Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | MARGARIDA SOUSA | ||
Descritores: | DÍVIDA LIQUIDÁVEL EM PRESTAÇÕES EXIGIBILIDADE INTERPELAÇÃO CITAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 12/17/2019 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PARCIAL PROCEDÊNCIA DA APELAÇÃO | ||
Indicações Eventuais: | 2.ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | I- O art. 781.º do Código Civil deve ser interpretado no sentido de que, na falta de realização de uma das prestações, fica o credor com o direito de exigir essa prestação e as subsequentes ainda não vencidas, mas não está dispensado de interpelar o devedor para que este cumpra imediatamente a totalidade da dívida; II- A ação executiva poderá, pois, ser intentada se o devedor já tiver procedido a uma interpelação com aquele conteúdo, indicando ou juntando o credor com o requerimento executivo os meios de prova tendentes a comprovar que já procedeu a tal interpelação do devedor; III- Mas também o poderá ser ainda que o credor não tenha procedido desse modo, caso em que a citação valerá como interpelação para desencadear o vencimento antecipado das prestações vincendas, certo que quando a inexigibilidade derive da falta de interpelação, a dívida se considera vencida desde aquele momento – art. 610º, nº 2, b), do CPC ex vi art. 551º, nº 1, do mesmo código –, com a única limitação de que os juros de mora só são devidos desde a citação. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO: Em 14.02.2018, A. B. II - IMOBILIÁRIA, SA intentou ação executiva contra D. P., A. M., J. M., F. P. e M. P., com fundamento em sentença proferida em 23 de janeiro de 2017 na Ação Ordinária nº 5687/15.7T8VNF, da Comarca de Braga, Juízo Local Cível de Vila Nova de Famalicão - Juiz 1, transitada em julgado, que homologou acordo por transação das partes, alegando que: Por sentença homologatória proferida nos autos que com o n.º 5687/15.7T8VNF correram os seus termos pelo Juiz 1 do Juízo Local Cível de Vila Nova de Famalicão do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, os ora Executados D. P., A. M., J. M., F. P. e M. P. foram condenados a pagar à aqui Exequente a quantia líquida de EUR. 12.800,00€ (doze mil e oitocentos euros) em 26 prestações, sendo as 25 primeiras no valor de EUR. 500,00€ (quinhentos euros) e a 26ª e última no valor de EUR. 300,00€ (trezentos euros), vencendo-se a primeira no dia 5 de Fevereiro de 2017 e as restantes em igual dia dos meses subsequentes. Sucede que, à data, não obstante já estarem vencidas 13 prestações, num total de EUR. 6.500,00€, os Executados, apenas, procederam, ao pagamento de EUR. 5.000,00€, correspondente a 10 prestações, nada mais tendo pago, apesar das várias interpelações que para o efeito a Exequente lhe dirigiu, tendo-se, assim, por vencido todo o restante crédito da Exequente, no valor de EUR. 7.800,00€ - cfr. artigo 781.º do Código Civil que postula que Se a obrigação puder ser liquidada em duas ou mais prestações, a falta de realização de uma delas importa o vencimento de todas. Os demais factos constam da transação devidamente homologada por douta sentença, a qual constitui o título executivo. Em 11.09.2019 foi proferida decisão a rejeitar liminarmente o requerimento executivo por insuficiência do título, com fundamento no artigo 726.º, n.º 1, al. a), do C.P.C, mais precisamente, por não se mostrar acompanhado da interpelação dos devedores. Inconformada com a decisão da primeira instância, a Exequente interpôs o presente recurso, concluindo a sua alegação nos seguintes termos: I - A sentença revidenda cometeu um erro de julgamento quando decidiu indeferir liminarmente o requerimento executivo por não se mostrar acompanhado da interpelação dos devedores - nisso vislumbrando insuficiência do respectivo título II - Subjaz à decisão recorrida o entendimento de que o facto de se terem por vencidas as prestações subsequentes por causa da falta de pagamento de uma delas não importa, sem mais, a constituição dos executados em mora, sendo necessário demonstrar-se a interpelação destes ao respectivo pagamento. Sucede, porém, que, III - Por via do título dado à execução - uma sentença homologatória de transacção, datada de 23/Janeiro/2017 - os executados foram solidariamente condenados no pagamento à exequente da quantia de EUR. 12.800,00€, a pagar em 26 prestações, sendo 25 no valor de EUR. 500,00€, seguidas de uma última de EUR. 300,00€, e vencendo-se a primeira no dia 05/Fevereiro/2017 e as restantes em igual dia dos meses subsequentes. IV - Não tendo os executados pago a 11.