Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1657/22.7T8BCL.G1
Relator: JOSÉ ALBERTO MOREIRA DIAS
Descritores: MODO DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO
PRIVAÇÃO DO USO DE VEÍCULO
DANO PATRIMONIAL
DANO NÃO PATRIMONIAL
INDEMNIZAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/29/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1- A falta de indicação, no requerimento de interposição do recurso, da sua espécie, efeito e modo de subida, não constitui fundamento de rejeição do recurso, mas antes cumpre ao tribunal recorrido, no caso de admitir o recurso, no despacho de admissão, suprir essas omissões, sem que essa sua decisão possa ser impugnada pelas partes ou vincule o tribunal superior.
2- A falta de especificações nas conclusões de recurso das menções do art. 639º, n.º 2 do CPC não constitui fundamento de rejeição do recurso, mas apenas é fundamento para que o relator dirija ao recorrente convite para que, no prazo de cinco dias, supra essas omissões, sob pena do recurso ser rejeitado na parte afetada.
3- A mera privação do uso de veículo, na medida em que priva o proprietário de uma das faculdades inerentes ao seu direito de propriedade sobre ele (o uso), constitui, em si mesmo, um dano de natureza patrimonial, que carece de ser indemnizado pelo responsável civil pela privação ilícita e culposa desse uso, independentemente da alegação e prova dos concretos danos sofridos pelo proprietário em consequência dela, ou da alegação e prova em como fazia efetivamente uso (ou pretendia fazer uso) do veículo.
4- O montante concreto da indemnização a arbitrar ao proprietário pela privação do uso do veículo automóvel é determinado por recurso à equidade, partindo do custo diário do aluguer de um veículo de características semelhantes à daquele praticado pelas empresas de aluguer de veículos junto da sua clientela e descontando-lhe os custos de exploração e o lucro dessas empresas.
Decisão Texto Integral:
Acordam na 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I- RELATÓRIO

AA, residente na Rua ..., ... ..., ..., instaurou ação declarativa de condenação, com processo comum, contra EMP01..., S.A., com sede na Avenida ..., ... ..., pedindo que se condenasse a última a pagar-lhe a quantia de:

a) 4.029,06 euros (relativo ao custo da reparação do veículo, sem IVA), acrescida de juros de mora, no dobro da taxa legal, desde ../../2022 (1º dia de atraso) até efetivo e integral pagamento;
b) 884,18 euros (relativo ao valor do IVA devido à taxa legal de 23%, calculado sobre a quantia de 4.279,06 euros), pagamento que deverá ocorrer no prazo de oito dias úteis após a apresentação à Ré da fatura relativa à reparação do veículo;
c) 1.269,41 euros, acrescida de juros legais de mora contados desde a citação até efetivo e integral pagamento;
d) 4.590,00 euros (a título de indemnização/compensação pela privação do uso do veículo automóvel seguro ou de qualquer outro em sua substituição desde ../../2020 – e não desde ../../2022, como por manifestado erro de escrita, evidenciado pelo alegado nos pontos 89º a 93º da petição inicial e pelo valor já liquidado, se escreve no petitório), sem prejuízo da quantia diária de 30,00 euros, contados a partir da propositura da ação, em 13/06/2022, até ao pagamento da quantia necessária à reparação do veículo, no montante de 4.029,06 euros;
e) 3.250,00 euros, acrescida de juros de mora legais contados desde a citação até efetivo pagamento.
Para tanto alegou, em suma: ser proprietária do veículo automóvel da marca ..., modelo ..., matrícula ..-QS-.., em relação ao qual celebrou um contrato de seguro com a Ré de danos próprios em caso de choque, colisão ou capotamento até ao montante 6.273,16 euros; no dia 19/10/2020, o veículo colidiu com um poste, no ..., em consequência do que sofreu diversos estragos, que o impedem de circular; apesar de ter participado o acidente à Ré e de lhe ter solicitado que diligenciasse pela reparação do veículo, esta, apesar de ter diligenciado pela peritagem, que apurou um custo de reparação no montante de 4.0296,06 euros, a que acresce IVA, não diligenciou pela reparação daquele, nem lhe entregou aquela quantia, sendo que ela própria não dispõe de recursos económicos que lhe permitam suportar o custo da reparação, pelo que o veículo permanece por reparar; e ter de pagar à oficina, a título de despesas de recolha, guarda e depósito do veículo a quantia de 1.269,41 euros, para além de estar privada do mesmo, o que lhe demanda danos patrimoniais e não patrimoniais (que concretizou).
Por requerimento de 10/08/2022, a Autora informou que a Ré já transferira para a sua conta a quantia de 4.029,06 euros, correspondente à primeira parte do pedido formulado na alínea a) do petitório, requerendo, porém, que a ação prosseguisse os seus termos legais quanto ao pedido de juros de mora formulado nessa alínea e, bem assim, quanto aos pedidos que formulou sob as alíneas b), c), d), e) e f) da petição inicial.
A Ré contestou defendendo-se por exceção e por impugnação.
Excecionou alegando que o contrato de seguro celebrado com a Autora, no que se refere à garantia de cobertura de veículo de substituição, apenas é válido em Portugal.
Excecionou sustentando já ter pago à Autora, em 10/08/2022, a quantia por esta peticionada na alínea a) do petitório, no montante de 4.029,06 euros.
Mais excecionou alegando que os atrasos verificados ao nível da regularização do sinistro deveram-se ao facto de a Autora ter optado por proceder à peritagem do veículo no estrangeiro, apesar dos alertas efetuados à mesma pela própria quanto aos riscos que isso implicava, não podendo, nessa medida, ser responsabilizada por uma opção que foi apenas e só da Autora e que se encontrava fora do seu poder de decisão.
Impugnou parte de facticidade alegada pela Autora; e reputou de excessivo o montante peticionado a título de indemnização pela paralisação do veículo.
Concluiu pedindo que a ação fosse julgada de acordo com a prova que viesse a ser produzida.
Por despacho proferido em 23/10/2022, determinou-se a adequação formal do processo e, em consequência, dispensou-se a realização de audiência prévia, a identificação do objeto do litígio e a enunciação dos temas da prova; e conheceu-se dos requerimentos de prova apresentados pelas partes.
Em 21/11/2022, proferiu-se despacho saneador tabelar e fixou-se o valor da causa em 14.122,65 euros.

Realizada audiência final, a qual se prolongou por uma única sessão, em 31/01/2024 proferiu-se sentença, em que se julgou a ação parcialmente procedente, constando a mesma da seguinte parte dispositiva:

“Nos termos e pelos fundamentos supra expostos, julga-se procedente (após redução do pedido), por provada, a presente ação e, em conformidade, decide-se:

A) Condenar a EMP01..., S.A. nos pedidos formulados pela Autora AA, i.e., condená-la a:
1. Pagar à Autora a quantia correspondente aos juros de mora legais relativos à quantia de 4.029,06 € (correspondente ao valor da reparação - do veículo acidentado da Autora - sem IVA - 4.279,06 € - com dedução da franquia contratualizada de 250,00 €), no dobro da taxa legal desde ../../2022 (1º dia de atraso) até efetivo e integral pagamento da quantia de 4.029,06 € ocorrido em 10/08/2022 (cfr. artigo 43º, nº 3, da Lei do Seguro Automóvel – Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21.08); 
2. Pagar à Autora a quantia de 984,18 € (relativa ao valor do IVA devido à taxa legal de 23%, calculado sobre a quantia de 4.279,06 € correspondente ao valor da reparação sem IVA), pagamento que deverá(ia) ocorrer no prazo de 8 (oito) dias úteis após a apresentação à Ré da fatura relativa à reparação do veículo;
3. Pagar à Autora a quantia de 1.269,41 € relativa ao montante que a Autora pagou à oficina a título de despesa de recolha, guarda e depósito do veículo automóvel acidentado (cfr. doc. nº ...3 junto com a PI), acrescida de juros legais de mora contados desde a citação até efetivo e integral pagamento;
4. Pagar à Autora a quantia de 4.590,00 € (a título de indemnização/compensação pela privação do uso do veículo automóvel seguro ou de qualquer outro em sua substituição, desde ../../2022 - 9º dia após a devolução do recibo da quantia de 4.029,06 €), acrescida da quantia diária de 30,00 € contada desde a data de instauração desta ação - 13/06/2022 - até ao pagamento da quantia de 4.029,06 € - 10/08/2022 - necessária à reparação do veículo;
5. Pagar à Autora a quantia de 2.500,00 € a título de indemnização/compensação por danos não patrimoniais, acrescida dos juros de mora legais contados desde a data de prolação desta sentença (data de liquidação da quantia devida a esse título) até efetivo e integral pagamento.
