Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
3114/21.0T8BRG.G1
Relator: FERNANDA PROENÇA FERNANDES
Descritores: NULIDADES DA SENTENÇA
EMPREITADA
EXCEPÇÃO DE PAGAMENTO
PROIBIÇÃO DA REFORMATIO IN PEJUS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/03/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I. Perante a alegação da excepção de pagamento na contestação, a invocação na réplica de que as quantias entregues à autora se não destinavam ao pagamento solicitado na acção, mas antes ao pagamento de outros trabalhos a mais, integra mera impugnação e não a invocação de uma contra-excepção.
II. Nessa medida, cabia à ré não só provar a existência dos pagamentos, como ainda provar que os mesmos se destinaram efectivamente ao pagamento da dívida em causa nos autos.
III. A proibição da reformatio in pejus consignada no art. 635º nº 4 do CPC, consiste em a decisão do recurso não poder ser mais desfavorável ao recorrente do que a decisão recorrida.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório.

F. A., Unipessoal, Lda., sociedade unipessoal por quotas, com o número único de registo e pessoa colectiva ………, com sede na Rua …, n.º .., em … - Braga, instaurou a presente acção declarativa com processo comum, no Juízo Local Cível de Braga - Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, contra X – Mediação Imobiliária, Lda, sociedade por quotas, com o número único de registo e pessoa colectiva ………, com sede na Rua …, Braga, pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 21.172,00 a título de capital, acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos até efectivo e integral pagamento e que liquida em € 8.139,66 aquando da propositura da presente acção.
Para tanto e em suma, alegou que no âmbito da sua actividade de construção de edifícios e obras de construção civil com escopo lucrativo, celebrou com a ré em 29.12.2015 um contrato de empreitada, tendo em vista a intervenção em edifício na Rua …, n.º .., em Braga, visando a recuperação do mesmo e com o preço acordado de € 36.500,00, acrescido do IVA.
Os trabalhos contratados consistiam na demolição e transporte de entulho, execução de rebocos e enchimentos, colocação de tectos falsos, impermeabilizações/isolamentos, revestimentos, serviço de serralharias, pinturas, funilarias, pichelaria e obras sanitárias e execução de instalações eléctricas, estando contratualizado o prazo de 90 dias para a execução das obras.
A factura, a pedido da ré, foi emitida em 31.12.2015 iniciando a obra no início de Janeiro de 2016 e entregue no final de Março de 2016, sendo que a ré a aceitou sem reserva, sendo que logo então foi interpelada para o pagamento.
Sucede que a ré durante o decurso da obra fez dois pagamentos, que totalizam o valor de € 17.000,00 e só em Maio de 2019 voltou a fazer um pagamento parcial, desta feita de € 4.000,00, pelo que se mostra paga a quantia de € 21.000,00, estando em falta o pagamento de € 20.172,00.
Afirma que a primeira interpelação para pagamento ocorreu em 05.04.2016, pelo que são devidos juros desde então.
Regularmente citada, a ré contestou, excepcionando o pagamento da factura reclamada.
Mais deduziu pedido reconvencional, através do qual peticiona a condenação da autora/reconvinda a pagar-lhe a quantia de € 15.446,00 referente à sanção contratual prevista na Cláusula 5ª do Contrato de empreitada.
Notificada da contestação/reconvenção veio a autora replicar, respondendo à matéria de excepção e contestando a reconvenção.
Quanto à matéria de excepção, reconhece o pagamento, além dos que afirma efectuados na p.i. de € 3.000,00 a imputar na quantia reclamada nos presentes autos.
Mais invoca que além das quantias inicialmente indicadas e dos € 3.000,00 adicionais a que alude na réplica, foi-lhe paga a quantia de € 15.000,00, sendo, contudo, que tal quantia (resultante do somatório de vários pagamentos) visou o pagamento de trabalhos a mais e materiais que a ré lhe solicitou comprasse em seu nome e que lhe pagaria depois.
Enunciando os trabalhos a mais, refere que ascendiam ao valor de € 13.310,00 e que os aludidos materiais teriam o custo de € 1.335,29.
Invoca ainda que o pagamento de € 1.792,85, a que alude a ré na contestação se refere à colocação de cerâmica na varanda, tapamento de roços e arranjo de paredes num edifício diverso, desconhecendo, em absoluto, a vontade da S. exercer a compensação em relação ao valor de € 1.628,94, a que alude a ré na contestação. Impugna a existência de defeitos e da sua denúncia e a existência de um qualquer fundamento para aplicação das penalidades.
Por outro lado, procede à redução do pedido, reduzindo ao capital o valor de € 3.000,00, com reflexos no cálculo de juros.
Por despacho com a Ref.ª 175748222 foi homologada a redução do pedido, admitida a reconvenção deduzida e proferidos os despachos a que aludem os artigos 595º e 596º do CPC.
Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
“IV. DISPOSITIVO
Nestes termos, e face ao exposto, julga-se a ação parcialmente procedente e em consequência:
a) Condeno a ré X – Mediação Imobiliária, Lda. a pagar à autora a quantia de € 6.228,94, acrescida da quantia correspondente ao valor dos trabalhos a mais a que se alude em 12) e 15) dos factos provados, a apurar, em incidente de liquidação, acrescida dos juros de mora calculados sobre tais quantias desde a citação da ré, em 07/06/2021, até efetivo e integral pagamento.
b) Absolvo a ré do restante peticionado pela autora.
c) Absolvo a autora/reconvinda do pedido reconvencional contra si deduzido pela ré/reconvinte.
Custas pelas partes na proporção do respectivo decaimento (cfr. artigo 527º do CPC).
Registe e notifique.”.
*
Inconformada com esta decisão, dela interpôs recurso a ré, a qual a terminar as respectivas alegações, formulou as seguintes conclusões, que se transcrevem:
“Conclusões:

1. Termina a douta sentença ora em crise com a condenação da Ré/Recorrente: a pagar à Autora/Recorrida a quantia de 6.228,94€ (seis mil duzentos e vinte e oito euros e noventa e quatro cêntimos), acrescida da quantia correspondente ao “valor dos trabalhos a mais” a apurar em incidente de liquidação;
2. Mas a Autora/Recorrida não fez qualquer pedido de condenação da Ré/Recorrente nesse sentido, ou seja, a Autora/Recorrida não pediu nestes autos a condenação da Ré/Recorrente a tal pagamento de “trabalhos a mais”;
3. E tanto assim é, que dos autos não consta a identificação de qualquer valor respeitante aos referidos “trabalhos a mais”, pelo que, ao condenar a Ré/Recorrente para além daquilo que foi peticionado nos autos, o Tribunal a quo teve que se socorrer do incidente de liquidação de sentença para apurar tal valor;
4. À ação que lhe foi movida pela Autora/Recorrida a Ré/Recorrente apresentou contestação onde se defendeu por exceção e onde formulou pedido reconvencional e em resposta à exceção invocada do pagamento, veio a Autora/Recorrida no seu articulado que apelidou de “Resposta” dizer que: “(…) embora os pagamentos identificados pela Ré tenham existido, eles não se destinavam totalmente ao pagamento desta dívida. (…) Embora a A. possa confirmar, que recebeu as quantias de €1.500,00, € 4000,00; e € 2000,00, além dos referidos €7500,00, a que a Ré alude.
