Decisão Texto Integral: | I - RELATÓRIO
1. Nestes autos de processo comum nº 490/10.3JABRG, por acórdão proferido a 27 de Fevereiro de 2013, o tribunal colectivo da Vara Mista de Guimarães condenou, pelo cometimento de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo art. 21.º, n.º 1 do DL. n.º 15/93, de 22/01, o arguido João F..., na pena de seis anos e seis meses de prisão, o arguido José C... na pena de sete anos e seis meses de prisão, o arguido José S... na pena de cinco anos e seis meses de prisão e o arguido Joaquim F..., na pena de cinco anos de prisão.
2. Inconformado, o arguido João F... interpôs recurso, tendo enunciado as seguintes conclusões (transcrição):
1. O recorrente considera que se encontra incorrecta e erradamente julgada a matéria de facto dada como provada.
2. No que se refere ao facto dado como provado de que o arguido “…procurava e era procurado por outros traficantes e também por consumidores para lhes vender tais produtos.”, da prova produzida em julgamento e salvo o devido respeito não resulta que o arguido ora recorrente haja procedido à venda ou cedência de produtos estupefaciente a outros consumidores para além do co arguido José C....
3. Os depoimentos testemunhais produzidos em audiência de julgamento não confirmaram outras transações de produto estupefacientes perpetradas pelo ora recorrente para além das confessadas pelo próprio aquando do seu depoimento.
4. A convicção dos agentes da PJ que acabou por influenciar a decisão proferida no douto Acordão, fundou-se apenas nas poucas conversas havidas pelo arguido nas quais nunca houve qualquer referência a um qualquer produto estupefaciente ou a uma qualquer transação.
5. Assim, inexistindo nos autos outros elementos probatórios para além das transcrições das interceções telefónicas constantes dos autos e ainda assim inócuas no que a tráfico de estupefacientes se refere, resulta e com o devido respeito, que o douto Acórdão enferma de insuficiente matéria factual para poder concluir pela venda de produtos estupefacientes por parte do arguido a vários consumidores.
6. Não existe no Acordão recorrido matéria que possa fundamentar tal convicção que, a final, se mostrou relevante para a determinação da medida da pena sendo certo que entre a venda a um consumidor e a venda a vários consumidores existe uma enorme distância no que se refere à determinação da pena a aplicar e nomeadamente na aproximação aos mínimos daquela.
7. As interceções telefónicas só poderão ser valoradas como meio de prova, caso, nos autos, existam outros elementos (inexistentes no caso sub judice) que permitam suportar e confirmar a veracidade das mesmas não revestindo só por si um grau de credibilidade suficiente que permita a condenação de um arguido.
8. O douto Tribunal a quo considerou ainda provado e, salvo o devido respeito, erroneamente que “desde data não concretamente apurada do ano de 2011 até 17 de Fevereiro de 2012 data em que foi detido à ordem dos presentes autos, dedicou-se compra e venda de heroína e cocaína.”
9. Ouvida a prova produzida em audiência de julgamento não se entende de que forma o Tribunal a quo fundamenta tal convicção porquanto, e mais uma vez, são os próprios agentes investigadores que confirmam que só após 28 de janeiro de 2012 e até 17 de fevereiro de 2012 o arguido João F... foi intercetado telefonicamente,
10. sendo que só a partir daquela data foi conotado, nos presentes autos, com o tráfico de estupefaciente.
11. Também nesta matéria não existem quaisquer factos que possam fundamentar a venda de estupefacientes por parte do recorrente num período para além do que medeia as datas de 28 de janeiro e 17 de Fevereiro.
12. A este propósito ainda as declarações do agente da PJ Mário V... na sessão do dia 19 de Dezembro de 2012.
13. E não pode ser a circunstância de no relatório social do recorrente elaborado pelo Instituto de Reinserção Social constar que o mesmo reiniciou o consumo de estupefacientes em finais de 2011 a determinar que, por causa desse consumo, o recorrente ter-se-ia dedicado à compra e venda de heroína e cocaína.
14. Considerou ainda erroneamente o Tribunal a quo que o recorrente “…forneceu quantidades de heroína e cocaína, que variavam entre 5 e 100 gramas, quantidades estas que os adquirentes destinavam também a venda a terceiros consumidores.
15. Quanto às quantidades transacionadas é mencionado pelos agentes da PJ responsáveis pela investigação que quase diariamente o ora recorrente fornecia ao co-arguido José C... quantidades que variavam entre as 5 e as 20 gr. de cocaína.
16. A única vez em que das interceções telefónicas aqueles agentes suspeitaram que o recorrente iria fornecer 100gr. de cocaína ao co-arguido José C..., tal fornecimento acabou por não se concretizar. Situação conhecida e declarada pelas mesmas testemunhas.
17. Veja-se a este propósito as declarações prestadas pelo agente da PJ, José A... quando refere que as quantidades eram habitualmente 20 gr. de cocaína e 20 gr. de heroína.
18. A única vez em que foram intercetadas conversações telefónicas onde se refere a quantidade de 100 gr. foi confirmado pelas testemunhas que tal transação nunca aconteceu.
19. Considera o recorrente, com o devido respeito, que nenhuma prova foi produzida em sede de audiência e julgamento que possa sustentar o douto acórdão condenatório, ainda que apenas em parte, existindo no direito penal o principio da presunção da inocência formulado no art. 32º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa, no art. 11º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e no art. 6º, nº 2, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
20. Um princípio que exige que contra um arguido em processo penal, seja feito uma prova segura, concludente e inequívoca de que foram praticados os factos descritos na acusação.
21. Tal não ocorreu de forma manifesta neste processo no que diz respeito a determinados fatos considerados como provados pelo douto Tribunal a quo.
QUANTO À MEDIDA DA PENA APLICADA
22. No que respeita ao crime de tráfico de estupefacientes, o legislador adotou um esquema de tipificação penal em que leva em conta que a grande maioria dos casos que chegam aos tribunais se apresentam como pouco investigados.
23. Existe uma «zona cinzenta» em que o juiz fica na dúvida sobre a real dimensão do tráfico em causa e, nesses casos, deverá, tendencialmente, aplicar uma pena cuja medida concreta é coincidente na moldura penal abstracta do crime de tráfico comum e na do crime de tráfico menor gravidade, a qual, conforme se pode verificar pelos artigos 21.º e 25.º, se situa entre os 4 e os 5 anos de prisão.
24. Do mesmo modo, não aceitou que o tráfico que é realizado pelo agente com a finalidade de obter droga para o seu consumo seja sempre integrado no crime privilegiado do traficante-consumidor, pois que essa finalidade tem de ser “exclusiva”.
25. A diminuição de ilicitude que o tráfico de menor gravidade pressupõe resulta de uma avaliação global da situação de facto, atenta a qualidade ou a quantidade do produto, os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da ação.
26. Mas, a avaliação de uma atividade, seja ela qual for, obriga a uma definição prévia de critérios (ou de exemplos-padrão) e, portanto, dir-se-á que o agente do crime de tráfico de menor gravidade do art.º 25.º do DL 15/93, de 22 de Janeiro, deverá estar nas circunstâncias seguidamente enunciadas, tendencialmente cumulativas:
- A atividade de tráfico é exercida por contacto direto do agente com quem consome (venda, cedência, etc.), isto é, sem recurso a intermediários ou a indivíduos contratados, e com os meios normais que as pessoas usam para se relacionarem (contacto pessoal, telefónico, internet);
- Há que atentar nas quantidades que esse vendedor transmitia individualmente a cada um dos consumidores, se são adequadas ao consumo individual dos mesmos, sem adicionar todas as substâncias vendidas em determinado período, e verificar ainda se a quantidade que ele detinha num determinado momento é compatível com a sua pequena venda num período de tempo razoavelmente curto;
- O período de duração da atividade pode prolongar-se até a um período de tempo tal que não se possa considerar o agente como “abastecedor”, a quem os consumidores recorriam sistematicamente em certa área há mais de um ano, salvo tratando-se de indivíduo que utiliza os proventos assim obtidos, essencialmente, para satisfazer o seu próprio consumo, caso em que aquele período poderá ser mais dilatado;
- As operações de cultivo ou de corte e embalagem do produto são pouco sofisticadas.
- Os meios de transporte empregues na dita atividade são os que o agente usa na vida diária para outros fins lícitos;
- Os proventos obtidos são os necessários para a subsistência própria ou dos familiares dependentes, com um nível de vida necessariamente modesto e semelhante ao das outras pessoas do meio onde vivem, ou então os necessários para serem utilizados, essencialmente, no consumo próprio de produtos estupefacientes;
- A atividade em causa deve ser exercida em área geográfica restrita;
27. Ora e no que se refere em concreto ao tráfico de estupefacientes perpetrado pelo recorrente é manifesta a verificação de tais requisitos cumulativos.
28. Sob pena de comprometer o embasamento das diligências adoptadas e seus resultados, cumpre afirmar que, não se questionando a verosimilhança das ilações retiradas de uma apreciação crítica das provas, tem-se como inadequada, face aos factos apurados, a medida da pena concretamente aplicada de 6 anos e 6 meses de prisão.
29. Afigura-se-nos que os elementos recolhidos no decurso das diligências adotadas, a análise e ponderação da matéria probatória carreada e a interpretação conjugada dos elementos disponíveis nos autos não habilitam a que a sanção privativa de liberdade com que o recorrente foi cominado seja de 6 anos e 6 meses.
30. Após a determinação da moldura abstrata da pena é necessário proceder à determinação da medida concreta da pena, à sua quantificação e por fim a escolha da pena.
31. O art. 71º, nº 1 do Código Penal (CP) determina que o quantum da pena de prisão seja fixado em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.
32. Atendendo ao preceituado, a culpa funciona como limite da pena, inviabilizando, desde logo, que alguém seja punido com pena mais elevada em atenção a fins de prevenção geral ou especial.
33. Toda a pena serve finalidades exclusivas de prevenção, geral e especial, a pena concreta é limitada, no seu máximo inultrapassável, pela medida da culpa e é determinada, dentro do referido limite máximo, atendendo a uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto ótimo de tutela penal dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico;
34. Para além disso, e no que diz respeito ao crime de tráfico de estupefacientes, a tipificação penal leva em conta que na maior parte das vezes, existem no processo “zonas cinzentas” que colocam o julgador numa dúvida quanto à real dimensão do tráfico em causa.
35. Não temos qualquer dúvida tratar-se do caso em concreto porquanto o próprio acórdão não define as quantidades de droga que teriam sido alegadamente vendidas pelo arguido João F....
36. Por tal, o julgador, o Tribunal a quo deveria aplicar uma pena cuja medida concreta fosse coincidente na moldura penal abstracta do crime de tráfico comum e na do crime de tráfico de menor gravidade, situada entre os 4 e os 5 anos de prisão.
37. O conteúdo reeducativo das penas consagra, além do aspeto punitivo a reintegração social do delinquente na sociedade. A matriz humanista do nosso direito, penal não bloqueia esta realidade, antes a promove.
38. O recorrente, admitindo-se a autoria do tráfico com um dos co-arguidos terá necessariamente de ser punido.
39. Mas esse castigo não lhe pode nem deve fechar as portas de uma ulterior vida honesta.
40. Assim, o recorrente apela que lhe seja dado uma merecida e justa oportunidade de iniciar um correto caminho, adentro dos interesses de reinserção social que o nosso ordenamento institui.
41. O Tribunal a quo, e com o devido respeito, ao condenar a recorrente na pena de prisão de 6 anos e 6 meses, fê-lo sem apresentar um único fundamento para a escolha daquela dosimetria e não de outra.
42. Foram violados, o artigo 21º, Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, o artigo 86º, nº 1, al. c), RJAM, os artigos 40º, 70º e 71º do Código Penal e artigos 120º, nº 2, al. d), 369º e 410º, nº 2 do Código Processo Penal e 32º da Constituição da República Portuguesa.
DA INCONSTITUCIONALIDADE INVOCADA
43. Pelas expostas razões e reafirmando as elevadas qualidades de inteligência, cultura jurídica, sensatez e suficiente experiência da vida, a limitação resultante da incontornável subjetividade da justiça e o sequente aceite de que ninguém é perfeito, impõe-nos a conclusão que se lamenta dum desrespeito da concordância prática dos valores em causa, valores imperativamente atendíveis.
44. E isto porque nenhuma sanção pode ser aplicada afora da teleologia específica do conjunto de meios que é o processo penal, convergente com a regeneração pessoal e social do delinquente, afetante da ponderação de meio e fim ínsita no principio da proporcionalidade.
45. Ora tal não foi respeitado desequilibrando-se desrazoavelmente o princípio jurídico-constitucional da proporcionalidade entre prova e pena, que um outro igualmente ponderoso da igualdade de todos perante a lei também impõe, pela circunstância que mereceu a justificação que o douto acórdão contém da personalidade do recorrente e do justificativo racional que esta oferecia para as condutas delituosas imputadas.
46. São os inputs referidos por Max Weber que não inquinam pela compreensão que merecem mas afetam pela injustiça que possibilitam é contra esta que se protesta, nesta vertente da violação dos aludidos princípios jurídico-constitucionais da proporcionalidade e da igualdade de todos perante a lei, consignados e estatuídos nos artigos 13º, 18º e 32º da Constituição da República Portuguesa, decorrente da inconstitucionalidade material dos artigos 21º, nº 1 do DL 15/93 de 22 de Janeiro e 86º, nº 1, c), do RJAM, que ora se suscita.”
3. O arguido José C... apresentou igualmente recurso do acórdão condenatório e das motivações extraiu as seguintes conclusões (transcrição) :
1. IMPUGNAÇÃO DO FACTO PROVADO Nº 23:
2. Verifica-se no que diz respeito a estes factos, que o Tribunal “a quo” procede à mistura de factos com simples meios de prova, confundindo uns com os outros.
3. Com efeito, não se vê onde o Tribunal “a quo” vai buscar fundamento legal para, em vez de se cingir à enunciação de factos que a lei exige, de acordo com o disposto no artº 374º, nº 2 do Código Penal, ter adotado uma postura de transcrição inútil do resultados de algumas escolhidas conversas objeto de escutas telefónicas, em vez, de como seria mister, desses elementos de prova retirar ou extrair os factos e apenas os factos com relevo para a decisão da causa. São esses – e só esses – que a lei manda enunciar, procedendo-se se necessário, e na extensão tida por necessária, ao aparo ou corte do que porventura em contrário e com caracter supérfluo provenha da acusação ou mesmo da pronúncia, que o acórdão não é nem pode ser fiel serventuário.
4. Impõe-se, assim, ao juiz sobre pena de ilegalidade que se abstenha da prática de atos inúteis, como os que acabam de se enunciar.
5. A colocação destas conversas nos factos provados mostra-se de todo inútil, até a título de compreensão adjuvante, pois a sua função de meio de prova, revelador do facto normativamente relevante, falece pela circunstância de não ter sido levado ao objeto do processo a correspondência com a específica realidade a revelar.
6. Nenhum destes factos dados como provados foi corroborado por qualquer outro elemento de prova, nomeadamente testemunhal, documental (relato de diligência externa) ou outra.
7. De todos os depoimentos das testemunhas ouvidas em audiência de discussão e julgamento nenhuma confirmou estas transcrições, não passando de transcrições de comunicações sem qualquer confirmação de que as mesmas aconteceram em algum momento.
8. Não pode assim o ora recorrente, concordar com a matéria dada como provada nestes factos, face à ausência de prova produzida nesse sentido, bem como ao facto de se tratar de transcrição de sessões telefónicas, sem que daí se extraia qualquer facto e ainda porque o próprio Tribunal “a quo” conforme supra se referiu na sua motivação entendeu que relativamente a vários destes “factos” não se fez qualquer prova.
9. È assim, totalmente inútil o elenco destas sessões nos factos provados, sem que daí se extraiam factos, motivo pelo qual deve toda a matéria constante do artº 23º dos factos provados deve ser retirada dos factos provados, com as devidas consequências legais.
10. IMPUGNAÇÃO DO FACTO PROVADO NO ARTº 6 DOS FACTOS PROVADOS, com base no depoimento da testemunha de acusação:
Domingos F...- Dia 16.01.2013 às 10:31:14 – minutos 00:00:00 Até 00:01:05; 00:01:05 Até 00:03:29;
11. Não pode concordar o ora recorrente com a matéria dada como provada neste facto, tendo em conta as declarações prestadas por esta testemunha, que nega a aquisição de produtos estupefaciente ao arguido, tendo ainda em conta que as demais testemunhas de acusação no que a este facto diz respeito, apenas viram a testemunha a entrar e sair de casa do arguido, não lhe tendo feito qualquer revista antes da entrada a fim de verificar se já levava consigo produto estupefaciente.
12. Ora face à prova testemunhal produzida, quanto a este facto e ausência de qualquer outra, ou seja, da prova testemunhal produzida, apenas resultou que a testemunha esteve em casa do arguido e que após a sua saída tinha na sua posse 0,20 gr de heroína.
13. Não foi a testemunha sujeita a qualquer revista antes de entrar em casa do arguido, não se sabendo se já levava consigo o produto estupefaciente e face ao seu depoimento, que negou que o produto estupefaciente que lhe foi apreendido tenha sido entregue pelo arguido, o Tribunal “a quo” não poderia dar este facto como provado, impondo-se em última instância a dúvida sobre o mesmo, pelo face à prova produzida quanto a este facto deve o mesmo ser retirado dos factos provados.
14. Entende o recorrente que a pena que lhe foi aplicada é elevada, desajustada e desproporcionada à culpa e às medidas de prevenção geral e especial.
15. Salvo o devido respeito por melhor opinião tendo em consideração os factos dados como provados – cfr.5 destas conclusões - no douto acórdão o Tribunal “a quo” não teve devida conta, na determinação da medida da pena, todas as circunstâncias que depuseram a favor do agente (arguido José C...), nomeadamente no que concerne às condições pessoais do agente e o Douto Acórdão não referiu expressamente os fundamentos da medida da pena, violando assim o disposto nos art.ºs 40º, 70º, 71º n.º 1, n.º 2 al. d) e e) e 3 e 72º, nº 1 e 2 al. d) todos do Código Penal Português.
16. Percorrendo os factos dados como provados resulta em abono do ora recorrente, entre outros que:
a) O ora recorrente se dedicou ao tráfico de produtos estupefacientes sensivelmente desde Março de 2010 até Março de 2012 – Facto provado sob nº 1);
b) No dia 16 de Junho de 2011o arguido detinha na sua posse 2 gramas de heroína, sendo que lançou para o solo dois pacotes contendo 0,2 gr de heroína – Facto provado nº 9 e 11;
c) Resulta que, na sequência da busca domiciliária levada a cabo no dia 06 de Março de 2012, foram apreendidas 5,70 gramas de cocaína – Facto provado sob o nº 27);
d) Desde muito jovem que apresenta hábitos de trabalho – facto provado no artº nº 116;
e) Iniciou o seu percurso profissional na construção civil e, posteriormente, empregou-se na área têxtil. Decorridos alguns anos e na procura de melhores condições laborais passou a trabalhar na área da restauração (cafés, restaurantes e bares) e, por fim, na exploração de vários estabelecimentos comerciais do mesmo ramo, mas de diversão noturna – facto provado no artº nº 117;
f) Em 1977 casou-se com Maria G..., de quem teve dois filhos. O relacionamento conjugal passou por diversos períodos marcados por dificuldades relacionais, com registo de uma separação e retoma da relação cerca de dois anos depois – facto provado no artº nº 118;
17. Entendemos pois que, as declarações prestadas pelo ora recorrente quanto ao seu envolvimento na prática do crime de tráfico de produtos estupefacientes, a sua colaboração foi determinante para a descoberta da verdade, no que à sua atuação respeita.
18. Pese embora toda esta factualidade dada como provada, bem como o facto da motivação do Tribunal assentar também nas declarações do ora recorrente, entendemos que, o Tribunal “a quo” na determinação da medida da pena deveria entender que em termos de culpa, que haverá uma forte atenuação dadas as condições pessoais e de vida do arguido (artº 117, 121 dos factos provados do acórdão), no que se refere à atitude do ora recorrente que se procurou integrar, pessoal e profissionalmente, na sociedade, que confessou a prática dos factos, mostrando-se colaborante com a justiça, no entanto o Tribunal “a quo” decidiu aplicar ao arguido uma pena de prisão efetiva de 7 anos e 6 meses de prisão, o que a nosso ver é, manifestamente exagerada, face à culpa e as medidas de prevenção especial e geral.
19. Não tomou o Tribunal “a quo” em consideração na determinação da medida da pena entre outros: As circunstâncias que depuseram a favor do ora recorrente, nomeadamente:
Não valorou o tribunal “ a quo” o bom comportamento do arguido anterior aos factos e posterior aos factos.
Não valorou o Tribunal “a quo” a situação sócio-económica e familiar do arguido, nomeadamente o apoio familiar.
A sua conduta posterior aos factos denota vontade de integração social.
Tem apoio familiar após a sua restituição à liberdade.
A confissão e colaboração com a justiça.
Encontra-se arrependido;
Sem que se pretenda justificar o injustificável: foram circunstâncias da vida, designadamente económicas que arrastaram o arguido para a prática do crime pelo qual foi condenado;
20. Acresce que, a pena aplicada ao arguido viola claramente os princípios de ressocialização previsto no artº 40º do C.P..
21. Verifica-se assim, que o Tribunal “a quo” violou o disposto no art.º 40º, 70º, 71º nº 1 e nº 2 do C. P.
Por conseguinte deve a pena aplicada ao arguido recorrente ser alterada e reduzida no seu quantum, devendo ser substituída por outra mais próxima dos mínimos legais e pelo máximo de 5 anos e 6 meses.”
4. O arguido José S... apresentou recurso, formulando as seguintes conclusões (transcrição) :
1. IMPUGNAÇÃO DO FACTO PROVADO NO Nº 60 DOS FACTOS PROVADOS,
com base no depoimento das testemunhas de acusação:
Inspetor Nuno M... - Dia 19.12.2012 às 12:17:34 – minutos 00:06:58 Até 00:07:55; 00:12:39 Até 00:13:11; 00:18:09 Até 00:18:47;
Inspetor José A...- Dia 28.11.2012 às 16:05:09 – minutos
00:31:18 Até 00:38:10
2. Para assentar a sua convicção para dar este facto como provado o Tribunal “a quo” socorre-se das interceções telefónicas, sessão 1010 e 1019, conjugadas com o depoimento das testemunhas José A...– Inspetor da Policia Judiciária; Nuno M... – Inspetor da Policia Judiciária e vigilância efetuada em 30.01.20102.
3. Ora do teor da interceção telefónica em causa, efetivamente decorre que o arguido R... liga ao arguido Joaquim e reclama da qualidade do produto estupefaciente, sendo que o arguido Joaquim lhe responde para não mexer no produto pois irá estar com o fornecedor do mesmo.
4. Resultando que de seguida o arguido Joaquim liga ao ora recorrente e pergunta-lhe se ele não vem tomar café com ele, ao que este responde que esta a chegar.
5. Estando montada uma vigilância nesse dia junto do Café S... onde estava o arguido Joaquim, foi visionada a chegada o arguido José S... ao Café S... e o arguido Joaquim a entrar na sua viatura e ambos se deslocam para a zona industrial, tendo finalizado a vigilância nesse momento, não conseguindo verificar os senhores inspetores para onde se deslocaram os arguidos e com quem estiveram.
6. Não verificaram se nesse mesmo dia o arguido Joaquim teve outros encontros, o que fez no resto do seu dia.
7. Acresce que, imputa-se que o arguido ora recorrente era fornecedor de produtos estupefacientes do arguido Joaquim, mas fornecedor de que substâncias?
Quantas vezes lhe forneceu e que quantidade? Onde estão esses fornecimentos?
De que qualidade de produto estupefacientes estamos a falar?
8. Não pode assim, concordar o ora recorrente com a matéria dada como provada neste facto, tendo em conta as declarações prestadas por esta testemunha, que nega a aquisição de produtos estupefaciente ao arguido, tendo ainda em conta que as demais testemunhas de acusação no que a este facto diz respeito, apenas viram a testemunha a entrar e sair de casa do arguido, não lhe tendo feito qualquer revista antes da entrada a fim de verificar se já levava consigo produto estupefaciente.
9. Nesta conformidade e atento a conjugação destes elementos de prova, vigilância, depoimento da testemunha que a efetuou e análise das interceções telefónicas, não podia o Tribunal “a quo” dar como provado que o ora recorrente era fornecedor de produtos estupefacientes do arguido Joaquim, devendo este facto ser excluído dos factos dados como provados.
10. Impugnação do facto provado nº 64 - Do mesmo modo, não pode servir para fundamentar esta conclusão o facto de o arguido José S..., ora recorrente, ter solicitado dinheiro ao arguido Joaquim, para fundamentar a convicção de que este era fornecedor daquele, porquanto não se apurou qual a proveniência dessa solicitação, que negócios tinham entre si, a que título, este, lhe devia a quantia solicitada e note-se que se fala em € 300,00 e não de elevadas quantias, pelo que a matéria constante do facto provado nº 64 não tem qualquer fundamento e encontra-se apenas assente nas interceções telefónicas, sem que seja corroborada por qualquer outro meio de prova.
11. Não há da prova testemunhal qualquer relato que confirme que essas entregas de dinheiro e a qual a sua proveniência, remetendo-se para assim para a transcrição do depoimento dos Inspetores da Policia Judiciária e dos elementos do NIC da G.N.R., que falaram sobre o ora recorrente, que se junta aos autos e por mera economia processual se dá aqui por integralmente reproduzida para os devidos efeitos legais.
12. Tendo em conta que este facto apenas foi dado como provado com base nas interceções telefónicas, sem qualquer outro elemento a corrobora-lo, deve ser excluído dos factos dados como provado.
13. IMPUGNAÇÃO DO FACTO PROVADO NO Nº 63 DOS FACTOS PROVADOS,
com base no depoimento das testemunhas de acusação:
Inspetor Nuno M... - Dia 19.12.2012 às 12:17:34 - minutos
00:06:58 Até 00:07:55; 00:12:39 Até 00:13:11; 00:18:09 Até 00:18:47;
14. Do facto provado no nº 63 dos factos provados, o Tribunal “a quo” dá como provado com base na vigilância externa efetuada no dia 30.01.2012, que os arguidos se deslocaram para a Zona Industrial S..., Fafe, onde se foram encontrar com o arguido João R... a fim de esclarecerem a qualidade do produto estupefaciente.
15. Ora, com o devido respeito o Tribunal “a quo” extravasou os elementos de prova produzidos quanto a este facto e formula uma convicção arbitrária, pois quer do relato de vigilância externa, quer do depoimento das testemunhas que estiveram na vigilância – testemunha Nuno M..., não resulta em momento algum que os arguidos se encontraram com o arguido João R..., resultando apenas que no momento em que estes entram na zona industrial é dada por terminada a vigilância, não se apurando para onde foram e com quem se encontraram.
16. Ora, face à prova produzida em julgamento, bem como ao teor do relato de vigilância externa, sem que resultasse qualquer confirmação do local para onde se dirigiram os arguidos após ter entrado na zona industrial, sem que tivesse sido visto qualquer encontro do arguido Joaquim e do ora recorrente com o arguido R..., sem que o arguido Joaquim ficasse em vigilância no resto do dia de forma a apurar se se encontrou com qualquer outra pessoa, o Tribunal “a quo” apenas tinha condições para dar como provado com um grau de certeza oseguinte:
Facto provado 63 - Assim, pelas 14h50, foi vista a chegar ao local de vigilância uma viatura da marca BMW, modelo 730, de cor preta, com a matrícula 93-82-..., sendo que ao volante e como único ocupante se encontrava o arguido José B…, sendo que o arguido Quim B... saiu do interior do café e introduziu-se no veículo e arrancaram em direção à Zona Industrial S..., Fafe.
17. IMPUGNAÇÃO DO FACTO PROVADO NO Nº 69 DOS FACTOS PROVADOS,
com base no depoimento das testemunhas de acusação:
José R... - Agente NIC – Dia 16.01.2013 às 11:22:37 – minutos 00:01:38 Até 00:11:02; 00:12:52 Até 00:21:01;
António S...– Agente NIC – dia 16.01.2013 às 11:08:30 – minutos 00:00:59 Até 00:06:13; 00:08:31 Até 00:13:20
Pedro T... - 2º Sargento - Dia 19.12.2012 às 12:53:25 – minutos 00:01:25 Até 00:11:17
18. Resulta deste facto dado como provado que, foi efetuado exame pericial aos vestígios lofoscópicos encontrados na superfície da fita-cola de cor castanha, que envolvia as 208,020g de heroína, foram os mesmos identificados como pertencentes ao arguido José B..., que havia manuseado aquele embrulho.
19. Apenas de impugna a conclusão a que o Tribunal “a quo” chega de que o arguido, ora recorrente, havia manuseado aquele embrulho.
20. Tendo em conta que os vestígios lofoscópicos encontrados foi na superfície da fita-cola de cor castanha, desconhece-se quando o ora recorrente teve contacto com a fita-cola, se antes ou depois desta ser colocada no produto estupefaciente, aliado ao facto de que aquele pavilhão era frequentado por várias pessoas, nomeadamente o arguido Joaquim, entre outros, que o que ali se procurava era veículos desmantelados, que aí foram recolhidos vários instrumentos ligados ao desmantelamento de veículo, restando a dúvida séria e razoável de quem era aquele produto estupefacientes.
21. Acresce que, tendo em conta que naquele pavilhão se investigava desmantelamento de viaturas automóveis, que foram visto a entrar e sair várias pessoas do interior do mesmo e que após a saída do ora recorrente do pavilhão na companhia de outro individuo, estes forram seguidos por um ofendido que entendia que a sua viatura estava no interior do pavilhão e balearam o carro do ora recorrente, sendo que, após tal suceder o ora recorrente enviou uma mensagem para o arguido Joaquim a solicitar que fosse ver o ambiente no local onde tinham estado os dois de tarde e outra mensagem para a companheira a dizer que "estava tudo fodido".
22. Daqui concluiu o Tribunal "a quo" que analisando o teor destas mensagens com a recolha das impressões digitais do arguido na fita-cola, que se trata de prova sólida de que este estava a falar do produto estupefaciente que se encontrava no interior do pavilhão, motivo pelo qual se convence que é seu.
23. Ora, com o devido respeito por melhor opinião, tal interpretação é arbitrária, porquanto tendo em conta todo o material ilícito que ali se encontrava, para além do produto estupefaciente, que estava numa sala ao lado, falamos dos carros desmantelados, poderia perfeitamente nas mensagens o arguido referir-se à descoberta do material automóvel furtado/roubado e que estava a ser desmantelado e não ao produto estupefaciente.
24. Para além de que, o pavilhão onde estavam os produtos estupefacientes era frequentado por várias pessoas, nomeadamente o arguido Joaquim, conforme resulta das interceções telefónicas, no local onde estava o produto estupefaciente encontrava-se roupas, não se tendo apurado a quem pertenciam, a acrescer o facto de que, as impressões digitais estavam na fita-cola, desconhecendo-se em que momento forma colocadas.
25. Perante todas estas hipotéticas situações, o Tribunal “a quo” numa ânsia de condenação, decidiu convencer-se que a conjugação da prova levava à conclusão de que o produto estupefaciente era do ora recorrente, sem sequer por em dúvida qualquer outro cenário.
26. Da conjugação do teor da prova testemunhal, com a análise da demais prova, nomeadamente interceções telefónicas, deveria ao Tribunal “a quo” ser colocada a dúvida quanto a este facto e dar apenas como provado:
Facto provado 69. Efetuado exame pericial aos vestígios lofoscópicos encontrados na superfície da fita-cola de cor castanha, que envolvia as 208,020g de heroína, foram os mesmos identificados como pertencentes ao arguido José B....
27. IMPUGNAÇÃO DOS FACTOS PROVADOS 89, 90, 91, 92, 93
28. Ora face a todo o supra exposto e caso V. Exªs entendem ser de alterar a matéria de facto nos termos sobreditos, então estes factos dados como provados, terão de ser retirados dos factos provados, por não ter qualquer suporte na matéria de facto provada.
29. A livre apreciação da prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente, conforme dispõe o artº 127º C.P.P.
30. Sabendo-se que é na audiência de julgamento que tal princípio assume particular relevo, a livre apreciação da prova terá subjacente sempre uma motivação – o «substrato racional» da convicção que dela emerge – e que encontra eco, de resto no artº 374º, nº 2.
