Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
3081/21.0T8BCL.G1
Relator: FERNANDA PROENÇA FERNANDES
Descritores: ARGUIÇÃO DE NULIDADES PROCESSUAIS
RECURSO
RECLAMAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/22/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 3.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Se há um despacho que pressuponha o ato viciado, o meio próprio para reagir contra a ilegalidade cometida, não é a arguição ou reclamação por nulidade, mas a impugnação do respetivo despacho pela interposição do competente recurso.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório.

Nos presentes autos de processo de inventário, foi proferida a 12.06.2024, seguinte decisão:

“1. AA requereu o presente INVENTÁRIO para partilha dos bens do ex-casal que constituía com BB.
Requerente e Requerido foram casados entre si segundo o regime da comunhão de adquiridos. - Doc. 1.
O casamento foi dissolvido por divórcio decretado por decisão proferida a 06 de Fevereiro de 2019, pelo CC, Notário no âmbito do Processo de Divórcio transitada em julgado - Doc. 1. 3.
O Requerido foi nomeado para exercer as funções de cabeça-de-casal, por ser o cônjuge mais velho, nos termos do disposto no artigo 1133º, nº 2, do Código de Processo Civil.
Citado nessa qualidade, nos termos e para os efeitos previstos no art.º 1102.º do CPC (Lei n.º 117/2019, de 13 de setembro), junto compromisso de honra.
Apresentou a seguinte Relação de Bens:
VERBA n.º 1
IMÓVEL - Prédio rústico denominado ... composto por lavradio situado no lugar de ..., União das Freguesias ..., concelho ... inscrito na respectiva matriz sob o artigo ...55 (artigo ...66 da extinta freguesia ...) e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...72/..., com o valor de € 78,20.
*
Notificada da RB (Relação de Bens) a interessada apresentou reclamação, alegando que esta é omissa no que tange a uma conta bancária de que o ex-casal era titular em território francês, junto do Banco 1...” com o nº ...22, com o saldo credor de 72.446,85 €, quantia essa que o cabeça de casal fez sua.
Requer, então, seja notificado o Banco 1.../SEG/SAT/SRC, ...86 ..., ..., a fim de prestar informações sobre os valores depositados na referida conta bancária à data do divórcio decretado em ../../2019.
Acusa a omissão da referida quantia em dinheiro de 72.446,85 €, depositada na conta com o número ...22.
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Na resposta à reclamação ao cabeça-de-casal alega que, “aquando da decretação do divórcio por mútuo consentimento, em ../../2019, foi celebrado em ..., um acordo que se junta sob o documento nº 1, assinado não só pelas partes mas também pelos respectivos mandatários.
Conforme vem aí declarado, a assinatura do mesmo foi precedida de um período de reflexão de 15 dias («Les parties sont parvenues à un accord complet objet de la presente convention pour laquelle ils ont disposé d’un delai de quinze jours de réfléxion aujourd’hui écoulé»).
Tal acordo foi depositado nesse mesmo dia, no Cartório do Notário ... em ... em ... passando a produzir efeitos como se de uma escritura se tratasse («Em application des dispositions des articles 229, 229-1 et 229-3 du Code Civil, les époux déclarent expressément qu’ils ont consenti mutuellement à leur divorce, et qu’ils se sont entendus sur la rupture de leur mariage et de ses effets dans les termes de la presente convention prenant forme d’un acte sous signature privée contresigné par avocats et déposé au rang des minutes d’un notaire»).
Nesse acordo, os interessados declararam serem titulares apenas e somente de uma conta bancária em comum em vias de encerramento («les époux disposent d’un compte commun en cours de désolidarisation»).
No que concerne aos efeitos patrimoniais do casamento, declararam ambos os interessados, não haver pagamento de tornas tendo ambos, expressamente, renunciado a toda e qualquer reclamação a esse título atribuíndo força executiva, ao referido documento («les époux déclarent n’y avoir lieu à liquidation de leur regime matrimonial, et donc n’y avoir lieu à aucun partage. Ils déclarent avoir parfaitement compris qu’une liquidation est le chiffrage de sommes qu’ils pourraient se devoir du fait de la vie commune (récompenses, créances entre époux, comptes d’administrations). Cependant, par la présente, cette information ayant été donnée par les avocats et bien comprises par les époux, ces derniers persistent et déclarent qu’il n’y a lieu à aucune liquidation, renonçant ainsi expressément à toute réclamation à ce titre une fois que la présente convention sera dotée de la force exécutoire, tel que rappele ci-dessus »).
Ora, para além da conta conjunta, cada um dos interessados tinha uma conta bancária em nome de cada um tendo ambos decidido não as relacionar.
Ao renunciar no aludido acordo, a qualquer reclamação bem como ao pagamento de tornas, não pode agora a reclamante ver integradas na relação de bens, quer a sua conta bancária quer a conta do aqui cabeça-de-casal.»
*
Por se tratar de documento redigido em língua estrangeira foi ordenada a sua tradução, nos termos do art.º 134º do CPC.