ª das acordadas prestações (nem, na realidade, nenhuma das demais) na data em que se venceu essa sua obrigação, forçoso é concluir, então, que se verificou o vencimento das que lhe eram subsequentes, conforme o predisposto no artigo 781.º do Código Civil. V - O vencimento da obrigação de pagamento referido em IV tem como consequência a imediata exigibilidade da totalidade do crédito que, à data do incumprimento, se mostrava ainda em dívida à exequente. VI - O título desta execução é, assim, e atento o que consta das conclusões III, IV e V, perfeitamente certo, líquido, e, por vencido, exigível - o que co-envolve a verificação de todas as condições de exequibilidade do mesmo. VII - O benefício concedido aos devedores de pagar, solidária e fraccionadamente, a dívida que estes confessaram em 23/Janeiro/2017 ter junto da exequente extinguiu-se com a falta de pagamento de uma dessas prestações. VIII - A extinção do benefício referido na conclusão VII ficou a dever-se, em exclusivo, a culpa dos devedores - culpa que, de resto, até se presume, nos termos do disposto no artigo 798.º e 799.º, n.º 1, do Código Civil. IX - No caso dos autos não é, atento o que se concluiu acima, necessário proceder à interpelação referida pelo a quo - e muito menos à admonitória, como sugerem os executados, de que nem sequer parece que tenha cabimento falar-se no caso sub judice. X - A decisão revidenda interpretou mal as normas contidas nos artigos 779.º, 780.º, 781.º e 804.º, n.º 2, do Código Civil, e dos artigos 703.º, n.º 1, al. a) do C.P.C., cuja melhor interpretação é a de que é exigível, sem mais, a obrigação vencida. Acresce que, XI - Sem prescindir de tudo quanto consta das conclusões precedentes, certo é que a exequente interpelou por diversas vezes os executados ao pagamento do seu crédito, vencido por falta de pagamento de uma das prestações acordadas - como logo alegou no requerimento executivo. XII - Atenta a alegação referida na conclusão XI, não parece que o a quo pudesse, sem mais e de forma liminar, rejeitar o requerimento executivo. XIII - A interpelação não está sujeita a nenhuma exigência de forma, designadamente escrita, como parece subjazer ao entendimento do a quo, seja para se afirmar a sua validade, seja a sua eficácia. XIV - A interpelação dos devedores ao pagamento, estando, como está, devidamente alegada, pode ser subsequentemente demonstrada por qualquer meio de prova idóneo, nomeadamente por via do testemunho de quem a levou a cabo. XV - Certo é que os executados não infirmam, designadamente na petição de embargos, a alegação da exequente de que procedeu à sua interpelação, da mesma maneira que não afirmam que não existiu essa interpelação - o que é coisa diferente de abordar, como efectivamente abordaram, ainda que de modo inultrapassavelmente genérico e abstracto, a questão. XVI - A existência da interpelação deverá ter-se, atento o teor da conclusão XV, por adquirida por admissão dos executados - tudo nos termos da normatividade que resulta do teor dos artigos 414.º, 465.º, 552.º, n.º 1, al. d), e 574.º, n.º 2, aplicável ex vi os artigos 551.º, n.º 1, e 732.º, n.º 2, do C.P.C.. XVII - Ao não entender conforme o supra concluído em XIII, XIV, XV e XVI, afigura-se à apelante que o Tribunal recorrido violou as normas constantes dos artigos 414.º, 465.º, 552.º, n.º 1, al. d), e 574.º, n.º 2, aplicáveis a estes autos por força do disposto nos artigo 551.º, n.º 1, e 732.º, n.º 2, do C.P.C., bem como dos artigos 352.º, 355.º, nºs 1 e 2, 356.º e 358.º do Código Civil. Acresce, ainda, que, XVIII - O indeferimento liminar do requerimento executivo também parece insustentável na medida em que se desconsideram os efeitos próprios da citação e, assim, da interpelação judicial para pagamento que lhe está co-envolvida. XIX - Mesmo prefigurando a necessidade de constituição dos executados em mora - incluindo no contexto de obrigações perfeitamente vencidas e exigíveis - por via da interpelação, não poderá duvidar-se que os mesmos foram já interpelados em atenção ao facto de terem sido citados para a acção executiva e ao disposto no artigo 805.º, n.