31. No entanto, conforme se encontra demonstrado a convicção do Tribunal é livre mas não arbitrária.
32. Ora resulta do atrás explanado que a formulação da convicção do Tribunal “a quo” foi arbitrária quanto à forma como se convenceu que o ora recorrente era o fornecedor do arguido Joaquim, bem como quanto à forma que se convenceu que o produto estupefaciente encontrado no pavilhão sito em Estorãos – Fafe, pertencia ao ora recorrente.
33. No que diz respeito à convicção de que o ora recorrente era o fornecedor do arguido Joaquim, assentou o Tribunal “a quo” a sua convicção no teor das interceções telefónicas, conjugadas com a vigilância do dia 30.01.2012 e depoimento das testemunhas de acusação.
34. No que diz, no que diz respeito às conversas telefónicas o Tribunal "aquo" considerou que as conversas telefónicas resultantes das transcrições se referiam a negócios de produtos estupefacientes, no entanto tais factos resultaram das conversas objeto de escutas telefónicas, sem qualquer outro elemento de prova que as corroborasse, na verdade, várias vigilâncias foram levadas a cabo nos presentes autos, em várias foram vistos os arguidos, sem que nada de relevo resultasse, ao contrário, nas vigilâncias em que resultou confirmação das interceções telefónicas no que respeita ao tráfico de produtos estupefacientes diziam respeito apenas ao arguido Joaquim, aí sim este arguido foi visto por várias e diversas vezes, na sequência da escuta telefónica a deslocar-se para junto dos consumidores.
35. Considera o Tribunal “a quo” que o ora recorrente é o fornecedor de produtos estupefacientes do arguido Joaquim, no entanto jamais foi vista qualquer entrega de produto estupefacientes, não se vislumbra do teor das escutas telefónicas, o número de fornecimentos e de que qualidade de produto estupefaciente, o que ficou por apurar.
36. Pese embora, tenhamos a interceção nº 1010 e 1019 em que o arguido Joaquim fala com o arguido R... e este último reclama da qualidade do produto estupefacientes e o arguido Joaquim lhe refere que o fornecedor vem ter com ele, e cerca de 10 minutos depois chega o ora recorrente e o arguido Joaquim entra na sua viatura e seguem os dois para a zona industrial, não pode ser suficiente para que se considere que o ora recorrente era o fornecedor de produtos estupefacientes do arguido Joaquim.
37. Ainda que, se suspeitasse que pelo facto do arguido José S... ir naquele momento ter com o Joaquim fosse o seu fornecedor, certo é que não foi sequer confirmado que ambos foram ter com o R..., na verdade depois de estes entrarem para a zona industrial certo é que a vigilância terminou, não sendo possível aos senhores inspetores que a realizavam aperceber-se para onde foram os arguido e se se encontraram com alguém.
38. Do mesmo modo, foi dada por terminada naquele momento a vigilância o que não permitiu esclarecer aos senhores inspetores se o arguido Joaquim naquele dia esteve com mais alguém e com o arguido R....
39. Pese embora as coincidências verificadas, não são suficientes para que se forme um juízo conclusivo sobre que o arguido José S... era o fornecedor de produtos estupefacientes do arguido Joaquim.
40. Valora-se assim, que o arguido é fornecedor do arguido Joaquim, sem que tivesse ocorrido qualquer entrega de produto estupefaciente, sem que resultasse das interceções telefónicas encomendas de qualquer produto estupefaciente e sem do depoimento das testemunhas decorresse prova nesse sentido, para além das conclusões retiradas pelo senhor inspetor investigador da polícia judiciária que assim era, ou seja, conclui-se que o arguido é o fornecedor do arguido Joaquim, com base em escutas telefónicas sem qualquer outro elemento de prova a corrobora-las no terreno, o teor das conversas telefónicas constantes dos factos provados não foram em momento algum visualizada a sua concretização, poderemos assim concluir: Onde é que estão as vendas efectuadas pelo ora recorrente ao arguido Joaquim? Quando, onde foram efectuadas? Ficamos certamente sem resposta….
41. Aliás de todos os depoimentos das testemunhas em que o Tribunal "a quo" fundamenta a sua convicção nenhuma referiu o encontro entre o arguido, ora recorrente, e o arguido Joaquim com o arguido R..., que corrobora-se a concretização do encontro entre os três na vigilância efetuada no dia 30.01.2012.
42. Ora, tal considerado isoladamente e sem quaisquer outra prova feita quer documental, quer em audiência de discussão e julgamento nesse sentido é insuficiente para formular a convicção dos factos provados no 60 a 64 e 69 dos factos provados, nomeadamente quanto ao encontro dos arguidos com o arguido R..., que permitisse a conclusão de que o ora recorrente era o fornecedor do arguido Joaquim.
43. Do mesmo modo, nos parece insuficiente para formular a convicção do Tribunal quanto aos factos provados no nº 69 factos provados apenas com base na recolha dos vestígios lofoscópicos encontrados na fita cola que envolvia o produto estupefaciente, considerando por esse facto que o ora recorrente manuseou o produto estupefaciente, seja a que título for, e em consequência atribuir a sua propriedade ao ora recorrente.
44. Senão vejamos, para dar este facto como assente o Tribunal “a quo” fundamenta a sua convicção no facto do pavilhão estar arrendado em nome do ora recorrente e no facto de este ter enviado duas mensagens, uma para o arguido Joaquim e outra para a companheira, solicitando na primeira que este fosse ver o ambiente ao local onde tinham estado nesse dia e outra dizendo á companheira que está “tudo fodido”.
45. Ora, com o devido respeito, conforme decorreu do facto dado como provado no nº 65 dos factos provados e da prova testemunhal produzida na audiência de discussão e julgamento, cuja transcrição se junta, o pavilhão foi objeto de busca, uma vez que se suspeitada que ali se procedesse ao desmantelamento de viaturas furtadas/roubadas, o que se veio a confirmar e se encontra a ser investigado em outro processo.
46. Resulta do depoimento das testemunhas Agente Ribeiro, Agente Santos e Agente Paulo T..., que na data em que fizeram vigilância ao pavilhão que se ouvia barulhos correspondente a desmantelamento de veículos automóveis, que do pavilhão saiu o ora recorrente acompanhado de mais dois indivíduos, que passado cerca de 30 minutos voltou ao pavilhão o ora recorrente e mais um individuo, onde permaneceram mais algum tempo e voltaram a sair, quando foram seguido por um individuo que suspeitava que ali estivesse a sua viatura a ser desmantelada e lhe alvejou o carro.
47. Foi nessa sequência que o ora recorrente mandou as mensagens ao arguido Joaquim e à sua companheira, com o teor supra descrito.
48. Pelo que, desde logo nos apercebemos de três situações diferentes:
Primeira – que o pavilhão se destinava ao desmantelamento de viaturas automóveis;
Segunda – que naquele pavilhão esteve presente nesse mesmo dia o arguido Joaquim;
Terceira – Que o pavilhão era frequentado por várias pessoas, nomeadamente o ora recorrente, o arguido Joaquim e os outros dois indivíduos que dali saíram nessa noite com o arguido José S....
49. Perante este facto e tendo em conta que os vestígios lofoscópicos pertencentes ao ora recorrente se encontravam na fita-cola que envolvia o produto estupefaciente, resta-nos saber a que título ali se encontravam, porque é que o arguido pegou nessa fita-cola, se antes de ser colocada em volta do produto estupefaciente ou depois, quem ali colocou o produto estupefaciente, a quem pertencia, tendo em conta o número de pessoas que frequentavam o pavilhão.
50. A livre apreciação da prova, quanto a estes factos foi arbitrária, tendo por base a condenação do ora recorrente, não valorando do mesmo modo o Tribunal “a quo” a possibilidade do arguido ter tocado na fita-cola a qualquer outro título.
51. Acontece porém que se encontram dados como provados factos sem sustentação de prova produzida em julgamento, por um lado, toda a matéria dada como provada em relação ao recorrente assentou essencialmente nas escutas telefónicas, escutas essas que não foram corroboradas por qualquer outros elemento de prova e em juízos conclusivos, que não foram efectivamente confirmadas em momento algum, pelo que existirá claramente a invocada insuficiência da matéria de facto para a decisão e violação do disposto no artº 127º do C.P.P.
52. Ou seja, se o Tribunal “a quo” não tivesse, como deveria ter feito, valorados as escutas telefónicas como meio de prova e dado a interpretação que entendeu, sem fundamento, ou sem que lhe fosse criada uma dúvida sobre a ocorrência de tais factos, e face à ausência total de prova produzida em audiência de discussão e julgamento, leva a que toda a matéria de facto dada como provada “caía por terra”.
53. Pelo que, o Tribunal “a quo” dá como provados factos sem qualquer suporte de prova, sendo que, as escutas telefónicas servem como meio de obtenção de prova e apenas poderão ser valoradas como meio de prova se forem comprovadas por qualquer outro elemento de prova.
54. Certo é que, a valoração das conversas gravadas estará sempre subordinada ao princípio da livre apreciação da prova e do in dubio pro reo, no entanto está deverá sempre ser corroborada por outro meio de prova de modo a poder-se aferir com toda certeza da sua veracidade, não revestindo um grau de credibilidade suficiente para que por si só permita a condenação de um arguido.
55. A única forma para que se possa sustentar uma condenação com base em escutas telefónicas é comprovar com o maior rigor possível a realidade ou veracidade das referências feitas nas conversas telefónicas e apenas poderão resultar como comprovadas através de diligências efectuadas e não apenas da escuta das mesmas.
56. Ora, face ao exposto o Tribunal “ a quo” ao formular a sua convicção e a decidir em conformidade condenando o arguido pela prática de um crime de tráfico de estupefaciente, violou claramente o disposto no artº 410, nº 2 al. a) do C.P.P..
57. O douto acórdão ora recorrido enferma do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, resultante de tal vício do texto da decisão recorrida, pois perante o recurso da matéria de facto e no qual toda a matéria se encontra documentada, não investigou todos os factos que podia e devia. Se o tivesse feito, a decisão seria indiscutivelmente outra, pois a apreciação da totalidade da matéria probatória à disposição do tribunal seguramente levaria à conclusão de que não resulta dos autos qualquer elemento de prova que corrobore o teor das escutas de modo a poder concluir-se que os factos aconteceram, que se concretizaram e que não passaram apenas de conversa, mais ou menos suspeitas.
58. Resulta daqui que para se concluir decisoriamente que o arguido cometeu o crime de tráfico de produtos estupefacientes é insuficiente a matéria de facto provada, que tal resulta do próprio texto da decisão de que ora se recorre, incorrendo assim o douto acórdão no vício consignado no artigo 410.º, n.º 2, al. a), do CPP.
59. Pelo que, verifica-se uma clara violação do disposto no artº 127º do C.P.P. naformulação da convicção do tribunal quanto forma como se convenceu que de que o arguido era fornecedor do arguido Joaquim e que manuseou o produto estupefaciente, sendo inconstitucional a interpretação efetuada pelo Tribunal, ao não se vincular ao principio da livre apreciação da prova e analisa-la arbitrariamente e ao principio e in dúbio pro reo, inconstitucionalidade que desde já se invoca, por violação do artº 32º da C.R.P..
60. O acórdão recorrido enferma ainda do vício da alínea c) do n.º 2, daquele artigo 410.º, sendo que foi efetuada uma errada apreciação da prova, em nossa opinião, manifesta e notória, pois uma apreciação não errada dessa prova, nomeadamente a referida no parágrafo anterior e feita à luz das regras da experiência, conduziria à conclusão de que existiam sérias dúvidas de que o ora recorrente fosse o fornecedor do arguido Joaquim, bem como o produto estupefaciente apreendido no pavilhão lhe pertencesse pelo facto de ter os seus vestígios lofoscópicos, tendo em conta o número de pessoas que frequentavam o pavilhão, nomeadamente o arguido Joaquim, o local isolado onde se encontrava, o objetivo do arrendamento do pavilhão e essencialmente que os referidos vestigios foram encontrados na fita-cola, na sua parte exterior e não no próprio produto estupefaciente, pelo que, deveria ter suscitado a dúvida ao Tribunal de saber em que momento o ora recorrente tocou na fita-cola e a que título, podendo admitir-se perfeitamente como válido e sério que a fita-cola tenha sido colocada no produto estupefacientes após o arguido ter tido contacto com a mesma, bem como sérias dúvidas de que as conversas decorrentes das escutas telefónicas se referiam a negócios de droga e que se concretizaram, na duvida o Tribunal teria que absolver este arguido, em abono do principio “In Dubio pro Reo”, o qual foi claramente violado.
61. Verifica-se assim, a nosso ver, que face à prova produzida em audiência de discussão e julgamento, cuja transcrição se encontra efetuada em relação ao arguido e para a qual se remete, que o Tribunal violou o principio “in dubio pro reo” ao dar como provado que o ora recorrente era fornecedor do arguido Joaquim e ainda que o produto estupefaciente encontrado no pavilhão era seu, tendo emconta por um lado, que tal convicção resulta das interceções telefónicas, sem que fossem corroboradas por outro elemento de prova, uma vez que, a vigilância de 30.01.2012 não dá qualquer grau de certeza que o arguidos se encontraram com o arguido R..., que não existe qualquer encomenda de produto estupefaciente resultante das interceções telefónicas, que não existe qualquer entrega do mesmo, desconhecendo-se de que era fornecedor e de que quantidades e ainda que o pavilhão era frequentado por várias pessoas, podendo o produto estupefaciente ali encontrado ser de qualquer um deles, desconhecendo-se quando e a que título as impressões digitais do arguido foram parar à fita-cola.
62. Todas estas questões deveriam criar uma dúvida séria e inultrapassável no julgador e em consequência devia lançar mão do princípio “in dúbio pro reo” e em consequência absolver o arguido.
63. Perante os referidos vícios, configura-se uma situação de necessidade de reenvio do processo para novo julgamento.
64. Ora verifica-se aqui um erro notório na apreciação da prova com a consequente violação do artº 410º, nº 2, al. c), do C.P.P..
65. Pelo que, conforme se referiu verifica-se a violação do princípio “in dubio pro reo”, sendo que segundo este princípio, na decisão dos factos incertos, a dúvida do julgador favorece o Réu e no douto acordão recorrido é manifestamente claro que o Tribunal “a quo” formulou a sua convicção no que concerne ao arguido, em provas de consistência duvidosa, aqui o Tribunal não fez Jus do princípio “In dubiopro reo” e o princípio da presunção da inocência do arguido a que alude o artº 32º da C.R.P.,
66. Pese embora a factualidade dada como provada entendemos que, o Tribunal “a quo” na determinação da medida da pena deveria entender que em termos de culpa, haverá uma forte atenuação dadas as condições pessoais e de vida do arguido no que se refere à atitude do ora recorrente que se procurou integrar, pessoal e profissionalmente, na sociedade, no entanto o Tribunal “a quo” decidiu aplicar ao arguido uma pena de prisão efetiva de 5 anos e 6 meses de prisão, o que a nosso ver é, manifestamente exagerada, face à culpa e as medidas de prevenção especial e geral.
67. Parece-nos que, salvo o devido respeito por melhor opinião, e a ter em consideração os factos dados como provados no douto acórdão o Tribunal “a quo” não teve em consideração, na determinação da medida da pena, todas as circunstâncias que depuseram a favor do agente (arguido José S...), nomeadamente no que concerne às condições pessoais do agente e o Douto Acórdão não referiu expressamente os fundamentos da medida da pena, violando assim o disposto nos art.ºs 70º, 71º n.º 1, n.º 2 al. d) e e) e 3 e 72º, nº 1 e 2 al. d) todos do Código Penal Português.
68. Entendemos assim, que a pena aplicada ao arguido José S... é manifestamente desadequada, por desajustada quer à culpa, quer às exigências de prevenção, até porque dos autos resulta, entre outras coisas que o arguido José S... não tem antecedentes criminais, está desde meados de Fevereiro de 2012, com a companheira grávida, a trabalhar em França.
69. Ademais, não obstante os factos dados como provados, certo é que não se conseguiu apurar o período em concreto que o arguido terá praticado os factos, aliás, o período temporal não resulta dos factos dados como provados, bem como resulta dos factos dados como provados quais as quantidades e qualidades de produtos estupefacientes que ora recorrente fornecia ao arguido Joaquim.
70. Resulta apenas dos factos provados que suportam a conclusão de que o ora recorrente era o fornecedor do arguido Joaquim, a vigilância do dia 30.01.2012, e a detenção de produto estupefaciente no dia 14 de Fevereiro de 2012, o que leva a que o período se concretize nestes dois únicos momentos.
71. Atendendo ao curto período temporal, bem como à ausência de quantificação da qualidade e quantidade de produtos estupefacientes entregues pelo arguido, ora recorrente ao arguido Joaquim, bem como ausência de quantificação do número de entregas, entendemos que o período temporal deve ser fixado nestes dois momentos, pelo que beneficia o arguido na determinação da medida da pena do curto período temporal em que esteve envolvido no tráfico de produtos estupefacientes e que o Tribunal não valorou.
72. Para além de que, o arguido se encontra inserido no meio social, conforme resulta do seu relatório social, o arguido refere trabalhar como pintor num grupo hoteleiro, auferindo um salário que ronda os 1200,00€. A companheira como a filha já completou cinco meses de idade, também já começou a prestar serviços de limpeza, conseguindo ambos um rendimento que lhes permite viver sem privações. Resulta pois do relatório social, bem como dos factos dados como provados que o arguido está laboral, social e familiarmente inserido.
73. Pelo exposto, ressalta desde logo que a pena aplicada ao arguido de 5 anos e 6 meses é absolutamente exagerada e contrária a todas as medidas de prevenção quer geral, quer especial, violando assim o fim ressocializador das penas e restringe a possibilidade de integração social e familiar do arguido ora recorrente, violando assim os fins de ressocialização previsto no disposto no artº 40º do C.P.
74. Não tomou o Tribunal “a quo” em consideração na determinação da medida da pena entre outros, as circunstâncias que depuseram a favor do ora recorrente, nomeadamente o bom comportamento do arguido anterior aos factos e posterior aos factos, a situação sócio-económica e familiar do arguido, nomeadamente o apoio familiar, a sua conduta posterior aos factos denota vontade de integração social, está laboralmente inserido, constituiu família e tem um filho neste momento com cerca de 10 meses, não tem antecedentes criminais, sendo este o seu primeiro contacto com a justiça.
75. O Tribunal “a quo” não tomou em devida consideração que os factos imputados ao arguido ocorreram há mais de um ano a esta parte e que após esse período o arguido pautou sempre a sua conduta de acordo com as normas legais.
76. O comportamento do arguido posterior à prática dos factos denota uma vontade de integração profissional, familiar e social, de pautar a sua conduta de acordo com as regras da sociedade, o que permite que se faça leva a que seja efectuado um juízo de prognose favorável acerca do arguido, podendo ser-lhe concedida uma pena de prisão suspensa na sua execução.
77. Verifica-se assim, que o Tribunal “a quo” violou o disposto no art.º 70º, 71º nº 1 e nº 2 do C. P. Por conseguinte deve a pena aplicada ao arguido recorrente ser alterada e reduzida no seu quantum, devendo ser substituída por outra mais próxima dos mínimos legais, pelo máximo de 4 anos e 6 meses.
78. Sem prescindir do supra alegado, e caso de mantenham os factos dados como provados pelo tribunal de primeira instância, deverá a pena aplicada ser inferior a cinco anos e suspensa na sua execução.
79. Exige a lei que o tribunal conclua, para optar pela suspensão de execução da pena privativa de liberdade, pela formulação de um prognóstico favorável relativamente ao comportamento futuro do agente em sociedade, de modo que a simples censura do facto ou a ameaça de cumprimento da pena aplicada sejam suficientes para o afastar do domínio da criminalidade com o cometimento de novos crimes.
80. O arguido está laboralmente inserido trabalhando com pintor num grupo hoteleiro em França desde Fevereiro de 2012, vivencia um relacionamento afectivo vivendo em união de facto com a namorada em casa de uma irmã, tem um filho com cerca de 10 meses de idade, este foi o seu primeiro contacto com a justiça, não tendo antecedentes criminais.
81. As condições de vida, familiar e profissionais do arguido supra expostas constituem elementos susceptíveis de formular um juízo de prognose favorável sobre a condução de vida daquele no futuro, sendo de prever, que a simples ameaça da pena será suficiente para prevenir a reincidência, realizando a finalidade da prevenção especial.
82. Aliás é nosso modesto entendimento, que nos crimes de tráfico de produtos estupefacientes, no caso de arguidos primários, a simples ameaça da pena será suficiente para prevenir a reincidência, realizando a finalidade da prevenção especial, ao contrário da pena efetiva de prisão em que o arguido beneficiará do contacto com outros reclusos ligados ao mundo do crime e como é consabido as prisões são as verdadeiras escolas do crime, o que em nada beneficiará
83. No caso, deverá o tribunal concluir pela suspensão de execução da pena privativade liberdade, já que é possível a formulação de um prognóstico favorável relativamente ao comportamento futuro do agente em sociedade.
84. Assim e em face de tudo o que se expôs e sem prescindir do que alegou neste recurso, entende o recorrente, sempre com o devido respeito, que a pena que lhe for aplicada deve ser reduzida no seu quantum e nunca superior a 4 anos e 6 meses de prisão e deverá ser suspensa na sua execução, tudo nos termos do disposto nos artigos 40º, 50º, 51º e 71º do Código Penal.
85. Face aos critérios legais foi pois violado o disposto nos arts. 40.º, n.º 2 e 71.º do C. P..
86. A pena além da sua necessidade terá que ter em conta as exigências individuais.
87. Ao não considerar na determinação da medida da pena os factos descritos no artº anterior o Tribunal “a quo violou o disposto no artº 70º, 71º nº 1 e nº 2 al. d) e e) e72º nº 1 e nº 2 al. d), todos do C. P.”
5. O arguido Joaquim F... apresentou igualmente recurso do acórdão do tribunal colectivo, concluindo as motivações pela seguinte forma (transcrição) :
“(…) Pelo que, em conclusão
DE FACTO
Encontram-se erradamente julgados os concretos pontos de facto supra aduzidos, face às concretas provas indicadas, todos aqui dados como reproduzidos, considerando as regras do ónus e da ponderação da prova e a demonstração efectuada.
Tem, pois, o recorrente que ser absolvido de tal factualidade imputada e impugnada, por míngua de prova legal e a sua punição ocorrer só pela restante.
DE DIREITO
1. A decisão recorrida é nula por não ter feito o exame critico da prova,
2. Isto ocorre, considerado o previsto nos artigos 374° e 379.º todos do CPP.
3. O que impõe a sua reformulação em sede de 1’ instância.
SEM PRESCINDIR
4. Encontra-se erradamente fixada a medida concreta da pena face à alteração factual que se impõe, pelo que deve, antes, ser fixada em 4 anos, considerando o seu especifico e constante de folhas 45 e 46 do acórdão recorrido e os critérios dos artigos 40° e 71° do CP.
5. Tal pena, por força desse específico pessoal, deve ser suspensa na sua execução por se verificarem os respectivos pressupostos e a garantia a sua eficácia poder ser controlada, através da imposição de normas de conduta.
6. Ao ter entendido de outra forma a decisão recorrida violou os artigos 40°, 710, 50° e 51°, todos do C.P.”
6. O magistrado do Ministério Público nas Varas Mistas de Guimarães apresentou fundamentada resposta, concluindo pela improcedência dos recursos.
7. Realizada a audiência neste Tribunal da Relação de Guimarães, na sequência de requerimento do arguido Joaquim F..., cumpre apreciar e decidir.
II - FUNDAMENTOS
8. Como é dado assente, o âmbito do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação (artigos 403º e 412º nº 1 do Código de Processo Penal), naturalmente que sem prejuízo das matérias de conhecimento oficioso.
Assim, as questões suscitadas pelos recorrentes são fundamentalmente as seguintes, pela ordem lógica de conhecimento:
a) Nulidade do acórdão por omissão do exame crítico da prova.
b) Vícios decisórios;
c) Impugnação da decisão da matéria de facto por erros de julgamento quanto aos factos constantes dos pontos 6, 18 a 21, 23, 30 a 66 (excepto 32, 41, 44, 45, 48, 50, 53 a 57 na parte em que diz respeito a José M...), 60, 63, 64, 69, 89 a 93 da matéria de facto provada e quanto aos pontos 2 e 3 da contestação do arguido Joaquim F...;
d) Violação do princípio in dubio pro reo;
e) Determinação da medida concreta da pena. Suspensão da execução.
9. Para compreensão e análise das diversas questões suscitadas nos recursos, torna-se necessário transcrever a decisão do tribunal colectivo sobre matéria de facto.
No acórdão, o tribunal recorrido julgou provada a seguinte matéria de facto (transcrição):
"1. Desde data não concretamente apurada, mas pelo menos desde Março de 2010 até Março de 2012, o arguido José C..., conhecido também por “Zé C...” ou “B...”, porque não desempenhasse qualquer actividade profissional remunerada, dedicou-se à comercialização de produtos estupefacientes, designadamente heroína e cocaína, que vendia a diversos consumidores que o procuravam.
2. Inicialmente, começou a levar a cabo essa actividade no interior da sua residência, sita na Travessa N..., Guimarães, passando depois para o Parque H... e depois para as instalações abandonadas de uma fábrica sita na Rua A..., Guimarães.
3. Para levar a cabo tal actividade, o arguido adquiria, na fase inicial, semanalmente quantidades não apuradas de heroína e cocaína, que depois cortava, pesava e embalava em doses individuais para vender a consumidores que se encontravam com ele directamente ou lhe telefonavam previamente para o efeito.
4. Nas deslocações que para tanto efectuava o arguido José C... fazia-se transportar na sua viatura automóvel de marca Renault, modelo Laguna, com a matrícula 08-09-..., e na viatura automóvel de marca Ford, modelo Fiesta, com a matrícula 94-35-....
5. Ao logo daquele período, o referido arguido, no desenvolvimento da mencionada actividade, vendeu por diversas vezes inúmeras quantidades de heroína e cocaína a vários consumidores.
6. No dia 20 de Fevereiro de 2010, este arguido vendeu a Domingos F..., pelo preço de €10, heroína com o peso de 0,20 gramas.
7. Para além de Domingos F..., o arguido foi também procurado por Domingos B..., Rui A..., Vítor O..., Eduardo L..., José M..., José S..., Francisco S..., Maria O..., todos consumidores de produto estupefaciente não apurado mas heroína ou cocaína, a quem vendeu, por mais do que uma vez, quantidades daqueles produtos, normalmente pelo preço unitário de €5.
8. Foi ainda no exercício dessa actividade que, no dia 16 de Junho de 2011, pelas 13.19 horas, o arguido José C... foi surpreendido por elementos do NIC da GNR no interior das instalações da mencionada fábrica, sita na Rua A..., Guimarães, junto a Rui A... e José S..., consumidores de estupefacientes, aos quais se preparava para vender produto dessa natureza.
9. Apercebendo-se da presença das autoridades, o arguido José C... de imediato atirou para o solo dois pacotes que segurava, um de cor branca e outro de cor vermelha, contendo no seu interior o peso bruto de 0,2 gramas de heroína.
10. Em simultâneo, os mencionados Rui A... e José Silva largaram para o solo uma nota no valor de €5 cada um, dinheiro com o qual iriam pagar ao arguido aquela heroína que pretendiam adquirir.
11. Nessa altura, o arguido José C... tinha ainda na sua posse:
- 20 “paços” em plástico de cor branca e vermelha, contendo no seu interior uma substância que, submetida a exame, revelou tratar-se de heroína, com o peso bruto de 2 gramas;
- uma embalagem em plástico contendo uma substância que, submetida a exame, revelou tratar-se de cocaína com o peso bruto de 0,2 gramas;
- duas notas do BCE com o valor facial de €5 cada uma;
- um telemóvel de marca Samsung, modelo E1120, de cor preta e cinza com um cartai da Vodafone, com o nº 916302492 e o IMEI 35805403990375/7;
- um telemóvel de marca Nokia, modelo 1600 de cor cinza, com o cartão Vodafone com o nº 915108736 e o IMEI 356446012234477.
12. Naquele dia 16 de Junho de 2011, pelas 13.19 horas, para além de Rui A... e José Silva, encontravam-se ainda junto à mencionada fábrica os seguintes consumidores de estupefacientes, que ali se haviam deslocado a fim de adquirirem heroína e cocaína ao arguido José C...: Vasily B..., Vítor O..., Eduardo L..., José M..., Hugo C..., Francisco S... e Maria O....
13. O arguido apenas não concretizou as pretendidas vendas a estes consumidores mercê da intervenção dos militares da GNR.
14. Na sequência da busca realizada na residência do arguido José C..., na Travessa N..., Guimarães, no mesmo dia 16 de Junho de 2011, pelas 16.10 horas, foram encontrados e apreendidos:
No quarto do arguido:
- um tabuleiro em vidro contendo resíduos de cocaína;
- uma faca de cozinha contendo resíduos de cocaína e de heroína;
- um X-acto apresentando resíduos de cocaína, o qual, juntamente com o tabuleiro e a faca, era utilizado para corte do produto estupefaciente;
- quatro documentos manuscritos alusivos a quantidades de estupefacientes, valores, nomes e débitos, no interior da mesinha de cabeceira;
- a quantia de €275 dividida numa nota de €100, cinco notas de €10 e nove notas de €5, que o arguido tinha guardada na capa de uma agenda na gaveta da mesinha de cabeceira;
- uma balança digital com resíduos de cocaína, em cima do guarda fatos;
- um telemóvel de marca Nokia, modelo 6100, com o IMEI 353369002822031, a operar com o número 916784709, que se encontrava em cima da mesinha de cabeceira;
- uma embalagem em plástico apresentando resíduos de heroína, que se encontrava em cima da cómoda;
- vários recortes em plástico vulgarmente utilizados para acondicionar produto estupefaciente, que se encontravam em cima da cómoda e apresentavam resíduos de heroína e cocaína;
No anexo à residência:
- uma concha de cozinha com resíduos de cocaína, utensílio este utilizado habitualmente no processo de “cozer” o estupefaciente em grandes quantidades.
15. O arguido destinava a droga que lhe foi apreendida à venda a consumidores, resultando o dinheiro de anteriores vendas de cocaína e heroína.
16. Os telemóveis apreendidos em 16 de Junho de 2011 eram utilizados pelo arguido José C... para estabelecer contacto com os consumidores.
17. A balança digital, recortes e demais utensílios igualmente apreendidos naquela data ao arguido eram por ele utilizados no desenvolvimento da descrita actividade, designadamente na divisão, pesagem e acondicionamento do estupefaciente em doses individuais para posterior venda a consumidores.
18. O arguido João F..., também conhecido pela alcunha de João S..., pelo menos desde data não concretamente apurada do ano de 2011 até 17 de Fevereiro de 2012 data em que foi detido à ordem dos presentes autos, dedicou-se compra e venda de heroína e cocaína.
19. Nessa actividade, para adquirir e fornecer heroína e cocaína, o arguido João F... procurava e era procurado por outros traficantes e também por consumidores para lhes vender tais produtos, designadamente através de contactos telefónicos, utilizando, para além de outros, o cartão com o nº 916 421 ...., fazendo-se transportar habitualmente num veículo de marca Mercedes ML 270 CDI, de cor preta, com a matrícula 53-82-....
20. Durante pelo menos o período de tempo referido em 18), o arguido João F... foi contactado, quer pessoal, quer para o sobredito número de telemóvel, por outros indivíduos, aos quais forneceu quantidades de heroína e cocaína, que variavam entre 5 e 100 gramas, quantidades estas que os adquirentes destinavam também a venda a terceiros consumidores.
21. Entre estes indivíduos estava o arguido José C..., também conhecido pela alcunha de “Zé C...” e utilizador do contacto telefónico com o nº 915 358 ..., ao qual o arguido João S..., com frequência quase diária, vendeu diversas quantidades de heroína e cocaína, que variavam entre as 5g e as 100gr., sendo a quantidade habitual de 20 gramas de heroína e 20 gramas de cocaína, que aquele, por sua vez e atenta a frequência e quantidade de produto estupefaciente solicitado (nomeadamente nos dias 8, 9, 14 e 16 de Fevereiro), destinava à venda a consumidores que, para esse efeito, o procuravam.
