaração de insolvência e, em consequência, absolver a Requerida EMP02... – Unipessoal, Ld.ª do pedido;--- ii. julgar procedente o incidente de dedução de pedido infundado, e, em consequência, condenar a Requerente EMP01... – Comércio de Equipamentos de Frio e Ar Condicionado, Lda. em indemnização a pagar à Requerente pelos danos patrimoniais e não patrimoniais pela mesma sofridos, a liquidar em execução de sentença.”
2. Com o devido respeito, que é muito, a Recorrente não se pode conformar com a sentença proferida, incidindo as presentes alegações de recurso sobre a procedência do incidente de dedução de pedido infundado.
3. Tendo a ora Recorrente sido condenada no pagamento de indemnização, a liquidar em execução de sentença, pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pela Requerida.
4. Entende a Recorrente que mal andou o Tribunal a quo no que respeita à decisão proferida no âmbito dos presentes autos, não tendo procedido à análise crítica dos meios de prova produzidos na audiência de julgamento nos termos do art.º 607.ºdo CPC.
5. De igual modo, entende a Recorrente que existe um erro manifesto na apreciação factual e jurídica da questão em apreço, pelo que não pode a Recorrente conformar-se com a sentença proferida., no que respeita à procedência do incidente de pedido infundado.
6. Lendo a decisão recorrida não podemos deixar de reconhecer que a mesma enferma de deficiências várias, não possuindo o conteúdo nem patenteando o cuidado exigível numa decisão judicial.
7. Não só faltam factos importantes e mesmo necessários para o conhecimento do mérito das questões que foram conhecidas e mesmo das questões cujo conhecimento foi igualmente omitido.
8. Desde logo, na sentença recorrida a Meritíssima juiz a quo começa por elencar os factos dados como provados e não provados, no entanto relativamente à explanação da motivação que levou a tais conclusões, a Meritíssimo juiz a quo limitou-se a afirmar, sem muitas delongas, que conferia credibilidade ao depoimento do legal representante da Requerida, em detrimento das declarações prestadas pelo legal representante da Recorrente.
9. Na situação em apreço, conforme se referiu, o tribunal recorrido ao ser omisso quanto ao juízo crítico dos factos, o que significa que estamos perante uma insuficiente fundamentação da sentença de que se recorre, determinando que a mesma seja nula, nulidade expressamente se argui para todos os devidos efeitos legais.
10. Pelo exposto, entendemos que a DECISÃO RECORRIDA É NULA por violação do disposto no artigo 615.º n.º 1, al. b) do Código de Processo Civil.
11. A isto acresce que, com o devido respeito, que é muito, Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento na apreciação da prova.
12. Senão vejamos, os Recorrentes consideram que foram incorretamente julgados os factos considerados provados em 3.18, 3.19. e 3.20.
13. Na verdade, o legal representante da Recorrente não alegou factos que não correspondem à verdade, alegou os factos de que tinha conhecimento, factos a que tinha acesso e factos que lhe foram transmitidos por terceiros que eram igualmente credores da Requerida.
14. De facto, se atentarmos nas declarações prestadas pelo legal representante da Recorrente na sessão de julgamento do dia 30 de janeiro de 2025, na passagem 15:10 a 20:15 é possível aferir que a Recorrente apercebeu-se em obra que o próprio empreiteiro geral abandonou a obra, tendo a obra estado parada algum tempo.
15. Além disso, refere que existiram diversas promessas de pagamento que nunca se vieram a concretizar, aliás a Requerida apenas procedeu à resolução do contrato de compra e venda, posteriormente à posição demarcada da Recorrente em não entregar os equipamentos em falta com o pagamento imediato.
16. Sendo certo que, referiu ainda que esteve com os equipamentos em falta, carregados, em frente ao estabelecimento e, que apenas não procedeu à sua entrega, porquanto a Recorrida não quis, uma vez mais, proceder ao pagamento da quantia em dívida.
17. Portanto, o cenário vivido em obra, era de um claro clima de abandono por várias empresas, com as desculpas reiteradas e infundamentadas em não pagar.
18. Referiu ainda o legal representante da Requerente na referida sessão de julgamento, a 21:48 a 23:00 por força da substituição em obra de várias especialidades, alterações em obra que não eram pagas, bem como a aprovação de crédito que demorou imenso tempo, fizeram criar a convicção que a solvabilidade da sociedade não era das melhores. Sendo certo que, o próprio empreiteiro dizia “Estão a fazer isto? Cuidado.”
19. O próprio empreiteiro referiu que ia abandonar, porque não recebia pagamentos.
20. Além de que, a Requerida assumiu uma posição de não atender telefonemas, o que ainda provocou mais dúvidas na Recorrente.
21. A isto acresce que, a Recorrente conforme alegou na petição inicial de insolvência teve conhecimento de outras sociedades que executaram trabalhos em obra e não receberam, porquanto os próprios legais representantes se queixavam da falta de pagamento, concretamente o Legal representante da sociedade EMP04..., S.A., com sede social na Rua ..., ... 823, ... ... e o Legal representante da sociedade EMP05..., com sede social na Rua ..., ... -..., ..., Portugal – veja-se sessão de julgamento de 30 de janeiro de 2025, passagem 23:47 a 26:00.
22. Tanto assim é que, em sede de Oposição foi junto o acordo de pagamento da sociedade EMP04..., S.A. ora, se existiu acordo de pagamento é porque claramente a Requerida não tinha condições de pagar a integralidade da dívida e, em algum período de tempo era devedora, tanto assim é que os credores se queixaram junto da ora Recorrente.
23. Além de que, em relação à sociedade EMP05..., com sede social na Rua ..., ... - ..., ..., Portugal, foi junto um acordo de resolução de contrato de empreitada, o que prova o receio da Recorrente, quando teve conhecimento da saída da obra da mencionada sociedade.
24. A isto acresce que, sempre se dirá que a sociedade Requerida apenas procedeu à junção aos autos de um balanço de vendas, não se encontrado espelhados os custos, pelo que não foi possível apurar o resultado analítico – 27:18 a 31:00.
25. Portanto, temos um cenário em que a obra se arrastou por mais de um ano, sociedades a queixarem-se de falta de pagamento, a abandono de obram falta de contato com a Requerida, desculpas em não pagar, que claramente só podiam criar um clima de dúvida e receio junto da Recorrente.
26. Por sua vez, a testemunha AA, Contabilista da Requerida refere que o equipamento constante no ativo, pertence ao Banco 1..., por força do contrato de leasing que fora celebrado e que, se encontra junto aos autos – veja-se sessão de julgamento de 30 de janeiro, de 15:04 a 17:04.
27. Ou seja, os bens que compõem o recheio do estabelecimento comercial da Requerida não são sus propriedade, facto que a Recorrente também tinha conhecimento, bem como de igual forma sabia que o local onde se encontra instalado o estabelecimento comercial é arrendado.
28. O que, também pesou na decisão de avançar com o processo de insolvência, perante o desconhecimento de bens que pudessem responder pelas dívidas da Requerida.
29. A própria contabilista da Requerida confirma a existência e a celebração de acordos de pagamento - 20:36 a 20.55
30. Além disso, convém notar que a mencionada testemunha refere que os únicos documentos contabilísticos publicados, de acesso público, era apenas o IES de 2023 que apresentava um balanço negativo – 30:32 a 31:00.
31. Refere que não havia forma pública de saber os balancetes das contas da sociedade - 25:12 a 26.00.
32. Pelo que, os factos que temos são concretos, a Requerida não tinha bens registados em seu nome, os únicos documentos contabilísticos que a Recorrente tinha acesso apresentavam um resultado negativo, ou seja, um prejuízo, várias sociedades abandonaram a obra, deram conhecimento à Recorrente que a Requerida lhes devia dinheiro, a Requerida apresentava desculpas reiteradas para não pagar, resolveu o contrato após a Recorrente “fincar o pé”, portanto temos vários indícios de uma situação de insolvência que a Recorrente não podia negar.
33. E, portanto, a Recorrente não alegou factos que não correspondiam à verdade sobre a situação financeira da Requerida, mas antes factos que teve conhecimento, factos que conjugados criaram a convicção da falta de solvabilidade da Requerida.
34. Pelo que, claramente ficou provado que inexistiu uma conduta dolosa da parte da Recorrente, não podendo assim o pedido infundado de insolvência ser julgado procedente, nem a Recorrente sem condenada no pagamento de qualquer indemnização.
35. Mais se diga, que não ficaram provados a existência de qualquer danos na Requerida, não tendo a Requerida logrado fazer prova de qualquer dano.
36. Na verdade, a testemunha BB, Bancária, na instituição bancária Banco 1..., que era da praça, como a própria refere, afirma expressamente que não tinha conhecimento do pedido de insolvência - veja-se sessão de 30 de janeiro, passagem 03:30 a 05:56.
37. Tendo sido gestora da Requerida, trabalhando a Requerida com a referida instituição bancária, é claro que, a mesma não teve qualquer prejuízo com o pedido em apreço, porque para além de não provado, não resulta qualquer prova que indicie que dano se provocou, perda de crédito junto da banca, e necessidade de recurso a tal crédito….nada resulta da prova produzida.
38. A final, é referido na sentença recorrida que apurados os consequentes danos, mas não a sua efectiva extensão, relega-se a fixação da competente indemnização para liquidação de sentença, nos termos da previsão dos art.ºs 358.º e segs. do CPC.
39. No entanto, questiona-se que danos é que foram apurados? Que danos é que a Requerida sofreu?
40. O incidente de liquidação apenas se destina a concretizar o objeto da condenação genérica: os danos objeto de liquidação são aqueles que na sentença condenatória foram apurados; é relativamente a esses danos que importa determinar o respetivo quantum.
41. É na ação declarativa que se definem os danos cuja liquidação é relegada para momento posterior, pelo que não podem ser objeto de liquidação prejuízos que não estão abrangidos pelo âmbito da condenação genérica ou que não resultam da factualidade apurada na ação declarativa - Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, Processo n.º 567/07.2TJVNF.2.G1, Data do Acórdão:08-02-2024
42. Não há qualquer prova documental que sustente qualquer dano.
43. A prova testemunhal é arrolada pela Requerida não refere expressamente nenhum dano em específico. Ninguém concretizou qualquer dano, é referido a situação dos ovos de forma genérica, pela testemunha CC, e não faz qualquer sentido.
44. A própria contabilista da Requerida, a testemunha AA, refere na passagem 28:00 a 28:35 que as vendas não chegaram aos valores que nós pretendíamos, referindo expressamente que não faltaram bens.
45. Uma coisa é as vendas não chegarem aos valores que estavam a prever, mas qualquer sociedade tem sempre uma estimativa de vendas que pode não ser concretizada, mas iria ser concretizada s enão fosse o pedido de insolvência?
46. Portanto, é claro que não foram tão pouco alegados, nem provados quaisquer danos que possam ter resultado para a Requerida, danos esses que teriam de ficar assentes e determinados nos presentes autos e, não a ser apurados em sede de incidente de liquidação, mecanismo que apenas em a função de quantificar.
47. Pelo que, é claro que a Requerente atuou dentro das normas legais, jamais descorando as regras do bom senso e boa-fé que lhe subjaz.
