Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | VERA MARIA SOTTOMAYOR | ||
Descritores: | ACORDO COLECTIVO DE TRABALHO BANCÁRIO COMPLEMENTO DE PENSÃO CÁLCULO CÁLCULO DA PENSÃO | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 03/16/2017 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | SECÇÃO SOCIAL | ||
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Sumário: | I – O sistema previdencial do sector bancário é regulado pelo ACT e respectivos anexos, pois é ai que se encontra toda a disciplina que lhe respeita, não sendo invocáveis as normas que regulam o regime geral da segurança social dos trabalhadores por conta de outrem II – O cálculo do complemento de reforma de um trabalhador bancário que o deixou de ser antes de atingir a situação de reforma e a quem tenha sido atribuída a reforma antecipada no âmbito do regime de segurança social, deve ser efectuado de harmonia com o disposto no n.º 2 da cláusula 122ª do ACT em causa, a qual exclui que os elementos de cálculo do complemento de pensão possam resultar do regime geral da segurança social. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social da Relação de Guimarães APELANTE: BANCO AA…, S.A. APELADO: BB… I – RELATÓRIO BB, residente na Rua Inácio José Peixoto, n.º 34, em Braga, instaurou na Comarca de Braga, Instância Central de Braga, 1ª Secção de Trabalho, a presente acção declarativa com processo comum contra BANCO AA, S.A., com sede … no Porto., pedindo a condenação da Ré: - a pagar-lhe as mensalidades do complemento de pensão de reforma por velhice, calculadas nos termos da cláusula 122ª do ACT do sector bancário, vencidas desde o dia 11 de Junho de 2016 até ao dia 12 de Agosto de 2016, perfazendo a quantia global de € 939,50 (novecentos e trinta e nove euros e cinquenta cêntimos), acrescida de juros de mora a calcular à taxa legal supletiva desde o seu vencimento até integral pagamento, a liquidar em execução de sentença; - a pagar-lhe as diferenças entre as mensalidades do complemento de pensão de reforma por velhice efectivamente pagas, desde o dia 13 de Agosto de 2015 até à propositura da presente acção e o valor que deveria ter sido pago durante esse período, calculadas nos termos da cláusula 122ª do ACT do sector bancário, em consequência da aplicação ilegal do factor de sustentabilidade, no valor global de € 447,87 (quatrocentos e quarenta e sete euros e oitenta e sete cêntimos), acrescido de juros de mora a calcular à taxa legal supletiva desde o seu vencimento até integral pagamento, a liquidar em execução de sentença; - a pagar-lhe as prestações vincendas do complemento de reforma, calculado nos termos da cláusula 122ª do ACT do sector bancário, desde a data da citação até ao trânsito em julgado da sentença e actualizadas nos termos legais, sem aplicação do factor de sustentabilidade, acrescidas de juros de mora a calcular à taxa legal supletiva desde o seu vencimento até integral pagamento, a liquidar em execução de sentença; - a pagar ao autor as prestações vincendas do complemento de reforma, calculado nos termos da cláusula 122ª do ACT do sector bancário, desde do trânsito em julgado da sentença até ao ultimo dia do mês de vida do autor, sem aplicação do factor de sustentabilidade, a liquidar em execução de sentença. A Ré contestou a acção pugnando pela sua total improcedência e por fim, pelo Mmo. Juiz a quo foi proferido despacho saneador sentença, que terminou com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, decido julgar a presente acção parcialmente procedente e, em consequência: 1. Condeno o réu a pagar ao autor a diferença entre o complemento de reforma que pagou e aquele que era devido sem aplicação do factor de sustentabilidade desde o dia 13 de Agosto de 2015 até ao trânsito em julgado da presente sentença, acrescida de juros de mora a calcular à taxa legal supletiva desde o vencimento de cada uma das prestações até integral pagamento; 2. Condeno o réu a pagar ao autor o complemento de reforma sem aplicação do factor de sustentabilidade, a partir do trânsito em julgado da presente sentença. Nos termos do art. 306º nº1 e 2 do Cód. de Processo Civil, fixo à causa o valor de € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo). Custas a cargo do autor e do réu na proporção do decaimento. Registe e notifique.” Inconformada com esta sentença, dela veio o Réu BANCO AA, S.A. interpor recurso de apelação para este Tribunal da Relação de Guimarães, apresentando alegações que terminam mediante a formulação das seguintes: “Conclusões: 1. O presente recurso vem interposto da douta Sentença de fls._, a qual, salvo o devido respeito, não pode o Recorrente concordar. 2. Salvo o devido respeito, que não só é muito, mas é todo, o pensamento do Senhor Juiz faz uma profunda e exaustiva análise da situação fática e jurídica dos autos, contudo, e no entender do Recorrente, errada. 3. Num primeiro ponto, crê a Recorrente que a análise feita à interpretação da Comissão Paritária sobre a cláusula 122ª do ACT aplicável foi incorreta, quer em si mesmo, quer no enquadramento jurisprudencial em que está inserida. É verdade que o R. referencia essa análise, mas fá-lo apenas para circunstanciar o panorama jurídico em que a mesma foi gerada, e para, por contraste, poder evidenciar a tese que seguiu, e num segundo plano de análise poder fundamentar também a decisão tomada, 4. Pelo que as referências feitas a que o sistema não pode funcionar numa dinâmica de mútua catalização osmótica, é relativo a um circunstancialismo jurídico que não é o dos autos, mas aquele em que os trabalhadores se reformam fora do Setor Bancário depois de atingirem os 65 anos de idade, e não no caso dos autos - situação de reforma antecipada, não prevista no Setor Bancário, para os casos de reformas obtidas junto da Segurança Social antes de alcançada incapacidade presumida. 5. Em síntese, pensa o Recorrente que o que está em causa é saber se a fonte do direito do A. é contratual, ou emerge do Acordo Coletivo de Trabalho e da Lei. Pensa-se ser este o ponto de bifurcação entre a tese seguida pelo Recorrente e a sustentada no douto aresto em crise. 6. Antes de avançarmos fica desde já a alegação de que ainda que fosse seguida a tese da douta sentença, a de que o direito do A. e agora recorrido emergisse do ACT ou/e da Lei, de acordo com a “interpretação actualista” que o Senhor Juiz do Tribunal a quo entende dever ser feita, a verdade é que, pese embora as considerações tecidas na sentença acerca do circunstancialismo existencial do denominado “factor de sustentabilidade”, a decisão teria ainda de ser outra. 