22. Para mencionar o tipo de estupefaciente utilizavam as expressões “branco”, “dia” e “claro” para a cocaína; “tinto” para a heroína e “das duas” para ambos.
23. No âmbito da prossecução dos seus desideratos e através de contactos telefónicos:
- No dia 28 de Janeiro de 2012, pelas 19h21, o arguido Zé C... solicitou ao arguido João S... o fornecimento de 5g, quer de heroína, quer de cocaína;
- No dia 30 de Janeiro de 2012, o arguido Zé C... pediu a João S... cocaína em pó (branco cru) em maior quantidade para cozer; o arguido João S... disse a António S... que o fornecedor não veio ter consigo, pelo que não deu para levar o produto estupefaciente (carro) que aquele lhe deixou.
- No dia 31 de Janeiro de 2012, o arguido Zé C...questionou o arguido João S... sobre se já tinha cocaína.
- No dia 3 de Fevereiro de 2012, o arguido Zé C... disse ao arguido João S... que não valia a pena comprar heroína, mas que a cocaína era uma maravilha; num outro momento, o arguido Zé C... disse ao arguido João S... para lhe levar mais quantidade de heroína, querendo saber o preço de cinquenta gramas.
- No dia 5 de Fevereiro de 2012, o arguido João S... avisou António S... de que um cliente lhe ia ligar e que não tem dinheiro suficiente para as 5g, mas que podia entregar-lhe, sendo o preço mínimo de cada grama de €55,00; ainda no mesmo dia o arguido João S... deu a António S... o número de telefone de um cliente que queria 5g de cocaína e 1 g de heroína.
- No dia 6 de Fevereiro de 2012, o arguido Zé C... pediu ao arguido João S... para lhe entregar heroína e cocaína “com quantidade”.
- No dia 7 de Fevereiro de 2012, o arguido Zé C... pediu ao arguido João S... mais quantidade de heroína e também mais cocaína porque esta “perde-se ao cozer”.
- No dia 8 de Fevereiro de 2012, o arguido Zé C... pediu ao arguido João S... 50g de boa qualidade, para lhe ser entregue no dia seguinte, acertando o preço em “seis e meio”.
- No dia 9 de Fevereiro de 2012, o arguido Zé C...disse ao arguido João S... que afinal pretende 100g e para ir ter consigo que já tem o dinheiro (€3.000,00), sendo que João S... lhe disse que estava com problemas em ir buscar o produto estupefaciente e que o preço para 50g é de €1.750,00.
- No dia 14 de Fevereiro de 2012, o arguido Zé C...pediu ao João S... que lhe entregasse a mesma quantidade do último fornecimento, 20 gramas de heroína e 20 gramas de cocaína.
- No dia 16 de Fevereiro de 2012, o arguido Zé C...solicitou ao arguido João S... que lhe entregasse, no dia seguinte, a quantidade habitual de 20 gramas de heroína e 20 gramas de cocaína.
24. Na sequência da vigilância efectuada junto da zona da residência do arguido Zé C..., cerca das 20h00 do dia 17 de Fevereiro de 2012, foi detectado o veículo em que o arguido João S... se fazia normalmente transportar (Mercedes ML 270 CDI, de cor preta, com a matrícula 53-82-...) a circular na E.N. 105 em direcção à Rua do Arco, deslocando-se para a habitação de Zé C... para lhe vender o estupefaciente que este lhe havia encomendado.
25. Perante a suspeita que o arguido João S... trouxesse consigo o produto estupefaciente que combinara no dia anterior vender ao arguido Zé C..., foi então aquele arguido interceptado e efectuada revista pessoal ao mesmo e busca ao respectivo veículo, na sequência do que foram encontradas:
- Na porta do veículo do lado do condutor 4 (quatro) embalagens de plástico, cada uma com o peso de cerca de 10 g (dez gramas), contendo duas delas cocaína e as outras duas heroína.
- Na posse do arguido João S...: nos bolsos das calças, a quantia de €2.085,00 em notas do BCE; um telemóvel da marca Garmin-Asus, modelo nuvifone A50, de cor preta, com o IMEI 355 998 030 0...., tendo inserido um cartão SIM da Vodafone nº 919 173 ... e respectiva bateria acoplada; um telemóvel da marca Nokia, com o IMEI 354 826 040 758 ..., com o cartão SIM da TMN nº 968 538 ... e respectiva bateria acoplada; um telemóvel da marca Samsumg, com o IMEI 358 077 044 307 ..., com o cartão SIM da Vodafone nº 916 421 .... e respectiva bateria acoplada.
26. No dia 18 de Fevereiro de 2012, cerca das 07h05, na Rua D..., Guimarães, foi efectuada busca domiciliária à residência do arguido João S..., tendo sido encontrado, por indicação do mesmo, numa cavidade da parede da cozinha, uma embalagem em plástico, contendo no seu interior um produto em pó de cor castanha, o qual, submetido ao respectivo exame pericial, revelou tratar-se de 2, 220 g de heroína.
27. Por sua vez, no dia 6 de Março de 2012, cerca das 16h00 foi efectuada busca domiciliária à residência do arguido Zé C..., sita na Travessa A..., Guimarães, tendo sido encontrado no seu interior:
- No quarto deste arguido: dentro de uma capa de uma agenda guardada na gaveta da mesinha de cabeceira, €60,00 em notas do BCE; dentro de um sapato de homem que se encontrava no chão, ao fundo da cama, 35 (trinta e cinco) embalagens contendo no seu interior um pó branco, o qual, submetido ao respectivo exame pericial, revelou tratar-se de 5,670g cocaína; dentro de uma saca plástica, pousada no chão junto á janela, 120 (cento e vinte) recortes de plástico de formato circular; sobre a mesa, ao lado da cama, um acolher de sopa contendo vestígios de produto estupefaciente, nomeadamente cocaína; dentro de um cofre que se encontrava fechado e pousado no chão, €200,00 em notas do BCE; numa gaveta da cómoda, uma factura da PT Comunicações, S.A., relativa ao telefone nº 253 536 ....
- Na cozinha: em cima da mesa, um telemóvel da marca Nokia, modelo RH-130, com o IMEI nº 359 284 046 3..., com o cartão SIM da Vodafone com o nº 911 875 ....
28. Na mesma data e local, efectuada revista pessoal ao arguido Zé C... tendo sido encontrado na sua posse, nos bolsos das calças, €215,00 em notas do BCE.
29. No dia 2 de Fevereiro de 2012, o arguido Zé C..., utilizando o contacto telefónico com o nº 915 358 ..., contactou o arguido João S... e pediu para este dizer ao Raul, seu empregado, para que o mesmo, por sua vez, avise o João P... que deixe de lhe roubar clientes, senão mete-o na cadeia.
30. Joaquim F..., também conhecido por “Quim B...”, igualmente se dedicava à venda de heroína e cocaína a terceiros revendedores e consumidores que o procuravam para o efeito, sendo que, para o exercício de tal actividade, que teve lugar, pelo menos, desde data não concretamente apurada do ano de 2010 até Julho de 2012, o arguido Quim B... fazia-se deslocar habitualmente nos veículos das marcas Citroen, modelo C4, de cor branca, com a matrícula 91-...-91, Audi, modelo A4, de cor azul, com a matrícula 73-05-..., Kia Sportage, de cor preta, com a matrícula 53-69-..., Honda, modelo Civic, de cor preta, com a matrícula 56-63-... todos registados em nome de Paula P..., sua companheira e, ainda, no veículo de marca Renault, modelo Clio, de cor branca, com a matrícula 54-38-..., registado em seu nome.
31. Durante aquele período, o arguido Quim B... foi procurado quer pessoal, quer telefonicamente, através do telemóvel com o n.º 918 065 ..., por outros traficantes, nomeadamente por Feliciano P...de Castro, e por vários consumidores que o abordavam directamente aos quais procedeu à venda de produto estupefaciente, nomeadamente heroína e cocaína, sendo certo que os locais para efectuar as transacções, as quantidade e tipo de produto eram acordados sempre em termos muito sintéticos, evitando que fossem ditas ao telefone quaisquer expressões que o ligassem a tal actividade de tráfico, pelo que eram utilizadas as expressões branco, dia e claro para a cocaína e tinto, escuro e noite para a heroína e os locais já estavam prefixados de acordo com o cliente em causa, referindo-se ao mesmos como o sítio, o caminho ou o campo.
32. Procuraram-no para aquele efeito, entre outros, Vergílio F..., José M..., Patrício N..., Paulo P..., José A... e R... C..., aos quais o arguido vendeu, por mais do que uma vez, diversas doses de cocaína e heroína em quantidades que habitualmente variavam entre o meio grama (0,5g) e os cinco gramas (5g). A cocaína era vendida ao preço de €50,00 o grama, sendo a quantidade mínima de meio grama (0,5g) vendida a €25,00. A heroína era vendida a €40,00 o grama, sendo a quantidade mínima de meio grama (0,5g) vendida a €20,00 e, em quantidades iguais ou superiores a dois gramas e meio (2,5g) pelo preço unitário de €75,00.
33. Deste modo e na prossecução da sua actividade, o arguido Quim B... procedeu à venda de cocaína e heroína em vários locais desta comarca, nomeadamente junto ao Campo de Futebol X, no Campo de Futebol Y, na Ponte de P..., no cemitério R..., nas imediações do Café S... e em alguns caminhos adjacentes a estes locais, os quais eram sempre de difícil vigilância por parte das entidades policiais sem que fosse notada a sua presença no local.
34. Na prossecução desta sua actividade, de entre o mais, no dia 19 de Janeiro de 2012, um indivíduo de identidade desconhecia, de uma cabine telefónica do W de Fafe (253 597 ...) solicitou a Quim B... a venda de 0,5 g de heroína.
35. Neste mesmo dia o arguido Quim B... foi contactado telefonicamente para o seu nº 918 065 ... por um indivíduo de nome Hélder F..., utilizador do nº 916 229 ..., o qual solicitou àquele 2g de produto estupefaciente não concretamente identificado mas heroína ou cocaína. Para o efeito, o arguido Quim B... ao volante do veículo com a matrícula 56-63-... deslocou-se junto da ponte existente na praia fluvial, sita na Rua P..., área desta comarca de Fafe, encontrando-se no mesmo local o referido Hélder F... ao volante do veículo de marca Rover, modelo 414, com a matrícula ...-30-73, sendo que, após uma breve conversa, aquele entregou-lhe o produto estupefaciente solicitado, que este recebeu.
36. No dia 22 de Janeiro de 2012, um indivíduo de identidade desconhecida, utilizando o telemóvel com o nº 913 106 073 solicitou a Quim B... a venda de 1g de produto estupefaciente não concretamente identificado mas heroína ou cocaína.
37. No dia 23 de Janeiro de 2012, o arguido João S..., utilizando o telefone com o nº 916 421 .... contactou o arguido Quim B... com o intuito de saber o nome de um outro traficante que mora na mesma localidade e tem uma tez escura. Quim B... responde que o nome começa por C, mas uma vez que o arguido João S... não percebeu enviou-lhe uma mensagem de texto com o nome Cunha.
38. Neste mesmo dia, o arguido Quim B... foi contactado telefonicamente pelo referido indivíduo de nome Hélder F..., utilizador do nº 916 229 ..., o qual solicitou àquele 2 g de produto estupefaciente não concretamente identificado mas heroína ou cocaína.
39. No dia 24 de Janeiro de 2012:
- o arguido Quim B... é contacto telefonicamente por José A... (através dos nº 960163... e 931735...) que lhe pergunta se tem cocaína. Quim B... responde afirmativamente, pelo que José V... solicita-lhe a entrega de meia grama. Assim, já cerca das 11h20, José V... referiu que se encontrava nas imediações do Café S..., tendo o arguido Quim B... dito para comparecer no Campo A... em 10 m.
- o arguido Quim B... é contacto telefonicamente por José M... (através do nº 960096...) que lhe pergunta se a cocaína é boa, marcando encontro para as 15 horas.
- o arguido Quim B... é contacto telefonicamente por um indivíduo de identidade desconhecida (através do nº 916733...) que lhe pede 3g cocaína, marcando encontro no campo.
- o arguido Quim B... é contacto telefonicamente por um indivíduo de identidade desconhecida (através do nº 936114...) que lhe pede meia grama de produto estupefaciente não concretamente identificado mas heroína ou cocaína mas em condições.
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por um indivíduo de identidade desconhecida (através do nº 913700040) que lhe diz que precisa de falar com ele. O arguido telefona-lhe e diz-lhe para passar lá em cima, sendo que o indivíduo lhe pergunta se é para beber uma garrafinha de branco, referindo-se a1g de cocaína.
40. No dia 27de Janeiro de 2012, o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por um indivíduo de identidade desconhecida (através do nº 915447...) que, tratando-se de um potencial cliente interessado a recomeçar a actividade de tráfico de estupefacientes, lhe pergunta como anda a heroína.
41. No dia 29 de Janeiro de 2012:
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por um indivíduo de identidade desconhecida (através do nº 914871...) que lhe pede 3g cocaína, marcando encontro para as 17h.
- o arguido Quim B... é contacto telefonicamente por um indivíduo de identidade desconhecida (através do nº 913106...) que lhe pede duas gramas de produto estupefaciente não concretamente identificado mas heroína ou cocaína, marcando encontro no caminho.
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por um indivíduo de identidade desconhecida, de alcunha “Cris” (através do nº 917006893) que lhe pergunta se arranja 2 gramas de cocaína.
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por um indivíduo de nome Eduardo (através do nº 915815...) que lhe diz que precisa de estar com ele, alertando, contudo, o arguido que só tinha cocaína.
42. No dia 30 de Janeiro de 2012, pelas 01h07 o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Hélder F... (através do nº 916229...) que lhe pede meia grama de produto estupefaciente não concretamente identificado mas heroína ou cocaína.
43. No dia 31 de Janeiro de 2012:
- o arguido Quim B... é contacto telefonicamente por um indivíduo de identidade desconhecida (através do nº 913700040). No decurso da conversa, o arguido diz que tem heroína no valor de €20,00 para ele provar e dizer se é boa, sendo que ainda lhe oferece cocaína, o que o mesmo recusa. Mais tarde, o referido indivíduo envia uma mensagem de texto ao arguido dizendo que a heroína não é nada de especial.
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Anabela (através do nº 912588...), que lhe pede para arranjar 2 caixas (produto estupefaciente não concretamente identificado mas heroína ou cocaína), já que só tem 6 baralhos. Por contacto telefónico realizado no dia 2 de Fevereiro de 2012 o arguido prontificou-se, no imediato, a ir levar 5 ou 6 baralhos de produto estupefaciente não concretamente identificado mas heroína ou cocaína.
- o arguido Quim B... é contacto telefonicamente por um indivíduo de identidade desconhecida (através do nº 934850191) que lhe solicita meia grama de produto estupefaciente não concretamente identificado mas heroína ou cocaína.
44. No dia 2 de Fevereiro de 2012, o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Eduardo (através do nº 960096...), que pretende adquirir produto estupefaciente não concretamente identificado mas heroína ou cocaína, alertando o arguido que só tem cocaína.
45. No dia 6 de Fevereiro de 2012, o Eduardo volta a contactar o arguido perguntando-lhe se já vende. O arguido responde que só tem cocaína e Eduardo pergunta se não tem heroína, ao que aquele responde que não.
46. No dia 8 de Fevereiro de 2012:
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por um indivíduo de identidade desconhecida (através do nº 913106...), marcando o arguido a entrega de cocaína em 10 minutos, no caminho, dizendo o indivíduo que, ao contrário da entrega anterior, só quer uma grama.
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Anabela (através do nº 912588...), que lhe pede para arranjar 4 caixas de produto estupefaciente não concretamente identificado mas heroína ou cocaína.
- um indivíduo de identidade desconhecia, de uma cabine telefónica sita na Rua M..., em Fafe (253 590 ...) solicita a Quim B... a venda de €25,00 de produto estupefaciente não concretamente identificado mas heroína ou cocaína, combinando a entrega na capela situada atrás do Café S....
47. No dia 9 de Fevereiro de 2012, o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Patrício (através do nº 915158615), que pretende adquirir €25,00 de produto estupefaciente não concretamente identificado mas heroína ou cocaína, sendo certo que como só tem disponíveis €21,00 solicita a entrega dos restantes €4,00 em momento posterior.
48. No dia 11 de Fevereiro de 2012:
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente pelo Peixoto, residente na localidade de A..., Fafe (através do nº 914871...), solicitando-lhe a venda de heroína.
- o arguido Quim B... informa Eduardo que já há das duas (heroína e cocaína) de boa qualidade.
49. No dia 23 de Fevereiro de 2012, o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Hélder F... (através do nº 916229...), que pretende adquirir-lhe 0,5g de cocaína.
50. No dia 24 de Fevereiro de 2012, o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Eduardo (através do nº 960096...), que pretende adquirir meio grama de heroína e meio grama de cocaína. No dia 1 de Março de 2012, o arguido informa Eduardo que tem heroína.
51. No dia 1 de Março de 2012:
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por um indivíduo de identidade desconhecida (através do nº 915815...), que lhe pergunta se já há, respondendo o arguido que só tem heroína.
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Virgílio F... e por Paulo P... (através do nº 915815...) que lhe solicitam a entrega de 2,5g de heroína e 0,5g de cocaína, respondendo o arguido que cocaína não tem, combinando a realização da transacção no sitio do costume.
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por José V... (através do nº 925452...), solicitando a entrega de meia grama de heroína, combinando a transacção para dez minutos depois, lá em cima no campo.
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Paulo P... (através do nº 914871...) que lhe solicita a entrega de 5g de heroína, perguntando o arguido se é o dobro de há pouco. Paulo P... pergunta, ainda, se já há cocaína.
52. No dia 2 de Março de 2012, o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Virgílio F... (através do nº 915815...), que pretende adquirir 2 meias (0,5g+0,5g de produto estupefaciente não concretamente identificado mas heroína ou cocaína), combinando a transacção para vinte minutos depois, no cemitério R....
53. No dia 3 de Março de 2012:
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Eduardo (através do nº 965815303), que lhe solicita 5g de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína.
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Jorge “M...” (através do nº 967217...) que lhe solicita a entrega de 5g de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína, combinando a realização da transacção para vinte minutos depois, à beira do Norberto.
54. No dia 4 de Março de 2012:
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Paulo P... (através do nº 914871...) que lhe solicita a entrega de 2,5g, e de duas embalagens de 0,5g de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína, combinando a realização da transacção às 17h00, lá em cima;
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Eduardo (através do nº 965815303), que lhe solicita 1g de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína, combinando a transacção em P..., Fafe, no espaço de 5m. Posteriormente, Eduardo solicita a entrega de mais 1 g de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína;
- o arguido Quim B... é novamente contactado telefonicamente por Eduardo (através do nº 915815...), que lhe solicita 0,5g de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína, combinando a transacção para dez minutos depois, lá em cima.
55. No dia 5 de Março de 2012:
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Eduardo (através do nº 965815303), que lhe solicita 2 gramas de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína. Posteriormente, pelas 12h32, Eduardo solicita a entrega de mais 0,5g de cocaína. Pelas 12h40, o arguido contacta telefonicamente Eduardo para o nº 915815..., dizendo-lhe este que quer mais 1,5g de heroína e a cocaína encomendada às 12h32. Pelas 17h53, Eduardo, utilizando o nº 915815..., solicita a entrega de 1g de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína, combinando o encontro no Campo de P..., Fafe.
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Paulo P... (através do nº 914871...) que lhe solicita a entrega de 5 meios gramas de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína, combinando o encontro para vinte minutos depois, lá em cima, no caminho de terra. Posteriormente, pelas 18h43 solicita a entrega de um saco de 2,5g de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína, sendo que o arguido lhe responde que só tem embalagens de 0,5g.
56. No dia 6 de Março de 2012:
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Paulo P... (através do nº 914871...) que lhe solicita a entrega de 6 meios gramas de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína, combinando o encontro para as 14h15 no caminho de terra. Posteriormente, solicita a entrega de 2,5g de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína, combinando o encontro lá em cima.
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Eduardo (através do nº 915815...), que lhe solicita 1g de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína, combinando o encontro, vinte minutos depois, lá em cima no campo.
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por G... (através do nº 926037...), que pretendia adquirir produto estupefaciente, referindo que na noite anterior tinha comprado meia grama ao Peixoto.
57. No dia 7 de Março de 2012:
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Eduardo (através do nº 915815...), que lhe solicita 1g de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína, combinando o encontro no espaço de vinte minutos, em cima.
- o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Paulo P... (através do nº 914871...) que lhe solicita a entrega de um saco igual ao de ontem (2,5g de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína).
58. No dia 8 de Março de 2012, o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por Paulo P... (através do nº 914871...) que lhe solicita a entrega 2,5g de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína, mais duas embalagens de 0,5g de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína, combinando o encontro para 15m depois no caminho de terra. Pelas 18h33, Paulo P... solicita a entrega de 4 embalagens de 0,5 g de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína. Pelas 19h12 Paulo P... solicita novamente a entrega das 4 ou, então, 5 embalagens de 0,5 g de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína.
59. No dia 9 de Março de 2012, o arguido Quim B... é contactado telefonicamente por R... C..., “professor da freguesia da Pica” (através do nº 916177505) que lhe solicita a entrega 2,5g de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína, mais duas embalagens de 0,5g também de produto estupefaciente não concretamente identificado, mas heroína ou cocaína, ao que aquele acedeu pelo preço de €120,00, combinando o encontro, à noite, junto da Zona Industrial de Fafe.
60. O arguido Quim B... tinha como fornecedor de produto estupefaciente, para posterior venda a revendedores e consumidores que o procuravam para o efeito nos moldes supra descritos, pelo menos o arguido José S..., conhecido pela alcunha de José B....
61. Com efeito, Quim B... e o B... encontravam-se amiúde, frequentando ambos o Café S....
62. No dia 30 de Janeiro de 2012, verificou-se que, enquanto o arguido Quim B... aguardava pelo chegada de um seu fornecedor, um cliente, o arguido João R..., telefonou-lhe e disse-lhe que o que levou está tudo fodido, respondendo-lhe aquele para não mexer em nada que o fornecedor vinha falar com ele e que iriam ambos falar consigo.
63. Assim, pelas 14h50, foi vista a chegar ao local de vigilância uma viatura da marca BMW, modelo 730, de cor preta, com a matrícula 93-82-..., sendo que ao volante e como único ocupante se encontrava o arguido José B..., sendo que o arguido Quim B... saiu do interior do café e introduziu-se no veículo e arrancaram em direcção à Zona Industrial S..., Fafe, local onde se foram encontrar com o arguido João R... a fim de esclarecerem a qualidade do produto estupefaciente.
64. Por outro lado, José B... frequentemente interpelava o arguido Quim B... para lhe entregar quantias em dinheiro provenientes da venda de produto estupefaciente que lhe havia cedido para venda.
65. Acresce que, no âmbito do processo de inquérito nº 63/12.6GBFLG, a correr termos nos serviços do Ministério Público de Felgueiras e no qual se investiga a prática de crimes de furto e desmantelamento de veículos, e já que um dos ali ofendidos referiu que o seu veículo estaria no interior de um Pavilhão sito na Rua S... , E... , área desta comarca de Fafe, no dia 13 de Fevereiro, cerca das 22h00, foi montada a respectiva vigilância por militares da Guarda Nacional Republicana.
66. Contudo, já no dia seguinte, cerca das 01h00, tendo o referido ofendido avistado a sair do interior do pavilhão um furgão da marca Opel, Modelo Vivaro, com a matrícula 32-19-... e no qual se encontrava no seu interior o José B..., colocou-se no seu encalço, facto que de que o arguido se apercebeu, colocando-se em fuga para parte incerta até à presente data.
67. Ora, cerca das 02h25, a pedido do arguido José B..., o arguido Quim B... deslocou-se junto do pavilhão em causa a fim de se inteirar dos acontecimentos. Já no local, e por o arguido Quim B... se encontrar conotado com o trafico de estupefacientes, foi sujeito a revista pessoal por parte dos militares da Guarda Nacional Republicana que ali se encontravam, tendo sido encontrado na sua posse 0,3 g de cocaína e 0,3g de heroína.
68. Nesse mesmo dia 14 de Fevereiro, por parte dos militares da Guarda Nacional Republicana e no âmbito dos citados autos de inquérito, foi realizada busca ao referido Pavilhão, cujo arrendamento foi feito José S...mas o contrato ficou em nome de Paulo S..., sendo que no interior de uma das dependências, devidamente fechada e isolada das restantes três, foi encontrado:
- Uma balança digital de precisão, de cor branca e da marca Oriflame;
- Um embrulho em forma de bola, envolto em fita-cola de cor castanha, contendo no seu interior 208,020g de heroína;
- Um saco plástico, contendo no seu interior4,540g de cocaína;
- Dois embrulhos plásticos, contendo no seu interior 7,075g de heroína;
- Um embrulho de plástico, contendo no seu interior 92,555 g de paracetamol/cafeína, utilizada como produto de corte;
- Um embrulho de plástico, contendo no seu interior 177,300 g de cafeína, utilizada como produto de corte;
- Um moinho de marca Beeken, contendo resíduos de heroína;
- Um rolo de fita-cola de cor castanha;
- Uma balança digital de cor preta, de marca Tanita;
- Uma balança digital de marca Payer, em forma de IPOD;
- Uma tesoura, contendo resíduos de heroína;
- Uma colher, contendo resíduos de heroína;
- Um rolo de sacos plásticos para recortes.
69. Efectuado exame pericial aos vestígios lofoscópicos encontrados na superfície da fita-cola de cor castanha, que envolvia as 208,020g de heroína, foram os mesmos identificados como pertencentes ao arguido José B..., que havia manuseado aquele embrulho.
70. Por sua vez, o arguido João R..., conhecido como R..., também se dedica à venda de produto estupefaciente, nomeadamente cocaína, aos consumidores que o procuram para o efeito, sendo certo que, parte do produto estupefaciente com o qual levava a cabo as suas transacções lhe era entregue, à consignação, pelo arguido Quim B....
71. Para o exercício de tal actividade, que teve lugar, pelo menos, desde Janeiro de 2012 até Julho de 2012, o arguido R... foi contactado quer pessoal, quer telefonicamente através dos telemóveis com os n.º 916 750 ... e 912 655 ..., por vários consumidores que o abordavam directamente aos quais procedeu à venda daquele produto estupefaciente, sendo certo que os locais para efectuar as transacções, as quantidade e tipo de produto eram acordados sempre em termos muito sintéticos, evitando que fossem ditas ao telefone quaisquer expressões que o ligassem a tal actividade de tráfico.
72. Procuravam-no, entre outros, Rogério B..., conhecido pela alcunha de “R...”, Adriano C..., Telma M..., e António G..., conhecido pela alcunha de “M...”, aos quais o arguido vendeu, a alguns com frequência diária, cocaína, em doses de meio e um grama, ao preço de €50,00 o grama, sendo a quantidade mínima de meio grama (0,5g) vendida a €25,00.
73. Deste modo e na prossecução da sua actividade, o arguido R... procedeu à venda de cocaína em vários locais desta comarca de Fafe.
74. No dia 5 de Março de 2012:
- entre as 18h06 e as 18h20, o arguido R... trocou várias mensagens de texto com um dos seus fornecedores (utilizador do nº 910432...), para combinar a entrega de cocaína;
- um casal de clientes, de nome Adriano C... e Telma, (utilizadores do nº 916949... ou 919924...) solicita a R... a venda de 1g de cocaína mais 0,5g a credito.
75. No dia 6 de Março de 2012:
- o casal de clientes, de nome Adriano C... e Telma, (utilizadores do nº 916949... ou 919924...) solicita a R... a venda de 1g de cocaína. Mais tarde, cerca das 17h18, o arguido contactou telefonicamente o casal, tendo atendido a referida Telma, a qual lhe solicitou 0,5g de cocaína, tendo aquele respondido que só a pronto pagamento, tendo combinado a transacção para 10m depois, em Paço. Posteriormente, às 20h25, o arguido contactou telefonicamente o casal, tendo atendido o Adriano, que lhe solicitou a entrega de 1g de cocaína, tendo aquele, mais uma vez, respondido que só a pronto pagamento, tendo combinado a transacção para 10m depois, na rotunda. Ainda no mesmo dia, cerca das 23h03, o casal enviou uma mensagem de texto ao arguido solicitando-lhe a entrega de 1g de cocaína a pronto pagamento, pelo valor de €30,00 e 0,5g a crédito.
- o arguido R... contactou telefonicamente um indivíduo conhecido pela alcunha de “G...” (utilizador do nº 911107...), o qual o questionou se tinha cocaína, tendo o arguido respondido afirmativamente.
- o arguido R... contactou telefonicamente um dos seus fornecedores (utilizador do nº 910432...), tendo-lhe pedido cocaína, em quantidade não concretamente apurada tendo ambos combinado o encontro para o final de jantar. Posteriormente, às 21h44, o arguido R... referiu que só ia levar uma, sendo que, pelas 21h57, combinaram o encontro na BP. Após, cerca das 22h40, o arguido reclama com o seu fornecedor de que já esta há 40m à espera, sendo que tem clientes que o aguardam.
- o arguido R... contactou telefonicamente um indivíduo conhecido pela alcunha de “M...” (utilizador do nº 964561383), o qual o questionou se tinha cocaína estupefaciente, tendo o arguido respondido afirmativamente, pelo que lhe encomendou 2g, sendo que pelas 23h06 combinaram o encontro à beira do hotel.
76. No dia 7 de Março de 2012, pelas 18h10, o referido casal de clientes, de nome Adriano C... e Telma, (utilizadores do nº 916949... ou 919924...) solicita a R... a venda de 1,5 g de cocaína.
77. No dia 8 de Março de 2012, o mesmo casal de clientes, de nome Adriano C... e Telma, (utilizadores do nº 916949... ou 919924...) solicita a R... a venda de 0,5 g de cocaína, sendo que pelas 21h04 solicitaram a entrega de 1g.
78. No dia 9 de Março de 2012:
- o arguido R... foi contactado telefonicamente por um dos seus fornecedores (utilizador do nº 910432...), tendo-lhe pedido 5g de cocaína tendo combinado o encontro para a hora do almoço.
- o casal de clientes, de nome Adriano C... e Telma, (utilizadores do nº 916949... ou 919924...) solicita a R... a venda de 1 g de cocaína, alertando que vão ficar a dever €5,00;
79. No dia 10 de Março de 2012:
- o casal de clientes, de nome Adriano C... e Telma, (utilizadores do nº 916949... ou 919924...) solicita a R... a venda de 2 g de cocaína, a pronto pagamento.
- o arguido R... foi contactado telefonicamente por um indivíduo de identidade desconhecida (utilizador do nº 913106...), que lhe pediu cocaína, pelo que aquele lhe tentou vender 1g daquele produto estupefaciente. O referido indivíduo disse que só tinha €30,00, tendo combinado o encontro no “E.Leclerc” de Fafe.
80. No dia 11 de Março de 2012, o referido indivíduo de identidade desconhecida (utilizador do nº 913106...) contactou o arguido R... pedindo-lhe cocaína, pelo que aquele lhe tentou, mais uma vez, vender 1g de cocaína. O referido indivíduo disse que só tinha €40,00, tendo combinado o encontro na C..., perto do restaurante, em Fafe. Cerca das 15h12, o referido indivíduo solicitou ao arguido R... a entrega de 0,5g de cocaína, pelo valor de €30,00. Posteriormente, cerca das 19h21, o mesmo indivíduo solicita ao arguido R... a entrega de cocaína, perguntando-lhe este que, como só tinha um grama, se queria que a partisse ao meio, ao que respondeu afirmativamente, pelo preço de €25,00.
81. No dia 14 de Março de 2012:
- o arguido R... contactou telefonicamente um dos seus fornecedores (utilizador do nº 913412...), que o informou que a cocaína já está melhor.
- o casal de clientes, de nome Adriano C... e Telma, (utilizadores do nº 916949... ou 919924...) é informado pelo arguido R... que já tem “aquela dura”.
- o arguido R... foi contactado telefonicamente por Rogério B..., conhecido pela alcunha de “R...” (utilizador do nº 936610...), que lhe pediu cocaína, tendo a transacção ocorrido na Rua G..., área desta comarca de Fafe.
