Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
26/06.0GBPVL.G1
Relator: CARLOS BARREIRA
Descritores: PROVA POR RECONHECIMENTO
PROVA TESTEMUNHAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/29/2009
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: O reconhecimento em audiência não está sujeito aos requesitos exigidos pelo art.º 147.º do CPP, sendo apreciado livremente pelo julgador no âmbito do art.º 127.º do mesmo diploma legal
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Guimarães

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I – RELATÓRIO
O Digno Magistrado do Mº Pº deduziu acusação contra o arguido:
J…

Imputa-lhe, a prática, em autoria material, de um crime de passagem de moeda falsa, p. e p. pelo artº 265º, nº 1, al. a), do C. Penal.

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Realizada a audiência de Discussão e Julgamento, foi proferida sentença que, além do mais, decidiu:
“1) Condenar o arguido J…, pela prática de um crime p. e p. pelo artº 265º, nº 1, al. a), do C.P., na pena 100 (cem) dias de prisão.
2) Fazer cumprir esta pena de prisão por dias livres, fixando em 20 os períodos correspondentes a fim de semana, cada um deles com a duração de 36 horas, com inicio às 09:00 horas de sábado e fim às 21:00 horas do domingo seguinte.
3) Após trânsito, abra conclusão para determinar a execução da pena ora aplicada.”

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Inconformado, recorreu o arguido, pretendendo seja revogada a decisão recorrida, dando-se como não provada a matéria de facto imputada, absolvendo-se o mesmo do crime imputado.

Para o efeito, apresenta as seguintes conclusões da motivação do seu recurso:
1. O recorrente foi condenado na pena de 100 dias de prisão, pela prática de um crime de passagem de moeda falsa, p. e p. pelo art.º 265º, n.º 1, al. a), do C. Penal.
2. Teve por base a sua condenação o depoimento das testemunhas E… e J…, o teor dos documentos de fls. 9 (auto de apreensão), 26 a 28 (ficha biográfica do arguido da Polícia Judiciária), 62 e 63 (relatório e exame da Polícia Judiciária), 63 (nota de € 100,00) e 131 a 143 (CRC).
3. O Reconhecimento é sobretudo um meio de protecção dos arguidos e estabelece critérios de segurança que visam filtrar o preconceito e a sugestão, previsto no art.º 147º, do C. P. Penal.
4. A observância de tais regras foi cumprida aquando do reconhecimento em sede de inquérito, dizendo a testemunha que, em tal momento, não foi capaz de identificar o arguido.
5. O recorrente não aceita como prova o depoimento da testemunha E…, considerando que o mesmo resulta do fácil sugestionamento daquela ao defrontar-se com uma “cara” que lhe é apresentada como a do culpado.
6. Caso contrário, tê-lo-ia reconhecido em sede de inquérito, nas instalações da Polícia Judiciária.
7. Quando é certo que, a testemunha se lembra, dois anos e meio após a ocorrência dos factos, do rosto e da estatura do arguido!
8. Assim, do depoimento da testemunha E… não pode o Tribunal a quo considerar provado, com a certeza e a segurança que se impõe, ter sido o arguido a praticar os factos de que vem acusado.
9. Quanto ao depoimento da testemunha J…, a verdade é que nada sabe acerca dos factos dos quais o arguido vem acusado.
10. Começando por enquadrar temporalmente os factos, no decorrer do ano de 2008, quando os mesmos terão ocorrido em Junho de 2006.
11. Nada sabe acerca da falsidade da nota.
12. Nada sabe acerca de ter sido aquela ou qualquer outra nota entregue na sapataria Carochinha.
13. Bem como nada sabe acerca de quem foi a pessoa a efectuar a compra do referido estabelecimento comercial.
14. O Tribunal a quo faz um conjunto de suposições as quais não encontram, de todo, sustentação no depoimento das próprias testemunhas.
15. O Tribunal a quo não apurou qualquer prova que permitisse concluir que foi o ora Recorrente o agente do crime.
16. De todo o modo, no mínimo por razões óbvias, sempre se deveria concluir que estamos perante dúvidas insanáveis, vigorando o Princípio in dubio pro reo, devendo, consequentemente, o tribunal a quo dar como não provada tal factualidade.
17. A sentença a quo padece do vício de erro notório na apreciação da prova.