7. Com efeito, num complexo interpretativo atualista do ACT, designadamente da cláusula 122ª conduziria à aplicação do factor de sustentação à pensão do A., porquanto a atualidade em curso assim o exigiria. 8. A proposta feita pela Recorrente, pese embora a redação e semântica utilizadas nas comunicações, evidenciadas pelo Tribunal a quo, que não lhe retira aquela natureza de proposta, pelo contrário confere um tratamento igualitário, a tese do R. promove a igualdade entre trabalhadores do Sector Bancário e trabalhadores sem carreira na Banca, o que salvo o devido respeito não sucede na solução preconizada no aresto recorrido, que desde logo por esta razão deverá ser revogado. 9. Outrossim, é de facto a natureza contratual da pensão de reforma do A. E salvo o devido respeito, não pode ser outra a sua natureza, dado o pressuposto lapidar de que o A. não tinha direito a qualquer pensão de reforma a ser paga pela R. antes de atingir os 65 anos de idade, como aliás dá nota a douta sentença ao mencionar que parte do Sector Bancário não reconhece esse direito aos seus ex-trabalhadores. 10. O Autor, ora Recorrido, não tem qualquer direito a um complemento de pensão de reforma emergente do ACT aplicável (Publicado no Bol. Min. Trab. Emprego, 1ª Séria, n.º 48 de 29/12/2001), e menos ainda calculado nos termos apresentados, porque pura e simplesmente o seu direito não se havia ainda constituído no momento em que o R. lho conferiu, e o direito que tem resultou duma pura liberalidade do R.. 11. O direito previdencial do Recorrido é, ou era até à sua atribuição, um direito em formação, que apenas se constituiria com o alcance da idade de reforma que este, como veremos, ainda não atingiu, cfr. doc. 1 junto com a contestação. 12. De acordo com o disposto na referida clª 122ª ó tem direito a uma pensão de reforma nos termos do ACT – AA, e o mesmo sucede com o restante Sector Bancário, o trabalhador que se encontre numa situação de invalidez, ou invalidez presumível, situações que são aferidas naturalmente nos termos do próprio ACT em causa. 13. O Recorrido não está em situação de invalidez como resulta da própria petição inicial, aliás douta, e não foi submetido, o que está correto, a qualquer junta médica como determina o n.º 3 da citada cláusula, nem se encontra numa situação de invalidez presumível porquanto esta, nos termos do disposto na cláusula 120ª ACT AA apenas existe quando o trabalhador atinge os 65 anos de idade, o que não sucedeu ainda com o Recorrido cfr. doc. 1 junto com a contestação, porquanto o Recorrido intencionalmente omitiu a sua idade, e não refere que pediu junto da Segurança Social a sua reforma antecipada. 14. Assim, e no que respeita ao regime previdencial bancário, constante do ACT AA o Recorrido, à data de Junho a Agosto de 2015 tinha em curso, apenas, um direito em formação, que se constituiria somente quando este atingisse os 65 anos de idade, e não com a atribuição pela Segurança Social de uma pensão de reforma. 15. E tanto basta para que improceda, in totum, a ação. O Recorrido não tinha qualquer direito a reivindicar do R. um complemento de pensão de reforma. 16. Nem este regime pode ser derrogado pelo regime de Segurança Social uma vez que o facto de neste regime se ter previsto que o tempo de Banco releva para atribuição de uma pensão de Segurança Social, não significa que a concessão de uma pensão pela Segurança Social com relevo do tempo de Banca, constitua uma obrigação para os Bancos de atribuírem na mesma altura, uma pensão de reforma ao reformado da Segurança Social, e menos ainda nos termos daquela. 17. Os regimes não se catalisam reciprocamente, não se complementam mutuamente de modo a contagiar um ao outro as obrigações previdenciais de cada um numa osmose que produziria o resultado procurado pelo Recorrido. 18. Sucede porém que o R. tem casuisticamente analisado casos semelhantes ao do A., a quem, sem suporte obrigacional no ACT – AA, e na lei, tem atribuído, quando requerida, uma pensão de reforma configurada em termos semelhantes àquela que atribuiu ao A. 19. Quer isto dizer que, não tendo o Recorrido direito a receber do Recorrente qualquer complemento de pensão de reforma antes dos 65 anos, o Recorrente, por aquele lha ter requerido, e atentas as circunstâncias particulares do Recorrido, decidiu atribuir-lhe uma pensão de reforma antes da idade dos 65 anos, ou seja, antes de se ter constituído a favor deste o direito previdencial em formação. 20. Não há pois que atender em concreto à pensão paga pela Segurança Social, mas somente, e in casu por exclusiva vontade do R., aquela que o A. auferiria se o tempo prestado de laboro ao Banco, aplicado à remuneração base (n.º 2 da citada cláusula) tivesse sido contado de acordo com os critérios fixados por lei para Segurança Social. 21. O direito do Recorrido a um complemento pensão de reforma emerge apenas da vontade do Recorrente em lha atribuir, e é configurado como o Recorrido lho apresentou e que o Recorrente quis que fosse, por equilíbrio com os pares do Recorrido, nos mesmos termos previstos na cláusula 122ª do ACT – AA e Segurança Social, se não se exigisse o requisito dos 65 anos de idade, e relevando: (i) o fator tempo tal como este é relevado pela lei da Segurança Social (cláusula 122ª n.º 1 do ACT AA), o que significaria, atenta a reforma antecipada do A., a aplicação de um fator de redução/penalização (não aplicado), e significa a aplicação de um fator de sustentabilidade, e (ii) o fator remuneração base a considerar, que é a auferida na Banca nos termos da cláusula 122ª, n.º 2 do ACT AA 22. O direito do A. a um complemento de pensão de reforma não emerge assim do ACT aplicável, porquanto este não o prevê, mas de uma declaração de vontade da Recorrente na sequência de um pedido do Recorrido, pelo que se configura nos exactos termos em que a Recorrente o declarou, e não nos termos que o Recorrido agora o entende. 23. A fonte do direito do A., é a vontade do Recorrente, e não o ACT em causa. Por via deste, o A. apenas teria direito a um complemento de pensão de reforma, e aí sim sem fator de sustentabilidade (decorrente da redação que tem atualmente o n.º 5 do DL 187/07 de 10 de Maio), como veremos, quando perfizesse os 65 anos de idade. 