Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
| ||
Relator: | RAQUEL BATISTA TAVARES | ||
Descritores: | EMPREITADA DEFEITOS RESOLUÇÃO EXCEPÇÃO DE NÃO CUMPRIMENTO BOA FÉ PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE | ||
![]() | ![]() | ||
Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 07/10/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | APELAÇÃO IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO CÍVEL | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | I - A empreitada é um contrato sinalagmático, do qual decorrem obrigações recíprocas para ambas as partes: para o empreiteiro a de realizar a obra e para o dono da obra a obrigação de pagar o preço. II - Num contrato de empreitada, o dono da obra pode opor a exceção de não cumprimento do contrato (cfr. artigo 428º do CC), recusando-se a pagar o preço, se a obra apresentar defeitos. III - A exceção de não cumprimento do contrato não nega a qualquer das partes o direito ao cumprimento da obrigação, nem o dever de a outra cumprir a prestação; o que decorre da mesma é a possibilidade de recusar a prestação por uma das partes enquanto a outra não efetuar a prestação que lhe cabe, ou seja, tem somente um efeito dilatório: a possibilidade de realização da prestação em momento ulterior, quando seja recebida a contraprestação. IV - Atento o principio geral da boa-fé não deve admitir-se o recurso à exceção de não cumprimento do contrato se os defeitos da prestação, atendendo ao interesse do credor, tiverem reduzida importância. V - O principio da proporcionalidade determina que a exceção seja oponível ao cumprimento defeituoso que não necessita de ser tão grave que justifique o direito à resolução do contrato, mas que já não o seja se o cumprimento defeituoso tiver reduzida importância devendo, por isso, ser proporcional à gravidade da inexecução. | ||
![]() | ![]() | ||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório A..., LDª, com sede na Rua ..., ..., ..., apresentou requerimento de injunção, distribuído como a presente ação especial do D.L. nº 269/98, de 1/9, contra F...- UNIPESSOAL, LDª, peticionando o pagamento de uma fatura no valor de €6.938,00, acrescida de juros de mora, outras quantias e taxa de justiça paga, no total de €7.729,47. Alega, para tanto, que, no exercício da sua atividade de serralharia e caixilharia de alumínio, realizou alguns trabalhos numa residência na Rua ... - vulgarmente designada entre Requerente e Requerida como obra na “encosta do elevador”, na cidade ..., nomeadamente o fornecimento e colocação de estrutura em vigas metálicas e perfis C galvanizados. Regularmente citada a Ré contestou invocando a exceção de não cumprimento, e alegando que se deparou com diversos problemas na reabilitação do apartamento, tais como serviços mal-executados, danos estruturais no interior e exterior que originaram atrasos e, ainda, infiltrações no andar inferior, tudo em consequência dos serviços prestados pela Autora. Alegou ainda que o regime simplificado do processo de injunção não se compadece com discussão dos defeitos e danos verificados na obra defendendo que a forma de processo escolhida pela Autora não é a adequada tendo esta feito um uso indevido do procedimento de injunção. Foi proferida sentença que julgou verificada a exceção dilatória inominada de uso indevido do processo de injunção e, em consequência, a Ré foi absolvida da instância. A Autora interpôs recurso que foi julgado procedente, tendo sido ordenado o prosseguimento dos autos. Veio a efetivar-se a audiência de discussão e julgamento com a prolação de sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva: “Por todo o exposto, decide-se julgar a ação parcialmente procedente, e, em consequência, condenar a ré a pagar à autora a quantia de €3.469,00 (três mil quatrocentos e sessenta e nove euros), acrescida de juros de mora, contados desde o dia subsequente à data de vencimento da fatura (22/11/2018), à taxa aplicável às relações comerciais, e bem assim dos juros vincendos até efetivo e integral pagamento. Decide-se, ainda, condenar a Ré no pagamento de quantia de €40,00 (quarenta euros), a título de despesas com a cobrança da divida. Quanto ao mais, decide-se absolver a Ré do pedido, entre o mais, em virtude da procedência da exceção de não cumprimento. Custas da ação a cargo da A. e da R., em partes iguais. Registe e notifique.” Inconformada apelou a Autora da sentença, concluindo as suas alegações da seguinte forma: “1. Não se conforma a Recorrente com a sentença que julga a ação parcialmente procedente, absolvendo a Ré em parte do pedido, em virtude da procedência da exceção de não cumprimento; 2. A matéria em discussão não reveste complexidade, tendo sido devidamente clarificada nos autos, através da junção de documentos comprovativos; 3. A Recorrida aceitou os trabalhos efetuados pela Recorrente, sem qualquer defeito, bem como o respetivo preço, através da fatura em discussão, tendo-se, inclusivamente, comprometido a efetuar o pagamento em determinada e certa data; 4. A Recorrida não pagou o preço da fatura ...01, emitida a 22-11-2018; 5. Os trabalhos realizados pela Recorrente estavam concluídos à data da emissão da fatura supra identificada. 