*
Fixar custas a cargo dae da Autora (esta decaiu apenas na quantia de 750,00 € que só poderá ser peticionada a título de custas de parte através da respetiva nota discriminativa e justificativa, a apresentar após o trânsito em julgado da presente sentença), na proporção dos respetivos decaimentos, fixando-se o decaimento da Ré em 9/10 e o decaimento da Autora em 1/10, além de que se fixa a taxa de justiça nos termos tabelares do Regulamento das Custas Processuais (artigos 527º/1, 1ª parte, 2, 529º/2 e 607º/6 todos do Código de Processo Civil – CPC)”.

Inconformada com o decido quanto à indemnização arbitrada à Autora a título de privação do uso de veículo automóvel acidentado e, bem assim, a título de compensação por danos não patrimoniais sofridos, a Ré EMP01..., S.A. interpôs recurso, em que formulou as conclusões que se seguem:

I- O tribunal recorrido deu como provado no facto 93º o valor diário de € 30,00 para aluguer de um veículo de substituição idêntico ao veículo da Autora. Fê-lo, no entanto, sem indicar qual ou quais os meios de prova que, em concreto, considerou para dar como provado o valor em causa.
II- E assim o terá feito porque o valor diário em causa não resulta de qualquer documento junto aos autos passível de prova do mesmo - a troca de emails entre Autora e Ré em que a primeira refere esse valor não é suficiente para prova do mesmo. Nem mesmo resultou do depoimento de qualquer testemunha: as testemunhas BB e CC não se referiram ou foram sequer questionadas quanto a tal matéria e a testemunha DD referiu desconhecer em absoluto os valores praticados no mercado para aluguer de veículos automóveis.
III- Ao dar como provado o valor em causa o tribunal recorrido foi além do que a prova lhe permitia, pelo que o facto em causa deverá ser dado como não provado, excluindo-se o mesmo do elenco dos factos provados e integrando-se o mesmo no dos factos dados como não provados.
IV- Não tendo resultado provado o valor diário de € 30,00 para aluguer de um veículo de substituição, não poderá o tribunal recorrido socorrer-se do mesmo para fixar qualquer valor indemnizatório a esse título. Sendo que, mesmo que tal valor tivesse resultado provado, ainda assim, o valor fixado é manifestamente excessivo. 
V- O recurso à equidade tem sido utilizado pela jurisprudência para determinação de tal valor. Sendo que, mesmo tendo por base um qualquer valor indemnizatório de aluguer de veículo semelhante, sempre deverá ser deduzido ao mesmo pelo menos 2/3 daquele tendo em conta as diversas despesas – leasings, seguros, impostos, etc. – e margem de lucros das empresas da área, para se aferir um valor justo e adequado a atribuir ao lesado.
VI. Diversas são as decisões judiciais já proferidas em situações semelhantes que balizam tal montante nos € 10,00 diários. Vejamos, a título de exemplo, e entre muitos outros: Acs. da RP de 14.12.2022, Processo n.º 510/21.6T8ALB.P1 (relator Isabel Silva) e de 10.01.2022, Processo n.º 602/20.9T8AGD.P1 (relator Manuel Domingos Fernandes); Acs. da RC de 10.09.2013, Processo n.º 438/11.8TBTND.C1 (relator Maria José Guerra), e de 09.11.2021, Processo n.º 1434/10.2T8CVL.C1 (relator Mário Rodrigues da Silva), Acs. da RG de 25.06.2020, Processo n.º 1136/18.7T8PTL.G1 (relator Alcides Rodrigues), de 30.1.2020, Processo n.º 500/18.6T8MDL.G1 (relatora Raquel Batista Tavares), e de 26/10/2017, Processo n.º 772/15.8T8FAF.G1 (relatora Anabela Tenreiro).
VII. Pelo que a decisão proferida deverá ser alterada neste ponto concreto e substituída por uma outra que, considerando o valor diário de € 10,00 pela privação do uso, reduza em conformidade a condenação da recorrente.
VIII. Ou, caso se entenda ser de recorrer ao montante fixado contratualmente - o qual, frise-se, se encontra, no entanto, previsto para situações e períodos diferentes da dos presentes autos – ainda assim, o valor diário em causa não poderia ultrapassar os € 14,70 diários atenta a classe, por referência à cilindrada, do veículo da Autora.
IX- O montante atribuído a título de danos não patrimoniais pelo tribunal recorrido não é devido, constituindo a condenação da Ré no mesmo numa duplicação de indemnizações pelo mesmo dano atenta a condenação pela privação do uso.
X- Caso assim não se entenda, sempre deverá tal montante ser reduzido para valor não superior a € 500,00, sob pena de incomensurável injustiça parente outras situações, bem mais gravosas e exigentes, em especial as que envolvem danos corporais.

TERMOS EM QUE o presente recurso deverá ser julgado procedente nos exatos termos supra concluídos, revogando-se a decisão recorrida e substituindo-se a mesma por outra que condene a ré conforme aqui defendido, com o que se fará JUSTIÇA!

A recorrida, AA, contra-alegou, pugnando pela  inadmissibilidade legal do recurso em virtude de, no requerimento de interposição a recorrente não ter identificado a sua espécie, efeito e modo de subida; pela imediata rejeição do recurso interposto quanto à impugnação do julgamento da matéria de facto, decorrente da recorrente não ter especificado, com exatidão, as passagens da gravação dos depoimentos das testemunhas em que funda essa impugnação; a rejeição do recurso quanto à impugnação da matéria de direito, por incumprimento dos ónus impugnatórios do n.º 2, do art. 639º do CPC, em virtude da recorrente não ter especificado as normas jurídicas violadas, nem o sentido com que, no seu entender, deviam ter sido interpretadas e aplicadas; e, em todo o caso, pugnou pela improcedência do recurso, tendo concluído as contra-alegações nos termos que se seguem:

1- De harmonia com o disposto no artigo 637º do Código de Processo Civil, os recursos interpõem-se por meio de requerimento dirigido ao tribunal que proferiu a decisão recorrida, no qual se indica a espécie, o efeito e modo de subida do recurso interposto.
2- No requerimento de interposição de recurso, a Recorrente limita-se a dirigir o presente recurso ao Tribunal da Relação e a remeter para as normas legais consagradas nos artigos 629º e seguintes do Código de Processo Civil, sem indicar a espécie, o efeito e o modo de subida do presente recurso.
3- A notória omissão na indicação expressa da espécie, do efeito e do modo de subida do recurso interposto, constitui uma violação da norma contida no nº 1 do artigo 637º do Código de Processo Civil.
