Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | ANTERO VEIGA | ||
Descritores: | REVISÃO DA INCAPACIDADE CASO JULGADO | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 03/03/2016 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PARCIALMENTE PROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 1ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | O laudo pericial deve ser fundamentado de modo a que do mesmo resultem os elementos essenciais ao método tendente à aquisição da conclusão a que os peritos chegaram, devendo os peritos expor o seu próprio itinerário cognitivo, de forma compreensível para um não técnico. Tratando-se de uma revisão da incapacidade, as exigências de fundamentação devem ter em atenção tal circunstância, constituindo o anteriormente fixado o ponto de partida, devendo os peritos fundamentar as divergências por que optaram. Não é em tal caso necessário justificar a concretização do grau de incapacidade no range previsto na lei, se não há agravamento ou melhoria, mantendo-se as sequelas iguais. Até porque em face da inexistência de alteração da situação, o grau de incapacidade fixado tem força de caso julgado. Não ocorrendo alteração na capacidade de trabalho ou de ganho; e é, agravamento, recidiva, recaída ou melhoria da lesão ou doença que deu origem à reparação, ou de intervenção clínica ou aplicação de ajudas técnicas e outros dispositivos técnicos de compensação das limitações funcionais ou ainda de reabilitação e reintegração profissional e readaptação ao trabalho; não pode haver alteração do grau de incapacidade. - Não havendo qualquer alteração nos apontados termos, não pode em sede de revisão, sob pena de violação do caso julgado, proceder-se à correção do decidido com base em entendimento diverso sobre a situação pré-existente e base da decisão anterior, designadamente não aplicando o fator de bonificação 1.5 anteriormente considerada; ou tendo a anterior decisão tomado posição expressa quanto a tal aplicação, concluindo pela negativa, aplicando-a em sede de revisão. - A “bonificação” não está em si mesma abrangida por caso julgado. Pode apesar de aplicada, ou não aplicada, por erro de julgamento na decisão inicial, ser aplicada nas posteriores revisões, conforme se verifiquem ou não os seus pressupostos, mas deverá sê-lo sem prejuízo do caso julgado, pressupondo sempre uma alteração da base factual que foi apreciada na decisão precedente. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães. Nestes autos emergentes de acidente de trabalho em que é sinistrado B…, e é entidade responsável “C…COMPANHIA DE SEGUROS…, SA” veio aquele requerer ao abrigo do disposto no artigo 145º do C.P.T., a realização de exame médico de revisão da incapacidade anteriormente fixada, alegando que se encontra pior das lesões que foram consequência do acidente de trabalho participado (cfr. fls. 200 e ss.). Realizado o exame médico, o Sr. Perito concluiu que o grau de IPP atual se mantém em 39,60%, por não ocorrer agravamento das sequelas que apresenta, como resulta do respetivo auto de fls. 242 a 244. - A fls 254 ss foi junto o inquérito profissional e estudo do posto de trabalho. - Notificadas as partes do resultado do exame, pelo sinistrado foi requerida a realização do exame por Junta Médica previsto no nº 4 do artigo 145º do Código de Processo do Trabalho. - O autor formulou os seguintes quesitos: 1. Por decisão, proferida em 01.10.2013, foi fixada uma incapacidade permanente parcial ao sinistrado de 39,60%? 2. Com o decurso do tempo, houve um agravamento das lesões sofridas em consequência do acidente ocorrido em 16.08.2011? 3. O sinistrado atualmente apresenta as seguintes queixas: 3.1) – fortes dores no ombro e cotovelo direito? 3.2) – sensação de dormência no ombro e braço direito com irradiação para a mão direita? 3.3) – impossibilidade de realização de tarefas básicas inerentes ao exercício da sua atividade profissional de condutor manobrador de máquinas, como: - carregar pesos? - fazer a manutenção de máquinas de obra? - manobrar máquinas? - grande dificuldade em subir e descer para as máquinas? - impossibilidade de introduzir cavilhas de cerca de 25 kg? - introduzir os tubos de óleo do martelo? - ou outras? E quais? 3.4) – O que implicou, inclusivamente, que ficasse sem emprego? 