Nenhum desses pagamentos no total de €15.000,00 se destinavam a pagar valores aqui peticionados, mas sim serviços extras não incluídos na empreitada (…), Sublinhado nosso, (cfr. articulado de resposta junto aos autos a 20.09.2021) é apenas neste articulado, que apenas serve para resposta à matéria alegada na Reconvenção, que a Autora/Recorrente vem mencionar a existência dos referidos “trabalhos a mais”;
5. Perante esta alegação da existência dos ditos “trabalhos a mais” e contrariamente àquilo que seria de esperar, a Autora/Recorrida não vem ampliar o seu pedido primitivo, no sentido de contemplar no mesmo, a condenação da aqui Ré/Recorrida ao pagamento dos mesmos;
6. Isto porque, a Autora/Recorrida considera que os tais trabalhos “a mais” que a mesma alega ter existido, estão pagos, Veja-se que diz a Autora/Recorrida ter recebido os pagamentos mencionados pela Ré/Recorrente no seu articulado de contestação;
7. Diz, no entanto, que tais pagamentos não se destinavam ao pagamento dos trabalhos peticionados nos autos, mas antes, ao pagamento de “serviços extras não incluídos na empreitada.” Sublinhado nosso, (cfr. articulado de resposta junto aos autos a 20.09.2021);
8. Curiosamente, no referido articulado de “Resposta”, aliás onde alega a existência daqueles “trabalhos extra” a Autora/Recorrida não ampliou o pedido, antes, veio reduzir o mesmo pois menciona que “peticionou, erradamente valor superior ao que lhe é devido”, pelo que, reduz o pedido ao valor de 26.500,00€ (vinte e seis mil e quinhentos euros), (cfr. articulado de resposta junto aos autos a 20.09.2021);
9. Veja-se que, não existe nem nunca existiu qualquer pedido da Autora/Recorrida, no sentido da condenação da Ré/ Recorrente ao pagamento dos referidos “trabalhos a mais” que, aliás a aquela não discrimina nem quantifica, aliás a menção à existência de tais “trabalhos extra”, surge apenas para a Autora/Recorrida obter um pagamento que sabe não lhe ser devido;
10. Torna-se óbvio que, ao reconhecer ter recebido a totalidade da quantia peticionada, paga pela Autora/Recorrente, para justificar esta lide a Autora/Recorrida socorreu-se da realização dos alegados trabalhos “a mais” que aliás, reitera-se não existiram e, claro está, não poderia a Autora/Recorrida formular um pedido de pagamento quanto aos trabalhos “a mais” ou, ficaria sem resposta à exceção do pagamento, invocado pela Ré/Recorrente;
11. Não obstante, a Meritíssima Juiz a quo substituiu-se à Autora/Recorrida e condenou a Autora/Recorrente ao pagamento dos referidos “trabalhos a mais” sem que tal condenação alguma vez tivesse sido peticionada;
12. Nestes termos, ao condenar A Ré/Recorrente nos termos descritos, a douta sentença ora em crise condena em objeto diverso daquilo que foi peticionado pela Autora/Recorrida e, por esse motivo a douta sentença ora em crise é nula, assim e nos termos do disposto no artigo 615º, nº 1, e) do Código de Processo Civil deve a douta sentença ora em crise ser declarada nula, com as demais consequências legais;
13. O mesmo sucede quanto à alegação da Autora/Recorrida no sentido de imputar os pagamentos efetuados pela Ré/Recorrente a “materiais”: Ao responder à exceção do pagamento, invocada pela Ré/Recorrente, a Autora/Recorrida alegou que os pagamentos recebidos se destinavam não só aos referidos “trabalhos extra”, “bem como, alguns materiais usados na execução da empreitada e que a Ré pediu que a A. comprasse em seu nome comprometendo-se a pagar-lhos depois.”. Sublinhado nosso, (cfr. articulado de resposta junto aos autos a 20.09.2021);
14. Sucede que, também no que respeita aos materiais, refere a cláusula OITAVA do contrato de empreitada em causa que: “ Fica acordado que o dono da obra fornece os materiais, nomeadamente, tijolos, cimento, colas, cerâmicos, massas betuminosas, impermeabilizantes, pedras de soleira e revestimentos, tintas e pré revestimentos, tubos e outros utensílios.”; Ou seja, pelo exposto se retira, mais uma vez, a falsidade dos argumentos trazidos aos autos pela Autora/Recorrida, que também mais uma vez, para justificar o recurso a esta lide e na tentativa de obter um pagamento que sabe não lhe ser devido vem dizer que pagou materiais;
15. Ora, também no que respeita aos materiais, existe convenção escrita no contrato de empreitada que refere serem os mesmos fornecidos pela aqui Ré/Recorrida (Dona da Obra), convenção, essa, que consta dos “FACTOS PROVADOS” da douta sentença ora em crise e que no seu ponto 3 dá por reproduzido na íntegra o contrato de empreitada celebrado entre a Ré/Recorrente e a Autora/Recorrida;
16. Nada consta do referido contrato de empreitada, no sentido de ter existido qualquer alteração ao que ficou contratado, sendo certo que, dos depoimentos prestados também nada resulta nesse sentido, não obstante a douta sentença ora em crise não ter dado como provados os factos ali alegados, ou seja, o facto de os pagamentos invocados pela Ré/Recorrente se destinarem em parte ao pagamento de materiais, o certo é que, deu como provada a realização de “trabalhos a mais” e condenou a Ré/Recorrente ao seu pagamento;
17. Mas mais uma vez, a douta sentença ora em crise vai além daquilo que é peticionado. Não tendo sido feito prova quanto ao pagamento de materiais pela Autora/Recorrida e não tendo a mesma especificado o valor dos “trabalhos a mais” que a mesma considera pagos, apenas poderia proceder a exceção do pagamento invocada pela Ré/Recorrente, isto porque, a Autora/Recorrida não especifica que valores se destinaram a pagamentos de materiais e que valores destinaram a pagamentos de “trabalhos a mais”, assim sendo, a resposta à exceção invocada pela Autora/Recorrida só pode ser julgada improcedente, pelo que, deve a exceção invocada do pagamento, invocada pela Ré/Recorrida ser julgada procedente pro provada com a sua necessária e consequente absolvição do pedido;
18. A sentença não pode condenar em quantidade superior ou, em objeto diverso do que se pedir, pelo que, a sentença que o faça, aliás tal como sucede com a sentença ora em crise, será nula. A proibição de condenação em quantidade superior à do pedido está consignada no artigo 609º, n.º 1 do Código de Processo Civil, o qual determina que: “1 - A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir.”;
19. Esta proibição é justificada pela ideia de que compete aos sujeitos processuais, a definição do objeto do litígio, não cabendo ao juiz o poder de se sobrepor à vontade destes;
20. Por outro lado, não é razoável, que a aqui Ré/Recorrente seja surpreendida, aliás como acabou por suceder, com uma condenação diferente daquela que foi pedida pela Autora/Recorrida e mais gravosa do que a pretendida por esta;
21. É o respeito pelo princípio do dispositivo que impede o tribunal de condenar em quantia superior ou em objeto diverso do que for pedido.
