Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
257/24.1T8VCT-B.G1
Relator: LUÍS MIGUEL MARTINS
Descritores: EXECUÇÃO PARA PRESTAÇÃO DE FACTO INFUNGÍVEL
FIXAÇÃO DE SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA
APELAÇÃO AUTÓNOMA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/05/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 3.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
O recurso de decisão proferida no processo executivo que fixou uma sanção pecuniária compulsória deve subir de imediato, sob pena de o recurso se tornar absolutamente inútil, por nesse caso o efeito compulsório já se ter produzido aquando da prolação da decisão final.
Decisão Texto Integral:
Acordam os Juízes da 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

1. Relatório

Em 6/11/2023, AA, residente na Rua ...., fração c, em ..., instaurou execução para prestação de facto infungível contra BB, residente em ..., ..., consubstanciada na pretensão de obtenção assinatura de um documento para resgate de uma conta poupança reforma, sendo que peticionou que à executada fosse aplicada uma sanção compulsória não inferior a € 50,00 diários, contada desde a data em que a mesma seja notificada para assinar o documento e o devolver ao exequente, até à data em que tal documento seja entregue ao mesmo devidamente assinado.

A 24/1/2024 foi proferido o seguinte despacho:
“A presente execução tem como finalidade a prestação de um facto infungível, pelo que, pode de facto ser requerida a aplicação de uma sanção pecuniária compulsória, nos termos do disposto no art.º 829º-A do Cód. Civil e 868º, nº 1 e 874º, nº 1 do CPC. Mas a fixação desta pressupõe que esteja fixado o um prazo para o cumprimento da obrigação.
No caso que nos ocupa, a sentença exequenda não fixou qualquer prazo para o cumprimento da obrigação, pelo que o exequente tem de indicar o prazo que reputa suficiente para o cumprimento, com vista à sua fixação no processo executivo, nos termos do disposto no art.º 874º, nº 1 do CPC.
O pedido de cumprimento imediato não satisfaz o ónus imposto, devendo o Exequente indicar expressamente um prazo para o efeito.
Nestes termos, e antes de mais, determino a notificação do Exequente para, no prazo de 10 dias, indicar o prazo que reputa suficiente para a prestação do facto por parte da Executada.”.
Após a indicação de prazo pelo exequente, em 5/2/2024, foi proferido o seguinte despacho:
“Cite a executada para os termos e efeitos previstos no art.º 868º, nº 2 do CPC, bem como para se pronunciar sobre o prazo requerido para o cumprimento da obrigação, nos termos do disposto no art.º 874º, nº 1 e 2 do CPC.”.
Citada a executada, nada disse quanto à sanção pecuniária compulsória, nem nos embargos que deduziu – que foram liminarmente indeferidos, por intempestivos - nem nos autos executivos em que permaneceu silente.
Assim, em 11/11/2024, foi proferida a seguinte decisão:
“O Exequente instaurou a presente execução para a prestação de facto, tendo por finalidade a obtenção coerciva da prestação exequenda por parte da Executada, e que no caso se trata da obtenção da sua assinatura do documento de resgate do produto do PPR, verba em que as partes acordaram ser adjudicada ao Exequente, obrigando-se a Executada a assinar todo e qualquer documento que seja necessário para o seu resgate, conforme transacção efectuada no âmbito do processo de inventário que correu termos no Juízo de Família e Menores de Viana do Castelo, sob o nº 3016/20...., a qual foi homologada por sentença, nos seus precisos termos.
O Exequente requerer que a Executada seja notificada para proceder à assinatura imediata do documento de resgate e a fixação de uma sanção pecuniária compulsória não inferior a € 50,00/diários, contados desde a data em que a mesma seja notificada para assinar o documento até o documento ser entregue devidamente assinado.
Foram deduzidos Embargos de Executado, que, no entanto, foram indeferidos liminarmente, decisão já transitada em julgado.
A prestação da obrigação exequenda consiste numa obrigação de prestação de facto infungível, ou seja, uma obrigação que só pode ser cumprida pela própria Executada, não podendo ser substituída por terceiro, pelo que por forma a compelir a Executada ao cumprimento, pode o Exequente requerer a aplicação de uma sanção pecuniária compulsória, por cada dia de incumprimento, nos termos do disposto no art.º 829º-A, nº 1 do Cód. Civil e 868º, nº 1 e 874º, nº 1 do CPC.