Junta a tradução do referido documento a interessada impugnou o seu teor.
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Designada data para a realização duma Audiência Prévia, prevista no art.º 1109.º do CPC, o cabeça-de-casal invocou a incompetência internacional deste Tribunal para conhecer da titularidade e do reconhecimento como bem comum do casal, da conta bancária indicada na reclamação, por não se verificarem os requisitos impostos pelo art.º 62.º do CPC, tendo em conta que esta conta é de um banco situado em ..., denominado “Banco 1...”.».
Após cumprido o contraditório o Tribunal julgou improcedente a invocada excepção, com os fundamentos que infra transcrevemos:
«O processo de inventário destina-se a distribuir equitativamente todo o património de uma herança ou de um património comum em consequência, como é o caso, de divórcio (arts. 1788º e 1689º do Código Civil). Tem por escopo pôr termo a uma comunhão que engloba todos os bens que dela fazem parte, independentemente do local onde se situem.
Devem ser partilhados todos os bens existentes no casal ao tempo em que a sentença transitada tenha posto termo ao casamento. Verificando-se a competência dos tribunais portugueses de acordo com as regras processuais, devem ser relacionados e partilhados, independentemente da sua situação, todos os bens objecto de comunhão. [vide Lopes Cardoso, nas “Partilhas Judiciais”, vol. I, 3ª edição, pág. 435 e segs, particularmente pág. 446, e Luís Lima Pinheiro, Direito Internacional Privado, vol. III, 2012 - 2ª ed. Refundida, págs. 283/284.].
Conforme dispõe o art.º 62.º do Código de Processo Civil (CPC) “Os tribunais portugueses são internacionalmente competentes: a) Quando a ação possa ser proposta em tribunal português segundo as regras de competência territorial estabelecidas na lei portuguesa; b) Ter sido praticado em território português o facto que serve de causa de pedir na ação, ou algum dos factos que a integram; c) Quando o direito invocado não possa tornar-se efetivo senão por meio de ação proposta em território português ou se verifique para o autor dificuldade apreciável na propositura da ação no estrangeiro, desde que entre o objeto do litígio e a ordem jurídica portuguesa haja um elemento ponderoso de conexão, pessoal ou real.
Ora, in casu, segundo os elementos de conexão referidos a possibilidade de instauração da acção nos tribunais portugueses pode encontrar fundamento no princípio da coincidência (al. a) do nº 1), ou seja, quando a acção também possa ser proposta em território português “segundo as regras da competência territorial estabelecidas na lei portuguesa”.
O presente inventário para partilha de bens é decorrente do processo de divórcio que correu em Portugal logo verifica-se a competência dos Tribunais Portugueses.
Decisão:
Pelo exposto, improcede a invocada exceção de incompetência internacional.»
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Inconformado, o cabeça de casal interpôs recurso de apelação, defendendo que os tribunais portugueses não são competentes para a partilha do imóvel situado em Portugal nem para a partilha de quaisquer outros bens designadamente contas bancárias francesas uma vez que foi decretado o divórcio em ..., tendo o despacho recorrido violado as disposições dos artigos 62 b), 96, 97 nº 1 e 99 nº 1, do Cód. Processo Civil.
Por douto acórdão, proferida pelo Venerando Tribunal da Relação de Guimarães, foi a apelação julgada improcedente e confirmada a decisão recorrida.
Inconformado, o cabeça de casal interpôs recurso de revista, nos termos dos artigos 671 nº 1 e 629 nº 2 a), do CPCivil, junto do Colendo Supremo Tribunal de Justiça.
Por douto acórdão do Supremo Tribunal de Justiça foi negada a revista e confirmada a decisão recorrida.
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Não obstante, o cabeça-de-casal veio invocar a nulidade do despacho que ordenou a notificação da instituição bancária francesa a fim de fornecer as informações anteriormente solicitadas.
Alega, para tanto, que «Prevê o artigo 255 do Cód. Proc. Civil que as notificações entre os mandatários presumem-se feitas “no terceiro dia posterior ao do seu envio, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando não o seja”. Atento o disposto no nº 1 do artigo 137 do referido diploma legal, “não se praticam atos processuais nos dias em que os tribunais estiverem encerrados, nem durante as férias judiciais”. E, o nº 2 do artigo 138 que “quando o prazo para a prática do ato processual terminar em dia em que os tribunais estiverem encerrados, transfere-se o seu termo para o 1.º dia útil seguinte”. As ferias judiciais iniciaram-se no dia 22 de dezembro de 2023 e terminaram no dia 3 de janeiro de 2024 (inclusive). Estabelece o nº 3 do artigo 3 do Cód. Proc. Civil que “o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo do processo de todo o processo, o principio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem”.