48. Porquanto atendendo ao valor em dívida, ao tempo que já decorreu desde o vencimento das faturas, às sucessivas promessas de cumprimento que culminaram na resolução ilícita do contrato e, aos rumores que são ouvidos de reiterados incumprimentos e dívidas da Requerida,
49. A Requerente não teve outra opção senão avançar para a via judicial, lançando mão do meio que considera legal, face à real situação económica e financeira da Requerente.
50. Assim, todos os factos alegados pela Requerente no seu articulado, limitaram-se a traduzir a pretensão do direito a que estes se arrogam, sempre tendo em conta a sua contribuição para a boa decisão da causa.
51. Não utilizou, de DE FORMA DOLOSA, a Requerente, qualquer expediente que extravasasse os legalmente admissíveis e aplicáveis ao caso vertente, nem ocultou ao Tribunal qualquer facto relevante ou imprescindível à boa decisão da causa.
52. A pretensão formulada pela autora funda-se no disposto no artigo 22.º do CIRE, de acordo com o qual:“A dedução de pedido infundado de declaração de insolvência, ou a indevida apresentação por parte do devedor, gera responsabilidade civil pelos prejuízos causados ao devedor ou aos credores, mas apenas em caso de dolo.”.
53. Apesar de criticar a opção legislativa, Paula Costa e Silva, in O Abuso Do Direito De Acção E O Art. 22.º Do CIRE, in Estudos Dedicados ao Professor Doutor Luís Alberto Carvalho Fernandes, Vol. III, Universidade Católica Editora, 2011, a pág. 158, refere que “A lei faz depender a constituição de deveres de indemnizar por pedido infundado de insolvência do dolo do requerente. Nem sequer a negligência grosseira é relevante.”.
54. Ora, volvendo à situação sub judice a Requerida não demonstrou os factos em que assacava à Recorrente a atuação dolosa, sem o que, reitera-se, não pode haver responsabilidade civil por parte deste.
55. Resulta claro da prova produzida que existiam motivos que fundaram o pedido de declaração de insolvência, pelo que não se poderia ter concluído estarmos perante a dedução de um pedido infundado de insolvência.
56. Ao invés, a ideia foi prever um regime especial que não inibisse o credor ou o próprio devedor de requerer ou se apresentar à insolvência, sem o receio de vir a ser rudemente sancionado no caso de o Tribunal não deferir a pretensão e não declarar a peticionada situação de insolvência.
57. E é isso que consta precisamente do ponto 13 do Preâmbulo do diploma, ao referir: “Uma das causas de insucesso de muitos processos de recuperação ou de falência residiu no seu tardio início, seja porque o devedor não era suficientemente penalizado pela não atempada apresentação, seja porque os credores são negligentes no requerimento de providências de recuperação ou de declaração de falência, por falta dos convenientes estímulos”.
58. Pelo que, em face do regime legal vigente, não é admissível a interpretação analógica, nem a interpretação extensiva e muito menos a interpretação ab rogante com vista a responsabilizar o credor que, agindo com negligência grosseira, deduziu pedido infundado de declaração de insolvência.
59. Sendo certo que, não resulta da prova produzida, nem dos factos dados como provados qualquer atuação dolosa da parte da Recorrente, sendo apenas referido que a Recorrente alega factos que sabe não ser verdade.
60. Ora, na sua formulação mais ténue, do dolo eventual, a alegação passa por afirmar que o agente prefigura a consequência ilícita e danosa como uma consequência possível do seu comportamento e não faz nada para a evitar; Ou seja, a enunciação do pressuposto dolo passa pela afirmação de que a Recorrente configurou como possível, no concreto quadro de circunstâncias que se lhe deparava, que a Requerida fosse declarada insolvente, pelos fundamentos expressos no requerimento inicial e conformou-se com essa possibilidade.
61. O que não se verificou, tendo sido alegado quanto muito um quadro de negligência grosseira, que como já vimos, não conduz a qualquer responsabilização nestes termos.
62. Assim, se a Requerente agiu convicta de que lhe assistia razão, não poderia estar consciente dessa mesma falta de razão.
63. A circunstância de não se ter razão ou de não se conseguir demonstrar o alegado não é, só por si, indicador de ter atuado com dolo.
64. Ademais a Requerente deduziu um pedido de insolvência válido, devidamente fundamentado, atento os conhecimentos que detinha.
65. Pelo que, o tribunal recorrido deveria ter dado como não provados os factos constantes em 3.18. 3.19. 3.20. atento ao facto da prova produzida, concretamente as declarações do legal representante da Recorrente, a prova documental e a prova testemunhal, nomeadamente nas passagens de gravação de prova supra transcritas, que por uma questão de brevidade processual se dão aqui por integralmente reproduzidas para todos os devidos efeitos legais, impor uma decisão final totalmente diversa considerando como não provados os factos mencionados e, assim o incidente de pedido infundado de insolvência seria julgado totalmente improcedente, com as legais consequências.
66. Pelo exposto, o tribunal recorrido, ao ter dado como provados os factos constantes em 3.18. 3.19. 3.20. com o devido respeito, incorreu num erro de julgamento sobre os aludidos concretos pontos de facto, os quais deverão ser alterados por este Tribunal Superior, (cfr. artigo 640.º, n.º 1 als. a) e b) e 662, n.º 1 do C.P.Civil).
67. Por tudo acima exposto, deve o presente recurso ser julgado procedente e ser a sentença recorrida revogada e substituída por outra que julgue improcedente o incidente de dedução de pedido infundado, com as legais consequências daí advenientes.
68. Assim, o Tribunal ao ter decidido como decidiu violou o disposto nos artigos 22.º do CIRE e 483.º do Código Civil.”
Pede que o presente recurso seja julgado procedente e a sentença recorrida seja revogada e substituída por outra que julgue improcedente o incidente de dedução de pedido infundado, com as legais consequências daí advenientes.
*
Foram apresentadas contra-alegações pela requerida, pugnando pela improcedência do recurso.
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O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, nos autos, e efeito meramente devolutivo, o que foi confirmado por este Tribunal.
Foi proferido o seguinte despacho pelo Tribunal a quo: “Vem arguida a nulidade da sentença, nos termos do art.º 615.º, n.º 1 do CPC.
Cumpre, pois, proferir despacho nos termos do art.º 617.º do citado diploma.
Ora, salvo o devido respeito, afigura-se-nos que a decisão proferida não padece da invocada nulidade, pois que da mesma consta de forma clara e inequívoca os seus fundamentos quer de facto quer de direito, não se encontrando os mesmos em oposição nem padecendo de qualquer ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
Vssªs Exªs, porém, decidindo farão melhor Justiça.”
Após os vistos legais, cumpre decidir.
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II QUESTÕES A DECIDIR.

Decorre da conjugação do disposto nos art.ºs 608º, nº. 2, 609º, nº. 1, 635º, nº. 4, e 639º, do Código de Processo Civil (C.P.C.) que são as conclusões das alegações de recurso que estabelecem o thema decidendum do mesmo. Impõe-se ainda ao Tribunal ad quem apreciar as questões de conhecimento oficioso que resultem dos autos.

Impõe-se, por isso, no caso concreto e face às elencadas conclusões, decidir, por ordem lógica:
-se a sentença é nula por falta de fundamentação;
-se os pontos 3.18 a 3.20 da matéria de facto provada, admitida a sua impugnação, devem passar a constar como não provados;
-nessa medida, se a condenação da requerente em indemnização a liquidar, por força da verificação de dedução de pedido de insolvência infundado, deve ser revogada.
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III   FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

O Tribunal recorrido consignou o seguinte:
“A) Da matéria de facto provada
Os factos provados, com interesse para a decisão da causa – tendo ainda em consideração a previsão dos art.ºs 22.º do CIRE e 542.º e segs. do CPC –, são os seguintes:---
3.1. A Requerente é uma sociedade por quotas que se dedica ao comércio, importação, exportação e instalação de sistemas de aquecimento, ventilação, refrigeração ou climatização nomeadamente aparelhos de frio e ar condicionado, bem como de máquinas e equipamentos para a indústria hoteleira e assistência técnica neste âmbito, com carácter habitual e intuito lucrativo.---
3.2. A Requerida dedica-se à Indústria de panificação, pastelaria e confeitaria, café, snack-bar, com carácter habitual e intuito lucrativo.---
3.3. No âmbito do exercício da sua atividade comercial, a Requerida adjudicou à Requerente o fornecimento e montagem de equipamentos vários, com vista à abertura de um novo espaço comercial, adjudicação essa que teve por base a fatura proforma nº 29122_03, datada de 15/03/2022, no valor total de € 164.442,45.---
3.4. A Requerida celebrou com o Banco 1..., S.A. um contrato de locação financeira, no dia 7 de junho de 2023, mediante o qual a referida instituição financeira se comprometeu a adquirir diretamente à Requerente, por indicação expressa da Requerida, parte dos equipamentos constantes na mencionada fatura proforma e, consequentemente ceder a sua utilização àquela, com o pagamento da correspondente renda devida pela utilização.---
3.5. Tendo a Requerente recebido o valor, pago diretamente pelo Banco 1..., S.A., de € 126.985,86, acordando entretanto com a Requerida que esta suportaria o restante valor de € 37.456,58, referente aos materiais e demais equipamentos discriminados nas facturas ...09, de 11/10/2023, ...4, de 30/01/2024, e ...60, de 23/02/2024.---
3.6. A Requerente emitiu ainda em nome da Requerida e por conta de trabalhos a mais pela mesma requeridos a fatura n.º ...89, de 28/05/2024, no montante de € 24.353,75.---
3.7. Relativamente aos equipamentos adquiridos diretamente pela Requerida e titulados pelas faturas supra ids., não procedeu aquela ainda ao seu pagamento.--
3.8. A Requerente exigia que o pagamento fosse efetuado com a reentrega e colocação dos materiais ainda em falta.---
3.9. Entendendo, entretanto, a Requerida que a contraprestação da Requerente padecia de irregularidades/deficiências, e após a remessa de diversos e-mails e a realização de diversas reuniões tendo em vista a resolução do diferendo, enviou àquela interpelação, datada de 3 de Abril de 2024, enviada a 8 de Abril de 2024 e recebida a 10 Abril de 2024, nos termos da qual solicitada àquela que, no prazo máximo de 8 dias, procedesse à entrega dos bens objeto do contrato de locação financeira e dos adquiridos diretamente pela requerida ali concretamente id., à restituição dos bens objeto do contrato de locação financeira, propriedade do Banco 1..., S.A., indevida e ilegalmente retirados das instalações da requerida, e à eliminação dos defeitos ali também denunciados.---
3.10. Na referida interpelação, comunicou ainda a Requerida à Requerente que, ultrapassado o prazo ali referido sem que a mesma procedesse à reparação dos defeitos e entregasse os equipamentos em falta, converter-se-ia a mora em incumprimento definitivo, procedendo-se à imediata resolução do contrato que foi celebrado entre as partes.---
3.11. A Requerida não tem proposta contra si qualquer ação de cobrança de dívida ou qualquer ação executiva.---
3.12. A Requerida não tem qualquer incumprimento junto do Banco de Portugal.-
3.13. A Requerida tem a sua situação regularizada perante a Autoridade Tributária e a Segurança Social.---
3.14. A Requerida não tem qualquer dívida emergente de contrato de trabalho, sua violação ou cessação, tendo os salários dos seus trabalhadores em dia.---
3.15. A Requerida, exercendo a sua atividade em espaço comercial arrendado, tem as respetivas rendas em dia, sem qualquer atraso ou incumprimento.---
3.16. A Requerida tem mantido em dia os pagamentos aos respectivos fornecedores.---
3.17. No decurso dos seus 6 meses de atividade, a Requerida apresenta lucro e o seu o ativo é superior ao seu passivo.---
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3.18. A Requerente alegou factos que sabia não corresponderem à verdade, designadamente respeitantes ao invocado incumprimento generalizado das obrigações e à impossibilidade de satisfação pontual das mesmas por parte da Requerida, tendo como principal objectivo obter o pagamento da quantia que reclama desta e bem sabendo das consequências que, para a mesma poderia acarretar a mera instauração dos presentes autos.---
3.19. O pedido de insolvência promovido pela Requerente é passível de suscitar, como suscitou, a desconfiança junto dos parceiros, fornecedores, trabalhadores, clientes e público em geral da Requerida, pondo em causa a solvabilidade económica e a reputação da mesma.---
3.20. A Requerida, face ao pedido de insolvência apresentado viu-se forçada a diligenciar pela respectiva defesa, designadamente suportado os custos inerentes à obtenção da documentação necessária e à sua representação forense.---
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B) Da matéria de facto não provada

Os factos não provados, com interesse para a decisão da causa – tendo ainda em consideração a previsão dos art.ºs 22.º do CIRE e 542.º e segs. do CPC –, são os seguintes:---
a) A Requerente procedeu à entrega e colocação em obra de todos os equipamentos constantes da fatura proforma.---
b) Como a obra não tinha instalado eletricidade trifásica, não sendo possível testar os equipamentos, a Requerente voltou a carregar alguns os equipamentos para armazém com vista a testar o bom funcionamento dos mesmos.---
c) A Requerente não recolocou nem reinstalou os equipamentos, por culpa exclusiva da Requerida.---
d) Os trabalhos constantes e melhor discriminados nas facturas ids. nos factos provados foram integralmente executados pela Requerente e recebidos pela Requerida.--
e) A Requerida não procedeu ao pagamento do montante reclamado pela Requerente porque caiu em situação económica e financeira difícil, situação essa que se agravou entretanto e que determinou que ficasse sem disponibilidades financeira e de dinheiro.---
f) A Requerida evidencia uma insuficiência dos valores ativos face às responsabilidades que tem pendentes, quer perante a Requerente quer perante terceiros.-
g) A Requerida não possui, livre de ónus ou encargos, património ou activo capaz de pagar o crédito da aqui Requerente e de responder aos compromissos já vencidos por si assumidos perante outros credores.---
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Por consubstanciar matéria de direito, conclusiva ou repetitiva, ou ainda que factual, cuja prova seria inócua para a decisão da causa, não relevaram para a apreciação da presente decisão os restantes factos alegados que não foram seleccionados acima, em sede de factualidade provada e não provada.”