º 1, do Código Civil. XX - Julgou mal o a quo porque a citação dos executados estava já consumada quando proferiu a decisão ora em crise, facto que deveria ter equacionado ao abrigo do artigo 611.º do C.P.C. - ademais de dever ordenar uma tal citação se a mesma não se mostrasse ainda feita. XXI - A interpelação para pagamento, que é a que interessa nestes autos, pode ser feita por via judicial, designadamente, através da citação dos devedores para a acção, como até ocorreu na fase declarativa, ou para a execução, conforme se dispõe nos artigos 805.º, n.º 1, do Código Civil, e 610.º, n.º 2, al. b), do C.P.C.. XXII - A decisão em crise transgrediu, assim, as normas contidas no artigo 805.º, n.º 1, do Código Civil, e nos artigos 610.º, n.º 2, al. b), e 611.º do C.P.C., cuja adequada interpretação é a de que por efeito de ambas as citações já efectuadas - quer em fase declarativa, quer em acção executiva - devem os executados devedores ter-se por interpelados e, dessa forma, constituídos em mora quanto à obrigação de pagamento do crédito da exequente. Acresce, por fim, que, XXIII - De acordo com a cláusula II da transacção homologada judicialmente e dada à execução, os devedores deveriam pagar a primeira das várias prestações a que se vincularam perante a exequente no dia 05/Fevereiro/2017 e as demais no mesmo dia 05 dos meses subsequentes, até integral pagamento. XXIV - A obrigação de pagamento das sucessivas prestações acordadas - incluindo daquelas que não foram pagas - tinha, atento o teor da conclusão XXIII, prazo certo, fixado por ambas as partes. XXV - A decisão do a quo desconsiderou totalmente a existência de prazo certo para pagamento das prestações e, assim, violou a norma do artigo 805.º, n.º 2, al. a), do Código Civil - posto que não há necessidade de interpelação nas obrigações revestidas, já de si, de um prazo certo. XXVI - A correcta interpretação e aplicação da lei ao caso dos autos imporia que se tivessem os executados por devidamente constituídos em mora, independentemente de terem sido interpelados, nos termos do disposto nos artigos 804.º, n.º 2, e 805.º, n.º 2, al. a), do Código Civil. Termina pedindo seja revogada a sentença recorrida, determinando-se o recebimento da execução e a sua normal e ulterior tramitação Os Executados não apresentaram contra-alegações. * II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSOComo é sabido, as conclusões da alegação do recorrente delimitam o objeto do recurso, ressalvadas as questões que sejam do conhecimento oficioso do tribunal (artigos 635º, n.º 4 e 639º, n.º 1 do NCPC). No caso vertente, a questão a decidir que releva das conclusões recursórias é a seguinte: - Saber da exigibilidade da obrigação exequenda. * III. FUNDAMENTAÇÃO- Os factos A sentença dada à execução, proferida no âmbito da ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, que A. B. II - IMOBILIÁRIA, SA move contra D. P., A. M., J. M., F. P. e M. P., homologou transação com o seguinte teor: Iº A autora reduz os pedidos formulados à quantia líquida de €: 12.800,00 (doze mil e oitocentos euros), do qual D. P., A. M., J. M., F. P. e M. P. se confessam solidariamente devedores. IIº A quantia acima referida será paga em 26 prestações, sendo as 25 primeiras no valor de €:500,00 (quinhentos euros) e a 26ª e última no valor de €:300,00 (trezentos euros), vencendo-se a primeira no dia 5 de Fevereiro de 2017 e as restantes em igual dia dos meses subsequentes. IIIº Os pagamentos serão efectuados por transferência bancária para a conta da autora com o seguinte IBAN: PT50 …. IVº Com o integral pagamento da quantia atrás referida, a autora declara nada mais ter a exigir dos réus por conta do ato de arrendamento identificado nos presentes autos. Vº As custas em dívida em partes iguais por autora e réus, prescindindo todos de custas de parte. - O direito Estamos perante execução para pagamento de quantia certa, fundada numa sentença homologatória da transação celebrada entre as partes em anterior processo declaratório, nos termos da qual, os executados ficaram obrigados ao pagamento de determinada quantia em prestações. Como se sabe, a ação executiva pressupõe o incumprimento da obrigação e o incumprimento não resulta do próprio título quando a prestação é, perante esse, incerta, inexigível ou, em certos casos, ilíquida (Lebre de Freitas, A ação executiva à luz do Código de Processo Civil de 201, pág. 99). No que para o caso interessa, a obrigação diz-se exigível quando