82. No dia 15 de Março de 2012:
- o arguido R... foi contactado telefonicamente por indivíduo de identidade desconhecida (utilizador do nº 913106...), que lhe pediu 0,5g de cocaína, pelo preço de €25,00. O arguido respondeu que só tinha 1g daquele produto e que a vendia por €50,00;
- o arguido R... foi contactado telefonicamente por um dos seus fornecedores (utilizador do nº 913412...), tendo-se combinado encontrar, pelas 13h10, na Zona Industrial S... Fafe. Assim, pelas 13h15, o referido fornecedor, ao volante do veículo de marca Fiat, modelo Punto, de cor branca, com a matrícula 05-81-..., chegou à Zona Industrial onde o arguido R... já o esperava. Após, o arguido R... abriu a porta frontal do veículo, lado do passageiro, tendo-lhe o referido indivíduo entregue algo que aquele guardou de imediato no bolso das calças.
83. No dia 16 de Março de 2012:
- o arguido R... foi contactado telefonicamente pelo referido indivíduo de identidade desconhecida (utilizador do nº 913106...), que lhe pediu cocaína, sendo que o arguido respondeu que só vendia 1g desse produto estupefaciente e pelo preço de €50,00.
- o arguido R... foi contactado telefonicamente pelo indivíduo conhecido pela alcunha de “G...” (utilizador do nº 911107...), o qual encomendou 1g de cocaína. Cerca das 20h10, do mesmo número, o arguido R... foi contactado pelo indivíduo conhecido pela alcunha de R... que reclamou que a embalagem entregue só tinha 0,5g e não 1g.
84. No dia 20 de Março de 2012, pelas 11h43, o referido casal de clientes, de nome R... e Telma, (utilizadores do nº 916949... ou 919924...) solicita a R... a venda de 0,5 g de cocaína, tendo combinado a transacção pelas 13h00, no K... de Fafe.
85. No dia 22 de Março de 2012:
- o arguido R... foi contactado telefonicamente pelo referido indivíduo de identidade desconhecida (utilizador do nº 913106...), que lhe pediu cocaína, sendo que o arguido disse que tinha 1g desse produto, tendo combinado encontrarem-se lá em cima.
- o arguido R... foi contactado telefonicamente por Adriano C... (utilizador do nº 919924...) que se queixa de que a cocaína está molhada, dizendo que é como se fumasse bicarbonato.
86. No dia 23 de Março de 2012:
- o arguido R... foi contactado telefonicamente por Adriano C... (utilizador do nº 919924...) que, mais uma vez, se queixa de que a cocaína está molhada e não tem qualidade.
- o arguido R... contactou telefonicamente um dos seus fornecedores (utilizador do nº 913906...), e queixou-se que a cocaína não tem qualidade.
- o arguido R... contacta o referido casal de clientes, de nome Adriano C... e Telma, (utilizadores do nº 916949... ou 919924...) e informa-os que o fornecedor, no dia seguinte, lhe vai trocar a cocaína por outra com qualidade.
87. No dia 24 de Março de 2012:
- o arguido R... contactou telefonicamente um dos seus fornecedores (utilizador do nº 913906...), para combinarem a troca da cocaína.
- o arguido R... Contacta o referido casal de clientes, de nome Adriano C... e Telma, (utilizadores do nº 916949... ou 919924...) e, falando com a Telma, informa-a que a cocaína já é de melhor qualidade. Pelas 23h46, a Telma contactou o R... pedindo-lhe que levasse à sua casa duas embalagens de 0,5 daquele produto estupefaciente.
88. No dia 3 de Abril de 2012:
- o arguido R... foi contactado telefonicamente por um indivíduo identificado como Filipe (utilizador do nº 962240...) que lhe solicitou a entrega de 0,5g de cocaína, tendo combinado a transacção para 20m depois, no armazém.
- o arguido R... foi contactado telefonicamente por um potencial fornecedor (utilizador do nº 913152817), que lhe oferece cocaína de boa qualidade pelo preço de €45,00 o grama.
89. À excepção de João R..., nenhum dos referidos arguidos exercia qualquer actividade profissional ou outra, remunerada ou não, dedicando-se exclusivamente à compra e venda de produtos estupefacientes, não tendo, assim, quaisquer outros rendimentos para além dos lucros que provinham daquela actividade que justificassem a posse dos veículos em que circulavam, nem os telemóveis que detinham.
90. As quantias em dinheiro encontradas na posse dos arguidos, nomeadamente dos arguidos João S... e Zé C..., provinham dos lucros da venda de estupefacientes, e bem assim os objectos e telemóveis que todos detinham e apreendidos tinham sido adquiridos por eles com os lucros dessa actividade e destinavam-se à prossecução da mesma.
91. Ao agir como descrito, os arguidos actuaram sabendo quais as características, natureza e efeitos dos produtos estupefacientes que adquiriram e que detinham para posterior venda, procurando desse modo obter compensação económica.
92. Sabiam ainda os arguidos que a posse, detenção, cedência e venda de tais produtos não são permitidos por lei.
93. Os arguidos agiram sempre de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
94. O arguido João F... foi, por decisão datada de 23.12.2009, reportada a factos ocorridos em 2005, condenado na pena única de quatro anos e dez meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, pela prática dos crimes de detenção de arma proibida e tráfico de estupefacientes, previstos e punidos pelos arts. 86º, da Lei nº 5/2006, de 23.02, e art. 21º, do D.L. nº 15/93, de 22.01.
95. Este arguido (João F...) frequentou a escola até concluir o 4º ano de escolaridade. Aos 12 anos começou a trabalhar na construção civil com o irmão mais velho, actividade que desempenhou até ao cumprimento do serviço militar obrigatório.
96. Casou aos 18 anos, emigrando para a Suíça aos 25 anos de idade. Até 2003 trabalhou no sector da construção civil, altura em que optou por mudar de actividade profissional com a abertura de um restaurante com um sócio, com quem se incompatibilizou, pelo que acabou por encerrar. Adquiriu, então, outro restaurante, em 2005, que acabou igualmente por encerrar.
97. Tem quatro filhos, dois nascidos na vigência do matrimónio, já adultos, com agregados familiares constituídos e a residirem na Suíça; os outros dois filhos nasceram de relacionamentos extra-conjugais, com 30 e 9 anos de idade, com os quais mantém proximidade relacional.
98. Fixou definitivamente residência em Guimarães no primeiro semestre de 2006, não obstante efectuar deslocações à Suíça, onde permanecem a esposa e filhos sem desejarem o regresso a Portugal.
99. Em 2006, o arguido começou a explorar um bar/discoteca na freguesia da sua área de residência, denominado “O...”, sendo nesse contexto que conheceu Emília C..., com quem passou a manter uma relação de namoro e a consumir cocaína e heroína, prática que manteve até lhe ser aplicada a medida de prisão preventiva, em 28.10.2007.
100. Na data dos factos dos presentes autos, residia com a progenitora, viúva e reformada e convivia com a irmã, primos e sobrinhos, com quem mantém um relacionamento de proximidade afectiva e de entreajuda.
101. Continua a deter o suporte familiar que detinha, nomeadamente da progenitora, irmã e sobrinhos, que o visitam sempre que podem.
102. Profissionalmente não desempenhava qualquer tipo de actividade, beneficiando da situação económica da progenitora, bem como das suas poupanças. Fazia, pontualmente, alguns biscates na construção civil ou na agricultura, os quais não lhe permitiam um rendimento mensal regular que lhe permitisse a satisfação das suas necessidades básicas.
103. Não apresenta perspectivas de enquadramento laboral de suporte à sua subsistência em liberdade, manifestando intenção de voltar para a Suíça.
104. Na data da aplicação da medida de coacção de prisão preventiva à ordem dos presentes autos, mantinha consumos regulares de estupefacientes e encontrava-se sujeito a acompanhamento pelos serviços de reinserção social no âmbito de uma suspensão de execução de pena de prisão de quatro anos e dez meses, com regime de prova.
105. Verbaliza arrependimento, mas assume um discurso de desculpabilização assente na necessidade de satisfazer as necessidades de consumo.
106. O arguido José C... foi, por decisão datada de 16.01.1984, condenado na pena de dois meses de prisão, substituída por multa, pela prática de um crime de desobediência, previsto e punido pelo art. 388º, do Código Penal.
107. Por decisão datada de 29.07.1986, foi condenado na pena de dezoito meses de prisão pela prática de um crime de furto qualificado, previsto e punido pelo art. 297, nº1 e 2, do Código Penal.
108. Por decisão datada de 14.10.1988 foi condenado na pena de dois anos de prisão pela prática de um crime de lenocínio, previsto e punido pelos arts. 215º e 216º, do Código Penal.
109. Por decisão datada de 12.04.1989, foi condenado na pena de um ano de prisão e multa, pela prática de um crime de lenocínio, previsto e punido pelos arts. 215º e 216º, do Código Penal.
110. Por decisão datada de 25.05.1990, reportada a factos ocorridos em 03.01.1984, foi condenado em pena de prisão substituída por multa, pela prática de um crime de receptação, previsto e punido pelo art. 329º, nº1, do Código Penal.
111. Por decisão datada de 16.12.1992, reportada a factos ocorridos em 26.08.1991, foi condenado na pena de nove anos e seis meses de prisão e multa, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo art. 23º, nº1, do D.L. nº 430/83, de 13.12.
112. Por decisão datada de 08.02.1994, reportada a factos ocorridos em 09.12.1989, foi condenado em pena de prisão pela prática dos crimes de ofensas corporais e detenção de arma proibida, previstos e punidos pelos art. 143º e 260 do Código Penal;
113. Por decisão proferida em 04.06.2002, foi revogada a liberdade condicional que havia sido concedida ao arguido em 08.07.1996, ordenando-se a execução da pena de prisão remanescente.
114. Por decisão datada de 27.04.2000, foi condenado na pena de cinco anos e seis meses de prisão, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo art. 21º, do D.L. nº 15/93, de 22.01, crime este praticado em 07.01.1999; esta pena foi declarada extinta pelo cumprimento por decisão de 05.11.2004.
115. O processo de desenvolvimento do arguido José C... decorreu no agregado de origem, constituído pelos pais e três irmãos, agregado este com frágeis recursos económicos; os pais, actualmente falecidos, trabalhavam, respectivamente, como revistadeira de roupas e como porteiro de uma fábrica.
116. O arguido habilitou-se com a 4ª classe, cessando a escolarização aos 11 anos de idade, altura em que começou a trabalhar.
117. Iniciou o seu percurso profissional na construção civil e, posteriormente, empregou-se na área têxtil. Decorridos alguns anos e na procura de melhores condições laborais passou a trabalhar na área da restauração (cafés, restaurantes e bares) e, por fim, na exploração de vários estabelecimentos comerciais do mesmo ramo, mas de diversão nocturna.
118. Em 1977 casou-se com Maria G..., de quem teve dois filhos. O relacionamento conjugal passou por diversos períodos marcados por dificuldades relacionais, com registo de uma separação e retoma da relação cerca de dois anos depois.
119. O seu primeiro período de prisão preventiva, no Estabelecimento Prisional de Guimarães, ocorreu em 1984/1984, tendo saído em liberdade volvidos alguns meses, após o que o ambiente familiar continuou a passar por períodos de instabilidade, para os quais não terão sido alheios, quer a dependência de estupefacientes, quer a prática de actividades ilícitas que o vieram a confrontar com o sistema judicial.
120. A sua segunda prisão ocorreu aos trinta e sete anos de idade, cumprindo uma pena de nove anos e seis meses, cujo termo foi em Fevereiro de 2001.
121. Saiu em liberdade condicional em 1996 e no decurso desse período regressou ao agregado constituído, altura em que foi vendedor num Stand de automóveis e posteriormente dedicou-se à distribuição de têxteis, estabelecendo-se depois por conta própria com um bar de diversão nocturna.
122. Com quarenta e cinco anos foi preso no Estabelecimento Prisional do Porto e posteriormente transferido para Paços de Ferreira, vindo a ser condenado a cinco anos e seis meses de prisão.
123. Este arguido iniciou acompanhamento no CRI de Guimarães, tendo frequentado com regularidade o programa opióide com metadona, mas não registou abstinência, mantendo o consumo regular de heroína e cocaína.
124. No período anterior à presente reclusão mantinha-se dependente da cocaína e heroína, contando, como ainda conta, com o apoio incondicional da família nuclear, que o descreve como calmo e de bom trato.
125. Não obstante o tratamento a que aceitou submeter-se, revela diminuto poder reflexivo e consequencial face aos efeitos negativos dos estupefacientes na definição de um projecto de vida integrador; não valoriza a eventual existência de vítimas decorrentes da adopção de comportamentos como os que lhe são apontados.
126. O arguido José S... não tem antecedentes criminais.
127. Cresceu integrado no agregado de origem, sendo o filho mais velho de um casal de média condição social e económica; o seu pai era empregado de balcão e a sua mãe sempre trabalhou em diferentes actividades profissionais, tendo dedicado ao filho uma atenção positiva, existindo forte vinculação entre ambos.
128. O pai consumia abusivamente bebidas alcoólicas e geria desadequadamente o seu dinheiro, viciando-se no jogo e criando instabilidade familiar. Há três anos atrás os progenitores divorciaram-se e o pai do arguido foi viver para França.
129. O arguido concluiu o 12º ano de escolaridade num centro de formação profissional, que o habilitou para a profissão de afinador de máquinas.
130. Por volta dos vinte anos, começou a trabalhar na venda de automóveis para um amigo, deslocando-se com frequência ao estrangeiro para ir buscar carros, sendo esta a única experiência profissional declarada.
131. Em 23.09.2011 foi vítima de acidente de viação que determinou a retirada de um rim e do baço, para além de diversas sequelas na coluna, o que conduziu a tratamentos e cirurgias posteriores.
132. Na data dos factos, vivia com a progenitora, que é funcionária numa cantina, e com a namorada, com quem estabeleceu uma união de facto.
133. Não trabalhava, mas a sua irmã, com vida estabilizada em França, estava a diligenciar no sentido de lhe conseguir uma colocação profissional, o que logrou conseguir; assim, em meados de Fevereiro de 2012, o arguido, com a companheira grávida, foi para casa dessa irmã, onde vive desde então.
134. Joaquim F... foi, por decisão datada de 10.01.2011, reportada a factos ocorridos em 10.01.2011 e transitada em 09.02.2011, condenado em pena de multa pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, previsto e punido pelo art. 292º, do Código Penal.
135. Por decisão datada de 29.03.2011, reportada a factos ocorridos em 22.08.2008 e transitada em 03.05.2011, foi condenado em pena de multa pela prática de um crime de ofensas à integridade física simples, previsto e punido pelo art. 143º, do Código Penal.
136. Joaquim F... é filho de pais emigrados na Alemanha, o que ocasionou que tenha sido criado, até à adolescência, com a avó materna, em Felgueiras, num agregado coeso e equilibrado.
137. O percurso escolar decorreu até aos 14 anos, com uma retenção no 7º ano, altura em que foi abandonado iniciando-se a trajectória profissional como aprendiz no ramo hoteleiro, sector onde se manteve até à emigração para a Suíça depois de atingida a maioridade.
138. Permaneceu na Suíça cerca de dois anos, após o que regressou a Portugal, exercendo actividade como porteiro em estabelecimentos de diversão nocturna no Porto.
139. Seguiram-se várias actividades em estabelecimentos de restauração na região de Fafe e Felgueiras, cuja mobilidade se orientava de acordo com oportunidades remuneratórias, na maioria com registo informal sem descontos para os regimes de protecção social.
140. Este arguido não desempenha actividade laboral regular e estruturada há mais de cinco anos.
141. Casou aos 20 anos, casamento este do qual nasceram dois filhos, tendo ocorrido a separação de facto há mais de cinco anos. O arguido enviuvou em Janeiro de 2012.
142. Iniciou uma relação afectiva com a actual companheira há mais de 10 anos, de onde resultou o nascimento de um filho.
143. Na data dos factos, o arguido não apresentava historial de consumo de estupefacientes, constituindo agregado com a actual companheira e dois filhos menores (um de uma anterior relação da companheira), centrando-se a sobrevivência económica do agregado na actividade assalariada da companheira (operária de confecção) e trabalhos ocasionais do arguido na restauração.
144. As rotinas do arguido surgem centradas na habitação, com períodos de ociosidade, devido ao facto de se envolver ocasional e informalmente na actividade de empregado de mesa (especialmente aos fins de semana).
145. O arguido João R... não tem antecedentes criminais.
146. O processo de desenvolvimento de João R... decorreu maioritariamente integrado num agregado monoparental, com indicadores de alguma vulnerabilidade sócio-económica (o progenitor faleceu na infância do arguido).
147. Iniciou o percurso escolar em idade normal, que foi interrompido aos 11 anos, apenas com a conclusão do 3º ano, na sequência da desmotivação e insucesso escolar potenciados pelas dificuldades económicas do agregado.
148. A sua trajectória profissional inicia-se na adolescência como ajudante de mecânico, sector onde se manteve durante cerca de dois anos até transitar para o sector do calçado, onde trabalhou aproximadamente sete anos. Após completar 20 anos ingressa numa empresa de transformação e embalagem de produtos alimentícios de Fafe, onde se mantém até à presente data.
149. Foi pai pela primeira vez aos 22 anos, envolvido numa coabitação pouco duradoura.
150. Há cerca de 7 anos casou com a actual cônjuge, que conheceu em contexto profissional, fixando-se o casal em Fafe, nascendo desta relação uma filha.
151. O envolvimento no consumo de estupefacientes ocorreu após a maioridade, mantendo o arguido um padrão regular de consumo de cocaína, consumo este interrompido aquando do nascimento do primeiro filho, mas que havia sido retomado antes dos factos em causa nos autos.
152. O actual agregado do arguido mostra-se coeso e funcional, constituindo o contacto com o sistema judicial e os factos ao mesmo subjacentes uma fonte de perturbação da respectiva dinâmica.
153. A sobrevivência económica do seu agregado é assegurada pela actividade profissional do arguido e de sua esposa, centrando-se o quotidiano do arguido na actividade laboral, nas relações sociais com a família da cônjuge e no grupo profissional.
154. Revela juízo crítico e reflexivo face à envolvência dos factos, bem como percepção do dano associado ao consumo e tráfico de estupefacientes.
O tribunal colectivo julgou não provado (transcrição) :
“A. O arguido João F... dedicou-se à compra e venda de produtos estupefacientes desde meados do ano de 2010.
B. O arguido João F... entregou efectivamente heroína e cocaína a José C... nos dias 28, 30 e 31 de Janeiro de 2012 e 1, 3, 6, 7,8,9, 14 e 16 de Fevereiro de 2012.
C. No dia 8 de Fevereiro, o arguido José C... acertou com o arguido João F... o preço de €32,50.
D. Outro indivíduo a quem o João F... fornecia grandes quantidades de produto estupefaciente para posterior venda a consumidores que o procuravam para o efeito tratava-se de Joaquim F..., mais conhecido por “Quim B...”.
E. O arguido Joaquim F... dedica-se à actividade de vende de heroína e cocaína desde Setembro de 2010.
F. Vergílio F... procurava o arguido Joaquim F... desde há cerca de 10 anos, José M... desde há cerca de 4 ou cinco anos, Patrício N... desde há cerca de um ano, Paulo P... desde há cerca de 2 ou 3 anos, José V... desde há cerca de 8 anos e R... C... desde há cerca de 10 anos.
G. O arguido Joaquim F... vendeu diversas doses de cocaína e heroína aos consumidores referidos em F) com frequência diária.
H. No contacto do dia 23 de Janeiro de 2012, o arguido João F... contactou o arguido Joaquim F... falavam de Mário C..., indivíduo referenciado como traficante de produto estupefaciente.
I. No dia 31 de Janeiro de 2012, quando Anabela contacta o arguido Joaquim F... e se refere a 2 caixas e 6 baralhos quis dizer, respectivamente, 20 gramas e 6 gramas, tendo-se o arguido prontificado a levar 5 ou 6 gramas. No dia 8 de Fevereiro de 2012, quando Anabela se refere a 4 caixas quer dizer 40 gramas de produto estupefaciente.
J. O arguido Joaquim F... tinha como fornecedor o arguido João F....
K. O arguido José S...interpelava o arguido Joaquim F... para lhe entregar avultadas quantias em dinheiro.
L. O arguido R... Sousa dedicava-se à venda de heroína. Vendeu, com frequência diária heroína a Rogério B..., Adriano C..., Telma M... e António G....
M. No dia 15 de Março de 2012, o casal de clientes comporto por Adriano C... e Telma (utilizadores do nº 916949... ou 919924...) solicitou ao arguido R... a venda de 1 grama de produto estupefaciente, alertando que vão ficar a dever €5.
N. No dia 22 de Março de 2012, quando foi contactado por Adriano C..., pelas 22h31, o arguido R... disse que tinha sido de ter cozido a cocaína há pouco tempo.
O. Todos os veículos conduzidos pelos arguidos foram adquiridos por eles com o produto da venda de cocaína e heroína.
P. Agindo como agiram procuraram todos os arguidos obter avultada compensação económica.
Q. O arguido José C... dedica-se à venda de cocaína e heroína desde o ano de 2009 e vendeu, por mais do que uma vez, heroína e cocaína a R... Anjos pelo preço unitário de €5.
R. O dinheiro apreendido ao arguido José C... em 16 de Junho de 2011 provinha do trabalho do agregado familiar do arguido, constituído pela esposa, filho, nora e neta, e destinava-se ao sustento destes durante aquele mês.
S. O montante de €215 apreendido na residência do arguido José C..., em 6 de Março de 2012, era pertença de seu filho João C..., que o tinha entregue ao arguido para ir pagar a factura da luz no valor de €89,68 e ainda a factura referente à alimentação na escola da sua filha menor do mês de Dezembro de 2011, no valor de 26,8 e ainda os meses de Abril, no valor de €23,36, Maio, no valor de 23,36, Junho, no valor de 21,90, e Julho no valor de 7,30, montantes estes que se encontravam em atraso referente ao ano lectivo de 2009/2010 e que o filho do arguido não podia ir pagar uma vez que trabalhava durante o dia.
T. O montante que se encontrava no cofre (apreendido na residência do arguido José C... em 6 de Março de 2012) era produto do trabalho do agregado familiar, constituído pela esposa e pelo filho, nora e neta, dinheiro aquele que se destinava ao pagamento mensal da renda de casa no valor de €150, renda esta que deveria ser paga até ao dia 8 de Março, sendo habitual guardá-lo no cofre; os demais €60 apreendidos eram da esposa do arguido e destinavam-se às despesas do dia a dia.
U. O arguido Joaquim F... sempre teve bom comportamento, sempre foi respeitado por todos e sempre respeitou todo e qualquer cidadão”.
Na motivação da decisão sobre a matéria de facto do tribunal colectivo, consta no acórdão recorrido o seguinte (transcrição):
“O tribunal formou a sua convicção com base na análise crítica e selectiva de toda a prova produzida em audiência, mormente por declarações, testemunhal, documental e pericial, conexionada com as regras da lógica e da experiência comum.
Em termos documentais e periciais, analisou-se:
Dos autos principais
1) Anexo de transcrição das escutas telefónicas efectuadas no âmbito da investigação (que contém 162 páginas).
2) Fls. 17 - vigilância efectuada em 16.09.2010 junto à residência do arguido Joaquim F..., tendo este sido visto a conduzir uma viatura de matrícula 91-...-91, Citroen C4.
3) Fls. 18 e 19 – vigilância efectuada em 11.01.2011, que se iniciou junto à residência do arguido Joaquim F..., onde ficou a constar que este, seguindo numa viatura todo-o-terreno, Kia Sportage, com a matrícula 53-69-..., andou por várias artérias, até que, pelas 14.35 horas, parou junto de um veículo de cor preta, da qual se apeou um sujeito jovem, que se dirigiu à viatura do arguido, havendo entre ambos uma troca.
4) Fls. 13 e 22 - Pesquisa na base de dados do registo automóvel, da qual resultou que os veículos de matrículas 91-...-91 e 53-69-... se encontravam registados em nome de Paula P..., constando como residente na mesma morada que o arguido Joaquim F....
5) Fls. 23 e 24 - vigilância efectuada em 24.01.2011 às movimentações do arguido Joaquim F..., durante o dia, tendo este conduzido a viatura de matrícula 53-69-....
6) Fls. 30 – vigilância efectuada em 03.04.2011 aos movimentos do arguido Joaquim F..., detectando-se o mesmo a conduzir o veículo de matrícula 53-63-..., Honda Civic de cor preta.
7) Fls. 31 – pesquisa na base de dados do registo automóvel, de que se extrai que o veículo Honda Civic de cor preta e matrícula 53-63-... se encontra registado em nome de Paula P..., com a mesma residência do arguido.
8) Fls. 195 e 196 – vigilância efectuada em 19.01.2012, com recurso a escutas telefónicas em tempo real, onde de constata que o arguido Joaquim F..., na sequência de combinação telefónica para o efeito, segue no veículo de matrícula 56-63-... e encontra-se, numa praia fluvial, com um indivíduo que vem na direcção contrária ao volante de um automóvel, parando ambos lado a lado e efectuado uma troca.
9) Fls. 233 – Vigilância em 30.01.2012 às movimentações do arguido Joaquim F..., constatando-se que este se encontra com o arguido José S... (também conhecido por “B...”) no “Café S...”, de onde depois saem e vão em direcção ao Parque Industrial S..., em Fafe.
10) Fls. 328 a 331 – Auto de detenção em flagrante delito do arguido João F..., no dia 17.02.2012, auto de revista pessoal e auto de busca e apreensão ao veículo de automóvel de matrícula 53-82-....
11) Fls. 339 – Auto de busca e apreensão na residência do arguido João F..., em 18.02.2012, em que, por indicação do mesmo, foi encontrada uma pequena embalagem em plástico contendo um produto em pó de cor castanha.
12) Fls. 462 a 468 - Auto de busca e apreensão, em 06.03.2012, na residência do arguido José C..., originais de facturas encontradas durante a diligência e em nome do mesmo, bem como reportagem fotográfica dos demais objectos encontrados.
13) Fls. 489 a 508 - Auto de busca e apreensão efectuados em 14.02.2012, no pavilhão industrial e anexos, sitos na Rua S... , E... , Fafe, bem como suporte fotográfico dos objectos e produtos ali encontrados.
14) Fls. 514 a 517 - Contrato de arrendamento relativo ao pavilhão onde, em 14.02.2012, foi efectuada a busca e apreensão.
15) Fls. 606 a 609 - Relatório de exame de leitura do telemóvel Nokia, 100, com o IMEI 359284046349..., com o cartão SIM da operadora Vodafone nº 911875....
16) Fls. 611 – Vigilância efectuada em 14.03.2012 ao arguido João R..., na sequência de uma combinação de encontro marcada por este via telemóvel (com escuta em tempo real), onde se verificou que tal arguido se encontrou com um indivíduo identificado, entrou por breves instantes na viatura deste e depois voltou a sair.
17) Fls. 614 e 615 – Vigilância ao arguido R..., em 15.03.2011, na sequência do encontro marcado via telefónica, de que os agentes da autoridade tiveram conhecimento em tempo real, onde se constata a abordagem do mesmo por parte de outro indivíduo.
18) Fls. 688 – Exame pericial ao produto estupefaciente e resíduos encontrados na colher, ambos apreendidos ao arguido José C..., revelando-se, em ambos os casos, tratar-se de cocaína.
19) Fls. 699 e 700 – Auto de busca e apreensão realizadas em 16.04.2012 à residência dos arguidos Joaquim F... e João R....
20) Fls. 749 e 750 – Exame pericial ao produto estupefaciente apreendido ao arguido João F..., revelando tratar-se de cocaína e heroína.
21) Fls. 807 a 812 – Exame efectuado pelo Gabinete de Perícia Criminalística aos vestígios lofoscópicos recolhidos na inspecção efectuada no dia 14 de Fevereiro de 2012, no Pavilhão Industrial sito na Rua E..., Fafe, do qual se extrai, além do mais, que o vestígio que se encontrava na superfície da fita-cola envolvendo produto estupefaciente que se encontrava na casa de banho, dentro de um saco, tal como fotografado pertence ao arguido José S....
22) Fls. 852 – Exame pericial aos resíduos encontrados no moinho, tesoura e colheres apreendidos no âmbito da busca realizada ao referido Pavilhão, em 14.02.2012, de onde resulta a presença de heroína em todos aqueles utensílios.
23) Fls. 854 e 855 – Exame pericial realizado aos produtos estupefacientes encontrados na mencionada busca ao Pavilhão, no dia 14.02.2012, que conclui tratar-se de heroína, cocaína, paracetamol e cafeína.
24) Fls. 1029 a 1030 – Certificado de Registo Criminal do arguido João F....
25) Fls. 1033 – Certificado de Registo Criminal do arguido José S....
26) Fls. 1036 a 1040 – Certificado de Registo Criminal do arguido Joaquim F....
27) Fls. 1128 e 1129 – Facturas juntas com a contestação apresentada pelo arguido José C..., uma da EDP, no valor de €89,69 e com data limite de pagamento em 14.02.2012, e outra do Município de Guimarães, no valor de €26,28 e com data limite de pagamento em 02.03.2012.
28) Fls. 1148 a 1153 – Relatório Social relativo ao arguido José C....
29) Fls. 1170 e 1175 – Relatório Social inerente ao arguido João F....
30) Fls. 1176 a 1179 – Relatório Social inerente ao arguido José S....
31) Fls. 1180 – Certificado de Registo Criminal do arguido João R....
32) Fls. 1181 a 1189 – Certificado de Registo Criminal do arguido José C....
33) Fls. 1216 a 1220 – Relatório Social do arguido Joaquim F....
34) Fls. 1221 a 1225 – Relatório Social inerente ao arguido João R....
35) Fls. 1570 a 1711 – Certidão solicitada ao processo nº 43/10.6GAGMR, do Tribunal de cabeceiras de Basto.
36) Fls. 1751 – Documento denominado “Confissão de Dívida”, cuja junção foi requerida pelo arguido João F..., admitido em audiência de julgamento.
Do apenso A
37) Fls. 39 – Vigilância efectuada em 6 de Outubro de 2010, junto à residência do arguido José C..., onde é vista a chegada de uma viatura com dois indivíduos, que para junto daquela residência, após o que o arguido se dirige ao veículo e entrega algo a um dos ocupantes.
38) Fls. 44 – Informação da Segurança Social, datada de 11.10.2010, de onde resulta que o arguido José C... não consta como beneficiário da segurança social.
39) Fls. 46 – Informação das Finanças, datada de 08.10.2010, de onde resulta que o arguido José C... não tem quaisquer rendimentos declarados.
40) Fls. 49 – Vigilância junto da residência do arguido José C..., efectuada em 09.10.2010, de onde resultou que vários indivíduos se deslocavam em viaturas a casa do arguido, entravam nela e saíam instantes depois, abandonando o local;
41) Fls. 50 – Vigilância junto da residência do arguido José C..., efectuada em 10.10.2010, de onde resultou que vários indivíduos se deslocavam a casa do arguido, entravam nela e saíam instantes depois, abandonando o local;
42) Fls. 51 – Vigilância junto da residência do arguido José C..., efectuada em 15.10.2010, de onde resultou que vários indivíduos se deslocavam em viaturas a casa do arguido, entravam nela e saíam instantes depois, abandonando o local;
43) Fls. 55 – Vigilância junto da residência do arguido José C..., efectuada em 21.10.2010, de onde resultou que vários indivíduos se deslocavam em viaturas a casa do arguido, entravam nela e saíam instantes depois, abandonando o local;
44) Fls. 56 – Vigilância junto da residência do arguido José C..., efectuada em 06.11.2010, de onde resultou que vários indivíduos se deslocavam em viaturas a casa do arguido, entravam nela e saíam instantes depois, abandonando o local;
45) Fls. 74 – Vigilância efectuada em 20.12.2010, junto à residência do arguido José C..., de onde resulta que este arguido recebeu em sua casa por uns instantes Domingos F..., que a autoridade policial conhece como consumidor de heroína, o qual, depois de abandonar a residência referida, foi abordado, na sequência do que lhe foi apreendido 0,20 gramas de heroína, conforme auto de fls. 75, 76 e 77.