22. Determina o artigo 5º, nº 1 do Código de Processo Civil, que: “às partes cabe alegar os factos essenciais que integram a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as exceções invocadas”;
23. Entendeu a Autora/Recorrida, nestes autos, alegar a existência de “trabalhos extra” para responder à exceção do pagamento, porém entendeu também não retirar qualquer consequência dessa alegação (para além da já identificada resposta à exceção), ou seja, a Autora/Recorrida fez-se valer do alegado pagamento de “trabalhos extra” – que aliás nunca existiram - para manter a sua tese e perante a alegação do pagamento, pela Ré/Recorrente da quantia peticionada, afirmar que os pagamentos que confessou ter recebido se destinavam não ao pagamento da fatura em causa, mas antes, dos referidos trabalhos extra;
24. No entanto e como seria de prever a Autora/Recorrida não retira qualquer consequência da sua alegação quanto aos “trabalhos extra”, a não ser a resposta à exceção perentória do pagamento, ao condenar a Ré/Recorrente ao pagamento de tais “trabalhos extra” que, aliás reitera-se, nunca existiram, a Meritíssima Juiz a quo, substituiu-se à Autora/Recorrida;
25. A douta sentença ora em crise, ao decidir como decidiu, violou o disposto no artigo 609º do Código de Processo Civil, assim e pelo exposto, deve o presente recurso de Apelação ser julgado procedente por provado e, em consequência deve a douta sentença ora em crise ser declarada nula, com as demais consequências legais;
26. Dispõe o artigo 393º do Código Civil que: “Se a declaração negocial, por disposição da lei ou estipulação das partes, houver de ser reduzida a escrito ou necessitar de ser provada por escrito, não é admitida prova testemunhal.”. (Sublinhado nosso) e o artigo 394º nº 1 do Código Civil determina que: “É inadmissível a prova por testemunhas, se tiver por objeto quaisquer convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo de documento autêntico ou dos documentos particulares mencionados nos artigos 373.º a 379.º, quer as convenções sejam anteriores à formação do documento ou contemporâneas dele, quer sejam posteriores.”.;
27. No seu articulado de contestação, a Ré/Recorrente, juntou aos autos o contrato de empreitada objeto dos mesmos, o qual, na sua cláusula “QUARTA” diz o seguinte: “Quaisquer modificações, solicitadas pelo DONO DA OBRA, aos trabalhos referidos na cláusula primeira, implicando alterações de preços e prazos, deverão ser expressas, necessariamente, em documentos escritos, que passarão a fazer parte integrante do presente contrato.”;
28. O documento em causa não foi impugnado pela Autora/Recorrida, pelo que, nos termos do disposto no artigo 376º do Código Civil o mesmo faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor;
29. Os “trabalhos a mais” que a douta sentença ora em crise deu como provados, a terem existido – o que não se concede - sempre seriam de enquadrar na previsão da cláusula transcrita;
30. Ou seja, sempre teriam que constar de documento escrito e, logo, sempre teriam que fazer parte integrante do contrato de empreitada mas tal não sucedeu, não obstante, o Tribunal a quo deu como provada a existência de tais “trabalhos a mais” com base unicamente nos depoimentos prestados em sede de audiência discussão e julgamento;
31. Porém, nos termos das normas citadas e tendo o contrato de empreitada em causa sido reduzido a escrito, sobre o mesmo e sobre o seu objeto não pode ser admitida prova testemunhal, sucede que, nos termos das normas citadas, não poderia a Meritíssima Juiz a quo tê-lo feito, ou seja, não poderia ter valorizado qualquer depoimento no sentido de dar como provadas “convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo de documento”;
32. Ao tê-lo feito, violou a douta sentença, o disposto no artigo 393º, nº 1 e no artigo 394º, nº1 do Código Civil, e nem se diga que o documento nº 1 junto com o articulado de “Resposta” pela Autora /Recorrida a 20.09.2020, aos autos, tem dignidade processual para provar a “redução a escrito” dos referidos “trabalhos a mais”, pois o documento em causa está manuscrito, não está assinado por nenhuma das partes e foi impugnado pela Ré/Recorrente;
33. Assim sendo, não poderia a prova testemunhal produzida em sede de audiência discussão e julgamento, alguma vez servir para dar como provada a existência dos “trabalhos a mais” como consta da referida sentença.
34. Nestes termos, deve o presente recurso de Apelação ser julgado improcedente por não provado, dando-se como não provada a realização dos referidos “trabalhos a mais” com a necessária e consequente absolvição da Ré/Recorrida do pedido, porquanto ficou provado ter a mesma pago, à Autora/Recorrente o montante peticionado.
TERMOS EM QUE:
Julgando o presente recurso procedente por provado e absolvendo a Ré/Recorrida do pedido nos termos requeridos, farão V. Exas. Venerandos Desembargadores a habitual, JUSTIÇA!”.
*
Contra-alegou a autora, terminando com as seguintes conclusões:
“Conclusões:

A) Não foi impugnada a matéria de facto da douta sentença recorrida;
B) A douta sentença recorrida não condena em valor superior ao peticionado, nem em objecto distinto do pedido;
C) A Apelada em articulado de resposta explicou que pagamentos da Apelante se destinavam a trabalhos a mais, não que estivessem todos pagos;
D) A douta sentença recorrida apurou da existência de trabalhos a mais, até pelas declarações de parte da Apelante, parcialmente pagos, conforme documentos juntos pela própria Apelante;
E) Daí que na parte da sentença onde se condena a pagar trabalhos a mais a liquidar em execução de sentença não haja condenação em objecto diferente do pedido;
F) Ao dar como provada a existência de trabalhos a mais a douta sentença recorrida não viola o disposto nº artº393º, nº 1 e 394º, nº 1, ambos do Cód. Civil, nem faz uso de prova proibida porque a prova de convenção ulterior ao contratado resulta também de outros documentos e declarações de parte da Apelante.
TERMOS EM QUE, deve a presente Apelação ser julgada improcedente com a legal consequência de manutenção da douta decisão recorrida, assim fazendo Justiça.”.
*
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
*
II. Objecto do recurso.

Sendo o âmbito dos recursos delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do CPC - ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste Tribunal consistem em saber:

1 - das invocadas nulidades da sentença;
2 - se deve a sentença apelada ser revogada/alterada, considerando-se procedente a invocada excepção de pagamento.
*
III. Fundamentação de facto.

Os factos que foram dados como provados na sentença sob recurso são os seguintes:
“1) A autora é uma sociedade unipessoal por quotas que se dedica, além do mais, à construção de edifícios e obras de construção civil, com intuitos lucrativos.
2) Por sua vez, a ré dedica-se à atividade de mediação imobiliária.
3) Autora e ré celebraram acordo escrito, denominado “Contrato de Empreitada para Intervenção em Edifício na Rua ... n.º … em Braga no âmbito do Plano de Regeneração Urbana de Braga”, datado de 29/12/2015, de acordo com o qual:
CLÁUSULA PRIMEIRA
Um – O EMPREITEIRO obriga-se a fazer de empreitada com mão de obra, por si fornecida, todos os trabalhos descritos no anexo I, do presente contrato.
Dois – Relação das obras incluídas na presente empreitada: As obras a efetuar são as descritas no mapa de trabalhos a executar que se anexa a este contrato e que faz parte integrante do mesmo.
Três – O EMPREITEIRO declara ter-se inteirado devidamente das obras a realizar, comprometendo-se a executar todos os trabalhos dentro das melhores normas de construção, sendo responsável pelos trabalhos executados, pelo prazo que a lei estipular e estiver em vigor. Para compreensão dos trabalhos foi promovida uma reunião entre J. J., C. S. e F. A., em que foram detalhados todos os pontos do anexo I, sendo explicados e compreendidos por ambas as partes.
Quatro – São da exclusiva responsabilidade do EMPREITEIRO os custos com o pessoal utilizado na obra que pelo presente contrato lhe é adjudicada, designadamente com impostos, seguros e segurança social. Deverá antes do início da mesma ter em dia seguros e outras obrigações impostas por lei.
SEGUNDA
Um – O preço fixo global de execução dos trabalhos referidos neste contrato é de € 36.500,00€ (trinta e seis mil e quinhentos euros) no qual se encontra excluído o valor de IVA à taxa em vigor, sendo que o imposto em questão deverá cumprir o estipulado na Lista I anexa ao Código do IVA (CIVA), verba 2.27, na sequência da renumeração e republicação do CIVA efetuada pelo Decreto-Lei n.º 102/2008, de 20/06/2008.
TERCEIRA
Os trabalhos abrangidos pela presente empreitada deverão estar concluídos na totalidade no prazo de 90 dias úteis após a data da adjudicação que será a data de assinatura do contrato.