24. Quanto à aplicação do factor de sustentabilidade, o Recorrente, no âmbito da liberalidade exposta, e a bem de um balanceamento com os pares do Recorrido em situação análoga, tomou por base transversal aquela cláusula, preterindo o requisito tempo, necessário para poder atribuir uma pensão de reforma ao A., e socorrendo-se dos demais critérios previstos na mesma, ajustando-os naturalmente às características singulares do processo do A.. 25. Assim, e embora o A. não ponha em causa a remuneração base a relevar para o cálculo do complemento de pensão, pensa o R. que a exposição do contexto dinâmico em que este pedido do A. se insere, tem interesse para clarificar a razão de ser da aplicação do fator de sustentabilidade. 26. Na prática significou partir do valor de 1.196,38 (nível 10, o do Recorrido à data cessação do contrato de trabalho com o Banco), e chegar ao valor de 454,62 euros, cfr. doc. 1 da p.i., valor que o Recorrido teria direito a receber de pensão na data em que perfizesse os 65 anos de idade, considerando os 19 anos de serviço bancário, e a não sobreposição/duplicação do ano de 1979, também reconhecido pela Segurança Social (evitando-se assim a aplicação da cláusula 115º e a necessidade de o Recorrido ter de devolver mensalmente parte da sua pensão paga pela Segurança Social ao R), 27. Partindo agora deste valor, analisemos o n.º 1 da cláusula 122ª do ACT AA. Ignorando o limite de idade de 65 anos com vista à atribuição de uma pensão ao Recorrido, o Recorrente usando o valor base 1.196,38 euros, aplicou as regras da Segurança de Social no que respeita à influência do período de antecipação da pensão de reforma para poder seguir o consignado naquela cláusula quanto ao demais, 28. Aplicando as regras da Segurança Social, designadamente quanto à aplicação do fator de sustentabilidade – 86,98, obtendo-se a pensão de 454,62 euros, que o Recorrente tem vindo a pagar ao Recorrido. 29. Nos casos de reforma antecipada, não previstos naquela cláusula, terá de abarcar o fator de sustentabilidade, sob pena, como veremos, e desde logo, de ao (ex)trabalhador ser atribuído um complemento de pensão de reforma superior à pensão de reforma que lhe seria atribuída naquele regime. 30. Porquanto a cláusula 122ª estabelece como limite a igualdade com aquele regime previdencial, igualdade que aquela jurisprudência estendia à remuneração base a relevar, minorando a aplicação do n.º 2 que a Recorrente e os Sindicados entendiam, e entendem, não se aplicar à remuneração a atender para base do cálculo. 31. Com efeito, a Recorrente ciente do conteúdo da sua vontade, e da vontade dos Sindicatos Outorgantes, sempre sustentou que o n.º 1 daquela cláusula se aplicava a todos os elementos a relevar para cálculo do complemento de pensão de reforma com exceção da remuneração base, 32. Quanto a esta, sempre sustentou a projeção da vontade das partes outorgantes do ACT, que aliás veio a sedimentar, juntamente com Força Sindical Outorgante, numa deliberação interpretativa feita por meio da constituição de uma Comissão Paritária. 33. Ora, a interpretação autêntica da cláusula 122ª do ACT, ou seja a interpretação das partes que celebraram o ACT em que aquela cláusula se insere, destinou-se a clarificar fundamentalmente que a remuneração base a relevar para efeitos de cálculo para o complemento de pensão de reforma é a remuneração prevista no n.º 2, e não a do regime geral da Segurança Social. Concomitantemente, 34. A demonstrar que aquela interpretação consolida a intenção das partes, ou seja de que todos os elementos temporais do complemento de pensão, ou melhor, todos os elementos que não se refiram à remuneração base e ao momento da constituição da pensão, supra versado, devem ser recolhidos do regime de previdência que se aplique ao reformado, máxime o regime geral de Segurança Social se outro mais favorável não existir. 35. O que significa que, se torna imperioso concluir que o complemento de pensão de reforma à exceção da remuneração base a relevar, e da constituição de direto, supra versada, se conduz pelo regime de previdência do trabalhador reformado, e tanto bastaria para suportar a aplicação do fator de sustentabilidade, porquanto o mesmo está previsto no regime geral de Segurança Social, cfr. artigo 35º do DL 187/2007 de 10 de Maio. 36.Mas sucede que o fator de sustentabilidade é, como a própria lei revela, um dos elementos temporais consignados na lei que expressa o elemento tempo, esperança média de vida, num modo quantitativo, de forma a que o tempo possa influir sobre a remuneração base. 37. Consequentemente o fator de sustentabilidade deve ser relevado no computo do complemento de pensão porque: (i) com exceção da remuneração base, todos os elementos a relevar para a formação do complemento de pensão se encontram no nº 1 da cláusula 122ª do ACT em causa; (ii) o fator sustentabilidade é um elemento temporal sendo o tempo expressamente mencionado no n.º 1 daquela cláusula; (iii) somente relevando o sistema previdencial em causa, nesta caso o regime geral da Segurança Social, na sua integralidade é possível alcançar a igualdade temporal pretendida com a Segurança Social. 38. De outra forma, ou seja, não relevando o fator de sustentabilidade, o A. que não perfez a idade para atingir a invalidez presumível, teria direito a uma pensão superior àquela que o tempo de Segurança Social lhe proporcionaria. 39. De notar ainda que, o tema das reformas antecipadas no regime geral da segurança social e os seus efeitos sobre o regime de segurança social do sector bancário não é novo para os nossos Tribunais. 40. Com efeito, a propósito de tema paralelo ao que ocupa os presentes autos, mas com plena aplicação a este caso, pronunciou-se o Supremo Tribunal de Justiça, por Acórdão de 18.10.2006, disponível in www.dgsi.pt, onde, lapidarmente, se escreve: “Nada justifica que seja o empregador a suportar no seu património a penalização no valor da pensão estatutária prevista na lei para quem, no uso da sua livre e autónoma vontade, usou da faculdade de requerer a antecipação do momento da sua reforma e deixou de contribuir para o sistema da segurança social até perfazer a idade legal da reforma.” 41. Este entendimento do Supremo Tribunal de Justiça, aplicado aos presentes autos, conduz, inequivocamente, à conclusão de que nada justifica que o Recorrente deva suportar o encargo decorrente de uma antecipação de reforma pedida unilateralmente pelo Recorrido, quando, de acordo com a regra da cláusula 122.