4- Acresce que, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações formuladas pelo Recorrente, não podendo o Tribunal Superior conhecer de matérias nelas não incluídas, com exceção das matérias que sejam de conhecimento oficioso.
5- No que concerne ao recurso da matéria de facto, dispõe o artigo 640º do Código de Processo Civil, que o recorrente deve obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
6- Sendo que, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao Recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
7- Para fundamentar a impugnação da decisão sobre a matéria de facto dada como provado no facto 93, a Recorrente alega que tal facto foi dado como provado pelo tribunal recorrido, sem indicar quais os meios de prova que considerou para dar como provado que o valor diário de 30,00€ para aluguer de um veículo de substituição idêntico ao veículo da Autora e que esse valor não resulta de qualquer documento junto aos autos nem resulta do depoimento de qualquer testemunha, mas não indica nem especifica, com exatidão, as passagens da gravação dos depoimentos das testemunhas.
8- Das conclusões apresentadas pela Recorrente, concretamente nos pontos I, II e III, não constam as passagens da gravação dos depoimentos a que a Recorrente alude, nomeadamente dos depoimentos das testemunhas BB, CC e DD. 
9- A não indicação, com exatidão, das passagens de gravação dos meios probatórios invocados como fundamento do recurso, consubstancia uma violação do ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto e determina a imediata rejeição do recurso na respetiva parte da impugnação em conformidade com o disposto no artigo 640º, nº 1 e nº 2, alínea a) do Código de Processo Civil.
10- O recurso interposto pela Recorrente, na parte relativa à impugnação da matéria de facto, deve ser rejeitado por violação do ónus previsto no artigo 640º do Código de Processo Civil e, por conseguinte, não deve ser apreciado, devendo a decisão sobre a matéria de facto manter-se inalterada.
11- Acresce que, de harmonia com o disposto no nº 2 do artigo 639º do Código de Processo Civil, versando o recurso sobre a matéria de direito, o Recorrente deve indicar nas suas conclusões as normas jurídicas violadas, o sentido com que, no seu entender, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas e, invocando erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no seu entendimento, devia ter sido aplicada.
12- Todavia, percorrendo a motivação e as respetivas dez conclusões do recurso, a Recorrente não indica nem especifica as normas jurídicas violadas nem o sentido com que, no seu entender, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas, incumprindo, deste modo, os pressupostos que impendem sobre a Recorrente que impugne a decisão sobre a matéria de direito. 
13- A falta de indicação, no corpo das alegações e nas conclusões das alegações, das normas jurídicas violadas bem como a não indicação do sentido com que, no seu entender, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas, consubstancia uma violação dos pressupostos consagrados no artigo 639º do Código de Processo Civil e determina a rejeição e a não apreciação do recurso interposto pela Recorrente.
14- O recurso interposto pela Recorrente não deve ser admitido nem apreciado por falta de verificação cumulativa dos requisitos legalmente exigíveis e elencados no artigo 639º do Código de Processo Civil.
15- Sem prescindir, caso o recurso interposto pela Recorrente seja admitido e consequentemente apreciado por este Tribunal Superior, entende a Recorrida que não assiste razão à Recorrente.
16- Quanto ao valor diário de 30,00€ fixado na douta sentença recorrida, a título de indemnização/compensação pela privação do uso do veículo automóvel seguro, entende a Recorrida que o referido montante é adequado, suficiente e justo face ao custo diário de aluguer de veículo da mesma categoria e com características similares ao veículo seguro e ao prolongado período de tempo em que a Autora/Recorrida ficou privada do uso do seu veículo automóvel (211 dias).
17- No modesto entendimento da Recorrida, a substituição do montante diário de 30,00€ para o valor diário de 10,00€, tal como pugnado pela Ré/Recorrente, é insuficiente, ínfimo e não contempla todos os encargos que a Autora, ora Recorrida, teria de suportar caso optasse pelo aluguer de um veículo automóvel da mesma categoria e com características idênticas ao veículo automóvel seguro.
18- A fixação da indemnização/compensação pela privação do uso do veículo, deve pautar-se por uma avaliação casuística e por critérios de adequação, proporcionalidade e ponderação de todos os circunstancialismos do caso em apreço, nomeadamente as despesas/custos de aluguer de um veículo da mesma categoria e com as características do veículo automóvel seguro, bem como o período pelo qual a Autora/Recorrida esteve privada da utilização do seu veículo (211 dias).
19- Como resulta da matéria de facto dada como provada, a Autora/Recorrida utilizava o veículo automóvel seguro para as suas deslocações diárias (trabalho, passeio e lazer) e que, em virtude do sinistro ocorrido em 19/10/2020 e da consequente privação do seu veículo, teve de socorrer-se da ajuda de familiares e amigos, sujeitando-se aos seus horários, vontades e caprichos, bem como a transportes públicos (factos 85º, 87º, 88º,89º, 90º, 91º, 93º, 94º e 95º da matéria de facto dada como provada).
20- Acresce que, a assunção da responsabilidade e da obrigação de indemnizar a Autora/Recorrida pelos danos causados em consequência do sinistro participado em 19/10/2020 e a injustificada delonga no pagamento da quantia necessária para a reparação do veículo seguro, no montante de 4.029,06€, deve sopesar para o apuramento e fixação do montante diário a título de compensação pela privação do uso do veículo seguro.
21- Com o devido respeito, a Autora/Recorrida não pode conformar-se com a excessiva demora na regularização do sinistro participado em 19/10/2020, quando cumpriu as suas obrigações contratuais, nomeadamente o pagamento pontual e atempado do prémio, e quando comunicou à Ré/Recorrente, por diversas vezes, que 30,00€/dia era o montante equivalente ao valor mínimo diário que despenderia caso tivesse optado por alugar um veículo da mesma categoria que o veículo seguro.
22- O incumprimento injustificado da Ré/Recorrente na regularização célere do sinistro não pode, nem deve, deixar de ser sancionado, sob pena de normalizar e pactuar com os excessivos e injustificados atrasos e de penalizar o segurado com o consequente agravamento dos danos resultantes da ocorrência do sinistro.
23- Pelo que, ainda que se entenda que não foi produzida prova no sentido de quantificar objetivamente o valor do dano pela privação do uso do veículo seguro e se recorra a juízos de equidade, o valor mínimo diário de 30,00€ fixado na decisão ora recorrida, afigura-se justo, proporcional e adequado para compensação dos danos sofridos pela Autora/Recorrida em consequência da privação do uso do veículo automóvel seguro, durante o período de 211 dias, nomeadamente para as suas deslocações profissionais, de lazer ou para satisfação das suas necessidades básicas.
24- Em todo o caso, ainda que se entenda que o valor diário de 30,00€, fixado a título de indemnização/compensação pela privação do uso do veículo automóvel seguro, deve ser alterado e reduzido, entende a Recorrida que o montante a ser fixado para compensação pela privação do uso do veículo seguro não deve ser inferior a 14,70€, correspondente ao valor diário constante das condições especiais do contrato de seguro celebrado entre a Autora/Recorrida e a Ré/Recorrente.
25- Pelo exposto, e salvo devido respeito, entende a Recorrida que o montante diário de 30,00€, fixado a título de indemnização/compensação pela privação do uso do veículo automóvel seguro ou de qualquer outro em sua substituição, deve manter-se inalterado, ou em alternativa, deve ser fixado o valor diário não inferior a 14,70€ em função das condições especiais que integram o contrato de seguro celebrado entre a Autora/Recorrida e a Ré/Recorrente.