6. Os defeitos apontados e alegados pela Recorrida, em nada tem que ver com os serviços prestados e identificados na referida fatura, pelo que, salvo devido respeito, não deveriam ter sido apreciados pelo Tribunal a quo; 7. O Relatório Pericial junto aos autos atesta a conformidade dos trabalhos prestados pela Recorrente com a pretensão da Requerida; 8. Factos corroborados pelos depoimentos das testemunhas inquiridas em sede de audiência de discussão e julgamento; 9. Pelo que em caso de apreciação dos defeitos alegados pela Recorrida, pelo Tribunal a quo, os mesmos deveriam improceder, tal como a exceção de não cumprimento. 10. O representante legal da Recorrida aceitou a obra/os trabalhos realizados pela Recorrente; 11. A Recorrente não responde por qualquer defeito, em caso de aceitação sem reserva pelo dono da obra; 12. Aquando da comunicação de defeitos, já havia sido, e em muito, ultrapassado o prazo de caducidade para o efeito; 13. Motivo pelo qual, o Tribunal a quo, não os deveria ter levado em linha de apreciação e consequente decisão. 14. O desnível verificado no piso flutuante foi previsto e solicitado pela Recorrida, conforme prova documental junta aos autos; 15. Pelo que não deveria o Tribunal a quo, considerar esse facto – desnível no pavimento flutuante-, como um defeito ou uma deficiência na execução do trabalho da Autora, e consequentemente, atribuir-lhe o direito a metade do preço; 16. Salvo o devido respeito, Tribunal a quo, violou o princípio da proporcionalidade e adequação, quando reduziu o montante devido à Autora na sua metade, em virtude, do já referido desnível no piso flutuante. 17. Face a tudo quanto exposto, deverá ser declarada totalmente procedente a presente ação, e em consequência, condenar-se a Ré no pagamento total do pedido.” Pugna a Recorrente pela procedência do recurso e consequentemente pela procedência total da presente ação condenando-se a Ré a pagar à Autora a quantia de €6.983,00, acrescida de juros de mora, contados desde o dia subsequente à data de vencimento da fatura, à taxa aplicável às relações comerciais, e bem assim os juros vincendos até efetivo e integral pagamento, e ainda no pagamento da quantia de €250,00 relativos a despesas com a cobrança da presente dívida. Não foram apresentadas contra-alegações pela Ré. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. *** II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSOO objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso (artigo 639º do Código de Processo Civil, de ora em diante designado apenas por CPC). A questão a decidir, tendo em conta o teor das conclusões formuladas pela Recorrente, é a de saber se houve erro na subsunção jurídica dos factos: - se a Ré pode invocar a exceção de não cumprimento; - se, podendo fazê-lo, foi violado o principio da proporcionalidade e adequação. *** III. FUNDAMENTAÇÃO3.1. Os factos Factos considerados provados em Primeira Instância: 1. A Autora A..., Ldª dedica-se à atividade de serralharia e caixilharia de alumínio, tendo sido contactada pela Ré a fim de realizar alguns trabalhos numa residência na Rua ... - vulgarmente designada entre as partes como obra na "encosta do elevador", na cidade .... 2. Após prévia encomenda e adjudicação da ré, a autora procedeu ao fornecimento e colocação de estrutura em vigas metálicas e perfis C galvanizados, na referida residência, que originou a emissão da seguinte fatura: - fatura ...01, emitida a 22/11/2018, no valor de 6.938.00€ (seis mil novecentos e trinta e oito euros), com vencimento na mesma data. 3. Os contactos para a adjudicação da obra foram efetuados em data não concretamente apurada mas que se situa entre maio e junho de 2018, tendo nessa ocasião a ré remetido para a requerente plantas e imagens 3D para melhor perceção das necessidades da obra. 4. Por email de 8/8/2018, a ré comunicou à autora que necessitava da obra concluída nessa semana – cfr. documento de fls. 29 verso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido. 5. Em 13/08/2018, a ré enviou email à autora do seguinte teor: “Como já enviado em email anterior, não foram efetuados os serviços e o prazo na nossa obra da Rua ..., ..., em .... Assim sendo, solicito a V.Exª que retire até ao final da semana as duas vigas lá colocadas. Como é do vosso conhecimento, o prejuízo que temos é elevado, pelo incumprimento do acordado. (…)” – cfr. documento de fls. 29 verso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido. 6. Desde o início das conversações, que a ré solicitou à autora especial atenção à laje existente atendendo ao facto da construção do prédio datar de 1961. 