46) Fls. 133 – Vigilância efectuada no dia 11.06.2011, junto das instalações de uma fábrica abandonada na zona de C..., Guimarães, onde se verificou que ali se encontravam cerca de 15 indivíduos conhecidos por serem consumidores de estupefaciente; ao arguido José C... chegou ao local, entrou nas instalações daquela fábrica e cerca de oito minutos depois voltou a sair seguido por alguns dos indivíduos que ali se encontravam, após o que abandonou o local.
47) Fls. 134 – Vigilância efectuada no dia 15.06.2011, junto das instalações de uma fábrica abandonada na zona de C..., Guimarães, onde se verificou que ali se encontravam cerca de 15 indivíduos conhecidos por serem consumidores de estupefaciente; ao arguido José C... chegou ao local, entrou nas instalações daquela fábrica e cerca de cinco minutos depois voltou a sair seguido por alguns dos indivíduos que ali se encontravam, após o que abandonou o local.
48) Fls. 135 – Vigilância efectuada no dia 15.06.2011, junto das instalações de uma fábrica abandonada na zona de C..., Guimarães, onde se verificou que ali se encontravam alguns indivíduos conhecidos por serem consumidores de estupefaciente; ao arguido José C... chegou ao local, entrou nas instalações daquela fábrica e, uma vez ali, retirou do bolso das calças algo, após o que efectuou uma troca com os vários consumidores, recebendo dinheiro (notas e moedas) que de imediato colocou no bolso da camisa; abandonou o local de seguida.
49) Fls. 136 – Vigilância efectuada no dia 16.06.2011, junto das instalações de uma fábrica abandonada na zona de C..., Guimarães, onde se verificou que ali se encontravam cerca de 10 indivíduos conhecidos por serem consumidores de estupefaciente; ao arguido José C... chegou ao local, entrou nas instalações daquela fábrica e cerca de dez minutos depois voltou a sair seguido por alguns dos indivíduos que ali se encontravam, após o que abandonou o local.
50) Fls. 137 e 138 – Vigilância efectuada no dia 16.06.2011, junto das instalações de uma fábrica abandonada na zona de C..., Guimarães, onde se verificou que ali se encontravam cerca de 8 a 10 indivíduos conhecidos por serem consumidores de estupefaciente; ao arguido José C... chegou ao local, entrou nas instalações daquela fábrica e, uma vez ali, retirou do bolso das calças alguns “paços” e quando efectuava a venda dos mesmos a dois consumidores que se anteciparam aos outros foi efectuada a abordagem pelos agentes da autoridade; nesse momento, o arguido atirou para o chão os dois pacotes que tinha na sua mão, bem como os consumidores que efectuavam a compra largaram cada um uma nota de €5; efectuou-se, então, revista ao arguido, procedendo-se à apreensão do que este tinha na sua posse.
51) Fls. 139, 140, 141 e 142 - Autos de apreensão subsequentes ao que se passou na vigilância de 16 de Junho de 2011, sendo o último relativo ao arguido José C..., bem como reportagem fotográfica dos objectos apreendidos (fls. 143 a 145).
52) Fls. 149 e 150 – Reportagem fotográfica do local onde se procedeu à vigilância e apreensão em 16.06.2011.
53) Fls. 174 a 184 – Auto de apreensão efectuada na residência do arguido José C..., em 16 de Junho de 2011, bem como papeis ali encontrados e relatório fotográfico dos objectos então apreendidos.
54) Fls. 263 e 264 – Exame pericial ao produto e objectos apreendidos ao arguido José C..., de onde resultou tratar-se, o pó, de heroína e cocaína, bem como resíduos destas duas substâncias nos vários objectos apreendidos.
O arguido João F... pretendeu prestar declarações e, no uso da palavra, referiu que começou a consumir em Novembro de 2011 e, no final desse ano, o arguido José C... perguntou-lhe se podia desenrascar-lhe droga para o seu consumo, ao que o depoente recusou mencionado contudo que o que podia fazer era, quando fosse comprar para si, também lhe trazia, o que efectivamente veio a acontecer, mas apenas umas cinco ou seis vezes.
Este favor ao arguido José C... decorreu entre Janeiro e 13 ou 14 de Fevereiro, altura em que foi detido.
Negou que fosse procurado por traficantes e afirmou nunca ter vendido um pacote a um consumidor, tanto que não queria que, na zona da sua residência, ninguém soubesse que era consumidor.
Nunca entregou heroína ou cocaína a mais ninguém a não ser ao Sr. José C... nas circunstâncias aludidas, sendo certo que era este quem lhe cozia a cocaína.
Confrontado com o resultado da busca e apreensão de que foi alvo, logo retorquiu que dessa vez tinha sido o José C... que lhe havia pedido para trazer também para um amigo dele.
Naquela ocasião trabalhava fazendo uns biscates na construção civil; estava a renovar a casa de um irmão seu, que na semana anterior lhe havia deixado a quantia de €5.000, sendo €1200 para o seu trabalho, €800 para o salário do homem que andava consigo e o restante para pagar uma madeira que estava encomendada e que ia buscar nesse dia.
Os €5.000 que o seu irmão lhe havia deixado eram em notas de €50, de €20, de €10 e uma ou duas de €5.
Quando foram a sua casa foi ele quem entregou a heroína, substancia esta que se destinava ao seu consumo e da sua companheira.
Quando saiu da cadeia, em 2009, só consumiu uma ou duas vezes até Novembro de 2011, altura em que começou novamente a consumir regularmente, assim como a sua companheira (heroína e cocaína).
Nalgumas das situações que referiu em que trazia para o José C..., ia entregar-lhe o produto a casa e, por vezes, até tomava café com ele.
Umas vezes a encomenda era feita pessoalmente e outras pelo telefone, sendo que, nas conversas telefónicas, não falavam em heroína ou cocaína.
Confrontado com o teor da mensagem correspondente à sessão nº 253, de 31.01.2012, confirmou que foi o José C... quem lha mandou, adiantando não saber o que ele pretendia dizer com aquilo.
Estas suas declarações revelaram-se muito incoerentes e inverosímeis, quando combinadas com a demais prova constante dos autos, no que se incluem as transcrições das escutas telefónicas que, na realidade, se dúvidas se suscitassem não deixariam de as dilucidar com clareza.
Tendo em conta as transcrições das sessões 1339 e 1340, de 16.02.2012, verifica-se que, através de mensagem, o arguido José C... diz a João F... que naquele dia não vai ter com ele ao café porque se encontra no porto, mas que no dia seguinte quer tudo como de costume; já na sessão 1237, de 14.02.2012, o arguido José C... pediu ao João F... que, quando fosse ao café, levasse igual ao da última vez, ou seja, “vinte e vinte”.
Daqui se conclui, com meridiana clareza, por um lado, que o habitual fornecimento era de 20 gramas de cada uma das drogas (cocaína e heroína) e que, no dia seguinte (17.02.2012) o arguido João F... iria entregar aquela quantidade ao que a encomendou.
Na posse desta informação, obviamente que a autoridade policial andou bem ao efectuar uma vigilância junto à residência do arguido José C..., na qual detectou o veículo em que se fazia transportar do arguido João F... naquelas imediações, perante o que o interceptaram, procedendo à sua revista, à busca no automóvel e subsequente detenção, tudo como decorre de fls. 328 a 331, sendo de realçar que a quantidade de cocaína e heroína apreendidas no veículo correspondiam, nada mais, nada menos, às que lhe haviam sido encomendadas no dia anterior.
Claro que nas mensagens de encomenda o arguido José C... não refere que é para si e para mais um amigo… como pretendeu fazer crer em audiência João F...!
O arguido José C... não tinha quaisquer rendimentos e lá teria dinheiro para adquirir de uma só vez 40 gramas de drogas duras para seu consumo pessoal…?
A história engendrada por João F... não contou, afigura-se-nos óbvio, com o “surgimento” da autoridade policial que, na posse das mensagens escutadas, se aprestou a fazer-lhe uma profícua espera, com resultados conclusivos e inequívocos.
José A..., da Polícia Judiciária, confirmou em audiência tudo o que acaba de se referir, tendo estado presente na busca realizada e confirmado que, em casa, foi o arguido quem indicou o produto estupefaciente e, quando da detenção, se encontrava a escassos metros da casa de José C....
Com coerência e desinteresse, corroborou o que se extrai dos autos de revista, busca e apreensão de fls. 328 a 331 e 339, evidenciando que já antes havia participado em vigilâncias de idas de João F... a casa de José C..., vigilâncias essa que não ficaram reduzidas a auto por nada de relevante ter sido observado; a primeira vigilância que efectuaram junto à cada de José C... para vigiar João F... foi quando eles falaram ao telefone em 100 gramas de produto.
Em boa verdade, basta atentar nas sessões 952, 953, 954, 958, 984, 986, de 8 e 9.02.2012 para verificar que efectivamente, por mensagens escritas e contacto telefónico verbal, o arguido José C... chegou a encomendar 100 gramas de estupefaciente ao João F..., pelo que não se nos afigura nada estranho que a autoridade policial não mostrasse interesse em efectuar uma vigilância, ainda que sem resultados práticos imediatos.
Analisadas as sessões relativas às conversas telefónicas transcritas, de fls. 75 a 98 do respectivo apenso, mostra-se amplamente comprovada a materialidade descrita na acusação e referente ao arguido João F... (assim como a José C..., como adiante veremos), sendo óbvio que se dedicava à venda a terceiros revendedores de cocaína e heroína, com quem trocava mensagens e conversas telefónicas para alcançar o pretendido desiderato e efectuar as necessárias combinações, usando terminologia própria, quer para a cocaína, quer para a heroína, de molde a não ser detectado pela autoridade policial no caso de escutas telefónicas activas (cfr. sessões 42 a 44, 64, 182, 186, 187, 229, 230, 253, 254, 304, 465, 572, 573, 709, 719, 725, 794, 795, 797, 887, 951 a 954, 958, 984, 986, 1012, 1237, 1339 e 1340).
As conversas que mantinha, o tipo, preço e quantidade de produtos estupefacientes que vendia e destinação dos mesmos (dele conhecida) resultam, assim, inequívocos das escutas telefónicas, corroboradas pelas vigilâncias, revista, buscas e apreensões e bem assim com a prova testemunhal.
Mário V..., da Polícia Judiciária, viria igualmente a corroborar a comunicação da escuta ouvida que conduziu à suspeita da entrega ao arguido José C... e, nessa decorrência, à vigilância e detenção de João F..., realizadas por aquela autoridade policial, facto que também foi confirmado pela testemunha Francisco F... (da Polícia Judiciária).
Atento o teor da várias conversas telefónicas escutadas e as movimentações do arguido João F..., afigura-se-nos claro que, como também se extrai do relatório social, o mesmo não exercia qualquer actividade profissional regular e remunerada que lhe permitisse prover ao seu sustento… muito menos que lhe permitisse andar com a elevada quantia que lhe foi apreendida e se encontrava no seu bolso!.
Claro que, como para tudo há uma explicação, o arguido procurou arranjar uma também para isto e… tal como a demais história que, contra tudo e contra todos, pretendeu veicular … foi dizendo que advinha de um montante em notas que o seu irmão lhe havia deixado para pagar uns trabalhos que lhe andava a fazer numa casa, bem assim para pagar os materiais necessários (madeiras e pladur).
Em abono desta… conveniente, mas não invulgar… tese, surgiu um seu irmão, de nome José R..., que procurou corroborar a versão em causa; infelizmente, para além da pouca credibilidade do seu depoimento (estava cá da Suíça, por acaso, entregou-lhe aquela quantia toda em notas, por acaso, que se destinava a pagar uns materiais e trabalho do seu irmão, por acaso), a posição que assumiu conduziu-o ao cadafalso quando exibiu um documento…à espera da requisição oficiosa… que, não tendo ocorrido, levou a requerimento de junção pela defesa.
Admitido o documento, tudo parecia encaixar-se, não fosse da leitura do mesmo, resultarem incongruências flagrantes com o declarado verbalmente…! Claro que, confrontado com as incoerências, a casa que antes era dos dois… passou a ser só dele… para depois não ser nenhuma das que consta da declaração de dívida que foi feita…imagine-se… para documentar uma entrega de cinco mil euros… em notas.
À testemunha pedia-se que, pelo menos, tivesse atentado na bandeira que hasteou, antes de o vento lhe pagar e, só aí, verificar que não tinha a simbologia pretendida!
Com isto se encerra o capítulo das obras de remodelação numa casa (que não se sabe se existe sequer), encomendadas para justificar a anormal circunstância de um desempregado deter uma quantia elevada em notas no seu bolso, quando se fazia acompanhar de 40 gramas de produto estupefaciente para entregar a um revendedor.
Face ao que resulta da prova produzida e das quantidades de heroína e cocaína que o arguido mobilizava com muita regularidade, atenta a ausência de rendimentos de trabalho, legítima e clarividente se nos afigura a conclusão de que aquele dinheiro se destinava a manter o “negócio”.
Aliás, a sua companheira, Manuela G..., atestando que o seu companheiro também era consumidor, acabou por deixar transparecer a inactividade profissional do mesmo ao longo do seu depoimento e bem assim as relações que ele detinha com José C... (embora alegadamente circunscritas à “cozedura” da cocaína).
O arguido José C... pretendeu igualmente prestar declarações e, no uso desse direito, referiu que, não obstante ter saído da prisão em 2009, continuou a ser consumidor, sendo que até Agosto de 2010 consumida com o que dita, mas a partir desta data é que começou a vender uns pacotes para ganhar o suficiente para ter dinheiro para o consumo do dia seguinte.
Adquiria mais ou menos uma grama diária, que dava para 12 ou 13 pacotes, da qual tirava para o seu consumo e vendia o resto.
Depois arranjou trabalho até Junho ou Julho de 2011 e parou de vender.
Quando vendia fazia-o em Guimarães, numa fábrica velha, nunca tendo fornecido droga a partir da sua residência.
Confirmou a titularidade e condução dos veículos identificados no libelo, bem assim que chegou a vender droga a Vítor O... e Maria O..., cobrando €5 por cada pacote de heroína e €10 por cada base de cocaína.
Não contestou a revista e buscas que lhe foram feitas, referindo que a casa em causa era de seu filho, mas os bens apreendidos encontravam-se no seu (do arguido) quarto.
Na sequência da apreensão de 2011, parou de vender e iniciou um tratamento no CAT com metadona; todavia, cerca de um mês ou dois depois, voltou a ter uma recaída e foi quando conheceu o arguido João F..., o qual lhe começou a arranjar produto estupefaciente.
Uma vez que se encontrava sob uma medida de coacção de apresentações periódicas e não podia sair da freguesia, falou com João F... para lhe arranjar o estupefaciente para o seu consumo, ao que este acedeu, sendo que só por uma vez ou duas é que também lhe pediu para trazer mais quantidade porque um amigo seu lhe pediu; então falou com João F... e este conseguiu arranjar-lhe 20 gramas.
Ulteriormente, mais ou menos em Janeiro voltou a começar a vender; uma pessoa arranjou-lhe quatro gramas de branca (cocaína), altura em que aproveitou e começou de novo a vender.
A cocaína que tinha na última apreensão era a última que tencionava vender, sendo que o produto estupefaciente que lhe foi apreendido estava consigo à consignação, pelo que só o pagaria depois de vendido.
Confirmou todas as apreensões que lhe foram efectuadas e bem assim que muitas vezes pedia a João F... para lhe trazer o produto para o seu consumo verbalmente (quando tomavam café juntos); outras vezes era, efectivamente, por telefone, para o que usou sempre o mesmo número de telemóvel.
Confrontado com o teor das mensagens transcritas e que se referem às 100 gramas (pags. 94 a 97 do apenso de transcrições), referiu que se o João lhe tivesse entregue aquele produto teria intermediado o negócio, sendo certo que tal quantidade de produto estava relacionada e dava com o valor de €3000 a que se alude na sessão 986 (transcrições do apenso – pag. 96).
Naquela altura, faltava dinheiro lá em casa e precisava de algum dinheiro para sobreviver, vendendo a 10 ou 11 pessoas num dia, embora com pouco lucro.
Relativamente ao Parque H..., apenas andou lá a arrumar carros e não a vender heroína ou cocaína.
Admitiu ter vendido heroína e/ou cocaína às pessoas referidas na acusação proferida no apenso A), embora não as reconheça pelo nome.
Este depoimento do arguido emergiu em audiência com contornos manifestamente preparados em função da prova que constava do processo e que, com alguma previsibilidade iria ser necessariamente produzida, entrecortando-se as declarações em função dos elementos de prova que, com mais evidência, haviam sido recolhidos.
O arguido confessou aquilo que, em termos de previsibilidade subjectiva, não valia a pena negar, sendo que, quanto ao mais, a versão que apresentou não se mostra minimamente credível, assomando-se a prova desde logo nas entrelinhas do seu discurso, no que se inclui, contrariamente ao pretendido pelo arguido João F..., o escopo lucrativo do arguido José C..., quando acabou por mencionar que havia falta de dinheiro lá em casa e necessitava de angariar algum para o efeito.
Ora, quanto ao ano de 2010, sabe-se que o arguido não tinha quaisquer rendimentos declarados e não constava como beneficiário da segurança social (fls. 44 e 46 do apenso A), o que corrobora a ideia, também deixada por este nas suas declarações, de que não exerceu qualquer actividade profissional regular durante o período a que se reporta a compra e venda de estupefacientes traslado nas acusações.
A autoridade policial competente efectuou vigilâncias junto à residência deste arguido em 6.10.2010 (fls. 39 do apenso A), 09.10.2010 (fls. 49 do apenso A), 10.10.2010 (fls. 50 do apenso A), 15.10.2010 (fls. 51 do apenso A), 21.10.2010 (fls. 55 do apenso A), 06.11.2010 (fls. 56 do apenso A) e, tal como se extrai do teor dos ditos autos, confirmados em audiência de julgamento pela prova testemunhal, era grande a afluência de indivíduos àquela, onde entravam e saíam instantes depois.
Nessa sequência, em 20.12.2010 foi efectuada vigilância também àquela residência, da qual resultou que este arguido recebeu em sua casa por uns instantes Domingos F..., que a autoridade policial conhece como consumidor de heroína, o qual, depois de abandonar a residência referida, foi abordado, na sequência do que lhe foi apreendido 0,20 gramas de heroína, tudo conforme autos de fls. 74, 75, 76 e 77.
Não obstante vir a confirmar-se com a prova testemunhal produzida e adiante analisada, destes elementos probatórios não restam dúvidas de que o arguido iniciou a actividade de venda na sua própria residência, onde afluíam os vários tóxico-dependentes que o procuravam para adquirir heroína e cocaína.
Esta conclusão encontra igualmente eco probatório na busca e apreensão realizada em 2011 naquela habitação, onde, para além do mais, foram encontrados vários objectos com resíduos de cocaína e heroína e que indubitavelmente se destinavam à preparação, corte, pesagem e acondicionamento de ambos os tipos de droga mencionados, tudo conforme consta dos autos de fls. 174 a 184, que viriam a ser confirmados em audiência pelos participantes nas diligências.
Esta busca e apreensão foi consequente a outras diligências de investigação por parte da autoridade policial, diligências estas igualmente reveladoras do imputado comportamento de José C... e que se traduziram em novas vigilâncias nas instalações de uma fábrica abandonada na zona da C..., Guimarães, cujos autos são bem reveladores e inequívocos, constam de fls. 133, 134, 135, 136, 138 e 138 e acabaram corroborados pelos seus autores em audiência de julgamento; a estas vigilâncias seguiram-se a revista, busca, detenção e apreensões também documentadas a fls. 139 a 142 e 143 a 145.
José A..., da Polícia Judiciária, como atrás se evidenciou quanto ao arguido João F..., participou nas vigilâncias em que este era visado e acabavam também por envolver o arguido José C...; demonstrou conhecimento também da busca efectuada em 2012 a este último arguido, bem assim quanto à situação de toxicodependência do mesmo e da alcunha por que era conhecido “Zé C...”.
Mário V..., da Polícia Judiciária, afirmou conhecer também o arguido José C... em virtude das suas funções, corroborando também a existência de escutas que ligavam o João ao José C..., na sequência das quais o primeiro viria a ser detido junto à residência do segundo, quando lhe ia entregar uma grande quantidade de heroína e cocaína.
Asseverou ter participado nas buscas feitas em 2012 à residência do José C..., confirmando o teor de fls. 462 a 468 e esclarecendo que o cofre era portátil, de pequenas dimensões e que se encontrava no chão, tendo sido o próprio arguido quem o abriu.
Também Francisco F... e Nuno M..., da Polícia Judiciária, demonstraram conhecimentos idênticos aos do seu colega Mário V..., corroborando os factos que este esclareceu no que respeita à actuação de José C..., assim lhe conferindo consistência probatória, sendo certo que, de resto, no que às buscas e apreensões concerne, o arguido não negou a imputação do libelo.
Maria A..., desempregada, declarou conhecer o arguido José C... porque era toxicodependente, tendo já ouvido tratá-lo por “B...”; de forma genérica e sem grande pormenorização, mencionou que um dia estavam nas instalações de uma fábrica velha, altura em que chegaram lá uns homens aos tiros, após o que os levaram todos para o posto e ali obrigaram-nos a dizer e assinar o que queriam e não queriam.
Procurou fazer crer que nunca comprou droga ao arguido José C..., sendo certo, porém, que não deu qualquer explicação para este estar lá no local nas circunstâncias em que a autoridade policial o asseverou, não logrando obter grande credibilidade, até pela forma e postura que adoptou perante o tribunal.
R... Anjos declarou só conhecer José C... de vista, que nunca viu vender e a quem nunca comprou heroína ou cocaína.
José J..., reformado por invalidez, disse conhecer o arguido, também chamado de “B...”, conhecimento este que lhe advinha do facto de estar ligado ao S..., que era traficante). Chegou a consumir com este arguido e a ir a casa dele com o S..., local onde também consumiu juntamente com aquele.
Rui A..., de forma algo hesitante, mas coerente e credível, afirmou-se como antigo consumidor de heroína, cocaína e haxixe, sendo que, em Junho de 2011, encontrava-se na metadona mas às vezes “metia o pé na argola” e comprava umas doses.
Frequentava a fábrica abandonada na C... para consumir e comprava a quem lá estava a vender.
No dia em causa nos autos, chegou lá o NIC e levaram-nos para o posto da GNR. Nessa altura também estava lá o arguido José C..., que era consumidor e também ia para lá consumir, mas às vezes dispensava a um ou a outro.
A si este arguido dispensou heroína e cocaína umas três ou quatro vezes antes da situação em que chegou lá o NIC e foi revistado e detido; pagou-lhe sempre em dinheiro, sendo €5 por uma dose de heroína e €10 por uma dose de cocaína.
Também o viu dispensar heroína e cocaína a outros consumidores que iam às instalações daquela fábrica.
Nesse dia em que o NIC actuou o José C... tinha droga com ele, tendo visto os agentes da autoridade a apanhar os paços do chão; antes de o NIC actuar estavam lá uns 8 ou 10 indivíduos consumidores à espera de alguém que viesse e tivesse para vender, sendo que nesse caso foi o José C... que veio (daqui se começou a inferir o que viria mais tarde a ser evidente: que os consumidores que se encontravam ali estavam à espera de José C..., que para ali se deslocava inúmeras vezes e “dispensava” a quem lá se encontrasse).
O José C... estava muitas vezes lá na fábrica e nunca o viu a consumir nesse local.
Com consistência e congruência probatória surgiu igualmente Domingos B..., actualmente detido do Estabelecimento Prisional de Braga, que esclareceu conhecer o arguido José C..., também chamado de “chulo” ou “B...”, com quem se encontra zangado.
É consumidor desde 1993 e encontra-se preso desde Dezembro de 2010, sendo que, na data da detenção, ainda consumia.
Sabe que o José C... se encontra ligado ao consumo e venda de estupefacientes, tendo-o já visto a fazer ambas as coisas.
Só tinha contacto com ele em casa dele, local onde ia buscar o produto para o seu consumo (heroína e cocaína); ia lá buscar heroína e cocaína todos os dias, sendo meia grama de heroína ao preço de €20 e uma base de cocaína ao preço de €10. Chegou a comprar-lhe uma grama de heroína por €35 e uma grama de cocaína por €50.
O depoente, além de consumir, também vendia heroína e cocaína e, por isso, chegou a comprar ao arguido José C... até 20 gramas; a si este arguido vendia-lhe sempre em casa, para o que lhe telefonava e ia ter a casa dele, onde se deslocavam para um barraco que tem ao lado.
Começou a comprar-lhe a partir de Fevereiro/Março de 2010, mais ou menos até cerca de dois meses antes de ser preso; é que, em 17 de Outubro de 2010, o José C... foi a casa de sua mãe e ameaçou-a, dizendo-lhe que o depoente lhe devia €250 de droga, perante o que a sua mãe lhe deu o dinheiro.
Sabe também que, na ocasião, o José C... tinha que ir todos os dias adquirir droga para consumir e vender.
Não obstante estar zangado com o arguido, as declarações deste depoente afiguraram-se-nos credíveis, quer porque intrinsecamente coerentes, quer porque congruentes com a demais prova produzida, designadamente a resultantes das vigilâncias atrás indicadas e que davam conta da afluência de muitos indivíduos à residência do arguido, onde entravam por instantes e saíam logo após.
José M... afirmou claramente conhecer o arguido José C...; foi consumidor de heroína e, quanto ao acontecimento na C..., o que se passou foi que estava ali à espera de arranjar alguém que partilhasse consigo uma dose porque não se estava a sentir bem.
Não arranjou quem partilhasse consigo porque entretanto surgiu a autoridade policial, logo depôs do José C... ter chegado, autoridade esta que começou aos tiros, acabando por os levar a todos para o posto.
Entretanto veio-lhe parar à mão dinheiro que não era seu.
Nunca comprou ao José C... e até lhe dava bons concelhos porque também tinha um filho.
Ora, este depoimento mostrou-se muito inconsistente e inverosímil, raiando a “brincadeira”, sobretudo se se atentar na demais prova testemunhal produzida em julgamento e até, sublinhe-se, à própria confissão do arguido, que assumiu que efectuava deslocações àquelas instalações para vender os sobreditos produtos estupefacientes.
José F..., também ouvido em audiência, de forma pronta, coerente e credível, revelou conhecer o arguido José C... e que também é tratado por “B...” e “chulo”.
O depoente, em Junho de 2011, consumia e, no dia em causa, foi à fábrica abandonada, onde estavam (lá dentro) à espera do José C..., sendo que logo que ele chegou os agentes da autoridade actuaram. Como o NIC chegou, o José C... não teve tempo de lhes entregar o produto, tendo-o visto a atirar o produto para o chão.
Além disso, chegou a comprar uma vez ou duas ao arguido José C..., sendo heroína e pelo preço de €5 de cada vez; pelo menos uma vez adquiriu heroína ao José C... no Parque H....
Nelson M..., militar da GNR, referenciou que José C... também é conhecido por “chulo” e “B...” e que participou em algumas vigilâncias, bem como na abordagem em Junho de 2011.
Começou por intervir em Outubro de 2010 na vigilância junto à residência deste arguido, verificando que vários consumidores, conhecidos das autoridades como tais, iam àquela residência, quer de dia, quer de noite, entravam e saíam minutos depois, recebendo-os o arguido nas escadas, no patamar de um anexo.
Muitas das vezes em que isto acontecia a esposa do arguido também se encontrava em casa.
Várias outras vigilâncias foram feitas àquela residência tendo como participantes outros militares da GNR, vigilâncias estas que terminaram por volta de Dezembro de 2010, sendo que, numa delas, o indivíduo que saiu da referida habitação foi abordado pelos agentes, que lhe apreenderam uma dose de heroína.
Em Junho de 2011 esteve presente nas diversas vigilâncias que realizaram na C..., as quais decorreram, quer de manhã, quer à tarde.
Nalgumas foram vistos vários consumidores a deslocarem-se ao local e entrarem, após o chegava também o José C... que ia para dentro, não sendo possível visualizar o que efectivamente acontecia.
Em outras ocasiões, as vigilâncias foram feitas a partir do interior das próprias instalações e, nestes casos, era possível observar a venda directa do José C... aos consumidores (entrega e recebimento de dinheiro).
Naquela fábrica costumavam estar habitualmente entre 10 a 15 consumidores e o arguido José C... deslocava-se para lá num Ford Fiesta.
No dia da abordagem estava ele e o Natálio dentro da fábrica; quando o José C... entra na fábrica e está a tirar dois pacotes para entregar a dois indivíduos que tinham dinheiro na mão intervieram, perante o que este arguido logo deitou os dois pacotes para o chão.
Neste dia estariam lá cerca de 10 pessoas à espera do José C... para consumirem.
Natálio V..., militar da GNR, igualmente asseverou as alcunhas por que era conhecido o arguido José C... e a participação em diversas vigilâncias em Junho de 2011, numa fábrica da C... – cujas instalações estão abandonadas; umas vezes viram-no a entrar na fábrica, sendo que da vez que esteve no interior viram-no a entregar estupefaciente directamente aos consumidores.
No dia da abordagem, intervieram quando José C... ia entregar dois pacotes a dois consumidores, intervenção essa perante a qual ele atirou, de imediato, os pacotes para o chão.
Àquele local acorriam cerca de 12 a 15 consumidores, sendo que em algumas situações um dos consumidores pegava no dinheiro de 3 ou 4 e dirigia-se ao José C... e adquiria-lhe para si e para os outros.
Normalmente os consumidores chegavam primeiro e aguardavam pela chegada do referido arguido.
Pelo que se apercebeu de tudo o que observou, o arguido José C... vendia pacotes de heroína a €5.
O depoimento destas duas últimas testemunhas deu cabal consistência aos autos concernentes às vigilâncias efectuadas e, bem assim, aos autos de revista e busca que foram elaborados, já anteriormente assinalados e, para além disso, confessados pelo visado.
Destas diligências extraiu-se igualmente a segura conclusão de que os indivíduos que se encontravam no local, no dia da abordagem, em Junho de 2011, eram consumidores de heroína e/ou cocaína e estavam à espera do arguido para lhe adquirirem produto para o seu consumo; tais indivíduos foram, subsequentemente à abordagem, identificados, nos termos dos autos que então foram redigidos.
Domingos F..., que era consumidor de heroína e afirmou conhecer o arguido José C..., pretendeu fazer crer que nunca lhe adquiriu heroína, depoimento este que não mereceu qualquer credibilidade, face ao que de contrário se extrai, com meridiana clareza, da vigilância de 20.12.2010 (fls. 74).
Vasily B... referiu que, na situação do dia 16 de Junho de 2011, ia àquele local, com o Miguel, à procura de heroína, sendo que, logo que entraram na fábrica, apareceram os agentes, pelo que nem chegou a dar dinheiro ou a comprar.
Hugo C..., colega da testemunha Vasily B... e com quem, em Junho de 2011, trabalhava, referiu que lhes foi dito que podiam encontrar heroína na fábrica abandonada, pelo que se deslocaram lá e quando ali chegaram já estava “muita gente” à espera do traficante.
Depois chegou a autoridade policial e, por isso, nem conseguiu comprar nada.
Vítor O... também confirmou que conhecia o arguido José C...; era consumidor de drogas e conhece-o desde esse tempo.
Asseverou que foi interceptado pela GNR numa fábrica abandonada, tendo sido levado para o Posto a fim de ser ouvido.
Aquela fábrica era o local onde toda a gente ia consumir e, no dia da abordagem, estavam lá alguns consumidores e, aquando dos tiros, viu que o “Sr. José C... Chulo” também estava no chão.
De todos estes elementos afigura-se-nos clara a conclusão de que José C... efectivamente se dedicava à venda de heroína e cocaína a consumidores, actividade que iniciou em data não concretamente apurada, mas que exercia pelo menos a partir de Março de 2010, data esta que se retirou do atrás citado depoimento de Domingos B....
A tudo isto viria a acrescer o que, na sequência das vigilâncias efectuadas junto à residência deste mesmo arguido, a fim de aferir dos seus encontros com João F... (tal como referido na análise dos factos a este último atinentes), foram requerida, autorizadas e obtidas escutas telefónicas, cujas transcrições, de uma forma manifesta, revelam bem a prossecução da mesma actividade ainda no ano de 2012.
De acordo com as transcrições das sessões 1339 e 1340, de 16.02.2012, verifica-se que, através de mensagem, o arguido José C... diz a João F... que naquele dia não vai ter com ele ao café porque se encontra no porto, mas que no dia seguinte quer tudo como de costume.