26- No que respeita à quantia de 2.500,00€ atribuída à Autora/Recorrida a título de indemnização/compensação por danos não patrimoniais, no modesto entendimento da Recorrida, não assiste razão à Recorrente quando alega que o referido montante não é devido uma vez que tal condenação constitui uma duplicação de indemnizações pelo mesmo dano atenta a condenação pela privação do uso (conclusão IX).
27- Contrariamente ao entendimento da Recorrente, a indemnização atribuída à Autora/Recorrida pela privação do uso do veículo automóvel seguro, enquanto dano patrimonial, é cumulável com a indemnização atribuída a título de danos morais.
28- Como exaustivamente tem sido entendido e decidido pelos Tribunais Superiores, o dano decorrente da privação do uso do veículo configura um dano de natureza patrimonial autónomo, suscetível de indemnização em consequência da violação do direito de propriedade, na vertente da livre fruição, uso e disposição por parte do proprietário, e é cumulável com os eventuais danos de natureza não patrimonial/moral sofridos e suportados pelo lesado (Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido em 5-03-2020 (Processo n.º 7289/16.1T8LRS.L1-2).
29- Assim, recaindo o ónus da prova dos factos constitutivos do direito sobre aquele que invoca e que se arroga titular do direito nos termos do disposto no artigo 342º do Código Civil, a Autora/Recorrida alegou e provou os danos não patrimoniais/morais sofridos em consequência do sinistro ocorrido em 19/10/2020.
30- Em consonância com a matéria de facto dada como provada, e assente por não ter sido objeto de impugnação por parte da Recorrente, concretamente nos factos 89º, 90º, 99º e 101º, em consequência direta, adequada e necessária da conduta da Ré e da recusa ilegítima no pagamento e do respetivo incumprimento contratual, a Autora sentiu-se incomodada, desgostosa, passou muitas noites sem dormir, sofreu nervosismo, ansiedade, aborrecimentos, transtornos, incómodos, muitas perdas de tempo, nomeadamente em contactos e deslocações para recolha de elementos, documentos, testemunhas, envio de e-mails, cartas, deslocações ao advogado e outras.
31- A Autora/Recorrida cumpriu o ónus que sobre si recaía para prova do direito a ser ressarcida pelos danos morais sofridos, pelo que, não tendo a Ré/Recorrente provado qualquer facto impeditivo/extintivo do direito invocado pela Autora/Recorrida, bem andou o tribunal a quo ao dar como provados os factos atinentes aos danos não patrimoniais sofridos pela Autora/Recorrida e, em consequência, condenar a Ré/Recorrente no pagamento da quantia de 2.500,00€ a título de indemnização/compensação por danos não patrimoniais, acrescida dos juros legais de mora desde a prolação da sentença até efetivo e integral pagamento.
32- Em todo o caso, a quantia de 2.500,00€ atribuída a título de indemnização pelos danos morais sofridos pela Autora resulta de um prudente arbítrio por parte do Tribunal a quo, alicerçado na gravidade dos incómodos, transtornos, desgostos e sofrimento moral suportados pela Autora/Recorrida que constam do elenco da matéria de facto dada como provada e assente (factos 89º, 90º, 99º e 101º), e que não foi objeto de impugnação.
33- Assim, no modesto entendimento da Recorrida, a redução da indemnização de 2.500,00€, atribuída à Autora a título de indemnização/compensação pelos danos não patrimoniais, para o montante de 500,00€, nos termos pretendidos pela Recorrente, deve ser julgada improcedente uma vez que, para além de não resultar provado qualquer facto impeditivo/modificativo que excluísse o direito invocado pela Autora, a redução da indemnização para o montante de 500,00€ representaria uma diminuta e irrisória compensação face à gravidade dos danos morais sofridos pela Autora durante o extenso e prolongado período decorrido desde a data de participação do sinistro, a 19/10/2020, até ../../2022, data do pagamento da quantia de 4.029,06€, necessária à reparação do veículo seguro, cuja excessiva, injustificada e intolerável delonga deve-se única e exclusivamente por facto imputável à Ré/Recorrente.
34- Com o devido respeito, a Ré/Recorrente apenas se pode queixar de si própria porquanto as quantias atribuídas à Autora, a título de danos patrimoniais e de danos não patrimoniais, são consequência da inércia e do protelar injustificado e abusivo no cumprimento da obrigação de reparar, num prazo razoável, os danos causados à Autora/Recorrida, decorrentes do sinistro participado em 19/10/2020 – neste sentido vide, entre outros, o douto Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça em 5-07-2007 (Processo 07B1849), 
35- No modesto entendimento da Recorrida, a douta decisão recorrida não é passível de qualquer censura ou reparo, devendo, por isso, manter-se inalterada.
36- Pelo que, deve ser negado provimento ao recurso interposto pela Ré/Recorrente, com as legais consequências.
NESTES TERMOS e mais de direito aplicáveis que V. Exas. melhor e doutamente suprirão, deve ser negado provimento ao recurso interposto pela Recorrente com as legais consequências.
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A 1ª Instância admitiu o recurso como sendo de apelação, a subir nos próprios autos e com efeito devolutivo, o que não foi alvo de modificação no tribunal ad quem.
*
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- DO OBJETO DO RECURSO

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
Acresce que, o tribunal ad quem também não pode conhecer de questão nova, isto é, que não tenha sido, ou devesse ser, objeto da decisão sob sindicância, salvo se se tratar de questão que seja do conhecimento oficioso, dado que, sendo os recursos os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, mediante o reexame de questões que tenham sido, ou devessem ser, nelas apreciadas, visando obter a anulação da decisão recorrida (quando padeça de vício determinativo da sua nulidade) ou a sua revogação ou alteração (quando padeça de erro de julgamento, seja na vertente de erro de julgamento da matéria de facto e/ou na vertente de erro de julgamento da matéria de direito), nos recursos, salvo a já enunciada exceção, não podem ser versadas questões de natureza adjetivo-processual e/ou substantivo material sobre as quais não tenha recaído, ou devesse recair, a decisão recorrida[1].

No seguimento desta orientação cumpre ao tribunal ad quem apreciar as seguintes questões:

a- Questões prévias suscitadas pela recorrida:
a.1- Se não ser de admitir o recurso interposto em virtude da recorrente, no requerimento de interposição do recurso, não ter indicado a sua espécie, efeito e modo de subida?;
a.2- Se se impõe rejeitar o recurso quanto à impugnação do julgamento da matéria de facto operada pela recorrente, em virtude desta não ter cumprido com os ónus impugnatórios do art. 640º, n.ºs 1 e 2, al. a) do CPC, ao não ter especificado, com exatidão, as passagens da gravação dos depoimentos das testemunhas em que fundou essa impugnação?;
a.3- Se se impõe rejeitar o recurso por incumprimento dos ónus impugnatórios do n.º 2, do art. 639º do CPC, em virtude da recorrente não ter especificado as normas jurídicas violadas, nem o sentido com que, no seu entender, deviam ter sido interpretadas e aplicadas à facticidade que se quedou provada e não provada nos autos?;
b- Se a sentença recorrida padece de erro de julgamento quanto à matéria de facto que nela foi julgada provada no ponto 93º e se, uma vez revisitada e reponderada a prova produzida, se impõe julgar aquela facticidade como não provada?;
c- se aquela sentença padece de erro de direito quando nela se:
c.1- condenou a recorrente a pagar à recorrida a quantia diária de 30,00 euros, a título de indemnização pela privação do uso do veículo automóvel sinistrado e se, em consequência, se impõe revogar o ponto 4º da sua parte dispositiva e substituí-lo pela condenação da recorrente a pagar à recorrida a quantia diária de 10,00 euros ou, subsidiariamente, a quantia diária de 14,70 euros prevista no contrato de seguro celebrado, a título de indemnização pela privação do uso do veículo automóvel?;
c.2- condenou a recorrente a pagar à recorrida a quantia de 2.500,00 euros, a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos e se, em consequência, se impõe revogar o ponto 5º da sua parte dispositiva e absolver a recorrente desse pedido ou, subsidiariamente, condená-la a pagar à recorrida a quantia de 500,00 euros, a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos?