Assim, importa fixar o prazo para a prestação do facto, bem como a fixação de uma sanção pecuniária compulsória para o não cumprimento da obrigação no prazo a fixar.
Tendo em conta o facto a prestar – a assinatura do documento necessário para o resgate do PPR adjudicado ao Exequente, entende-se adequado ao prazo de 10 dias.
Para o caso de incumprimento da obrigação no prazo indicado, considera-se adequada a sanção pecuniária compulsória indicada de € 50,00/dia.
Em face do exposto, decide-se:
- Fixar à Executada o prazo para assinatura da documentação necessária ao resgate do PPR adjudicado ao Exequente em 10 dias, a contar da notificação para o efeito;
- Aplicar a sanção pecuniária compulsória à razão diária de € 50,00 a contar do vencimento da obrigação.”.

Deste despacho veio a executada interpor recurso formulando as seguintes conclusões:
“1) Vem o presente recurso interposto do Despacho datado de 11-11-2024 com a Ref.: ...36) que decidiu:
“O Exequente instaurou a presente execução para a prestação de facto, tendo por finalidade a obtenção coerciva da prestação exequenda por parte da Executada, e que no caso se trata da obtenção da sua assinatura do documento de resgate do produto do PPR, verba em que as partes acordaram ser adjudicada ao Exequente, obrigando-se a Executada a assinar todo e qualquer documento que seja necessário para o seu resgate, conforme transacção efectuada no âmbito do processo de inventário que correu termos no Juízo de Família e Menores de Viana do Castelo, sob o nº 3016/20...., a qual foi homologada por sentença, nos seus precisos termos. O Exequente requerer que a Executada seja notificada para proceder à assinatura imediata do documento de resgate e a fixação de uma sanção pecuniária compulsória não inferior a € 50,00/diários, contados desde a data em que a mesma seja notificada para assinar o documento até o documento ser entregue devidamente assinado.”.
Foram deduzidos Embargos de Executado, que, no entanto, foram indeferidos liminarmente, decisão já transitada em julgado.
A prestação da obrigação exequenda consiste numa obrigação de prestação de facto infungível, ou seja, uma obrigação que só pode ser cumprida pela própria Executada, não podendo ser substituída por terceiro, pelo que por forma a compelir a Executada ao cumprimento, pode o Exequente requerer a aplicação de uma sanção pecuniária compulsória, por cada dia de incumprimento, nos termos do disposto no art.º 829º-A, nº 1 do Cód. Civil e 868º, nº 1 e 874º, nº 1 do CPC. Assim, importa fixar o prazo para a prestação do facto, bem como a fixação de uma sanção pecuniária compulsória para o não cumprimento da obrigação no prazo a fixar. Tendo em conta o facto a prestar – a assinatura do documento necessário para o resgate do PPR adjudicado ao Exequente, entende-se adequado ao prazo de 10 dias.
Para o caso de incumprimento da obrigação no prazo indicado, considera-se adequada a sanção pecuniária compulsória indicada de € 50,00/dia.
Em face do exposto, decide-se: - Fixar à Executada o prazo para assinatura da documentação necessária ao resgate do PPR adjudicado ao Exequente em 10 dias, a contar da notificação para o efeito; - Aplicar a sanção pecuniária compulsória à razão diária de € 50,00 a contar do vencimento da obrigação.”
2) Foram deduzidos Embargos de Executado, que, no entanto, foram indeferidos liminarmente, decisão já transitada em julgado. Não obstante,
3) De acordo com o disposto no art. 817.º do CC, não sendo a obrigação voluntariamente cumprida, tem o credor o direito de exigir judicialmente o seu cumprimento e de executar o património do devedor.
4) O credor pode, assim, solicitar ao tribunal que condene o devedor a cumprir, se a prestação ainda puder ser efetuada; se o devedor judicialmente condenado não cumprir, pode recorrer à execução, requerendo a realização coativa da prestação.
5) Não é, possível a execução específica de uma prestação de facto infungível, uma vez que o devedor não pode ser coagido ao facere (nemo praecise potest cogi ad factum). Nestes casos, o credor tem apenas direito à chamada execução por equivalente, o que significa que a condenação do devedor a cumprir, quando não acatada, não encontra a adequada e eficaz proteção no processo executivo.
