Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
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| Relator: | MARIA DOS ANJOS NOGUEIRA | ||
| Descritores: | CASO JULGADO FACTOS PROVADOS EM DECISÃO ANTERIOR | ||
| Nº do Documento: | RG | ||
| Data do Acordão: | 11/26/2020 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
| Decisão: | APELAÇÃO IMPROCEDENTE | ||
| Indicações Eventuais: | 2.ª SECÇÃO CÍVEL | ||
| Sumário: | Os factos considerados provados nos fundamentos da sentença não podem considerar-se isoladamente cobertos pela eficácia do caso julgado, para o efeito de extrair deles outras consequências, além das contidas na decisão final. | ||
| Decisão Texto Integral: | ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – Relatório A. L., casado, residente na Rua …, Braga, instaurou contra M. G. e M. M., residentes na Rua …, Vila Verde, a presente acção declarativa, pedindo que se reconheça o seu direito de propriedade sobre o prédio rústico identificado no artigo 1º da p. i., já reconhecido, e com trânsito em julgado, no processo n.º 444/14.0TBVVD da Comarca de Braga, de que faz parte um “trato de terreno“, com a largura de 0,90 metros e comprimento de cerca de 80 metros, condenando-se os réus a abster-se de, por si ou a seu mando, violarem esse direito e ainda, solidariamente, a pagar uma compensação pelos danos morais provocados e ainda a reconstruir o muro na confrontação poente/nascente do seu prédio urbano, numa extensão de cerca de 50 metros por 2 metros de altura e 0, 60 metros de largura ou, alternativamente, a autorizar o autor a realizar as aludidas obras de reconstrução, condenando-se ao pagamento do montante a liquidar em execução de sentença. Para o efeito, alegou, em síntese, que é dono do prédio identificado no artigo 1.º da petição inicial, tendo, inclusive, obtido o reconhecimento do seu direito de propriedade no âmbito de acção judicial anterior instaurada para o efeito. Mais alegou que faz parte do referido prédio um trato de terreno que também adquiriu e de que tomou posse efetiva a 7 de Abril de 2011, aí mandando colocar um portão, no exercício legítimo do seu direito de tapagem, já que, quer ele quer os seus antecessores na posse e composse, pelo menos, desde 1885/1887, se opuseram a que, quer de noite ou de dia, os réus, vizinhos e quaisquer outras pessoas das redondezas passassem ou atravessassem o seu prédio rústico ou em qualquer uma das suas parcelas, oposição essa que fizeram à vista de toda a gente e de modo contínuo, ininterrupto e pacífico, com a consciência de exercerem um direito próprio e na convicção de não prejudicarem direito de outrem. Mais alega, ainda, que, de modo contínuo e ininterrupto, têm colhido e feito seus os frutos que o referido prédio rústico produz, incluindo no dito trato de terreno, aí plantando árvores, arrancado as que outrem, abusivamente, aí plantaram, ele roçando o mato ou não, nele apanhando a lenha para o consumo do seu lar e procedendo ao seu cultivo em toda a sua extensão, o que fizeram sempre sem oposição de quem quer que fosse desde, pelo menos, o ano civil de 1887 a esta parte, suportando os respetivos encargos e impostos, à vista de toda a gente, com o conhecimento de todos, na convicção de que exercem um direito próprio e que não lesam os interesses de ninguém. Mais alega que os réus, em total desrespeito pelo seu direito, durante o Verão de 2017, invadiram o seu prédio, na parte do sobredito trato de terreno, limpando as ervas daninhas e derrubando as árvores que aí nasciam, plantando outras e estendendo uma manga de irrigação, o que lhe provocou incómodos, revolta, desespero, insónias, para cuja compensação reclama a quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros) Finalmente, alega que os réus estão obrigados a reconstruir o muro de vedação, que derrocou, na confrontação Poente/Nascente, numa extensão mínima de cerca de 50 metros de cumprimento, por dois metros de altura e com largura de 0,60m, porquanto o impede da plena utilização e frutificação da sua propriedade. Com o requerimento probatório que apresentou juntou documentos e arrolou testemunhas. * Regularmente citados, os réus apresentaram contestação, por excepção e impugnação.Excepcionando, os réus sustentaram a verificação de caso julgado relativamente aos autos de proc. n.º 444/14.0T8VVD deste Juízo local, e, ainda que assim se não entendesse, invocaram a autoridade de caso julgado formado pela decisão proferida nesse âmbito. Em sede de impugnação, os réus, em síntese, contradisseram os factos invocados pelo autor, sustentando que o dito trato de terreno jamais integrou o prédio descrito no artigo 1.º da petição inicial, pois que sempre se destinou à passagem de todos aqueles que por ali pretendessem circular, à vista de toda a gente, sem oposição de ninguém, designadamente dos antepossuidores do prédio do autor, tratando-se, conforme conhecimento de todos, incluindo do autor, de um carreiro público. Concluem, face ao exposto, que não violaram qualquer direito do autor, não estando, por isso, obrigados a indemnizá-lo, estando, antes, o autor obrigado a indemnizá-los pelos prejuízos causados pela sua actuação de má-fé. Pedem a sua absolvição da instância e, assim se não entendendo, a absolvição dos pedidos formulados nos autos, pedindo, no reverso, a condenação do autor como litigante de má-fé. Com o requerimento probatório que apresentaram, à semelhança do autor, juntaram documentos, arrolaram testemunhas e requereram ainda a inspecção judicial ao local. * Ofereceu-se o contraditório ao autor relativamente à matéria de excepção suscitada em sede de contestação.Em resposta, e em síntese, o autor refutou a verificação de caso julgado relativamente aos autos de proc. n.º 444/14.0TBVVD, bem como, afastou a autoridade de caso julgado formado pela decisão proferida sobre a matéria em discussão e afastou ainda a imputação como litigante de má fé. * Proferiu-se despacho saneador, julgando-se parcialmente procedente a excepção de caso julgado, no que toca ao pedido de reconhecimento do direito de propriedade sobre o prédio identificado no artigo 1.º da petição inicial, por já apreciado no âmbito dos autos de proc. n.