Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
359/14.2TBEPS-L.G1
Relator: MARGARIDA PINTO GOMES
Descritores: RECURSO
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
DESISTÊNCIA DO RECURSO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 10/20/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDÊNCIA DO INCIDENTE
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Configura litigância de má fé o recurso de decisão que admitiu a desistência de penhora e levantamento da mesma, com fundamento de o bem não ser propriedade do executado, por quem, anteriormente, em sede de oposição à penhora invocara aquela mesma situação e requerera o levantamento da penhora.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

I – RELATÓRIO:

M. J. instaurou ação declarativa, sob a forma comum, contra, A. M. & Filhos, Lda, C. C. e Estado Português, representado pelo Digno Magistrado do Ministério Público, pedindo a condenação solidária dos réus a indemnizar a autora, na quantia de € 166 880,00 (cento e sessenta e seis mil oitocentos e oitenta euros), acrescida de juros à taxa legal, que se vencerem desde a citação até efetivo e integral pagamento.

A ação foi julgada improcedente tendo os réus Estado Português e A. M. & Filhos, Ldª, sido absolvidos do pedido e a autora condenada na multa de 5 (cinco) UCs e numa indemnização à Ré A. M. & Filhos, Ldª, no valor de 17.500,00 € (dezassete mil e quinhentos euros), devendo a quantia de 8.250,00 €, ser pagos diretamente ao Ilustre Mandatário da Ré, nos termos do art. 543º, nº4, do C.P.C.

A A. M. & Filhos, Lda veio deduzir execução para pagamento de quantia certa contra M. J., porquanto, tendo transitado em julgado a sentença que condenou esta pagar-lhe a quantia de 17.500.00€, devendo 8.250,00€ ser pagos diretamente ao mandatário da exequente, a executada não pagou qualquer quantia referente a tal condenação e montante indemnizatório referido no item 1 deste requerimento.
Alega ainda ser a Executada também responsável pelo pagamento dos juros vincendos e vencidos, contados à taxa legal, a partir da data do transito em julgado da sentença sendo os mesmos, até à data, no montante de 1.083,56€ (565 dias, contados sobre 17.500,00€, à taxa legal de 4%).

A 8 de outubro de 2019 foi penhorado o direito e acção / quinhão hereditário pertencente à executada, nas heranças abertas por óbito de M. T., NIF ......... e M. D., NIF ......... 5000,00, sendo que, as referidas heranças são constituídas pelos seguintes prédios: Artigo rústico ...; artigo urbano ...; artigo urbano ...; artigo urbano ... e artigo urbano ..., todos da freguesia de ..., concelho de Esposende.

Por apenso aqueles autos veio M. J., executada, deduzir Oposição à Penhora, alegando que, como era do conhecimento da Exequente, a penhora do direito e acção / quinhão hereditário que era pertença da executada, na herança indivisa, aberta por óbito de M. T. e M. D., já não se encontra na sua esfera jurídica e desse facto foi dado conhecimento, pelos restantes herdeiros, os quais, responderam após notificação, com data de 03.09.2019, do Senhor Agente de Execução, onde declararam que a Executada, não era titular de qualquer direito ao quinhão hereditário e isto porque, por escritura pública, por conta da quota disponível, foi doado o quinhão hereditário da herança aberta indivisa, por óbito dos seus pais, de M. T. (nif. .........) e M. D. (nif. .........), que pertencia à executada, a J. F. e liquidou o imposto de selo, inerente à participação da transmissão gratuita.
Pelo que o direito constante da verba n.º 1 do auto de penhora, não pertence à Executada.
Alegou ainda que, o direito identificado na verba n.º 1, foi-lhe atribuído pelo Senhor Agente de Execução o valor de € 5000,00 (cinco mil euros), pelo que, em caso de improceder a presente oposição à penhora, no que tange à verba n.º 1, impugna-se para todos os legais efeitos, o valor atribuído constante do auto de penhora, porque é manifestamente inferior ao valor económico real de tal quinhão hereditário, que se aproxima do valor de € 30.000,00 (trinta mil euros), para tanto basta verificar o valor atribuído na escritura de doação.
Por último, alegou a mesma que a aqui exequente, mesmo após ter sido notificada da extinção da execução comum, Processo n.º 359/14.2TBEPS-B, o mesmo não procedeu ao cancelamento das penhoras bancárias (Conta n.º: ……..3 do Banco … e conta n.º: ………9 do Banco …), realizadas no âmbito daquele apenso declarado extinto e que executada, não tem bens para indicar à penhora.
Pedia, em conclusão que a oposição à penhora fosse declarada procedente por provada, porquanto, incide sobre bem que, não respondendo, nos termos do direito substantivo, não devia ser atingido pela penhora, devendo proceder-se ao seu levantamento e cancelamento de eventual registo.

Por sentença, transitada em julgado, foi indeferido o incidente porquanto sendo o bem de terceiro, conforme alegado, caberia a este deduzir oposição, mediante embargos de terceiro, o meio específico de reacção contra a penhora por parte de terceiros, baseando-se na impenhorabilidade subjectiva.

Posteriormente deduziu a executada oposição à penhora realizada, nos termos dos artºs 856º, nº 1 e 784º, nº 1, al. a), ambos do Código de Processo Civil, alegando, que:

- foram penhorados os seguintes bens: a) o direito e acção pertença da executada, na herança aberta por óbito de seus pais, M. T. e M. D., sendo aquela constituída por cinco prédios (artigo rústico ...; artigo urbano ...; artigo urbano ...; artigo urbano ...; artigo urbano ...; todos da freguesia de ..., concelho de Esposende); b) o prédio urbano composto pela casa de r/chão, 1.º e 2.º andares, alpendre, terraço e logradouro, situado na Rua ..., n.º …, freguesia de ..., em Esposende, inscrito na matriz predial sob o art. ..., descrito na C.R.Predial sob o n.º .../...;
- as penhoras efectuadas “são manifestamente excessivas” já que o prédio urbano identificado em b), o qual é a casa onde reside a aqui executada, tem o valor patrimonial de € 127.281,00 (cento e vinte e sete mil duzentos e oitenta e um euros); e o quinhão hereditário pertencente à executada, por óbito dos seus pais, embora com valor atribuído de € 5.000,00, vale pelo menos € 165.581,91, e sendo sete irmãos os seus contitulares, o valor do quinhão hereditário da executada é de aproximadamente € 24.000,00, o que é suficiente para garantir o pagamento da dívida, incluindo o crédito e despesas prováveis;
- o valor patrimonial não corresponde ao real valor dos prédios em causa naquele quinhão hereditário, sendo o valor real de mercado sempre superior ao que consta na Caderneta Predial em sede de tributação do IMI;
- estando já penhorado o quinhão hereditário, que garante o pagamento do crédito, não se entende que seja igualmente penhorado o imóvel/prédio urbano, onde reside a executada de avançada idade e que não tem outro local para onde ir residir;
- pelo que, requer a redução da penhora, devendo em conformidade, permanecer penhorado apenas o quinhão hereditário pertença da executada nas aludidas heranças.

Foi proferida decisão que julgou totalmente improcedente a oposição à penhora e, consequentemente, determinou a manutenção da penhora sobre o prédio urbano composto pela casa de r/chão, 1.º e 2.º andares, alpendre, terraço e logradouro, situado na Rua ..., n.º .., freguesia de ..., em Esposende, inscrito na matriz predial sob o art. ..., descrito na C.R.Predial sob o n.º .../...; julgou improcedente a reclamação apresentada pela exequente à liquidação/conta corrente discriminada provisória elaborada a fls. 17, remetida aos autos pelo Sr.AE a 3.02.2022.