O nº 1 do artigo 149 do Cód. Proc. Civil fixa em 10 dias, “o prazo para a parte responder ao que for deduzido pela parte contrária”. Prevendo o nº 2 que “o prazo para qualquer resposta conta-se sempre da notificação do ato a que se responde”. O prazo de 10 dias concedido ao aqui cabeça de casal para se pronunciar sobre o pedido formulado pela requerente terminava, assim, no dia 15 de janeiro de 2024. Ao pretender exercer nesse dia, o seu direito do contraditório pôde verificar que no dia 11 de janeiro de 2024, ou seja, antes de ter decorrido o prazo para o exercício do contraditório, foi proferido despacho a ordenar “a notificação da instituição bancária francesa para prestar as informações já anteriormente solicitadas”. Este douto despacho violou o principio do contraditório previsto no nº 3 do artigo 3 do Cód. Proc. Civil por não ter sido concedido ao aqui cabeça de casal, a possibilidade de se pronunciar. Além disso, O despacho datado de 11 de janeiro de 2024 não foi notificado às partes conforme o exige o nº 1 do artigo 248 do Cód. Proc. Civil. Assim, Além de ter sido violado o principio do contraditório, não foi cumprida a formalidade estabelecida no referido nº 1 do artigo 248. Em face do exposto, requer, a V.Exa, a nulidade do despacho proferido no dia 11 de janeiro de 2024 e de todos os actos subsequentes
A interessada pronunciou-se a fls. 126 e ss.
Cumpre apreciar
Atento o decidido pelo Colendo STJ é, por demais, evidente que o alegado pelo cabeça de casal carece de qualquer fundamento, pois a decisão prolatada por este Tribunal encontra respaldo nos doutos Acórdãos que o confirmaram, não carecendo do contraditório cuja omissão é invocada.
Por tal, improcede in totum a invocada nulidade.
Notifique.
*
Após, oficie à instituição bancária solicitado a referida informação, no prazo de 10 dias”.
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Inconformado com esta decisão, dela interpôs recurso o cabeça de casal, que a terminar as respetivas alegações, formulou as seguintes conclusões, que se transcrevem:
[…].
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Contra-alegou a interessada AA, terminando com as seguintes conclusões:
[…]
*
O recurso foi admitido, já neste Tribunal (após reclamação do apelante) como de apelação, a subir imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. Objecto do recurso.             

Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações dos recorrentes – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do CPC –, ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal consistem em saber se foram violados o princípio do contraditório previsto no nº 3 do art. 3 do CPC, o nº 1 do art. 248 do CPC, e se já deveria ter sido dado cumprimento ao disposto no nº 3 do art. 1105º e à alínea a) do nº 1 do art. 1110º, ambos do CPC.
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III. Fundamentação de facto.

Os factos relevantes para a decisão a proferir, constam do relatório supra.
Da consulta dos autos, há ainda a considerar o seguinte:
- A relação de bens foi apresentada pelo cabeça de casal a 01 de fevereiro de 2022;
- A 02 de março de 2022, a interessada AA, apresentou a seguinte reclamação:
“AA, requerente nos autos acima em referência e aí melhor identificada, notificada da relação de bens apresentada pelo cabeça de casal, vem da mesma apresentar reclamação, nos termos e com os fundamentos seguintes:
1. A relação de bens apresentada pelo cabeça de casal não corresponde à verdade, pois omite bens que são do casal e como tal fazem parte do acervo de bens a dividir.
2. Assim, estranha-se que o cabeça de casal não tenha relacionado qualquer conta bancária, designadamente a conta bancária de que o ex-casal era titular em território francês.
3. Pelo que, o Ex-casal era titular de uma conta particular junto do Banco 1...” com o nº ...22, com o saldo credor de 72.446,85 €, quantia essa que o cabeça de casal fez sua. – Doc. nº 1.
4. Ora, esse valor é um bem comum do casal que carece de ser relacionado e partilhado nos presentes autos.
5. Em conformidade com o supra exposto e, tendo em consideração que o cabeça de casal omitiu deliberadamente a referida conta bancária, requer que seja notificado o Banco 1.../SEG/SAT/SRC, ...86 ..., ..., a fim de prestar informações sobre os valores depositados na referida conta bancária à data do divórcio decretado em ../../2019.
6. Assim, falta ainda relacionar a referida quantia em dinheiro de 72.446,85 €, depositada na conta com o número ...22.
Nestes termos e nos mais de Direito,
A. Requer a V. Exa. se digne admitir a presente reclamação contra a relação de bens apresentada e ordenar a notificação do cabeça de casal para relacionar o bem em falta (quantia em dinheiro) aqui acusado e proceder à retificação da relação em conformidade com o supra exposto ou dizer o se lhe oferecer.
B. Mais requer a V. Exa. se digne oficiar junto da entidade bancária supra identificada para vir aos autos prestar as informações peticionadas.
Meios de Prova:
A. Requer-se as declarações de parte da aqui Requerente a toda a matéria da presente reclamação.
B. Testemunhal: requer a inquirição das seguintes testemunhas, a apresentar:
DD.
EE”.
- A 07 de março de 2022, foi proferido o seguinte despacho:
“Cumpra o disposto no art.º 1105.º do Código de Processo Civil (CPC) devendo o cabeça de casal pronunciar-se quanto à requerida solicitação de elementos junto da referida instituição bancária”.