Consignou ainda o seguinte:
“C) Da motivação e análise crítica da prova
O Tribunal formou a sua convicção, para a determinação da matéria de facto dada como provada e não provada, quer nas posições vertidas em sede de articulados, quer no teor conjugado dos elementos documentais juntos aos autos, e das declarações prestadas pelas partes e pelas testemunhas pelas mesmas indicadas.---
No que se refere aos factos provados, resultaram os mesmos apurados nos seguintes termos:---
Os factos plasmados nos pontos 3.1. e 3.2. assim resultam quer do teor das certidões de matrícula juntas aos autos em anexo à p.i..---
Os factos descritos sob os pontos 3.3., 3.5. e 3.6. advieram do teor das facturas juntas em anexo à p.i., enquadrados contextualmente entretanto pelo teor das declarações de parte prestadas pelos legais representantes da Requerente e da Requerida.---
Os factos expostos no ponto 3.4. reproduzem o teor conjugado dos documentos bancários e das declarações da testemunha BB, que fora gerente de conta da Requerente e acompanhou o contrato de locação financeira por aquela celebrado.---
Os factos relatados nos pontos 3.7. e 3.8. resultam do teor conjugado das declarações de parte prestadas pelos legais representantes da Requerente e da Requerida.-
Os factos plasmados nos pontos 3.9. e 3.10. assim resultam do teor das missivas juntas em anexo à contestação e não impugnadas pela Requerente, tendo-se ainda em conta o relato trazido a Tribunal pela testemunha DD, no que às reclamações da Requerente por desconformidades e/ou defeitos diz respeito.---
Os factos descritos nos pontos 3.11. e 3.17. resultam do teor conjugado das declarações de parte prestadas pela legal representante da Requerida e da testemunha AA, contabilista da Requerida, complementados ainda pelos depoimentos pelo teor da documentação anexa à contestação e não impugnada pela Requerente e das declarações da testemunha CC, funcionária administrativa da Requerida.---
Por fim, os factos plasmados nos pontos 3.18. a 3.20. resultaram assim provados atendendo quer ao teor das declarações de parte prestadas pela legal representante da Requerida, quer dos depoimentos das demais testemunhas pela mesma arroladas, a par das regras de experiência que nos demonstram claramente os prejuízos advindos para uma empresa com casa aberta ao público do rumor da pendência de um pedido de insolvência da mesma, quer ao nível da confiança necessária junto dos parceiros e trabalhadores, quer dos fornecedores, cliente e público em geral; quer ainda atendendo ao teor das próprias declarações do legal representante da Requerente, no que ao real conhecimento da situação financeira da Requerida diz respeito e, em especial, ao alegado “receio” em não conseguir cobrar o crédito que sobre a mesma reclama, que resultou ser seu efectivo objectivo, tendo procurado braquear a clara situação de litígio que entre ambas as sociedades existe no que respeita à relação negocial entre as mesmas havida.---
No que se refere aos factos não provados, resultaram os mesmos da ausência de demonstração da sua realidade, designadamente por contraposição com a factualidade apurada.---
Na verdade, tais factos, alegados pela Requerente, não se encontram demonstrados em quaisquer documentos, sendo que a única testemunha arrolada por aquela, demonstrou nenhum conhecimento possuir quanto à situação actual da Requerida, tendo aliás confirmado nenhuma dívida por cobrar sobre a mesma lhe ser conhecido.”
***
IV MÉRITO DO RECURSO.

NULIDADE DE SENTENÇA.

Dispõe o art.º 615º, n.º 1, C.P.C. que é nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
As nulidades da sentença são vícios formais e intrínsecos de tal peça processual e encontram-se taxativamente previstos no normativo legal supra citado.
Os referidos vícios, designados como error in procedendo, respeitam unicamente à estrutura ou aos limites da sentença.
As nulidades da sentença, como seus vícios intrínsecos, são apreciadas em função do texto e do discurso lógico nela desenvolvidos, não se confundindo com erros de julgamento (error in judicando), que são erros quanto à decisão de mérito explanada na sentença, decorrentes de má perceção da realidade factual (error facti) e/ou na aplicação do direito (error juris), de forma que o decidido não corresponde à realidade ontológica ou normativa, com a errada aplicação das normas jurídicas aos factos, erros de julgamento estes a sindicar noutro âmbito (cfr. Acórdão desta Relação de 4/10/2018 em que foi relatora Eugénia Cunha, e do STJ de 17/10/2017, publicados em www.dgsi.pt, como todos os que aqui serão citados sem indicação de outra fonte).
Conforme Acórdão desta Relação relatado por Maria João Pinto de Matos, aqui adjunta, com a mesma data e igualmente publicado, “As decisões judiciais proferidas pelos tribunais no exercício da sua função jurisdicional podem ser viciadas por duas distintas causas (qualquer uma delas obstando à sua eficácia ou validade): por se ter errado no julgamento dos factos e do direito, sendo então a respectiva consequência a sua revogação; e, como actos jurisdicionais que são, por se ter violado as regras próprias da sua elaboração e estruturação, ou as que balizam o conteúdo e os limites do poder à sombra do qual são decretadas, sendo então passíveis de nulidade, nos termos do art. 615.º do C.P.C. (neste sentido, Ac. do STA, de 09.07.2014, Carlos Carvalho, Processo nº 00858/14, in www.dgsi.pt, como todos os demais citados sem indicação de origem).”
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A recorrente invoca a deficiente fundamentação da sentença, visando com isso a sua declaração de nulidade, alegando para tanto que na mesma não se procedeu a uma análise crítica das provas, não se indicaram as ilações tiradas dos factos essenciais e instrumentais, e não se especificaram os demais fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador.
O dever de fundamentação assenta no princípio constitucional da obrigatoriedade de fundamentação de todas as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente (art.º 205º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa).
A fundamentação tem de ser factual e jurídica. E, de acordo com o n.º 2 do art.º 154º, não pode ser através da mera adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou oposição em apreço, salvo quando, tratando-se de despacho interlocutório, a contraparte não tenha apresentado oposição ao pedido e o caso seja de manifesta simplicidade. O dever de fundamentação abrange todos os pedidos controvertidos e todas as dúvidas suscitadas no processo, mas também abrange o dever de explicitação dos motivos que levaram o julgador a dirimir a controvérsia em determinado sentido.
Pode questionar-se se apenas a falta absoluta constitui a causa de nulidade prevista na alínea b) do n.º 1 do art.º 615º – “a ausência total de fundamentos de direito e de facto” conforme refere José Alberto dos Reis, “Código Processo Civil Anotado”, V, pág. 140, e Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio Nora, “Manual de Processo Civil”, 2ª. ed., 1985, págs. 670 a 672; ou se a integra uma fundamentação apenas incompleta ou insuficiente.
Tem sido posição maioritária da jurisprudência que apenas a falta absoluta conduz à nulidade; admite-se que uma insuficiência grosseira (situação diversa da falta de mérito suficiente para justificar a parte dispositiva, que sempre se traduzirá antes em erro de julgamento) possa equivaler à falta de fundamentação.
Esta situação não é, todavia, transponível para o caso em apreço.
De facto, em primeiro lugar não há falta absoluta de fundamentação, como reconhece a recorrente, o que já seria suficiente para afastarmos a pretensão de obter a declaração de nulidade da sentença, face à posição (maioritária) que perfilhamos. A sentença elencou os factos provados, os não provados, e apresentou a respetiva motivação.
Em segundo lugar, a motivação apresentada é suficiente para se perceber o raciocínio feito, perante as provas apresentadas, e a decisão factual que delas se extraiu. Por isso, não há sequer uma insuficiência grosseira.
O modo como o Tribunal recorrido apresentou a motivação, fazendo corresponder a cada facto o meio de prova que o sustenta (ou a sua ausência), permite à recorrente a sindicância, perante este Tribunal de recurso, da matéria de facto assente e não provada; permite-lhe refutar o valor atribuído a cada meio de prova, de modo a tentar obter juízo diverso.
A fundamentação das decisões destina-se precisamente a possibilitar a sua perceção e a sua impugnação.