º 444/14.0TBVVD, determinando-se o prosseguimento dos autos para apreciação dos demais pedidos formulados pelo autor, na medida em que se considerou que a causa de pedir que os funda assenta noutros factos (aquisição originária), daqueloutra alegada nos autos de proc. n.º 444/14.0TBVVD, improcedendo, nesta parte, a excepção de caso julgado e ficando prejudicada a apreciação da verificação dos efeitos da autoridade de caso julgado.Identificou-se o objecto do litígio e enunciaram-se os temas da prova. Procedeu-se a inspecção judicial ao local, conforme documentada no auto respectivo. Procedeu-se a audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida sentença que julgou a acção improcedente, por não provada, absolvendo-se, em consequência, os réus, M. G. e M. M., dos pedidos contra si formulados nos autos, e o pedido de condenação como litigante de má-fé improcedente, por não provado, dele se absolvendo o autor. * II-Objecto do recursoNão se conformando com a decisão proferida, veio o A. interpor recurso, no qual formula, a final, as seguintes conclusões: 1- Violaram-se os artigos 33º, n.º 1 615º n.º 1 al d), parte final o Art. 195º n.º 1 parte final, o Art. 581º n.º 1, nº 2, n.º 3 e n.º 4, Art. 621º Art. 609º n.º 1 do CPC; o Art. 1251º, o Art. 1253º art. 1258º, 1259º, 1260º n.º 1 ou 2, 1261º , 1262º, , 1263 al a) ou al.d), Art. 1265º, 1267º n.º 2 1268º n.º 1, Art. 1287º, 1288º, 1302e Art. 1305º todos do CC. 2- O tribunal a quo, salvo o devido respeito, incorreu no vício da nulidade insanável por excesso de pronúncia relativamente à verificação de caso julgado material no que tange à matéria de facto julgada como provada no ponto 5 da matéria de facto julgada como provada, uma vez que na acção n.º 444/14.0TBVVD se julgou como provada a seguinte matéria conexa: “G- Há mais de 25/30 anos, com ressalva dos réus e estes apenas para se deslocarem entre a sua habitação e a sua propriedade rústica circunvizinha, as pessoas da freguesia e povoação de ...deixaram de utilizar o trato de terreno referido em C)” e que, em sede de recurso de apelação, o tribunal ad quem logrou aditar o ponto seguinte após o ponto de facto N: «As pessoas estavam convencidas de que usavam um 2 carreiro público” excluindo com tal dos factos não provados o seu ponto 9». 3- E nesta acção o tribunal a quo vem julgar matéria de facto que contende com o caso julgado material, seja ponto «5. Desde tempos de que já não há memória e sem oposição de ninguém até, pelo menos, à data referida em 3., qualquer pessoa, incluindo os réus, circulava pela dita faixa de terreno para ir e vir do trabalho, para se deslocar à Vila de Prado e a Barcelos, para circular entre as habitações e propriedades rústicas e para se deslocar ao serviço religioso». 4- Porquanto as testemunhas F. P. e M. S. que foram causa da fundamentação e fixação do caso julgado material agora vieram depor sobre a mesma questão, em contradição direta e oposta com o que haviam afirmado/deposto anteriormente, caso julgado material que aqui se invoca. 5- O tribunal ao julgar improcedente por não provada a acção, violou o instituto da usucapião ou da prescrição aquisitiva da posse, através da pática de actos materiais reiterados exercidos com a intenção e a convicção de o autor através dos seus antecedentes na posse ter beneficiado da presunção da dita posse e se ter formado o seu corpus por essa via. 6- A não ser assim o que aqui se não entende deve julgar-se procedente por provada a acção, por via do instituto da usucapião ou da inversão do titulo da posse, pelo menos desde a data de 1980, data em que era vivo o avô de C. M., por ter beneficiado de uma detenção precária, por parte dos utentes do “ carreiro público” que era assim considerado, por uma pressuposição errada por parte dos utentes do carreiro. 7- Deve ser julgada provada e procedente toda a matéria de facto julgada como não provada e que é a seguinte, em aditamento à já provada e com eliminação da que foi julga como provada de modo ilícito: A) Há 25, 30 e mais anos, o autor, por si e seus antepossuidores, opuseram-se a que outrem entrasse num trato de terreno, com uma largura de 0,90 metros e de comprimento de cerca de 80 metros, na confrontação Poente do prédio id. em 1., numa extensão total de 72,00 m2. B) Logo a 7 de abril de 2011, o autor mandou colocar no prédio id. em 1. um portão. C) O autor, por si e seus antecessores, pelo menos desde 1885/1887, opuseram-se a que, quer de noite ou de dia, os réus, vizinhos e quaisquer outras pessoas das redondezas passassem ou atravessassem o seu prédio rústico ou em qualquer uma das suas parcelas. D) Oposição essa que fizeram à vista de toda a gente e de modo contínuo, ininterrupto, e pacífico, com a consciência de exercerem um direito próprio e na convicção de não prejudicarem direito de outrem. E) De modo contínuo e ininterrupto, têm colhido e feito seus todos os frutos produzidos na área de largura de 0,90m, e de comprimento de cerca de 80m, na confrontação Nascente do seu prédio, e num total de 72,00 m2, aí plantando árvores, arrancado as que outrem aí plantaram, nomeadamente os réus que, durante o verão passado, aí vieram a plantar eucaliptos e outras árvores. F) Foi o autor e estes últimos que aí roçaram o mato ou não, e nele apanharam a lenha para o consumo do seu lar e cultivaram o aludido prédio em toda a sua extensão e área de ha 0, 290900. G) Foram eles, autor e antepossuidores, que o amanharam a seu bel talento, cultivaram batatas e milho e os colheram, cortaram a madeira de castanho e carvalho nele produzida. H) O que fizeram sempre, à vista e com o conhecimento de todos, sem oposição de quemquer que fosse desde pelo menoso ano civilde 1886/87 a esta partee suportaram os respetivos encargos, como o imposto municipal sobre os imoveis ou a anterior contribuição autárquica. I) Os vendedores e antepossuidores, C. M. e outro, no ano de 1887, e a pedido expresso do seu avô, derrubaram umas escadas que aí permaneciam, para assim evitar que as pessoas utilizassem a dita parcela para passar a pé, de bicicleta ou com animais ou carrinhos de mão ou qualquer outro meio de transporte. J) Há, pelo menos, 25, 30 e mais anos que o autor por si e seus antepossuidores cultivam a sobredita parcela como parte do prédio descrito em 1., para tanto desbastaram as ervas