já se encontra vencida ou quando o seu vencimento depende da simples interpelação do devedor, ou seja, quando já pode ser exigida (Marco Gonçalves, in Lições de Processo Civil Executivo, pág. 160). Se a obrigação tiver prazo certo, só decorrido este a execução é possível, pois até ao dia do vencimento a prestação é inexigível. Mas a partir dessa data torna-se exigível, independentemente de qualquer interpelação por parte do credor (alínea a) do nº 2 do artigo 805° do Código Civil). Assim sendo, desde já se dirá que, tendo, como tem, a obrigação de pagamento das prestações acordadas ora em questão o seu vencimento a um dia certo do mês, isto é, sendo a obrigação dos Devedores/Executados uma obrigação de prazo certo, independentemente de quaisquer outras considerações, sempre seriam exigíveis todas as prestações acordadas cujo prazo de pagamento já se mostrasse ultrapassado à data em que foi instaurada a ação executiva. Com efeito, como a propósito de situação similar se refere no Acórdão desta Relação de 15.12.2016 (Relatora: Maria Amália Santos) “o exequente não estaria obrigado a interpelar os executados para o pagamento das quantias que, por força dos respectivos termos certos (as datas de vencimento das convencionadas prestações), se venceram”. A única questão controversa prende-se, pois, com as prestações cujos prazos de pagamento ainda não se mostravam ultrapassados à data da instauração da execução. Vejamos, pois, o que, quanto a tais prestações, releva para efeito da apreciação da respetiva exigibilidade. Dispõe o art. 781.º do Código Civil que “se a obrigação puder ser liquidada em duas ou mais prestações, a falta de realização de uma delas importa o vencimento de todas”. Razões de equilíbrio de prestações impõem a interpretação, que cabe na letra do preceito, de que se exprime no mesmo a mera exigibilidade, e não o vencimento automático (Almeida Costa - in Direito das Obrigações, 9a ed., págs. 951, e F. Gravato Morais, in Contrato de Crédito ao Consumo, págs. 194 a 196). “A perda pelo devedor do benefício do prazo em relação às prestações ainda em dívida é justificada com a quebra da relação de confiança em que assenta o plano de pagamento calendarizado. A partir daquela falta causal, o credor fica com o direito de exigir essa prestação e as subsequentes ainda não vencidas, mas não está dispensado de interpelar o devedor para que este cumpra imediatamente a totalidade da dívida. O credor tem, portanto, de manifestar ao devedor a sua vontade de aproveitar este privilégio que a lei lhe concede (cf. A. Varela, Das Obrigações em geral, 2.º vol., 3.ª ed., Almedina, Coimbra, 1980, pp. 52-53).” (Acórdão da Relação de Lisboa, 22.1.2008, Relator - João Aveiro Pereira) Há, pois, uma exigibilidade imediata dessas prestações mas não um vencimento automático que determine que o prazo das prestações ainda não vencidas passe a ser o da prestação faltosa. O vencimento imediato das prestações cujo prazo ainda se não venceu constitui um benefício que a lei concede - mas não impõe - ao credor. Trata-se de uma faculdade do credor que ele pode exercer ou não. Tornando-se, por isso, imperativo que aquele manifeste ao devedor a sua vontade de, efetivamente, a exercer. Consistindo a interpelação “no acto pelo qual o credor comunica ao devedor a sua vontade de receber a prestação”, “a reclamação do cumprimento dirigida pelo primeiro ao segundo” (Galvão Telles, Direito das Obrigações, 5a edição, pág. 218), aquela, desde que tenha por objeto a totalidade da dívida fracionada, será um meio adequado para a manifestação da referida vontade “de se aproveitar do benefício legal ou contratual posto à sua disposição” (Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 26.01.2016) A ação executiva poderá, pois, ser intentada se o devedor já tiver procedido a uma interpelação com aquele conteúdo, indicando ou juntando o credor com o requerimento executivo os meios de prova tendentes a comprovar que já procedeu a tal interpelação do devedor (art.