Nos autos de execução para pagamento de quantia certa deduzido por A. M. e Filhos, Lda. contra M. J., veio a exequente, a 27 de janeiro de 2022, desistir da penhora levada a efeito sobre os quinhões hereditários que pertenceram à executada nas heranças ilíquidas e indivisas abertas por óbito dos seus pais M. T. e M. D., porquanto, conforme decorria do documento n.º 3 junto com os Embargos de Executado – Oposição á Penhora do apenso H, a executada transmitiu para o seu filho J. F., os quinhões hereditários que lhe pertenciam nas heranças ilíquidas e indivisas abertas por óbito dos seus pais M. T. e M. D. sendo que, apesar do referido J. F. não ter deduzido oposição por embargos à referida penhora, o certo é que a exequente tem conhecimento da referida transmissão e, no seu entendimento, não deve o mesmo ser objeto de venda judicial, pois trata-se de um bem pertencente a terceiro sendo certo ainda que, tais quinhões hereditários foram já postos em venda judicial, por duas vezes, em leilão electrónico, no âmbito da presente execução, e apenas foram apresentadas duas propostas de aquisição, uma no valor de 2500,00€ e outra no valor de 2.525,00€, inferiores ao valor base (mínimo) de venda (4.250,00€).

A 31 de janeiro de 2022 foi proferido o seguinte despacho:
“Uma vez que o exequente pretende desistir da penhora feita a 8.10.2019 (v. auto penhora com a referência 9200488), relativa ao direito e acção/quinhão hereditário que era pertença da executada, na herança indivisa aberta por óbito dos seus pais – M. T. e M. D., e relativamente ao qual a própria executada no apenso “H” afirmou ter sido alienado a terceiro, através da escritura de doação lavrada a 28 de Novembro de 2018, homologo de imediato a desistência e, em consequência, ordeno o levantamento da referida penhora.
Notifique e informe o AE.
(…)”.

Inconformada com tal decisão veio a executada recorrer de tal despacho apresentando as seguintes conclusões:

I - A Recorrente, não concebendo e não se conformando com o teor do douto despacho com referência 177408820, datado de 31.01.2022, no qual homologa, de imediato, a desistência da penhora acão / quinhão hereditário, nas heranças abertas por óbito de M. T., NIF: ........., cujas respetivas heranças são constituídas pelos seguintes prédios: artigo rústico ...: artigo urbano ...; artigo urbano ...; artigo urbano ...; artigo urbano ..., todos da freguesia de ..., concelho de Esposende.
II - Ordenando o seu levantamento e, em consequência, prosseguindo os autos de execução com a penhora do prédio urbano onde esta reside, ou seja, prédio urbano composto pela casa de R/C, 1.º e 2.º andares, alpendre, terraço e logradouro, situado na Rua ..., n.º .., freguesia de ... Concelho de Esposende, inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo ..., descrito na CRP sob o número 00... / ....
III - Penhora do direito e ação / quinhão hereditário, na data de 02.01.2020, foi pelo Senhor Agente de Execução - conforme o preceituado no artigo 837º do código do Processo Civil - decidido que a venda dos bens penhorados nestes autos (quinhão hereditário), será VENDA EM LEILÃO ELECTRÓNICO, ao qual foi atribuído o valor de € 5.000,00 (cinco mil euros), contudo, o valor tributário (IMI) da herança deixada pelos pais da executada ascende a € 165. 581,91, e sendo que são sete irmãos e o valor do quinhão hereditário, é de aproximadamente € 24.000,00, suficiente para garantir o pagamento da quantia exequenda.
IV - É o próprio Exequente que o refere em requerimento próprio que dirige à Segurança Social, requerendo o cancelamento do apoio judiciário concedido à Recorrente, conforme documento n.º 2 que instrui a oposição à penhora.
V - Contudo, na verdade, o Exequente, propôs uma ação de impugnação pauliana, no Tribunal judicial da Comarca de Braga – Juízo Central cível de Braga – juiz 3, que correu termos sob o processo n.º 4764/19.0T8BRG, porquanto, a Executada / Recorrente havia doado o prédio urbano ao seu filho, a qual foi procedente, entre o mais “ Declarar impugnada a doação realizada no dia 6 de Junho de 2019, na Conservatória do Registo Predial e Comercial, sito na cidade e concelho da Póvoa de Varzim, para efeitos de a A. poder executar no património de ambos os RR. o bem imóvel doado (Prédio Urbano composto pela casa de rés-do-chão, 1.º e 2.º andar, alpendre, terraço e logradouro, situado na Rua ..., freguesia de ..., concelho de Esposende, inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo ... da União de Freguesias de ... e ..., descrito na CRP sob o número 00... / ....) e praticar todos os atos de conservação da sua garantia patrimonial permitidos por lei, na medida necessária à satisfação do seu crédito, sendo assim ineficaz relativamente à A. a transmissão efetuada.”.
VI - Na realidade, não foram juntos os documentos que acompanharam, agora, a oposição à penhora, que comprovam a garantia da quantia exequenda no valor de € 24.000,00 e, este prédio urbano, é a casa onde reside a aqui executada / Recorrente, tem o valor patrimonial de € 127.281,00 (cento e vinte e sete mil duzentos e oitenta e um euros).
VII - Na data de 22.12.2021, a Recorrente, é citada da penhora (arts. 626.º e 856.º do CPC), realizada sobre o Prédio urbano composto pela casa de R/C, 1.º e 2.º andares, alpendre, terraço e logradouro, situado na Rua ..., n.º .., freguesia de ... Concelho de Esposende, inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo ..., descrito na CRP sob o número 00... / ....
VIII - Na data de 24.01.2022, a Recorrente, deduziu oposição à penhora, alegando que a penhora este quinhão hereditário, no valor de € 24.000,00, de forma manifesta e inequívoca garante a quantia exequenda e despesas prováveis, mostrando-se por isso suficiente para garantia do seu crédito.
IX - Outrossim, em conformidade com o referido critério resultante do n.º 3 do art.º 735 do CPC, mostra-se excessivo para pagamento da divida exequenda, a penhora deste bem, o prédio urbano onde reside a executada que tem o valor patrimonial de € 127.281,00.
X - Destarte, apercebendo-se da peça processual de oposição à penhora apresentado pela Recorrente, na data de 27.01.2022, no requerimento por si subscrito com referência n.º 12528127, o Exequente, vem desistir da penhora do quinhão hereditário.
XI - O qual, foi deferido por despacho, do tribunal a quo, que aqui colocado em crise, - Uma vez que o exequente pretende desistir da penhora feita a 8.10.2019 (v. auto penhora com a referência 9200488), relativa ao direito e acção /quinhão hereditário que era pertença da executada, na herança indivisa aberta por óbito dos seus pais - M. T. e M. D., e relativamente ao qual a própria executada no apenso “H” afirmou ter sido alienado a terceiro, através da escritura de doação lavrada a 28 de Novembro de 2018, homologo de imediato a desistência e, em consequência, ordeno o levantamento da referida penhora.
XII - O filho da Recorrente, não apresentou embargos de terceiro – existindo sinais nos presentes autos do seu conhecimento da penhora, relativa ao direito e ação /quinhão hereditário – porquanto, entendeu que não o deveria fazer, deixando prosseguir a penhora, mesmo tendo conhecimento da sua venda por leilão eletrónico, conformou-se com este facto para proteger a casa (única) onde reside a sua mãe.
XIII - Conforme, apenso “H” transitou em julgado, conforme sentença datada de 18.11.2019, com referência n.º 165919189, e o direito / ação do quinhão hereditário, conforme exposto, prosseguiu para venda na modalidade de leilão eletrónico, não tendo sido sustada a sua venda, através de embargos de terceiro, ou seja, prosseguiu com esta penhora do quinhão hereditário.
XIV - A venda do direito / ação do quinhão hereditário, poderia ter sido concretizada, porque decida à venda por leilão eletrónico e proposta igualmente por negociação particular pelo Senhor Agente de Execução.
XV - Considerando os fundamentos da oposição à penhora quando refere o despacho colocado em crise (” No mais aguarde o que for decidido no apenso I” de oposição à penhora,”) é lícito interrogar, após a homologação da desistência da penhora do direito a ação do quinhão hereditário, qual o efeito útil da tempestiva, legal e legitima, oposição a penhora.
XVI - Até porque, o tribunal a quo profere - 31.01.2022 - despacho no apenso “I” onde refere “Antes de mais, por se nos afigurar relevante à boa decisão da causa, notifique o Sr. Agente de Execução para, em 10 dias, informar: a) O valor atualizado da quantia exequenda e demais despesas prováveis; b) Quais os bens que se mostram, à presente data, penhorados, levando em conta a decisão hoje proferida no apenso “G”. Após, notifique as partes da informação que vier a ser prestada, uma vez que esta será tida em consideração na decisão a proferir.”
XVII - Destarte, estão a ser comtemplados Juros Compulsórios, devidos ao Exequente (50%) e aos Cofres do Estado (50%), no valor total de € 4.140, 22, ora, nos termos do art.º 829 -A n.º 1 do Código Civil, não existindo sinais, nem na douta sentença que serve de título executivo, nem na presente execução – requerimento executivo – que o credor o tenha peticionado, nos termos do art.º 829 – A, n.º 1 do C.C, juros compulsórios à taxa de 5%,entende a Recorrente que estes não são devidos, na esteira de inúmeras decisões jurisprudenciais.
XVIII - Resumindo, reclama-se que estando penhorado o direito ação do quinhão hereditário, que garante o pagamento do crédito – o qual não foi embargado por terceiro (filho da Recorrente) - não se concebe a homologação da desistência da penhora do quinhão hereditário, perseguindo a execução com a penhora do prédio urbano, a única casa onde reside a Recorrente, de avançada idade e que não tem outro local para onde ir residir, colando-a numa situação de incerteza e precariedade, sendo-lhe licito apresentar a sua defesa nos tribunais.
XIX - Reitere-se a penhora da ação / quinhão hereditário quinhão, foi decidido colocar em venda judicial, nestes precisos autos, na modalidade de venda em leilão eletrónico (embora desfasado quanto ao real valor patrimonial) e posteriormente em venda por negociação particular.
XX - Mesmo sabendo que a Recorrente o tenha doado ao seu filho, o qual nunca, jamais, se opôs à venda judicial nos presentes autos, aliás, francamente, estes bens prosseguiram para venda judicial em leilão eletrónico.
XXI - Pelo que podia e deveria o tribunal a quo ter mantido a penhora do aludido quinhão hereditário, até que sentença proferido no âmbito da oposição à penhora.