ª, o direito apenas é reconhecido ao Recorrido nos casos de invalidez (que não é o caso) ou de invalidez presumível (65 anos, que também não é o caso)! 42. Tudo visto, chega-se pois à conclusão que: (i) o A. não tem direito a qualquer complemento de pensão de reforma a pagar pelo R. antes de atingir os 65 anos de idade; (ii) o R por liberalidade deferiu o pedido de pensão de reforma do A. preterindo requisitos exigidos pelo ACT aplicável; (iii) à parte do requisito preterido, fê-lo nos termos da cláusula 122ª interpretada de acordo com a interpretação fixada pela Comissão Paritária, e no sentido acolhido pela jurisprudência mais recente; (iv) relevando a remuneração base a considerar para o efeito nos termos do seu n.º 2; (v) e submetendo-a aos demais critérios da Segurança Social – designadamente fator de sustentabilidade, por que é isso que flui do espirito da cláusula 122ª e seria isso que a mesma preveria certamente se a sua previsão englobasse a atribuição de complementos de pensão atribuídos antes da idade prevista para a reforma por velhice. 43. Ora, num contexto em que o Recorrido não tinha ainda direito a qualquer complemento de pensão, e o Recorrente por lhe ter sido pedido, entendeu atender tal pedido, como tem vindo a fazer casuisticamente para outros trabalhadores, procurou fazê-lo do modo mais próximo possível com o regime existente para quem tem direito a um complemento, recortando o regime da cláusula 122ª do ACT - AA de modo a saneá-lo do impedimento à atribuição da pensão requerida, aproveitando-a em tudo o possível, designadamente nos elementos referentes a outras previdências, e “adicionando-lhe” critérios da Segurança Social (sustentabilidade) nela ausentes de forma expressa por a mesma não prever a possibilidade de reforma antes dos 65 anos de idade. 44. Crendo que preveria a aplicação deste fator, se a cláusula tivesse sido concebida para atribuição de complementos de pensão antes do alcance da idade mínima prevista para o efeito no ACT, ou seja antes dos 65 anos de idade. 45. Diga-se, aliás, que foi publicado no recentíssimo BTE n.º 29, de 8/8/2016 o novo Acordo Colectivo de Trabalho do Sector Bancário, no qual as Partes (Bancos e Sindicatos) previram expressamente a possibilidade da antecipação do complemento de reforma devido aos trabalhadores que abandonam o sector bancário, estabelecendo, porém e como seria de esperar, pressupostos específicos (situação de desemprego de longa duração e sem subsídio de desemprego e 57 anos de idade), estabelecendo, também, uma penalização de 0,5% por cada mês de antecipação face à data da reforma por invalidez presumível (65 anos), tudo conforme decorre expressamente da cláusula 99.ª do mencionado ACT. 46. Bem se pode ver que a “interpretação actualista” do Meritíssimo não tem assim, na verdade, nada de actualista, pois que, no sector, existe já regra específica que não tem nada a ver com o resultado daquela “interpretação” feita pelo tribunal a quo. 47. Com o devido respeito, o Recorrente pensa que ficou demonstrado que não pode valer a interpretação actualista efectuada pelo Tribunal a quo, pelo que se requer a V.Exas, seja a douta decisão ora sob recurso revogada, e o Recorrente absolvido do peticionado nos presentes autos. 48. Da análise à douta sentença proferida pelo Tribunal a quo, constante de fls., verifica-se que é defendida, no presente caso, uma “interpretação actualista” da cláusula 122ª do acordo colectivo de trabalho do grupo AA, ora em análise nos presentes autos. 49. Em síntese, e no entendimento do tribunal a quo, por aplicação de tal “interpretação actualista”, deveria ser atribuído um complemento de pensão de reforma por via da clª 122ª igualmente nos casos de reforma antecipada, e não apenas em casos de invalidez ou invalidez presumível. (independentemente da ausência de previsão da figura da reforma antecipada no referido regime previdencial, como o tribunal – e bem – o refere). 50. Ora, salvo o devido respeito, que é muito, é entendimento do Recorrente de que a clª 122ª do ACT/AA é inconstitucional na interpretação efectuada da mesma pelo Tribunal a quo, ou seja que, através de uma “interpretação actualista” da referida clª 122, existe o direito ao pagamento de um complemento de reforma nos casos de reforma antecipada, e não apenas em casos de invalidez ou invalidez presumível. 51. Nos presentes autos, aplicando a referida interpretação actualista da clª 122ª, o Tribunal a quo decide pela atribuição de um direito ao Autor, que não se encontra plasmado na referida clª 122ª do ACT do AA, e não se encontra porque as partes entenderam não fixar tal direito. 52. Sendo certo que, nem se poderá referir que a figura da reforma antecipada não existia no sentido de poder ser “pensada” pelas partes outorgantes enquanto elemento definidor para atribuição de uma pensão de reforma. Note-se que o referido ACT celebrado entre o Banco AA, S.A., e o Sindicato dos Bancários do Norte e Outros, publicado originalmente no BTE N.º 48, 29.12.2001, teve últimas alterações constantes do BTE n.º 27, de 22/07/2013 e do BTE n.º 12, de 29.03.2014, portanto quando já se encontrava plenamente em vigor a situação de reforma antecipada em sede de regime geral de segurança social. 53. Nada justifica que o Recorrente deva suportar o encargo decorrente de uma antecipação de reforma pedida unilateralmente pelo Recorrido, quando, de acordo com a regra da cláusula 122.ª, o direito apenas é reconhecido ao Recorrido nos casos de invalidez (que não é o caso) ou de invalidez presumível (65 anos, que também não é o caso). 54. Nesse sentido, a clª 122ª do ACT/AA é inconstitucional na interpretação efectuada pelo Tribunal a quo, ou seja, que através de uma “interpretação actualista” da referida clª 122, existe o direito ao pagamento de um complemento de reforma nos casos de reforma antecipada, e não apenas em casos de invalidez ou invalidez presumível, por violação do disposto no artigo 63.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa, na medida em que tal interpretação reconheceria ao recorrido o direito a um complemento de pensão de reforma fora das regras próprias do regime aplicável e, diga-se, em manifesta contradição com as regras próprias do regime geral de segurança social, o qual, como é sabido, penaliza a antecipação da reforma. 55. Ao decidir como decidiu, violou a douta Sentença recorrida constante de fls., designadamente, o disposto na cláusula 122ª do ACT celebrado entre o Banco AA, S.A., e o Sindicato dos Bancários do Norte e Outros, publicado originalmente no BTE N.