4. Em consequência do acidente o sinistrado apresenta as seguintes sequelas: a) rigidez do cotovelo direito, sequela da fratura do troquiter e tendinopatia do supra espinhoso, com limitação da mobilidade a nível da abdução 60°, flexão 60°, rotação externa 60° e interna 60°, (Cap. I art.º 3.2.7.2.2.2 b); 3.2.7.2.1.1 b); 3.2.7.2.3.2 b) e 3.2.7.2.3.1 – b) da Tabela Nacional de incapacidades por acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais DL 352/2007 de 23 de outubro)? b) paralisia do nervo circunflexo direito (Cap III art. 6.1.4)? 5. Motivo por que o sinistrado, na sequência do acidente, apresenta hoje, uma incapacidade permanente parcial de 39,60 %? Ou outra e qual? 6. Incapacidade que deve ser corrigida pela aplicação do fator 1,5, uma vez que o sinistrado não foi reconvertido em relação ao seu posto de trabalho, de acordo com o nº 5 das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades? Resultando por isso numa incapacidade permanente parcial de 58,80%? Ou outra e qual? 7. Na sequência do acidente, o sinistrado ficou com lesões que se traduzem em grande dificuldade ou mesmo impossibilidade de realização de tarefas básicas inerentes à sua atividade profissional de condutor manobrador de máquinas: 7.1 - carregar pesos? 7.2 - fazer a manutenção de máquinas de obra? 7.3 - manobrar máquinas? 7.4 - grande dificuldade em subir e descer para as máquinas? 7.5 - impossibilidade de introduzir cavilhas de cerca de 25 kg? 7.6 - introduzir os tubos de óleo do martelo? 7.7 - e outras? Quais? 8. Estando assim totalmente incapaz para e exercício da profissão habitual (IPATH)? 9. O que significa que o sinistrado, em termos de percentagem a atribuir, tem um agravamento de incapacidade parcial atual de 19,20% (58,80 – 39,60)? Ou outra, e qual? E encontra-se totalmente incapaz para e exercício da profissão habitual (IPATH)? - No âmbito da junta médica os Srs. Peritos Médicos do Tribunal e da seguradora consideraram, por maioria, que não ocorreu um agravamento das sequelas resultantes do acidente, concluindo que o sinistrado apresenta agora uma incapacidade permanente parcial de 30,40% e que as sequelas que apresenta não são impeditivas do exercício do trabalho habitual de manobrador de máquinas. Consta da junta médica: por unanimidade, os srs. peritos médicos respondem aos quesitos formulados a fls. 248 vº, 249 e 249 vº da seguinte forma: 1. -sim. 2. - não. 3.1 - refere dores no ombro direito. 3.2 - não referiu. 3.3 - limitado a carregar pesos: - limitado na manutenção das máquinas. - não se admite limitação a manobrar as máquinas. - limitado a subir e descer para as máquinas mas não impossibilitado de o fazer. - por maioria, os srs. peritos médicos do tribunal e da seguradora entendem que está limitado. o sr. perito médico do sinistrado entende que está impossibilitado. - refere que não conseguiria. -por maioria, os srs. peritos médicos do tribunal e da seguradora entendem que não podem responder face à pergunta genérica. o sr. perito médico do sinistrado entende que se encontram especificadas essas outras tarefas no relatório de fls. 257 e seguintes. 3.4 - entendem os srs. peritos médicos do tribunal e da seguradora que as sequelas que o sinistrado apresenta não são impeditivas do exercício do trabalho habitual de manobrador de máquinas. pelo sr. perito médico do sinistrado foi dito que o examinado está incapaz para a sua profissão habitual tendo em conta todo o restante trabalho necessário para assegurar o funcionamento das ditas máquinas. 4 a)- apresenta rigidez do ombro direito e não do cotovelo. 4b)- clinicamente apresenta parésia e não paralisia do nervo circunflexo direito. 5. - tendo em conta que os srs. peritos médicos do tribunal e da seguradora entendem não ser de aplicar o fator de bonificação de 1,5 a ipp a atribuir é de =30,4%=, conforme quadro anexo. pelo sr. perito médico do sinistrado entende ser de manter a ipp de =39,6%=, atribuída na junta médica de 07-03-2013, valor ao qual se chegou com a aplicação do fator 1,5. 6. - não se entende este quesito tendo em conta que na ipp atribuída em sede de junta já foi aplicado o fator 1,5, daí o valor de =39,6%=. 7.1 - limitado na medida da ipp atribuída. 7.2 - limitado na medida da ipp atribuída 7.3 - não. 7.4 - limitado na medida da ipp atribuída 7.5 e 7.6 - limitado na medida da ipp atribuída. pelo sr. perito médico do sinistrado não pode exercer essa função. 