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III- DA FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A 1ª Instância julgou provada a seguinte facticidade com relevância para a decisão de mérito a proferir nos autos:

1- A Autora é proprietária do veículo automóvel de marca ...” e modelo ..., com a matrícula ..-QS-...
2- Em 30/12/2015, a Autora celebrou com a Ré seguradora, então denominada “EMP02...”, um contrato de seguro relativo ao veículo automóvel com a matrícula ..-QS-.., titulado pela apólice n.º ...93. 
3- A Ré aceitou expressamente o contrato de seguro celebrado com a Autora e considerou-o efetivamente celebrado com início às 00:00 desse dia 30/12/2015, com a duração de 1 ano (renovável).
4- Tal contrato de seguro, titulado pela apólice n.º ...93, tinha e tem como objeto seguro o veículo automóvel da marca ...” e modelo ..., com a matrícula ..-QS-.., propriedade da Autora, cuja cobertura assegurava, para além do mais, os danos próprios provocados no referido veículo a título de choque, colisão ou capotamento até ao capital seguro de 6.273,16 €.
5- O contrato de seguro celebrado entre Autora e Ré, titulado pela apólice n.º ...93, renovou-se em 30/12/2019, pelo período de 1 ano, encontrando-se válido e em vigor desde 30/12/2019 até ../../2020.
6- No dia 19/10/2020, cerca das 19 horas, em ..., ..., o veículo automóvel de matrícula ..-QS-.., propriedade e conduzido pela Autora, sofreu um acidente de viação, tendo colidido e embatido num poste/meco elevatório.
7- Em consequência do acidente, o referido veículo automóvel ficou danificado em toda a extensão da parte da frente, concretamente no pára-choques da frente, capot, grelha, motor, radiador, faróis, etc. 
8- Em consequência do acidente e por via dos danos que apresentava, dada a sua natureza e a sua extensão, o veículo automóvel da Autora, de matrícula ..-QS-.., ficou sem poder circular. 
9- O veículo automóvel de matrícula ..-QS-.. foi transportado (reboque) para as instalações de uma oficina oficial da marca ...”, no ..., denominada “...”, sita em ..., ..., ..., onde foi recolhido e ficou depositado a aguardar que a Ré desse ordem para ser reparado.
10- No mesmo dia do acidente, 19/10/2020, a Autora contactou telefonicamente a Ré e logo após participou-lhe o referido acidente, acionando a cobertura de danos próprios do veículo e solicitou-lhe que diligenciasse pela reparação do veículo automóvel acidentado.
11- A Autora solicitou à oficina oficial da marca ...”, onde o veículo se encontrava guardado/depositado, que procedesse à sua vistoria/peritagem para verificar os danos por este sofridos e avaliar o custo da reparação dos mesmos. 
12- A vistoria/peritagem efetuada em 26/10/2020 pela oficina oficial da marca ...” estimou que o custo da reparação dos danos verificados no veículo ascendia, em materiais e mão-de-obra, ao montante de 5.006,50 € (com IVA incluído). 
13- A Seguradora, ora Ré, estava e está legalmente obrigada a comunicar à segurada, ora Autora, a assunção, ou não, da responsabilidade no prazo de 30 dias úteis a contar do 2º dia útil posterior à data em que lhe foi comunicada a ocorrência do sinistro, o que a Ré não fez, nem deu qualquer justificação válida para essa não comunicação.
14- Desde a data do acidente (19/10/2020) até ao final de abril de 2021, ou seja, durante mais de 6 meses, a Autora solicitou à Ré, por várias vezes, que diligenciasse pela reparação do veículo automóvel acidentado ou lhe pagasse (à Autora) o valor do dano ou prejuízo sofrido por via deste acidente, no valor orçamentado pela oficina oficial da marca ...”, no montante de 5.006,50 €, o que a Ré, sem qualquer motivo ou justificação válida, também não fez, nem se mostrou, nem se mostra, disposta a fazer.
15- Em maio de 2021, face à inércia da Ré em diligenciar pela reparação do veículo ou pelo pagamento à Autora do valor necessário para esta mandar proceder à sua reparação, a Autora viu-se na necessidade de recorrer aos serviços jurídicos de advogado para resolver este assunto junto da Ré seguradora.
16- Em 07/05/2021, o mandatário judicial da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ..., através do qual lhe comunicou que havia sido incumbido pela sua constituinte, ora Autora, no sentido de regularizar assunto relativo ao acidente automóvel ocorrido em 19/10/2020, com o veículo automóvel de que aquela era/é proprietária, com a matrícula ..-QS-..; tal acidente já tinha sido participado à Ré e já tinha sido acionada a cobertura de danos próprios, pelo que enviou à Ré a fatura/orçamento dos danos verificados no veículo, no montante de 5.006,50 €, solicitou-lhe que procedesse ao pagamento da quantia necessária para a Autora mandar proceder à sua reparação, no indicado montante de 5.0006,50 €; e informou-a que o veículo ainda se encontrava na oficina e por reparar, o que agravava os danos e prejuízos sofridos pela Autora decorrentes da privação do uso do veículo acidentado, desde a data do acidente.
17- Nesse dia 07/05/2021, a Ré enviou ao mandatário da Autora o e-mail, que foi junto com a PI como doc. nº ..., a agradecer o contacto efetuado, a informar que o e-mail que este lhe tinha enviado, referido no artigo anterior, foi registado com o n.º ...78, tendo sido encaminhado para tratamento, e que daria resposta com a maior brevidade possível, o que a Ré não fez.
18- Em 17/05/2021, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. nº ..., a solicitar resposta ao e-mail que lhe tinha enviado em 07/05/2021.
19- Nesse dia 17/05/2021, a Ré enviou ao mandatário da Autora o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...0, a agradecer o contacto efetuado, a informar que o e-mail que este lhe tinha enviado, referido no artigo anterior, foi registado com o n.º ...24, tendo sido encaminhado para tratamento, e que daria resposta com a maior brevidade possível, o que a Ré não fez, nem diligenciou pela reparação do veículo automóvel acidentado, nem procedeu ao pagamento da quantia necessária à sua reparação.
20- Em 11/06/2021, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...1, a solicitar resposta aos e-mails que lhe tinha enviado em 07/05/2021 e 17/05/2021.
21- A Ré não respondeu ao e-mail que o mandatário da Autora lhe enviou em 11/06/2021, não diligenciou pela reparação do veículo automóvel acidentado, nem procedeu ao pagamento da quantia necessária à sua reparação.
22- Em 23/06/2021, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...2, a solicitar novamente resposta aos e-mails que lhe tinha enviado em 07/05/2021 e 17/05/2021.
23- Nesse dia 23/06/2021, a Ré enviou ao mandatário da Autora o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...3, a agradecer o contacto efetuado, a informar que o e-mail que este lhe tinha enviado, referido no artigo anterior, foi registado com o n.º ...72, tendo sido encaminhado para tratamento, e que daria resposta com a maior brevidade possível, o que a Ré não fez, nem diligenciou pela reparação do veículo automóvel acidentado, nem procedeu ao pagamento da quantia necessária à sua reparação.
24- Em 02/08/2021, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...4, a solicitar resposta aos e-mails que lhe tinha enviado em 07/05/2021, 17/05/2021, 11/06/2021 e 23/06/2021.