º 48, 29.12.2001, e subsequentes alterações no BTE, N.º 4 de 29/01/2005, BTE n.º 33, de 08/09/2006, e BTE n.º 3 de 22/01/2009, BTE n.º 39, de 22.10.2011, BTE n.º 27, de 22/07/2013 e BTE n.º 12, de 29.03.2014, bem como o disposto no artigo 63º n.º4 da Constituição da República Portuguesa. 56. Termos em que, por tudo o acima exposto, se requer a V.Exas, Venerandos Desembargadores, seja a douta Sentença de fls._ revogada, absolvendo-se a ora Recorrente de todos os pedidos formulados pelo Autor.” O Recorrido não respondeu ao recurso. * Admitido o recurso na espécie própria e com o adequado regime de subida, foram os autos remetidos a esta 2ª instância.Foi determinado que se desse cumprimento ao disposto no artigo 87º n.º 3 do C.P.T., tendo o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitido douto parecer de fls. , no sentido da improcedência do recurso. Dado cumprimento ao disposto na primeira parte do nº 2 do artigo 657º do Código de Processo Civil foi o processo submetido à conferência para julgamento. II OBJECTO DO RECURSO Delimitado o objeto do recurso pelas conclusões da Recorrente (artigos 635º, nº 4, 637º n.º 2 e 639º, nºs 1 e 3, do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto no artigo 87º n.º 1 do CPT), a questão trazida à apreciação deste Tribunal da Relação é a de saber se a pensão complementar atribuída pela Ré ao Autor deve ser calculada aplicando-se o factor de sustentabilidade previsto para o regime da segurança social. * III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO1. O autor exerceu a actividade de bancário no Banco XX no período entre o dia 9 de Julho de 1979 e o dia 23 de Janeiro de 1998; 2. O Banco XX foi adquirido pelo réu; 3. No período em que exerceu a actividade de bancário, o autor contribuiu para a Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários; 4. No período entre os meses de Abril a Julho de 1979 e entre o mês de Novembro de 1999 e o mês de Junho de 2015, o autor exerceu uma actividade profissional no sector privado; 5. Neste período, o autor contribuiu para o regime geral da segurança social; 6. No mês de Junho de 2015, o autor requereu a reforma antecipada junto da segurança social; 7. No dia 4 de Agosto de 2015, a segurança social concedeu ao autor a reforma antecipada; 8. A reforma antecipada foi concedida ao autor com efeitos a partir do dia 11 de Junho de 2015; 9. No dia 13 de Agosto de 2015, o autor requereu ao réu o complemento de reforma dos bancários, atendendo ao tempo de serviço que havia prestado no Banco XX; 10. No dia 23 de Setembro de 2015, o réu comunicou ao autor que, no âmbito da cláusula 122ª do Acordo Colectivo de Trabalho celebrado entre o Banco Comercial Português e outros e o Sindicato dos Bancários do Norte e outros, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego - nº48 de 29 de Dezembro de 2001, tinha sido autorizado atribuir-lhe o complemento de reforma no valor de € 395,43; 11. O réu atribuiu ao autor o complemento de reforma com efeitos a partir do dia 13 de Agosto de 2015; 12. O réu aplicou o factor de sustentabilidade previsto para o regime geral da segurança social no cálculo do complemento de reforma que foi atribuído ao autor. IV – APRECIAÇÃO DO RECURSO A pensão complementar atribuída pelo Réu ao Autor deve ser calculada aplicando-se o factor de sustentabilidade previsto para o regime da segurança social Como é consabido o regime previdencial estabelecido na regulamentação colectiva do sector bancário tem natureza de subsistema da segurança social, sendo certo que até à entrada em vigor do DL n.º 54/2009, de 2/03, que determinou a inscrição dos novos trabalhadores bancários no regime da segurança social, o sector bancário encontrava-se à margem do sistema público de previdência. Esta relação previdencial entre a entidade bancária e o trabalhador que importa a responsabilização da primeira enquanto entidade que usufrui do trabalho pela pensão de reforma correspondente ao trabalho prestado pelo segundo, constituía-se com a celebração do contrato de trabalho, podendo permanecer após a extinção deste, designadamente nas situações em que a cessação do contrato ocorre antes da verificação dos factos constitutivos do direito à pensão que são: a doença ou invalidez efectivas, verificadas em qualquer idade ou a invalidez presumível, quando o trabalhador atinge os 65 anos de idade. Até à verificação destes factos o trabalhador apenas tem uma expectativa jurídica de aquisição futura do direito à pensão. Daí que, cessado o contrato de trabalho, as relações entre trabalhador e instituição bancária não cessam no que à relação previdencial diz respeito, pois mantém-se viva a relação de segurança social, designadamente no que respeita à relação pensionística. O sistema previdencial do sector bancário é regulado pelo ACT e respectivos anexos, pois é ai que se encontra toda a disciplina que lhe respeita, não sendo invocáveis as normas que regulam o regime geral da segurança social dos trabalhadores por conta de outrem. Na verdade, aos trabalhadores do sector bancário aplica-se, em regra, o seu regime específico, pois o sistema é privado, privativo deles e não qualquer sistema que resulte da conjugação das normas do ACT e do regime geral da segurança social. Aliás, a referência deste ao sistema dos bancários destina-se apenas a afirmar a sua existência autónoma e não a colocá-lo sob a sua alçada. Importa assinalar que a apreciação da questão por nós acima enunciada tem subjacente o facto de se manter o regime previdencial que vinha vigorando para os trabalhadores bancários que dele beneficiavam, razão pela qual é aplicável ao caso dos autos o instrumento de regulamentação colectiva de trabalho. Daí que numa primeira abordagem o regime jurídico aplicável à determinação da pensão seja o vigente no momento em que ocorre o facto determinante do seu nascimento, ou seja, o resultante dos instrumentos de regulamentação colectiva em vigor à data da invalidez efectiva ou presumida do trabalhador ainda que a relação de trabalho já tenha cessado. Assim, no caso em apreço, tendo o autor exercido a sua actividade profissional bancária, no Banco XX, no período compreendido entre o dia 9 de Julho de 1979 e o dia 23 de Janeiro de 1998, que posteriormente veio a ser adquirido pelo réu e tendo ao autor sido atribuída a reforma por velhice na Segurança Social em 4/08/2015 e com efeitos a partir de 11/06/2015, é no instrumento de regulamentação colectiva vigente nesta data que temos de ir procurar os normativos que determinam o seu direito a um complemento de pensão, bem como o seu montante. Como refere a este propósito o Acórdão do STJ de 24/02/2015, proferido no Proc. n.