Respondeu ao recurso a exequente invocando a inadmissibilidade do mesmo porquanto tendo a executada/recorrente alegado por fundamento a alínea h) do n.º 2 do art. 644.º do CPC, que diz respeito a recursos de “decisões cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil”, não estamos perante um desses casos, sendo certo que a executada/recorrente nada alega relativamente a essa inutilidade se o recurso fosse interposto a final.
Vem a mesma ainda pugnar pela improcedência do recurso, arguindo ainda a má fé da recorrente.

Notificada para se pronunciar sobre a invocada litigância de má fé veio a recorrente alegar que o Senhor Agente de Execução – em 18.09.2019, na notificação com referência 9102211, informou o Recorrido, que, o quinhão hereditário, já não pertencia a Recorrente, não obstante, este prosseguiu com a execução, conforme seu requerimento datado de 19.09.2019, com referência 9109894.
Na data de 18.11.2019, foi proposta pela Recorrente a oposição à penhora “Apenso H”, a qual foi indeferida, porquanto, não era o meio processual próprio, ou seja, o seu filho teria de recorrer, ao meio processual próprio, contudo, conformaram-se com tal decisão, não propondo o meio processual próprio - Embargos de Terceiro - deixando os autos prosseguir os seus termos, para salvaguarda a casa de morada de família.
A penhora do quinhão hereditário prosseguiu os seus termos, assim, na data de 02.01.2020, foi decidida a modalidade de venda, através de leilão eletrónico e, a requerimento do Recorrido, com data de 23.11.2020, com referência 10798087, vem comunicar que pretende que a venda do bem penhorado prossiga mediante negociação particular, por mais 30 dias.
No Tribunal judicial da Comarca de Braga – Juízo Central cível de Braga – juiz 3, que correu termos sob o processo n.º 4764/19.0T8BRG – Ação Pauliana - onde foi discutido como tema de prova, o valor do quinhão hereditário e em sede de Recurso, no Tribunal da Relação de Guimarães - Processo: 4764/19.0T8BRG.G1, 2.ª Secção Cível, foi junta prova documental pelo Recorrente, nos termos dos artigos 651.º n.º 1, 425.º, 423.º do CPC, a qual provava o real valor tributário do quinhão hereditário, sendo que não foram admitidos os documentos apresentados com as alegações de recurso – Processo n.º 4764/19.0T8BRG.G1, 2.ª Secção Cível - determinando-se o seu desentranhamento, porque o fundamento apresentado não poderia servir de pretexto para a junção tardia de tais documentos.
Fê-lo nos presentes autos, propôs a oposição à penhora, “Apenso I”, com referência 12513185, datado de 24.01.2022, onde a Recorrente, fez juntar os aludidos documentos, que comprovavam o valor patrimonial tributário do quinhão hereditário, sabendo-se que por regra este é menor ao real valor económico do bem, sendo que,só neste momento, o Recorrido, confrontado com a questão levantada do real valor patrimonial do quinhão hereditário - documentos juntos ao “Apenso I” - peticionou a desistência desta penhora deste bem, por requerimento com data de 27.01.2022, com referência 12528127. Ou seja, o Recorrido, só desistiu deste bem, porque, entretanto, havia garantido a penhora da única casa de família da Recorrida.
Foi intentado o presente recurso, porque a recorrente e o seu filho entendem que quinhão hereditário é suficiente para liquidar a divida exequenda, acrescendo, que, no despacho objeto do presente recurso, o tribunal a quo relegou a decisão do requerimento de oposição a penhora “Apenso I”, para momento ulterior e com tal decisão, não restou a Recorrente outra via, senão recorrer legitimamente de tal despacho, o qual inviabilizava o fundamento da oposição à penhora, tornava-a invariavelmente, sem nenhum efeito (salvo o devido respeito que é muito, o tribunal a quo poderia e deveria decidir aquele “Apenso I”, julgando-o procedente, improcedente ou até inadmissível).
Portanto, não é a Recorrente que “parece que anda a brincar aos processos” os Apensos B, C, e D, do presente processo 359/14.2TBEPS, foram extintos no” Apenso F”, que deu origem à douta decisão singular do Tribunal da Relação de Guimarães – 1.ª Secção Cível, julgando que o Recorrido não tinha à data título executivo, porque propôs a execução sem ter decorrido o transito em julgado nos autos principais.
A Recorrente, de avançada idade, deixará de ter onde residir a partir do dia 29.09.2022, vai ser despejada da sua habitação, a sua pretensão com o presente recurso, não carece de falta de fundamento ou de um juízo moral censurável, o acesso à justiça, ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, previsto no art.º 20 da CRP é um princípio fundamental e basilar do estado de direito, estando profundamente desfeita, psicologamente afectada, com a decisão que a condenou por litigância de má-fé, vai perder a sua única habitação que construiu com muito trabalho, sacrifício e provações e, vem o recorrido, pretender que abra mão da mesma sem mais, inibindo-a de recorrer meios processuais legítimos que tem ao seu dispor.
A pretensão formulada, pela Recorrente, relativamente ao quinhão hereditário, pelas razões supra alegadas, foi uma consequência da sua penhora e da decisão de venda judicial, a requerimento do Recorrido, sendo que o comportamento da Recorrente não integra a previsão do art.º 542 n.º 1 al. a) do CPC.