7.7 - resposta dada no último parágrafo do quesito 3.3 8 . - por maioria, não. pelo sr. perito médico do sinistrado entende que o sinistrado se encontra incapaz para o trabalho habitual, podendo e devendo ser reconvertido. 9.0 - por unanimidade, não tem agravamento. prejudicado. respondido ao quesito 8.0• mais declaram os srs. peritos médicos do tribunal e da seguradora, como fundamento da sua posição, e na presença do sinistrado e do sr. dr. juiz que se verificou, ao exame objetivo, ausência de atrofias do membro superior direito com exceção do músculo deltoide. mais verificaram a presença de calosidades na face palmar de ambas as mãos, simétricas entre si, a atestar trabalho laboral ativo. questionado sobre pigmentação das extremidades dos dedos interpretada como manuseamento de óleos declarou o sinistrado que tem feito trabalhos em casa na sua horta e num portão que implicou o referido manuseamento de substâncias oleosas. pelo sr. perito médico do sinistrado foi dito que a questão agora referida é revelador que o sinistrado pode e deve ser reconvertido na sua profissão habitual. - Os peritos atribuem os coeficientes de 0,13 (cap. I – 3.2.7.3 –c)) e 0,20 (cap. III – 6.1.4), total de 30,4, não considerando bonificação. - A junta médica de 7/3/2013, que serviu de base à fixação da incapacidade anterior, fixou os coeficientes de 0,08 (cap. I – 3.2.7.3 – b)) e 0,20 ( cap. III – 6.1.4), fixando a incapacidade em 0,26,4 x1,5 = 39,60. - Por sentença de 23/6/2015 foi atribuída a pensão com base na incapacidade de 30,40%, acolhendo-se o laudo. Consta da decisão: “… No caso concreto, como resulta do supra exposto e do que nos foi dado a observar na junta médica, verifica-se que, apesar das sequelas que apresenta, o sinistrado tem condições físicas e mentais para desempenhar todas as funções inerentes à sua categoria profissional de manobrador de máquinas, descritas no parecer do IEFP. Por isso, não havendo necessidade de reconversão do seu posto de trabalho, não há lugar à aplicação de fator de bonificação previsto na Tabela Nacional de Incapacidades. Em conformidade e não sendo aplicável o fator 1,5, a IPP é fixada em 30,40% Pelo exposto, decide-se reduzir a pensão do sinistrado para o valor de 1.896,48 €, a partir de 11/08/2014 (data do requerimento a pedir a revisão da incapacidade)… “ * Inconformado o requerente interpôs o presente recurso apresentando as seguintes conclusões: 1. O relatório de Junta Médica está insuficientemente fundamentado. 2. Os senhores peritos do tribunal e da seguradora não fundamentaram devidamente a sua decisão da IPP a atribuir, a não afetação do sinistrado de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual e desnecessidade de reconversão profissional e aplicação do fator 1,5. 3. Nos termos do nº 8 das Instruções Gerais da TNI, os peritos devem fundamentar as suas conclusões de forma a permitir ao julgador a análise e ponderação, com segurança, do grau de incapacidade a atribuir. 4. Por outro lado, verificando-se, como se verifica, uma divergência entre os peritos sobre a questão da IPP, aplicação do fator 1,5 e incapacidade absoluta para a profissão habitual – resposta ao quesito 5º, 7º e 8º -, era indispensável que do Relatório constassem as razões invocadas por cada um deles para dar resposta num e noutro sentido, de forma a que o Tribunal (que se venha a pronunciar sobre tal matéria), pudessem avaliar a bondade dos fundamentos de cada uma dessas posições. 5. E tal fundamentação impunha-se em maior grau, na presente situação, uma vez que nos autos existe um laudo (singular) do perito do IML que atribui IPP diferente da atribuída pelos peritos maioritários e aplica o fator 1,5 face à necessidade de reconversão profissional que entende o sinistrado carecer e o parecer do IEFP e posição do perito médico do sinistrado, que defende a IPATH do sinistrado. 6. No laudo emitido da junta médica, os senhores peritos do tribunal e seguradora apenas consideraram que o A. está afetado de IPP de 30,4%, não se justificando a aplicação do fator 1,5 e não apresenta incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, nada explicando quanto a esse entendimento. 