7. Apesar do atraso na execução dos trabalhos contratados e do teor do email suprarreferido em 5., após diversas reuniões, a ré acedeu em a autora concluir a obra. 8. Através de carta registada com AR, datada de 03 de junho de 2019, a ré comunicou à autora, entre o mais, o seguinte: “(…) Com efeito, foi acordada com V. Exªs (e Eng. AA a execução da obra sita no ... andar do nº 1 da Rua ..., em ..., mediante o orçamento apresentado para construção de um mezanino. Após diversos adiamentos para o início da execução dessa obra, vieram V.Exªs a verificar que não dispunham de todo o material necessário à sua conclusão…. Para além dessa obra, foi ainda adjudicado a V.Exªs o tratamento das grades exteriores e portões. Só foram colocadas, até à presente data, a grade da varanda e duas portinhas metálicas. Ora, verifica-se que essa grade e portinhas já se encontram com sinais de ferrugem, mal pintadas, mau acabamento e sem tratamento prévio, o que não podemos aceitar. A adjudicação dessas obras a V.Exªs só nos tem causado prejuízo: 1 Tive de colocar escadas novas, para tanto danificaram a madeira existente, assim como o degrau em pedra – o que o Eng. AA informou que iria reparar mas ainda nada, até hoje; 2 Fissuraram a parede interior que tivemos de revestir a pladur (gesso cartonado) para encobrir (obra essa que tivemos de suportar); 3 Fissuraram a parede exterior (situação que aguardamos ser reparada); 4 Descolaram o granito no rodapé e sujaram a parede para colocar a grade da varanda (situação que também se aguarda ser reparada); 5 O mezanino não se encontra conforme imagens em 3D que vos foram apresentadas e enviadas mas, na verdade, ainda não está concluído (o que se aguarda…); 6 As grades colocadas estão com ferrugem pelo que têm de ser substituídas; o demais contratado (grades exteriores e portão= ainda nem sequer foram colocados deixando a obra à mercê de qualquer ato de vandalismo; 7 Os demais artesãos contratados (picheleiro, eletricista, carpinteiro, técnico do pladur, ladrilhadores, pintores,…), apresentaram agora valores mais elevados (quer de materiais (ex. valor do mármores quase que triplicou, carpintaria…), quer de mão de obra) em razão do decurso do tempo (cerca de 1 ano) que mediou entre os primeiros orçamentos e a data prevista para a realização das obras que lhe pretendemos adjudicar; 8 Fruto ainda do atraso na conclusão das obras adjudicadas a V.Exªs, a obra final não se encontra concluída pelo que ainda não consegui arrendar o imóvel, como será expectável se tivessem procedido em conformidade com o contratado e com a lisura profissional que vos é exigida. Por diversas vezes, reclamamos pessoalmente e por email, para que concluísse a obra além de termos verificado que a mesma apresenta defeitos quer na sua colocação quer na sua execução, defeitos que também não nos coibimos de denunciar. As reparações e alterações efetuadas nunca foram suficientes para eliminar convenientemente os defeitos apontados e delas temos vindo a reclamar igualmente. (…) Assim, e porque pretendemos pôr fim rapidamente a este assunto, vimos pela presente solicitar que procedam às reparações necessárias daquilo que já foi feito e que se dignem a concluir o que foi contratado mas ainda não realizado por v. EXªs, a saber: - Finalização do mezanino conforme 3D apresentado; - reparação das escadas e degrau em pedra; - colocação das grades restantes e portão exterior; - substituição das grades colocadas e que se encontram com ferrugem; - reparação das fissuras exteriores e - reparação do granito no rodapé e pintura da parede onde colocaram a grade da varanda; - aplicação do epóxi. Tais intervenções deverão ser efetuadas no prazo de 8 (oito) dias a contar da receção da presente missiva, sob pena de resolvermos o contrato e de nos vermos na obrigação de solicitar a conclusão da obra a outras empresas, caso em que não hesitaremos a imputar todos os custos que daí advierem. Assim, tendo sido contactado por V.Exª para efetuar o pagamento do preço, vimos pela presente igualmente manifestar que, enquanto não forem efetuadas as reparações solicitadas e concluída a obra conforme supra referenciado, não será liquidada nenhuma quantia – direito que nos assiste enquanto V.Exª não cumprirem com as obrigações assumidas. (…)” - cf. documento junto a fls. 31, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido. 9. A viga ou pilar colocado para apoiar as escadas é o resultado da junção de soldadura de duas peças mais pequenas ficando à vista a emenda. 10. Foi orçamentada a colocação de 4 pilares por a autora ter entendido ser necessário em obra, o que a ré aceitou por desconhecimento, mas foram colocados apenas dois pilares. 11. Os perfis em “C” foram colocados sobre as vigas e não no interior das mesmas como devia por forma a que o perfil em C não tivesse deixado espaço para o piso flutuante entrar por baixo da aba da viga vermelha (ou bordô), assim como o pladur. 12. A estrutura assim montada pela autora inviabilizou que o piso e pladur ficassem no interior das abas das vigas principais (bordôs). 13. Tal colocação dos perfis teve repercussões no prosseguimento da obra porquanto ocasionou uma diminuição do pé direito dos tetos obrigando a ré a optar por diversas soluções de remedeio mediante emendas nas vigas principais, de forma a reduzir esses defeitos, como por exemplo na segunda viga principal junto à viga de madeira. 14. Mas também invalidou que o pavimento flutuante fosse devidamente colocado, apesar de todos os esforços desenvolvidos, verificando-se ainda hoje um desnível que se encontra por corrigir. 