Na sessão 1237, de 14.02.2012, o arguido José C... tinha pedido ao João F... que, quando fosse ao café, levasse igual ao da última vez, ou seja, “vinte e vinte”.
Como já atrás se expendeu, legítima se nos afigura a conclusão, por um lado, de que o habitual fornecimento era de 20 gramas de cada uma das drogas (cocaína e heroína) e de que, no dia seguinte (17.02.2012) o arguido João F... iria entregar aquela quantidade ao que a encomendou.
Esta informação conduziu à vigilância junto à residência do arguido José C... em que se detectou o veículo em que se fazia transportar o arguido João F... naquelas imediações, perante o que o interceptaram, procedendo à sua revista, à busca no automóvel e subsequente detenção, tudo como decorre de fls. 328 a 331, sendo de realçar que a quantidade de cocaína e heroína apreendidas no veículo correspondiam, nada mais, nada menos, às que lhe haviam sido encomendadas no dia anterior.
José A..., da Polícia Judiciária, como vimos, esclareceu tudo isto; esteve presente na busca realizada e confirmou que, em casa, foi o arguido quem indicou o produto estupefaciente e, aquando da detenção, se encontrava a escassos metros da casa de José C....
Atestou o que traslado ficou nos autos de revista, busca e apreensão de fls. 328 a 331 e 339, evidenciando que já antes havia participado em vigilâncias de idas de João F... a casa de José C..., vigilâncias essa que não ficaram reduzidas a auto por nada de relevante ter sido observado; a primeira vigilância que efectuaram junto à casa de José C... para vigiar João F... foi quando eles falaram ao telefone em 100 gramas de produto.
A transcrição das sessões 952, 953, 954, 958, 984, 986, de 8 e 9.02.2012 permite assegurar que efectivamente, por mensagens escritas e contacto telefónico verbal, o arguido José C... chegou a encomendar 100 gramas de estupefaciente ao João F..., pelo que não se nos afigura nada estranho que a autoridade policial não mostrasse interesse em efectuar uma vigilância, ainda que sem resultados práticos imediatos.
Analisadas as sessões relativas às conversas telefónicas transcritas, de fls. 75 a 98 do respectivo apenso, mostra-se amplamente comprovada a materialidade descrita na acusação e referente ao arguido José C... (assim como a João F...), sendo óbvio que se dedicava à aquisição de consideráveis quantidades de heroína e cocaína para venda a consumidores, sempre usando terminologia própria, quer para a cocaína, quer para a heroína, de molde a não ser detectado pela autoridade policial no caso de escutas telefónicas activas (cfr. sessões 42 a 44, 64, 182, 186, 187, 229, 230, 253, 254, 304, 465, 572, 573, 709, 719, 725, 794, 795, 797, 887, 951 a 954, 958, 984, 986, 1012, 1237, 1339 e 1340).
As conversas que mantinha, o tipo, preço e quantidade de produtos estupefacientes que vendia e destinação dos mesmos (dele conhecida) resultam, assim, inequívocos das escutas telefónicas, corroboradas pelas vigilâncias, revista, buscas e apreensões e bem assim com a prova testemunhal.
Mário V..., da Polícia Judiciária, viria igualmente a corroborar a comunicação da escuta ouvida que conduziu à suspeita da entrega ao arguido José C... e, nessa decorrência, à vigilância e detenção de João F..., realizadas por aquela autoridade policial, facto que também foi confirmado pela testemunha Francisco F... (da Polícia Judiciária).
O manancial probatório carreado traduziu bem a imagem global da actuação habitual de José C..., sendo evidente que, face às suas movimentações e, inclusivamente à medida de coacção a que esteve sujeito, não tinha nenhuma actividade profissional regular, pelo que não era detentor de qualquer fonte de rendimento (que não a de venda de produtos estupefacientes).
Como derivou das suas próprias declarações, alturas existiram em que o dinheiro no agregado era pouco e precisava de angariar algum para contribuir para os gastos da casa, razão por que parece inquestionável que o dinheiro que, em ambas as detenções, lhe foi apreendido se destinava e/ou era produto da actividade de tráfico a que se dedicava.
De resto, face à ausência de rendimentos, algum dinheiro tinha que ter, mais não fosse para adquirir para o seu consumo, não sendo minimamente credível, de acordo com as regras da experiência comum, que a sua mulher e filho lhe entregassem montantes atendíveis em notas para pagar contas e ou para guardar no seu quarto.
É que, como se nos afigura óbvio, um viciado em heroína e cocaína, sem qualquer fonte de rendimento, todo o dinheiro que lhe esteja acessível gasta naquele vício. E, dúvidas não restarão, os familiares de José C... sabiam desta sua situação.
Acresce que a história de ir pagar as contas…, bom…, não passa de uma história passada, já que passadas estavam, aquando da apreensão, as datas limite de pagamento das contas cujas facturas foram juntas aos autos com a contestação (fls. 1128 e 1129)…!
Face a tal, caiu no descrédito o testemunho de João C..., filho de José C..., que procurou sustentar esta tese e ainda a de que o dinheiro era também resultante do seu trabalho e de sua mãe. O que não explicou é porque deixava aquele dinheiro em notas (pequenas, veja-se) a uma pessoa que sabia não ter qualquer fonte de rendimento e estava há muitos anos dependente de drogas duras.
A fragilidade deste testemunho ficou ainda mais evidente aquando da contra-instância, em que se perdeu a pouca consistência que já se antevia e se quedou em respostas lacunosas e evasivas.
Os arguidos José S..., também conhecido por “B...”, e Joaquim F..., também conhecido por “Quim B...”, não prestaram declarações em julgamento, o primeiro porque requereu a realização da audiência na sua ausência e o segundo porque fez uso do direito ao silêncio.
Contudo, a prova dos factos que constavam na acusação assentou em bases sólidas, designadamente decorrendo das vigilâncias efectuadas durante a investigação, das escutas telefónicas que, a partir de determinado momento, foram solicitadas e autorizadas, bem como das buscas e apreensões efectuadas, tudo corroborado testemunhalmente pelas diversas pessoas ouvidas.
Fernando F..., militar da GNR, esclareceu que a sua intervenção ocorreu num processo que corria termos em Cabeceiras de Basto, no qual vieram a apurar que o indivíduo que ali investigavam por suspeita de tráfico de estupefacientes estava ligado ao aqui arguido Joaquim F....
Naqueles outros autos, o investigado era Feliciano Pereira, que, ouvido na presente audiência, não carreou elementos relevantes para a descoberta da verdade material.
No âmbito do processo de Cabeceiras de Basto, Fernando F... efectuou um seguimento a Feliciano P...e constatou que este, no dia 30.05.2011, se encontrou com o arguido Joaquim F... no “Campo P...”, onde terá ocorrido uma transacção de produto estupefaciente (heroína), tal como decorre do auto de vigilância cuja incorporação foi ordenada no âmbito do julgamento e se encontra certificado a fls. 1570 e ss.
Pese embora a diminuta relevância probatória desta diligência, dado o respectivo conteúdo e circunstâncias processuais em que se inseriu, a demais prova produzida foi cabal no que respeita à demonstração da actividade e comportamentos imputados a ambos os arguidos agora em referência.
José A..., da Polícia Judiciária, assumiu-se como tendo sido o titular do processo durante a investigação e esclareceu que, na fase inicial, andaram aqui na zona de Fafe e junto à residência do arguido Joaquim, percebendo, desde logo, que este não exercia qualquer actividade profissional regular, saindo de casa pelas 10 ou 11 horas da manhã e dirigindo-se muitas vezes para o Campo de Futebol X, para Quinchães, Praia Fluvial e Cemitério R..., entre outros, locais estes que, de acordo com a sua experiência profissional, são habitualmente frequentados por consumidores que procuram produto para sustento do seu vício.
Participou em muitas vigilância às movimentações do arguido Joaquim, que lavrou nos competentes autos, sendo que, após terem recolhido o número de telefone pelo mesmo utilizado junto de clientes, passaram a deter escutas telefónicas que lhes permitiram comprovar a actividade de tráfico a que se dedicava, marcando encontros e comparecendo nos locais combinados com os seus clientes consumidores, decorrendo de várias intercepções – transcritas no apenso respectivo – a própria identificação dos intervenientes.
Durante a investigação, Joaquim F... mudou pelo menos três vezes de veículo, andando primeiro num Citroen C4, depois num Jeep Kia também num Honda Civic, viaturas estas que se encontravam sempre registadas em nome da sua mulher, ou pelo menos da pessoa com quem vivia.
Geralmente este arguido vendia a consumidores heroína e cocaína, em quantidades que, por regra, variavam entre as 2 e as 5 gramas, usando sempre termos próprios para se referirem a cada uma daquelas substâncias, percebendo-se dos telefonemas interceptados que até se zangava quando os consumidores que o contactavam falavam em termos mais claros.
Não obstante o cuidado que tinha nas conversas e a suposição de poder estar a ser escutado, Joaquim F... manteve sempre o mesmo número e só na parte final da investigação é que começou a utilizar outro, cujas conversações não se mostraram, todavia, relevantes para a descoberta da verdade.
Foi, aliás, na sequência das escutas telefónicas ao Joaquim que acabaram por obter prova relativamente aos demais arguidos, já que inicialmente era aquele o único investigado.
O arguido José S... acabou, outrossim, por ser “apanhado” nas intercepções telefónicas, das quais se conclui (como adiante se analisará) que era fornecido pelo Joaquim F....
Aliás, a situação do pavilhão, que deu origem à dispersão da investigação e, nessa sequência, à detenção do Joaquim e às buscas e apreensões derivou ainda do conteúdo das escutas telefónicas.
Ismael S..., militar da GNR, declarou conhecer o arguido Joaquim em virtude das suas funções, referindo que, em determinada altura (Maio de 2011) lhe comunicaram que um tal de Feliciano se ia deslocar ao fornecedor e então foi efectuar o respectivo seguimento, verificando que aquele vinha para Fafe; quando estavam a chegar à “Pica” viram que o Feliciano se encontrou com o Joaquim e, pelos movimentos de ambos, efectuou-se uma transacção (fls. 1586 e ss).
Mário V... e Francisco F..., ambos da Polícia Judiciária, salientaram a existência de diversas vigilâncias ao arguido Joaquim que, porém, na maior parte não tiveram os resultados pretendidos, uma vez que o vigiado optava por circular por vias que não facilitavam aquela tarefa e, por isso, as condições em que as entregas telefonicamente combinadas eram feitas não podiam ser observadas facilmente.
Esta asserção encontra eco nas variadas vigilâncias documentadas nos autos, em que se efectuava o seguimento do arguido Joaquim, ao volante de mais do que um veículo automóvel, mas depois não era possível visualizar directamente a entrega ou realização de qualquer concreta transacção; estamos a referir-nos, além do mais, às vigilâncias de 16.09.2010 (fls. 17), 24.01.2011 (fls. 23 e 24), e 03.04.2011 (fls. 30).
Nuno M..., da Polícia Judiciária, mostrou conhecer, da investigação em que participou, os arguido Joaquim F... e José S..., esclarecendo que as vigilâncias em que interveio foram sempre ao primeiro dos referidos arguidos, acontecendo muitas vezes que tentavam ver a existência de uma transacção, sem que tal fosse possível, uma vez que as zonas não o permitiam, sendo certo porém que, apesar de se não verem os encontros ou as entregas, as movimentações detectadas eram compatíveis com as informações transmitidas por quem procedia à audição das escutas em tempo real.
Chegou a ver o arguido Joaquim a deslocar-se a vários sítios conhecidos como ponto de encontro para consumidores de estupefacientes, seguindo ele quase sempre sozinho e utilizando mais do que uma viatura (Honda, Kia e Citroen).
Confirmou ainda a vigilância efectuada em 30.01.2012 (fls. 233), junto ao “Café S...”, onde observaram o arguido José S...a chegar num BMW e recolher o arguido Joaquim, seguindo ambos para a Zona Industrial S..., em Fafe.
Esta vigilância foi efectuada tendo por base as intercepções telefónicas que deram origem às sessões 1010 e 1019, de fls. 24 e 25 do apenso respectivo, em que ambos os identificados arguido combinam encontrar-se no café, extraindo-se da primeira das transcrições a suspeita/conhecimento de que o telefone podia estar sob escuta.
Sérgio S..., da Polícia Judiciária, deu conta igualmente das vigilâncias que foram efectuadas ao Joaquim F..., verificando-se que frequentava muito o “Café S...” e marcava encontros em locais onde era difícil o seguimento.
Não obstante a dificuldade que sempre foi sentida na obtenção de resultados durante as vigilâncias, a verdade é que, em duas delas, tal não sucedeu, tendo sido visionado o arguido Joaquim e concretizar uma transacção previamente combinada por telefone.
É o que resulta de fls. 18 e 19, relativas a vigilância efectuada em 11.01.2011, que se iniciou junto à residência do arguido Joaquim F..., onde ficou a constar que este, seguindo numa viatura todo-o-terreno, Kia Sportage, com a matrícula 53-69-..., andou por várias artérias, até que, pelas 14.35 horas, parou junto de um veículo de cor preta, da qual se apeou um sujeito jovem, que se dirigiu à viatura do arguido, havendo entre ambos uma troca.
Igualmente em 19.01.2012, foi efectuada vigilância com recurso a escutas telefónicas em tempo real, onde de constata que o arguido Joaquim F..., na sequência de combinação telefónica para o efeito, segue no veículo de matrícula 56-63-... e encontra-se, numa praia fluvial, com um indivíduo que vem na direcção contrária ao volante de um automóvel, parando ambos lado a lado e efectuado uma troca (fls. 195 e 196).
Confrontado o teor da transcrição da escuta que esteve na origem da última destas vigilâncias e o resultado da mesma, dúvidas não restam de que se tratou de uma combinação seguida de encontrão para entrega de produto estupefaciente, designadamente heroína ou cocaína (cfr. sessões 58 e 60, de fls. 8 do apenso de transcrições).
Relativamente à prova da actividade de venda de heroína e cocaína por parte de Joaquim F..., os depoimentos testemunhais de consumidores de heroína e cocaína mostraram-se profícuos, inserindo-se neste âmbito o produzido por Virgílio F..., consumidor de heroína e cocaína há uns anos, que, pese embora tenha evitado respostas claras, acabou por deixar nas entrelinhas ter sido fornecido pelo sobredito arguido.
Referiu que às vezes telefonava para adquirir estupefaciente e era aviado, em Fafe, por um indivíduo chamado “Quim” à beira do cemitério R... e em Quinchães.
Porque afirmou nunca ter adquirido aos arguidos presentes na sala, acabou por ser confrontado com o teor das transcrições das escutas em que o seu número foi detectado, nomeadamente com a sessão 3257, de fls. 57 do apenso respectivo, perante o que inflectiu o discurso, passando a asseverar que quando lhe disseram para ligar para o Quim B... só foi duas ou três vezes e não o conhecia bem.
O seu amigo Peixoto, consumidor de heroína e cocaína, também ligava para alguém conhecido por Quim B..., sendo certo que ele próprio (o depoente), por vezes, utilizava o telefone do Peixoto ou do Eduardo para ligar, pagando €25 por meio grama de cocaína e €20 por meio grama de heroína.
Paulo P..., consumidor de heroína há mais de dois anos, referiu que antes do actual já teve vários números de telemóvel e começou o seu depoimento tentando fazer crer que nunca havia adquirido heroína ao Joaquim F..., designadamente declarando que, em Casadela, comprava a um rapaz de Mondim e, algumas vezes, o Quim B... vinha com esse rapaz, sendo certo que, em algumas das ocasiões, ambos vinham do Audi do Quim, que era quem conduzia.
Nas chamadas telefónicas que fazia para combinar os encontros utilizava expressões como “branco” ou “tinto”, referindo-se, respectivamente a cocaína e a heroína; por vezes também usava as designações de “claro”, “dia”, “escuro” e “noite”.
Confrontado com o teor da sessão nº 3656, de fls. 61 do apenso de transcrições, acabou por se recordar desta conversa, conversa esta que ao tribunal parece bastante esclarecedora, o mesmo tendo ocorrido, a título de exemplo, com as conversas a que se reportam as sessões 3719 de fls. 63 e 4098 de fls. 65 (do apenso referenciado), perante o que até esclareceu que o caminho de terra mencionado na conversa era o tal sítio em Casadela.
Relativamente às duas sessões de fls. 66, ambas com o número 4146, acabou por evidenciar que quando dizia quatro metades estava a referir-se a quatro meias gramas de heroína.
Depois de muitas hesitações e confrontações, a memória pareceu avivar-se a esta testemunha acabou por deixar evidente que “as vezes podia comprar ao Quim”, uma ou duas vezes à noite; o Quim às vezes até aldrabava nas quantidades, mas isso também outros faziam; porém também aconteceu de o depoente lhe dar menos dinheiro do que o que era suposto.
Comprava a heroína a €20 a meia grama e, quando outros consumidores lhe pediam para levar, a cocaína a €25 a meia grama.
José V..., referiu em audiência que já foi consumidor, tendo deixado o consumo no princípio de 2011, após o que teve uma recaída no final de 2011 e início de 2012, altura em que lhe arranjaram um número de telefone para combinar a entrega e foi adquirir “uma pedra”.
Ligou do seu número, que era o 960 163 238, combinou o encontro e adquiriu meia grama de cocaína no “Campo P...”; havia alturas em que dizia 2dia” ou “tinto”, conforme pretendesse referir-se a cocaína ou heroína.
Apesar do discurso lacunoso e aparentemente desmemoriado, o conteúdo das suas declarações foi de encontro àquilo que ficou traslado na transcrição das sessões 428, 433 e 434, de fls. 18 e 18 do respectivo apenso.
José M..., que se assumiu consumidor de heroína até Março/Abril de 2012 e frequentador do “Café S...”, onde encontrava o arguido Joaquim, era portador do telemóvel com o número 960 096 972, que usava para encomendar aquele produto estupefaciente a este arguido, tal como se colhe, entre outras, das sessões 450, 1282, 1570 e 1695 (fls. 19, 27, 32 e 35 do apenso de transcrições).
Segundo esta testemunha, que lhe ligava sempre do mesmo número, o arguido Joaquim vendia, no mínimo, meia grama, não falando abertamente em heroína e os locais que combinavam para a entrega não eram sempre os mesmos, sendo indicados pelo arguido.
Começou a comprar a Joaquim F... há três ou quatro anos, embora também adquirisse a outros vendedores; alturas houve, porém, em que o seu único fornecedor era este arguido, a quem adquiria pelo menos duas ou três vezes por semana e meia grama de cada vez.
O testemunho acabado de evidenciar permitiu ao tribunal situar por aproximação, mas com segurança, o período em que o arguido se dedicou à venda de heroína e cocaína, mormente o ano em que seguramente tinha iniciado aquela actividade.
Também R... Castro, consumidor esporádico de cocaína e heroína, assumiu que adquiriu tais produtos a Joaquim F..., para o que entrava em contacto com o mesmo e era combinado o encontro; sempre que o procurou para adquirir heroína e cocaína foi mediante prévio contacto telefónico.
No que respeita ao tipo de produtos comercializados, quantidades, forma e locais de entrega, clientela (consumidores e revendedores) e intensidade das vendas por parte de Joaquim F..., além de tudo o explanado, baseou-se o tribunal no teor das escutas telefónicas transcritas no apenso respectivo (fls. 7 a 67), transcrições estas que, revelando a maior parte dos factos imputados no libelo, não deixaram margem para qualquer dúvida que pudesse subsistir.
Por outro lado, a conexão do arguido José S...ao tráfico de estupefacientes e ao arguido Joaquim F... adveio, como já aflorado, das escutas telefónicas, da prova testemunhal e das apreensões efectuadas, com a subsequente recolha de vestígios lofoscópicos.
António S..., militar da GNR, atestou em audiência ter abordado o arguido Joaquim F... no dia 13.02.2012, junto ao pavilhão industrial em Fafe; estavam a fazer uma vigilância a esse pavilhão por causa de uma denúncia de que ali estaria a ser desmantelado um veículo que tinha sido roubado uns dias antes, altura em que o arguido Joaquim apareceu lá e foi abordado.
Também se encontrava presente durante as buscas feitas a esse pavilhão (fls. 489 a 508), pese embora não na qualidade de buscador, sabendo que havia lá uma bola com heroína, bem como cocaína e material de corte, três balanças de precisão, tesouras com vestígios e outros objectos com vestígios.
Foi chamado o NAT de Braga para efectuar inspecção ao local, cujos elementos recolheram impressões digitais.
Na ocasião, o Sr. Artur, dono do pavilhão, disse que o contrato de arrendamento estava em nome de um Samuel, mas o arrendatário era o José S....
Estes factos viriam depois a ser confirmados por António R..., militar da GNR que conhece ambos os arguidos (José S... e Joaquim F...) e asseverou ter estado igualmente na vigilância ao pavilhão em causa, no dia 13.02.2012, vigilância esta que foi montada cerca das 23.30 horas, sendo audível barulho de rebarbadoras e bate chapas no interior do armazém.
Durante a vigilância aperceberam-se da saída do José S... numa viatura com mais três indivíduos, viatura essa que, quando regressou, já só transportava dois indivíduos, vindo o José S... ao volante, tendo ambos voltado a entrar no pavilhão e ali permanecendo cerca de 20 a 30 minutos, saindo novamente, agora numa carrinha Opel Vivaro branca.
Mais tarde, foi o depoente que fez a abordagem ao arguido Joaquim F..., que se deslocou ali ao local e entrou no recinto exterior do armazém. Foi abordado no exterior do armazém e revistado, tendo na sua posse cerca de meia grama de heroína e meia grama de cocaína.
O armazém pertencia ao Sr. Artur, o qual lhes referenciou que tinha arrendado aquele imóvel ao Sr. Samuel (que era quem figurava no contrato), mas que quem tinha feito o arrendamento foi o arguido José S....
No mais, corroborou o que resulta dos mencionados autos de busca e apreensão, insertos a fls. 489 e ss.
Pedro T..., militar da GNR, também confirmou que o arguido José S... era também conhecido por “B...”, tendo participado nas buscas realizadas no pavilhão industrial em que se suspeitava servir para desmantelamento de carros, local onde, numa sala ao lado, encontraram roupa e produto estupefaciente (heroína e cocaína) e produtos vulgarmente utilizados para a sua preparação; na sequência dessas buscas foram recolhidos vestígios lofoscópicos, além do mais, numa das embalagens encontradas e com produto estupefaciente, tudo conforme resulta dos autos então lavrados e já assinalados.
Artur F..., comerciante de produtos agrícolas, demonstrou conhecer o arguido José S..., que apelidou de “russote”, e esclareceu ser dono (sócio da sociedade proprietária) do pavilhão onde efectuaram as buscas e apreensões, sito em S....
Aquando do pedido de arrendamento foi abordado por dois indivíduos, sendo um deles o arguido José S..., indivíduos estes que lhe deixaram ficar um Bilhete de Identidade para fazer o contrato negociado, Bilhete de Identidade este que não era daquele arguido mas do outro indivíduo.
Na altura deram-lhe logo €600, entrega esta que foi feita pelo José S....
O contrato ficou em nome do outro, mas quem lhe falou se arrendava foi o José S....
Na verdade, apercebeu-se que falaram entre eles e o José S... disse ao Samuel que o contrato não podia ficar em seu nome e que tinha que ser no nome dele (Samuel), o que efectivamente veio a acontecer (cfr. fls. 514 a 517).
Ora, que assim foi ressalta também clarividente da análise da sessão nº 164 (fls. 105 do apenso), onde alguém da EDP liga para o número de telefone do arguido José S... e pergunta se é o Samuel P... S..., ao que o arguido responde; percebe-se, da conversa, que se trata de funcionários da EDP que se haviam deslocado ao pavilhão para ver um disjuntor e um contador e ligam para o número que lhes havia sido fornecido como sendo o interessado que solicitou o serviço, número esse que pertence, como vimos, ao arguido mas, provavelmente, o contador estava em nome do Samuel já que figurava no arrendamento como o inquilino do imóvel.
Tendo em conta este manancial probatório que conexiona o arguido José S...ao pavilhão objecto da busca e apreensão, de onde havia entrado e saído na noite que antecedeu tais diligências e relativamente ao qual negociou um contrato de arrendamento que, por conveniência, ficou em nome de outrem, afigura-se-nos, face ao resultado do exame pericial aos vestígios lofoscópicos encontrados no estupefaciente ali apreendido, legítima a conclusão de tal produto (envolvido em fita cola), bem como os demais utensílios encontrados com vestígios de heroína, haverem ali sido por ele manuseados e deixados (fls. 807 a 812 e 852).
De resto, a presença das impressões digitais deste arguido na fita cola que envolvia a heroína não deixa margem para dúvidas de que essa substância foi manuseada por ele, pelo que, sabendo-se da sua sobredita ligação ao local buscado, a conclusão a que se chegou antevê-se lógica e segura.
Mas, se dúvidas restassem, elas seriam dilucidadas por recurso às escutas telefónicas, transcritas no apenso respectivo, que estabelecem a ligação entre o arguido José S... e o arguido Joaquim e esclarecem o motivo por que este último se deslocou ao local durante a noite, onde viria a ser abordado pelos agentes da autoridade.
Sabendo-se que o dispositivo de vigilância foi montando cerca das 23.30 horas do dia 13.02.2012 e que, durante a mesma, José S...saiu com outros indivíduos e voltou a regressar apenas com um deles, ausentando-se cerca de 20 a 30 minutos depois, não é de estranhar o telefonema que fez ao arguido Joaquim, pelas 02.19 horas do dia 14.02.2012, que se encontrava no “Café S...” e a quem pediu expressamente para passar “onde foste comigo à bocado”, a fim de ver “se está tudo bem”, “se não vês lá ambiente”.
Tendo o arguido Joaquim ido ao pavilhão e ali sido abordado pelos agentes da autoridade policial, igualmente se não estranha que, cerca de 15 minutos depois, José S... ligue a Anabela e tenha com ela a conversa transcrita na sessão 245 (fls. 107), dizendo. Além do mais, “aconteceu uma merda, meu”.
Tudo aponto no indicado sentido e se harmoniza em conclusões probatoriamente isentas de dúvidas razoáveis; o arguido José S... sabia bem o que tinha deixado no pavilhão e tinha motivos para se preocupar com o ambiente que ali pudesse existir.
Acresce que o envolvimento deste arguido na actividade de tráfico a que igualmente se dedicava o Joaquim F... emerge ainda da conversa telefónica gravada em 11.02.2012 e transcrita a fls. 104 do apenso (sessão 103),cujo teor, sem necessidade de grandes considerações, se revela elucidativo.
João R... usou da faculdade de não prestar declarações.
Todavia, a prova carreada para os autos em audiência de julgamento mostrou-se cabal para dar como assente a generalidade da facticidade que lhe vinha imputada, derivando essencialmente dos testemunhos ouvidos, das vigilâncias efectuadas e das conversas telefónicas escutadas.
Rogério B..., de forma sincera e pronta, revelou conhecer este arguido, bem assim que foi consumidor de cocaína até há cerca de 3 ou 4 meses, consumo esse no âmbito do qual ligava ao R... para este lhe arranjar, ao que ele acedia, tendo inclusivamente chegado a consumir juntos.
Normalmente ligava ao R... e este, si tivesse, arranjava-lhe, meia ou uma grama de cocaína, dependendo da situação; pagava €25 por meia grama e ter-lhe-á adquirido umas 20 vezes, em algumas das quais se fazia acompanhar do seu amigo Miguel que também adquiria para o seu consumo.
O R... começou a desenrascá-lo há um ano e pouco atrás, período durante o qual aquele mudou de número de telemóvel, mas informava-o do novo.
José A..., da Polícia Judiciária, explicou que, na sequência das escutas ao telemóvel de Joaquim F..., aparece o arguido João R..., a quem aquele entregava cocaína à consignação.
O R..., de acordo com o que se depreende das escutas, tinha pessoas certas a pedir-lhe o fornecimento e que formavam um núcleo relativamente pequeno, sendo ele próprio também consumidor dessa substância.
Telma M..., revelando o seu número de telemóvel e afirmando conhecer o arguido R..., esclareceu que vive com a testemunha Adriano e que foi consumidora de cocaína, no âmbito do que por vezes pedia a este arguido para lha arranjar, o que efectivamente ocorreu diversas vezes (mais de meia dúzia).
Ela e o seu companheiro dirigiam-se ao R... e este, por seu turno, ia buscar a outra pessoa, sendo as encomendas feitas através de contacto telefónico.
Adriano C..., companheiro da anterior testemunha, confirmou o que esta havia já relatado, referenciando que telefonavam ao R... para este lhes arranjar cocaína, o que acontecia duas ou três vezes por semana e, normalmente, meia grama.
O encontro para a entrega era junto do local de trabalho do arguido e outras vezes na sua própria (do depoente) casa.
Sérgio S..., da Polícia Judiciária, assegurou ter participado numa das vigilâncias realizadas ao arguido R..., durante a qual este se encontrou com um indivíduo que seguia num Opel Corsa, a quem terá entregue produto estupefaciente.
As vigilâncias realizadas pela autoridade policial durante a investigação, com relevância probatória, encontram-se documentadas nos autos e tiveram na sua base a audição das escutas telefónicas em tempo real, das quais se retirava a marcação de encontro para entrega da cocaína pretendida, tudo conforme se extrai de fls. 611, 614 e 615.
Complementando a prova testemunhal e documental acabada de apreciar surgem as escutas telefónicas cuja transcrição se encontra no apenso respectivo, escutas essas que, além de situarem o arguido R... ligado ao arguido Joaquim F... – cfr. sessões 2510 (fls. 46), 2514 (fls. 47), 2571 (fls. 48) -, não deixam margem para qualquer dúvida relativamente à natureza do produto que vendia, forma como eram combinadas as entregas e respectivos locais, intensidade da actividade e círculo de compradores.
A clareza das transcrições que constam a fls. 121 a 135, 139 a 150, 153 a 155 e 159 a 162, dispensam a respectiva citação (cujos factos subjacentes constam quase integralmente da própria acusação e, por isso, dos considerados provados), bem como ulteriores considerações, senão para precisar que as sessões 622 e 623 se reportam à vigilância de fls. 611 e as sessões 635, 636, 639 e 640 se reportam à vigilância de fls. 614 e 614.
Apresentadas pela defesa de Joaquim F..., as testemunhas Joaquim B... e José A... abonaram sobre a sua pessoa e situação habitacional, social e familiar, não acrescentado nada que de importante não resultasse já do relatório social elaborado e junto aos autos.
Alfredo A... e João L..., apresentados pela defesa de R... Sousa, depuseram sobre as condições de vida deste e asseguraram as suas qualidades e dedicação profissionais, factos que já se extraíam, outrossim, do relatório social oportunamente requisitado.
De resto, o tribunal atendeu aos relatórios sociais que oportunamente foram elaborados para cada um dos arguidos, analisados em audiência e pelos mesmos aceites, bem como aos certificados de registo criminal.
Não foi produzida prova consistente e credível em relação à materialidade considerada não provada, no que se inclui a que versava das contestações apresentadas.”
10. Na motivação do recurso, o arguido Joaquim F... invoca a nulidade das escutas telefónicas, afirmando que as transcrições ordenadas nos autos “foram recolhidas, em termos que oportunamente especificará, com violação dos artigos 187.º e 189.º do CPP ”
O recorrente nada mais alega sobre esta matéria e não descortinamos na motivação e nas conclusões qualquer argumento ou fundamento, mínimo que seja, para sustentar esta afirmação.
Nestes termos, improcede manifestamente o recurso neste âmbito.
11. O arguido Joaquim F... suscita a nulidade do acórdão por desrespeito do segmento do nº 2 do artigo 374º do Código de Processo Penal, onde se impõe que, na sentença, a exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto e de direito, inclua não só a indicação mas também o exame crítico das provas que serviram par firmar a convicção do tribunal”.
Como tem sido insistentemente sublinhado, o dever de fundamentação das decisões penais num Estado de Direito, além de constituir uma das fontes de legitimidade da jurisdição em geral, constitui um direito e garantia fundamental do cidadão contra a arbitrariedade no exercício do poder público. Nos termos da Constituição e da lei as decisões judiciais são susceptíveis de recursos, mas a eficácia do recurso depende substancialmente da fundamentação e da possibilidade de comprovação pelo tribunal ad quem dos pressupostos da decisão.” (in “Registo da Prova em Processo Penal”, “Estudos em Homenagem a Cunha Rodrigues”, Coimbra Editora, 201, I, pág. 806-807).