- A 19 de abril de 2022, respondeu o cabeça de casal, nos seguintes termos:
“BB, cabeça-de-casal nos autos de inventário, notificado da reclamação apresentada pela interessada AA, vem, nos termos do nº 1 do artigo 1105 do Cód. Proc. Civil, expor e requerer, a V.Exa, o seguinte:
Aquando da decretação do divórcio por mútuo consentimento, em ../../2019, foi celebrado em ..., um acordo que se junta sob o documento nº 1, assinado não só pelas partes mas também pelos respectivos mandatários. Conforme vem aí declarado, a assinatura do mesmo foi precedida de um período de reflexão de 15 dias («Les parties sont parvenues à un accord complet objet de la presente convention pour laquelle ils ont disposé d’un delai de quinze jours de réfléxion aujourd’hui écoulé»).
Tal acordo foi depositado nesse mesmo dia, no Cartório do Notário ... em ... em ... passando a produzir efeitos como se de uma escritura se tratasse («Em application des dispositions des articles 229, 229-1 et 229-3 du Code Civil, les époux déclarent expressément qu’ils ont consenti mutuellement à leur divorce, et qu’ils se sont entendus sur la rupture de leur mariage et de ses effets dans les termes de la présente convention prenant forme d’un acte sous signature privée contresigné par avocats et déposé au rang des minutes d’un notaire»).
Nesse acordo, os interessados declararam serem titulares apenas e somente de uma conta bancária em comum em vias de encerramento («les époux disposent d’un compte commun en cours de désolidarisation»).
No que concerne aos efeitos patrimoniais do casamento, declararam ambos os interessados, não haver pagamento de tornas tendo ambos, expressamente, renunciado a toda e qualquer reclamação a esse título atribuíndo força executiva, ao referido documento («les époux déclarent n’y avoir lieu à liquidation de leur regime matrimonial, et donc n’y avoir lieu à aucun partage. Ils déclarent avoir parfaitement compris qu’une liquidation est le chiffrage de sommes qu’ils pourraient se devoir du fait de la vie commune (récompenses, créances entre époux, comptes d’administrations).
Cependant, par la présente, cette information ayant été donnée par les avocats et bien comprises par les époux, ces derniers persistent et déclarent qu’il n’y a lieu à aucune liquidation, renonçant ainsi expressément à toute réclamation à ce titre une fois que la présente convention sera dotée de la force exécutoire, tel que rappele ci-dessus »).
Ora,
Para além da conta conjunta, cada um dos interessados tinha uma conta bancária em nome de cada um tendo ambos decidido não as relacionar.
Consequentemente,
Ao renunciar no aludido acordo, a qualquer reclamação bem como ao pagamento de tornas, não pode agora a reclamante ver integradas na relação de bens, quer a sua conta bancária quer a conta do aqui cabeça-de-casal.

TERMOS em que, para os devidos efeitos, requer a V.Exa, a junção da presente resposta e, consequentemente, o indeferimento da reclamação apresentada pela interessada AA.

PROVA
I – DECLARAÇÕES DE PARTE do aqui cabeça-de-casal, a toda a matéria da presente resposta”.
- Após tradução dos documentos juntos pelo cabeça de casal, foi a 7 de julho de 2022 proferido o seguinte despacho:
“Para realização de uma Audiência Prévia nos termos e para os efeitos previstos no art.º 1109.º do Código de Processo Civil (CPC) designo o dia 29-09-2022, pelas 14h00m.
Caso não seja obtido acordo, desde já se designa o mesmo dia e hora para inquirição das testemunhas arroladas.
Notifique e DN”.
- Na audiência prévia ambas as partes prescindiram da produção da prova testemunhal, bem como por declarações de parte e o cabeça-de-casal invocou a incompetência internacional do Tribunal para conhecer da titularidade e do reconhecimento como bem comum do casal, da conta bancária indicada na reclamação, por não se verificarem os requisitos impostos pelo art.º 62.º do CPC, tendo em conta que esta conta é de um banco situado em ..., denominado “Banco 1...”.
- Após cumprido o contraditório o Tribunal julgou improcedente a invocada exceção, por decisão de 29 de março de 2023, com o seguinte dispositivo:
“Decisão:
Pelo exposto, improcede a invocada exceção de incompetência internacional. 
Custas do incidente a suportar pelo cabeça-de-casal, fixando-se a taxa de justiça no mínimo legal.
Notifique. 
Após, oficie à instituição bancária solicitando a referida informação”.
- Desta decisão, interpôs o cabeça de casal recurso, tendo a decisão em causa sido confirmada, quer por este Tribunal da Relação, quer pelo STJ.
- Notificados de tais decisões, veio a interessada AA requerer o prosseguimento dos autos, a 22.12.2023, nomeadamente com a já requerida e deferida notificação da instituição bancária francesa para prestar as informações solicitadas.