15. A ré entregou à autora a pintura e tratamento do gradeamento, assim como das portinhas que, para além de também não terem sido colocados no local no prazo acordado, não tendo sido galvanizados, foram pintados com a ferrugem já existente pelo que rapidamente apareceram sinais de oxidação. 16. A autora assumiu a necessidade de retificar esse serviço, mas não o fez. 17. O mesmo tendo sucedido para o granito no rodapé e pintura da parede que foram estragados pela autora com a colocação da grade da varanda. 18. Aquando da fixação das primeiras duas vigas, as mesmas entraram por uma abertura onde posteriormente iria ser colocada uma janela através de um camião grua. 19. Atendendo ao atraso na obra, ao facto do serviço de caixilharia já ter sido contratado e desse serviço não poder ser mais adiado, para além da necessidade de fechar a casa para não danificar as intervenções já levadas a cabo, as janelas tiveram de ser colocadas antes que as demais vigas que a autora devia colocar estarem no local. 20. Assim, as últimas vigas tiveram de entrar para o prédio pelo .... 21. Em consequência, os degraus ficaram danificados, assim como a sua estrutura, com o arrastar das vigas e peso das mesmas. 22. E também as paredes dessas escadas sofreram estragos com a passagem das vigas acabando com fissuras que tiveram de ser encobertas pela ré com pladur. 23. O atraso na obra da autora acabou por influenciar os serviços que ainda estavam por prestar sendo que os demais profissionais, não podendo esperar mais por terem outras obras programadas, viram-se na obrigação de cumprir o serviço contratado, tais como isolamento e caixilharia. 24. Do atraso da requerente na conclusão da estrutura do mezanino resultaram danos na parte da obra que já tinha avançado, por não poder esperar mais que a requerente concluísse o seu serviço, nomeadamente o isolamento colocado nas paredes acabou por ser danificado pela fixação posterior da estrutura metálica que já se devia encontrar concluída aquela data. 25. Com a fixação das escadas de acesso ao mezanino, o proprietário do ... viu o teto da sua fração a abrir e cimento a escorrer pelas paredes. 26. A ré solicitou um orçamento para a reparação das fissuras na estrutura do prédio tendo já comunicado o mesmo à autora nas reuniões tidas entre as partes. 27. A requerida solicitou à autora a reparação nos termos supra descritos em 8. 28. Não tendo a autora reparado, a ré proveio à reparação de alguns. 29. A reparação das escadas de acesso à fração obrigou à substituição da sua estrutura que havia ficado danificada em razão do peso excessivo suportado aquando da passagem das vigas, assim como à remoção dos degraus em madeiras tendo a ré optado em revestir os degraus em granito de BB de qualidade inferior por o seu custo ser inferior ao de um revestimento em madeira. 30. Para o efeito a autora despendeu €2.186,10. 31. Para a reparação das fissuras nas paredes dessas escadas, a ré teve de revesti-las a gesso cartonado tendo pago um valor de 300,00€ que posteriormente foi incluído no valor da fatura dos demais serviços contratados em gesso cartonado. 32. A ré teve de reparar os danos causados na fração do ... tendo essa reparação tido o custo de 1.163,35€. 33. As fissuras exteriores não foram reparadas mas a ré solicitou um orçamento que ascende o valor de 16.134,53€ (IVA incluído). 34. A parte da casa sem mezanino já estava completamente isolada com manta de alumínio, perfis para isolamento térmico em azul e iria receber o pladur como revestimento. 35. A obra esteve parada à espera que a autora concluísse o seu serviço. 36. Com os danos verificados no isolamento já colocado, a requerida teve de contratar a sua reparação para além do serviço primitivamente orçamentado e respetivo custo. 37. Os demais serviços contratados viram os seus preços alterados em comparação com nos inicialmente anunciados porquanto se verificou o aumento do preço dos materiais (do mármore por exemplo), para além dos trabalhadores se terem visto, não raras vezes, na obrigação de efetuar deslocações inúteis para depois verificarem in loco que não podiam continuar com a obra por culpa da autora. 38. Esses mesmos prestadores de serviço foram iniciando outras obras pelo que a da ré foi relegada para segundo plano devendo sujeitar-se depois à disponibilidade destes. 39. Caso a obra tivesse ficado concluída nos prazos estabelecidos, a ré teria conseguido arrendar a fração por um período de 3 anos com uma renda mensal de 1.500,00€. 40. À data da emissão da fatura supra identificada em 2. já se encontravam todos os trabalhos cujo pagamento se solicitava totalmente finalizados. 41. Por email de 24/10/2018, a autora enviou à ré a fatura supra identificada em 2. 42. Por email de 21/11/2018, a ré devolveu à autora a fatura solicitando a emissão de nova fatura com taxa de IVA a 6%. 43. Por email de 22/11/2018, a autora remeteu à ré a fatura corrigida bem como nota de crédito com a taxa errada, tendo a mesma sido aceite sem qualquer reserva. 