A enunciação dos motivos e o exame crítico das provas há-de consistir por isso num análise que permita compreender a opção por um meio probatório e se, for o caso, o motivo por que se elegeu um em detrimento de outro, porventura de sentido contrário, por forma a permitir uma perfeita compreensão da decisão pelos destinatários, aqui aferidos considerando um homem médio suposto pelo ordem jurídica, exterior ao processo, com a experiência razoável da vida e das coisas.
Naturalmente que a maior ou menor exigência de pormenorização da análise crítica depende da complexidade dos meios de prova disponíveis. Essa análise terá de ser particularmente exigente se se verificaram depoimentos, declarações ou documentos de conteúdo ou sentido contraditórios.
Deste modo, “o rigor e a suficiência do exame crítico têm de ser aferidos por critérios de razoabilidade, sendo fundamental que permita exteriorizar as razões da decisão e o processo lógico, racional e intelectual que lhe serviu de suporte” (Acórdão do STJ de 21-3-2007, in www.dgsi.pt). Assim sendo, haverá nulidade da sentença (artigo 379º nº 1, alínea a) Código de Processo Penal) quando, em consequência de uma omissão ou deficiência na enunciação e análise crítica da prova, fique afectada a plena compreensão do processo lógico e racional que conduziu à decisão. Como refere a jurisprudência do STJ, não quer isto dizer que essa obrigação seja exigente ao ponto de tornar inviável a sua observância concreta; ou seja, o dever de fundamentar não obriga a explicar a análise a que se procedeu, o raciocínio efectuado, o juízo feito, ponto por ponto, bastando-se com a indicação das provas segundo uma visão global e compreensiva, indicando-as de um modo tanto quanto possível completo, ainda que sucinto, no dizer da lei” ( Acórdão do STJ Supremo Tribunal de Justiça 27-05-2009 proc. 1511/05.7PBFAR.S1 Pires da Graça).
No caso concreto:
Como bem resulta da transcrição supra, acórdão recorrido contém não só o elenco do conjunto da prova pericial e documental analisada (pags. 43 a 52), mas também, no local próprio, com suficiente clareza e pormenor, a indicação dos meios de prova relevantes para a decisão, quanto a cada um dos pontos de facto referentes ao arguido recorrente.
No segmento a que o recorrente alude, revela-se evidente a enunciação dos motivos que alicerçaram a convicção. Como resulta de uma leitura do texto constante de pags. 72 a 80, 83 e 84, a enunciação não se restringe a uma mera transcrição de conversas telefónicas, mas aí se contem uma análise conjunta, à luz de regras normais de vivência comum, de prova testemunhal, de prova resultante também de elementos percepcionados directamente em acções de vigilância e acções policiais por militares da GNR e agentes da Polícia Judiciária, bem como em depoimentos de testemunhas que afirmaram ter comprado heroína e/ou cocaína ao arguido (Virgílio F..., Paulo P..., José V..., José M...).
Em síntese, para um cidadão “comum” de normal inteligência e experiência da vida, será perfeitamente compreensível que o tribunal considere provada a prática de actos de detenção e de cedência de heroína e de cocaína, a partir dos elementos constantes nas transcrições de escutas telefónicas destes autos e directamente percepcionados pelos agentes policiais nas acções de vigilância ou relatados pelos próprios consumidores adquirentes e que se encontram descritos na fundamentação do acórdão.
Tendo ainda em conta que não existem outros meios probatórios de sentido contrário (ou contra-indícios), afigura-se-nos que a fundamentação de facto do acórdão permite uma plena compreensão do processo lógico e racional que conduziu à formação da convicção. Questão naturalmente distinta reside em saber se houve erro de julgamento, ou seja, se essa prova permite a decisão em matéria de facto. Essa é uma questão que aqui não releva e que deve ser tratada seguidamente em sede própria.
Em conclusão, inexiste qualquer nulidade neste âmbito.
12. Como é sabido, os tribunais da relação conhecem dos recursos em matéria de facto e em matéria de direito (artigos 427º e 428º do Código de Processo Penal ) e a decisão sobre a matéria de facto pode ser alvo de recurso em dois planos bem distintos:
Uma primeira forma de colocar em crise a decisão de facto consiste na alegação de um dos vícios do artigo 410º nº 2 do Código de Processo Penal ou seja, a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão ou o erro notório na apreciação da prova. Neste caso, também de conhecimento oficioso, o objecto de apreciação encontra-se bem delimitado: trata-se de analisar apenas a decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras normais de experiência comum, sem possibilidade de apelo a outros elementos que lhe sejam estranhos, mesmo que constem do processo.
Num segundo plano, este já de “verdadeiro recurso em matéria de facto”, a análise não se limita ao texto da decisão e envolve a apreciação da prova produzida ou examinada em audiência de julgamento.
Ainda assim, o recurso não pressupõe nem se destina a uma reapreciação global de todos os elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida, mas apenas a uma reapreciação autónoma da decisão tomada pelo tribunal a quo, circunscrita aos factos individualizados que o recorrente considere incorrectamente julgados, na base, para tanto, na avaliação das provas que impunham uma decisão diferente Importa ter presente o quadro limite dos poderes de cognição deste Tribunal da Relação, decorrente do disposto nos artigos 410º, 412º e 428º do Código de Processo Penal (CPP).
Seguimos aqui o entendimento expresso pelo Supremo Tribunal de Justiça (STJ), no acórdão de 12 de Junho de 2008, Relator Conselheiro Raul Borges, sum. in www.dgsi.pt: processo nº 07P4375: “Atente-se contudo que a sindicância da matéria de facto pelos tribunais de segunda instância sofre quatro tipos de limitações: “desde logo, uma limitação decorrente da necessidade de observância, por parte do recorrente, de requisitos formais da motivação de recurso face à imposta delimitação precisa e concretizada dos pontos da matéria de facto controvertidos, que o recorrente considera incorrectamente julgados, com especificação das provas e referência ao conteúdo concreto dos depoimentos que o levam a concluir que o tribunal julgou incorrectamente e que impõem decisão diversa da recorrida, com o que se opera a delimitação do âmbito do recurso; - já ao nível do poder cognitivo do tribunal de recurso, temos a limitação decorrente da natural falta de oralidade e de imediação com as provas produzidas em audiência, circunscrevendo-se o “contacto” com as provas ao que consta das gravações e/ou, ainda, das transcrições; - por outro lado, há limites à pretendida reponderação de facto, já que a Relação não fará um segundo/novo julgamento, pois o duplo grau de jurisdição em matéria de facto não visa a repetição do julgamento em 2.ª instância; a actividade da Relação cingir-se-á a uma intervenção cirúrgica, no sentido de restrita à indagação, ponto por ponto, da existência ou não dos concretos erros de julgamento de facto apontados pelo recorrente, procedendo à sua correcção se for caso disso, e apenas na medida do que resultar do filtro da documentação; - a jusante impor-se-á um último limite, que tem a ver com o facto de a reapreciação só poder determinar alteração à matéria de facto se se concluir que os elementos de prova impõem uma decisão diversa e não apenas permitem uma outra decisão. …”. (sublinhados nossos)
Neste âmbito, impõe-se ao recorrente que proceda à delimitação dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e à indicação das concretas provas que impõem decisão diversa e ainda, se for o caso, das provas que devem ser renovadas, com indicação concreta das passagens dos suportes de gravação em que se funda a impugnação (artigo 412º nº 3 e nº 4 do Código de Processo Penal).
13. No plano indicado em primeiro lugar, o arguido José S... insurge-se com a decisão da matéria de facto mas, salvo melhor entendimento, não distingue os planos ou perspectivas e qualifica a mesma realidade, quer como erro de julgamento, decorrente de uma errada apreciação e valoração das provas ou da insuficiência destas para a decisão de facto proferida, quer como vício decisório, numa alusão vaga e sem a mínima concretização a ocorrência de insuficiência da matéria de facto apurada e de erro notório na apreciação da prova (conclusões 56 a 64).
Como se escreveu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de Abril de 2011, Rel. Cons. Pires da Graça, proc. nº 7266/08.6TBRG.G1.S1, “A apreciação da prova é um juízo valorativo, de raciocínio objectivo, de ponderação do que é revelado por cada prova produzida, e em conjugação com as demais, e eventual erro que daqui derive é um erro de julgamento na credibilidade de determinada prova, cuja impugnação é feita através do recurso em matéria de facto, nos termos do art. 412.º, n.ºs 3 e 4, do CPP. O erro notório na apreciação da prova, é um conceito jurídico processual, técnico legal, que ao subsumir-se ao disposto na alínea c) do n.º 2 do art. 410.º do CPP, apenas tem a ver com o texto da decisão recorrida, perspectivado na matéria de facto provada e não provada e respectiva fundamentação (…).”
Poder-se-á ainda considerar adquirido que o vicio da alínea a) do artigo 410º nº 2 do Código de Processo Penal existe quando se conclua, a partir do próprio texto da sentença, isoladamente considerada ou em conjugação com regras de experiência comum, que a matéria de facto provada se revela insuficiente para a decisão correcta de direito. Entendendo-se necessário precisar que a decisão critério não é aquela decisão que se alcançou no processo, mas a decisão justa, a composição mais próxima da “ideal” e que, tendencialmente, declara a justiça no caso concreto Como decidiu o Acórdão do STJ de 07-01-99, “a insuficiência para a decisão da matéria de facto provada é um vício que ocorre quando a matéria de facto provada é insuficiente para a decisão de direito, o que se verifica porque o tribunal recorrido deixou de apurar matéria de facto que lhe cabia apurar dentro do objecto do processo, tal como este está circunscrito pela acusação e pela defesa, sem prejuízo do mais que a prova produzida em audiência o justifique” (sum citado por Simas Santos, Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 7ª ed. 2008, Rei dos Livros, página 74, sublinhado nosso)
Ou ainda, como se escreveu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13 de Maio de 1998 Relator Joaquim Rodrigues Dias Cabral, na Colectânea, Tomo II, o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, previsto na al. a) do n° 2 do art. 410° do C.P.P. (…) é um vício que resulta do texto da decisão recorrida, sem influência de elementos exteriores àquela, a não ser as regras da experiência comum; vício de lógica jurídica ao nível da matéria de facto, que torna impossível uma decisão logicamente correcta, justa e conforme à lei.
Especificamente, a insuficiência prevista na al. a) determina a formação incorrecta de um juízo porque a conclusão ultrapassa as premissas. A matéria de facto é insuficiente para fundamentar a solução de direito correcta, legal e justa.
Insuficiência em termos quantitativos porque o tribunal não esgotou os seus poderes de indagação em matéria de facto. Na tarefa da descoberta da verdade material, o tribunal podia e devia ter ido mais além. Não o fazendo, a decisão formou-se incorrectamente por deficiência da premissa menor. O suprimento da insuficiência faz-se com a prova de factos essenciais, que fazem alterar a decisão recorrida, já na qualificação jurídica dos factos, já na medida concreta da pena, ou de ambos conjuntamente. Se os novos factos não determinarem alguma dessas alterações, não são essenciais, o vício não é importante, pode ser sanado no tribunal de recurso.
O termo "decisão" refere-se, portanto, à decisão justa que devia ter sido proferida, não à decisão recorrida.
Os poderes do tribunal na procura da verdade material encontram-se limitados pelo objecto do processo definido na acusação ou na pronúncia, temperado pelo princípio das garantias da defesa, consignado no art. 32° da Constituição.
Assim, sobre o tribunal recai o dever de ordenar a produção da prova necessária à descoberta da verdade material, tanto relativamente aos factos narrados na acusação ou na pronúncia como aos alegados pela defesa na contestação e aos que surgirem no decurso da audiência de julgamento, em benefício do arguido.
Aquela tarefa de indagação da verdade material tem de ser tanto quanto possível exaustiva”..
Ora, neste caso, o recorrente extravasa claramente o texto da própria decisão, recorrendo sempre a argumentação extraída da apreciação própria da prova produzida em audiência de julgamento. Deste modo, as considerações que o recorrente tece ao longo das conclusões do recurso podem ser analisadas no plano da impugnação da decisão em matéria de facto por erro de julgamento (designadamente quanto à apreciação do valor das transcrições das escutas, da prova testemunhal, das vigilâncias ou pericial pelas impressões digitais), mas não podem proceder enquanto fundamento de vício decisório.
Diremos ainda assim que o texto do acórdão contem o raciocínio dedutivo que permite justificar de uma forma razoável toda a matéria de facto provada referente a este arguido. Aí se indicam e conjugam elementos concretos referentes, em síntese, a conversações telefónicas com o arguido Joaquim, prova por vigilância das deslocações e entrada no armazém onde veio a ser apreendido o estupefaciente e os utensílios e a presença de impressões digitais do arguido no embrulho contendo heroína.
Afigura-se-nos que as ilações extraídas a partir dos elementos de prova recolhidos contêm-se na razoabilidade. De modo algum se pode concluir a partir unicamente do texto da decisão recorrida pela existência de um desacerto ostensivo ou grosseiro na apreciação da prova.
O recorrente não concretiza e também não vislumbramos qualquer omissão do dever de investigação oficiosa uma vez que o tribunal realizou as diligências de prova que se lhe impunha realizar.
Em conclusão, não se verifica a ocorrência de algum dos vícios previstos no artigo 410º nº 2 do Código Penal, designadamente insuficiência da matéria de facto apurada, de contradição insanável entre factos dados por provados e factos dados como não provados ou de erro notório na apreciação da prova e improcede neste âmbito o recurso deste arguido.
14. No âmbito de impugnação por erro de julgamento, o arguido José S... censura a decisão quanto a todos os factos constantes dos pontos 60, 63, 64, 69 e 89 a 93 do elenco da matéria de facto provada do acórdão recorrido. Neste âmbito, indica com perfeição os concretos elementos de prova que no seu entender justificam uma decisão diferente.
No que respeita ao ponto 60, o recorrente suscita implicitamente a falta de especificação e concretização da matéria de facto provada referente ao fornecimento de produto estupefaciente ao arguido Joaquim F....
Como o Supremo Tribunal de Justiça tem decidido, a imprecisão da matéria de facto quanto ao tempo e ao local da prática dos factos, designadamente quando a descrição se reduz a mera utilização de fórmulas vagas e genéricas, contende com o direito ao contraditório, constitucionalmente garantido e, nessa medida, ofende as garantias de defesa do arguido, sendo então insusceptível de fundamentar uma condenação penal (Assim, entre outros, os Acórdãos do STJ de 14 de Setembro de 2006, Proc. 2421/06, 5ª secção, de 17 de Janeiro de 2007, Proc. 06P3644, de 21 de Fevereiro de 2007, Proc.º 3932/06 - 3.ª Secção, de 15 de Novembro de 2007, Proc. 3236/07, 5ª secção, de 2 de Abril de 2008, proc 578/08, 3ª secção e de 2 de Julho de 2008, 3ª secção, Proc. 3861/07 todos disponíveis em www.dgsi.pt bem como o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24-01-2012,Proc 68/11.4PATVD.L1, Jorge Gonçalves, acessível in www. colectaneadejurisprudencia.com).
Para melhor compreensão do entendimento subjacente a essa decisões, poder-se-á ter presente que o Supremo Tribunal de Justiça considerou inadmissíveis e invalidou afirmações da matéria de facto de acórdãos condenatórios como “o arguido ES vinha vendendo heroína a consumidores, e em resultado dessa actividade vinha adquirindo, seja por troca directa, seja por compra com dinheiro obtido na venda da heroína inúmeras coisas” (Ac. de 02-04-2008) ou “o arguido vendia por conta própria haxixe e cocaína, com intenção de obter contrapartida económica” (Acórdão de 21-02-2007) assim como censurou a inclusão de imputações sem qualquer especificação das condutas em que se concretizou o aludido comércio e do tempo e lugar em que tal aconteceu (Acórdão de 14-09-2006).
O que bem se compreende, e com que concordamos: só a indicação de todos os elementos da acção, designadamente a concretização do “Quando” , do “Onde” e do “O quê” pode permitir ao arguido uma forma tão elementar da prova como demonstrar que naquela ocasião se encontrava em outro local ou que a pessoa que estava naquele local àquela hora era afinal uma outra….. Ou que, estando naquele local naquela hora, afinal o que estava a fazer era coisa diferente….
Sem esquecer as dificuldades próprias da investigação de um crime como o de tráfico de estupefacientes, certo também é que um processo leal e justo terá sempre permitir ao arguido o conhecimento dos elementos imprescindíveis para a definição dos factos que lhe são imputados.
Revertendo ao caso destes autos, ter-se-á de concluir que a descrição constante do ponto 60 (“fornecimento ao arguido Quim B...”) bem como texto do ponto 64 (o arguido “interpelava frequentemente o co-arguido Quim B... para lhe entregar quantias em dinheiro provenientes da venda de produto estupefaciente(…)”) se limitam a a meras imputações genéricas, sem a mínima especificação quanto às substâncias envolvidas (que v.g. tanto poderão ser , por hipótese, “canabis”, como heroína ou cocaína) nem quanto ao n.º de actos de entrega, nem as datas, os locais ou quantias envolvidas).
Estas imputações, de tão vagas e genéricas, não permitem um efectivo contraditório, nem o exercício dos direitos de defesa do arguido, constitucionalmente consagrados (artigo 32.º n.º 1 e n.º 5 da Constituição da República Portuguesa). Em consequência deve ser negada qualquer relevância desse “circunstancialismo” para eventual enquadramento jurídico penal enquanto actividade susceptível de integrar o cometimento do crime de tráfico de estupefacientes.
Em nosso entender, a sequência da conversação telefónica entre João R... e Joaquim F... acerca da qualidade do produto estupefaciente fornecido pelo segundo ao primeiro e o encontro entre este último e o José S...em 30.01.2012 na zona industrial, sempre seriam insuficientes para permitirem a conclusão segura que a heroína de que o R... reclamava tinha sido fornecida pelo José S.... Tanto mais quanto não se presenciou nenhum encontro entre os três.
Nestes termos, procede o recurso do arguido quanto aos pontos 60, 63 e 64 do elenco da matéria de facto provada do acórdão do tribunal colectivo e, em consequência decide-se alterar a decisão da matéria d facto nos seguintes termos:
1.º- A matéria constante dos pontos n.º 60 e 64 é retirada dos factos provados e acrescentada aos factos não provados;
2.º - Do ponto 63 da matéria de facto provada é retirado o segmento final “local onde se foram encontrar com o arguido João R... a fim de esclarecerem a qualidade do produto estupefaciente”, que assim se inclui nos factos não provados .
No seu recurso, o recorrente insurge-se ainda com a decisão do tribunal colectivo no segmento do ponto 69 em que aí consta que o arguido manuseou o embrulho contendo 208,020 g de heroína que foi apreendido em 14 de Fevereiro de 2012 num pavilhão em Esporãos, Fafe.
Invoca o arguido para tanto, em síntese, que havia outras pessoas com acesso ao local, aí se desenrolava actividade proibida de desmantelamento de veículos e que as impressões digitais poderiam ter sido apostas na fita-cola em ocasião anterior ao do embrulho da heroína.
Salvo o devido respeito são argumentos inconsistentes que de forma alguma impõem uma decisão diferente.
Impõe-se recordar que a heroína se encontrava acomodada dentro de um saco, numa divisão do pavilhão.
Como desenvolvidamente consta da decisão recorrida, existem elementos referentes à negociação do “arrendamento” do pavilhão e de contactos referentes ao fornecimento de energia que inequivocamente convencem que apenas o arguido dispunha do acesso ao local, do poder de disposição das instalações e das condições adequadas para ali guardar a heroína.; Das operações de vigilância e dos depoimentos da testemunhas resulta a entrada e permanência no local. Existem conversações telefónicas que demonstram a preocupação perante as acções das forças policiais.
Tendo ainda em conta a conformação normal de um rolo de “fita- cola” e as normais operações em situações idênticas, afigura-se-nos destituído de razoabilidade acreditar que os vestígios lofoscópicos examinados poderiam ter sido colocados antes de ter sido feito o embrulho apreendido.
Assim, a partir ou com base nos elementos revelados nos autos de apreensão e nos depoimentos dos inspectores da Policia Judiciária que visionaram directamente a detenção e transporte, em conjugação com os relatos de vigilância externa e o teor do registo das conversações telefónicas, é possível extrair com a necessária segurança a detenção do arguido recorrente de heroína com o peso líquido de 198,765 g .
Tendo em conta a quantidade e qualidade da substância apreendida, a que ainda acresce a existência junto de uma balança digital de precisão, três outras balanças, uma tesoura, um moinho e muitos sacos de plástico, elementares regras de vivência comum permitem-nos considerar como provado com a necessária segurança e para lá de qualquer dúvida razoável, que a heroína apreendida era pertença do arguido e se destinava a subsequentes operações de cedência, de entrega ou de venda, com disseminação por um número indeterminado de consumidores.
Entende-se assim manter na íntegra a redacção do ponto 69 da matéria de facto provada.
O recorrente não invoca fundamento autónomo e agora também não vislumbramos elemento de prova que imponha a alteração da decisão do tribunal colectivo referente aos factos constantes dos pontos 89 a 93.
15. No seu recurso, o arguido João F... censura a decisão no âmbito de impugnação por erro de julgamento quanto aos factos constantes dos pontos 18 a 21 do elenco da matéria de facto provada no acórdão recorrido, invocando, em síntese, que os elementos de prova disponíveis não permitem ter como provado que o recorrente tenha procedido a venda ou a cedência de produtos estupefacientes a outras pessoas que não ao co-arguido José C... e em quantidades que variavam entre as 5 e as 20 g de heroína e as 5 e as 20 g de cocaína.
Impõe-se assim analisar os elementos de prova em que assentou a decisão do tribunal colectivo e verificar se outros existem que imponham uma decisão diferente.
No que se refere a actos concretos de detenção ou de entrega de substância estupefaciente a outra pessoa que não o co-arguido José C..., os elementos probatórios restringem-se ao teor das transcrições das conversações telefónicas.
Deve enfatizar-se a preocupação quanto à sustentabilidade probatória de uma condenação baseada apenas nas declarações obtidas com as intercepções telefónicas. Na realidade, “sem a concorrência dos adequados meios de prova sobre os factos, não se poderá considerar directamente provado um determinado facto, que não seja a mera existência e o conteúdo da própria conversação” Daí que “a aquisição processual que a intercepção permite (…)- não poderá, enquanto tal, na dimensão valorativa da prova penal em audiência, ser considerada mais do que princípio de indicação ou de interacção com outros factos, permitindo, então, deduções ou interpretações conjugadas no plano autorizado pelas regras da experiência para afirmação da prova de um determinado facto; os dados recolhidos na intercepção de uma conversação, apenas por si mesmos não podem constituir, nesta dimensão probatória, mais do que elementos da construção e intervenção das regras das presunções naturais como instrumentos metodológicos de aquisição da prova de um facto.” (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07-01-2004, proc. 03P3213, Henriques Gaspar)
Sendo viável operar presunções naturais a partir do texto documentado das comunicações transcritas, a análise das relações de inferência deve ser particularmente rigorosa e exigente quando a condenação se baseie exclusivamente nesses dois elementos probatórios.
No caso, é inequívoco que as conversações escutadas e transcritas só se podem compreender como genericamente enquadradas no comportamento de quem “se dedica ao tráfico de estupefacientes”. Porém, nenhuma transcrição permite delinear um específico acto de detenção, de compra ou de venda de heroína ou de cocaína, minimamente localizado no tempo e no espaço. Os restantes elementos de prova (testemunhal, resultante das vigilâncias, por apreensão ou exame pericial) em nada corroboram essas suspeitas de cedência de droga a outras pessoas. No caso em apreciação, o facto conhecido (o pressuposto e a base da presunção) foi a existência de uma conversação telefónica com um co-arguido em que o recorrente encomendava determinada quantidade de produto estupefaciente, com a entrega a ficar aprazada para momento posterior.
Também não existem regras da vivência comum que permitam a partir unicamente das escutas telefónicas concluir, para lá de uma dúvida razoável, que se concretizaram os projectados “negócios” com outras pessoas.
O recorrente tem igualmente razão quanto ao valor mais elevado das vendas de heroína e de cocaína. Como decorre do teor das transcrições embora tivesse havido uma “encomenda” de 100g , as quantidades que José C... encomendava ao arguido recorrente situavam-se entre 5 e 20 g de heroína e entre 5 e 20 g de cocaína.
Por último, tem de proceder a impugnação quanto à data de início da actividade de compra e venda de heroína e cocaína constante do ponto 18 da matéria de facto provada. Com efeito, a motivação da decisão não permite justificar esse segmento probatório e os elementos constantes das transcrições das chamadas telefónicas e da prova testemunhal apenas permitem situar o princípio dessa actividade em 28 de Janeiro de 2012.
Em consequência, decide-se alterar a decisão da matéria de factos nos seguintes termos:
1.º- Altera-se a redacção do ponto 18 da matéria de facto provada por forma a constar aí o seguinte “ O arguido João F..., também conhecido pela alcunha de João S... dedicou-se à compra e venda de heroína e de cocaína desde 28 de Janeiro de 2012 até 16 de Fevereiro de 2012;
2.º A matéria constante do ponto n.º 20 é retirada dos factos provados e acrescentada aos factos não provados ;
3.º Altera-se a redacção do ponto 21 da matéria de facto provada por forma a aí passar a constar o seguinte:
“ O arguido João F... vendeu diversas quantidades de heroína e cocaína, que variavam entre as 5g e as 20gr., sendo a quantidade habitual de 20 gramas de heroína e 20 gramas de cocaína, ao arguido José C..., que este, por sua vez e atenta a frequência e quantidade de produto estupefaciente solicitado (nomeadamente nos dias 8, 9, 14 e 16 de Fevereiro), destinava à venda a consumidores que, para esse efeito, o procuravam.”.
No mais, mantêm-se a decisão da matéria de facto quanto a este arguido.
16. Neste âmbito da impugnação da decisão em matéria de facto, o arguido José C... suscita fundamentalmente duas questões referentes aos pontos n.º 6 e n.º 23 do elenco da matéria de facto provada do acórdão recorrido.
Em síntese, afirma o recorrente que o tribunal incorreu em erro ao julgar provado no ponto n.º 6 que o arguido vendeu 0,20 g de heroína a Domingos F..., “tendo em conta as declarações prestadas por esta testemunha, que nega a aquisição de produtos estupefaciente ao arguido, tendo ainda em conta que as demais testemunhas de acusação no que a este facto diz respeito, apenas viram a testemunha a entrar e sair de casa do arguido, não lhe tendo feito qualquer revista antes da entrada a fim de verificar se já levava consigo produto estupefaciente”.
Cumpre antes de mais notar que no acórdão recorrido consta a data do acontecimento aqui em apreço como sendo a de 20 de Fevereiro de 2010, certamente devido a lapso: como resulta do auto de vigilância de fls. 74, a data correcta é a de 20 de Dezembro de 2010.
Do auto de vigilância resulta fundamente que a testemunha foi vista a entrar na morada do arguido e, depois daí sair, foi revistada encontrando-se na sua posse 0,2 g de heroína. Nada mais daí resulta e chamado a depor em audiência, Domingos F... afirmou que nunca comprou heroína ao arguido José C....
Perante estes elementos probatórios – os únicos disponíveis – ter-se-á de admitir como razoável que o Domingos F... tenha adquirido a heroína em outro local antes de entrar na casa do arguido.
Nestes termos, procede o recurso do arguido e a matéria constante do ponto 6 deve ser retirada dos factos provados e incluída no circunstancialismo não provado.
Invoca ainda o arguido que toda a matéria constante do ponto 23 deve ser excluída do elenco da factualidade provada, uma vez que aí se contem a mera transcrição de escutas telefónicas, ou seja, enunciação de meios de prova e não de factos com relevo para a decisão da causa.
A questão suscitada extravasa os limites da impugnação da decisão em matéria de facto por erro de julgamento e insere-se antes no cumprimento dos requisitos da sentença constantes do artigo 374.º do Código do Processo Penal, quanto à fundamentação da sentença e enumeração dos factos provados e não provados. A elaboração da acusação pública e, posteriormente, da sentença seguindo uma técnica errada não integra nulidade tipificada na lei. Haveria mera irregularidade, entretanto sanada (artigos 118.º a 120.º 123.º, 374.º e 379.º, todos do Código do Processo Penal).
Ainda assim sempre se dirá:
O objecto da prova tanto pode incidir sobre os factos probandos, como sobre factos diversos do tema da prova, mas que permitam, com o auxílio das regras da experiência, uma ilação quanto a este ( prova indirecta ou indiciária). Daí que o tribunal se deva pronunciar sobre a prova quer dos factos essenciais, quer também dos factos circunstanciais ou instrumentais relevantes para a prova dos factos probandos.
É óbvio que a transcrição da escuta apenas permite provar a existência e o conteúdo da gravação, mas o próprio teor da conversa pode ele próprio constituir um facto indiciário, circunstancial ou instrumental, que por força de presunções naturais e eventualmente complementado por outros elementos probatórios, permita comprovar o preenchimento do tipo de crime. Nessa medida, se aceita a inclusão das transcrições das conversações na acusação pública, a que agora o tribunal teve de responder no acórdão. Questão completamente diferente reside na relevância que essas transcrições devem merecer em sede de enquadramento jurídico penal dos factos provados, a apreciar no local próprio.
17. No seu recurso, o arguido Joaquim F... censura a decisão sobre a matéria de facto do acórdão recorrido invocando a ocorrência de erros de julgamento na interpretação e valoração pelo tribunal colectivo dos meios de prova. O recorrente fez “indicação” dos factos que são alvo de divergência de valoração, envolvendo um extenso conjunto com a larga maioria dos que ao arguido se referem. Acresce que o recorrente não se preocupa em enunciar ou concretizar as provas que impõem uma decisão diferente” e indica a totalidade do depoimento de onze testemunhas.
Ou seja, o recorrente não indica as concretas passagens do registo da prova, nem transcreve os segmentos que no seu entender o tribunal não valorou correctamente. A falta de efectiva individualização do facto, a omissão de concretização dos meios de prova e a omissão de esclarecimento de qualquer relação entre o meio de prova indicado e o facto individualizado que se afirma incorrectamente julgado inviabilizam, ou pelo menos, impõem um esforço acrescido na reapreciação da decisão, prevista no artigo 412º, nº 3, 4 e 6 do Código de Processo Penal.
Tal como se escreveu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de Março de 2006, Relator Cons. Simas Santos, processo 06P461, sum. in www.dgsi.pt e no entendimento posteriormente retomado no Acórdão também do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de Junho de 2008, no processo 08P1884, “Se o recorrente se dirige à Relação limitando-se a indicar alguma prova, com referencia a suportes técnicos, mas na totalidade desses depoimentos e não qualquer segmento dos mesmos, não indica as provas que impõem uma decisão diversa quanto a questão de facto (…), pois o recurso de facto para a Relação (…) é um remédio jurídico destinado a colmatar erros de julgamento, que devem ser indicados precisamente com menção das provas que demonstram esses erros. 2 - Se o recorrente não faz, nem nas conclusões, nem no texto da motivação as especificações ordenadas pelos n.°s 3 e 4 do art. 412.° do CPP, não há lugar ao convite a correcção das conclusões, uma vez que o conteúdo do texto da motivação constitui um limite absoluto que não pode ser extravasado através do convite a correcção das conclusões da motivação” Também no entendimento de Albuquerque, Paulo Pinto de in Comentário ao Código de Processo Penal, 3ª ed. pag. 1121 e 1222 “A especificação das “concretas provas” só se satisfaz com a indicação do facto individualizado que consta da sentença recorrida e que se considera incorrectamente julgado. Por exemplo, é insuficiente a indicação genérica de um depoimento, de um documento, de uma perícia ou de uma escuta telefónica realizada entre duas datas ou a uma pessoa. Mais exactamente, no tocante aos depoimentos prestados na audiência, a referência aos suportes magnéticos só se cumpre com a indicação do número de “voltas” do contador em que se encontram as passagens dos depoimentos gravados que impõem diferente decisão, não bastando a indicação das rotações correspondentes ao início e ao fim de cada depoimento (…). Acresce que o recorrente deve explicitar por que razão essa prova “impõe” decisão diversa da recorrida. Este é o cerne do dever de especificação. O grau acrescido de concretização exigido pela Lei nº 48/2007, de 29.8 visa precisamente impor ao recorrente que relacione o conteúdo especifico do meio de prova que impõe decisão diversa da recorrida com o facto individualizado que considera incorrectamente julgado (…). .