Dizia já Alberto dos Reis, no “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. I, pág. 284, que “…a parte vencida carece de ser convencida, isto é, de conhecer as razões do seu insucesso, para que possa atacá-las por via de recurso, se quiser e puder recorrer. Mas não é esta a única justificação do preceito legal, pois que a exigência da motivação é aplicável mesmo às decisões de que não cabe recurso. Desde que o nosso sistema é o de legalidade, o juiz tem de demonstrar que decidiu em conformidade com a lei; tem, portanto, de interpretar a norma legal adequada e aplicá-la aos factos da causa. Este trabalho de interpretação e aplicação é da mais alta importância; é por via dele que se forma a jurisprudência e que esta se vai uniformizando e adaptando às novas condições e necessidades do meio social”.
Assinalou Tomé Gomes -“Um olhar sobre a demanda da verdade no processo civil”, Revista do CEJ, 2005, n.º 3, pág. 158 - que o convencimento do julgador deve basear-se numa certeza relativa, histórico-empírica, dotada de um grau de probabilidade adequado às exigências práticas da vida, e destaca que “…para a formação de tal convicção não basta um mero convencimento íntimo do foro subjectivo do Juiz”; bastará sim, a formação de uma convicção “suportada numa persuasão racional, segundo juízos de probabilidade séria, baseada no resultado da prova apreciado à luz das regras da experiência comum e atentas as particularidades do caso”.
Significa isto que a convicção subjetiva que se possa formar tem de ter suporte objetivado, tem de ser o resultado de um percurso lógico, motivado e devidamente clarificado, consistindo a fundamentação de facto na apresentação do mérito demonstrativo. E tem de ser feita de modo a permitir ao respetivo destinatário a perceção das razões de facto da decisão judicial, assim cumprindo o dever constitucional/legal de justificação. Um entendimento conforme ao artigo 205.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa impõe esta interpretação de modo a garantir sempre a possibilidade de impugnação.
Já vimos que a sentença recorrida justificou (suficientemente) a decisão, não estando afetada de nulidade.
A eventual falta de mérito da motivação, a maior ou menor argumentação, a pior ou melhor expressão do modo como o julgador chegou à sua convicção, nomeadamente a eventual falta de juízo crítico (bastante) sobre cada um dos meios de prova, é de analisar a propósito da impugnação da matéria de facto, podendo conduzir ao êxito da pretensão da recorrente.
Improcede, por isso, sem necessidade de maiores considerações, a invocada nulidade de sentença.
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-IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO.

Cumpre começar por enunciar os requisitos de ordem formal que permitem a este Tribunal apreciar a impugnação da matéria de facto, para então se verificar se a recorrente os cumpriu, nomeadamente se indicou os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões; se especificou na motivação os meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos impugnados; fundando-se a impugnação em parte na prova gravada, se indicou na motivação as passagens da gravação relevantes; apreciando criticamente os meios de prova, se expressou na motivação a decisão que no seu entender deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas; tudo conforme resulta do disposto no art.º 640º, nºs. 1 e 2, do Código Processo Civil (C.P.C.) e vem melhor mencionado na obra de Abrantes Geraldes “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 4ª Edição, págs. 155 e 156. 
Conforme Acs. do STJ, designadamente de 29/10/2015, de 03/05/2016 e de 21/03/2019, podemos distinguir nestas exigências um ónus primário ou fundamental de delimitação do objeto do recurso e de fundamentação concludente da impugnação, e um ónus secundário tendente a possibilitar um acesso mais ou menos facilitado aos meios de prova gravados relevantes para a apreciação da impugnação deduzida. No primeiro caso, cabem as exigências de concretização dos pontos de factos que se consideram incorretamente julgados, especificação dos concretos meios de prova que sustentam a decisão errada e/ou diversa (sendo que o Tribunal pode considerar esses e, ao abrigo do princípio do inquisitório, outros que entenda relevantes, apreciando livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto impugnado, exceto no que respeita a factos para cuja prova a lei exija formalidades especiais ou que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados por documento, acordo ou confissão, conforme art.º 607º, n.º 5 do C.P.C.), e a indicação do sentido em que se deveria ter julgado a matéria de facto, na posição do recorrente, ou da decisão a proferir (art.º 640º, n.º 1, a), b) e c)). No segundo caso, cabe a exigência de indicação exata das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver reapreciados (a), n.º 2, do art.º 640º). Em ambos os casos, a cominação para a falta de cumprimento das exigências é a rejeição imediata do recurso (cfr. a dita disposição), sem possibilidade de prévia oportunidade de aperfeiçoamento da peça. Em ambos os casos, os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade devem orientar a decisão de rejeição (-já que a parte ficará prejudicada ao não ver apreciado o seu recurso por motivos de ordem formal). A nuance entre os dois casos decorrerá do bom senso com que se analisam as exigências, as quais, antes de mais, têm que ver com o facto de possibilitar à parte contrária um efetivo exercício do contraditório, para além de serem decorrência dos princípios estruturantes da cooperação e da lealdade e boa fé processuais, visando-se com elas assegurar a seriedade do próprio recurso. Se as primeiras exigências são imprescindíveis a esse exercício e orientam também o Tribunal de recurso relativamente ao que se lhe pretende sujeitar, a segunda exigência, tendo em vista a melhor orientação para esse efeito, ainda que seja cumprida de forma imprecisa, caso a parte contrária tendo apreendido convenientemente o alcance do visado e o Tribunal esteja habilitado ao pretendido reexame, não se imporá a rejeição do recurso, mas antes o seu aproveitamento. Desde modo se dará prevalência ao mérito sobre a forma, princípio enformador do atual C.P.C..
Além disso, a sanção de rejeição do recurso apenas poderá abarcar o segmento relativo à impugnação da matéria de facto e, dentro deste segmento, apenas pode abranger os pontos relativamente aos quais tenham sido desrespeitadas as referidas regras.
Por último, e continuando a seguir a orientação do nosso STJ, face ao que se pretende assegurar com cada um dos ónus, a especificação dos pontos concretos de facto impugnados deve constar das conclusões (art.ºs 635º, n.º 4, 640º, n.º 1, a), e 639º, n.º 1, do C.P.C.). No mais (meios de prova concretos e indicação das passagens das gravações), basta que constem do corpo das alegações.
Em 17/10/2023 foi proferido Acórdão Uniformizador de Jurisprudência pelo STJ (n.º 12/2023, publicado no Diário da República n.º 220/2023, Série I de 2023-11-14, págs. 44 a 65), no sentido de se interpretar a exigência da indicação da decisão pretendida prevista na alínea c) do n.º 1 do art.º 640º, na ótica de que o recorrente não está vinculado a indicar nas conclusões a decisão alternativa pretendida, desde que a mesma resulte, de forma inequívoca, das alegações.
Trata-se da consagração de uma corrente do STJ apologista de um menor rigor formal exigido no cumprimento dos ónus formais impostos no art.º 640º do C.P.C., promotora da verdade material em detrimento da observação de formalidades de menor relevância, desde que não seja postergado o exercício cabal do contraditório, bem como seja apreendida em termos claros pelo julgador a pretensão recursiva, chamando à colação os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, instrumentais em relação a cada situação concreta.
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A recorrente insurge-se contra a factualidade constante dos pontos 3.18, 3.19, 3.20 do elenco dos factos provados.
Pretende que essa matéria passe a constar como não provada.
Alude, no que respeita à imputada atuação dolosa, e no sentido de a afastar, ao depoimento do seu legal representante, e ao depoimento de AA, localizando determinadas passagens no registo áudio; alude também ao acordo de pagamento com a EMP04... S.A., e ao acordo de resolução do contrato de empreitada com a EMP05..., juntos aos autos.
No que concerne aos danos decorrentes para a recorrida, menciona os depoimentos de BB e de AA, localizando passagens no registo áudio, e diz que do depoimento de CC não resulta a respetiva prova.
Muito embora se possa dizer que a recorrente cumpriu de forma minimamente percetível os ónus impugnatórios, o que resulta da leitura da peça recursiva é acima de tudo uma argumentação no sentido de, face aos elementos disponíveis, a interpretação a fazer da produção de prova dever ser outra, diversa daquela que o Tribunal recorrido fez.
Ora, situamo-nos no âmbito da prova livre, em que vale a convicção do Tribunal devidamente fundamentada.
A propósito da reapreciação da matéria de facto, dispõe o art.º 662º, n.º 1, do C.P.C. que “A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.” A Relação usa do princípio da livre apreciação da prova com a mesma amplitude de poderes da 1ª instância, nos termos que resultam do n.º 5 do art.º 607º do C.P.C.. Assim, após análise conjugada de todos os meios de prova produzidos, a Relação deve proceder à reapreciação da prova de acordo com a própria convicção que sobre ela forma, sem quaisquer limitações, a não ser as impostas pelas regras de direito material. A propósito refere também Abrantes Geraldes na mesma obra, pág. 273, "(…) a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência”. E na pág. 274 (…) “a Relação tem autonomia decisória, competindo-lhe formar e formular a sua própria convicção, mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daquelas que se mostrem acessíveis e com observância do princípio do dispositivo no que concerne à identificação dos pontos de discórdia”.  
Porém, não está em causa proceder-se a novo e global julgamento, não sendo exigido nem permitido à Relação que de motu proprio se confronte com a generalidade dos meios de prova que estão sujeitos a livre apreciação e que, ao abrigo desse princípio foram valorados pelo Tribunal de 1ª instância, para deles se extrair uma decisão inteiramente nova (pág. 279). Assim a Relação irá examinar a decisão da primeira instância e seus fundamentos, analisar as provas gravadas e proceder ao confronto do resultado desta análise com aquela decisão e fundamentos, pronunciando-se apenas quanto aos concretos pontos impugnados.
O Tribunal da Relação, nesta sua função de reapreciação da decisão de facto, não opera apenas em casos de erros manifestos de apreciação, mas também pode formar uma convicção diversa da 1ª instância sobre os pontos de facto impugnados, o que deve levar a nova decisão que contenha esse resultado, fundamentadamente, ou seja, com base bastante para alterar aquela que foi a convicção (errada) do juiz de 1ª instância (erro de julgamento - error in iudicando, concretamente error facti).
Partindo do princípio do dispositivo, deve o recorrente indicar os meios de prova que, no seu entender, deviam ter feito o Tribunal a quo trilhar caminho diverso no seu juízo probatório; contudo, o Tribunal ad quem não está limitado a essa indicação – que será o seu ponto de partida e pode até ser o bastante- podendo e devendo se tal se impuser (além dos demais poderes conferidos em termos de retorno à primeira instância ou de oficiosidade) socorrer-se de todos os meios de prova produzidos nos autos para confirmar ou rebater a argumentação do recorrente.