A recorrente veio desistir do recurso, o que se admitiu, ordenando-se o prosseguimento destes autos para conhecimento da litigância de má fé.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.
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II – OBJETO DO RECURSO:

O objeto do recurso é definido pelas conclusões das alegações, impondo-se conhecer das questões colocadas pelos recorrentes, bem como as que sejam de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas, cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, sendo certo que o tribunal não se encontra vinculado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes e que visam sustentar os seus pontos de vista, isto atendendo à liberdade do julgador na interpretação e aplicação do direito.
Assim, atendendo à desistência do recurso, prosseguem os autos apenas para se aferir da litigância de má fé da recorrente.
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III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:

Com relevância para o presente recurso há a considerar a factualidade resultante do relatório supra.
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IV – DO DIREITO:

Aqui chegados e porquanto veio a recorrente desistir do recurso instaurado e que visava saber se o Sr. Juiz a quo não deveria ter homologado a desistência da penhora levada a efeito sobre os quinhões hereditários que pertenceram à executada nas heranças ilíquidas e indivisas abertas por óbito dos seus pais M. T. e M. D. enquanto não transitasse em julgado a decisão que julgou totalmente improcedente a oposição à penhora e, consequentemente, determinou a manutenção da penhora sobre o prédio urbano composto pela casa de r/chão, 1.º e 2.º andares, alpendre, terraço e logradouro, situado na Rua ..., n.º .., freguesia de ..., em Esposende, inscrito na matriz predial sob o art. ..., descrito na C.R.Predial sob o n.º .../..., resta apenas a este Tribunal aferir da litigância de má fé desta recorrente.

Efetivamente, em sede de contra alegações veio a recorrida suscitar a questão da litigância de má fé da recorrente porquanto quando o referido bem (quinhão hereditário) foi penhorado, a executada deduziu oposição à penhora (apenso H), alegando que tal bem não lhe pertencia, juntando a respectiva escritura pública relativa à sua transmissão para comprovar tal alegação, tendo nesta declarado a executada/apelante M. J.,- “Que, por conta da sua quota disponível, doa, ao segundo outorgante, J. F., seu filho, os quinhões hereditários que lhe pertence nas heranças ilíquidas e indivisas abertas por óbito de seus pais, M. T. (NIF da herança .........), falecida no dia … de outubro de dois mil e quatro, com a sua última residência na Rua ..., nº .., da freguesia de ..., concelho de Esposende, e de M. D. (NIF da herança .........) falecido no dia oito de janeiro de dois mil e catorze, o qual teve a sua última residência habitual em na dita Rua ..., nº .., os quais não deixaram quaisquer testamento, nem quaisquer outra disposição de última vontade, atribuindo a esta doação o valor de vinte e quatro mil e cem euros”, escritura essa constante do apenso H), alegando ainda que, por isso, não deveria esse bem ter sido penhorado e pedindo, a final, que fosse levantada essa penhora, tudo como decorre do apenso H.
Agora, após a exequente/apelada ter vindo desistir dessa penhora, face ao conhecimento que a exequente adquiriu ao ser-lhe notificada aquela escritura pública de doação do quinhão hereditário, a executada/apelante vem apresentar o presente recurso de apelação pugnando e pedindo a manutenção dessa penhora.
Alega que deve ter-se em consideração que o ilustre mandatário que ofereceu aquela oposição à penhora no referido apenso H é o mesmo que agora apresenta este recurso de apelação, sendo tal comportamento processual manifestamente contraditório é absolutamente inadmissível e isto porque, naquele apenso H a executada pede o levantamento da penhora e neste recurso pede a manutenção da penhora, apesar de se saber que o bem penhorado não lhe pertence.
Alega ainda que deve ter-se ainda em consideração que o título dado em execução constitui uma sentença onde a executada, ré nos autos onde a sentença/título executivo foi proferido, foi condenada já como litigante de má-fé, ou seja, de nada valeu tal sentença, pois continua a litigar de manifesta e requintada má-fé.
A pretensão formulada pela executada/recorrente no recurso em apreciação, e os factos por si ali alegados, integram a previsibilidade do art. 542.º/1/al. a) do CPC, ou seja, estamos perante uma pretensão ou oposição cuja falta de fundamento a executada não pode ignorar.

Contrapõe a recorrente que o Senhor Agente de Execução – em 18.09.2019, na notificação com referência 9102211, informou o Recorrido, que, o quinhão hereditário, já não pertencia a Recorrente, não obstante, este prosseguiu com a execução, conforme seu requerimento datado de 19.09.2019, com referência 9109894.
Na data de 18.11.2019, foi proposta pela Recorrente a oposição à penhora “Apenso H”, a qual foi indeferida, porquanto, não era o meio processual próprio, ou seja, o seu filho teria de recorrer, ao meio processual próprio, contudo, conformaram-se com tal decisão, não propondo o meio processual próprio - Embargos de Terceiro - deixando os autos prosseguir os seus termos, para salvaguarda a casa de morada de família.
A penhora do quinhão hereditário prosseguiu os seus termos, assim, na data de 02.01.2020, foi decidida a modalidade de venda, através de leilão eletrónico e, a requerimento do Recorrido, com data de 23.11.2020, com referência 10798087, vem comunicar que pretende que a venda do bem penhorado prossiga mediante negociação particular, por mais 30 dias.
No Tribunal judicial da Comarca de Braga – Juízo Central cível de Braga – juiz 3, que correu termos sob o processo n.º 4764/19.0T8BRG – Ação Pauliana - onde foi discutido como tema de prova, o valor do quinhão hereditário. Em sede de Recurso, no Tribunal da Relação de Guimarães - Processo: 4764/19.0T8BRG.G1, 2.ª Secção Cível, foi junta prova documental pelo Recorrente, nos termos dos artigos 651.º n.º 1, 425.º, 423.º do CPC, a qual provava o real valor tributário do quinhão hereditário, não tendo sido admitidos os documentos apresentados com as alegações de recurso – Processo n.º 4764/19.0T8BRG.G1, 2.ª Secção Cível - determinando-se o seu desentranhamento, porque o fundamento apresentado não poderia servir de pretexto para a junção tardia de tais documentos.
Fê-lo nos presentes autos, propôs a oposição à penhora, “Apenso I”, com referência 12513185, datado de 24.01.2022, onde a Recorrente, fez juntar os aludidos documentos, que comprovavam o valor patrimonial tributário do quinhão hereditário, sabendo-se que por regra este é menor ao real valor económico do bem, sendo que só neste momento, o Recorrido, confrontado com a questão levantada do real valor patrimonial do quinhão hereditário - documentos juntos ao “Apenso I” - peticionou a desistência desta penhora deste bem, por requerimento com data de 27.01.2022, com referência 12528127.
O Recorrido, só desistiu deste bem, porque entretanto havia garantido a penhora da única casa de família da Recorrida.
Foi intentado o presente recurso, porque a recorrente e o seu filho entendem que quinhão hereditário é suficiente para liquidar a divida exequenda.
Acresce, que, no despacho objeto do presente recurso, o tribunal a quo relegou a decisão do requerimento de oposição a penhora “Apenso I”, para momento ulterior e com tal decisão, não restou a Recorrente outra via, senão recorrer legitimamente de tal despacho, o qual inviabilizava o fundamento da oposição à penhora, tornava-a invariavelmente, sem nenhum efeito (salvo o devido respeito que é muito, o tribunal a quo poderia e deveria decidir aquele “Apenso I”, julgando-o procedente, improcedente ou até inadmissível).
Não é a Recorrente que “parece que anda a brincar aos processos” os Apensos B, C, e D, do presente processo 359/14.2TBEPS, foram extintos no” Apenso F”, que deu origem à douta decisão singular do Tribunal da Relação de Guimarães – 1.ª Secção Cível, julgando que o Recorrido não tinha à data título executivo, porque propôs a execução sem ter decorrido o transito em julgado nos autos principais.
A Recorrente, de avançada idade, deixará de ter onde residir a partir do dia 29.09.2022, vai ser despejada da sua habitação, a sua pretensão com o presente recurso, não carece de falta de fundamento ou de um juízo moral censurável, o acesso à justiça, ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, previsto no art.º 20 da CRP é um princípio fundamental e basilar do estado de direito, estando profundamente desfeita, psicologamente afectada, com a decisão que a condenou por litigância de má-fé, vai perder a sua única habitação que construiu com muito trabalho, sacrifício e provações e, vem o recorrido, pretender que abra mão da mesma sem mais, inibindo-a de recorrer meios processuais legítimos que tem ao seu dispor.
A pretensão formulada, pela Recorrente, relativamente ao quinhão hereditário, pelas razões supra alegadas, foi uma consequência da sua penhora e da decisão de venda judicial, a requerimento do Recorrido e a desistência da penhora, surge quando foi colocado em crise, pela Recorrente, no “apenso I” o valor real daquele quinhão hereditário, assim, tendo garantido a penhora da única casa de morada de família – cujo valor patrimonial é manifestamente superior e desproporcionado em relação ao seu crédito – o Recorrido, optou por ter uma posição contraria à que tinha inicialmente.