25- Nesse dia 02/08/2021, a Ré enviou ao mandatário da Autora o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...5, a agradecer o contacto efetuado, a informar que o e-mail que este lhe tinha enviado, referido no artigo anterior, foi registado como n.º ...62, tendo sido encaminhado para tratamento, e que daria resposta com a maior brevidade possível.
26- Em 22/10/2021, a Ré enviou ao mandatário da Autora o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...6 a informar que assumia o pagamento de 5.006,50 € correspondente à reparação da viatura ..-QS-.., conforme ao orçamento que lhe fora apresentado.
27- A Ré seguradora solicitou ainda ao mandatário da Autora, através do citado e-mail de 22/10/2021 (doc. n.º ...6 junto com a PI), que a informasse se a viatura se encontrava reparada e, na afirmativa, que lhe enviasse a correspondente fatura pelo montante indicado de 5.006,50 € e em nome da Autora, bem como o comprovativo do IBAN desta.
28- Em 26/10/2021, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...7, a informar que a Autora ainda não tinha procedido à reparação pelo facto de não ter capacidade financeira para proceder ao respetivo pagamento, e a solicitar que a Ré procedesse ao pagamento da quantia necessária à reparação (5.006,50 €) por transferência para a conta bancária da Autora, para o que anexou o documento comprovativo do IBAN desta, e solicitou ainda que lhe enviasse o comprovativo de tal pagamento/transferência.
29- Em 29/10/2021, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...8, a solicitar resposta ao e-mail que lhe tinha enviado em 26/10/2021.
30- A Ré não respondeu ao e-mail que o mandatário da Autora lhe enviou em 26/10/2021 e não procedeu ao pagamento da quantia que assumiu pagar-lhe através do e-mail que enviou em 22/10/2021, no montante de 5.006,50 € correspondente à reparação da viatura ..-QS-...
31- Em 04/11/2021, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...9, a solicitar novamente resposta ao e-mail que lhe tinha enviado em 26/10/2021.
32- Em 11/11/2021, a Ré enviou ao mandatário da Autora o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...0, a remeter o recibo de indemnização em nome da Autora e no valor de 4.029,00 €, correspondente ao valor do orçamento de 5.006,50 €, sem IVA e com a franquia contratual de 250,00 € deduzida a esse valor.
33- Através do referido e-mail de 11/11/2021 (doc. n.º ...0 junto com a PI), a Ré seguradora comunicou ao mandatário da Autora que assumiria o pagamento do montante em falta (relativo ao valor do IVA) mediante a apresentação da fatura em nome da Autora, que o IBAN enviado com o e-mail de 26/10/2021 não era válido, devendo ser documento de onde constasse a identificação do titular e do Banco, bem como lhe comunicou que, mediante a devolução do recibo e depois de legalizado, efetuaria o pagamento.
34- Em 12/11/2021, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...1, a solicitar que a situação fosse reapreciada, uma vez que, para além do valor constante do recibo que a Ré tinha enviado em 11/11/2021, relativo ao valor da reparação sem IVA, assistia ainda à Autora o direito de receber o valor de 1.269,41 €, relativo à despesa da recolha/guarda do veículo que a Autora já tinha pago à oficina onde o veículo ficou a aguardar ordem de reparação por parte da seguradora, enviando-lhe cópia da respetiva fatura, bem como uma compensação pela privação do uso do veículo que naquela data quantificou em 1.500,00€, solicitando, por isso, que a Ré procedesse à emissão de novo recibo de indemnização que contemplasse aquelas despesa e compensação de 1.269,41€ e 1.500,00€ ou, em alternativa, à emissão de outro recibo com estes montantes (2.769,41€).
35- A Ré não respondeu ao e-mail que o mandatário da Autora lhe enviou em 12/11/2021.
36- Em 26/11/2021, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...2, a solicitar resposta ao e-mail que lhe tinha enviado em 12/11/2021.
37- A Ré não respondeu ao e-mail que o mandatário da Autora lhe enviou em 26/11/2021.
38- Em 13/12/2021, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...3, a solicitar resposta aos e-mails que lhe tinha enviado em 12/11/2021 e 26/11/2021.
39- A Ré também não respondeu ao e-mail que o mandatário da Autora lhe enviou em 13/12/2021.
40- Em 22/12/2021, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...4, a solicitar a resolução do assunto relativo ao sinistro e evitar mais desgaste e prejuízos, insistindo pelo pagamento à Autora da despesa efetivamente suportada e relativa à guarda/recolha do veículo, no valor de 1.269,41 €, bem como da compensação pela privação do uso do seu veículo que naquela data quantificou em 1.500,00 €, e pela emissão de outro recibo de indemnização relativo a estes montante (2.769,41 €).
41- A Ré não respondeu ao e-mail que o mandatário da Autora lhe enviou em 22/12/2021.
42- Em 17/01/2022 e 31/01/2022, o mandatário da Autora enviou à Ré os e-mails que foram juntos com a PI como docs. n.ºs ...5 e ...6, a solicitar resposta ao e-mail que lhe tinha enviado em 22/12/2021.
43- Em 01/02/2022, a Ré enviou ao mandatário da Autora o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...7, a informar que não assumiria o pagamento de despesas relativamente a parqueamento, nem da quantia reclamada pela Autora a título de substituição de veículo e que ficava a aguardar o envio do recibo de indemnização que tinha enviado, devidamente legalizado (assinado), bem como comprovativo do IBAN válido.
44- Nesse mesmo dia 01/02/2022, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...8, a comunicar-lhe que, para evitar mais perdas de tempo e despesas, a Autora aceitava receber a quantia de 4.029,06 € referente ao valor do orçamento sem IVA, e que reclamaria o valor do IVA quando lhe fosse apresentada a fatura da reparação do veículo.
45- Através do referido e-mail de 01/02/2022 (doc. n.º ...8 junto com a PI), o mandatário da Autora enviou à Ré o recibo de indemnização que esta tinha remetido em 11/11/2021 no valor de 4.029,06 €, assinado pela Autora, acompanhado do comprovativo do IBAN e cópia do respetivo cartão de cidadão, e solicitou à Ré que procedesse à transferência da quantia de 4.029,06 € para a conta bancária da Autora com a maior urgência possível.
46- Em 21/02/2022, porque a Ré não procedia, como ainda não procedeu, ao pagamento da quantia que assumiu pagar à Autora, no montante de 4.029,06 €, constante do recibo de indemnização que enviou em 11/11/2021 e que o mandatário da Autora lhe devolveu em 01/02/2022, devidamente legalizado (assinado), o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...9, a solicitar que o informasse se já tinha procedido ao referido pagamento.
47- A Ré não respondeu ao e-mail que o mandatário da Autora lhe enviou em 21/02/2022 e não procedeu ao pagamento da quantia constante do recibo de indemnização, no valor de 4.029,06 €, nem deu qualquer justificação válida para o efeito.
48- Em 25/02/2022, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...0, a solicitar, novamente, que o informasse se já tinha procedido ao referido pagamento.
49- A Ré não respondeu ao e-mail que o mandatário da Autora lhe enviou em 25/02/2022 e não procedeu ao pagamento da quantia constante do recibo de indemnização no valor de 4.029,06 €.
50- Em 07/03/2022, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...1, a solicitar novamente que procedesse ao pagamento por transferência bancária da quantia de 4.029,06 € para a conta bancária da Autora nos 2 dias seguintes.
51- A Ré não respondeu ao e-mail que o mandatário da Autora lhe enviou em 07/03/2022 e não procedeu ao pagamento da quantia constante do recibo de indemnização que enviou em 11/11/2021 e que o mandatário da Autora lhe devolveu em 01/02/2022, no montante de 4.029,06 €.