7. Limitando-se a emitir uma mera e abstrata opinião de IPP e de que não estava incapaz para o trabalho habitual, baseada apenas no exame realizado naquele dia. Não explicam contudo em que consistiu esse exame, nem o motivo da discordância face ao resultado do GML já constante dos autos, motivos de discordância entre peritos e sem qualquer referência ao parecer do IEFP. 8. A falta de fundamentação do relatório pericial constitui nulidade processual nos termos do art. 201º do CPC. 9. Não se pronunciando o tribunal sobre estes aspetos e omitindo tais factos na sentença, tal, porque influi na decisão da causa, constitui nulidade processual nos termos do referido art. 201º do CPC. 10. A sentença não apreciou convenientemente todas as questões que lhe foram colocadas, designadamente sobre a IPP, necessidade de reconversão profissional e consequente aplicação do fator de bonificação de 1,5, e eventual existência de IPATH, devido à falta de fundamentação do laudo de junta médica. 11. A falta de fundamentação do laudo pericial influi na decisão da causa, desde logo porque fornece ao tribunal uma informação cuja coerência ou acerto não é possível sindicar. 12. Afetando ainda, por inerência, a inteligibilidade e compreensão da sentença proferida com base nesse relatório no que toca à fixação da incapacidade, aplicação do fator 1,5 e incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual do autor, já que na mesma o Sr. Juiz confirma o referido laudo maioritário 13. O que impede, nomeadamente, um Tribunal Superior, em sede de recurso, se pronuncie quanto ao acerto dessa sentença, na medida em que dela não consta os correspondentes fundamentos. 14. Com efeito, devido à falta de fundamentação do relatório médico, não tinha o Tribunal os meios de prova suficientes que suportassem a decisão proferida, pelo que se verifica erro de julgamento – art. 712º, nº 4, do CPC. 15. O Mme Juiz de Primeira Instância assenta a fundamentação da sentença proferida no laudo maioritário, que conforme se referiu apresenta vícios que justificam a sua nulidade. Termos em que deve ser dado provimento ao recurso, e, em consequência: i) deve ser declarado nulo o Auto de Exame por Junta Médica, por falta ou insuficiência de fundamentação; ii) deve ser anulada a sentença recorrida, e ordenado ao tribunal de 1ª instância que leve a cabo as diligências que considere serem pertinentes e repetição da junta médica para suprimento das mencionadas irregularidades, com resposta total e fundamentada do laudo que emitam quanto à IPP, necessidade de reconversão profissional e aplicação do fator 1,6 e questão da IPATH – quesito 5º, 7º e 8º, pronunciando-se fundamentadamente quanto à divergência com os pareceres clínico do GML de Braga, com o parecer do perito do sinistrado e assistente do sinistrado, e com o parecer do inquérito profissional constante dos autos, ou iii) se determine o pedido de esclarecimentos ao Srs. Peritos que integraram essa junta, também com essa finalidade; tudo nos termos e ao abrigo do disposto no art. 712º, nº 4, do CPC. * Em contra-alegações sustenta-se o julgado. O Exmº PGA deu parecer no sentido da procedência. A factualidade é a decorrente do precedente relatório e ainda: *** Conhecendo do recurso: Nos termos dos artigos 635º, 4 e 639º do CPC, o âmbito do recurso encontra-se balizado pelas conclusões do recorrente. Importa saber se ocorre a nulidade processual nos termos do artigo 201º do CPC por falta de fundamentação do laudo pericial (insuficiência quanto à IPP, quanto à não atribuição de incapacidade para o trabalho habitual, quanto à necessidade de reconversão e aplicação do facto 1,5). - erro de julgamento. - Da violação de caso julgado relativamente à aplicação da bonificação de 1,5%. * A nulidade processual invocada (insuficiente fundamentação do laudo), a existir, integraria a previsão do artigo 195º do CPC, a invocar perante o juiz no prazo do artigo 149º do mesmo diploma. Tendo o recurso sido interposto dentro do prazo de dez dias após o conhecimento do alegado vício, e estruturando-se toda a alegação na invocada falta de fundamentação, sem outras questões, nada obstaria à aplicação do artigo 193º do CPC, como se refere no douto parecer, aproveitando-se o requerimento, por convolação, em requerimento de invocação de nulidade perante o juiz. Contudo, a alegação de erro de julgamento, como decorrência daquela falta de fundamentação, absorve a