- Por despacho de 11.01.2024, foi determinada tal notificação, nos seguintes termos:
“Atento o teor do douto acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Guimarães proferido em 10/07/2023 (Ref. ...71) e do douto acórdão do Colendo Supremo Tribunal de Justiça proferido em 30/11/2023 (Ref. ...64), determino a notificação da instituição bancária francesa para prestar as informações já anteriormente solicitadas”.
- A 25.01.2024, veio o cabeça de casal apresentar o seguinte requerimento:
“BB, cabeça-de-casal nos autos de inventário à margem referenciados, vem arguir
NULIDADE do douto despacho proferido no 11 de janeiro de 2024
Com os seguintes fundamentos:
1. No dia 22 de dezembro de 2023, a requerente AA veio requerer o “prosseguimento dos autos, designadamente ordenando-se a notificação da instituição bancária francesa para prestar as informações já anteriormente solicitadas”.
2. Prevê o artigo 255 do Cód. Proc. Civil que as notificações entre os mandatários presumem-se feitas “no terceiro dia posterior ao do seu envio, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando não o seja”.
3. Atento o disposto no nº 1 do artigo 137 do referido diploma legal, “não se praticam atos processuais nos dias em que os tribunais estiverem encerrados, nem durante as férias judiciais”.
E,
4. O nº 2 do artigo 138 que “quando o prazo para a prática do ato processual terminar em dia em que os tribunais estiverem encerrados, transfere-se o seu termo para o 1.º dia útil seguinte”.
5. As ferias judiciais iniciaram-se no dia 22 de dezembro de 2023 e terminaram no dia 3 de janeiro de 2024 (inclusive).
6. Estabelece o nº 3 do artigo 3 do Cód. Proc. Civil que “o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo do processo de todo o processo, o principio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem”.
7. O nº 1 do artigo 149 do Cód. Proc. Civil fixa em 10 dias, “o prazo para a parte responder ao que for deduzido pela parte contrária”.
8. Prevendo o nº 2 que “o prazo para qualquer resposta conta-se sempre da notificação do ato a que se responde”.
9. O prazo de 10 dias concedido ao aqui cabeça de casal para se pronunciar sobre o pedido formulado pela requerente terminava, assim, no dia 15 de janeiro de 2024.
10. Ao pretender exercer nesse dia, o seu direito do contraditório pôde verificar que no dia 11 de janeiro de 2024, ou seja, antes de ter decorrido o prazo para o exercício do contraditório, foi proferido despacho a ordenar “a notificação da instituição bancária francesa para prestar as informações já anteriormente solicitadas”.
11. Este douto despacho violou o principio do contraditório previsto no nº 3 do artigo 3 do Cód. Proc. Civil por não ter sido concedido ao aqui cabeça de casal, a possibilidade de se pronunciar.
Além disso,
12. O despacho datado de 11 de janeiro de 2024 não foi notificado às partes conforme o exige o nº 1 do artigo 248 do Cód. Proc. Civil.
Assim,
13. Além de ter sido violado o principio do contraditório, não foi cumprida a formalidade estabelecida no referido nº 1 do artigo 248.
Em face do exposto, requer, a V.Exa, a nulidade do despacho proferido no dia 11 de janeiro de 2024 e de todos os actos subsequentes”.

- A interessada AA, respondeu, nos seguintes termos:
 “AA, requerente nos autos acima em referência a e aí melhor identificada, notificada do requerimento apresentado pelo cabeça de casal (refª. citius 47780660 de 25/01/2024), vem, pronunciar-se nos seguintes termos:
1. Salvo sempre o devido respeito, não assiste qualquer razão ao cabeça de casal na arguida nulidade do douto despacho proferido em 11/01/2024.
2. Na verdade, tal despacho apenas vem confirmar o já doutamente determinado anteriormente, como aliás resulta do douto despacho.
3. Ora, já em 29/03/2023 (refª.: ...71) o douto Tribunal tinha determinado o seguinte: “oficie à instituição bancária solicitado a referida informação”.
4. Tal informação só ainda não tinha sido solicitada pelo Tribunal à referida instituição bancária em virtude dos sucessivos e variados recursos interpostos pelo cabeça de casal aos quais foi atribuído efeito suspensivo.
Assim, e salvo o devido respeito, tal despacho não enferma de qualquer nulidade, devendo os autos prosseguir conforme o doutamente determinado nos referidos despachos de 29/03/2023 e de 11/01/2024”.
- A 09 de fevereiro de 2024, apresentou o cabeça de casal, novo requerimento, com o seguinte teor:
“BB, cabeça-de-casal nos autos de inventário à margem referenciados, notificado do requerimento da requerente, vem expor e requerer, a V.Exa, o seguinte:
1. Após ter sido citado do requerimento de inventário, o aqui cabeça de casal apresentou em 1 de fevereiro de 2022, a relação de bens, a declaração de compromisso, a caderneta e a descrição predial.
2. Em 2 de março de 2022, a requerente reclamou a conta bancária no valor de € 72.446,85 e pediu que fosse ordenado ao cabeça de casal para relacionar o bem em falta requerendo ainda “se digne oficiar junto da entidade bancária supra identificada para vir aos autos prestar as informações peticionadas” e indicou meios de prova designadamente declarações de parte e testemunhas.