QUARTA
Quaisquer modificações, solicitadas pelo DONO DA OBRA, aos trabalhadores referidos na cláusula primeira, implicando alterações de preços e prazos, deverão ser expressas, necessariamente em documentos escritos, que passarão a fazer parte integrante do presente contrato.
QUINTA
Caso o EMPREITEIRO não conclua a obra, por qualquer razão, no prazo estabelecido, isto é, no prazo de 90 dias úteis após a data de adjudicação, acrescido de eventuais prorrogações acordadas, será obrigado a pagar ao DONO DA OBRA, até ao fim dos trabalhos ou até à resolução do contrato, uma multa contratual diária no montante de 50.00€ (...quenta euros).
SEXTA
Em caso de dúvida ou desacordo entre as partes sobre a interpretação e/ou integração do presente contrato, far-se-á apelo às disposições do Código Civil, na parte relativa aos contratos de empreitada.
SÉTIMA
Os trabalhos a executar são descritos conforme o projeto de arquitetura apresentado para orçamento e execução de obra. Deve o empreiteiro garantir a qualidade na execução assim como na aplicação dos materiais. No não definido em projeto, acordam as partes que deverá ser fornecida e ou elucidada a execução pelo arquiteto do projeto.
OITAVA
Fica acordado que o dono de obra fornece os materiais, nomeadamente, os tijolos, cimento, colas, cerâmicos, massas betuminosas, impermeabilizantes, pedras de soleira e revestimentos, tinta e pré revestimentos, tubos e outros utensílios.
NONA
Fica acordado que o empreiteiro fornece toda a mão de obra para a execução de todos os serviços, nomeadamente na demolição, aplicação de todos os materiais conforme discriminado em projeto de arquitetura.
DÉCIMA
Todas as ferramentas são por conta do empreiteiro. Toda a descarga do material é com recurso a mão de obra do empreiteiro.
DÉCIMA PRIMEIRA
Para evitar atrasos no prazo de conclusão da obra, deve o empreiteiro solicitar por email dirigido ao dono da obra, os materiais necessários a aplicar, com um prazo mínimo de 15 dias antes da aplicação.
DÉCIMA SEGUNDA
Os pagamentos terão lugar mensalmente após conferência do auto de medição efetuado pelas partes.
DÉCIMA TERCEIRA
Faz parte integrante deste contrato a proposta apresentada pelo empreiteiro. (…)”
4) De acordo com o Anexo I, os trabalhos a executar pela autora na Rua ..., n.º .., eram: “Execução de todas as demolições necessárias para cumprimento do projeto de arquitetura (plantas “Proposta”), incluindo a carga do entulho para contentores a fornece pelo cliente, sendo o tratamento do entulho por conta do cliente.
Execução de demolição de revestimentos e enchimentos de pavimentos e remoção de todos os produtos sobrante para contentor. NOTA: Caso se venha a verificar a necessidade de demolição dos revestimentos enchimentos dos pavimentos este valor está considerado.
Demolição de degraus das escadas do prédio desde o r/ch ao 3 andar inclusive, assim como desmontagem do corrimão existente e execução do maciço para apoio do elevador no piso de entrada, conforme especificação da Ottis.
Fixação de estrutura metálica sob as escadas, na sala comum, caso seja necessário, para suporte da escada, com as medidas aproximadas de 2,50 m x 3,40 m.
Execução de laje aligeirada para fecho da abertura no pavimento do sótão, na zona da escada existente.
Assentamento de alvenaria simples em tijolo cerâmico com 30x20x11cm, assente com argamassa de cimento de areia ao traço 1:5 para a instalação do recuperador de calor, cimento e areia por conta do empreiteiro.
Assentamento de alvenaria e respetiva impermeabilização com serezite e posterior impermeabilização com agentes físicos ou químicos do canteiro do Piso 1.
Assentamento de alvenaria simples em bloco de termoargila, 15 cm de espessura, assente em argamassa de cimento e areia ao traço 1:5 para a instalação do recuperador de calor, cimento e areia por conta do empreiteiro.
Assentamento de alvenaria simples em bloco de betão com 50x20x15, assente com argamassa de cimento e areia ao traço 1:5. Cimento e areia por conta do empreiteiro.
Assentamento de grade no piso 1.
Assentamento de alvenaria simples em tijolo de vidro, no duche WC privativo, com as medidas aproximadas de 0,85 x 2,0 m.
REBOCOS E ENCHIMENTOS
Fornecimento e execução de betonilha com 4 cm de espessura média e acabamento sarrafado, em enchimento e regularização de pavimentos interiores, executada com argamassa de cimento e areia ao traço 1:4, fabricada em obra.
Execução de betonilha com 4 cm de espessura média e acabamento afagado, para materialização de pendentes, no terraço e varanda, executada com argamassa de cimento e areia ao traço 1:4, fabricada em obra.
Execução de betonilha com 6 cm de espessura média e acabamento sarrafado, armada, sobre sistema de impermeabilização do terraço e varanda, executada com argamassa de cimento e areia ao traço 1:4, fabricada em obra.
Execução de emboço e reboco com 3 cm de espessura média e acabamento sarrafado, em paredes interiores de alvenaria de tijolo, executado com argamassa de cimento e areia ao traço 1:4, fabricada em obra.
Fornecimento e execução de estuque manual em tetos com 2 cm de espessura, incluindo barramento em massa fina.
Fornecimento e execução de estanhado em todas as paredes que necessitem de reparos ou que sejam feitas novas.
TETOS FALSOS
Fornecimento e montagem de teto falso e sancas em toda a área da casa constituído por:
- 1 placa de gesso laminado standard (normal) com 13 mm de espessura;
- estrutura horizontal em perfis metálicos galvanizados afastados a 50 cm;
- Suspensões em varão roscado 06 mm até 1 m de altura;
- Banda de Papel em juntas;
- Barramento de juntas com massa de secagem rápida;
- Acessórios de fixação;
Fornecimento e montagem de teto falso interior nas áreas das casas de banho e cozinha constituído por:
- 1 placa de gesso laminado standard (normal) com 13 mm de espessura;
- estrutura horizontal em perfis metálicos galvanizados afastados a 50 cm;
- Suspensões em varão roscado 06 mm até 1 m de altura;
- Banda de Papel em juntas;
- Barramento de juntas com massa de secagem rápida;
- Acessórios de fixação;
IMPERMEABILIZAÇÕES/ISOLAMENTOS
Aplicação de isolamento térmico com painéis de lã mineral sobre os tetos falsos;
Execução de sistema de isolamento térmico ETICS com placas EPS 60 mm, para isolamento térmico da nova parede no terraço do piso 1, para posterior revestimento com cerâmico imitação de xisto.
Aplicação de barramento de impermeabilização, armado, em parede e pavimentos de zonas húmidas (WC´s e cozinha).
Execução de impermeabilização no pavimento do terraço do piso 1, composta por isolamento térmico XPS (sistema cobertura invertida), aplicado sobre betonilha de pendentes, constituída por:
- Emulsão betuminosa aplicada como primário de impermeabilização, tipo IMPERKOTE F;
- Membrana de betume polímero APP de 3,0 KG/m2 com armadura de fibra de vidro de 50 gr/m2, protegida a Polietileno em ambas as faces, tipo POLYPLAS 30;
- Membrana de betume polímero APP de 4,0kg/m2 com armadura de poliéster de 150 gr/m2, protegida em ambas as faces com polietileno, tipo POLYESTER 40T;
- Isolamento térmico em placas de poliestireno extrudido tipo roofmate SL com 60 mm de espessura;
- Manta geotêxtil de polipropileno com 150 gr/m2 como camada separadora;
Execução de impermeabilização no pavimento da varanda da cozinha, constituída por:
- Emulsão betuminosa aplicada como primário de impermeabilização, tipo IMPERKOTE F;
- Membrana de betume polímero APP de 3,0 KG/m2 com armadura de fibra de vidro de 50 gr/m2, protegida a Polietileno em ambas as faces, tipo POLYPLAS 30;
- Membrana de betume polímero APP de 4,0kg/m2 com armadura de poliéster de 180 gr/m2, protegida em ambas as faces com polietileno, tipo POLYESTER 40T;
- Manta geotêxtil de polipropileno com 150 gr/m2 como camada separadora;
REVESTIMENTOS
Aplicação de pavimento flutuante termolaminado da classe AC4, com acabamento sintético, da marca Finsa, com 8 mm de espessura, incluindo espuma de polietileno, na cozinha e sala do piso 1.