52- Em 14/03/2022, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...2, a solicitar novamente que procedesse ao pagamento por transferência bancária da quantia de 4.029,06 € para a conta bancária da Autora nos 2 dias seguintes.
53- Mais uma vez, a Ré não respondeu ao e-mail que o mandatário da Autora lhe enviou em 14/03/2022 e não procedeu ao pagamento da quantia a que se obrigou, constante do recibo de indemnização suprarreferido e no montante de 4.029,06 €.
54- Em 23/03/2022, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...3, a solicitar novamente e mais uma vez que procedesse, com a maior urgência possível, ao pagamento por transferência bancária da quantia constante do recibo de indemnização que já lhe tinha sido devolvido em 01/02/2022, ou seja, há quase dois meses, e a comunicar-lhe que, caso o pagamento não fosse efetuado nos 2 dias seguintes, a Autora reservava o direito de usar em tribunal os emails enviados, para prova da excessiva morosidade no pagamento e na reclamação dos prejuízos daí decorrentes.
55- A Ré não respondeu ao e-mail que o mandatário da Autora lhe enviou em 23/03/2022 e não procedeu ao pagamento da quantia constante do recibo de indemnização que enviou em 11/11/2021 e que o mandatário da Autora lhe devolveu em 01/02/2022, no montante de 4.029,06 €, nem deu qualquer justificação para o efeito.
56- Em 28/03/2022, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...4, a solicitar mais uma vez que procedesse ao pagamento da quantia de 4.029,06 € relativo sinistro e ao recibo devolvido em 01/02/2022, e a comunicar-lhe que, caso o pagamento não fosse efetuado nos 2 dias seguintes, a Autora reservava o direito de reclamar em Tribunal todas as indemnizações a que tinha e tem direito, inclusive pelos prejuízos derivados do incumprimento contratual e da excessiva e injustificada morosidade da Ré, usando em Tribunal os emails enviados, para prova de tais factos.
57- Nesse dia 28/03/2022, a Ré enviou ao mandatário da Autora os e-mails que foram juntos com a PI como docs. n.ºs ...5 e ...6, um (doc. n.º ...5) a agradecer o contacto efetuado, a informar que o e-mail que lhe tinha enviado nesse dia 28/03/2022 (doc. n.º ...4) foi registado com o n.º ...80, tendo sido encaminhado para tratamento, e que daria resposta com a maior brevidade possível, e outro (doc. n.º ...6) a agradecer o contacto efetuado, a confirmar que recebeu o pedido efetuado através do e-mail enviado nesse dia 28/03/2022 (doc. n.º ...4), que foi registado com o n.º ...81, e que lhe iria responder nos dias seguintes, o que a Ré não fez nem procedeu ao pagamento da quantia constante do referido recibo de indemnização, no montante de 4.029,06 €, nem deu qualquer justificação para o efeito.
58- Em 01/04/2022 o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...7, a solicitar o envio do comprovativo do pagamento à Autora da quantia de 4.029,06 € relativo ao sinistro e ao recibo de indemnização devolvido em 01/02/2022.
59- Nesse dia 01/04/2022, a Ré enviou ao mandatário da Autora os e-mails que foram juntos com a PI como docs. n.ºs ...8 e ...9, um (doc. n.º ...8) a agradecer o contacto efetuado, a confirmar que recebeu o pedido efetuado através do e-mail enviado nesse dia 01/04/2022 (doc. n.º ...7), que foi registado com o n.º ...18, e que lhe iria responder nos dias seguintes, e outro (doc. n.º ...9) a agradecer o contacto efetuado, a informar que o e-mail que lhe tinha enviado nesse dia 01/04/2022 (doc. n.º ...7) foi registado com o n.º ...19, tendo sido encaminhado para tratamento, e que daria resposta com a maior brevidade possível, o que a Ré não fez nem procedeu ao pagamento da quantia constante do referido recibo de indemnização no montante de 4.029,06 €, nem deu qualquer justificação para o efeito.
60- Em 08/04/2022, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...0, a solicitar novamente o envio do comprovativo do pagamento à Autora da quantia de 4.029,06 € relativo ao sinistro e ao recibo de indemnização devolvido em 01/02/2022.
61- Nesse dia 08/04/2022, a Ré enviou ao mandatário da Autora os e-mails que foram juntos como docs. n.ºs ...1 e ...2, um (doc. n.º ...1) a agradecer o contacto efetuado, a informar que o e-mail que lhe tinha enviado nesse dia 08/04/2022 (doc. n.º ...0) fora registado com o n.º ...00, tendo sido encaminhado para tratamento, e que daria resposta com a maior brevidade possível, e outro (doc. n.º ...2) a agradecer o contacto efetuado, a confirmar que recebera o pedido efetuado através do e-mail enviado nesse dia 08/04/2022 (doc. n.º ...0), que fora registado com o n.º ...01, e que lhe iria responder nos dias seguintes, o que a Ré não fez nem procedeu ao pagamento da quantia constante do referido recibo de indemnização no montante de 4.029,06 €, nem deu qualquer justificação para o efeito.
62- Em 22/04/2022, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...3, a solicitar, numa última tentativa de resolução extrajudicial do assunto, que procedesse ao pagamento à Autora da quantia de 4.029,06 € e a comunicar-lhe que, caso o pagamento não fosse efetuado nos 2 dias seguintes, a Autora reservava o direito de recorrer a Tribunal, reclamando as indemnizações a que tinha e tem direito e participando a situação às entidades administrativas e de supervisão competentes.
63- Nesse dia 22/04/2022, a Ré enviou ao mandatário da Autora os e-mails que foram juntos com a PI como docs. n.ºs ...4 e ...5, um (doc. n.º ...4) a agradecer o contacto efetuado, a confirmar que recebera o pedido efetuado através do e-mail enviado nesse dia 22/04/2022 (doc. n.º ...3), que foi registado com o n.º ...98 e que lhe iria responder nos dias seguintes, e outro (doc. n.º ...5) a agradecer o contacto efetuado, a informar que o e-mail que lhe tinha enviado nesse dia 22/04/2022 (doc. n.º ...3) fora registado com o n.º ...00, tendo sido encaminhado para tratamento, e que daria resposta com a maior brevidade possível, o que a Ré não fez nem procedeu ao pagamento da quantia constante do recibo de indemnização de 4.029,06 €, nem deu qualquer justificação para o efeito.
64- Em 04/05/2022, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...6, a solicitar, mais uma vez, que procedesse ao pagamento à Autora da quantia de 4.029,06 €, relativa ao recibo devolvido a 01/02/2022, alertando-a de que a situação estava a causar e já causara prejuízos e danos à Autora, a qual contava receber a quantia em causa e fazer face a compromissos assumidos, que a atuação da seguradora consubstanciava grave incumprimento e conduta violadora da boa-fé, e a comunicar-lhe que, caso o pagamento não fosse efetuado nos 2 dias seguintes, a Autora reservava o direito de recorrer a Tribunal, reclamando as indemnizações a que tinha e tem direito, usando em Tribunal todos os emails para prova do incumprimento e da mora da seguradora.
65- Nesse dia 04/05/2022, a Ré enviou ao mandatário da Autora os e-mails que foram juntos com a PI como docs. n.ºs ...7 e ...8, um (doc. n.º ...7) a agradecer o contacto efetuado, a confirmar que recebeu o pedido efetuado através do e-mail enviado nesse dia 04/05/2022 (doc. n.º ...6), que fora registado com o n.º ...53 e que lhe iria responder nos dias seguintes, e outro (doc. n.º ...8) a agradecer o contacto efetuado, a informar que o e-mail que lhe tinha enviado nesse dia 04/05/2022 (doc. n.º ...6) fora registado com o n.º ...54, tendo sido encaminhado para tratamento, e que daria resposta com a maior brevidade possível, o que a Ré não fez nem procedeu ao pagamento da quantia constante do recibo de indemnização de 4.029,06 €, nem deu qualquer justificação para o efeito.