º 1866/11.4TTPRT.P1.S1 (relatado pelo Conselheiro Melo Lima), disponível em www.dgsi.pt “(…) o direito à pensão de reforma é conferido pelo instrumento de regulamentação colectiva em vigor na data da cessação do contrato de trabalho, mas o conteúdo e medida desse direito afere-se pelo texto do correspondente instrumento de regulamentação colectiva em vigor no momento em que ocorre o pressuposto da pensão de reforma.” Esse instrumento é o Acordo Colectivo de Trabalho celebrado entre as entidades patronais do Grupo AA e o Sindicato dos Bancários do Norte, o Sindicato dos Bancários do Centro e o Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, publicado originariamente no BTE n.º 48 de 29/12/2001 e subsequentes alterações no BTE n.º 4 de 29/01/2005, BTE n.º 33 de 8/09/2006, BTE n.º 3 de 22/01/2009, BTE n.º 39, de 22/10/2011, BTE n.º 27, de 22/07/2013 e BTE n.º 12, de 29/03/2014. Tal ACT não contempla expressamente a situação em apreço nos autos, no entanto a cláusula 122ª do citado Acordo Colectivo sob a epígrafe “Benefícios em caso de invalidez presumível fora do sector bancário” estipula o seguinte: “1 - O trabalhador de uma entidade patronal subscritora do presente acordo não inscrito no regime geral de segurança social ou em qualquer outro regime especial de segurança social, que passe à situação de invalidez ou de invalidez presumível já desvinculado da referida entidade ou de qualquer outra instituição do sector bancário, tem direito ao pagamento pela entidade patronal subscritora, na proporção do tempo de serviço nela prestado, da importância necessária para que venha a auferir uma pensão de reforma igual à que lhe caberia se o tempo de serviço prestado no sector bancário fosse considerado como tempo de inscrição no regime geral de segurança social ou outro regime especial mais favorável que lhe seja aplicável, independentemente de o trabalhador chegar ou não a adquirir direitos nos referidos regimes. 2 - A parte da pensão a cargo da entidade patronal, correspondente ao tempo de serviço nela prestado, prevista no número anterior, será calculada com base na aplicação do Anexo VI, na parte correspondente a trinta e cinco anos de serviço, à retribuição fixada no Anexo III correspondente ao nível em que o trabalhador se encontrava colocado na data da cessação do contrato de trabalho com a referida entidade, e actualizada segundo as regras do presente acordo. 3 – (…) 4 – (…)”. A interpretação desta cláusula levantou e continua a levantar dúvidas suscitando diversas interpretações espelhadas quer pelas partes, quer na sentença recorrida. Invocando a transcrita cláusula o Recorrente autorizou a atribuição do complemento de reforma ao recorrido, aplicando ao seu cálculo o factor de sustentabilidade empregue no cálculo da pensão da Segurança Social, uma vez que o recorrido não preenchia os requisitos estabelecidos no n.º 1 da cláusula 122ª atinentes à atribuição do complemento de pensão de reforma (designadamente não se verificava uma situação de “invalidez presumível”, expressão esta que é utilizada neste instrumento de regulamentação colectiva de trabalho referindo-se aos trabalhadores do sector bancário que atinjam 65 anos de idade, ou seja que atinjam a idade de reforma – cláusula 120º do ACT). O Recorrente sustenta assim que o cálculo do complemento de pensão deve ser efectuado incluindo o factor de sustentabilidade, já que nada justifica que tenha de suportar o encargo decorrente de uma antecipação de reforma pedida unilateralmente pelo Recorrido, quando, de acordo com a regra da cláusula 122.ª, o direito apenas é reconhecido ao Recorrido nos casos de invalidez (que não é o caso) ou de invalidez presumível (65 anos, que também não é o caso), sendo certo que atendendo ao espirito da cláusula 122ª a mesma preveria a aplicação de tal factor se a sua previsão englobasse a atribuição de complemento de pensão atribuído antes da idade prevista para a reforma por velhice. Não duvidamos do que esteve em análise no que respeita à atribuição do complemento de reforma foi a antecipação da atribuição de um direito com a correspondente de estabilidade, devendo ser essa confiança legítima que se gerou e que deve ser tutelada através da inalteração do que foi decidido pelo Recorrente ao aplicar ao Recorrido a cláusula 122ª do ACT sem que os seus requisitos estivessem reunidos. Questão diversa diz respeito ao seu cálculo e tratando-se de um problema de interpretação importa salientar que as convenções colectivas de trabalho (nelas se incluindo o acordo de empresa) têm parte negocial ou obrigacional e uma parte regulamentar, respeitando a primeira às regras que disciplinam as relações entre as partes signatárias da convenção nomeadamente no que toca à verificação do cumprimento da convenção e aos meios de resolução de conflitos decorrentes da sua aplicação e revisão e a segunda às normas que regulam os direitos e deveres recíprocos dos trabalhadores e dos empregadores. É entendimento uniforme do Supremo Tribunal de Justiça que na interpretação das convenções colectivas deve aplicar-se o disposto nos artigos 236º do Código Civil quanto à parte obrigacional e o preceituado no artigo 9º do Código Civil quanto à parte regulativa. Neste sentido ver entre outros Ac. STJ de 28/09/2005, Proc. n.º 1165/05, publicado no DR , 1ª série-A, n.º 216, de 10/11/2005 e Ac. STJ de 4/05/2011 Proc. n.º 4319/07.1TTLSB.L1.S1, in www.dgsi.pt. A cláusula 122ª do ACT respeita sem margem para dúvida à parte regulativa do ACT, pelo que a sua interpretação deve obedecer às regras do artigo 9º do C.C. que consagra os princípios a que deve obedecer o intérprete ao empreender essa tarefa, estipulando que “ [a] interpretação não deve cingir-se à letra lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada” (n.º 1).O enunciado linguístico da lei é de onde deve partir toda a interpretação, exercendo também a função de limite, pois não pode “ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso” (n.º 2). Por fim “[n]a fixação do sentido e alcance da lei, o interprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados” (n.