daninhas que aí cresciam anualmente e plantaram árvores, vinha em ramada e demais arbustos agrícolas, plantaram e plantam em todo o prédio id. em 1., de modo ininterrupto, incluindo o dito trato de terreno, até ao limite da confrontação poente, com a confrontação nascente de prédio urbano dos réus. K) E colocaram uma vedação em metal, com cerca de 0, 90 m, na sua confrontação Norte, para impedir que alguém e nomeadamente os vizinhos e aqui réu a utilizassem como atravessadouro entre as propriedades que confrontam com o prédio descrito em 1., o que fizeram, sem oposição de ninguém, nomeadamente dos aqui réus, que com tal se conformaram, desde pelo menos 1987 para cá e à vista de toda a gente, pacífica e publicamente. L) Os réus, desde o verão passado, invadem e invadiram o trato de terreno supra referido, que bem sabem ser propriedade do autor, querendo com tal servir-se do mesmo como atravessadouro. M) Durante o Verão de 2017, e em data que se desconhece, os réus invadiram o dito trato de terreno, limpando as ervas daninhas e derrubando as árvores que aí nasciam e plantando eucaliptos. N) Sem autorização do autor, os réus lograram estender uma manga de irrigação de ½ polegadas de cor preta, por sobre a dita parcela ou trato de terreno. O) A descrita actuação provoca incómodos, revolta, desespero e insónias ao autor” 8- Deve ser julgado como provado e procedente o invocado erro notório existente no ponto 3 da matéria de facto julgada como provada quando aí se reporta a confrontação Nascente, sendo que a confrontação adequada e em resultado da apreciação e ponderação dos dosc. 1 e n.º 2 juntos com a p. i., desde logo por não ter existido prova em contrário é a confrontação Sudoeste/Nordeste e quanto à proposição faixa de terreno com piso em terra batida e calcada. 9-No local e área parcela de terreno dita ou melhor subentendida de “carreiro público” não existem quaisquer arcos de demarcação na confrontação poente do prédio rústico id. em 1 da p. i 10-Porque tal resulta da conjugação dos diferentes meios probatórios, nomeadamente os documentais, pois o tribunal a quo, salvo o devido respeito, deveria ter comparado, sopesado e avaliado e não o fez, não só os documentos fotográficos, integrantes da inspecção judicial, mas ainda os documentos juntos e reproduzidos na p. i. sob os n.º 5, , 7, 8, 9, 10, 11 e 12, os juntos e produzidos em 2017-11-09, pelo autor, sob os nº 14 a 21 e eventualmente os juntos pelas corréus na sua contestação, sem prejuízo daqueles meios probatórios como testemunhal que levou a que a matéria de facto constitui caso julgado material. 11- Com a violação por inadequada ponderação e sopesação dos meios probatórios ao seu dispor e levados para os autos, os quais deixou de apreciar, o tribunal a quo violou as regras da experiência comum e o direito do autor em poder adquirir por via da usucapião a parcela de terreno erradamente subentendida de “carreiro público” Termos em que e sempre com o mui douto suprimento de VOSSAS EXCELÊNCIAS se pede se dignem julgar provada e procedente a invocação da nulidade insuprível por excesso de pronuncia do tribunal a quo e ainda julgar procedente por provado o presente recurso, revogando em todo o seu conteúdo e extensão a sentença revidenda e substituindo-a, por decisão judicial de sinal contrário que declare a nulidade da sentença por sofrer dos vícios da excesso de pronúncia por verificação do caso julgado material,por verificaçãode erro notório naapreciação da matériadefactojulgada como provada nos seus pontos 3 e ponto 5 e ainda julgando como provada e procedente toda a matéria de facto julgada como não provada levando-a à matéria de facto julgada como provada, e julgando ainda violados os meios probatórios documentais quando conjugados, entre si e também as regras da experiência comum, na apreciação da matéria de facto. Em tudo fazendo VOSSAS EXCELÊNCIAS a HABITUAL JUSTiÇA * Os RR./Recorridos vieram apresentar as suas contra-alegações, nelas concluindo nos seguintes termos: 1ª. O Recorrente impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto, mas resulta quer das conclusões de recurso em apreço, quer do próprio corpo das alegações que o Recorrente não cumpre as obrigações que lhe são impostas. • não especifica os concretos meios probatórios, constantes da gravação, que impunham diversa decisão sobre aqueles pontos, e • não indica com exactidão as passagens da gravação em que funda a impugnação que devia concretizar. • não procede à análise crítica de cada um dos pontos em apreço, com referência a cada um dos meios de prova invocados, designadamente, não especifica com exatidão os documentos ou as passagens da gravação, e nem sequer da respetiva transcrição, em que se funda para sustentar a sua pretensão relativamente a cada um dos fatos constantes daqueles pontos • aliás, faz referência a depoimentos sem os identificar (ver artigo 27º, 39º, 46º, 51º das alegações), noutras situações identifica a testemunha, mas não identifica pelo menos o minuto em que começa tais declarações (ver artigo 33º, 35º alegações). 2ª. Por isso, deve rejeitar-se a impugnação do julgamento da matéria de facto (artº 685.º-B do CPC). 3ª. Alega o Recorrente que a sentença é nula porquanto considerou provado que no ponto 5 que “desde tempo de que já não há memoria e sem oposição de ninguém até, pelo menos, à data referida em 3., qualquer pessoa, incluindo os réus, circulava pela dita faixa de terreno para ir e vir do trabalho, para se deslocar à Vila de Prado e a Barcelos, para circular entre as habitações e propriedades rústicas e para se deslocar ao serviço religioso.” 4ª. E que tal questão não era colocada ao tribunal. 5ª. Contudo, tal matéria fazia parte dos temas da prova designadamente do tema de prova 9). 6ª. Não se verificando, por isso, qualquer excesso de pronúncia do tribunal a quo. 7ª. E, além do mais, o A/Recorrente quando foi notificado do despacho saneador NÃO APRESENTOU qualquer reclamação contra o mesmo, designadamente quanto aos temas de prova fixados. 8ª. Acresce que, não existe qualquer CONTRADIÇÃO entre os factos provados nos presentes autos e no âmbito do processo nº444/14.0TBVVD. 