3. Notificado da reclamação, o cabeça de casal veio responder tendo junto o acordo celebrado em ... no dia ../../2019 aquando da decretação do divórcio por mútuo consentimento e alegado que para além da conta conjunta, cada um tinha a sua conta bancária tendo ambos acordado não as relacionar, ao renunciar no aludido acordo, a qualquer reclamação bem como ao pagamento de tornas, a requerente não pode ver agora integradas na relação de bens, quer a sua conta bancária quer a conta do aqui cabeça de casal. Requereu, consequentemente, o indeferimento da reclamação e indicado como meio de prova, a prestação de declarações de parte.
4. A requerente veio requerer em 27 de abril de 2022, a tradução do aludido documento que veio a ser junto pelo cabeça de casal em 1 de junho de 2022.
5. Por despacho proferido no dia 7 de julho de 2022, foi agendada a audiência prévia para os efeitos previstos no art. 1109 do Cód. Proc. Civil, para o dia 29.09.2022 pela 14H com a advertência que “caso não seja obtido acordo, desde já se designa o mesmo dia e hora para inquirição das testemunhas arroladas”..
6. No dia da audiência prévia, as partes prescindiram da produção de prova testemunhal bem como das declarações de parte.
7. Constando da acta de que “O cabeça de casal, para além do que foi dito na resposta à reclamação, invoca a incompetência internacional deste Tribunal para conhecer da titularidade e do reconhecimento como bem comum do casal, da conta bancária indicada na reclamação, por não se verificarem os requisitos impostos pelo art.º 62.º do CPC tendo em conta que esta conta bancária é de um banco situado em ..., denominado “Banco 1...”. Assim sendo, o bem indicado, além de não ser um bem comum, não pode ser objecto de uma partilha num tribunal português”.
8. Por despacho de 29 de março de 2023 foi considerada improcedente a excepção de incompetência internacional.
9. O cabeça de casal interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães e posteriormente para o STJ tendo este tribunal por acórdão proferido no dia 30 de novembro de 2023 negado a revista e confirmado a decisão da 1ª instância dando como sumário que “I – Os tribunais portugueses são internacionalmente competentes para tramitar processo de inventário em consequência de divórcio de cidadão nacionais, que embora decretado por notário em ..., respeita a, pelo menos, um imóvel sito em Portugal, residindo em Portugal a requerente; II – O princípio da unidade e universalidade da partilha impõe que todos os bens devam ser incluídos na mesma, quer estejam situados em território nacional, quer no estrangeiro”.
10. Na resposta à reclamação, o cabeça de casal arguiu duas excepções sendo estas:
a) a excepção dilatória de caso julgado arguida na resposta datada de 29 de abril de 2022 por terem sido partilhados todos os bens que detinham em ... inclusive as contas bancárias quer individuais quer conjuntas, no acordo celebrado aquando da decretação do divórcio por mútuo consentimento e depositado no mesmo dia, ou seja, ../../2019, no Cartório do Notário ... em ... em ... passando o mesmo, a produzir efeitos como se de uma escritura de partilha se tratasse.
b) a excepção dilatória da incompetência internacional arguida na audiência prévia realizada em 29 de setembro de 2022.
11. Estabelece a alínea a) do nº 1 do artigo 1110 do Cód. Proc. Civil que “depois de realizadas as diligências instrutórias necessárias, o juiz profere despacho de saneamento do processo em que resolve todas as questões suscetíveis de influir na partilha e na determinação dos bens a partilhar”.
12. Neste caso concreto, as partes prescindiram da produção de prova tendo o despacho proferido em 29 de março de 2023 recaído apenas e somente sobre a excepção da incompetência internacional.
13. O tribunal não deu, assim, cumprimento integral à referida disposição legal.
Pois, até à presente data,
14. Não houve despacho de pronúncia sobre a excepção de caso julgado arguida pelo cabeça de casal.
15. Não foi julgada procedente nem improcedente a reclamação da requerente.
16. Não foi determinado quais os bens a partilhar.
Ou seja,
17. Não foram resolvidas todas as questões susceptíveis de influir na partilha e na determinação dos bens a partilhar.
18. Estamos, assim, perante uma omissão de pronúncia que o cabeça de casal pretendia suscitar na resposta ao pedido formulado pela requerente cujo prazo terminava no dia 15 de janeiro de 2024.
19. Ao pretender exercer nesse dia, o seu direito do contraditório pôde verificar que no dia 11 de janeiro de 2024, ou seja, antes de ter decorrido o prazo para o exercício do contraditório, foi proferido despacho a ordenar “a notificação da instituição bancária francesa para prestar as informações já anteriormente solicitadas”.
Assim,
20. O douto despacho datado de 11 de janeiro de 2024 violou não só o principio do contraditório previsto no nº 3 do artigo 3 do Cód. Proc. Civil como não cumpriu o estabelecido na alínea a) do nº 1 do artigo 1110 do Cód. Proc. Civil a acrescer ainda, a falta de notificação às partes conforme o exige o nº 1 do artigo 248 do Cód. Proc. Civil.