questão, prejudicando o conhecimento da nulidade e consequentemente a remessa do processo à primeira instância para esse efeito. É que se ocorrer falta de fundamentação do laudo a decisão proferida resulta inquinada, tornando-se impossível a reapreciação da matéria de facto, devendo ser anulada a decisão nos termos do artigo 662º, 2, al. c) do CPC. A junta médica constitui prova pericial, que, nos presentes autos, havendo desacordo, é obrigatória, conforme artigo 138º e 140º do CPT. Conquanto sujeita à livre apreciação do juiz (art. 389º do CC), este, em qualquer peritagem (mas com especial relevo nos casos em que esta é obrigatória, o que implica de si uma especial ponderação do legislador no sentido da sua utilidade e pertinência), dada a falta das habilitações técnicas que demandam a peritagem, em caso de discordância deverá fundamentar devidamente a mesma, designadamente com base em elementos de igual valia técnico/científica. Refere o nº 8 das Instruções Gerais da TNI: “O resultado dos exames é expresso em ficha elaborada nos termos do modelo anexo, devendo os peritos fundamentar todas as suas conclusões”. Resulta daqui que a atribuição da incapacidade pelos peritos, deve encontrar justificação na fundamentação a constar do laudo, podendo tal justificação resultar das respostas dadas aos quesitos formulados pelas partes. Do laudo devem resultar os elementos essenciais ao método tendente à aquisição da conclusão a que os peritos chegaram, daquele conhecimento (grau de incapacidade), devendo os peritos expor o seu próprio itinerário cognitivo, de forma compreensível para um não técnico. Se não permitir esse objetivo, quer a sã formação do juiz decisor em primeira instância, quer a reapreciação da prova em sede de segunda instância, nos termos do artigo 662º do CPC., ficam prejudicadas. Tal obrigação de fundamentação assume particular relevo, no enquadramento das lesões, na concretização do grau de incapacidade dentro do range previsto nas alíneas, na aplicação ou não de fatores de bonificação ou correção, nos casos de disfunções ou sequelas não previstos na tabela, contemplando os aspetos profissionais, do posto de trabalho do sinistrado e outros que relevem ao caso. Vejamos no caso se ocorre insuficiente fundamentação: Importa ter em consideração que se trata de uma revisão, pelo que o ponto de partida deve analisar-se em função do anteriormente fixado, esclarecendo as divergências por que se optou, respondendo ao solicitado. Não é necessário justificar a concretização do grau de incapacidade no range previsto na lei, se não há agravamento, mantendo-se as sequelas iguais. Até porque em face dessas concretas sequelas o grau de incapacidade fixado tem força de caso julgado. Vejamos então. Quanto ao grau fixado, a junta mantém 0,20 no que tange ao sequela integrada no Cap. III e procede a uma alteração no que se refere à do Cap. I, na alínea, passando da b) para a c) (que têm um range idêntico mas com valores mínimos e máximos diferentes), assim: b) Grau II — A elevação do braço forma com o tronco um ângulo de 90°, com limitação das rotações interna e externa, impedindo levar a mão à nuca, ao ombro oposto e à região lombar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 0,06 -0,10 c) Grau III — A elevação do braço forma com o tronco um ângulo inferior a 90° e a flexão-extensão do cotovelo um ângulo entre 60° a 100° (ângulo favorável) . . .. . . . . . . 0,11 -0,15” Dentro desta colocou a incapacidade concreta ao mesmo nível que havia colocado a anterior junta, exatamente a meio. Trata-se de correção que não resulta de agravamento como flui do teor de todo o relatório. Os peritos são unanimes em referir que não ocorre agravamento – resposta ao quesito 9. O próprio perito indicado pelo sinistrado refere na resposta a 5 que é de manter a IPP de 39,6% (já com a bonificação). O quesito 4.a) tem resposta positiva, sendo que as limitações de mobilidade aí referidas são exatamente as mesmas que constavam do item sete da base instrutória, que obteve como resposta positiva na junta anterior. Também o 4.b) corresponde a uma situação idêntica à considerada na anterior junta. Assim é patente e resulta suficientemente fundamentada a opção pela consideração de que não ocorreu agravamento. Refira-se ainda que o estudo do posto de trabalho já se encontrava