9ª. As testemunhas ouvidas quer nos presentes autos quer no âmbito do processo nº444/14.0TBVVD foram COERENTES e ASSERTIVAS: • ao afirmar que aquele trato de terreno sempre foi um carreiro público no uso indiscriminado do público em geral. • que com a pavimentação da estrada o uso desse carreiro foi diminuindo, mas que sempre lá continuaram a passar pessoas, incluindo os RR. • Que os RR nunca deixaram de lá passar. 10ª. NÃO RESTAM DÚVIDAS que o trato de terreno em questão sempre esteve no uso do público em geral, o mesmo resulta do depoimento das testemunhas. Todas as testemunhas depuseram de forma isenta e objectiva, e confirmaram a existência do carreiro desde tempo que a memória não lembra. Nesse mesmo sentido convergiram os depoimentos das testemunhas F. P., na audiência de 30/01/2020, que em torno dos mm:ss 19:55, 19:59, 20:04 e 24:53 como transcrito a fls. 5 supra; M. S., na audiência de 30/01/2020, que em torno dos mm:ss 09:44, 09:48, 10:00, 12:10 e 12:23 como transcrito a fls. 5 e 6 supra; 11ª. A sentença recorrida não merece qualquer censura quanto à decisão relativa à matéria de facto suscitada pela Recorrente. 12ª. Na realidade, a alegação do Recorrente no que à decisão da matéria de facto diz respeito, verifica-se que a mesma se reconduz a uma mera sindicância da convicção formada pelo Meritíssima Juiza relativamente à prova produzida, o que não poderá relevar para o efeito pretendido. 13ª. Porém, o que releva para efeitos de valoração da prova produzida é a livre convicção formada pelo Juiz do processo (artº 396º do Código Civil) e não aqueloutra que eventualmente é formada por alguma das partes, ou pelos seus mandatários. 14ª. Esta regra repercute-se em sede de impugnação da matéria de facto, designadamente no que diz respeito à consagração legislativa da possibilidade de alteração da decisão do Tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto, nos termos previstos no artº 662º do CPC. 15ª. Na verdade, tal consagração legislativa visa apenas evitar que se mantenham decisões manifestamente injustas, com base em erros grosseiros, seja por insuficiência da matéria de facto provada, seja por contradição insanável na fundamentação ou entre esta e a decisão, ou ainda, quando houver erro notório na apreciação da prova. 16ª. QUANTO AO DEMAIS VALE A LIVRE CONVICÇÃO DO JUIZ. 17ª. Relativamente à douta decisão em causa não é possível vislumbrar qualquer vício susceptível de justificar a alteração daquela decisão uma vez que, conforme se afere da decisão em matéria de facto e respectiva fundamentação, o Tribunal decidiu com base num raciocínio lógico, coerente, devidamente justificado e perfeitamente inteligível. 18ª. OS FACTOS PROVADOS 3, 4 e 5 foram bem julgados e em consonância com os documentos juntos, com a inspecção ao local e com a produção de prova, não merecendo qualquer sindicância. 19ª. Por isso, não existe qualquer razão ou fundamento que justifique a REAPRECIAÇÃO/ALTERAÇÃO dos factos não provados, de forma a que se dê como provado os factos enumerados nas alíneas A) a O) conforme pretendido pelo Recorrente. 20ª. Da INSPECÇÃO AO LOCAL o tribunal a quo constatou que a faixa de terreno em discussão vai estreitando progressivamente até atingir uma largura de 1,80 metros, apresentando-se o seu piso em terra batida com sinais de alguma vegetação, calcada pela passagem de pessoas ou animais. 21ª. NA VERDADE, do depoimento das TESTEMUNHAS, conjugado com a INSPEÇÃO AO LOCAL, o REGISTO FOTOGRÁFICO efectuado nessa inspeção e as fotografias juntas pelos Recorridos na contestação (que demonstram a mesma realidade verificada na inspeção ao local), foram esclarecedores e relevantes para a decisão proferida: • As testemunhas dos Recorridos ouvidas em sede de audiência de julgamento, todas com ligações a Cabanelas, descreveram de um modo assertivo, coerente e unânime como, durante toda a sua vida de mais de 60 anos, utilizaram o dito carreiro, como toda a população daquela zona; • As mesmas testemunhas confirmaram, que os Recorridos até aos dias de hoje continuam a utilizar o referido carreiro; • Reconheceram também que após a pavimentação do caminho da Muda à Igreja o uso diminuiu (claro está que o facto de ter diminuído o uso, não significa que tenha sido abandonado ou deixado de utilizar como pretende “a toda a força” o Recorrente demonstrar) • Descreveram com pormenor as características daquele trato de terreno, designadamente, o piso em terra batida, que o mesmo é marginado pela vedação/cota dos terrenos que o ladeia – o que é confirmado pelas fotografias juntas pelos Recorridos na contestação e pela inspeção ao local, constando-se dos registos fotográficos nesse dia recolhidos -; que o trato de terreno (carreiro atravessa várias propriedades); confirmando que nesse mesmo trata o nunca lá foi plantado ou cultivado o quer que seja; que nunca nesse trato existiu castanheiros; 22ª. Todas as testemunhas depuseram de forma isenta e objectiva, e confirmaram a existência do carreiro, como, durante toda a sua vida de mais de 60 anos, utilizaram o dito carreiro, como toda a população daquela zona; assim como descreveram com pormenor que o mesmo era em terra batida, situação que foi verificada na inspeção ao local. Nesse mesmo sentido convergiram os depoimentos das testemunhas F. P., na audiência de 30/01/2020, que em torno dos mm:ss 05:58, 06:56, 07:06, 07:45, 08:40, 09:17, 10:29, 10:35, 10:39, 11:29, 12:36, 13:08, 13:17, 16:56, 17:20, 18:10, 18:32, 18:33, 20:04, 24:36, 24:53, como transcrito a fls. 11, 12, 13 e 14 supra; M. S., na audiência de 30/01/2020, que em torno dos mm:ss 03:05, 03:43, 03:53, 04:52, 06:21, 06:26, 06:38, 07:04, 07:27, 08:55, 09:38, 09:47, 10:56, 11:35, como transcrito a fls. 14, 15, 16 e 17 supra; C. M., na audiência de 30/01/2020, que em torno dos mm:ss 02:30, 02:47, 02:51, 03:13, 03:25, 03:42, 04:47, 08:01, 08:12, 08:24, 08:25, 08:29 e 09:32, como transcrito a fls 17 e 19. 23ª. POR OUTRO LADO, são também vários os INDÍCIOS que demonstram que, ao contrário do alegado pelo Autor, aquela faixa de terreno nunca esteve na posse, ou sobre a mesma foi exercido qualquer ato de posse: • Desde logo, as características da faixa em questão (ladeada por vedação/cota dos terrenos vizinhos; • Piso em terra batida, com sinais de passagem de pessoas ou animais; • a faixa de terreno em questão não atravessa a propriedade do A., mas situa-se sim, entre o seu prédio e os prédios de terceiros. 