O Ac. desta Relação de 29-10-2020 (processo n.º 2163/17.7T8VCT.G1, relatado por Alcides Rodrigues) sintetiza os princípios a ter em consideração na atuação do Tribunal de recurso, recorrendo à doutrina -Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2017 – 4ª ed., Almedina, pp. 271/300, Luís Filipe Pires de Sousa, “Prova testemunhal”, 2017 – reimpressão, Almedina, pp. 384 a 396, Miguel Teixeira de Sousa, em anotação ao Ac. do STJ de 24/09/2013, Cadernos de Direito Privado, n.º 44, Outubro/dezembro 2013, p. 33 e Francisco Manuel Lucas Ferreira de Almeida, “Direito Processual Civil”, Vol. II, 2015, Almedina, pp. 462 a 469- e jurisprudência -Acs. do STJ de 7/09/2017 (relator Tomé Gomes), de 24/09/2013 (relator Azevedo Ramos), de 03/11/2009 (relator Moreira Alves) e de 01/07/2010 (relator Bettencourt de Faria); Acs. da RG de 11/07/2017 (relatora Maria João Matos. Aqui 2ª adjunta), de 14/06/2017 (relator Pedro Damião e Cunha) e de 02/11/2017 (relator António Barroca Penha), todos consultáveis em www.dgsi.pt.- desta forma:
- só tem que se pronunciar sobre a matéria de facto impugnada pelo recorrente;
- sobre essa matéria de facto impugnada, tem que realizar um novo julgamento;
- nesse novo julgamento forma a sua convicção de uma forma autónoma, de acordo com o princípio da livre apreciação das provas, mediante a reapreciação de todos os elementos probatórios que se mostrem acessíveis (e não apenas os indicados pelas partes);
- a reapreciação da matéria de facto por parte da Relação tem que ter a mesma amplitude que o julgamento de primeira instância;
- a intervenção da Relação não se pode limitar à correção de erros manifestos de apreciação da matéria de facto, sendo também insuficiente a menção a eventuais dificuldades decorrentes dos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação das provas;
- ao reapreciar a prova, valorando-a de acordo com o princípio da livre convicção, a que está também sujeita, se conseguir formar, relativamente aos concretos pontos impugnados, uma convicção segura acerca da existência de erro de julgamento da matéria de facto, deve proceder à modificação da decisão;
- se a decisão factual do tribunal da 1ª instância se basear numa livre convicção objetivada numa fundamentação compreensível onde se optou por uma das soluções permitidas pela razão e pelas regras de experiência comum, a fonte de tal convicção -obtida com benefício da imediação e oralidade- apenas poderá ser afastada se ficar demonstrado ser inadmissível a sua utilização pelas mesmas regras da lógica e da experiência comum.
Voltando ao art.º 607º, n.º 5, do C.P.C., este dispõe que, em princípio, o Tribunal aprecia livremente as provas, decidindo os Juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, com ressalva das situações em que a lei dispuser diferentemente: quando não dispense a exigência de uma determinada formalidade especial, quando os factos só possam ser provados por documento ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes.
A prova visa o convencimento do juiz sobre a realidade dos factos –art.º 341º do C.C.. Essa prova não é, não tem de ser, a prova absoluta.
Diz Vaz Serra (“Provas – Direito Probatório Material”, BMJ 110/82 e 171) que “As provas não têm forçosamente que criar no espírito do juiz uma absoluta certeza acerca dos factos a provar, certeza essa que seria impossível ou geralmente impossível: o que elas devem é determinar um grau de probabilidade tão elevado que baste para as necessidades da vida”. É a afirmação da corrente probabilística, seguida pela maior parte da doutrina que, opondo-se à corrente dogmática, considera não exigível mais do que um elevado grau de probabilidade para que se considere provado o facto. Mas terá que haver sempre um grau de convicção indispensável e suficiente que justifique a decisão, que não pode ser, de modo algum, arbitrária, funcionando aquela justificação (fundamentação) como base de compreensão do processo lógico e convincente da sua formação (cfr. entre outros o Ac. da Rel. do Porto de 23/9/2021, relator Filipe Caroço).
O tribunal aprecia livremente os meios de prova e é livre na atribuição do grau do valor probatório de cada meio de prova produzido. Perante o princípio da livre apreciação da prova, em cada caso, o tribunal é livre para considerar suficiente a prova testemunhal produzida ou para considerar que a mesma é afinal insuficiente e exigir outro meio de prova de maior valor probatório (ou seja, com maior capacidade para convencer o juiz da probabilidade do facto em discussão). Coisa diferente é a questão do standard ou padrão de prova, a qual já tem que ver com a questão do ónus da prova ou da determinação do conceito de dúvida relevante para operar a consequência desse ónus – no sentido de que a lei manda que, na dúvida, o juiz decida contra a parte onerada com a prova (cfr. arts.º 346.º do Código Civil -C.C.- e 414º do C.P.C.).
Diz-nos Luís Filipe Pires de Sousa (“Prova testemunhal”, 2014, pág. 384) que “O standard de prova deve operar como uma pauta móvel que tem de ser permanentemente concretizada ao ser aplicada ao caso concreto. Cremos que no nosso ordenamento jurídico será, pois, de aplicar, o standard da probabilidade prevalecente…Assim, no vulgar caso de cobrança de um crédito decorrente de compra e venda, na ação de responsabilidade civil emergente de acidente de viação ou na ação em que se discuta o cumprimento de um contrato de empreitada operará o standard da probabilidade lógica prevalecente desde que seja ultrapassado o limite mínimo de probabilidade(> ou = 0,51)…”.
Quanto a esta matéria, no Ac. desta Relação de 7/12/2023 (processo n.º 573/20.1T8VCH.G1, relatado por Gonçalo Oliveira Magalhães), foi elucidativamente feita a apreciação dessa posição face ao nosso ordenamento jurídico.
Temos para nós que, como já decidimos no processo n.º 2568/18.6T8VRL.G1 (ac. de 3/12/2020) e no processo n.º 967/19.5T8VRL.G1 (ac. de 8/10/2020), ambos da relatora do presente e não publicados, “O grau de probabilidade exigido para que se dê como verificada determinada realidade de facto é de elevada probabilidade.”
Voltando ao art.º 607º, agora o seu n.º 4, do C.P.C., este impõe que o juiz declare quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, e ainda que tome em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.
Em suma, e conforme se diz no Ac. desta Relação de 9/11/2023 (2984/22.9T8GMR.G1), também relatado por Maria João Pinto de Matos: “…quando os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insuscetível de ser destruída por quaisquer outras provas, a dita modificação da matéria de facto - que a ela conduza - constitui um dever do Tribunal de Recurso, e não uma faculdade do mesmo (o que, de algum modo, também já se retiraria do art.º 607.º, n.º 4, do CPC, aqui aplicável ex vi do art.º 663.º, n.º 2, do mesmo diploma).”
Refere-se ainda no mesmo, conjugando com as exigências relativas aos ónus impugnatórios: “Dir-se-á mesmo que as exigências legais referidas têm uma dupla função: não só a de delimitar o âmbito do recurso, mas também a de conferir efetividade ao uso do contraditório pela parte contrária (pois só na medida em que se sabe especificamente o que se impugna, e qual a lógica de raciocínio expendido na valoração/conjugação deste ou daquele meio de prova, é que se habilita a contraparte a poder contrariá-lo).
Por outras palavras, se o dever - constitucional (art.º 205.º, n.º 1, da CRP) e processual civil (art.ºs 154.º e 607.º, n.ºs 3 e 4, do CPC) - impõe ao juiz que fundamente a sua decisão de facto, por meio de uma análise crítica da prova produzida perante si, compreende-se que se imponha ao recorrente que, ao impugná-la, apresente a sua própria. Logo, deverá apresentar “um discurso argumentativo onde, em primeiro lugar, alinhe as provas, identificando-as, ou seja, localizando-as no processo e tratando-se de depoimentos a respetiva passagem e, em segundo lugar, produza uma análise crítica relativa a essas provas, mostrando minimamente por que razão se “impunha” a formação de uma convicção no sentido pretendido” por si (Ac. da RP, de 17.03.2014, Alberto Ruço, Processo n.º 3785/11.5TBVFR.P1).
Com efeito, “livre apreciação da prova” não corresponde a ”arbitrária apreciação da prova”. Deste modo, o Juiz deverá objetivar e exteriorizar o modo como a sua convicção se formou, impondo-se a “identificação precisa dos meios probatórios concretos em que se alicerçou a convicção do Julgador”, e ainda “a menção das razões justificativas da opção pelo Julgador entre os meios de prova de sinal oposto relativos ao mesmo facto” (Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra Editora, Limitada, 1985, pág. 655).
“É assim que o juiz [de 1ª Instância] explicará por que motivo deu mais crédito a uma testemunha do que a outra, por que motivo deu prevalência a um laudo pericial em detrimento de outro, por que motivo o depoimento de certa testemunha tecnicamente qualificada levou à desconsideração de um relatório pericial ou por que motivo não deu como provado certo facto apesar de o mesmo ser referido em vários depoimentos. E é ainda assim por referência a certo depoimento e a propósito do crédito que merece (ou não), o juiz aludirá ao modo como o depoente se comportou em audiência, como reagiu às questões colocadas, às hesitações que não teve (teve), a naturalidade e tranquilidade que teve (ou não)” (Paulo Pimenta, Processo Civil Declarativo, Almedina, 2014, pág. 325).
“Destarte, o Tribunal ao expressar a sua convicção, deve indicar os fundamentos suficientes que a determinaram, para que através das regras da lógica e da experiência se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento dos factos provados e não provados, permitindo aferir das razões que motivaram o julgador a concluir num sentido ou noutro (provado, não provado, provado apenas…, provado com o esclarecimento de que…), de modo a possibilitar a reapreciação da respetiva decisão da matéria de facto pelo Tribunal de 2ª Instância” (Ana Luísa Geraldes, “Impugnação e reapreciação da decisão sobre a matéria de facto”, Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas, Volume I, Coimbra Editora, 2013, pág. 591, com bold apócrifo).
Dir-se-á mesmo que, este esforço exigido ao Juiz de fundamentação e de análise crítica da prova produzida “exerce a dupla função de facilitar o reexame da causa pelo Tribunal Superior e de reforçar o autocontrolo do julgador, sendo um elemento fundamental na transparência da justiça, inerente ao ato jurisdicional” (José Lebre de Freitas, A Ação Declarativa Comum à Luz do Código de Processo Civil de 2013, 3.ª edição, Coimbra Editora, setembro de 2013, pág. 281).
É, pois, irrecusável e imperativo que, “tal como se impõe que o tribunal faça a análise crítica das provas (de todas as que se tenham revelado decisivas)… também o Recorrente ao enunciar os concreto meios de prova que devem conduzir a uma decisão diversa deve seguir semelhante metodologia”, não bastando nomeadamente para o efeito “reproduzir um ou outro segmento descontextualizado dos depoimentos” (Ana Luísa Geraldes, “Impugnação e reapreciação da decisão sobre a matéria de facto”, Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas, Volume I, Coimbra Editora, 2013, pág. 595, com bold apócrifo).
Compreende-se que assim seja, isto é, que a “censura quanto à forma de formação da convicção do Tribunal não” possa “assentar de forma simplista no ataque da fase final da formação dessa convicção, isto é, na valoração da prova; tal censura terá de assentar na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objetivos que se apontam na motivação ou porque se violaram os princípios para a aquisição desses dados objetivos ou porque não houve liberdade na formação da convicção.
Doutra forma, seria uma inversão da posição dos personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar, pela convicção dos que esperam a decisão” (Ac. do TC n.º 198/2004, de 24 de março de 2004, publicado no DR, II Série, de 02.06.2004, reproduzindo Ac. da RC, sem outra identificação).
De todo o exposto resulta que o âmbito da apreciação do Tribunal da Relação, em sede de impugnação da matéria de facto, estabelece-se de acordo com os seguintes parâmetros: só tem que se pronunciar sobre a matéria de facto impugnada pelo recorrente; sobre essa matéria de facto impugnada, tem que realizar um novo julgamento; e nesse novo julgamento forma a sua convicção de uma forma autónoma, mediante a reapreciação de todos os elementos probatórios que se mostrem acessíveis (e não só os indicados pelas partes).