6)
7) Surgiu, assim, a necessidade de encontrar um instrumento destinado a fazer pressão sobre o devedor e a vencer a sua resistência, a fim de o decidir a cumprir voluntariamente as obrigações não suscetíveis de «cumprimento forçado», isto é, de execução in natura, por falta de correspondente ação executiva que efetive e atue a sentença de condenação no cumprimento. Trata-se da sanção pecuniária compulsória, consagrada no art. 829.º-A do Código Civil, normativo introduzido pelo Decreto-Lei n.º 262/83, de 16 de Junho, em cujo nº1 se estabelece que “nas obrigações de prestação de facto infungível, positivo ou negativo, salvo nas que exigem especiais qualidades científicas ou artísticas do obrigado, o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ou por cada infração, conforme for mais conveniente às circunstâncias do caso”.
8) Estatui ainda o mesmo preceito legal, no seu nº 2, que a sanção pecuniária compulsória será fixada, segundo critérios de razoabilidade, sem prejuízo da indemnização a que houver lugar, e no n. º3, que o seu montante reverte, em partes iguais, a favor do credor e do Estado.
9) É do despacho datado de 11-11-2024 com a Ref.: ...36) que decidiu aplicar a sanção pecuniária compulsória à razão diária de € 50,00 a contar do vencimento da obrigação que ora se reclama/recorre. Isto porque,
10) A sanção pecuniária compulsória a que alude o artigo 829.º A, n.º 1, do Código Civil, assume natureza judicial por ser determinada pelo tribunal a pedido do credor, estando vedado ao tribunal conhecer a mesma oficiosamente. A sanção em causa é exclusiva das prestações de facto, positivo ou negativo, de natureza infungível. O tribunal fixa a sanção pecuniária compulsória na sentença, limitado ao valor do pedido (cfr. artigo 609.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), segundo critérios de razoabilidade, conforme decorre do artigo 829.º A, n.º 2, do Código Civil, de acordo com o que for adequado ao caso concreto.
11) A fixação da sanção pecuniária compulsória, na ausência de critérios objectivos para a fixação de um valor exacto, deve ocorrer, assim, por recurso à equidade, nos termos do artigo 566.º, n.º 3, do Código Civil aqui devidamente adaptado, constituindo esta um critério residual de justiça do caso concreto, apenas aplicável em situações excepcionais tipificadas na lei (cfr. artigo 4.º do Código Civil, no caso, ao abrigo da alínea a)), e que faz apelo a “todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida”
12) Porém, o juízo de equidade não significa arbitrariedade pelo que julgar equitativamente é procurar a mais justa das soluções, a justiça do caso concreto, mas sempre dentro dos limites que o Tribunal tiver por provados. Ensaiando a operação de fixação da sanção pecuniária compulsória o tribunal pode atender aos seguintes factores: gravidade da conduta e o grau de culpa do devedor; a importância do direito a acautelar pelo credor; a duração da violação do direito do credor; as consequências do incumprimento, incluindo se ocorreram danos ou lucros cessantes; a importância do incumprimento consoante se trate de um caso isolado ou de um caso reincidente; a duração previsível do incumprimento; as vantagens ou lucros resultantes do incumprimento; as condições económicas do devedor de modo a que a sanção seja proporcional e persuasiva.
13) A sanção pecuniária compulsória pode ser fixada no âmbito de uma execução constituindo, nesta sede, uma decisão de mérito a proferir no âmbito da execução (cfr. artigos 10.º, n.ºs 1 e 4 a 6, 868.º, n.º 1, parte final, 874.º, n.º 1, e 876.º, n.º 1, alínea c) todos do CPC).
14) Sucede que, a presente decisão de mérito foi proferida em violação clara do princípio do contraditório. Ou seja, à Executada, tendo os embargos sido indeferidos liminarmente por intempestivos, não lhe foi dada oportunidade para se pronunciar acerca do petitório da sansão pecuniária compulsória.
15) Salvo o devido e merecido respeito, por mais douta opinião, a sanção pecuniária compulsória judicial peticionada em sede executiva não pode ser aplicada, sob pena de violação do princípio do contraditório, sem que, previamente, seja dada oportunidade ao Executado para se pronunciar sobre a imposição da referida sanção.
16) Note-se! que o contraditório não é sobre o cumprimento ou não da sentença, mas sim sobre a fixação da sanção pecuniária compulsória. Com efeito, o despacho condenatório em sanção pecuniária compulsória é com a devida vénia e respeito pelo tribunal, ilegal, por violação manifesta do princípio do contraditório, porquanto a Recorrente não teve oportunidade de se pronunciar.