´s 715º e 724º, nº 1, h), do CPC). Nestes casos, a execução principia pelas diligências, a requerer pelo exequente, destinadas a tornar a execução exigível, porquanto o não era em face do título executivo (art. 713º do CPC). In casu, no respetivo requerimento executivo, a Exequente alegou ter dirigido aos Executados “várias interpelações”, sem, no entanto, especificar expressamente o seu conteúdo, situação que, no caso de dúvida, poderia justificar um despacho de aperfeiçoamento (cfr. neste sentido Lebre de Freitas, obra citada, pág. 115). Sucede, porém, que da leitura, na sua globalidade, do requerimento executivo, resulta inequívoco que a Exequente se referia a interpelações para pagar as prestações já vencidas e não a interpelações para pagar a totalidade das prestações – não estando, pois, a referir-se a manifestações de vontade de solicitar o vencimento antecipado das prestações ainda não vencidas e relativamente às quais havia sido convencionado um prazo –, não havendo, por isso, razões para proceder a qualquer convite ao aperfeiçoamento e, muito menos, para se considerar invocada a interpelação que, estando em causa o vencimento antecipado das prestações cujo prazo ainda não se mostrava ultrapassado, se impunha ter sido alegada e comprovada. Defende, porém, a Exequente que tal manifestação de vontade terá, no mínimo, ocorrido com a citação. E, com efeito, quando a inexigibilidade derive da falta de interpelação, a dívida considera-se vencida desde a citação – art. 610º, nº 2, b), do CPC ex vi art. 551º, nº 1, do mesmo código. A citação equivale, portanto, a interpelação. Assim, no caso das dívidas fracionadas, a citação equivalerá a interpelação relevante para efeito do vencimento antecipado das prestações ainda não vencidas, sobretudo se o requerimento executivo contiver uma declaração que traduza uma direta manifestação de vontade do credor nesse sentido, o que claramente sucede no caso em apreço uma vez que a Credora/Exequente ali refere expressamente tendo-se, assim, por vencido todo o restante crédito da Exequente, no valor de EUR. 7.800,00€ - cfr. artigo 781.º do Código Civil. Isso mesmo considerou o STJ, no acórdão de 2006.01.17 (Relator - Azevedo Ramos) por apelo ao disposto no artigo 662.º, n.º 2, alínea a), do anterior CPC (atual artigo 610.º, n.º 2, CPC). No mesmo sentido, o citado Acórdão da Relação de Lisboa de 22.1.2008, onde se decidiu que “os efeitos do referido art.º 781.º apenas se aplicam a partir da citação, data em que a Ré tomou efectivamente conhecimento da opção da A. (…) pelo vencimento antecipado de todas as prestações ainda em dívida”. Com a única limitação de que os juros de mora só são devidos após esse momento (Acórdão da Relação de Lisboa de 29.11.2016 Relatora – Maria Adelaide Domingos), onde também se entendeu que o vencimento da totalidade da dívida ocorreu com o ato de citação. Face ao exposto, o requerimento executivo só deveria ter sido rejeitado no que excede os juros das prestações vincendas à data da instauração da execução calculados da data da citação dos Executados. Procede, pois, a apelação, embora não na sua totalidade. Sumário: I – O art. 781.º do Código Civil deve ser interpretado no sentido de que, na falta de realização de uma das prestações, fica o credor com o direito de exigir essa prestação e as subsequentes ainda não vencidas, mas não está dispensado de interpelar o devedor para que este cumpra imediatamente a totalidade da dívida; II – A ação executiva poderá, pois, ser intentada se o devedor já tiver procedido a uma interpelação com aquele conteúdo, indicando ou juntando o credor com o requerimento executivo os meios de prova tendentes a comprovar que já procedeu a tal interpelação do devedor; III – Mas também o poderá ser ainda que o credor não tenha procedido desse modo, caso em que a citação valerá como interpelação para desencadear o vencimento antecipado das prestações vincendas, certo que quando a inexigibilidade derive da falta de interpelação, a dívida se considera vencida desde aquele momento – art. 610º, nº 2, b), do CPC ex vi art. 551º, nº 1, do mesmo código –, com a única limitação de que os juros de mora só são devidos desde a citação. * IV. DECISÃO:Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente a apelação, revogando a decisão recorrida, com exceção da rejeição do requerimento executivo no que excede os juros das prestações vincendas à data da instauração da execução calculados da data da citação dos Executados, e determinando o prosseguimento da execução (e dos embargos) no que a tudo o mais respeita. Custas da rejeição parcial do requerimento executivo pela Exequente. Custas do recurso pela Recorrente na proporção de 0,7%. Guimarães, 17.12.2019 Margarida Sousa Afonso Cabral de Andrade Alcides Rodrigues |