Aplicação de soalho flutuante vinílico, WICANDERS HYDROCORK, com 8 mm de espessura, incluindo espuma de polietileno, na cozinha e sala do piso 1.
Aplicação de pavimento em soalho de taco espinhado ou cutelo em eucalipto, incluindo raspagem e envernizamento com 1 demão de tapa poros e 2 demãos de verniz cera Duro... da ... aplicado de acordo com indicações do fabricante, em todas as áreas que se mostre necessário.
Levantamento, limpeza e colagem de taco existente (soalho de taco espinhado conforme original), incluindo raspagens e e envernizamento com 1 demão de tapa poros e 2 demãos de verniz cera Duro... da ... aplicado de acordo com indicações do fabricante, em todas as áreas da casa.
Aplicação de revestimento de pavimento com taco de eucalipto nas áreas em que o existente não seja possível recuperar e áreas de demolição.
Assentamento de mosaico cerâmico 20x20cm em pavimentos interiores, assente em cimento cola, incluindo tomação das juntas, na lavandaria e WC piso 1.
Assentamento de azulejo com 20x20cm em paredes interiores, assente com cimento cola, incluindo tomação das juntas, na lavandaria e WC piso 1.
Assentamento de ladrilho ou outro material cerâmico ou mármore Estremoz, em pavimentos interiores, assente em cimento de cola de ligantes mistos e refechamento de juntas com betume de juntas, no WC comum nas casas de banho.
Retirada dos peitoris e soleiras existentes e assentamento de novas na área da sala e cozinha (fachada Norte).
Fornecimento e assentamento de revestimento em mármore Estremoz branco médio, 2 cm espessura, estereotomia a definir, com veio “casado”, em paredes interiores, assente com cimento cola de ligantes mistos e refechamento de juntas com betume de juntas, nas casas de banho.
Assentamento de mosaico cerâmico Revigrês Xisto Preto 30x60cm em pavimentos exteriores, assente com cimento cola tipo Weber Col Flex L e betumagem das juntas com tipo betume weber color flex em cor preto, na varanda da cozinha e terraço piso 1.
SERRALHARIAS
Fornecimento, execução e montagem de estrutura metálica para as escadas, constituída por um único perfil central, incluindo cabos de aço, conforme desenho.
PINTURA
Aplicação de esmalte em duas demãos sobre rodapé existente, com 6 cm de altura, incluindo preparação de superfícies e lixagem entre demãos.
Aplicação de esmaltes em duas demãos sobre portas aros existentes e apainelados ou caixas das persianas, incluindo preparação das superfícies e lixagem entre demãos, em vãos com as seguintes dimensões:
Aplicação de esmalte em duas demãos sobre pladur da caixa de escadas, incluindo preparação das superfícies e lixagem entre demãos.
Estanhamento das paredes para necessária pintura.
Aplicação anti-fungos e tinta plástica, cor a definir, em duas demãos, sobre paredes interiores, incluindo preparação prévia das superfícies e lixagem entre demãos.
Aplicação anti-fungos e tinta plástica, cor a definir, em duas demãos, sobre tetos interiores, incluindo preparação prévia das superfícies e lixagem entre demãos.
Fornecimento e aplicação de tinta crílica, cor a definir, em duas demãos, em paredes exteriores.
FUNILARIAS
Aplicação de rufos e caleiras na cobertura
PICHELARIA E OBRAS SANITÁRIAS
Aplicação de tubagens de esgotos para a execução das casas de banho privativa e cozinha conforme projeto.
Aplicação de todas as louças sanitárias e bases de chuveiro.
Execução da rede de águas quentes e águas frias em tubo de cobre ou multicamada com ligação a bomba de calor aplicada sob piso 1.
Pré instalação de aquecimento central em todos os compartimentos da casa, conforme norma que garanta o aquecimento com todos os materiais por conta do empreiteiro.
Instalação de recuperador de calor dupla face incluindo aplicação de chaminé, revestimento, aplicação de pedra de revestimento e ligação a rede de águas quentes e radiadores.
INSTALAÇÕES ELÉTRICAS
Execução de circuitos elétricos de alimentação de tomadas, iluminação ITED, rede, conforme projeto incluindo material, excluindo candeeiros e focos.
NOTAS
A carga ou descarga dos materiais é por conta do empreiteiro, sendo que o fornecimento terá que ser por conta do dono de obra e posto à porta do Prédio da Rua ..., n.º ...”
5) O prédio identificado em 3) destinava-se a ser habitado, como sucede, pelo Sr. J. J., legal representante da ré, e esposa, I. C..
6) A fatura correspondente, FT 2015/37, com o valor de € 41.172,00 (IVA total de € 4.672,00 incluído) foi emitida, a pedido da ré, que nisso tinha interesse, em 31/12/2015 e vencimento na mesma data.
7) A obra foi iniciada no início de Janeiro de 2016
8) Para pagamento do preço acordado, a ré entregou à autora:
7.1. Em 01/02/2016 a quantia de € 7.000,00;
7.2. Em 02/02/2016 a quantia de € 10.000,00; e
7.3. Em 08/04/2016 a quantia de € 3.000,00.
9) Ademais:
8.1. Em 25/08/2016, J. J. transferiu a quantia de € 7.500,00 para a conta da autora;
8.2. Foi transferida para a conta da autora, em 12/01/2017, a quantia de € 1.500,00;
8.3. Foi transferida para a conta da autora, em 11/01/2017, a quantia de € 4.000,00;
8.4. Foi transferida para a conta da autora, em 04/05/2017, a quantia de € 2.000,00;
8.5. Foi transferida, em 26/03/2018, a quantia de € 1.792,85, para a conta da autora pela ré; e
8.6. Foi transferida, em 08/05/2019, a quantia de € 4.000,00, para a conta da autora pela ré.
10) A empresa S. & Energy, S.A., declarou ter recebido da autora, de quem é credora, a quantia de € 1.628,94.
11) Parte dos trabalhos da responsabilidade da autora dependiam da execução de trabalhos por parte do carpinteiro, contratado pela ré, que implicaram um atraso na conclusão dos trabalhos a cargo da autora de, pelo menos, 3 meses.
12) Também o telhado e caixa de elevador foram entregues a um terceiro, que atrasou os trabalhos, por período não concretamente apurado e, ademais, provocou danos nos tetos do piso de cima, que tiveram que ser reparados, desconhecendo-se o concreto valor da reparação.
13) Apesar de estar prevista apenas a colocação de roofmate no pavimento do terraço do piso 1, foi aplicado este isolamento inclusive nas partes em que estava prevista apenas a colocação de lã de rocha, o que determinou o pagamento da quantia de € 1.300,00.
14) Por não terem, o legal representante da ré e mulher, gostado da cor inicialmente escolhida, deram indicação para ser aplicada tinta de cor diferente, o que sucedeu nos quartos e cozinha, pelo que foi paga a quantia de € 1.350,00.
15) Foi solicitada pelo legal representante da ré aos trabalhadores da autora a aplicação de pladur no fogão de sala, o que aqueles fizeram, desconhecendo-se o valor de tal trabalho.