44. Em 26/09/2019, a autora remeteu à ré o email do seguinte teor: “No seguimento da reunião de hoje na obra da Rua ... em ... temos a reportar os seguintes aspetos, a considerar no âmbito da conclusão do projeto inicial, bem como no seguimento do mesmo: - nova pintura do gradeamento exterior; - reparação das escadas em pedra; - remoção do pilar em ferro; - orçamento para revestimento das escadas em ferro com chapa de alumínio (5mm espessura) anti-derrapante e perfis em ferro; - orçamento para calhas para as vigas do piso superior. Na eventualidade de pretender acrescentar ou alterar algum outro aspeto, disponha, por favor do nosso contacto de e-mail e/ou telefona.(…)”. 45. Em reunião de 26/09/2019, entre autora e ré, foi acordado o pagamento da fatura supra identificada em 2. *** Factos considerados não provados em Primeira Instância:a) A autora informou que conseguiria ter a obra concluída no final de julho de 2018. b) Não obstante o referido em 6., a autora não teve em atenção nem as recomendações efetuadas, nem as imagens 3D (renders) e plantas enviadas. c) A viga ou pilar colocado para apoiar as escadas era desnecessária por as escadas serem suficientemente robustas para suportar o peso não precisando de mais nenhum suporte, facto que veio incrementar o orçamento e aumentar escusadamente o peso na laje. d) Esse pilar era tão dispensável que a autora se propôs retirá-lo quando abordada quanto a este assunto. e) A autora determinou a construção de uma estrutura metálica para o mezanino demasiadamente pesada pelo que desnecessária atendendo ao facto desta, no final da obra, ser tão só para suportar um sofá, um móvel de TV, TV e uma estante. f) O excesso de peso contendeu com a estrutura do prédio e originou diversos estragos, tais como fissuras no exterior. g) Mas também humidade na fração do ..., que a ré teve de solucionar. h) Após adjudicar numa primeira fase o respetivo trabalho, a ré acabou por cancelar essa mesma adjudicação, tendo a autora cancelado todas as encomendas efetuadas para o efeito. i) Quando contactada, uma segunda vez, pela ré, os respetivos prazos para entrega dos materiais e a disponibilidade de agenda da autora já não correspondiam ao inicialmente acordado. j) A autora já suportou despesas com a cobrança da presente divida, nomeadamente com os honorários da mandatária pela abertura do processo, análise da factualidade em discussão, avaliação da estratégia processual a seguir, elaboração do requerimento de injunção. *** 3.2. DA REAPRECIAÇÃO DE DIREITO:3.2.1. DA EXCEÇÃO DE NÃO CUMPRIMENTO A Autora veio peticionar nos presentes autos o pagamento de uma fatura, datada de 22/11/2018, no valor de €6.938,00, respeitante ao fornecimento e colocação de uma estrutura em vigas metálicas e perfis C galvanizados. Na contestação a Ré, para além do mais e no que aqui releva, invocou a exceção de não cumprimento. O Tribunal a quo entendeu que à Ré assistia o direito de se escusar ao pagamento do preço da obra, mas apenas quanto a metade do valor peticionado (ou seja, relativamente a €3.469,00) enquanto a Autora não procedesse à reparação do perfil de forma a eliminar o desnível do pavimento flutuante. É contra este entendimento que se insurge a Autora/Recorrente sustentando que a Ré não pode invocar a exceção de não cumprimento uma vez que: - os defeitos que invocou, a existirem, nada têm a ver com os serviços subjacentes à fatura peticionada nos autos; - a Ré aceitou os trabalhos realizados sem qualquer reserva; - já teria esgotado há muito o prazo de caducidade para a denuncia de qualquer defeito que pudesse existir; - quanto ao desnível existente a própria Ré é que o pretendia, não podendo ser considerado defeito. Sustenta por último que, a entender-se que a Ré pode invocar a exceção de não cumprimento, não respeita o principio da proporcionalidade e adequação permitir que a Ré se recuse ao pagamento de metade do montante da fatura. Vejamos se lhe assiste razão. A questão que aqui se coloca é a de saber se a Ré pode recusar o pagamento da aludida fatura, ou de parte dela, o que nos remete diretamente para a temática da exceção de não cumprimento do contrato, a que se refere o artigo 428º do Código Civil (de ora em diante designado apenas por CC). Antes, porém, de entrarmos na análise de tal questão impõe-se tecer algumas considerações prévias em face das alegações da Recorrente. Em primeiro lugar para referir que, tal como interpretamos as suas alegações e conclusões, não visa a presente apelação a impugnação da decisão sobre a matéria de facto. Lidas as alegações (quer o seu corpo, quer as conclusões) nelas não vislumbramos qualquer intenção da Recorrente em impugnar a matéria de facto. Dir-se-á, ainda assim, que se fosse essa a intenção, uma vez que se refere de forma genérica a documentos, à prova pericial, às declarações do legal representante da Ré e da Autora e às declarações das testemunhas, não cumpriu manifestamente os ónus que lhe são impostos pelo artigo 640º do CPC. De acordo com este preceito é de exigir ao recorrente que obrigatoriamente especifique: - Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; - Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; - Quando