Vejamos.

Estabelece o nº 1 do artº 20º da Constituição da República Portuguesa, sob a epígrafe “Acesso ao Direito e tutela jurisdicional efetiva” que, “A todos é assegurado o acesso ao Direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos”.
Na esteira deste princípio constitucional do acesso ao direito, o nº 1 do artº 2º do Código de Processo Civil garante que, “A protecção jurídica através dos tribunais implica o direito a obter, em prazo razoável, uma decisão judicial que aprecie com a força de caso julgado, a pretensão regularmente deduzida em juízo (..)”.
Do nº 2 do mesmo preceito resulta que “A todo o direito, excepto quando a lei determine o contrário, corresponde a acção adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, a prevenir ou reparar a violação dele e a realizá-la coercivamente, bem como os procedimentos necessários para acautelar o efeito útil da acção”.
Destes preceitos legais resulta o acesso aos tribunais, mediante o exercício do direito de ação, sendo que, este direito de ação é autónomo face ao direito substantivo que lhe subjaz, “(…) o que permite afirmar a legitimidade do seu exercício, ainda que o resultado declarado se traduza na absolvição da instância ou na improcedência da ação”, conforme referem os Drs Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, 2ª edição, pág17
Ora, do atrás exposto não pode concluir-se que o exercício deste direito de ação não é isento de deveres. Como refere o Acordão da Relação do Porto de 4 de abril de 2022, relatado pelo Sr Desembargador Jerónimo Freitas, in www.dgsi.pt, “Para os assegurar o Estado coloca os seus órgãos jurisdicionais à disposição de quem quer que se arrogue um direito, mas o direito a propor a acção, bem assim o correspondente direito de defesa por parte de quem é demandado, devem exercer-se dentro de determinados limites circunscritos por deveres de conduta”.
Conforme refere ainda o citado Acordão “A Lei de autorização de revisão do Código de Processo Civil (Lei nº 33/95 de 18 de Agosto), consignou a orientação de que “As alterações à lei processual deverão consagrar o dever de cooperação para a descoberta da verdade (..)”.
Dando consecução à lei de autorização legislativa, a revisão do Código de Processo Civil veio a ser introduzida pelo DL 329-A/95, de 12 de Dezembro, em cujo preâmbulo é proclamada a afirmação dos princípios fundamentais estruturantes de todo o processo civil, entre os quais, e de acordo com aquela orientação, consta o princípio cooperação, referindo-se-lhe o legislador como “(..) princípio angular e exponencial do processo civil”.
O princípio da cooperação que aí encontrava consagração no art.º 226.º, consta actualmente no art.º 7.º do CPC, ai se estabelecendo que (n.º1) “Na condução e intervenção no processo, devem os magistrados, os mandatários judiciais e as próprias partes cooperar entre si, concorrendo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio”.
A cooperação que a lei impõe deve ser feita de boa-fé, isto é, com lealdade e lisura de procedimento. Assim resulta do art.º 8.º do CPC (correspondente ao art.º 265.º A, do pretérito CPC), onde se lê “As partes devem agir de boa-fé e observar os deveres resultantes do preceituado no artigo anterior”.
Ora, a litigância de má fé que se traduz na violação do dever de boa fé processual, de forma dolosa ou gravemente negligente, encontra-se regulada nos artºs 542º a 545º do Código de Processo Civil.