17) O princípio do contraditório deve ser entendido como garantia da participação efectiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, em termos de, em plena igualdade, poderem influenciar todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação, directa ou indirecta, com o objecto da causa e em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão.
18) Acresce ainda que, o despacho ora colocado em crise é nulo por falta de fundamentação, uma vez que o mesmo não especifica os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão – artigo 615.º, n.º 1, alínea b) do CPC.
19) Dispõe o artigo 154.º n.º 1 do CPC que “as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas”, acrescentando o seu n.º 2 que “a justificação não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição…”.
20) O que, salvo o devido e merecido respeito, foi o que aconteceu in casu.
21) Conforme vem sendo decidido uniformemente pela jurisprudência, a falta de motivação a que alude a alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, motivo de nulidade da decisão, é a total omissão dos fundamentos de facto ou de direito em que assenta a decisão. «Uma especificação dessa matéria apenas incompleta ou deficiente não afecta o valor legal da sentença» - Acórdão do STJ de 05/05/2005, in www.dgsi.pt/jstj.
22) Ao proferir o despacho “Para o caso de incumprimento da obrigação no prazo indicado, considera-se adequada a sanção pecuniária compulsória indicada de € 50,00/dia. (…)- Aplicar a sanção pecuniária compulsória à razão diária de € 50,00 a contar do vencimento da obrigação”, mera adesão ao pedido do Exequente – sem mais, não há dúvida que falta em absoluta a sua fundamentação, motivo pelo qual o mesmo é nulo.
23) Em face do acabado de expender, deve o despacho recorrido ser revogado porque violador do princípio do contraditório e do artigo 829º-A do Código Civil, tudo com as legais consequências.
24) Deve, ainda, aquele despacho ser declarado é nulo por falta de fundamentação, uma vez que o mesmo não especifica os fundamentos de facto que justificam a decisão – artigo 615.º, n.º 1, alínea b) do CPC.”.
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Notificado das alegações da executada, veio o exequente apresentar resposta, rematando com as seguintes conclusões:
[…]
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No introito das suas alegações de recurso e subsequentemente nas suas conclusões, veio o recorrido, como vimos, suscitar a questão da inadmissibilidade do recurso, dizendo na sua conclusão inicial que:
“O presente recurso é inadmissível, não sendo enquadrável em qualquer uma das situações previstas no artigo 853º CPC ou 644º CPC.”.
Notificada que foi a recorrente para se pronunciar a tal respeito, nos termos do artigo 655º, n.º 2, que remete para o artigo 654º, n.º 2, ambos do Código de Processo Civil, veio dizer, em suma, que:
-  A decisão recorrida é uma decisão de mérito, pelo que seria imediatamente recorrível, nos termos do art. 644.º, n.º1, al. b) do Código de Processo Civil;
- Citando doutrina autorizada, diz que o termo inicial para a fixação da sanção pecuniária compulsória é o trânsito em julgado da sentença condenatória;
- Diz já nas suas palavras, que uma vez que a sanção pecuniária compulsória apenas é exigível com o trânsito em julgado definitivo da decisão que a fixou, deve o recurso interposto ser apreciado imediatamente, nos termos do artigo 644º, n.º 2, alínea h) : decisões cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil;
- Por outro lado, sanção pecuniária compulsória judicial não é nada mais nada menos, na ótica da Recorrente do que uma “multa ou sanção processual”, pelo que o recurso devia ser admitido nos termos do art. 644.º, n.º 2, al. e) do Código de Processo Civil.
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O recurso foi admitido como de apelação a subir imediatamente, em separado e com efeito devolutivo.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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2. Questões a decidir

- Saber se o recurso é admissível nesta fase, antes da prolação da decisão que ponha termo ao processo.
Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente (acima transcritas), sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso (artigos 635.º e 639.º do Código de Processo Civil), as questões a decidir no presente recurso de apelação, caso seja admitido são as seguintes:
- Saber se a decisão proferida é nula, por violação do contraditório e por falta de fundamentação de facto e de direito.
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3. Fundamentação

Os factos a considerar são os que resultam do relatório.
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4. Do objeto do recurso
a) Da alegada irrecorribilidade do despacho recorrido.