Em face do exposto, requer, a V.Exa, a nulidade do despacho proferido no dia 11 de janeiro de 2024 e de todos os actos subsequentes e o cumprimento do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 1110 do Cód. Proc. Civil”.
- A tal requerimento respondeu a interessada AA, nos seguintes termos:
“AA, requerente nos autos acima em referência a e aí melhor identificada, notificada do requerimento apresentado pelo cabeça de casal (refª. citius 47928801 de 08/02/2024), vem, pronunciar-se nos seguintes termos:
1. Salvo sempre o devido respeito, o requerimento agora apresentado eplo cabeça de casal reproduz parcialmente, e tem o mesmo objeto, o requerimento apresentado em 25/01/2024, com a refª. citius 47780660,
2. além de que, em ambos os requerimentos é peticionado o mesmo: nulidade do despacho de 11/01/2024.
3. Em ambos os requerimentos não assiste qualquer razão ao cabeça de casal na arguida nulidade do douto despacho proferido em 11/01/2024.
4. Na verdade, tal despacho apenas vem confirmar o já doutamente determinado anteriormente, como aliás resulta do douto despacho.
5. Ora, já em 29/03/2023 (refª.: ...71) o douto Tribunal tinha determinado o seguinte: “oficie à instituição bancária solicitado a referida informação”.
6. Tal informação só ainda não tinha sido solicitada pelo Tribunal à referida instituição bancária em virtude dos sucessivos e variados recursos interpostos pelo cabeça de casal aos quais foi atribuído efeito suspensivo.
7. Acresce que, o objeto dos presentes autos de inventário está devidamente delimitado por doutos despachos já transitados em julgado.
8. Todas as questões levantadas no requerimento a que se responde estão definitivamente decididas por doutos despachos devidamente transitados em julgado,
9. sendo que, os bens que fazem parte do acervo patrimonial a dividir estão perfeitamente identificados e assentes: o prédio rústico e a conta bancária junto do Banco 1....
Assim, e salvo o devido respeito, tal despacho não enferma de qualquer nulidade, devendo os autos prosseguir conforme o doutamente determinado nos referidos despachos de 29/03/2023 e de 11/01/2024.”.
- Foi então proferido o despacho apelado.
*
IV. Do objecto do recurso.            

1. Delimitada que está, sob o n.º II, a questão a decidir, é o momento de a apreciar.
Na sequência da apresentação da relação de bens, que incluía apenas um imóvel, veio a interessada AA reclamar da relação de bens, peticionando que fosse aditada uma conta bancária existente em ....
Nesse mesmo requerimento, para além de outra prova que indicou, solicitou que se oficiasse ao Banco francês em causa, para que informasse o valor depositado na referida conta, à data do divórcio.
Notificado de tal reclamação, o cabeça de casal, veio invocar que tal conta não deve ser relacionada, pelos fundamentos indicados no requerimento por si apresentado a 19 de abril de 2022, indicando prova.
Designada audiência prévia, para os efeitos do art. 1109º do CPC, ou, caso não fosse obtido acordo, para produção de prova pessoal, foi nessa data prescindida a produção de prova pessoal, e invocada a excepção de incompetência internacional do tribunal para conhecer da titularidade e do reconhecimento como bem comum do casal, da conta bancária indicada na reclamação.
Por decisão de 29 de março de 2023, o tribunal julgou improcedente a invocada excepção de incompetência internacional, determinando, seguidamente, que se oficiasse à instituição bancária francesa solicitando a referida informação.
Desta decisão, interpôs o cabeça de casal recurso, tendo a decisão em causa sido confirmada, quer por este Tribunal da Relação, quer pelo STJ.
Sucede que, contrariamente ao que parece ser o entendimento do tribunal a quo e da apelada, o que se afirma no Ac. desta Relação (confirmado pelo STJ) é que:
“Não havendo, como se constata, norma comunitária que obste à inclusão no processo de inventário de conta bancária existente em país estrangeiro, atento o princípio da universalidade e da unidade, segundo os quais todos os bens objeto de comunhão deverão ser partilhados no mesmo inventário, deve a conta bancária de banco estrangeiro ser incluída na relação de bens.
Questão diversa e fora do âmbito do recurso, é a de saber se os valores aí depositados são, ou não, bem comum dos interessados na partilha”. (sublinhado nosso).
Ou seja, nos Acórdãos proferidos, a única questão tratada, foi a da competência internacional do tribunal a quo, e já não a de saber se os valores depositados na conta em causa, são, ou não, bem comum dos interessados, sendo que até ao momento, não houve qualquer decisão do tribunal a quo sobre a reclamação à relação de bens apresentada, tendo apenas sido determinada a solicitação de uma informação ao banco francês sobre o montante existente na conta em causa, à data do divórcio.
Na sequência da notificação do acórdão do STJ, a interessada AA veio requerer o prosseguimento dos autos, nomeadamente com a já requerida e deferida notificação da instituição bancária francesa para prestar as informações solicitadas, o que foi determinado pelo despacho de 11.01.2024.