Vejamos, ainda assim.
Bem ao invés do que se afirma na motivação do recurso deste arguido, o texto do acórdão recorrido (de que supra se fez transcrição) permite concluir que o tribunal colectivo alicerçou a sua convicção segura quanto à prova da matéria de facto referente ao comportamento do arguido, não apenas no teor das transcrições de conversas telefónicas e de mensagens ou dos relatórios de diligências externas de 11.01.2011 e de 19.01.2012, mas na conjugação desses com outros elementos, onde se inclui prova por testemunho directo.
Depois de termos consultado os elementos de prova indicados pelo recorrente e de ouvido todo o registo áudio dos depoimentos prestados na audiência de julgamento a partir do disco CD apenso aos autos, não vislumbramos motivo que nos leve a divergir da apreciação do tribunal recorrido, muito menos que nos imponha uma decisão diferente.
Com efeito, os indicados relatos de diligência externa, sendo o que se refere à diligência de 19.01.2012 conjugado com escuta telefónica, permitem concluir que os inspectores da PJ surpreenderam directamente concretos actos de entrega de estupefaciente, como aí relatado.
Pudemos ainda confirmar que a descrição constante da motivação da convicção do tribunal (pag. 77 a 80 do acórdão) retrata fielmente, ponto por ponto, o conteúdo e significado dos depoimentos das testemunhas Virgílio Lopes de Freitas, Paulo P..., José V... Magalhães Andrade, José M... e R... C....
Apesar de algumas hesitações e dificuldades de memorização, os relatos destes consumidores de estupefacientes permitem, alguns conjugados com as transcrições das correspondentes intercepções telefónicas, comprovar seguramente da ocorrência dos concretos actos de detenção e venda de heroína e de cocaína pelo arguido Joaquim F... a todas e cada uma dessas pessoas, nas circunstâncias concretas constantes do elenco da matéria de facto provada.
Na decisão, o tribunal considerou que o depoimento das testemunhas Joaquim B... e José A... em nada de relevante acrescentou quanto ao teor do relatório social O recorrente não concretiza e também não vislumbramos fundamento para uma decisão diferente quanto à ausência de prova dos factos constantes nos n.º 2 e 3 da contestação.
Em conclusão, não encontramos qualquer erro de lógica ou de razoabilidade na interpretação e valoração dos meios de prova pelo tribunal colectivo.
18. Segundo o princípio in dubio pro reo, que constitui corolário do principio da presunção da inocência consagrado no artigo 32º nº 2 da CRP e é unanimemente reconhecido como princípio fundamental do direito processual penal, o tribunal deve sempre decidir a favor do arguido se não se encontrar convencido da verdade ou falsidade de um facto, isto é, se permanecer em estado de dúvida sobre a realidade do mesmo (numa situação de non liquet). Como se escreveu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Abril de 2011, “Se a acusação, e em última instância o próprio juiz, não conseguem reunir prova da culpabilidade do arguido, a ponto de o tribunal ficar numa situação de dúvida, então impor-se-á a absolvição. O tribunal não pode decidir-se por um non liquet: ou absolve ou condena. As limitações com que se debateu o funcionamento do ius puniendi não poderão prejudicar o arguido. Só que a situação de dúvida tem que se revelar de algum modo, e designadamente através da sentença. A dúvida é a dúvida que o tribunal teve, não a dúvida que o recorrente acha que, se o tribunal não teve, deveria ter tido. (processo 117/08.3PEFUN.L1.S1 disponível in www.dgsi.pt )
Ou seja, para que se coloque a questão de eventual aplicação do princípio, torna-se necessário que o tribunal se encontre numa situação de dúvida e só existe violação do princípio se, perante uma situação assumidamente de dúvida, se decida sem ser a favor do arguido.
No caso concreto, em lado algum transparece que o tribunal recorrido tenha enfrentado uma situação de dúvida quanto à ocorrência dos factos que julgou provados. Sendo inquestionável que também agora em sede de recurso não se nos suscita dúvida que justifique a aplicação daquele princípio,
Nestes termos, não pode afirmar-se ter havido violação do princípio in dubio pro reo e improcede igualmente a argumentação dos recorrentes João F... e José S... neste âmbito.
19. Cumpre de seguida apreciar cada um dos quatro recursos, no segmento correspondente às consequências jurídicas do crime.
Como se encontra adquirido pela doutrina e jurisprudência e insistentemente se repete, na determinação da medida concreta da pena o tribunal deve atender, em primeira linha, à culpa do agente, que constitui o limite superior e inultrapassável da pena a aplicar, sob pena de, ultrapassando-o, se afrontar a dignidade humana do delinquente. Por seu turno, o limite mínimo da moldura concreta há-de ser dado pela necessidade de tutela dos bens jurídicos face ao caso concreto e pretende corresponder a exigências de prevenção positiva ou de integração.
Assim, esse limite inferior decorrerá de considerações ligadas às exigências de prevenção geral, não como prevenção negativa ou de intimidação, mas antes como prevenção positiva ou de integração, já que a aplicação de uma pena visa a protecção de bens jurídicos com um significado prospectivo que se traduz na tutela das expectativas da comunidade na manutenção da validade e vigência das normas infringidas. Estão em causa a integração e reforço da consciência jurídica comunitária e o seu sentimento de segurança face às ocorridas violações das normas.
Finalmente, o tribunal deve fixar a pena concreta de acordo com as exigências de prevenção especial, quer na vertente da socialização, quer na advertência individual de segurança ou inocuização do delinquente Dias, Jorge de Figueiredo As Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra Editora, 1995, págs. 228 e segs, Rodrigues, Anabela Miranda, A Determinação da Medida da Pena Privativa da Liberdade, Coimbra Editora pag. 570 a 576 Jescheck, HH Tratado, Parte General , II, pag. 1189 a 1199.
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Dito de outro modo, “a pena, no mínimo, deve corresponder às exigências e necessidades de prevenção geral, de modo a que a sociedade continue a acreditar na validade da norma punitiva; no máximo, não deve exceder a medida da culpa, sob pena de degradar a condição e dignidade humana do agente; e, em concreto, situando-se entre aquele mínimo e este máximo, deve ser individualizada no quantum necessário e suficiente para assegurar a reintegração do agente na sociedade, com respeito pelo mínimo ético a todos exigível (Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 22-09-2004, Proc. n.º 1636/04 - 3.ª, Rel. Antunes Grancho in ASTJ, n.º 83 e http://www.pgdlisboa.pt/pgdl/jurel/stj_busca_processo.php?buscaprocesso=1636/04&seccao=3)
Nesta tarefa de individualização, o tribunal dispõe dos módulos de vinculação na escolha da medida da pena constantes do artigo 71.º do Código Penal, consignando os critérios susceptíveis de “contribuir tanto para determinar a medida adequada à finalidade de prevenção geral (a natureza e o grau de ilicitude do facto impõe maior ou menor sentimento comunitário de afectação dos valores), como para definir o nível e a premência das exigências de prevenção especial (as circunstâncias pessoais do agente, a idade, a confissão, o arrependimento) ao mesmo tempo que transmitem indicações externas e objectivas para apreciar e avaliar a culpa do agente. Observados estes critérios de dosimetria concreta da pena, há uma margem de actuação do julgador dificilmente sindicável, se não mesmo impossível de sindicar” ” (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17-04-2008, Rel. Souto Moura, cit. por Martins, A. Lourenço, Medida da Pena, Coimbra Editora, Coimbra, 2011, pp 242).
Ao crime de tráfico de estupefacientes previsto e punido no artigo 21.º n.º 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, cometido por cada um dos arguidos corresponde uma pena de prisão, a fixar entre um mínimo de quatro anos e um máximo de doze anos.
Como é sabido, os factores concretos de medida da pena, enunciados de forma exemplificativa no artigo 71º nº 2 do Código Penal, compreendem circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, se relacionam com a execução do facto, a personalidade do agente e, por ultimo, os elementos relativos à conduta do agente anterior e posterior ao facto.
Deve ser assim ponderado o circunstancialismo de facto provado na sua globalidade, já tendo em devida conta a decisão da matéria de facto provada e não provada constante do acórdão recorrido, mas com as alterações supra referidas nos pontos 14, 15 e 16..
20. Analisando o circunstancialismo de facto à luz dos enunciados critérios, serão de considerar fundamentalmente os seguintes elementos com interesse para a escolha e dosimetria da pena do arguido João F...:
No que respeita às circunstâncias da execução do facto, releva ter presente a quantidade e qualidade das substâncias que o arguido tinha em seu poder e negociou, na medida em que permitem ponderar por uma maior intensidade do perigo de ofensa dos bens jurídicos protegidos com a incriminação: No fundamental, a matéria de facto provada evidencia que durante um período de tempo de cerca de um mês, com frequência quase diária, o arguido obteve, deteve e vendeu ao arguido José C..., diversas quantidades de heroína e de cocaína, que variavam entre as 5 e as 20 g, sendo a quantidade habitual e 20 g de heroína e de 20 g de cocaína; Mais se comprova a detenção por este arguido em 17 de Fevereiro de 2012 de 19,845 g de heroína e de 19,420 g de cocaína (cloridrato) além da quantia de € 2085 em dinheiro e, ainda, de 2,063 g de heroína no dia 18 de Fevereiro de 2012,.
No mais, será de notar que o comportamento do arguido revela persistência de vontade e uma rudimentar organização de meios.
No que respeita aos factores relativos à personalidade, interessa salientar que ainda na data da aplicação da medida de coacção de prisão preventiva à ordem dos presentes autos, mantinha consumos regulares de estupefacientes e encontrava-se sujeito a acompanhamento pelos serviços de reinserção social no âmbito de uma suspensão de execução de pena de prisão de quatro anos e dez meses, com regime de prova. (..) Verbaliza arrependimento, mas assume um discurso de desculpabilização assente na necessidade de satisfazer as necessidades de consumo o que agrava moderadamente as exigências de prevenção especial.
Como elementos das condições pessoais e económicas, dever-se-á ter em conta que o arguido, estudou até ao 4º ano de escolaridade. Trabalhou na construção civil e posteriormente no sector da restauração. Na data dos factos dos presentes autos, residia com a progenitora, viúva e reformada e convivia com a irmã, primos e sobrinhos, com quem mantém um relacionamento de proximidade afectiva e de entreajuda. Continua a deter o suporte familiar, nomeadamente da progenitora, irmã e sobrinhos, que o visitam sempre que podem.. Profissionalmente não desempenhava qualquer tipo de actividade, beneficiando da situação económica da progenitora, bem como das suas poupanças. Fazia, pontualmente, alguns biscates na construção civil ou na agricultura, os quais não lhe permitiam um rendimento mensal regular que lhe permitisse a satisfação das suas necessidades básicas. Não apresenta perspectivas de enquadramento laboral de suporte à sua subsistência em liberdade, manifestando intenção de voltar para a Suíça.
No que respeita aos elementos relativos à conduta do agente anterior e posterior ao facto há que ter fundamentalmente presente os antecedentes criminais: o arguido João F... tinha sido, por decisão de 23.12.2009, reportada a factos ocorridos em 2005, condenado na pena única de quatro anos e dez meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, pela prática dos crimes de detenção de arma proibida e tráfico de estupefacientes, previstos e punidos pelos arts. 86º, da Lei nº 5/2006, de 23.02, e art. 21º, do D.L. nº 15/93, de 22.01.
Impõe-se pois considerar as particulares exigências de reprovação e de prevenção especial decorrentes da circunstância de o arguido ter cometido os factos destes autos, não só depois de ter sido advertido por condenação judicial anterior, mas no período de suspensão da execução de pena de prisão por factos de idêntica natureza.
Sopesando em conjunto todas as enunciadas circunstâncias, concluímos que a pena a aplicar como necessária, e equitativa para a culpa exteriorizada pelo arguido, assim ainda como proporcional às exigências de prevenção geral positiva ou prevenção de integração se deve fixar em cinco anos e seis meses de prisão.
21. Os elementos com interesse para a escolha e dosimetria da pena do arguido José C... são os seguintes:
A matéria de facto provada evidencia que durante um período de tempo de cerca de dois anos, com frequência quase diária, o arguido obteve do arguido João F..., deteve e vendeu, diversas quantidades de heroína e de cocaína, em porções que variavam entre as 5 e as 20 g, sendo a quantidade habitual de 20 g de heroína e de 20 g de cocaína; Mais se comprova a venda de doses de heroína ou cocaína a oito consumidores diferentes, normalmente pelo preço unitário de € 5, bem como a detenção em 16 de Junho de 2011 de 0,2 g de heroína e em 6 de Março de 2012 de 5,670 g de cocaína, dividido em 35 embalagens.
No mais, será de notar que o comportamento do arguido revela persistência de vontade ao longo de um considerável período de tempo e uma incipiente organização de meios.
No que respeita aos factores relativos à personalidade, interessa salientar que o arguido estudou até ao 4.º ano de escolaridade, trabalhou na construção civil e, posteriormente, empregou-se na área têxtil, na área da restauração (cafés, restaurantes e bares) e, por fim, na exploração de vários estabelecimentos comerciais do mesmo ramo, mas de diversão nocturna. Este arguido iniciou acompanhamento no CRI de Guimarães, tendo frequentado com regularidade o programa opióide com metadona, mas não registou abstinência, mantendo o consumo regular de heroína e cocaína.
No período anterior à presente reclusão mantinha-se dependente da cocaína e heroína, contando, como ainda conta, com o apoio incondicional da família nuclear, que o descreve como calmo e de bom trato. Não obstante o tratamento a que aceitou submeter-se, revela diminuto poder reflexivo e consequencial face aos efeitos negativos dos estupefacientes na definição de um projecto de vida integrador; não valoriza a eventual existência de vítimas decorrentes da adopção de comportamentos como os que lhe são apontados.
No que respeita aos elementos relativos à conduta do agente anterior e posterior ao facto há que ter fundamentalmente presente os antecedentes criminais onde avulta o anterior cometimento de dois outros crimes de tráfico de estupefacientes: um em 1992 que justificou uma condenação na pena de nove anos e seis meses de prisão e outro em 2000 , com a condenação numa pena de cinco anos e seis meses de prisão.
Sopesando em conjunto todas as enunciadas circunstâncias, concluímos que a pena a aplicar como necessária, e equitativa para a culpa exteriorizada pelo arguido, assim ainda como proporcional às exigências de prevenção geral positiva ou prevenção de integração se deve fixar em seis anos e seis meses de prisão.
22. Na ponderação dos critérios do artigo 71º do Código Penal, os elementos com interesse para a escolha e dosimetria da pena do arguido José S... são em primeiro lugar os decorrentes da natureza e quantidade da substância : O arguido detinha e dispunha de 198, 765 g de heroína, com um grau de pureza de 9 %, que permitiria a divisão por 179 doses diárias, segundo a portaria 94/96 (cfr. relatório pericial a fls. 854 e 855). O grau de ilicitude decorrente da intensidade do perigo criado assume uma gravidade significativa e exige alguma severidade na determinação concreta da pena, se tivermos em conta a qualidade, quantidade e valor do estupefaciente detido e a possibilidade de profusão por um número considerável de consumidores.
O arguido executou esses actos de detenção para venda de heroína, mantendo a resolução e a actividade em colaboração e actuação conjunta com outras pessoas. A intensidade do dolo, com pleno conhecimento das características da droga que transportava e negociava agrava moderadamente a responsabilidade do arguido.
Nos factores relativos à personalidade, interessa salientar que o arguido José S... cresceu integrado no agregado de origem, sendo o filho mais velho de um casal de média condição social e económica; o seu pai era empregado de balcão e a sua mãe sempre trabalhou em diferentes actividades profissionais, tendo dedicado ao filho uma atenção positiva, existindo forte vinculação entre ambos. O arguido concluiu o 12º ano de escolaridade num centro de formação profissional, que o habilitou para a profissão de afinador de máquinas. Na data dos factos, vivia com a progenitora, que é funcionária numa cantina, e com a namorada, com quem estabeleceu uma união de facto.
Não trabalhava, mas a sua irmã, com vida estabilizada em França, estava a diligenciar no sentido de lhe conseguir uma colocação profissional, o que logrou conseguir; assim, em meados de Fevereiro de 2012, o arguido, com a companheira grávida, foi para casa dessa irmã, onde vive desde então.
No que respeita aos elementos relativos à conduta do agente anterior e posterior ao facto há que ter presente a ausência de registo de antecedentes criminais..
Procedendo à valoração conjunta das enunciadas circunstâncias concluímos que por justa e equitativa, assim como proporcional às exigências de prevenção, se deve fixar a pena deste arguido em quatro anos e dez meses de prisão.
Quanto à pretensão de suspensão da execução:
Sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos, o juiz tem o dever de suspender a execução da pena de prisão, ainda que sob a obrigação de cumprimento de deveres ou de regras de conduta ou sob regime de prova (artigos 50º a 54º do Código Penal, na redacção hoje vigente, da Lei 59/2007, de 4 de Setembro).
Para este efeito, verificado o pressuposto formal de que a pena de prisão previamente determinada não seja superior a cinco anos, é necessário que o julgador, reportando-se ao momento da decisão e não ao da prática do crime e sopesando em conjunto as circunstâncias do facto e da personalidade, atendendo às condições de vida do agente e à sua conduta anterior e posterior ao facto, possa fazer uma apreciação favorável relativamente ao comportamento do arguido, no sentido de antecipar ou prever que a ameaça da pena seja adequada e suficiente para realizar as finalidades da punição, o mesmo é dizer, para garantir a tutela dos bens jurídicos e a reinserção do agente na sociedade, entendida aqui como perspectiva que o condenado não volte a delinquir no futuro.
Uma vez que a função da culpa se esgotou no momento da determinação da medida da pena de prisão, o juízo de prognose necessário para eventual aplicação de pena de substituição, designadamente da suspensão de execução, depende em exclusivo de considerações de prevenção especial de socialização e de prevenção geral positiva. Por isso se conclui sempre que, desde que aconselhável à luz de exigências de socialização, a pena de substituição só não deverá ser aplicada se a opção pela execução efectiva de prisão se revelar indispensável para garantir a tutela do ordenamento jurídico ou para responder a exigências mínimas de estabilização das expectativas comunitárias Dias, Figueiredo, As Consequências Jurídicas do Crime, Ed. Notícias, 1993, pag. 332 e 333 , Robalo Cordeiro, A Determinação da Pena in Jornadas, CEJ, II, Lisboa 1998, pag. 48, Anabela Miranda Rodrigues, A determinação da medida concreta da pena privativa da liberdade e a escolha da Pena RPCC I 1991, nº 2, 243. Na jurisprudência, por todos, o Acórdão do S.T.J. de 13-12-2007, rel. Cons. Santos Cabral, in www.dgsi.pt com o seguinte sumário : “Na lei penal vigente, a culpa só pode (e deve) ser considerada no momento que precede o da escolha da pena – o da medida concreta da pena de prisão –, não podendo ser ponderada para justificar a não aplicação de uma pena de substituição: tal atitude é tomada tendo em conta unicamente critérios de prevenção. Não oferece qualquer dúvida interpretar o estipulado pelo legislador (art. 71.º do CP) a partir da ideia de que uma orientação de prevenção – e essa é a da prevenção especial – deve estar na base da escolha da pena pelo tribunal; sendo igualmente uma orientação de prevenção – agora geral, no seu grau mínimo – a única que pode (e deve) fazer afastar a conclusão a que se chegou em termos de prevenção especial. Neste contexto, a prevalência não pode deixar de ser atribuída a considerações de prevenção especial de socialização, por serem sobretudo elas que justificam, em perspectiva político-criminal, todo o movimento de luta contra a pena de prisão. E prevalência a dois níveis diferentes: - o tribunal só deve negar a aplicação de uma pena alternativa ou de uma pena de substituição quando a execução da prisão se revele, do ponto de vista da prevenção especial de socialização, necessária ou, em todo o caso, provavelmente mais conveniente do que aquelas penas; coisa que só raramente acontecerá se não se perder de vista o carácter criminógeno da prisão, em especial da de curta duração;.
Aplicando agora as considerações gerais na situação dos presentes autos:
Entre as circunstâncias da personalidade, poderemos ter presente que o arguido José S... , sem antecedentes criminais e beneficiando de actividade profissional e apoio familiar, reúne um conjunto de circunstâncias comuns a uma generalidade de pessoas.
Porém, de outro lado, verificam-se intensas exigências de prevenção geral decorrentes da gravidade dos factos cometidos pela arguida.
De forma que se poderá considerar como unânime a nível do Supremo Tribunal de Justiça, a jurisprudência tem enfatizado a particular gravidade do tráfico de estupefacientes, designadamente quando se trata de detenção e transporte de heroína ou cocaína, pela dependência que estas substâncias induzem, pelas nefastas consequências que normalmente provocam na saúde e na vida dos consumidores e pelas incidências de ordem social que o consumo fomentaAcórdão do Supremo Tribunal de Justiça 14-02-1990 Proc. 20606 e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça 23-03-2000, citados por Martins, A. Lourenço, em Medida Pena, Coimbra, 2011, pp. 259 e 260. Atente-se ainda, a título meramente exemplificativo nas decisões proferidas em julgamento por crimes de tráfico de estupefacientes da responsabilidade de correios internacionais em que “apenas” se demonstra a detenção e transporte de estupefacientes: Acórdão do STJ de 18-10-2007, relator Costa Mortágua, Acórdão do STJ de 15-11-2007 relator Simas Santos, Acórdão do STJ de 04-09-2008 relator Santos Carvalho, Acórdão do STJ de 18-06-2009 relator Oliveira Mendes, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10-02-2010, relator Henriques Gaspar, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15-09-2010, relator Armindo Monteiro, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9-06-2010, relator Santos Cabral Acordão do Supremo Tribunal de Justiça de 9-06-2010, relator Henriques Gaspar, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13-01-2011, relator Henriques Gaspar, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16-03-2011 relator Santos Carvalho, todos disponíveis em www.dgsi.pt..
Daí que, persistentemente, a jurisprudência tenha rejeitado a possibilidade de suspensão de execução de penas de prisão aplicadas pela prática de crimes de tráfico de estupefacientes do artigo 21º do DL 15/93, com fundamento em particulares exigências de prevenção geral de intimidação, que se colocam com particular acuidade pela gravidade do crime, considerado de autentico “flagelo” ou “praga social” – Conforme entre outros, Acórdão do STJ de 27/09/2007, relator Santos Carvalho A suspensão da execução da pena nos casos de tráfico comum e de tráfico agravado de estupefacientes, em que não se verifiquem razões ponderosas para uma atenuação extraordinária da pena, seria atentatória da necessidade estratégica nacional e internacional de combate a esse tipo de crime, faria desacreditar as expectativas comunitárias na validade da norma jurídica violada e não serviria os imperativos de prevenção geral., de 3/10/2007, relator Pires da Graça, in www.dgsi.pt, Valorando a matéria fáctica provada, de harmonia com o disposto nos artigos 40º e 71º do Código Penal, revela-se adequada a pena de cinco anos de prisão, pela autoria material de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artº 21º nº 1 do Decreto-Lei 15//93, de 22/1, com referência à tabela I-B Anexa., em que a quantidade total de droga transportada era de 992,182 gramas de cocaína, pena essa insusceptível de suspensão na sua execução, nos termos do artº 50º nº 1 do Código Penal, na redacção da Lei nº 48/2007 de 29 de Agosto, por a tal se oporem exigências de prevenção e reprovação do crime”, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15-07-2009, “O STJ vem-se posicionando – considerando o grave crime de tráfico de estupefacientes socialmente intolerável, de uma indescritível danosidade pessoal, familiar, social e colectiva em que a maioria esmagadora das suas vitimas são as camadas sociais mais jovens e os autores dessa destruição ao nível da saúde física, psíquica e até da liberdade individual alguém que despreza em grau elevado a condição humana, movido pela ganância do lucro fácil –, num patamar de rejeição de suspensão, a menos que concorram condições de excepcional valia, reduzindo o juízo de reprovação individual sendo previsível um quadro de não sucumbência, vista a personalidade delineada do agente sustentando um juízo de prognose favorável, conquanto não sejam afectados os fins das penas, de protecção dos bens jurídicos e de ressocialização do agente – art. 40.º, n.º 1, do CP”Armindo Monteiro, www.pgdlisboa.pt, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14-10-2010, Isabel Pais Martins “nos crimes de tráfico de estupefacientes as finalidades de prevenção geral impõem-se com particular acuidade, pela forte ressonância negativa, na consciência social, das actividades que os consubstanciam. A comunidade conhece as gravíssimas consequências do consumo de estupefacientes, particularmente das chamadas “drogas duras” e os Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 01-04-2008 relator Nuno Gomes da Silva in www.dgsi.pt, de 03-04-2008 relator João Carrola, de 08-04-2008 relator Ricardo Cardoso in www.pgdlisboa.pt, de 20-05-2008 relator Santos Rita, de 26-06-2008 relator Fernando Estrela in www.dgsi.pt, de 02-07-2008 relator Carlos Almeida, de 03-07-2008 relator Almeida Cabral e de 8-07-2009 relatora Margarida Ramos Almeida in www.pgdlisboa.pt..
Naturalmente que não podem existir crimes que pela sua natureza logo sejam insusceptíveis de suspensão de execução de pena de prisão não superior a cinco anos e tudo deve depender da análise que o caso concreto permita quanto ao preenchimento dos pressupostos legais.
No caso vertente, haverá que ter em conta os elementos da personalidade e as circunstâncias de vida do arguido, o seu comportamento anterior e posterior ao cometimento do crime, a circunstância de se tratar de um acto “isolado”, mas também que se trata de um comportamento integrando actos de detenção de cerca de 200 g de heroína
Na realidade, perante a natureza e quantidade da substância em causa, envolvendo necessariamente a criação de um perigo intenso para a saúde de milhares de pessoas e para a segurança da vida em sociedade e os restantes elementos do circunstancialismo provado, seria incompreensível para a comunidade que a reacção criminal se restringisse a uma suspensão de execução da pena de prisão, com a consequente libertação da pessoa co-responsável por esses factos.
O sentimento social de reprovação pelo crime e as intensas exigências de prevenção geral do caso concreto levam-nos a concluir que a simples censura do facto e a ameaça de execução da pena, ainda que acompanhadas por regime de prova, não realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, impondo-se a necessidade do cumprimento efectivo da pena de prisão.
23. Na determinação da medida concreta da pena, haverá que ter presente fundamentalmente que o arguido Joaquim F..., durante um período de tempo situado entre data não concretamente apurada do ano de 2010 e Julho de 2012, foi procurado quer pessoal, quer através do telemóvel, por vários consumidores que o abordavam directamente aos quais procedeu à venda de produto estupefaciente, nomeadamente heroína e cocaína. Procuraram-no para aquele efeito, entre outros, Vergílio F..., José M..., Patrício N..., Paulo P..., José A... e R... C..., aos quais o arguido vendeu, por mais do que uma vez, diversas doses de cocaína e heroína em quantidades que habitualmente variavam entre o meio grama (0,5g) e os cinco gramas (5g). A cocaína era vendida ao preço de €50,00 o grama, sendo a quantidade mínima de meio grama (0,5g) vendida a €25,00. A heroína era vendida a €40,00 o grama, sendo a quantidade mínima de meio grama (0,5g) vendida a €20,00 e, em quantidades iguais ou superiores a dois gramas e meio (2,5g) pelo preço unitário de €75,00. Deste modo e na prossecução da sua actividade, o arguido Quim B... procedeu à venda de cocaína e heroína em vários locais desta comarca, nomeadamente junto ao Campo de Futebol X, no Campo de Futebol Y, na Ponte de P..., no cemitério R..., nas imediações do Café S... e em alguns caminhos adjacentes a estes locais, os quais eram sempre de difícil vigilância por parte das entidades policiais sem que fosse notada a sua presença no local.
No mais, será de notar que o comportamento do arguido revela persistência de vontade ao longo de um considerável período de tempo e uma rudimentar organização de meios. O desvalor da conduta pela qualidade e quantidade das substâncias estupefacientes e a persistência na conduta, agravam a responsabilidade do arguido e justificam moderada severidade na determinação concreta da pena.
Nos factores relativos à personalidade, interessa salientar que Joaquim F... é filho de pais emigrados na Alemanha, o que ocasionou que tenha sido criado, até à adolescência, com a avó materna, em Felgueiras, num agregado coeso e equilibrado. O percurso escolar decorreu até aos 14 anos, com uma retenção no 7º ano, altura em que foi abandonado iniciando-se a trajectória profissional como aprendiz no ramo hoteleiro, sector onde se manteve até à emigração para a Suíça depois de atingida a maioridade. Permaneceu na Suíça cerca de dois anos, após o que regressou a Portugal, exercendo actividade como porteiro em estabelecimentos de diversão nocturna no Porto. Seguiram-se várias actividades em estabelecimentos de restauração na região de Fafe e Felgueiras, cuja mobilidade se orientava de acordo com oportunidades remuneratórias, na maioria com registo informal sem descontos para os regimes de protecção social. Este arguido não desempenha actividade laboral regular e estruturada há mais de cinco anos.(…) Iniciou uma relação afectiva com a actual companheira há mais de 10 anos, de onde resultou o nascimento de um filho. Na data dos factos, o arguido não apresentava historial de consumo de estupefacientes, constituindo agregado com a actual companheira e dois filhos menores (um de uma anterior relação da companheira), centrando-se a sobrevivência económica do agregado na actividade assalariada da companheira (operária de confecção) e trabalhos ocasionais do arguido na restauração. As rotinas do arguido surgem centradas na habitação, com períodos de ociosidade, devido ao facto de se envolver ocasional e informalmente na actividade de empregado de mesa (especialmente aos fins de semana).
No que respeita aos elementos relativos à conduta do agente anterior e posterior ao facto há que ter presente o registo de condenação em penas de multa pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez e de um crime de ofensas à integridade física simples.
Sopesando em conjunto todas as enunciadas circunstâncias, concluímos que a pena necessária e equitativa para a culpa exteriorizada pelo arguido, assim ainda como proporcional às exigências de prevenção geral e especial se deve fixar em quatro anos e seis meses de prisão.
Quanto à pretensão de suspensão da execução, valem aqui as considerações gerais já supra expostas:
O juízo de prognose necessário para eventual aplicação de pena de substituição, designadamente da suspensão de execução, depende em exclusivo de considerações de prevenção especial de socialização e de prevenção geral positiva.
Entre as circunstâncias da personalidade constantes da decisão da matéria de facto provada, devemos ter presente que o arguido Joaquim F... não revela capacidade de efectiva inclusão em actividade laboral remunerada. Apesar do positivo enquadramento familiar, os factos provados não permitem descortinar a mínima alteração de comportamento, permanecendo o arguido, sem ocupação nem meios próprios de subsistência, numa situação de risco do cometimento de factos idênticos.
O intenso sentimento social de reprovação pelo crime de tráfico de estupefacientes e as particulares exigências de prevenção geral do caso concreto levam-nos a concluir, também quanto a este arguido, que a simples censura do facto e a ameaça da prisão não realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, impondo-se a necessidade do cumprimento efectivo da pena de prisão, para corresponder a exigências mínimas de tutela dos bens jurídicos e de confiança da comunidade na validade e vigência das normas jurídicas atingidas.
Nestes termos, improcede o recurso neste âmbito.
III - DISPOSITIVO
24. Pelos fundamentos expostos, na parcial procedência dos recursos, decidem os juízes deste Tribunal da Relação de Guimarães:
1º - Modificar a decisão na fundamentação da matéria de facto provada e não provada nos termos acima enunciados;
2.º - Reformular as penas aplicadas pelo tribunal colectivo e, pelo cometimento, por cada um dos arguidos, de um crime de tráfico de estupefacientes previsto e punido pelo art. 21.º, n.º 1 do DL. n.º 15/93, de 22/01, condenar,
- o arguido João F..., na pena de cinco anos e seis meses de prisão;
- o arguido José C... na pena de seis anos e seis meses de prisão;
- o arguido José S... na pena de quatro anos e dez meses de prisão, e,
- o arguido Joaquim F..., na pena de quatro anos e seis meses de prisão.
3.º- Manter em tudo o mais o acórdão recorrido.
Sem tributação.
Guimarães, 23 de Setembro de 2013. |