24ª. POR SUA VEZ, as testemunhas indicadas pelo Recorrente, designadamente, cunhado e esposa, não tinham conhecimento dos factos, não tinham conhecimento da realidade dos usos da terra de Cabanelas, conhecendo o lugar em questão apenas desde a compra do prédio em 2011!!! 25ª. E a testemunha, C. M., anterior proprietário do prédio do A., embora tenha negado inicialmente a existência de um caminho na parcela em discussão, acabou por deixar escapar que o avó e a recorrida para apanhar as castanhas, utilizavam um carreirinho que teria um metro de largura, o que contraria a tese do A. que nesse local teriam culturas. 26ª. Assim como, involuntariamente, também confirmou que o balcão de cima estava de bravo desde, pelo menos, 1980, e que por isso, não cultivavam a terra, o que também infirma o alegado pelo A. A testemunha C. M. na audiência de 30/01/2020, que em torno dos mm:ss 14:00, 14:33, 14:39, 14:40, 14:42, 37:11, 37:35, 37:55, 38:09, 38:19, como transcrito a fls. 19 e 20 supra; 27ª. PORTANTO, o Recorrente, NÃO PROVOU qualquer ato de posse sobre a faixa de terreno em questão, não existindo qualquer fundamento para se considerar PROVADOS os factos A) a O). SEM PRESCINDIR, 28ª. Dispõe o art. 342º.1 do CC “aquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado.” 29ª. Tinha, por isso, o A. o ónus da prova dos factos constitutivos do seu direito de propriedade e dos factos constitutivos da turbação ou esbulho do seu direito, PROVA ESSA QUE NÃO LOGROU FAZER. 30ª. O A. NÃO PROVOU nenhum dos factos por si alegados. 31ª. Ao passo que, e apesar de não ser seu ónus dos RR, estes fizeram prova suficiente para contrariar a versão apresentada pelos AA. POR ÚLTIMO 32ª. ALEGA, ainda o Recorrente que se “o avô da testemunha se não adquiriu o que não se aceita a posse, por via de tais actos materiais, sempre se demonstrou que a adquiriu, com base na inversão do titulo da pose, neste caso face ao abandono dos anteriores titulares, inversão do titulo que aqui se incova...” 33ª. Quanto a este NOVO FACTO, importa frisar que não se verifica qualquer inversão do titulo da posse, não foram demonstrados quaisquer factos que comprovem essa inversão e mais, constitui matéria nova, matéria que já mais foi alegada nos articulados. 34ª. POR ISSO, a decisão recorrida, e consequentemente os factos provados não merecem qualquer sindicância. NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO: Deve o presente recurso ser julgado improcedente, negando-se qualquer provimento ao mesmo e mantendo-se a decisão recorrida nos seus precisos termos. Assim farão V. Exas. a ESPERADA Justiça, * O recurso foi recebido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito devolutivo. * Foram colhidos os vistos legais. * III - O Direito Como resulta do disposto nos artos. 608º., nº. 2, ex vi do artº. 663º., nº. 2, 635º., nº. 4, 639º., n.os 1 a 3, 641º., nº. 2, alínea b), todos do Código de Processo Civil (C.P.C.), sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex officio, este Tribunal só poderá conhecer das que constem das conclusões que definem, assim, o âmbito e objecto do recurso. Deste modo, e tendo em consideração as conclusões acima transcritas cumpre apreciar e decidir sobre a nulidade arguida e o apontado erro na apreciação da prova. * · Fundamentação de facto 1. O prédio rústico, composto de terreno de lavradio com balcões, sito no lugar …, da freguesia de …, concelho de Vila Verde, a confrontar de Norte com A. M., de Nascente com caminho da Muda à Igreja, e de Poente e Sul com M. R., está inscrito na matriz predial daquela freguesia sob o artigo … e está descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º …, onde também se inscreve a sua aquisição, por compra, a favor do autor, A. L., casado com L. L., no regime da separação de bens. 2. Em 7 de Abril de 2011, por escrito, perante notário, C. R. e L. M. declararam vender ao autor, que aceitou, o prédio id. em 1., com a área rectificada de 2909 m2. 3. Após a sobredita data, a Nascente do prédio id. em 1., o autor colocou um portão, vedando o acesso a uma faixa de terreno, com piso em terra batida e calcada, que se estende no sentido Sudeste/Noroeste, com a largura, na entrada, de cerca de 4,70 metros e que vai estreitando até atingir uma largura de 1,80 metros. 4. A dita faixa de terreno é marginada pela vedação/cota dos terrenos que ladeia. 5. Desde tempos de que já não há memória e sem oposição de ninguém até, pelo menos, à data referida em 3., qualquer pessoa, incluindo os réus, circulava pela dita faixa de terreno para ir e vir do trabalho, para se deslocar à Vila de Prado e a Barcelos, para circular entre as habitações e propriedades rústicas e para se deslocar ao serviço religioso. 6. Em 8 de Agosto de 2013, o autor apresentou queixa contra a ré M. G., pelo facto de ter derrubado o portão referido em 3., o que deu origem ao nuipc 312/13.3GAVVD. 7. No âmbito dos autos de proc. sumaríssimo com o n.º supra referido, à ré foi aplicada pena de multa pela prática do crime de dano p. e p. pelo artigo 212.º do Código Penal. * Factos não provados A) Há 25, 30 e mais anos, o autor, por si e seus antepossuidores, opuseram-se a que outrem entrasse num trato de terreno, com uma largura de 0,90 metros e de comprimento de cerca de 80 metros, na confrontação Poente do prédio id. em 1., numa extensão total de 72,00 m2. B) Logo a 7 de abril de 2011, o autor mandou mandou colocar no prédio id. em 1. um portão. C) O autor, por si e seus antecessores, pelo menos desde 1885/1887, opuseram-se a que, quer de noite ou de dia, os réus, vizinhos e quaisquer outras pessoas das redondezas passassem ou atravessassem o seu prédio rústico ou em qualquer uma das suas parcelas. D) Oposição essa que fizeram à vista de toda a gente e de modo contínuo, ininterrupto, e pacífico, com a consciência de exercerem um direito próprio e na convicção de não prejudicarem direito de outrem. E) De modo contínuo e ininterrupto, têm colhido e feito seus todos os frutos produzidos na área de largura de 0,90m, e de comprimento de cerca de 80m, na confrontação Nascente do seu prédio, e num total de 72,00 m2, aí plantando árvores, arrancado as que outrem