a impugnação dos pontos da decisão da matéria de facto se baseie em provas gravadas deverá ainda indicar com exatidão as passagens da gravação relevantes e proceder se o entender à transcrição dos excertos que considere oportunos; - A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. O incumprimento de tal ónus implica a rejeição do recurso, na parte respeitante, sem possibilidade sequer de introdução de despacho de aperfeiçoamento. A este propósito escreve António Abrantes Geraldes (Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2ª Edição, 2014, p. 133) que “[o] Recorrente deixará expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência nova que vem no reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente (…)” mas também que \“quando houver sérios motivos para rejeição do recurso sobre a matéria de facto (maxime quando o recorrente se insurja genericamente contra a decisão, sem indicação dos pontos de facto; quando não indique de forma clara nem os pontos de facto impugnados, nem os meios de prova em que criticamente se baseia; ou quando nem sequer tome posição clara sobre a resposta alternativa pretendida) tal efeito apenas se repercutirá nos segmentos afetados (…)”. Deverá, por isso, ser rejeitado o recurso genérico da decisão da matéria de facto quando não se delimitam com precisão os concretos pontos que se pretendem questionar, e não se deixa expressa a decisão que, no entender do recorrente, deve ser proferida sobre a matéria de facto impugnada. Ora, analisado o corpo das alegações e as conclusões do recurso conclui-se que a Recorrente aí não especifica qualquer concreto ponto da matéria de facto que impugna e nem indica a decisão que, no seu entender deve ser proferida relativamente ao mesmo; as conclusões apresentadas não demonstram, por isso, qualquer preocupação de precisão na delimitação, nesta parte, do objeto do recurso, não indicando concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados. Assim sendo, ainda que tivesse sido intenção da Recorrente impugnar a matéria de facto (o que entendemos não ter sido) não se mostraria devidamente cumprido o ónus de delimitação do objeto do recurso sobre a matéria de facto, e seria de rejeitar, nesta parte, o recurso. Por outro lado, quanto à questão do decurso do prazo de caducidade para a denuncia de qualquer defeito, importa salientar que só agora a Recorrente veio suscitar tal questão e, estando em causa uma questão nova, como é consabido, a mesma não pode ser apreciada por esta Relação. De facto, os recursos têm por base decisões (cfr. artigo 627º do Código de Processo Civil) não podendo incidir sobre questões novas. Na fase de recurso, como afirma António Abrantes Geraldes (Ob. cit., p. 27) “as partes e o Tribunal Superior devem partir do pressuposto de que a questão foi objeto de decisão tratando-se apenas de apreciar a sua manutenção, alteração ou revogação. Por outro lado, a demanda do Tribunal Superior está circunscrita às questões já submetidas ao tribunal de categoria inferior”; desta regra excecionam-se apenas, como é óbvio, as questões de conhecimento oficioso, o que não é manifestamente o caso. Nos termos do disposto no artigo 333º do CC a caducidade só é de conhecimento oficioso quando for estabelecida em matéria excluída da disponibilidade das partes. Não estando em causa tal matéria, a caducidade não é de conhecimento oficioso, carecendo de alegação e prova por parte do interessado a quem aproveita. Assim, não tendo sido colocada a questão perante o Tribunal a quo, não tendo sido objeto da decisão recorrida e não sendo manifestamente de conhecimento oficioso, não pode dela conhecer esta Relação. Analisemos agora a questão da exceção de não cumprimento, começando por salientar que não vem questionado no presente recurso o enquadramento jurídico efetuado pelo Tribunal a quo que entendeu, e bem, ter sido celebrado entre a Autora e a Ré um contrato de empreitada. A empreitada é o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra mediante um preço (artigo 1207º do CC), sendo que o empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato (artigo 1208º do CC), e sendo a principal obrigação do dono da obra a prestação do preço acordado. Como é sabido, estamos perante um contrato sinalagmático, do qual decorrem obrigações recíprocas para ambas as partes: para o empreiteiro a de realizar a obra e pata o dono da obra a obrigação de pagar o preço. “Um dos aspetos em que se exprime o sinalagma contratual, no contrato de empreitada – corolário do princípio da pontualidade (art. 406º do Código Civil) – é, do lado do empreiteiro, a execução da obra nos termos convencionados – “O empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato” – art. 1208º do Código Civil – e, do lado do dono dela, a obrigação de, caso a aceite, pagar o preço – “O preço deve ser pago, não havendo cláusula ou uso em contrário, no ato de aceitação da obra” – nº 2 do art. 1211º do citado diploma” (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16/06/2015, Processo n.