16) Também a impermeabilização do pavimento do terraço do piso 1 foi alterado, do inicialmente previsto para tela líquida, o que determinou o pagamento da quantia de € 1.950,00.
17) Obra foi entregue em data não concretamente apurada, sem que a ré tivesse enunciado quaisquer reservas.
18) A autora remeteu à ré “Aviso de Cobrança”, datado de 16/12/2020, em que reclamava o pagamento da quantia de € 20.172,00 referente à fatura a que se alude em 5).
19) Em resposta e através de Mandatário, a ré respondeu por carta datada de 29/01/2021, na qual pode ler-se “Na verdade e como é do perfeito conhecimento de V/ Exa, a referida fatura 2015/37 respeita a serviços de construção civil realizados por V/ Exa na obra do N/ constituinte, sita na Rua ..., n.º .., em Braga, a qual foi mal executada por V/ Exa e padece de diversos defeitos os quais já foram transmitidos pelo Sr. J. J..
Defeitos esse que V/ Exa se comprometeu a corrigir, mas que até à presente data não o fez.
No entanto, e não obstante os defeitos de que padece a obra realizada por V/ Exa, o N/ constituinte foi efetuando pagamentos ao longo do tempo por conta da referida fatura, tendo sido pago até à presente data, por conta da fatura n.º 2015/37 a quantia de € 38.421,79. Sendo que os restantes € 2.750,21 encontram-se caucionados e a aguardar que V. Exa. proceda à correção dos defeitos existentes na obra do N/ constituinte, sita na Rua ..., n.º .., em Braga.”
20) Na verdade, a colocação da base de chuveiro numa das casas de banho, que apresenta um pendente incorreto, provocando a saída de água, desconhecendo-se o valor da substituição da base.
21) Surgiu, ademais, em data não concretamente apurada, problemas de infiltração relacionados com uma base de chuveiro, que foi participada e ressarcida como dano de água por companhia de seguros, tendo os trabalhos de reparação sido assegurados pela B., sendo que o valor da reparação ascendeu a cerca de € 2.000,00.
22) Só na sequência da presente ação, decidiu a ré aplicar à autora a cláusula penal à razão de € 50,00/dia.”.
*
Quanto aos factos não provados e irrelevantes, consignou-se o seguinte:
“Não se provou que:

a) o prazo de conclusão dos trabalhos fosse de 90 dias corridos e terminasse concretamente em 31/03/2016;
b) os trabalhos contratados hajam sido entregues pela autora à ré em final de Março de 2016 e logo em 05/04/2016 a autora tenha interpelado a ré para efetuar o pagamento;
c) a ré sempre tenha dito que irá pagar o valor de € 20.172,00 em falta;
d) a ré tenha pago a totalidade da fatura identificada em 6 dos factos provados;
e) em 17/12/2016 a obra estivesse longe de ser concluída por culpa única e exclusiva da autora, que apenas a entregou durante o mês de Março de 2017;
f) logo aquando da entrega da obra a ré, através do seu legal representante, tenha comunicado verbalmente à autora uma série de incumprimentos e defeitos dos trabalhos realizados e que a autora tenha aceitado a existência dos mesmos, vindo a protelar, desde então, intervenção para correção que a autora vem protelando desde então;
g) defeito na execução dos trabalhos estivesse a afetar o andar inferior (2º andar), motivando a intervenção da empresa especializada B. – Serviços Técnicos e Assistência, Lda.;
h) a autora tenha executado os seguintes trabalhos a mais, relativamente ao contratado:
- pintura da varanda - € 950,00;
- pintura da casa das máquinas – € 1.275,00;
- pintura do elevador - € 2.695,00;
- alteração da porta da casa de banho - € 350,00;
- colocação de pladur no sótão - € 950,00; e
- colocação de pladur nos tetos e execução de parede em pladur na sala, bem como partir viga para assentar pladur - € 2.175,00.
i) os trabalhos a que se alude em 12) dos factos provados tenha concretamente o custo de € 290,00;
j) no decurso da obra a ré haja pedido à autora para fornecer diversos materiais, que lhe competia fornecer, no valor de € 1.335,29;
k) o valor a que se alude em 10) dos factos provados tenha visado pagar parte do valor da fatura reclamada nos autos; e
l) o pagamento de € 1.792,85 a que se alude em 10) dos factos provados se tenha destinado ao pagamento da aplicação de cerâmica na varanda, tapamento de roços e arranjo das paredes num edifício da Rua …, em Braga, a pedido da ré e que para a aludida obra a autora haja orçamentado outros trabalhos que não lhe foram adjudicados.
C) A demais matéria contida nos articulados não releva para a decisão da causa, é conclusiva ou de direito, pelo que não foi aqui considerada.”.
*
IV. Do objecto do recurso.

Delimitadas que estão, sob o n.º IV, as questões a decidir, é o momento de as apreciar.
Invoca a apelante que a sentença recorrida é nula, nos termos dispostos pelo art. 615º nº 1 al. e) do CPC, pelo facto de a mesma condenar em objecto diverso do pedido e além do peticionado.
Mais invoca que a mesma é nula por violação dos arts. 5º nº 1 e 609º do CPC, uma vez que a autora/apelada nada peticionou quanto aos trabalhos a mais, sendo que a sentença condenou em valor superior ou em objecto diverso.
A Mma. Sra, Juiz a quo pronunciou-se no sentido de que se não verificam as arguidas nulidades.
Vejamos.
As nulidades da sentença são vícios formais e intrínsecos de tal peça processual e encontram-se taxativamente previstas no art. 615º do CPC.
Tais vícios, designados como “error in procedendo”, respeitam apenas à estrutura ou aos limites da sentença.
Como se escreveu nos Acórdãos desta Relação de 4/10/2018, e do STJ de 17/10/2017, ambos disponíveis in www.dgsi.pt, as nulidades da sentença, como seus vícios intrínsecos, são apreciadas em função do texto e do discurso lógico nela desenvolvidos, não se confundindo com erros de julgamento (error in judicando), que são erros quanto à decisão de mérito explanada na sentença, decorrentes de má percepção da realidade factual (error facti) e/ou na aplicação do direito (error juris), de forma que o decidido não corresponde à realidade ontológica ou normativa, com a errada aplicação das normas jurídicas aos factos, erros de julgamento estes a sindicar noutro âmbito.
Com excepção das previstas na al. a) do n.º 1 do artigo 615.º e no artigo 666.º, n.º 1, segunda parte, estas nulidades respeitam ao teor do acto decisório, nomeadamente ao cumprimento das normas processuais que determinam a estrutura, objecto e limites do julgamento; porém, não quanto ao mérito desse julgamento.
A nulidade da sentença, por violação do disposto pelo art. 615º nº 1 al e) do CPC, verifica-se quando o juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido. Tal relaciona-se com o previsto no artigo 609º n.º 1 do CPC onde se estabelece que: “a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir”.
Como se escreveu no Ac. desta Relação de Guimarães, de 29/04/2021, disponível in www.dgsi.pt: “O tribunal, por regra, não só não pode conhecer senão das questões que lhe tenham sido colocadas pelas partes, como também não pode decidir ultrapassando os limites do pedido que foi formulado, sob pena da decisão ficar afectada de nulidade.
A nulidade da decisão quando o Tribunal condene em objecto diverso do pedido colhe o seu fundamento no princípio do dispositivo, que atribui às partes a iniciativa e o impulso processual, e no princípio do contraditório segundo o qual o Tribunal não pode resolver o conflito de interesses, que a demanda pressupõe, sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes e a outra seja chamada para se opor (v. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21/03/2019, Relator Conselheiro Oliveira Abreu, também disponível em www.dgsi.pt).