Contudo (e tal como se referiu supra), mantendo-se em vigor os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova, e guiando-se o julgamento humano por padrões de probabilidade e não de certeza absoluta -, precisa-se ainda que o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1.ª Instância sobre a matéria de facto só deve ser usado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos pontos de facto impugnados.
Por outras palavras, a alteração da matéria de facto só deve ser efetuada pelo Tribunal da Relação quando o mesmo, depois de proceder à audição efetiva da prova gravada, conclua, com a necessária segurança, no sentido de que os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, apontam em direção diversa, e delimitam uma conclusão diferente daquela que vingou na 1.ª Instância. “Em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira Instância em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte” (Ana Luísa Geraldes, “Impugnação e reapreciação da decisão sobre a matéria de facto”, Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas, Volume I, Coimbra Editora, pág. 609).”
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Face às concretas alegações de recurso, cabe também tecer algumas considerações sobre as declarações de parte, face ao apelo que a recorrente faz a esse meio de prova.
Dispõe quanto ao seu regime o art.º 466º do C.P.C..

Refere-se no Ac. da Rel. de Lisboa de 26/4/2017 (processo n.º 18591/15.0T8SNT.L1-7) que a doutrina e a jurisprudência vêm assumindo várias posições no que respeita à função e valoração das declarações de partes, que se reconduzem a três teses essenciais:
a) tese do caráter supletivo e vinculado à esfera restrita de conhecimento dos factos;
b) tese do princípio de prova;
c) tese da autossuficiência das declarações de parte.
Para a primeira tese, que é defendida por Lebre de Freitas (“A Ação Declarativa Comum, À Luz do Processo Civil de 2013”, Coimbra Editora, 2013, pág. 278) “a apreciação que o juiz faça das declarações de parte importará sobretudo como elemento de clarificação do resultado das provas produzidas e, quando outros não haja, como prova subsidiária, “máxime” se ambas as partes tiverem sido efetivamente ouvidas.” Ou seja, as declarações de parte têm uma função eminentemente integrativa, supletiva e subsidiária, permitindo suprir falhas ao nível da produção da prova, designadamente testemunhal, tendo particular relevo em situações em que apenas as partes protagonizaram e tiveram conhecimento dos factos em discussão.
Segundo a tese do princípio de prova, as declarações de parte não são suficientes por si só para estabelecer qualquer juízo de aceitabilidade final, podendo apenas coadjuvar a prova de um facto desde que em conjugação com outros elementos de prova.
Finalmente, a tese da autossuficiência das declarações de parte considera que as mesmas podem permitir a prova de um facto de forma autónoma, ou seja, desacompanhadas de qualquer outro meio probatório.
O Acórdão citado desenvolve e cita doutrina em abono de cada uma destas teses, que nos dispensamos aqui de reproduzir.
A atribuição às declarações de parte da função de clarificação do resultado das provas produzidas e, quando outras não haja, a sua utilização como prova subsidiária, são as teses maioritárias na jurisprudência.
A tese do princípio de prova exige sempre a sua correlação com outros meios de prova, o que será o mais curial na maior parte das situações que se colocam aos tribunais, como a dos autos, em que as partes teriam outras formas de se precaver relativamente à demonstração do facto (seja por via testemunhal, seja por via documental).
O Prof. Miguel Teixeira de Sousa, num texto publicado no blog do IPPC em 25/5/2018, em anotação ao Acórdão da Relação do Porto de 23/4/2018 (também disponível em www.dgsi.pt), pronunciou-se contra a tendência para a desvalorização deste meio de prova. 
Argumenta o autor do texto que este meio de prova deve ser valorado como qualquer outra prova livre –arts.º 466º, n.º 3, e 607º, n.º 5, C.P.C.. “…também não se pode acompanhar a orientação segundo a qual a prova por declarações de parte deve ser entendida como um meio de prova complementar ou com uma função de clarificação de outras provas. Não se ignora, como é evidente, que a prova por declarações de parte merece uma especial ponderação pelo tribunal, dado que é a própria parte que depõe em juízo sobre factos que, em princípio, lhe são favoráveis. Isto é, no entanto, coisa completamente diferente de se entender que, à partida e independentemente de qualquer valoração específica em função das circunstâncias do caso concreto, a prova por declarações de parte não pode ter um valor probatório próprio.”
Depois de fazer uma incursão sobre o direito comparado, o Prof. Miguel Teixeira de Sousa conclui “5. Se é certo que se impõe apreciar a prova por declarações de parte sem ilusões ingénuas, também é verdade que não há que, à partida, desqualificar o valor probatório dessa prova. Em suma: a prova por declarações de parte tem, sem quaisquer apriorismos, o valor probatório que lhe deva ser reconhecido pela prudente convicção do juiz; nem mais, nem menos, pode ainda precisar-se.”
Em suma, as declarações de parte são sempre um meio de prova livre.
Pronunciaram-se também sobre esta posição os Acs. da Rel. do Porto de 7/12/2008, de 21/11/2019 e de 20/2/2020.

Veja-se o Ac. desta Relação de 12/10/2023 (processo n.º 1059/19.2T8CHV.G1) que, de forma absolutamente frontal, conclui: – “I A norma do nº3 do artº 466º é claramente esclarecedora ao sujeitar as declarações de parte ao regime da livre apreciação da prova, excepto quando as mesmas constituírem confissão.
II - Norteando-se o nosso sistema processual civil pela procura da verdade material e estando as declarações de parte sujeitas ao princípio da livre apreciação da prova, não se lhes deve retirar a paridade valorativa com os demais meios de prova que o legislador consagrou de forma inovadora.
III - Adoptamos, por tudo, a posição que admite que as declarações de parte constituam causa única de justificação para dar certo facto como provado, revestidas que sejam das exigências bastantes para formar no julgador a convicção segura de que o facto ocorreu.”
Veja-se ainda, também desta Relação, o Ac. de 23/11/2023 (processo n.º 1205/22.9T8VRL.G1): “Num sistema processual civil cuja bússola é a procura da verdade material dos enunciados fáticos trazidos a juízo, a aferição de uma prova sujeita a livre apreciação não pode estar condicionada a máximas abstratas pré-assumidas quanto à sua (pouca ou muita) credibilidade mesmo que se trate das declarações de parte. Se alguma pré-assunção há a fazer é a de que as declarações de parte estão, ab initio, no mesmo nível que os demais meios de prova livremente valoráveis. A aferição da credibilidade final de cada meio de prova é única, irrepetível, e deve ser construída pelo juiz segundo as particularidades de cada caso e segundo critérios de racionalidade (ob. cit., pág. 19).
Posto isto, na valoração das declarações de parte, deve relevar-se os seguintes parâmetros: contextualização espontânea do relato, em termos temporais, espaciais e até emocionais; existência de corroborações periféricas (confirmação por outros dados que, indiretamente, demonstram a veracidade da declaração); produção inestruturada; descrição de cadeias de interações; reprodução de conversações; existência de correções espontâneas; segurança/assertividade e fundamentação; vividez e espontaneidade das declarações; reação da parte perante perguntas inesperadas; autenticidade.”
A obra citada é da autoria de Luís Filipe Pires de Sousa - “As Malquistas Declarações de Parte” - onde diz, na pág. 17 que “…deve ser repudiado um pré-juízo de desconfiança e de desvalorização das declarações de parte, sendo infundada e incorreta a postura que degrada prematuramente o valor probatório das declarações de parte.”
*
Tecidas as orientações que importam, cabe aplicar ao caso.
E antes de mais para se dizer que o Tribunal recorrido, ao contrário do que diz a recorrente, emitiu um juízo crítico no que respeita à prova produzida incidente sobre os factos impugnados, pois, fundando-se nas declarações de parte prestadas pela legal representante da requerida e nos depoimentos das demais testemunhas pela mesma arroladas, analisou-os com recurso ao critério ou filtro resultante da aplicação das regras de experiência. E, em confronto com essas provas, desvalorizou as declarações do legal representante da requerente, que, “…no que ao real conhecimento da situação financeira da Requerida diz respeito e, em especial, ao alegado “receio” em não conseguir cobrar o crédito que sobre a mesma reclama, que resultou ser seu efectivo objectivo, tendo procurado branquear a clara situação de litígio que entre ambas as sociedades existe no que respeita à relação negocial entre as mesmas havida.”.

Recordemos os factos em causa:
“3.18. A Requerente alegou factos que sabia não corresponderem à verdade, designadamente respeitantes ao invocado incumprimento generalizado das obrigações e à impossibilidade de satisfação pontual das mesmas por parte da Requerida, tendo como principal objectivo obter o pagamento da quantia que reclama desta e bem sabendo das consequências que, para a mesma poderia acarretar a mera instauração dos presentes autos.---
3.19. O pedido de insolvência promovido pela Requerente é passível de suscitar, como suscitou, a desconfiança junto dos parceiros, fornecedores, trabalhadores, clientes e público em geral da Requerida, pondo em causa a solvabilidade económica e a reputação da mesma.---
3.20. A Requerida, face ao pedido de insolvência apresentado viu-se forçada a diligenciar pela respectiva defesa, designadamente suportado os custos inerentes à obtenção da documentação necessária e à sua representação forense.”.
Podemos cindir a impugnação e sua análise em dois temas, conforme fez a recorrente ao apresentar os meios de prova em que se baseia: a atuação da requerente; a produção de danos.
Ouvida toda a prova produzida, e não só a invocada, para se perceber o contexto da situação, não estando em causa o que cada um disse, mas o que se pode extrair das declarações de todos, devidamente concatenadas, há que tecer as nossas próprias considerações.
O legal representante da requerente, EE, apresentou-se como conhecedor e experiente na questão de gestão de empresas (mestre em Gestão, contabilista certificado, há 25 anos), mas, salvo o devido respeito, nas declarações que prestou tentou inverter toda a lógica que deve presidir à propositura da presente ação. De facto, falou de sinais e evidências, mas imputou à requerida não ter, na sua oposição, demonstrado a solvabilidade, afirmando que os documentos que apresentaram (balancete analítico e balanço individual, reportado a novembro 2024) não dizem nada sobre isso. Os sinais que referiu são o facto do financiamento ter demorado a ser aprovado, os seus termos, o facto de serem pedidas alterações em obra, e não ter sido paga a parte que incumbia à requerida (não abrangida pelo financiamento). Tudo o mais que referiu fê-lo de forma genérica, e muito pouco ou nada clara: o senhorio a bater à porta para receber (?), trabalhadores que não recebiam (de quem?), abandono da obra por parte de trabalhadores, especialidades a abandonar a obra, desânimo, cliente ausente (?), obra a demorar; pareceu querer referir que o empreiteiro abandonou a obra por falta de pagamento, mas mais à frente das suas declarações o que resultou foi que a sua perceção foi que o empreiteiro resolveu o contrato com receio de não vir a receber. Ficou patente que se deu um impasse entre as partes quanto à entrega do que faltava do equipamento, por parte da requerente, e do pagamento que faltava, por parte da requerida, a qual, face a tal, enviou comunicação de resolução do contrato. Disse ainda que os cerca de € 126.000,00 da parte do Banco já haviam recebido e que 80% do estabelecimento estava montado, tendo a requerida recorrida a outros fornecedores para terminar a obra e a montagem do estabelecimento, indo ao mercado (sendo que, acrescentamos nós, aceitaram o contrato). Disse que não sabe se já receberam; e não sabe se há dívidas à Segurança Social, Autoridade Tributária (“pode ter um acordo…”), incumprimento junto do Banco de Portugal…  Remeteu tudo para prova que disse incumbir à requerida. Referiu que a requerente esgotou todas as tentativas de cobrança: por carta, por mail.