nos autos, sendo referido na resposta ao quesito 3.3 pelo perito indicado pelo sinistrado. Conjugando o teor da perícia, designadamente as respostas dadas com os quesitos formulados, resulta suficientemente fundamentado o mesmo, no quadro de uma revisão e no que tange à não ocorrência de uma agravação. Quanto à não atribuição de incapacidade parta o trabalho habitual, a perícia respondeu aos quesitos formulados, referindo ocorrer limitação no uso das máquinas, na medida da IPP atribuída, quando consideradas operações concretas relacionadas com esse uso, as referidas nos quesitos. Referem que não se admite limitação a manobrar máquinas, pretendendo significar que com aquelas limitações pode manobrar máquinas, e, não está afetado de incapacidade parta o trabalho habitual. Este juízo é maioritário. O perito indicado pelo sinistrado refere essa incapacidade, com o argumento; “tendo em conta o restante trabalho necessário para assegurar o funcionamento das ditas máquinas”. Ora quanto aos restantes trabalhos os peritos maioritários referem limitação de acordo com a incapacidade fixada. Tais respostas abarcam atos muito concretos (resultantes dos quesitos) e compreendem-se as respostas, no todo do relatório, pelas sequelas que resultam da resposta dada ao quesitos 4ª) e 4b) e à explicação final onde referem a inexistência de atrofias do membro superior direito com exceção do músculo deltoide, verificando-se ainda calosidade palmar na face de ambas as mãos a atestar trabalho laboral ativo. Assim e quanto a este pormenor também se mostra fundamentado suficientemente o relatório. - Quanto à não atribuição da bonificação, a ela se referem apenas na resposta dada ao quesito 5, referindo que “entendem não ser de aplicar...”, sendo que o perito minoritário entende ser de manter a IPP de 39,6%. A fundamentação de uns e outros é manifestamente insuficiente como bem refere o douto parecer. Contudo levanta-se uma outra questão, que implica a desnecessidade de anular o laudo para esclarecimentos. É que não resultando do laudo que tenha ocorrido melhoria, apenas resulta que não houve agravação – aliás as limitações de movimentos são exatamente as mesmas – resposta ao quesito 7 da anterior junta e resposta ao quesito 4 por esta junta -, não podia a sentença retirar a bonificação sem prejuízo do caso julgado. Relativamente à questão da aplicação do fator ao grau de incapacidade fixada, proferida a decisão ficou esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa (art. 666.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, atual 613º), não podendo, aproveitando um pedido de revisão, sem qualquer alteração em termos de agravamento ou melhoria da lesão ou doença (artigo 70 da L. 98/2009), proceder-se à correção do decidido com base em entendimento diverso sobre a situação pré-existente e base da decisão anterior. O incidente de revisão visa e tem como pressuposto um agravamento, recidiva, recaída ou melhoria da lesão ou doença, com repercussão na capacidade de ganho, conforme artigo 70 da LAT (L. 98/2009). Assenta pois numa alteração ao nível da factualidade, em relação aquilo que foi considerado na decisão inicial, ou em anteriores decisões proferidas na sequência de pedidos de revisão. Não pode em sede de revisão reapreciar-se a mesma questão já apreciada em sede da anterior decisão, aplicando-lhe agora critérios de fixação de incapacidade (previstas na lei) diferentes, sejam ou não mais conformes à lei, sob pena de violação do caso julgado. Em sentido diverso - Ac. RL de 30/5/2012, www.dgsi.pt, processo nº 468/08.7TTTVD.L1-4. Do que se trata é tão só de um dos critérios a atender na fixação da incapacidade final, conquanto se trate de “juízo” com critério definido na lei. O que conta para efeitos de trânsito é a incapacidade fixada, independentemente dos critérios utilizados. O errado entendimento da lei não obsta ao trânsito, nem é motivo para “revisão “ de sentença. A reapreciação em sede de revisão, do cálculo da incapacidade previamente efetuado, utilizando outros critérios (podia ser este como podiam ser outros), implica necessariamente violação do caso julgado e do princípio de que proferida sentença fica esgotado o poder jurisdicional, com dano para a legítima confiança criada na força do respetivo trânsito. Não que a incapacidade não possa