No despacho que admitiu o recurso, disse-se que:
“Assim, por ser legalmente admissível, ser tempestivo e ter sido interposto por quem tem legitimidade, admito o recurso interposto pela Executada, da decisão sindicada, que é de apelação, com subida imediata, em separado e com efeito devolutivo, ao abrigo do disposto nos art.ºs 638º, nº 1, 644º, nº 2, al. h), 645º, nº 2, 647º, nº 1 e 852º, 853º, nº 1 e nº 4 todos do Novo Código de Processo Civil.”.
De acordo com o art. 853.º do Código de Processo Civil, na parte que ora importa reter:
“1 - É aplicável o regime estabelecido para os recursos no processo de declaração aos recursos de apelação interpostos de decisões proferidas em procedimentos ou incidentes de natureza declaratória, inseridos na tramitação da ação executiva.
2 - Cabe ainda recurso de apelação, nos termos gerais:
a) Das decisões previstas no n.º 2 do artigo 644.º, quando aplicável à ação executiva;
(…).”.
Ou seja, admitiu-se o recurso com subida imediata por virtude do plasmado no art. 644.º, n.º 2 al. h) do Código de Processo Civil, também aplicável ao processo executivo, isto é, também aqui cabe apelação autónoma das decisões cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil.
Ora, o segmento normativo supra referido abrange as decisões com efeitos de direito ou de facto irreversíveis, pelo que a procedência recurso não é suscetível de alcançar o efeito útil por não os poder afastar. Ganhar ou perder o recurso a final seria igual, redundando numa utilidade nula – Cfr. Rui Pinto, “Oportunidade processual de interposição de apelação à luz do art. 644.º CPC”, Revista da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, Março de 2021, pág. 642 e a vasta jurisprudência e doutrina aí recenseada.
Cumpre então apreciar se o recurso interposto da decisão recorrida deve subir imediatamente ou a final e em consequência concluir se o mesmo é ou não admissível neste momento.
 Foi fixada uma sanção pecuniária compulsória nos termos do art. 829.º-A do Código Civil que rege que:
“1 - Nas obrigações de prestação de facto infungível, positivo ou negativo, salvo nas que exigem especiais qualidades científicas ou artísticas do obrigado, o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ou por cada infracção, conforme for mais conveniente às circunstâncias do caso.
2 - A sanção pecuniária compulsória prevista no número anterior será fixada segundo critérios de razoabilidade, sem prejuízo da indemnização a que houver lugar.
3 - O montante da sanção pecuniária compulsória destina-se, em partes iguais, ao credor e ao Estado.
4 - Quando for estipulado ou judicialmente determinado qualquer pagamento em dinheiro corrente, são automaticamente devidos juros à taxa de 5% ao ano, desde a data em que a sentença de condenação transitar em julgado, os quais acrescerão aos juros de mora, se estes forem também devidos, ou à indemnização a que houver lugar.”.
 A função da sanção pecuniária compulsória é compelir a que o devedor cumpra sua obrigação de facto infungível ou seja uma obrigação que não pode ser cumprida por outrem que no caso se consubstancia na assinatura de um documento para que possa ser levantada uma importância relativa a uma conta poupança reforma, vulgo PPR.
Como refere Calvão da Silva “Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória”, 4.ª Edição, Almedina, 2002, pág. 407 é a “condenação pecuniária decretada pelo juiz para constranger e determinar o devedor recalcitrante a cumprir a sua obrigação.”.
Ora, a permitir-se apenas o recurso a final da decisão que lhe impôs o pagamento da quantia de € 50 por cada dia que decorra sem a assinatura do documento em causa, revelar-se-á totalmente inútil, máxime na situação em que a decisão final seja aquela que declara extinção da execução pelo cumprimento, ou seja pela assinatura do documento em causa, pois que nesse caso o efeito coercitivo da sanção pecuniária terá produzido na plenitude todos os seus efeitos de forma irreversível, sendo que de todo o modo esse efeito coativo sempre ocorrerá e sem possibilidade de reposição da situação anterior em caso de procedência do recurso. Ou seja, uma eventual decisão que viesse a revogar a decisão recorrida apenas teria a eventual virtualidade de dispensar o pagamento da sanção pecuniária compulsória, com a restituição das importâncias liquidadas, mas jamais poderia afastar o efeito intimidatório no sentido do cumprimento desta sanção, pelo que este seria irreversível.
Assim sendo, mostra-se correto o despacho que recebeu o recurso, designadamente na parte que considerou que subia imediatamente.