FF, legal representante da requerida, explicou o surgimento dos problemas com a requerente, a tentativa de resolver (inclusive a tentativa de pagar com um cheque visado, entregue mediante condições/soluções da parte da requerente, que não foram por esta aceites); e, na ausência de solução, o envio da resolução do contrato.
Especificou que o valor (em causa) a pagar à requerente era devido no final da obra.
Negou comentários ou problemas relativos a faltas de pagamento na obra. Afiançou não dever nada a ninguém. Inclusive, está a cumprir o leasing com o banco, não obstante a falta de entrega do material por parte da requerente. Depois do corte das relações, a requerente levantou material da obra.
Soube do pedido de insolvência por um fornecedor, antes da citação. Dado estar a dias do Natal, isso afetou a produção; havia fornecedores a 30 dias que não entregaram mercadoria (ovos) e, por isso, não produziu o que era devido e não faturou o que era suposto. Tinha um pedido de financiamento em curso, com carta de aprovação, que ficou parado até a resolução desta questão.
GG, da parte da firma que tinha inicialmente a empreitada (e decisor de facto), disse que abdicaram da obra porque não havia dinheiro; disse que o plano de pagamentos não foi cumprido, e que a obra estava parada (por quem e porquê?); mas que a rutura deu-se devido a desentendimento seu com a FF, que os acusou do atraso da obra; reconheceu que trabalhava ao mesmo tempo para os proprietários do prédio; e reconheceu também que, com a rescisão, passou a fatura dos dois meses de trabalho, a qual foi integralmente paga pela requerida.
AA, contabilista da requerida com 37 anos de experiência, reportou-se à situação da requerida com cerca de 5 meses de atividade, explicando e afastando o cenário de insolvência (não há dívidas vencidas em incumprimento, o ativo é superior ao passivo); aliás a requerida até tinha uma situação invulgarmente favorável na fase de laboração em questão. Afiançou, porque presenciou, que a FF tinha um cheque para entregar à requerente para pagar uma vitrine de que precisava para abrir o estabelecimento, e que a requerente não aceitou, face à discussão que entre ambas as partes se gerou. Classificou como inaceitável o pedido de insolvência.
Havia um crédito pedido (para sustentar o aumento do negócio no Natal) que foi travado por causa do pedido de insolvência (aviso, “luz vermelha”, no Banco); os fornecedores também se retraíram (dois que falaram consigo), dado que a questão constou. O fornecimento (de ovos) não foi, por isso, suficiente, tiveram de recorrer a outros que já não conseguiram satisfazer a sua procura, e acabaram por produzir menos.
Esclareceu que, à data em que lhe pediram os elementos juntos aos autos, as contas ainda não estavam feitas e fechadas, de modo a serem aprovadas e publicadas. Não havia forma de saber se a requerida estava em insolvência; a sua situação só se veria posteriormente pela IAS (único registo público).
BB, gestora da conta da requerida à data, explicou o motivo da demora na concessão do financiamento (que nada tinha a ver com a situação da requerida).
Apresentou como facto que o envolvimento bancário é sempre afetado por um pedido de insolvência.
Afirmou o seu desconhecimento pessoal deste pedido de insolvência.
DD, que entrou na obra em substituição da requerente e que acabou a montagem, deu nota de várias retificações que fez, o que dá consistência a razões para a rutura entre as partes no processo. O trabalho que fez estava a ser pago, conforme acordado, até se saber da situação da entrada da insolvência, dados os problemas que isso acarretou para a requerida, nomeadamente na banca e respetivo financiamento (como lhe disse a cliente), e ao nível do nome da requerida (-toda a gente sabe que entrou a insolvência).
CC, administrativa da requerida, depôs sobre o seu (regular) funcionamento. Dado que o pedido de insolvência se reporta a uma data perto (antes) do Natal, e sendo assunto comentado pelos fornecedores, confirmou que um deles apenas forneceu metade da encomenda por ter receio de deixar tudo e não ser pago (dado que os pagamentos eram a 30 ou 60 dias), tendo-se desentendido com a FF; face a isso, tiveram de procurar noutros locais, e ainda assim não produziram o que era suposto. Os funcionários também souberam e ficaram com medo.
HH, que trabalhou na obra após a rutura com o primeiro empreiteiro geral, afastou as considerações feitas pelo representante da requerente no que se refere a comentários de falta de dinheiro ou de falta de pagamentos. Presenciou a tentativa de resolver o problema com a requerente, inclusive fazendo um pagamento por cheque, mas não houve acordo, não tendo a requerente aceite o cheque. Também constatou o levantamento do equipamento, bem como as desconformidades com o descritivo da fatura, e discrepâncias nas medidas.
Tudo devidamente conjugado, e conjugado também com a restante matéria apurada, resulta uma enorme ligeireza na postura do legal representante da requerente, que remete para a requerida o ónus de se defender da acusação de estar insolvente. Sucede que essa ligeireza não é compatível, desde logo, com os conhecimentos de que o legal representante da requerente se arroga. Se numa primeira apreciação poderíamos ser levados a dizer que, pelo menos, alegou factos sem cuidar de averiguar da sua veracidade, cremos que podemos e devemos ir mais longe: era conhecedor do que pressupunha um pedido de insolvência e das suas consequências, e que esse pedido não se bastava com alegações genéricas; ao apresentá-las, isso revela precisamente que de facto sabia que não havia qualquer incumprimento por parte da requerida para com terceiros, e que se averiguasse nada encontraria. O que foi dito por AA quanto à falta de elementos que permitissem uma alegação de estado de insolvência naquela fase, dada a sua formação, era do seu conhecimento. Sabia que a factualidade alegada teria de estar espelhada em algum elemento objetivo, palpável, sustentado, e, não obstante, não conseguiu referir nada de concreto nas suas declarações. Sabia que entre as partes havia uma divergência que estava na base da não liquidação do remanescente, independentemente de quem tinha razão quanto ao motivo da rutura. Foi conhecedor de que a requerida apresentou um cheque visado com vista ao pagamento do valor que estava em causa, mas que por divergências entre as partes não foi entregue. Acabou por referir que o empreiteiro que saiu da obra (uma das dívidas que na p.i. referia genericamente) não o fez por falta de pagamento, mas por receio de não ser pago (e face ao que o próprio esclareceu, nem sequer foi exatamente isso o que aconteceu). Relativamente à outra situação que mencionava na p.i. (reportada a quem lhe sucedeu na obra), foi patente que não era conhecedor de qualquer dívida existente. Os documentos 11 (respeitante à resolução do primeiro contrato de empreitada, já referido supra) e 12, juntos com a oposição, o que atestam é precisamente a ausência de dívidas. O facto de ser acordado um pagamento faseado não significa que previamente houvesse qualquer atraso.
A sua atuação só pôde, por isso, ter como objetivo aquilo que pretendia da requerida: que lhe pagasse o dito valor. E para esse efeito, como é comummente sabido, e, face aos seus conhecimentos, não podia ser ignorado por EE, a via judicial a usar não é o pedido de insolvência.
As condutas que se imputam a EE, com poder de representação da requerente, abarcam qualquer seu representante legal, com poder de decisão; e refletem-se na pessoa coletiva, já que, tratando-se de uma sociedade por quotas, a sua vontade corresponde necessariamente à vontade do órgão a quem a lei reconhece legitimidade para a formar, atuando em seu nome.
Confirma-se, por isso, integralmente o ponto 3.18, com base nos elementos destacados e na conjugação feita, nomeadamente no confronto das declarações de EE com os demais meios de prova, tudo integrado no contexto e nos restantes factos averiguados. É nossa convicção que sabia da falta de veracidade das suas afirmações, que efetivamente se apurou serem falsas.
Não tendo prestado depoimento de parte, sendo a representada parte requerida no incidente em apreço (e não havendo confissão enquanto meio de prova vinculada), nada impede que as suas declarações sejam o suporte de factos que lhe são desfavoráveis, ponderadas como meio de prova livre, e desde que fundamentado o raciocínio probatório. Foi isto que o Tribunal recorrido ponderou.
O referido em 3.20 é um facto constatado nesta ação.
O ponto 3.19, resulta claro face à conjugação das declarações da legal representante da requerida, e dos depoimentos de AA e de CC: isto quanto a concretos efeitos sobre a situação da requerida. Mas também os depoimentos de DD e de BB, apoiados na experiência dos mesmos e que coincide com a experiência comum, confirmam os efeitos de um pedido de insolvência, nomeadamente face à sua publicidade, o que não é de todo afastado pelo facto de BB não ter tido efetivo conhecimento da situação.
Assim sendo, improcede na íntegra a impugnação da matéria de facto, uma vez que não se vislumbra erro de julgamento; antes pelo contrário, os factos impugnados mostram-se sustentados na prova produzida, e a convicção deste Tribunal vai inteiramente ao encontro da formada pelo Tribunal recorrido.
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DECISÃO DE DIREITO.

O pedido introduzido nos autos pela requerida leva-nos para o domínio da responsabilidade civil extracontratual.
De facto, o que resulta do art.º 22º do Decreto-Lei n.º 53/04, de 18 de março e suas sucessivas alterações (CIRE), aqui chamado e base da responsabilidade imputada à requerente, é que “A dedução de pedido infundado de declaração de insolvência, ou a apresentação indevida por parte do devedor, gera responsabilidade pelos prejuízos causados ao devedor ou aos credores, mas apenas em caso de dolo”. Resultam, pois, as seguintes considerações:
.abarca a situação de pedido feito pelo credor contra o devedor e prejuízos decorrentes para o devedor, como é o caso dos autos;
.remete para o instituto da responsabilidade civil extracontratual ou delitual (art.ºs 483º e segs. do Código Civil (C.C.);
.restringe, contudo, a sua aplicação aos casos em que haja dolo, no caso do credor, dolo esse em qualquer das suas modalidades como melhor veremos;
.exige a caracterização da ilicitude que decorre da falta de sustento do pedido de insolvência, ou na dedução de um pedido infundado de declaração de insolvência.
Assim, teremos de averiguar:
- o facto voluntário;
- a ilicitude;
- a imputação do facto ao lesante na modalidade de dolo (por força do referido art.º 22º);
- o dano, patrimonial e/ou não patrimonial;
- o nexo de causalidade entre o facto ilícito e culposo e o dano.

O elemento básico da responsabilidade é o facto do agente, um facto dominável ou controlável pela vontade, um comportamento ou uma forma de conduta humana. Apenas o facto ilícito é suscetível de censura. E o facto é ilícito, nomeadamente, quando se traduz na violação do direito de outrem. Os direitos subjetivos abrangidos são, antes de mais, os direitos absolutos, nomeadamente, os direitos sobre as coisas ou direitos reais, os direitos de personalidade, os direitos familiares e a propriedade intelectual. Mas para que o facto ilícito gere responsabilidade é necessário que o autor tenha agido com culpa, o que significa atuar em termos de a conduta do agente merecer a reprovação ou censura do direito: o lesante, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, podia e devia ter agido de outro modo. Por fim, para haver obrigação de indemnizar é condição essencial que haja dano, que o facto ilícito culposo tenha causado um prejuízo a alguém e ainda que se verifique existir um nexo de causalidade entre o facto e o dano.