Como sustenta Teixeira de Sousa (Estudos sobre o Novo Processo Civil, página 362, apud o citado Acórdão de 21/03/2019) “um limite máximo ao conhecimento do tribunal é estabelecido pela proibição de apreciação de questões que não tenham sido suscitadas pelas partes, salvo se forem de conhecimento oficioso (art. 660°, n° 2, 2.ª parte), e pela impossibilidade de condenação em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido (art. 661°, n.° 1). A violação deste limite determina a nulidade da sentença por excesso de pronúncia (art. 668°, n° 1, al. d) 2.ª parte) ou por conhecimento de um pedido diferente do formulado [art. 668°, n° 1, al. e)]”.
Como ensinam José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2º, 3ª Edição, Almedina, pág. 737, na pronúncia ultra petitum enunciada na referida alínea e), do nº. 1, do artº. 615º do CPC, ocorre violação do “princípio do dispositivo na vertente relativa à conformação objectiva da instância”, ao não serem observados “os limites impostos pelo art. 609-1, condenando ou absolvendo em quantidade superior ao pedido ou em objecto diverso do pedido”.
Assim, não pode o juiz, ultrapassar na sentença os limites do pedido (ou dos pedidos deduzidos).
Ora, este balizamento é operado pelo objecto do processo (pedido e causa de pedir) tal como definido (a título principal) pelo autor na petição inicial.
Deste modo, o juiz não pode conhecer, em regra, senão das questões suscitadas pelas partes. E na decisão que proferir sobre essas questões, não pode ultrapassar, nem em quantidade, nem em qualidade, os limites constantes do pedido formulado pelas partes.
No caso dos autos temos que a autora/apelada pediu a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 21.172,00, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, correspondente ao valor em dívida por trabalhos por si realizados e não pagos, no âmbito de um contrato de empreitada celebrado entre as partes.
Na contestação à matéria da acção, a ré/apelante invocou a excepção de pagamento, alegando ter pago um montante superior ao peticionado, e especificando que pagamentos foram esses.
E na sua réplica, respondendo à matéria de excepção, a autora aceitou ter-lhe sido paga a quantia de € 15.000,00, sendo contudo que tal quantia (resultante do somatório de vários pagamentos) visou o pagamento de trabalhos a mais e materiais que a ré lhe solicitou comprasse em seu nome e que lhe pagaria depois.
Enunciando os trabalhos a mais, refere que ascendiam ao valor de € 13.310,00 e que os aludidos materiais teriam o custo de € 1.335,29. Invocou ainda que o pagamento de € 1.792,85, a que alude a ré na contestação se refere à colocação de cerâmica na varanda, tapamento de roços e arranjo de paredes num edifício diverso, desconhecendo, em absoluto, a vontade da S. exercer a compensação em relação ao valor de € 1.628,94, a que alude a ré na contestação.
Finalmente, a autora veio reduzir o pedido, por aceitar ter sido pago, para além das quantias por si referidas na p.i., também o montante de € 3.000,00, no que se refere aos valores peticionados na p.i..
Temos assim que, em ponto algum do processo, designadamente na réplica, a autora suscitou a ampliação da causa de pedir e/ou do pedido. Pelo contrário, o que sucedeu nesta peça processual é que a autora veio reduzir o pedido, por aceitar ter sido pago, para além das quantias por si referidas na p.i., também o montante de € 3.000,00, no que se refere aos valores peticionados na p.i..
Sucede que, foi entendido pelo Tribunal a quo que a resposta à matéria da excepção de pagamento, constituía uma contra-excepção, onerando a autora/apelada com o ónus da sua prova.
Discordamos de tal entendimento, pois que a invocação de que as quantias entregues à autora se não destinavam ao pagamento solicitado na presente acção, mas antes ao pagamento de outros trabalhos a mais, integra uma mera impugnação.
De facto, o autor tem o ónus de deduzir na réplica as contra-excepções (excepções às excepções deduzidas pela parte contrária) que tenha a opor à contestação, alegando os factos impeditivos, modificativos ou extintivos dos efeitos dos alegados pelo réu em sede de excepção, com sujeição à preclusão do art. 489º do CPC.
Contudo, no caso dos autos, a matéria invocada pela autora na sua réplica não integra qualquer contra-excepção pois não obsta à apreciação do mérito da excepção de pagamento invocada, nem constitui qualquer facto impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da ré.
Na verdade, limitou-se a autora a impugnar os factos articulados na contestação no que à excepção de pagamento diz respeito, fazendo-o circunstanciadamente, apresentando outra versão dos acontecimentos, adoptando uma postura que doutrinalmente é apelidada de “negação indirecta ou motivada” e que se traduz “(...) na afirmação de que as coisas se passaram de modo parcialmente diverso e com outra significação jurídica; numa versão diferente do facto visado __ aceitando-se porém algum elemento dele __ e tal que daí não pode ter resultado o efeito jurídico pretendido pelo autor; numa contraversão ou contra-exposição do mesmo facto.” __ cf. Manuel de Andrade, “Noções Elementares de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1979, pág. 127.
Com a impugnação ou defesa directa, o réu (neste caso a autora quanto à invocada excepção de pagamento) propõe-se demonstrar que o autor não tem o direito de que se inculca titular, ou porque não existe o facto constitutivo ou porque não é idóneo a produzir o efeito jurídico que o autor pretende. Já com a excepção no sentido amplo, o réu alega um facto impeditivo tendente a demonstrar que o direito do autor não nasceu (simulação, por exemplo) ou um facto do qual resulta que o direito do autor nasceu realmente, mas já se extinguiu o direito (o pagamento, por exemplo). - cfr. Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. III, Coimbra Editora, pág. 24 e 32.
Nesta medida, através da alegação por parte da autora na sua petição inicial, de uma concreta causa de pedir e de um específico pedido, tradutores do objecto do processo, estabeleceu-se ou firmou-se o enunciado balizamento cognitivo a que o Tribunal a quo estava vinculado, não podendo consequentemente este conhecer acerca de causas de pedir não invocadas, nem ultrapassar os limites do pedido ou pedidos deduzidos, em violação do princípio do dispositivo.
Assim, fixado o objecto do processo, incumbia à Mma. Sra. Juiz a quo respeitá-lo na decisão proferida, limitando o seu campo de conhecimento à concreta causa de pedir invocada e ao objecto fixado no petitório deduzido.
Ora, apesar da nítida definição das balizas de conhecimento legalmente permitidas, a sentença apelada não as observou quando conheceu das quantias que estavam em causa no que aos trabalhos a mais diz respeito, ocupando-se de um pedido que não foi deduzido pela autora, assim incorrendo em excesso de pronúncia, o que configura efectiva causa de nulidade, nessa parte, da sentença recorrida.
É que, como se disse já, em momento algum a autora deduziu qualquer pedido de pagamento das quantias em causa, apenas tendo invocado na sua réplica, como resposta à matéria de excepção (de pagamento) que os montantes alegados pela ré se não destinaram ao pagamento das quantias peticionadas na petição inicial.
O que significa também que, para além de conhecer de pedido não deduzido, a sentença apelada condenou, ainda, em objecto diverso do pedido, o que configura, igualmente, causa de nulidade da sentença, nos termos da já referida alínea e), do nº. 1, do artº. 615º, do CPC.
Pelo exposto, por preenchimento da causa de nulidade referida na alínea e), do nº. 1, do artº. 615º do CPC é parcialmente nula a sentença apelada, na parte em que, apreciando acerca do pedido da acção, julga esta parcialmente procedente e condena a ré a pagar à autora a quantia de € 6.228,94, acrescida da quantia correspondente ao valor dos trabalhos a mais a que se alude em 12) e 15) dos factos provados, a apurar, em incidente de liquidação, acrescida dos juros de mora calculados sobre tais quantias desde a citação da ré, em 07/06/2021, até efectivo e integral pagamento.