º 3) Ora a transcrita cláusula 122ª do ACT do Grupo Bancário do AA aplica-se aos trabalhadores bancários que o deixaram de o ser antes de atingirem a situação de reforma, em caso de invalidez ou de invalidez presumível fora do sector bancário terão direito ao pagamento pela entidade patronal subscritora do ACT, na proporção de tempo de serviço nela prestado, da importância necessária para que venha a auferir uma pensão de reforma igual à que lhe caberia se o tempo de serviço prestado no sector bancário fosse considerado como tempo de inscrição no regime geral de segurança social ou outro regime especial mais favorável que lhe seja aplicável. Sendo tal direito reconhecido independentemente de o trabalhador chegar ou não a adquirir direitos nos referidos regimes. Pretende-se assim salvaguardar que todo o tempo de serviço prestado pelos trabalhadores conte para os cálculos da pensão de reforma independentemente do sector de actividade em que tiver sido prestado. Determina ainda o n.º 2 da cláusula 122º do ACT a forma como é calculada a pensão a cargo do empregador, ou seja é calculada com base na aplicação do Anexo VI, na parte correspondente a trinta e cinco anos de serviço, à retribuição fixada no Anexo III correspondente ao nível em que o trabalhador se encontrava colocado na data da cessação do contrato de trabalho com a referida entidade, e actualizada segundo as regras do presente acordo. Este n.º 2 da mencionada cláusula contêm um segmento que é contraditório com o previsto no n.º 1, pois limita o cálculo da pensão a cargo do empregador subscritor correspondente ao tempo de serviço nela prestado e nas condições ai previstas. Foi entendimento maioritário da jurisprudência, ponderando os elementos literal, teleológico e histórico da cláusula em apreço que a interpretação que melhor se coaduna com interesses em causa e a coerência do sistema é a interpretação restritiva do seu n.º 2, no sentido deste normativo se aplicar apenas aos trabalhadores que não chegam a adquirir direitos noutro regime nacional de segurança social e o n.º 1 aos trabalhadores cuja pensão é fixada pela segurança social, sem ponderação do tempo de serviço prestado no sector bancário. O fim visado pela cláusula em exame radica na salvaguarda, para efeitos de cálculo da pensão de reforma, do tempo de serviço prestado por aqueles trabalhadores no sector bancário, em conformidade com o disposto no n.º 4 do artigo 63.º da Constituição da República Portuguesa, de acordo com o qual “[t]odo o tempo de trabalho contribui, nos termos da lei, para o cálculo das pensões de velhice e invalidez, independentemente do sector de actividade em que tiver sido prestado”. O que está causa é um trabalhador que se reforma fora do sector bancário (no dizer do n.º1), trabalhador já “desvinculado da referida entidade ou de qualquer outra instituição do sector bancário”; o trabalhador tem direito a um complemento de pensão, quando for colocado na situação de invalidez ou invalidez presumível, a pagar pela entidade subscritora do acordo “na proporção do tempo de serviço nela prestado”; e esse complemento será o correspondente ao que seria devido pela segurança social como se o trabalhador tivesse prestado o tempo de serviço no banco em actividade sujeita a inscrição na segurança social: nas palavras da cláusula, o complemento corresponde à “importância necessária para que venha a auferir uma pensão de reforma igual à que lhe caberia se o tempo de serviço prestado no sector bancário fosse considerado como tempo de inscrição no regime de segurança social ou outro regime especial mais favorável que lhe seja aplicável”. Resultava assim que o complemento de reforma previsto na cláusula 122ª se calculava nos mesmos termos do regime geral da segurança social. Neste sentido ver entre outos Acórdãos do STJ de 7/05/2008, Proc n.º 08S460, Acórdão da Relação de Coimbra de 16/10/2014, Proc. n.º 583/13.5T4AVR.C1, e Acórdãos da Relação de Lisboa de 10/10/2013, Proc. n.º 1916/10.1TTLSB.L1-4 e de 20/04/2016, Proc. n.º 40/14.2TTSTB.L1. Na sequência desta jurisprudência à qual se opunham as instituições bancárias, pois defendiam a total independência e autonomia do regime previdencial dos bancários em relação ao regime geral da segurança social, foi constituída uma comissão paritária para interpretação da cláusula 122ª, tendo deliberado o seguinte: “Independentemente de o trabalhador adquirir direitos noutro regime geral de segurança social, ou em outro regime especial de segurança social, ou não chegar a adquirir direitos nesses regimes gerais ou especiais, a parte da pensão a cargo da entidade patronal é determinada temporalmente pelo critério previsto no número um da cláusula 122ª, e calculado o seu valor sempre de harmonia com o disposto no número dois da mesma cláusula. Assim, no cálculo da parte da pensão a cargo da entidade patronal, não deve ser utilizada a remuneração de referência fixada pelo regime geral da segurança social” Esta deliberação foi publicada no Boletim do Trabalho e Emprego – nº 34 de 15 de Setembro de 2014. Em concordância com o defendido na sentença recorrida, não temos dúvidas em afirmar que com esta interpretação, pretendeu-se afastar a orientação maioritária e pacífica da jurisprudência, repondo o entendimento defendido pelas instituições bancárias de que o regime previdencial dos bancários é independente e autónomo em relação ao regime da segurança social e as respectivas prestações são calculadas exclusivamente com base nos elementos que resultam do acordo colectivo, em detrimento dos elementos que resultam do regime geral da segurança social. E sendo este o sentido que se pretendeu dar à cláusula não podemos concluir de outra forma que não seja de que o complemento de reforma, quando seja de atribuir, como sucede no caso em apreço, já que o Recorrente autorizou a sua atribuição, terá de ser calculado em qualquer circunstância de harmonia com o n.