º 3309/08.1TJVNF.G1.S1, Relator Fonseca Ramos, disponível para consulta em www.dgsi.pt). Por isso, num contrato de empreitada, o dono da obra pode opor a exceção de não cumprimento do contrato (cfr. artigo 428º n.º 1 do CC), recusando-se a pagar o preço, se a obra apresentar defeitos. Vejamos. Conforme estabelece o n.º 1 do artigo 428º do CC se nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, cada um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação enquanto o outro não efetuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo. A exceção de não cumprimento do contrato aí prevista não nega a qualquer das partes o direito ao cumprimento da obrigação, nem o dever de a outra cumprir a prestação. A exceptio non inadimpleti contractus concede é ao excipiente a possibilidade de não realizar a prestação a que se encontra adstrito (que tanto pode ser uma prestação de coisa, como uma prestação de facto), enquanto a outra parte não efetuar a contraprestação no contrato bilateral ou sinalagmático que a ambos vincula. Ou seja, tem somente um efeito dilatório: a possibilidade de realização da prestação em momento ulterior, quando seja recebida a contraprestação. É que, através da exceção de não cumprimento o excipiens não está a recusar a satisfação da prestação a que se encontra adstrito, nem a negar o direito do autor ao seu cumprimento, pretendendo apenas realizar a sua prestação no momento em que receba simultaneamente da outra parte a prestação a que tem direito. Assim, salienta-se desde já, não estamos perante uma causa extintiva do crédito da Autora, pois a exceção de não cumprimento visa apenas paralisar temporariamente a pretensão da contraparte; ainda que tenha sido julgada procedente a exceção de não cumprimento relativamente a metade do crédito peticionado pela Autora nos presentes autos, tal não significa que a Ré ficou livre da obrigação de pagamento, mas apenas que beneficiou da suspensão dessa obrigação, enquanto a Autora não cumprir a sua obrigação. A exceptio non adimpleti contractus prevista no referido artigo 428º n.º 1 do CC é própria dos contratos bilaterais e para a sua aplicação é necessário que as obrigações contratualmente previstas sejam correspetivas, correlativas ou interdependentes, isto é, que uma seja sinalagma da outra. Como referem Pires de Lima e Antunes Varela (Código Civil Anotado, Volume I, p. 405 e 406) “a exceptio non adimpli contractus a que se refere este artigo pode ter lugar nos contratos com prestações correspetivas ou correlativas, isto é, interdependentes, sendo uma o motivo determinante de outra. É o que se verifica nos contratos tradicionalmente chamados bilaterais ou sinalagmáticos. É necessário ainda que não estejam fixados prazos diferentes para as prestações, pois, neste caso, como deve ser cumprida uma delas antes da outra, a exceptio não teria razão de ser”. Acrescentam ainda que “a exceptio não funciona como uma sanção, mas apenas como um processo lógico de assegurar, mediante o cumprimento simultâneo, o equilíbrio em que assente o esquema do contrato bilateral (…) E vale tanto para o caso de falta integral do cumprimento, como para o de cumprimento parcial ou defeituoso, desde que a invocação não contrarie o princípio geral da boa fé consagrado nos artigos 227º e 762º nº 2”. Visa, assim, a exceção de não cumprimento do contrato assegurar o equilíbrio entre as prestações no âmbito dos contratos sinalagmáticos e vale tanto para o caso de falta integral do cumprimento, como para o de cumprimento parcial ou defeituoso, desde que a invocação não contrarie o princípio geral da boa-fé (cfr. artigos 227º e 762º n.º 2 do CC). A exceção de não cumprimento do contrato pode também ser utilizada quando a outra parte cumpre a obrigação, mas de forma defeituosa (exceptio non rite adimpleti contractus), mas desde que os defeitos prejudiquem a integral satisfação do interesse do credor. Atento o principio geral da boa-fé não deve admitir-se o recurso à exceção de não cumprimento do contrato se os defeitos da prestação, atendendo ao interesse do credor, tiverem reduzida importância. Segundo Almeida Costa (R.L.J., Ano 119, p. 144) do princípio da boa fé resulta “o imperativo de uma apreciação, em face das circunstâncias concretas, da gravidade do cumprimento incompleto ou defeituoso, que não deve mostrar-se insignificante. Seria contrário à boa fé que um dos contraentes recusasse a sua inteira prestação, só porque a do outro enferma de uma falta mínima ou sem suficiente relevo. Na mesma linha, surge a regra da adequação ou proporcionalidade entre a ofensa do direito do excipiente e o exercício da exceção. Uma prestação significativamente incompleta ou viciada justifica que o outro obrigado reduza a contraprestação a que se acha adstrito. Mas, em tal caso, só é razoável que recuse quanto se torne necessário para garantir o seu direito”. O principio da proporcionalidade determina que a exceção seja oponível ao cumprimento defeituoso que não necessita de ser tão grave que justifique o direito à resolução do contrato, mas que já não o seja se o cumprimento defeituoso tiver reduzida importância devendo, por isso, ser proporcional à gravidade da inexecução (v. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 06/09/2016, Processo n.º 6514/12.2TCLRS.L1.S1, Relator Garcia Calejo, disponível em www.dgsi.pt). Assim, nada obsta a que, provando-se o cumprimento defeituoso da Autora, a Ré possa invocar a exceção de não cumprimento, dentro dos limites impostos pela boa-fé, ou seja, se a prestação efetuada prejudicar a integral satisfação do seu interesse e desde que o cumprimento defeituoso não seja de reduzida importância. Analisemos então o caso dos autos. No caso concreto, como resulta da matéria de facto provada, a Autora cumpriu efetivamente de forma defeituosa a prestação a que se encontrava obrigada. Ao contrário do que sustenta a Recorrente, o defeito invocado pela Ré e considerado pelo Tribunal a quo reporta-se aos serviços subjacentes à fatura peticionada nos autos. Está apenas em causa, pois só este foi considerado para efeitos da exceção de não cumprimento, o desnível existente no piso flutuante decorrente da forma como foi efetuada a colocação dos perfis em “C”: colocados sobre as vigas e não no interior das mesmas. Conforme decorre dos pontos 11), 12), 13) e 14) dos factos provados os perfis em “C” foram colocados sobre as vigas e não no interior das mesmas, como devia, por forma a que o perfil em C não tivesse deixado espaço para o piso flutuante entrar por baixo da aba da viga vermelha (ou bordô), assim como o pladur; a estrutura assim montada pela autora inviabilizou que o piso e pladur ficassem no interior das abas das vigas principais (bordôs). Tal colocação dos perfis teve repercussões no prosseguimento da obra porquanto ocasionou uma diminuição do pé direito dos tetos obrigando a Ré a optar por diversas soluções de remedeio mediante emendas nas vigas principais, de forma a reduzir esses defeitos, como por exemplo na segunda viga principal junto à viga de madeira e também invalidou que o pavimento flutuante fosse devidamente colocado, apesar de todos os esforços desenvolvidos, verificando-se ainda hoje um desnível que se encontra por corrigir. Temos, por isso, de concluir pela deficiente colocação dos perfis que determinaram a existência de um desnível que não devia existir; veja-se que nada se mostra apurado que permita concluir, como pretende a Recorrente, que a Ré pretendia a existência de tal desnível e nem que a Ré aceitou os trabalhos realizados sem qualquer reserva. Assim, provada a execução defeituosa por parte da Autora, determinante do desnível no pavimento, pode a Ré invocar a exceção de não cumprimento, não sendo de considerar o cumprimento defeituoso, no caso concreto, de reduzida importância. Sustenta ainda a Recorrente que, mesmo a entender-se que a Ré pode opor a exceptio, não respeita o principio da proporcionalidade e adequação permitir que a Ré se recuse ao pagamento de metade do montante da fatura. Como já referimos o principio da proporcionalidade determina que a escusa do pagamento seja proporcional à gravidade da inexecução. In casu, a Autora foi contactada pela Ré a fim de realizar alguns trabalhos numa residência e, após prévia encomenda e adjudicação da Ré, procedeu ao fornecimento e ali colocou uma estrutura em vigas metálicas e perfis C galvanizados, que originou a fatura no valor de €6.938.00 cujo pagamento a Autora reclama na presente ação. Como já vimos, a execução defeituosa por parte da Autora possibilita à Ré invocar a exceção de não cumprimento do contrato, ou seja, recusar proceder ao pagamento do preço enquanto a Autora não retificar a colocação dos perfis de modo a que seja eliminado o desnível do pavimento. A questão que se coloca é se o pode fazer, se pode recusar o pagamento, relativamente à totalidade do preço, uma vez que a escusa desse pagamento tem de ser proporcional à extensão dos defeitos, à gravidade da inexecução. Considerando que no caso concreto o valor da fatura respeita ao fornecimento e colocação de uma estrutura, que os trabalhos foram finalizados pela Autora, não estando em causa um defeito da própria estrutura, mas na forma como foi colocada, entendemos ser acertada a posição do tribunal a quo ao julgar ser desproporcional a recusa da Ré em pagar a totalidade do preço; atendendo ao principio da proporcionalidade e à referida factualidade, entendemos também como adequado admitir a escusa de pagamento quanto a metade do valor faturado. Não vislumbramos que a matéria de facto provada imponha a fixação de qualquer outra proporção, sendo certo que a Recorrente também o não diz, e nem sequer indica qual o valor que considera ser o adequado. Não merece, por isso, a sentença recorrida a censura que lhe dirige a Recorrente, improcedendo integralmente o recurso. As custas são da responsabilidade da Recorrente em face do seu integral decaimento (artigo 527º do CPC). *** IV. DecisãoPelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente o recurso, confirmando-se a sentença recorrida. Custas pela Recorrente. Guimarães, 10 de julho de 2023 Texto elaborado em computador e integralmente revisto pela signatária Raquel Baptista Tavares (Relatora) José Cravo (1º Adjunto) Afonso Cabral de Andrade (2º Adjunto) |