ser alterada, como o demonstra o mecanismo de revisão, mas apenas nos termos da lei, ocorrendo alteração do estado de saúde do sinistrado, com agravamento, recidiva, recaída ou melhoria da lesão ou doença. É que a revisão, fundando-se em alteração posterior, não viola o caso julgado. Claro que a bonificação, e porque como referido se trata apenas de um critério de cálculo, não está em si mesma abrangida por caso julgado. Pode apesar de aplicada (ou não aplicada) por erro de julgamento na decisão inicial, ser aplicada nas posteriores revisões, verificando-se os seus pressupostos, mas deverá sê-lo sem prejuízo do caso julgado, e é, pressupondo uma alteração da base factual que foi apreciada na primeira decisão (ou decisão precedente). A aplicabilidade ao caso concreto da bonificação pode resultar apenas como consequência da agravação ou recidiva, como a sua não aplicação pode resultar de melhoria. Sendo assim, é coisa nova não coberta pelo caso julgado formado pela anterior decisão, porque a não reconvertibilidade ocorre em momento posterior a tal decisão, ou deixa de ocorrer. Sendo facto superveniente em relação à primeira decisão, afeta toda a incapacidade. Isto sem embargo do entendimento no sentido de que dada a natureza indisponível e a oficiosidade do processo, este possa ser “reaberto “ para apreciação de direitos do sinistrado, desde que não tenham sido apreciados na ação, entendendo-se quanto a esses não haver caso julgado – Vd. Ac. RC de 2/5/2014, www.dgsi.pt, processo nº 121/12.7TTFIG-A.C1, estritamente quanto a esta questão do trânsito e relativo a juros não apreciados. Em sentido aproximado do defendido, vd. RL de 22/5/2013, processo nº 183/03.8TTBRR.1.L1-4.; e RG de 16/4/2015, processo nº 691/10.4TTBCL.P1.G1. Ora no caso presente a anterior decisão apreciou a questão da bonificação por não reconvertibilidade. Não ocorreu qualquer alteração ao nível da saúde do sinistrado, nem para pior nem para melhor, pelo que qualquer apreciação sobre a questão viola o caso julgado. É de manter a anterior incapacidade e pensão fixada. DECISÃO: Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar parcialmente procedente a apelação, alterando-se a decisão, mantendo-se a anterior incapacidade e pensão. Custas a meias. ## O laudo pericial deve ser fundamentado de modo a que do mesmo resultem os elementos essenciais ao método tendente à aquisição da conclusão a que os peritos chegaram, devendo os peritos expor o seu próprio itinerário cognitivo, de forma compreensível para um não técnico. Tratando-se de uma revisão da incapacidade, as exigências de fundamentação devem ter em atenção tal circunstância, constituindo o anteriormente fixado o ponto de partida, devendo os peritos fundamentar as divergências por que optaram. Não é em tal caso necessário justificar a concretização do grau de incapacidade no range previsto na lei, se não há agravamento ou melhoria, mantendo-se as sequelas iguais. Até porque em face da inexistência de alteração da situação, o grau de incapacidade fixado tem força de caso julgado. Não ocorrendo alteração na capacidade de trabalho ou de ganho; e é, agravamento, recidiva, recaída ou melhoria da lesão ou doença que deu origem à reparação, ou de intervenção clínica ou aplicação de ajudas técnicas e outros dispositivos técnicos de compensação das limitações funcionais ou ainda de reabilitação e reintegração profissional e readaptação ao trabalho; não pode haver alteração do grau de incapacidade. - Não havendo qualquer alteração nos apontados termos, não pode em sede de revisão, sob pena de violação do caso julgado, proceder-se à correção do decidido com base em entendimento diverso sobre a situação pré-existente e base da decisão anterior, designadamente não aplicando o fator de bonificação 1.5 anteriormente considerada; ou tendo a anterior decisão tomado posição expressa quanto a tal aplicação, concluindo pela negativa, aplicando-a em sede de revisão. - A “bonificação” não está em si mesma abrangida por caso julgado. Pode apesar de aplicada, ou não aplicada, por erro de julgamento na decisão inicial, ser aplicada nas posteriores revisões, conforme se verifiquem ou não os seus pressupostos, mas deverá sê-lo sem prejuízo do caso julgado, pressupondo sempre uma alteração da base factual que foi apreciada na decisão precedente. |