aí plantaram, nomeadamente os réus que, durante o verão passado, aí vieram a plantar eucaliptos e outras árvores. F) Foi o autor e estes últimos que aí roçaram o mato ou não, e nele apanharam a lenha para o consumo do seu lar e cultivaram o aludido prédio em toda a sua extensão e área de ha 0, 290900. G) Foram eles, autor e antepossuidores, que o amanharam a seu bel talento, cultivaram batatas e milho e os colheram, cortaram a madeira de castanho e carvalho nele produzida. H) O que fizeram sempre, à vista e com o conhecimento de todos, sem oposição de quem quer que fosse desde pelo menos o ano civil de 1886/87 a esta parte e suportaram os respetivos encargos, como o imposto municipal sobre os imoveis ou a anterior contribuição autárquica. I) Os vendedores e antepossuidores, C. M. e outro, no ano de 1887, e a pedido expresso do seu avô, derrubaram umas escadas que aí permaneciam, para assim evitar que as pessoas utilizassem a dita parcela para passar a pé, de bicicleta ou com animais ou carrinhos de mão ou qualquer outro meio de transporte. J) Há, pelo menos, 25, 30 e mais anos que o autor por si e seus antepossuidores cultivam a sobredita parcela como parte do prédio descrito em 1., para tanto desbastaram as ervas daninhas que aí cresciam anualmente e plantaram árvores, vinha em ramada e demais arbustos agrícolas, plantaram e plantam em todo o prédio id. em 1., de modo ininterrupto, incluindo o dito trato de terreno, até ao limite da confrontação poente, com a confrontação nascente de prédio urbano dos réus. K) E colocaram uma vedação em metal, com cerca de 0, 90 m, na sua confrontação Norte, para impedir que alguém e nomeadamente os vizinhos e aqui réu a utilizassem como atravessadouro entre as propriedades que confrontam com o prédio descrito em 1., o que fizeram, sem oposição de ninguém, nomeadamente dos aqui réus, que com tal se conformaram, desde pelo menos 1987 para cá e à vista de toda a gente, pacífica e publicamente. L) Os réus, desde o verão passado, invadem e invadiram o trato de terreno supra referido, que bem sabem ser propriedade do autor, querendo com tal servir-se do mesmo como atravessadouro. M) Durante o Verão de 2017, e em data que se desconhece, os réus invadiram o dito trato de terreno, limpando as ervas daninhas e derrubando as árvores que aí nasciam e plantando eucaliptos. N) Sem autorização do autor, os réus lograram estender uma manga de irrigação de ½ polegadas de cor preta, por sobre a dita parcela ou trato de terreno. O) A descrita actuação provoca incómodos, revolta, desespero e insónias ao autor. * Fundamentação de direito Começando pela nulidade arguida há que ter em conta que os vícios determinantes de nulidade da sentença correspondem a casos de irregularidades ou ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da razão por que decide de determinada maneira (falta de fundamentação), quer porque essa explicação conduz, logicamente, a resultado oposto do adoptado (contradição entre os fundamentos e a decisão), ou uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de pretender resolver questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não tratar de questões que deveria conhecer (omissão de pronúncia) — als. a) a e) do n.º 1 do art.º 615 do CPC. Tais nulidades típicas da sentença reconduzem-se a vícios formais decorrentes de erro de actividade ou de procedimento (error in procedendo) respeitante à disciplina legal e que se mostrem obstativos de qualquer pronunciamento de mérito. Assim, as nulidades da sentença são apreciadas em função do texto e do discurso lógico nela desenvolvidos, não se confundindo com a errada aplicação das normas jurídicas aos factos, erros de julgamento, estes, a sindicar noutro âmbito. Tais vícios não se confundem, assim, com erros de julgamento (error in judicando), que são erros quanto à decisão de mérito explanada na sentença, decorrentes de má percepção da realidade factual (error facti) e/ou na aplicação do direito (error juris), de forma que o decidido não corresponde à realidade ontológica ou normativa. Esta nulidade configura, no fundo, uma violação do disposto no artigo 608º, nº 2, do mesmo Código, segundo o qual “o[O] juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.” Neste contexto, há que distinguir entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos pelas partes. Conforme já ensinava ALBERTO DOS REIS, in “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. V, Coimbra 3ª Ed., p. 143, “s[S]ão, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.” No que especificamente tange ao excesso de pronúncia (segunda parte da alínea d) do n.º 1 do art. 615.º), o mesmo ocorre quando o juiz se ocupa de questões que as partes não tenham suscitado, sendo estas questões os pontos de facto ou de direito relativos à causa de pedir e ao pedido, que centram o objeto do litígio. Conforme se refere no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06-12-2012 (João Bernardo), p. 469/11.8TJPRT.P1.S1, publicado no site da dgsi, à luz do princípio do dispositivo, há excesso de pronúncia sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido, não podendo o julgador condenar, além do pedido, nem considerar a causa de pedir que não tenha sido invocada. Contudo, quando o tribunal, para decidir as questões suscitadas pelas partes, usar de razões ou fundamentos não invocados pelas mesmas, não está a conhecer de questão de que não deve conhecer ou a usar de excesso de pronúncia suscetível de integrar nulidade. Assim, a discordância da parte relativamente à subsunção dos factos às normas jurídicas e/ou à decisão sobre a matéria de facto de modo algum configuram causa de nulidade da sentença. Como se afere das considerações supra expostas, a doutrina e a jurisprudência têm entendido que a omissão ou excesso de pronúncia enquanto causas de nulidade da sentença têm por objeto questões a decidir na sentença, e não propriamente factos. Neste sentido, sublinhou o ac. RL 23-04-2015 (Ondina Alves), p. 185/14.9TBRGR.L1-2, que «questão a decidir não é a argumentação utilizada pelas partes em defesa dos seus pontos de vista fáctico-jurídicos, mas sim as concretas controvérsias centrais a dirimir e não os factos que para elas concorrem. Situação diversa da nulidade da sentença é a de saber se houve erro de julgamento, pois como se refere no Ac. do STJ de 21.05.2009 (Pº 692-A/2001.S1), (…) se a questão é abordada mas existe uma divergência entre o afirmado e a verdade jurídica ou fáctica, há erro de julgamento, não “error in procedendo”». No caso concreto, o A./Recorrente entende verificar-se o apontado vício da nulidade insanável por excesso de pronúncia no que tange à matéria de facto julgada como provada no ponto 5, uma vez que na acção n.