Termos em que, revogando a douta sentença e concedendo provimento ao presente recurso, farão, V.as Ex.as, a habitual JUSTIÇA!

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O Ministério Público, junto do tribunal recorrido, notificado da interposição do recurso, para os efeitos do art. 413.º, do Cód. Proc. Penal, na resposta, pronunciou-se no sentido de que deve ser negado provimento ao recurso, por a douta sentença ter observado todos os preceitos legais, não merecendo qualquer censura.

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Junto desta Relação, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, após vista dos autos, para os termos do art.º 416.º, do Cód. Proc. Penal, manifestou-se também pelo improvimento do recurso e, consequentemente, pela manutenção da douta decisão recorrida.

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Notificado do parecer do Ministério Público, nos termos do disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, o arguido nada mais disse nos autos.

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Colhidos os vistos legais e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.

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II – FUNDAMENTAÇÃO. OS FACTOS…
(…)
De referir, em relação ao Reconhecimento, o seguinte:
O que o recorrente diz tratar-se de um reconhecimento feito em audiência, na realidade não o é.
Com efeito, trata-se do simples acto de uma testemunha na audiência identificar o arguido como o autor dos factos em julgamento, pelo que tal se insere no âmbito da prova testemunhal e não no âmbito da prova por reconhecimento, em sentido técnico-jurídico.
“O simples acto de uma testemunha na audiência identificar o arguido como o autor dos factos em julgamento insere-se no âmbito da prova testemunhal e não no âmbito da prova por reconhecimento. – Ac. da RP, de 07.11.2007, Proc.º 0713492, Rel. Paulo Valério.
“ I – Conforme jurisprudência uniforme deste Supremo Tribunal, o reconhecimento em audiência de certa pessoa como autora de determinado facto não está sujeito aos requisitos exigidos no art.º 147º do CPP.
II – É que em tais casos o que se valoriza é o depoimento da testemunha, apreciado nos termos do artigo 127º do CPP, e não a “prova por reconhecimento” a que alude o referido art.º 147º.
III – E esta interpretação do art.º 147º não viola o princípio das garantias de defesa consagrado no art.º 32º, n.º1, da CRP, ou qualquer outra norma constitucional, como entendeu o TC no Ac n.º 425/05, de 25-08-2005.
IV – Tais considerações aplicam-se ao reconhecimento de objectos, por força do disposto no art.º 148º do CPP.” – Ac. do STJ, de 06.09.2006, Proc.º 06P1392, Rel. Políbio Silva Flor.
Também o Ac. do T. Constitucional n.º 425/2005 (onde se referencia diversa doutrina nacional e estrangeira, nomeadamente italiana, sobre a prova por reconhecimento), publicado no DR., II Série, de 10.10.2005, decidiu:
“Não julgar inconstitucional o artigo 147º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Penal, na interpretação segundo a qual quando, em julgamento, a testemunha, na prestação do seu depoimento, imputa os factos que relata ao arguido, a identificação do arguido efectuada nesse depoimento não está sujeita às formalidades estabelecidas em tal preceito.”
Assim, por contraposição ao reconhecimento que foi feito em inquérito, o acto de identificação feita do arguido, por uma testemunha, em audiência, é apreciado livremente pelo julgador, no âmbito do art.º 127º, do C. P. Penal.
(…)

IV – DECISÃO
Termos em que, os Juízes, na Secção Criminal, desta Relação, decidem:
1 - Negar provimento ao recurso interposto pelo arguido/recorrente.
2 - Manter integralmente a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 ucs.