Estabelece o nº 2 do artº 545º do Código de Processo Civil que:
Diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave:
a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c)Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d)Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção de justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão”.
Como referem os Drs Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, na obra citada, pág 615 e 616, “Se um dos objetivos do exercício do direito de ação é o reconhecimento de uma situação jurídica tutelável, o recurso legítimo aos tribunais não pode restringir-se àqueles que inequivocamente tenham a razão do seu lado”, conferindo a lei (…) uma vasta amplitude ao direito de ação ou de defesa, de maneira que, para além da repercussão no campo das custas judiciais, não retira do decaimento qualquer outra consequência, a não ser que alguma das partes aja violando as regras e princípios básicos por que devem pautar a sua atuação processual”, não devendo confundir-se a litigância de má fé com:
“a) a mera dedução de pretensão ou oposição cujo decaimento sobreveio por mera fragilidade da sua prova, por a parte não ter logrado convencer da realidade por si trazida a juízo;
b) a eventual dificuldade de apurar os factos e de os interpretar;
c) a discordância na interpretação e aplicação da lei aos factos, a diversidade de versões sobre certos factos ou a defesa convicta e séria de uma posição, sem, contudo, a lograr impor”.
Ou seja, a litigância de má fé traduz-se na violação do dever geral de boa fé processual, consagrado no artº 8º do Código de Processo Civil, enquanto conduta ilícita, praticada de forma dolosa - lide dolosa - ou gravemente negligente - lide temerária.
Através da litigância de má fé, a lei sanciona a instrumentalização do direito processual, como referem os Drs Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa, na obra citada, pág 617 “(…) quer ela se apresente como uma forma de conseguir um objetivo considerado ilegítimo pelo direito substantivo, quer como um meio de impedir a descoberta da verdade, quer ainda como forma de emperrar ainda mais a máquina judiciária, com a colocação de obstáculos ou com a promoção de expedientes meramente dilatórios. Abarca ainda os casos em que se pretende impedir o trânsito em julgado da decisão e, deste modo, prejudicar a contraparte na tutela ou realização do direito substantivo que se através da decisão lhe seja reconhecido”.
Importa ainda, como resulta do Acordão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18 de fevereiro de 2015, relatado pelo Sr Conselheiro Silva Salazar, in www.dgsi.pt, que “Não basta, assim, para que se conclua pela litigância de má fé por alguma das partes no processo, a dedução de pretensão ou oposição sem fundamento, ou a afirmação de factos não verificados ou verificados de forma distinta: tal pode ter ocorrido por a parte se encontrar, embora incorretamente, convencida da sua razão ou de que os factos se verificaram da forma que os descreve, hipótese em que inexistirá má fé. Impõe-se, pois, para que haja litigância de má fé, que a parte, ao deduzir a sua pretensão ou oposição infundamentada ou ao afirmar factos não ocorridos, tenha atuado com dolo ou com negligência grave, ou seja, sabendo da falta de fundamento da sua pretensão ou oposição, ou encontrando-se numa situação em que se lhe impunha que tivesse esse conhecimento”.
Aqui chegados, importa apreciar da conduta processual da recorrente afim de aferir se a mesma configura uma litigância de má fé.
A ação declarativa, sob a forma comum, instaurada por M. J., a ora recorrente/requerida no incidente de litigância de má fé, contra, A. M. & Filhos, Lda, C. C. e Estado Português, foi julgada improcedente tendo os réus Estado Português e A. M. & Filhos, Ldª, sido absolvidos do pedido e a autora (recorrente e requerida do incidente de litigância de má fé) condenada na multa de 5 (cinco) UCs e numa indemnização à Ré A. M. & Filhos, Ldª, no valor de 17.500,00 € (dezassete mil e quinhentos euros), devendo a quantia de 8.250,00 €, ser pagos diretamente ao Ilustre Mandatário da Ré, nos termos do art. 543º, nº4, do C.P.C.
Porquanto transitou em julgado tal sentença e não lhe foi paga aquela quantia, a A. M. & Filhos, Lda deduziu execução para pagamento de quantia certa contra a recorrente e requerida no incidente de litigância de má fé, em discussão, sendo que a 8 de outubro de 2019 foi penhorado o direito e acção / quinhão hereditário pertencente à executada, nas heranças abertas por óbito de M. T., NIF ......... e M. D., NIF ......... 5000,00, sendo que, as referidas heranças são constituídas pelos seguintes prédios: Artigo rústico ...; artigo urbano ...; artigo urbano ...; artigo urbano ... e artigo urbano ..., todos da freguesia de ..., concelho de Esposende.
Por apenso aqueles autos M. J., ali executada e aqui recorrente e requerida no incidente de litigância de má fé, deduziu Oposição à Penhora, alegando que, como era do conhecimento da Exequente, a penhora do direito e acção / quinhão hereditário que era pertença da executada, na herança indivisa, aberta por óbito de M. T. e M. D., já não se encontrava na sua esfera jurídica e desse facto foi dado conhecimento, pelos restantes herdeiros, os quais, responderam após notificação, com data de 03.09.2019, do Senhor Agente de Execução, onde declararam que a Executada, não era titular de qualquer direito ao quinhão hereditário e isto porque, por escritura pública, por conta da quota disponível, foi doado o quinhão hereditário da herança aberta indivisa, por óbito dos seus pais, de M. T. (nif. .........) e M. D. (nif. .........), que pertencia à executada, a J. F. e liquidou o imposto de selo, inerente à participação da transmissão gratuita.
Pedia, em conclusão que a oposição à penhora fosse declarada procedente por provada, porquanto, incidia sobre bem que, não respondendo, nos termos do direito substantivo, não devia ser atingido pela penhora, devendo proceder-se ao seu levantamento e cancelamento de eventual registo.
Por sentença, transitada em julgado, foi indeferido o incidente porquanto sendo o bem de terceiro, conforme alegado, caberia a este deduzir oposição, mediante embargos de terceiro, o meio específico de reacção contra a penhora por parte de terceiros, baseando-se na impenhorabilidade subjectiva.
Posteriormente deduziu a executada oposição à penhora realizada, nos termos dos arts. 856.º, n.º 1 e 784.º, n.º 1, al. a), ambos do Código de Processo Civil, alegando, que:
- foram penhorados os seguintes bens: a) o direito e acção pertença da executada, na herança aberta por óbito de seus pais, M. T. e M. D., sendo aquela constituída por cinco prédios (artigo rústico ...; artigo urbano ...; artigo urbano ...; artigo urbano ...; artigo urbano ...; todos da freguesia de ..., concelho de Esposende); b) o prédio urbano composto pela casa de r/chão, 1.º e 2.º andares, alpendre, terraço e logradouro, situado na Rua ..., n.º .., freguesia de ..., em Esposende, inscrito na matriz predial sob o art. ..., descrito na C.R.Predial sob o n.º .../...;
- as penhoras efectuadas “são manifestamente excessivas” já que o prédio urbano identificado em b), o qual é a casa onde reside a aqui executada, tem o valor patrimonial de € 127.281,00 (cento e vinte e sete mil duzentos e oitenta e um euros); e o quinhão hereditário pertencente à executada, por óbito dos seus pais, embora com valor atribuído de € 5.000,00, vale pelo menos € 165.581,91, e sendo sete irmãos os seus contitulares, o valor do quinhão hereditário da executada é de aproximadamente € 24.000,00, o que é suficiente para garantir o pagamento da dívida, incluindo o crédito e despesas prováveis;
- o valor patrimonial não corresponde ao real valor dos prédios em causa naquele quinhão hereditário, sendo o valor real de mercado sempre superior ao que consta na Caderneta Predial em sede de tributação do IMI;
- estando já penhorado o quinhão hereditário, que garante o pagamento do crédito, não se entende que seja igualmente penhorado o imóvel/prédio urbano, onde reside a executada de avançada idade e que não tem outro local para onde ir residir;
- pelo que, requer a redução da penhora, devendo em conformidade, permanecer penhorado apenas o quinhão hereditário pertença da executada nas aludidas heranças.

Foi proferida decisão que julgou totalmente improcedente a oposição à penhora e, consequentemente, determinou a manutenção da penhora sobre o prédio urbano composto pela casa de r/chão, 1.º e 2.º andares, alpendre, terraço e logradouro, situado na Rua ..., n.º .., freguesia de ..., em Esposende, inscrito na matriz predial sob o art. ..., descrito na C.R.Predial sob o n.º .../...; julgou improcedente a reclamação apresentada pela exequente à liquidação/conta corrente discriminada provisória elaborada a fls. 17, remetida aos autos pelo Sr.AE a 3.02.2022.
Nos autos de execução para pagamento de quantia certa deduzido por A. M. e Filhos, Lda. contra M. J., veio a exequente, a 27 de janeiro de 2022, desistir da penhora levada a efeito sobre os quinhões hereditários que pertenceram à executada nas heranças ilíquidas e indivisas abertas por óbito dos seus pais M. T. e M. D., porquanto, conforme decorre do documento n.º 3 junto com os Embargos de Executado – Oposição á Penhora do apenso H, a executada transmitiu para o seu filho J. F., os quinhões hereditários que lhe pertenciam nas heranças ilíquidas e indivisas abertas por óbito dos seus pais M. T. e M. D. e isto porque, apesar do referido J. F. não ter deduzido oposição por embargos à referida penhora, o certo é que a exequente tem conhecimento da referida transmissão e, no seu entendimento, não deve o mesmo ser objeto de venda judicial, pois trata-se de um bem pertencente a terceiro sendo certo ainda que, tais quinhões hereditários foram já postos em venda judicial, por duas vezes, em leilão electrónico, no âmbito da presente execução, e apenas foram apresentadas duas propostas de aquisição, uma no valor de 2500,00€ e outra no valor de 2.525,00€, inferiores ao valor base (mínimo) de venda (4.250,00€).