Recai sobre o lesado o ónus da prova dos factos constitutivos da obrigação de indemnizar - art.ºs 342º, n.º 1, e 487º do C.C..
Neste instituto prevê-se uma forma de exercício abusivo do direito de ação, estruturalmente semelhante à figura da litigância de má fé, prevista no art.º 542º do C.P.C.; mas é um regime especial relativamente a esta figura, tendo um âmbito de aplicação diverso, desde logo no que respeita ao elemento subjetivo, restringindo a sua aplicação aos casos de dolo do lesante.
Relativamente ao facto voluntário, dúvidas não há que a requerente, mediante decisão tomada por quem para tal tinha legitimidade, intentou a ação de insolvência contra a aqui requerida.
Teremos, então, de averiguar se essa atuação foi ilícita, não se confundindo a ilicitude com o dolo: a ilicitude prende-se com a conduta aferida de forma objetiva; o dolo remete-nos para a imputação subjetiva do facto ao lesante.
E quanto à ilicitude, temos de analisar os fundamentos invocados e verificados para a propositura da ação de insolvência.
Alegava-se na p.i. respetiva factualidade integradora das alíneas a) e b), do art.º 20º, n.º1, do CIRE, e a referência ao art.º 3º, n.ºs 1 e 2.
Note-se que transitou o segmento da sentença que julgou improcedente o pedido de declaração de insolvência, e que a restante factualidade não foi impugnada.
Resultou apurado que:
“3.9. Entendendo, entretanto, a Requerida que a contraprestação da Requerente padecia de irregularidades/deficiências, e após a remessa de diversos e-mails e a realização de diversas reuniões tendo em vista a resolução do diferendo, enviou àquela interpelação, datada de 3 de Abril de 2024, enviada a 8 de Abril de 2024 e recebida a 10 Abril de 2024, nos termos da qual solicitada àquela que, no prazo máximo de 8 dias, procedesse à entrega dos bens objeto do contrato de locação financeira e dos adquiridos diretamente pela requerida ali concretamente id., à restituição dos bens objeto do contrato de locação financeira, propriedade do Banco 1..., S.A., indevida e ilegalmente retirados das instalações da requerida, e à eliminação dos defeitos ali também denunciados.---
3.10. Na referida interpelação, comunicou ainda a Requerida à Requerente que, ultrapassado o prazo ali referido sem que a mesma procedesse à reparação dos defeitos e entregasse os equipamentos em falta, converter-se-ia a mora em incumprimento definitivo, procedendo-se à imediata resolução do contrato que foi celebrado entre as partes.---
3.11. A Requerida não tem proposta contra si qualquer ação de cobrança de dívida ou qualquer ação executiva.---
3.12. A Requerida não tem qualquer incumprimento junto do Banco de Portugal.-
3.13. A Requerida tem a sua situação regularizada perante a Autoridade Tributária e a Segurança Social.---
3.14. A Requerida não tem qualquer dívida emergente de contrato de trabalho, sua violação ou cessação, tendo os salários dos seus trabalhadores em dia.---
3.15. A Requerida, exercendo a sua atividade em espaço comercial arrendado, tem as respetivas rendas em dia, sem qualquer atraso ou incumprimento.---
3.16. A Requerida tem mantido em dia os pagamentos aos respectivos fornecedores.---
3.17. No decurso dos seus 6 meses de atividade, a Requerida apresenta lucro e o seu o ativo é superior ao seu passivo.”
Destes factos constata-se a falta de fundamento do pedido apresentado, tendo-se provado matéria em contrário do alegado. Nomeadamente, a questão da dívida da requerida face à requerente é matéria em litígio; podendo essa situação conferir legitimidade à requerente para propor a ação (cfr. as três posições que se perfilam nesta temática em Marco Carvalho Gonçalves, “Processo de Insolvência e Processos Pré-Insolvenciais”, pág. 189, nota 440), não pode servir de fundamento ao pedido. Significa isto que o credor requer a declaração de insolvência tendo em vista um propósito ilegítimo, que é o de obter, por esta via, a satisfação do seu crédito (por todos, Ac. da Rel. de Évora de 12/01/2023, processo n.º 431/22.5T8ELV.E1); e não se mostra preenchido nenhum dos factos índice previsto no art.º 20º, n.º 1, do CIRE para que se pudesse presumir a situação de insolvência.
Está, por isso, verificada a ilicitude da conduta, a qual resulta da falta de evidência e prova de qualquer dos factos índices previstos. Mas resulta ainda mais: foram alegados factos que se sabia serem falsos.
Relativamente à culpa, face à improcedência da alteração da matéria de facto, ela está plasmada no ponto 3.18 dos factos, e na modalidade de dolo eventual. Nesta matéria existe uma divergência (quase exclusivamente) doutrinal, de que Marco Carvalho Gonçalves dá conta (pág. 235 a 237 da obra citada), no sentido de se pretender abranger também a negligência, quando o requerente é o credor. Contrariando frontalmente essa posição, e por todos, podemos ver o Ac. da Rel. de Coimbra de 19/2/2013, posição que, também a nosso ver, é a que tem sustento legal.  
A requerente sabia que a propositura da ação podia ter repercussões na imagem da requerida, com o que se conformou, e portanto agiu; representou a verificação do resultado na esfera da requerida como consequência possível da sua conduta e atuou, conformando-se com essa verificação; não visando diretamente a violação da norma, soube que ao agir daquela forma tal pode implicar uma inobservância voluntária do elemento comportamental que o sentido da norma pretende induzir na generalidade das pessoas.
O seu propósito está claramente desviado do fim visado pelo desencadear do processo concursal que caracteriza a insolvência. De facto, tendo ao seu dispor a tutela declarativa normal para atingir o fim visado, a requerente optou pelo desvio que implicou a opção pelo pedido de insolvência, aceitando as consequências que daí resultariam para a requerida.
Com essa conduta, provocou de facto consequências, tal como vem enunciado nos pontos 319 e 3.20, matéria também pretendida alterar pela recorrente, mas sem sucesso.
A requerida alegou e provou danos sobre o seu nome, imagem e credibilidade comercial, bem como prejuízos decorrentes de gastos e tempo perdido com a ação.
Os mesmos decorrem como consequência adequada da conduta ilícita e dolosa da requerente, demonstrado por isso que está o nexo de causalidade adequada –artº. 563º do C.C..
Alegou, por isso, danos não patrimoniais e patrimoniais.
O dano patrimonial é o reflexo do dano real sobre a situação patrimonial do lesado. Mede-se pela diferença entre a situação real atual do lesado e a situação (hipotética) em que ele se encontraria se não fosse a lesão.
O dano não patrimonial é o prejuízo insuscetível de avaliação pecuniária.
O prejuízo da credibilidade ou imagem comercial da requerida merece relevância jurídica em sede de dano não patrimonial, tal como resulta apurado no ponto 3.19, que a recorrente não viu alterado como pretendia; ou seja, o dano apurado é relevante, merecedor da tutela do direito, nos termos do art.º 496º do C.C.. No giro comercial é importante a segurança e a credibilidade que a empresa sugere.
Em matéria extracontratual (tal como vem sendo entendido na contratual) são ressarcíveis em ambas as modalidades –cfr. art.º 496º do C.C..
Começando pelos patrimoniais, provado o dano conforme resulta do ponto 3.20, não se provou o valor alegado como custos decorrente da necessidade de defesa.
Voltaremos a esta matéria mais à frente.
Relativamente aos danos não patrimoniais, discute-se a sua ressarcibilidade quando o ofendido é uma sociedade comercial e não haja reflexo direto no seu património.
A resposta positiva encontra fundamento desde logo no art.º 12º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa. A tutela dos direitos de personalidade no nosso Código Civil está vocacionada para as pessoas singulares (Capítulo I), restringindo o art.º 160º do mesmo (Capítulo II) a capacidade das pessoas coletivas aos direitos e obrigações necessários ou convenientes à prossecução dos seus fins, e excetuando os direitos e obrigações vedados por lei ou que sejam inseparáveis da personalidade singular. No entanto, no âmbito da responsabilidade civil, o art.º 484º determina a proteção do crédito ou do bom nome de qualquer pessoa singular ou coletiva, impondo ao violador a responsabilidade pelos danos causados, sem que distinga entre estes. Na mesma linha temos o art.º 187º do Código Penal.
É no sentido da tutela a orientação do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.
Por tudo isso, entendemos que as pessoas coletivas são sujeitos ativos de direitos de personalidade ou estruturalmente idênticos, como é o caso do direito ao nome, ao bom nome, à honra, ao crédito, à consideração social, não obstante os casos em que o seu escopo é o lucro; por isso, violados que sejam, a sua compensação é viável, independentemente da diminuição do lucro, desde que a violação se traduza numa maior dificuldade de relacionamento com fornecedores, clientes, concorrentes ou parceiros, banca, e desde que não haja sobreposição com perdas patrimoniais diretas (ou seja, dupla valoração do mesmo dano).
Em suma, foi o que se verificou no caso e resulta daquele ponto 3.19. Porém provado o dano, não se encontrou o valor a ressarcir.
A recorrente pretendeu obter a falta de prova dos danos. Não discutiu propriamente, provados os mesmos, a ulterior liquidação do seu valor.
Se quanto aos danos patrimoniais o modo de proceder pode ter-se por correto - provando-se os danos, mas não a sua quantificação, prevendo-se a mesma ainda possível, relega-se para outra ação/incidente essa matéria, sem prejuízo de, se a quantificação se gorar, o recurso à equidade ser o último meio de encontrar o valor -, quanto aos danos não patrimoniais o montante que visa o seu ressarcimento é necessariamente encontrado, face à sua natureza, com recurso a um juízo equitativo (art.º 496º, n.º 4, do C.C.).
Sucede que, como vimos, a recorrente não apresenta a questão da posterior liquidação como objeto do recurso, e a recorrida não se insurgiu relativamente à decisão, pelo este Tribunal tem de manter a decisão tal como ela foi proferida, restando o recurso ao incidente de liquidação previsto nos art.ºs 358º e segs. do C.P.C. para a determinação do quantum indemnizatório em ambas as modalidades.
Deve, portanto, ser considerado improcedente o recurso.
*
As custas são a cargo da parte vencida, no caso a recorrente –art.º 527º, n.ºs 1 e 2, C.P.C..
***
V DISPOSITIVO.

Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação em julgar o recurso totalmente improcedente, e em consequência, negam provimento à apelação, mantendo na íntegra a sentença recorrida.
*
Custas a cargo da recorrente (artº. 527º, nºs. 1 e 2, do C.P.C.).
*
Guimarães, 24 de abril de 2025.
*
Os Juízes Desembargadores
Relatora: Lígia Paula Ferreira Sousa Santos Venade
1ª Adjunta: Rosália Cunha
2ª Adjunta: Maria João Marques Pinto de Matos
(A presente peça processual tem assinaturas eletrónicas)