Verificada a nulidade arguida, importa supri-la, mediante o conhecimento da aludida questão, fazendo-o segundo a regra da substituição do tribunal recorrido, estabelecida nos n.ºs 1 e 2 do 665.º do CPC.
Face à factualidade dada como provada e não impugnada, a autora/apelada, no âmbito da sua actividade de construção de edifícios e obras de construção civil com escopo lucrativo, celebrou com a ré em 29.12.2015 um contrato de empreitada, tendo em vista a intervenção em edifício na Rua ..., n.º .., em Braga, visando a recuperação do mesmo e com o preço acordado de € 36.500,00, acrescido do IVA.
Que foi um contrato de empreitada o celebrado pelas partes não é posto em causa nem pelas partes, nem pelo Tribunal a quo, e este Tribunal concorda com tal classificação.
Após redução do pedido devidamente homologada, a autora pediu a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 25.600,00, correspondente ao somatório do montante em dívida de € 18.172,00 e que fez titular através da factura n.º FT 2015/37, emitida em 31.12.2015, no valor total de € 41.172,00, acrescida dos juros de mora, que contou até à entrada da presente acção e liquidou, após redução, em € 7.428,00.
Feito o julgamento, no âmbito da invocada excepção de pagamento logrou a ré provar, como lhe competia visto o disposto pelo art. 342º nº 2 do Cód. Civil, que foram efectuados pagamentos à autora num total de € 40.792,85 (cfr. pontos 8 e 9 dos factos dados como provados).
Como é sabido, o cumprimento é um modo de extinção das obrigações, e enquanto facto extintivo do direito invocado pelo autor que se apresenta como credor, integra ou constitui, excepção peremptória ou de direito material.
Por conseguinte é sobre o devedor demandado que, de acordo com o disposto pelo já referido art.342º nº2º do Cód. Civil, recai o ónus da prova de que esse modo de extinção da obrigação efectivamente ocorreu ou se verificou.
Nessa medida, cabia à ré/apelante, não só provar a existência dos pagamentos, como ainda provar que os mesmos se destinaram efectivamente ao pagamento da dívida em causa nos autos.
Competia-lhe, pois, provar que as entregas das quantias indicadas no ponto 9 (8.1 a 8.5 inclusivé) serviram para pagar o montante em falta titulado pela factura indicada na petição inicial (o mesmo não sendo necessário no que às quantias referidas em 8 e 9 – ponto 8.6 – diz respeito, uma vez que quanto a estas foi aceite pela autora que se destinavam ao pagamento em causa, aliás, não foram sequer peticionadas).
Sucede que, vista a contestação, verificamos que no seu art. 3º a ré invoca que no âmbito do contrato de empreitada celebrado entre autora e ré, esta por si e por terceiros, procedeu ao pagamento à autora do valor total de € 42.421,79.
Não diz contudo, em momento algum, que tais quantias entregues à autora se destinavam ao pagamento do montante peticionado nestes autos e correspondente a parte do valor constante da factura indicada na petição inicial (aliás, considerando o valor total da factura - € 41.172,00 - temos que a ré invoca ter procedido ao pagamento de uma quantia superior à devida).
Por outro lado, resulta da al. d) dos factos dados como não provados que não provou a ré ter pago a totalidade da factura identificada em 6 dos factos provados.
E dos pontos 13, 14 e 16 dos factos dados como provados resulta que, desse valor total pago pela ré à autora, € 4.600,00 não se destinaram ao pagamento dos valores em causa na factura.
Ou seja, do valor total da factura, a autora/apelada peticionou o pagamento da quantia de € 18.172,00, visto já lhe ter sido paga a quantia de € 24.000,00 (os referidos nos pontos 8 e 9-8.6).
A ré provou que fez pagamentos (para além dos não peticionados e acabados de referir) no montante de € 16.792,85 (cfr. ponto 9 de 8.1 a 8.5, inclusive).
Mas desses pagamentos, a quantia de € 4.600,00 não se destinou ao pagamento dos valores em causa na factura, como acima já se referiu.
E do restante valor de € 12.192,85 que a ré por si ou por terceiros pagou à autora, não logrou aquela provar ter sido destinado ao pagamento dos trabalhos incluídos na factura em causa nos autos.
Isto é, não provou a ré/apelante, como lhe competia, a invocada excepção de pagamento, pois que pese embora tenha logrado provar que efectuou pagamentos à autora/apelada, não provou que os mesmos se destinavam efectivamente ao pagamento da dívida em causa nos autos.
Não tendo a ré logrado provar o invocado pagamento, deveria ser condenada no pagamento do montante peticionado.
Contudo, há que ter em consideração o disposto pelo art. 635º nº 4 do CPC, que dispõe: “Os efeitos do julgado, na parte não recorrida, não podem ser prejudicados pela decisão do recurso, nem pela anulação do processo”.
A proibição da reformatio in pejus aqui consignada, tem uma longa tradição no nosso processo civil.
De acordo com Teixeira de Sousa (Estudos Sobre o Novo Processo Civil, 467), consiste em a decisão do recurso não poder ser mais desfavorável ao recorrente do que a decisão recorrida.
Lebre de Freitas e Ribeiro Mendes (Código de Processo Civil Anotado, 2.ª edição, 3.º, 42) para ilustrar esta figura dão precisamente o seguinte exemplo: “Se por exemplo, numa acção de responsabilidade civil, o réu for condenado a pagar certa indemnização e interpuser recurso da sentença, a proibição da reformatio in pejus impedirá o tribunal de recurso de condenar em quantia superior…”
No caso dos autos, tendo apenas interposto recurso da sentença a ré/apelante, que havia sido condenada a pagar à autora a quantia de € 6.228,94, acrescida da quantia correspondente ao valor dos trabalhos a mais a que se alude em 12) e 15) dos factos provados, a apurar, em incidente de liquidação, acrescida dos juros de mora calculados sobre tais quantias desde a citação da ré, em 07/06/2021, até efectivo e integral pagamento, não mais ela pode ser condenada a pagar um valor superior.
Nesta medida, respeitando a proibição da reformatio em pejus, será de manter a condenação da ré no pagamento à autora da quantia de € 6.228,94, acrescida dos juros de mora calculados sobre tal quantia desde a citação da ré, em 07.06.2021, até efectivo e integral pagamento.
Face a tal conclusão, torna-se inútil o conhecimento da última questão suscitada nas alegações de recurso.
Assim, procede parcialmente a apelação.
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V. Decisão.

Perante o exposto, acordam os Juízes desta 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, em julgar parcialmente procedente a apelação em consequência do que:

a) julgam parcialmente nula a sentença apelada, na parte em que, apreciando acerca do pedido da acção, julga esta parcialmente procedente e condena a ré a pagar à autora a quantia de € 6.228,94, acrescida da quantia correspondente ao valor dos trabalhos a mais a que se alude em 12) e 15) dos factos provados, a apurar, em incidente de liquidação, acrescida dos juros de mora calculados sobre tais quantias desde a citação da ré, em 07/06/2021, até efectivo e integral pagamento.
b) suprindo a nulidade arguida, segundo a regra da substituição do tribunal recorrido e respeitando a proibição da reformatio em pejus, condenam da ré no pagamento à autora da quantia de € 6.228,94, acrescida dos juros de mora calculados sobre tal quantia desde a citação da ré, em 07.06.2021, até efectivo e integral pagamento.
c) no mais, confirmam a sentença recorrida.
Custas da acção e do recurso por apelante e apelada, nas proporções dos respectivos decaimentos.
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Guimarães, 03 de Novembro de 2022

Assinado electronicamente por:
Fernanda Proença Fernandes
Anizabel Sousa Pereira
Jorge dos Santos
(O presente acórdão não segue na sua redacção as regras do novo acordo ortográfico, com excepção das citações/transcrições efectuadas que o sigam)