º 2 da cláusula 122ª, nela não se incluindo a aplicação do factor de sustentabilidade. A comissão paritária mais não fez do que clarificar que o complemento de reforma deve ser calculado exclusivamente com base nos elementos que resultam do acordo colectivo, demonstrando assim a independência e autonomia do regime previdencial dos bancários relativamente ao regime geral da segurança social, já que é ai que se encontra toda a disciplina que lhe respeita, não sendo invocáveis as normas que regulam o regime geral da segurança social dos trabalhadores por conta de outrem. Por esta via resulta manifesto não ser aplicável ao complemento de reforma atribuído ao Recorrido o factor de sustentabilidade previsto para o regime da segurança social. Não existe qualquer cláusula no instrumento de regulamentação colectiva aplicável que nos permita concluir que o Recorrente ao proceder à atribuição da pensão complementar ao Recorrido, no seu cálculo deveria de aplicar o factor de sustentabilidade próprio do regime geral da segurança social, pelo facto do Recorrido não reunir os requisitos e a Recorrente ter entendido ser-lhe devido tal complemento de pensão. Ao invés, a Recorrente não pode deixar de proceder ao seu cálculo de harmonia com o previsto no ACT aplicável, o qual veio a excluir para efeitos de cálculo da pensão a cargo do empregador a utilização da remuneração de referência fixada pelo regime da segurança social ao afirmar que o complemento de reforma a cargo do empregador é sempre calculado de harmonia com o n.º 2 da cláusula 122ª. Não vislumbramos assim qualquer razão para que de forma arbitrária se decida reduzir o montante devido apenas, porque o Recorrido, quando solicitou o complemento da pensão ainda não tinha 65 anos. Por outro lado, importa ter presente que o factor de sustentabilidade introduzido pelo DL n.º 187/2007 de 10/05 foi previsto exclusivamente para o regime geral da segurança social tendo em vista adequar o sistema das pensões às modificações de origem demográfica ou económica relacionadas com a evolução da esperança média de vida, tal como resulta do seu preâmbulo, razão pela qual também por esta via não se vislumbra qualquer razão para aplicar este factor de sustentabilidade no cálculo da pensão complementar devida ao Recorrido. De facto e salvo o devido respeito por opinião diversa, o regime de segurança social do sector bancário substituiu o regime geral de segurança social por isso quando o trabalhador se encontra abrangido por este, como sucede no caso em apreço, o regime de segurança social do sector bancário complementa o regime geral. No caso o Recorrido tem direito à pensão de reforma antecipada pela Segurança Social e terá direito ao complemento de reforma do ACT, pois a Recorrente assim o determinou em relação ao Recorrido como o tem determinado em relação aos demais trabalhadores em idêntica situação e sobre isto as partes estão de acordo. Só que, para além disto e é aqui que o Recorrente discorda, há que proceder ao seu cálculo em conformidade com o previsto na cláusula 122ª n.º 2 da ACT, agora interpretada de harmonia com o estabelecido pela comissão paritária, a qual exclui que os elementos de cálculo do complemento de pensão possam resultar do regime geral da segurança social. Uma coisa não impede a outra: ao atribuir-lhe a pensão complementar a mesma tem de ser calculada de harmonia com o previsto no n.º 2 da cláusula 122º do ACT, só esta interpretação merece ser acolhida, pois a aplicação do factor de sustentabilidade a incidir no cálculo da pensão complementar não resulta de qualquer norma constante do ACT aplicável, sendo certo que o conteúdo e a medida da pensão de reforma é conferido pelo correspondente instrumento de regulamentação colectiva em vigor no momento em que ocorre o pressuposto da atribuição da reforma e este à data não previa qualquer redução no cálculo da pensão. O recorrente pretendia assim beneficiar do melhor de cada um dos dois regimes de segurança social aplicáveis: do regime geral de segurança social e do regime de segurança social do ACT do Grupo AA considerando a remuneração de referência resultante do ACT e aplicando-lhe a redução decorrente do regime geral da segurança social. O facto de ter sido foi publicado no BTE n.º 29, de 8/8/2016 o novo Acordo Colectivo de Trabalho do Sector Bancário, no qual Bancos e Sindicatos preveem expressamente a possibilidade da antecipação do complemento de reforma devido aos trabalhadores que abandonam o sector bancário, estabelecendo, pressupostos específicos, tal como resulta da cláusula 99.ª do ACT, só peca por tardio, não tendo contudo qualquer efeito na análise da questão colocada em apreciação no presente recurso, pois não tem eficácia retroactiva, já que a al. c) do artigo 478º do CT impede a eficácia retroactiva de qualquer cláusula que não tenha expressão pecuniária e a matéria em causa não tem essa estrita expressão. Por fim, impõe-se dizer que entendimento assumido pelo juiz a quo, não viola, como alega e conclui o Recorrente nas suas alegações de recurso o n.º 4 do art. 63º da CRP, o qual dispõe: “Todo o tempo de trabalho contribui, nos termos da lei, para o cálculo das pensões de velhice e de invalidez, independentemente do sector de actividade em que tiver sido prestado”. A tese em causa permite tomar em consideração toda a carreira contributiva do A., tanto no sector bancário, como no sector privado ou outro, respeitando as regras do regime aplicável, apenas antecipando o que lhe é devido no sistema bancário (não estava reunido o pressuposto idade), porque tal foi autorizado pela Recorrente. Não vislumbramos assim qualquer incompatibilidade entre as regras próprias do regime geral da segurança social e o regime previdencial do sector bancário. Assim sendo improcedem todas as conclusões de recurso deixando-se consignado que nenhuma censura merece a sentença recorrida, que por isso se confirma na íntegra. V - DECISÃO Nestes termos, acordam os juízes que integram a Secção Social deste Tribunal da Relação em negar provimento à apelação, assim confirmando a decisão recorrida Custas a cargo do Recorrente. Notifique. Guimarães, 16 de Março de 2017 Vera Maria Sottomayor (relatora) Antero Veiga Alda Martins Sumário – artigo 663º n.º 7 do C.P.C. I – O sistema previdencial do sector bancário é regulado pelo ACT e respectivos anexos, pois é ai que se encontra toda a disciplina que lhe respeita, não sendo invocáveis as normas que regulam o regime geral da segurança social dos trabalhadores por conta de outrem II – O cálculo do complemento de reforma de um trabalhador bancário que o deixou de ser antes de atingir a situação de reforma e a quem tenha sido atribuída a reforma antecipada no âmbito do regime de segurança social, deve ser efectuado de harmonia com o disposto no n.º 2 da cláusula 122ª do ACT em causa, a qual exclui que os elementos de cálculo do complemento de pensão possam resultar do regime geral da segurança social. ____________________________________________ Vera Sottomayor |