º 444/14.0TBVVD se julgou como provada a seguinte matéria conexa: “G- Há mais de 25/30 anos, com ressalva dos réus e estes apenas para se deslocarem entre a sua habitação e a sua propriedade rústica circunvizinha, as pessoas da freguesia e povoação de ...deixaram de utilizar o trato de terreno referido em C)” e se aditou o ponto de facto N: «As pessoas estavam convencidas de que usavam um 2 carreiro público” excluindo com tal dos factos não provados o seu ponto 9». Nesse ponto 5, dos factos provados, deu-se como provado que: “5. Desde tempos de que já não há memória e sem oposição de ninguém até, pelo menos, à data referida em 3., qualquer pessoa, incluindo os réus, circulava pela dita faixa de terreno para ir e vir do trabalho, para se deslocar à Vila de Prado e a Barcelos, para circular entre as habitações e propriedades rústicas e para se deslocar ao serviço religioso.”. Importa, perante o exposta, frisar, antes de mais, que o não atendimento de um facto que se encontre provado ou a consideração de algum facto que não devesse ser atendido nos termos do artigo 5.º, n.º 1 e 2, do CPC, não se traduzem em vícios de omissão ou de excesso de pronúncia, dado que tais factos não constituem, por si, uma questão a resolver nos termos do artigo 608.º, n.º 2, do CPC. Reconduzem-se antes a erros de julgamento passíveis de ser superados nos termos do artigo 607.º, n.º 4, 2.ª parte, aplicável aos acórdãos dos tribunais superiores por via dos artigos 663.º, n.º 2, e 679.º do CPC. Segundo o ensinamento de Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, Coimbra Editora, 1981, pp. 144-146, «(…) Por a sentença tomar em consideração factos não articulados, contra o disposto no art. 664.º, não se segue, como já foi observado, que tenha conhecido de questão de facto de que lhe era vedado conhecer». No que respeita ao conteúdo e alcance do caso julgado, estabelece o art. 619.º, n.º 1 do C. P. Civil que: «Transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida de mérito da causa, a decisão sobre a relação jurídica material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580.º e 581.º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696.º a 702.º ». Segundo a noção dada por Manuel de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1976, 304, o caso julgado material, «consiste em a definição dada à relação controvertida se impor a todos os tribunais (e até a quaisquer outras autoridades) – quando lhes seja submetida a mesma relação, quer a título principal (repetição da causa em que foi proferida a decisão), quer a título prejudicial (acção destinada a fazer valer outro efeito dessa relação). Todos têm que acatá-la, julgando em conformidade, sem nova discussão». É imposto por razões de certeza do direito, mas, sobretudo, de segurança das relações jurídicas. Tem por finalidade, obstar a decisões concretamente incompatíveis (que não possam executar-se ambas sem detrimento de alguma delas), a que em novo processo o juiz possa validamente estatuir de modo diverso sobre o direito, situação ou posição jurídica concreta definida por anterior decisão e, portanto, desconhecer no todo ou em parte os bens por ela reconhecidos e tutelados. E, enquanto a excepção do caso julgado constitui a sua vertente negativa, obstando a que se discuta no processo o que já foi antes decidido, a autoridade do caso julgado encerra a vertente positiva, determinando que no segundo processo se acate o que foi decidido no primeiro. Acontece que, enquanto que alguns doutrinadores, designadamente para Alberto dos Reis (Código de Processo Civil, Anotado, Vol. III, 3ª edição, reimpressão, Coimbra Editora, 1981, pág. 139), para Lebre de Freitas (“Revista da Ordem dos Advogados”, n.º 66, Dezembro de 2006, pág. 1514) e para Remédio Marques (“Acção Declarativa à Luz do Código Revisto”, Coimbra Editora, 2007, pág. 447), defendem que o caso julgado, só se forma, em princípio, sobre a decisão contida na sentença, outros há, como Castro Mendes (“Limites Objectivos do Caso Julgado em Processo Civil”, pág. 152 e segs.) e Miguel Teixeira de Sousa (“Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, Lex, 1997, págs. 578 e 579), que defendem uma concepção mais ampla do caso julgado. Na esteira desta última doutrina, afirmou-se, no acórdão do STJ, de 22.02.2018 (revista n.º 3747/13.8T2SNT.L1.S1, acessível na dgsi), que “a autoridade do caso julgado implica o acatamento de uma decisão proferida em acção anterior cujo objecto se inscreve, como pressuposto indiscutível, no objecto de uma acção posterior, obstando assim a que a relação jurídica ali definida venha a ser contemplada, de novo, de forma diversa» e abrange, «para além das questões directamente decididas na parte dispositiva da sentença, as que sejam antecedente lógico necessário à emissão da parte dispositiva do julgado». No entanto, todos estão de acordo que os fundamentos de facto, por si só, nunca formam caso julgado, afirmando, neste sentido Remédio Marques (in “Acção Declarativa à Luz do Código Revisto”, Coimbra Editora, 2007, pág. 447), que o caso julgado «não se estende, em princípio, aos fundamentos de facto da sentença final». No mesmo sentido, refere Antunes Varela (in, “ Manual de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1984, pág. 697) que «os factos considerados provados nos fundamentos da sentença não podem considerar-se isoladamente cobertos pela eficácia do caso julgado, para o efeito de extrair deles outras consequências, além das contidas na decisão final». É também este o entendimento seguido pela nossa jurisprudência, conforme decorre do Acórdão do STJ, de 02.03.2010 (revista nº 690/09.9YFLSB), onde se afirma que «a problemática do respeito pelo caso julgado coloca-se, sobretudo, a nível da decisão, da sentença propriamente dita e, quando muito, dos fundamentos que a determinaram, quando acoplados àquela», pelo que «os fundamentos de facto, nunca por nunca, formam, por si só, caso julgado, de molde a poderem impor-se extraprocessualmente». Entendimento este perfilhado no Ac. do STJ, respeitante ao Proc. 3811/13.3TBPRD.P1.S1, de 17-05-2018, que se seguiu de perto, ao concluir que o caso julgado resultante do trânsito em julgado da sentença não se estende aos factos aí dados como provados para efeito desses mesmos factos poderem ser invocados, isoladamente, da decisão a que serviram de base. Posto isto, importa ter em conta que, como resulta do despacho saneador, aí se julgou parcialmente procedente a excepção de caso julgado invocada pelos RR., absolvendo-os da instância quanto ao pedido de reconhecimento da propriedade do prédio identificado no art. 1.