A 31 de janeiro de 2022 foi proferido o seguinte despacho:
“Uma vez que o exequente pretende desistir da penhora feita a 8.10.2019 (v. auto penhora com a referência 9200488), relativa ao direito e acção/quinhão hereditário que era pertença da executada, na herança indivisa aberta por óbito dos seus pais – M. T. e M. D., e relativamente ao qual a própria executada no apenso “H” afirmou ter sido alienado a terceiro, através da escritura de doação lavrada a 28 de Novembro de 2018, homologo de imediato a desistência e, em consequência, ordeno o levantamento da referida penhora.
Notifique e informe o AE.
(…)”.
Ora, inconformada com tal decisão veio a executada recorrer de tal despacho apresentando as seguintes conclusões:

I - A Recorrente, não concebendo e não se conformando com o teor do douto despacho com referência 177408820, datado de 31.01.2022, no qual homologa, de imediato, a desistência da penhora acão / quinhão hereditário, nas heranças abertas por óbito de M. T., NIF: ........., cujas respetivas heranças são constituídas pelos seguintes prédios: artigo rústico ...: artigo urbano ...; artigo urbano ...; artigo urbano ...; artigo urbano ..., todos da freguesia de ..., concelho de Esposende.
II - Ordenando o seu levantamento e, em consequência, prosseguindo os autos de execução com a penhora do prédio urbano onde esta reside, ou seja, prédio urbano composto pela casa de R/C, 1.º e 2.º andares, alpendre, terraço e logradouro, situado na Rua ..., n.º .., freguesia de ... Concelho de Esposende, inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo ..., descrito na CRP sob o número 00... / ....
III - Penhora do direito e ação / quinhão hereditário, na data de 02.01.2020, foi pelo Senhor Agente de Execução - conforme o preceituado no artigo 837º do código do Processo Civil - decidido que a venda dos bens penhorados nestes autos (quinhão hereditário), será VENDA EM LEILÃO ELECTRÓNICO, ao qual foi atribuído o valor de € 5.000,00 (cinco mil euros), contudo, o valor tributário (IMI) da herança deixada pelos pais da executada ascende a € 165. 581,91, e sendo que são sete irmãos e o valor do quinhão hereditário, é de aproximadamente € 24.000,00, suficiente para garantir o pagamento da quantia exequenda.
IV - É o próprio Exequente que o refere em requerimento próprio que dirige à Segurança Social, requerendo o cancelamento do apoio judiciário concedido à Recorrente, conforme documento n.º 2 que instrui a oposição à penhora.
V - Contudo, na verdade, o Exequente, propôs uma ação de impugnação pauliana, no Tribunal judicial da Comarca de Braga – Juízo Central cível de Braga – juiz 3, que correu termos sob o processo n.º 4764/19.0T8BRG, porquanto, a Executada / Recorrente havia doado o prédio urbano ao seu filho, a qual foi procedente, entre o mais “ Declarar impugnada a doação realizada no dia 6 de Junho de 2019, na Conservatória do Registo Predial e Comercial, sito na cidade e concelho da Póvoa de Varzim, para efeitos de a A. poder executar no património de ambos os RR. o bem imóvel doado (Prédio Urbano composto pela casa de rés-do-chão, 1.º e 2.º andar, alpendre, terraço e logradouro, situado na Rua ..., freguesia de ..., concelho de Esposende, inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo ... da União de Freguesias de ... e ..., descrito na CRP sob o número 00... / ....) e praticar todos os atos de conservação da sua garantia patrimonial permitidos por lei, na medida necessária à satisfação do seu crédito, sendo assim ineficaz relativamente à A. a transmissão efetuada.”.
VI - Na realidade, não foram juntos os documentos que acompanharam, agora, a oposição à penhora, que comprovam a garantia da quantia exequenda no valor de € 24.000,00 e, este prédio urbano, é a casa onde reside a aqui executada / Recorrente, tem o valor patrimonial de € 127.281,00 (cento e vinte e sete mil duzentos e oitenta e um euros).
VII - Na data de 22.12.2021, a Recorrente, é citada da penhora (arts. 626.º e 856.º do CPC), realizada sobre o Prédio urbano composto pela casa de R/C, 1.º e 2.º andares, alpendre, terraço e logradouro, situado na Rua ..., n.º .., freguesia de ... Concelho de Esposende, inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo ..., descrito na CRP sob o número 00... / ....
VIII - Na data de 24.01.2022, a Recorrente, deduziu oposição à penhora, alegando que a penhora este quinhão hereditário, no valor de € 24.000,00, de forma manifesta e inequívoca garante a quantia exequenda e despesas prováveis, mostrando-se por isso suficiente para garantia do seu crédito.
IX - Outrossim, em conformidade com o referido critério resultante do n.º 3 do art.º 735 do CPC, mostra-se excessivo para pagamento da divida exequenda, a penhora deste bem, o prédio urbano onde reside a executada que tem o valor patrimonial de € 127.281,00.
X - Destarte, apercebendo-se da peça processual de oposição à penhora apresentado pela Recorrente, na data de 27.01.2022, no requerimento por si subscrito com referência n.º 12528127, o Exequente, vem desistir da penhora do quinhão hereditário.
XI - O qual, foi deferido por despacho, do tribunal a quo, que aqui colocado em crise, - Uma vez que o exequente pretende desistir da penhora feita a 8.10.2019 (v. auto penhora com a referência 9200488), relativa ao direito e acção /quinhão hereditário que era pertença da executada, na herança indivisa aberta por óbito dos seus pais - M. T. e M. D., e relativamente ao qual a própria executada no apenso “H” afirmou ter sido alienado a terceiro, através da escritura de doação lavrada a 28 de Novembro de 2018, homologo de imediato a desistência e, em consequência, ordeno o levantamento da referida penhora.
XII - O filho da Recorrente, não apresentou embargos de terceiro – existindo sinais nos presentes autos do seu conhecimento da penhora, relativa ao direito e ação /quinhão hereditário – porquanto, entendeu que não o deveria fazer, deixando prosseguir a penhora, mesmo tendo conhecimento da sua venda por leilão eletrónico, conformou-se com este facto para proteger a casa (única) onde reside a sua mãe.
XIII - Conforme, apenso “H” transitou em julgado, conforme sentença datada de 18.11.2019, com referência n.º 165919189, e o direito / ação do quinhão hereditário, conforme exposto, prosseguiu para venda na modalidade de leilão eletrónico, não tendo sido sustada a sua venda, através de embargos de terceiro, ou seja, prosseguiu com esta penhora do quinhão hereditário.
XIV - A venda do direito / ação do quinhão hereditário, poderia ter sido concretizada, porque decida à venda por leilão eletrónico e proposta igualmente por negociação particular pelo Senhor Agente de Execução.
XV - Considerando os fundamentos da oposição à penhora quando refere o despacho colocado em crise (” No mais aguarde o que for decidido no apenso I” de oposição à penhora,”) é lícito interrogar, após a homologação da desistência da penhora do direito a ação do quinhão hereditário, qual o efeito útil da tempestiva, legal e legitima, oposição a penhora.
XVI - Até porque, o tribunal a quo profere - 31.01.2022 - despacho no apenso ”I” onde refere “Antes de mais, por se nos afigurar relevante à boa decisão da causa, notifique o Sr. Agente de Execução para, em 10 dias, informar: a) O valor atualizado da quantia exequenda e demais despesas prováveis; b) Quais os bens que se mostram, à presente data, penhorados, levando em conta a decisão hoje proferida no apenso “G”. Após, notifique as partes da informação que vier a ser prestada, uma vez que esta será tida em consideração na decisão a proferir.”
XVII - Destarte, estão a ser comtemplados Juros Compulsórios, devidos ao Exequente (50%) e aos Cofres do Estado (50%), no valor total de € 4.140, 22, ora, nos termos do art.º 829 -A n.º 1 do Código Civil, não existindo sinais, nem na douta sentença que serve de título executivo, nem na presente execução – requerimento executivo – que o credor o tenha peticionado, nos termos do art.º 829 – A, n.º 1 do C.C, juros compulsórios à taxa de 5%,entende a Recorrente que estes não são devidos, na esteira de inúmeras decisões jurisprudenciais.
XVIII - Resumindo, reclama-se que estando penhorado o direito ação do quinhão hereditário, que garante o pagamento do crédito – o qual não foi embargado por terceiro (filho da Recorrente) - não se concebe a homologação da desistência da penhora do quinhão hereditário, perseguindo a execução com a penhora do prédio urbano, a única casa onde reside a Recorrente, de avançada idade e que não tem outro local para onde ir residir, colando-a numa situação de incerteza e precariedade, sendo-lhe licito apresentar a sua defesa nos tribunais.
XIX - Reitere-se a penhora da ação / quinhão hereditário quinhão, foi decidido colocar em venda judicial, nestes precisos autos, na modalidade de venda em leilão eletrónico (embora desfasado quanto ao real valor patrimonial) e posteriormente em venda por negociação particular.
XX - Mesmo sabendo que a Recorrente o tenha doado ao seu filho, o qual nunca, jamais, se opôs à venda judicial nos presentes autos, aliás, francamente, estes bens prosseguiram para venda judicial em leilão eletrónico.
XXI - Pelo que podia e deveria o tribunal a quo ter mantido a penhora do aludido quinhão hereditário, até que sentença proferido no âmbito da oposição à penhora.