Deste despacho, veio o cabeça de casal invocar a nulidade, a 25.01.2024, por violação do princípio do contraditório e do disposto pelo art. 248º nº 1 do CPC, por o mesmo não lhe ter sido notificado, nem lhe ter sido dada oportunidade para sobre ele se pronunciar. Desse seu requerimento resulta que, pelo menos no dia 15 de janeiro de 2024, teve conhecimento do despacho em causa.
E, a 9 de fevereiro de 2024, o cabeça de casal, apresentou novo requerimento, a invocar para além do já invocado a 25.01.2024, nova nulidade do despacho de 11.01.2024, por não ter o tribunal a quo ainda julgado procedente ou improcedente a reclamação por si apresentada, nem terem sido determinados quais os bens a partilhar, omissão de pronúncia que o cabeça de casal pretendia suscitar na resposta ao pedido formulado pela requerente cujo prazo terminava no dia 15 de janeiro de 2024.
Terminou pedindo fosse declarada a nulidade do despacho proferido no dia 11 de janeiro de 2024 e de todos os actos subsequentes e o cumprimento do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 1110º do CPC.
Foi nesta sequência que veio a ser proferida a decisão apelada.
Vejamos então.
Estão em causa a violação do princípio do contraditório, uma irregularidade de notificação e a omissão da prolação de decisão sobre a reclamação à relação de bens apresentada e de despacho de saneamento do processo.
Em relação aos mesmos, o apelante reagiu pelos seus requerimentos de arguição de nulidade 25.01.2024 e de 09.02.2024 que supra se transcrevemos, e, depois, na sequência da prolação de decisão sobre tais requerimentos a 12.06.2024, através do presente recurso.
Como é sabido, e está sedimentado quer na doutrina quer na jurisprudência, a arguição da nulidade só é admissível quando a infração processual não está, ainda que indireta ou implicitamente, coberta por um qualquer despacho judicial.
De facto, se há um despacho que pressuponha o ato viciado, o meio próprio para reagir contra a ilegalidade cometida, não é a arguição ou reclamação por nulidade, mas a impugnação do respetivo despacho pela interposição do competente recurso.
No caso dos autos, as nulidades que o apelante imputa ao tribunal, estão cobertas pelo despacho de 11.01.2024.
Aliás, tais alegadas nulidades só se tornaram percetíveis para o apelante com a prolação de tal despacho, após o qual verificou que não teria sido notificado do mesmo, que lhe terá sido vedado o direito ao contraditório e em que, em seu entender, deveria ter já sido decidida a reclamação à relação de bens e proferido despacho de saneamento dos autos.
Assim, estando as nulidades invocadas cobertas por despacho, o apelante, pretendendo reagir contra elas, deveria ter recorrido do mesmo.
Sucede que não o fez, vindo antes por requerimentos de 25.01.2024 e 09.02.2024 arguir as nulidades que entende verificarem-se, sobre os quais recaiu o despacho de 12.06.2024, que indeferiu tal arguição e do qual interpôs o recurso dos autos.
Não tendo o apelante interposto recurso do despacho de 11.01.2024, conclui-se que aquando da interposição do recurso dos autos já tinha transitado em julgado aquele despacho de 11.01.2024.
Ora, o caso julgado formal (art. 620º nº1 do CPC), tendo força obrigatória dentro do processo, torna inadmissível decisão posterior sobre a mesma questão que dele tenha sido objeto.
Nesta medida, por via do caso julgado formal formado com aquele despacho de 11.01.2024, precludiu a possibilidade de invocação das nulidades que o recorrente entende verificarem-se.
Mas ainda que assim se não entendesse, no que diz respeito à omissão de decisão sobre a reclamação à relação de bens e despacho de saneamento dos autos, também por outra razão a apelação teria de improceder.
É que, o despacho que determinou a notificação do banco francês para vir prestar informação sobre o montante depositado na conta em causa à data do divórcio, não decidiu a reclamação apresentada, apenas determinou se solicitasse um meio de prova requerido pela reclamante, na reclamação que apresentou.
Ou seja, tal determinação ocorreu ainda na fase da instrução dos autos, a qual ainda não terminou, visto que a reclamação não foi decidida (e ao que parece, tal solicitação foi requerida tendo em vista tal decisão), nem foi ainda em momento algum determinado que o cabeça de casal aditasse à relação de bens o montante existente na conta em causa, razão pela qual, sempre seria prematuro, considerando o estado dos autos, ser proferido despacho de saneamento previsto pelo art. 1110º do CPC.
Improcede, pois, a apelação.
*
V. Decisão.

Perante o exposto, acordam os Juízes que constituem este Coletivo da 3ª secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar a apelação improcedente, confirmando, em consequência, a decisão apelada.
Custas pelo apelante.
*
Guimarães, 22 de maio de 2025

Assinado electronicamente por:
Fernanda Proença Fernandes
Elisabete Moura Alves
Luís Miguel Martins