º, da petição inicial, e improcedente quanto aos demais pedidos, sem que tenha sido interposto recurso dessa decisão. Acresce o facto de, também, nessa sede, se ter enunciado como tema de prova, sob o ponto 9, saber se a parcela em causa nos autos configura um caminho no uso directo, indiscriminado e imemorial, para trânsito da população da freguesia e do público em geral, afecto à circulação de pessoas, de veículo, de veículos de tracção animal, de máquinas, e de alfaias agrícolas, nas idas e vindas dos seus trabalhos e entre as habitações e propriedades rústicas circunvizinhas, para Vila de Prado e Barcelos e para se deslocarem aos serviços religiosos da igreja paroquial, na convicção de utilizarem uma infra-estrutura do domínio público e se o mesmo ainda é utilizado diariamente pelos Réus. Como tal, o tribunal a quo limitou-se a pronunciar-se sobre esse tema de prova da forma como o fez, pelo que não há excesso de pronúncia. É que diferente do exposto é já a questão de não se concordar com o decidido. Passando para a reapreciação da matéria de facto, importa ter em consideração que, neste âmbito, impera o ónus de especificação de cada um dos pontos da discórdia do recorrente com a decisão recorrida, seja quanto às normas jurídicas e à sua interpretação, seja a respeito dos factos que considera incorrectamente julgados e dos meios de prova que impunham uma decisão diferente, devendo, neste caso, indicar a decisão que, no seu entender, devia ter sido proferida sobre as questões de facto impugnadas (cf. Arts. 639.º, n.º 2 e 640.º, nºs 1 e 2 do NCPC). Assim, face ao disposto no citado art.º 640.º, n.º 1, do NCPC, quando seja impugnada a decisão da matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos da matéria de facto que consideram incorrectamente julgados [alínea a)]; os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [alínea b)]; e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas [alínea c)]. In casu, o A./Recorrente pede que se dê como provados os factos dados como não provados em aditamento à matéria factual já provada, com eliminação da que foi julgada como provada de modo ilícito (ponto 7, das conclusões de recurso), sem dar cumprimento ao ónus de impugnação nos termos que a lei o determina. É que pese embora o recorrente tenha referenciado nas suas conclusões que o tribunal a quo considerou provados factos que entende que deviam ter sido dados como não provados, elencando depois alguns pontos da matéria de facto dada como provada, o facto é que daí não retirou qualquer ilação certa, específica e concreta quanto à decisão que devia ter sido proferida relativamente a cada um deles. Tal exigência, entre as demais, decorre do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo e limitar os recursos às situações em que haja uma real discordância das decisões recorridas e para correcção de erros da decisão e não também às situações em que apenas se pretende diferir a decisão. Nessa medida, há que ter em conta que, no domínio do nosso regime recursório cível, o meio impugnatório para um tribunal superior não visa propriamente um novo julgamento global ou latitudinário da causa, mas apenas uma reapreciação do julgamento proferido pelo tribunal a quo com vista a corrigir eventuais erros da decisão recorrida. Significa isto que a finalidade do recurso não é proferir um novo julgamento da acção, mas julgar a própria decisão recorrida. Assim, considerando que as alegações do Recorrente não dão satisfação às mencionadas exigências legais, sendo que quanto ao recurso da matéria de facto não existe despacho de aperfeiçoamento ao contrário do que sucede quanto ao recurso em matéria de direito, por aplicação do disposto no art. 639.º, n.º 3 do C.P.C, tem de se rejeitar o recurso no que se refere à impugnação da decisão que fixou a matéria de facto provada e não provada. Relativamente ao apontado erro notório que o A./Recorrente diz padecer o ponto 3, dos factos provados, no que se reporta à confrontação Nascente, por considerar que, atento o teor dos docs. 1 e 2, juntos com a petição, corresponde à confrontação Sudoeste/Nordeste ‘quanto à proposição faixa de terreno com piso em terra batida e calcada’, segundo aquilo que é possível perceber do ponto 8, das suas alegações, julgamos que também não tem qualquer fundamento para se considerar existir tal erro. Na verdade, a matéria vertida nesse ponto resulta do que foi alegado pelo próprio A./Recorrente na sua petição inicial e decorre precisamente do teor das cópias da inscrição matricial, da descrição predial e da escritura de rectificação da escritura de compra e venda referente ao imóvel, com base nos quais o tribunal a quo deu tal factualidade como provada. Assim, perante o exposto, inalterada a factualidade, deve, consequentemente, manter-se a decisão proferida assente em tais factos. * IV- DecisãoNestes termos, acordam os Juízes da 2.ª Secção Cível, deste Tribunal da Relação de Guimarães, em julgar improcedente o recurso, mantendo-se, consequentemente, a decisão proferida. Custas a cargo do A./Recorrente. Registe e notifique. * Guimarães, 26 de Novembro de 2020 (O presente acórdão foi elaborado em processador de texto pela primeira signatária e assinado electronicamente pelo colectivo) Maria dos Anjos S. Melo Nogueira Desembargador José Carlos Dias Cravo Desembargador António Manuel Antunes Figueiredo de Almeida |