Ou seja, tendo a recorrente e requerida neste incidente de litigância de má fé, pugnado pelo levantamento da penhora que incidiu sobre o direito e acção / quinhão hereditário que era pertença da executada, na herança indivisa, aberta por óbito de M. T. e M. D., porquanto o mesmo já não se encontrava na sua esfera jurídica e isto porque, por escritura pública, por conta da quota disponível, foi doado tal quinhão hereditário da herança aberta indivisa, por óbito dos seus pais, de M. T. (nif. .........) e M. D. (nif. .........), que pertencia à executada, a J. F. vem a mesma, opor-se a decisão que homologou a desistência da penhora feita a 8 de outubro de 2019, relativa ao direito e acção/quinhão hereditário que era pertença da executada, na herança indivisa aberta por óbito dos seus pais – M. T. e M. D., e relativamente ao qual a própria executada no apenso “H” afirmou ter sido alienado a terceiro, através da escritura de doação lavrada a 28 de Novembro de 2018, e, em consequência, ordenou o levantamento da referida penhora.
Temos, pois, por parte da recorrente e requerida neste incidente de litigância de má fé, ao recorrer da decisão homologatória da desistência da penhora e que ordena o levantamento da penhora, uma conduta processual que contradiz ou é manifestamente oposta à anteriormente por si tida e em que requeria aquele levantamento, pelos motivos porque houve lugar à desistência, ser o bem penhorado um bem de terceiro.
Ora, a recorrente e requerida neste incidente de litigância de má fé, não pode desconhecer as duas condutas processuais tidas e a oposição das mesmas, bem como a inexistência de alteração quanto à natureza do bem em causa, na pendência das diversas ações (execução, oposição à penhora e embargos).
Diga-se ainda que o facto de, como conclui a recorrente e requerida neste incidente, de proferida decisão nos autos de oposição à penhora “Apenso H”, a qual foi indeferida, porquanto, não era o meio processual próprio, se ter com a mesma conformado, deixando os autos prosseguir os seus termos, para salvaguardar a casa de morada de família, não justifica a conduta tida nos presentes autos, ao recorrer de uma decisão – homologação da desistência da penhora e levantamento da mesma - que ia de encontro ao por si inicialmente peticionado.
Acresce que, concluir, como conclui a recorrente e requerida neste incidente, que o recorrido e requerente neste incidente, só desistiu da penhora deste bem, porque, entretanto, havia garantido a penhora da única casa de família da Recorrida e que o presente recurso foi deduzido, porque a recorrente e o seu filho entendem que quinhão hereditário é suficiente para liquidar a divida exequenda, também não é justificação para a conduta da mesma
Ora, efetivamente, estando penhorado um bem, comprovadamente de terceiro, não deveria este ter sido penhorado.
Acresce que, estando no poder da exequente (e não na executada e no seu filho) a nomeação de bens à penhora também a mesma poderá dos mesmos desistir, designadamente quando os mesmos não são pertença do executado.
Por último, diga-se que, o facto de ter sido pela mesma deduzida oposição à penhora, que incide também sobre aquele bem penhorado, nada impede o exequente, designadamente por não estarmos perante direitos indisponíveis, de desistir da penhora.
Vem ainda a recorrente e requerida neste incidente arguir como justificação da sua conduta, designadamente, do recurso instaurado, o facto de, no despacho objeto do presente recurso, o tribunal a quo ter relegado a decisão do requerimento de oposição a penhora “Apenso I”, para momento ulterior e com tal decisão, não restou a Recorrente outra via, senão recorrer legitimamente de tal despacho, o qual inviabilizava o fundamento da oposição à penhora, tornava-a invariavelmente, sem nenhum efeito (salvo o devido respeito que é muito, o tribunal a quo poderia e deveria decidir aquele “Apenso I”, julgando-o procedente, improcedente ou até inadmissível).
Ora, salvo o devido respeito por contrária opinião, o apenso I, no qual pretendia a recorrente/requerida a redução da penhora, devendo em conformidade, permanecer penhorado apenas o quinhão hereditário pertença da executada nas aludidas heranças, não impedia a homologação da desistência da penhora e isto porque, conforme declaração da própria interessada aquele bem não lhe pertencia desde a altura em que o havia doado.
Concluindo.
Não pode, em consequência, deixar de se concluir que a recorrente e ora requerida de forma consciente veio, ao contrário do que pugnara em sede de oposição à penhora, opor-se, sem qualquer justificação, à decisão que, tendo em atenção o facto de o bem penhorado não ser pertença daquela, admitiu a desistência daquela penhora.
Não podia a mesma desconhecer a natureza oposta das suas condutas processuais, o que significa ter a mesma, de uma forma dolosa, deduzido o presente recurso conhecendo a sua falta de fundamento e fazendo um uso manifestamente reprovável do processo, com o fim de entorpecer a ação da justiça, o que integra o estatuído nas citadas alíneas a) e d), preenchendo os requisitos para se concluir pela litigância de má fé por parte da mesma.

Aqui chegados importa nos termos do nº 1 do artº 542º do Código de Processo Civil, fixar multa, uma vez que a recorrida e requerente no incidente não pediu, no seu articulado – contra alegações – qualquer indemnização.
Atendendo à gravidade da conduta da recorrente/requerida do incidente, ao valor da causa e ao título de imputação subjetiva em causa (dolo substancial), fixa-se em 5 (cinco) UCs a multa devida por esta
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V – DECISÃO:

Nestes termos, julgo procedente o incidente de litigância de má-fé, condenando a recorrente/requerida no mesmo, na multa de 5 (cinco) UCs.

Custas do incidente de litigância de má fé, a cargo da recorrente/requerida no mesmo, fixando-se a taxa de justiça no mínimo legal, de 1 (uma) UC, conforme art º 7º n.º 4, do RCP e Tabela II anexa.
Guimarães, 20 de outubro de 2022

Relatora: Margarida Pinto Gomes
Adjuntas: Maria da Conceição Bucho
Raquel Rego