 Em face do exposto, o recurso é o próprio e foi admitido com os efeitos e modo de subida adequados.
b) Da nulidade do despacho recorrido por alegada violação do contraditório e omissão de fundamentação de facto e de direito.
Quanto à suposta violação do contraditório, de acordo com o princípio geral consagrado no art. 3.º, nº 3 do Código de Processo Civil:
“O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido oportunidade de sobre elas se pronunciarem.”.
Está assim vedado ao juiz a prolação de qualquer decisão sobre qualquer questão, processual ou substantiva, de facto ou de direito, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que, previamente, tenha sido conferido às partes, a efetiva possibilidade de sobre a mesma se pronunciar.
O princípio do contraditório deve ser entendido como garantia da participação efetiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, em termos de, em plena igualdade, poderem influenciar todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação, direta ou indireta, com o objeto da causa e em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão. Reconhece-se, assim, o direito da parte à sua audição antes de ser tomada qualquer decisão e o direito a conhecer todas as condutas assumidas pela contraparte e a tomar posição sobre elas, o que decorre, aliás, do princípio do processo justo e equitativo (cfr. neste sentido Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, págs. 46 e 47).
Ora, em face do que consta do percurso processual de que supra demos conta, verifica-se que o contraditório foi observado na sua plenitude, sendo completamente espúrio o argumento que foi cerceado o contraditório à recorrente porque os embargos de executado foram liminarmente indeferidos.
Em primeiro lugar, os embargos de executado foram indeferidos por serem intempestivos (sibi imputet) e por outro lado, nos embargos de executado nem sequer foi aflorada a questão da sanção pecuniária compulsória.
A executada foi citada, de acordo com o despacho supra transcrito, nada tendo dito a respeito da sanção pecuniária compulsória nem mesmo no âmbito da execução, pelo que inexiste qualquer violação do contraditório e por inerência qualquer nulidade.
Quanto à suposta falta de fundamentação de facto e direito, que na versão da recorrente conduziria à nulidade do despacho, nos termos dos art. 615.º, n.º al. b) do Código de Processo Civil, é também ostensivo que não se verifica.
Como se disse no despacho em que o Tribunal recorrido se pronunciou sobre esta esgrimida nulidade:
“O despacho em crise espelha os fundamentos de facto e direito em que se baseia a decisão proferida, concretamente quanto à fixação da sanção pecuniária compulsória, a qual é fixada segundo critérios de razoabilidade e conveniência tendo em conta as circunstâncias do caso (art.º 829º-A, nº 1 e 2 do Cód. Civil), tendo sido essa a bitola seguida pelo julgador.”.
Ora, no despacho recorrido indicaram-se expressamente as normas que no seu entender eram aplicáveis ao caso (arts. 829.º-A, n.º 1 do Código Civil e 868.º, n.º 1 e 874.º, nº 1 do Código de Processo Civil).
Para além disso, foi relatada a factualidade que estava em causa no processo, tendo culminado com a decisão quanto ao prazo e quanto ao valor em função dessa mesma factualidade, nos seguintes termos:
“Assim, importa fixar o prazo para a prestação do facto, bem como a fixação de uma sanção pecuniária compulsória para o não cumprimento da obrigação no prazo a fixar.
Tendo em conta o facto a prestar – a assinatura do documento necessário para o resgate do PPR adjudicado ao Exequente, entende-se adequado ao prazo de 10 dias.
Para o caso de incumprimento da obrigação no prazo indicado, considera-se adequada a sanção pecuniária compulsória indicada de € 50,00/dia.”.
Mostram-se, assim, especificados os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, pelo que, obviamente, também aqui inexiste qualquer nulidade, designadamente a do art. 615.º, n.º 1, al. b) do Código de Processo Civil, aplicável aos despachos por virtude do art. 613.º, n.º 3 do mesmo diploma legal.
Improcede, pois, a apelação.
Tendo ficado vencida, as custas deverão ser suportadas pela apelante nos termos do art. 527.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil.
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5. Decisão

Perante o exposto, decide-se julgar improcedente o recurso interposto, mantendo-se a decisão apelada.
Custas pela apelante.
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Guimarães, 5 de junho de 2025

Relator: Luís Miguel Martins
Primeiro Adjunto: José Manuel Flores
Segunda Adjunta: Fernanda Proença Fernandes