66- Em 18/05/2022, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...9, a solicitar novamente que procedesse ao pagamento à Autora da quantia de 4.029,06 €, relativa ao recibo devolvido a 01/02/2022, alertando-a de que a situação estava a causar e já causara prejuízos e danos à Autora, a qual contava receber a quantia em causa para poder pagar a reparação, que a atuação da seguradora consubstanciava grave incumprimento e conduta violadora da boa-fé, inviabilizando que a Autora procedesse à reparação do veículo, uma vez que esta necessitava de receber a quantia em causa para tal feito, e a comunicar-lhe que, caso o pagamento não fosse efetuado nos 2 dias seguintes, a Autora reservava o direito de recorrer a Tribunal, reclamando as indemnizações a que tinha e tem direito, nomeadamente a quantia diária mínima de 30,00 € correspondente ao valor do aluguer de um veículo; esclareceu que assistia à Autora, e assiste, o direito de reclamar o valor do aluguer de um veículo face à recusa do pagamento por parte da seguradora e enquanto subsistir a recusa e falta de pagamento; referiu ainda que seriam usados em Tribunal todos os emails enviados à seguradora e aos quais esta não deu, nem dá, resposta, tudo para prova da mora, do incumprimento, do desinteresse e da má-fé da seguradora, bem como ainda para que a seguradora não pudesse vir alegar desconhecimento da situação.
67- Nesse dia 18/05/2022, a Ré enviou ao mandatário da Autora os e-mails que foram juntos com a PI como docs. n.ºs ...0 e ...1, um (doc. n.º ...0) a agradecer o contacto efetuado, a confirmar que recebeu o pedido efetuado através do e-mail enviado nesse dia 18/05/2022 (doc. n.º ...9), que fora registado com o n.º ...33 e que lhe iria responder nos dias seguintes, e outro (doc. n.º ...1) a agradecer o contacto efetuado, a informar que o e-mail que lhe tinha enviado nesse dia 18/05/2022 (doc. n.º ...9) fora registado com o n.º ...35, tendo sido encaminhado para tratamento, e que daria resposta com a maior brevidade possível, o que a Ré não fez nem procedeu ao pagamento da quantia constante do recibo de indemnização de 4.029,06 €, nem deu qualquer justificação para o efeito.
68- Finalmente, em 02/06/2022, o mandatário da Autora enviou à Ré o e-mail que foi junto com a PI como doc. n.º ...2, a solicitar, mais uma vez e numa última tentativa de resolução extrajudicial, que procedesse ao pagamento à Autora da quantia de 4.029,06 €, relativa ao recibo devolvido a 01/02/2022, alertando-a de que a situação estava a causar e já causara prejuízos e danos à Autora, a qual contava receber a quantia em causa para poder pagar a reparação, e a comunicar que a atuação da seguradora consubstanciava grave incumprimento e conduta violadora da boa-fé, inviabilizando que a Autora procedesse à reparação do veículo, uma vez que necessitava de receber a quantia em causa para tal efeito, e a comunicar-lhe que, caso o pagamento não fosse efetuado nos 2 dias seguintes, a Autora estaria legitimada para recorrer a Tribunal, reclamando as indemnizações a que tinha e tem direito, nomeadamente a quantia diária mínima de 30,00 € correspondente ao valor do aluguer de um veículo; concretizou que lhe assistia o direito de reclamar esse valor face à recusa do pagamento por parte da seguradora e enquanto subsistisse a recusa e a falta de pagamento completamente injustificadas, anómalas e absurdas, pelo que seriam usados em Tribunal todos os emails enviados à seguradora e aos quais esta não deu, nem dava, resposta, para prova da mora, do incumprimento, do desinteresse e da má-fé da seguradora, e para que a seguradora não pudesse vir alegar desconhecimento da situação.
69- Mais uma vez, a Ré não respondeu ao e-mail que o mandatário da Autora lhe enviou em 02/06/2022, suprarreferido, e não procedeu ao pagamento da quantia necessária à reparação do veículo no montante de 4.029,06 €, relativo ao recibo de indemnização devolvido em 01/02/2022, nem deu qualquer justificação para o efeito.
70- A Autora, quer diretamente quer através do seu mandatário, solicitou à Ré, por várias vezes, pelo menos 13 vezes e durante pelo menos 4 meses [e-mails de 01/02/2022 (doc. ...8), 21/02/2022 (doc. ...9), 15/02/2022 (doc. ...0), 07/03/2022 (doc. ...1), 14/03/2022 (doc. ...2), 23/03/2022 (doc. ...3), 28/03/2022 (doc. ...4), 01/04/2022 (doc. ...7), 08/04/2022 (doc. ...0), 22/04/2022 (doc. ...3), 04/05/2022 (doc. ...6), 18/05/2022 (doc. ...9) e 02/06/2022 (doc. ...2)], que lhe pagasse o valor do dano ou prejuízo sofrido por via do referido acidente, no montante que a Ré aceitou pagar, no indicado montante de 4.029,06 €, o que esta, sem qualquer motivo ou justificação válida, não fez, nem se mostra disposta a fazer.
71- A Seguradora, ora Ré, estava e está legalmente obrigada a proceder ao pagamento à lesada, ora Autora, da quantia decorrente do sinistro, no prazo de 8 (oito) dias úteis a contar da data da assunção da responsabilidade e mediante a apresentação dos documentos necessários ao pagamento. 
72- A Ré estava obrigada a proceder ao pagamento à Autora da quantia de 4.029,06 €, relativa ao valor necessário à reparação do veículo acidentado, até ao dia ../../2020 (8º dia útil posterior à data em que lhe foram remetidos os documentos necessários ao pagamento).
73- Apesar do prazo de que dispunha para o efeito já ter sido, há muito, ultrapassado, a Ré ainda não procedeu ao pagamento da quantia devida à Autora no montante suprarreferido de 4.029,06 €, nem deu qualquer justificação válida para o efeito. 
74- Largamente ultrapassada a data do acidente e ultrapassado largamente o prazo legalmente estabelecido de que dispunha para o efeito, a Ré veio a proceder apenas ao pagamento da quantia devida à Autora, constante do recibo de indemnização que enviou em 11/11/2021 e que lhe fora devolvido em 01/02/2022, após a citação da mesma Ré para a presente ação e concretamente em 10/08/2022, mas não apresentou qualquer justificação fundamentada para não o ter feito anteriormente.
75- O prazo decorrido desde a data do acidente (19/10/2020) até ../../2022, sem que a Ré tenha procedido à regularização do sinistro e ao pagamento da quantia que aceitou pagar à Autora decorrente do acidente, não tem qualquer motivo ou justificação válida e atendível.
76- O prazo de que a Ré dispôs desde a data do acidente e desde que lhe foi devolvido o recibo de indemnização é exagerado e incompatível com o interesse do lesado de ver o acidente de viação resolvido dentro do prazo de 30 dias úteis que o legislador considerou como razoável e necessário para o efeito e de receber o valor a que tem direito dentro do prazo de 8 dias úteis que o legislador também considerou como razoável e necessário.
77- Apesar dos vários e-mails enviados pela Autora e pelo seu mandatário e dos diversos contactos telefónicos efetuados, a Ré não procedeu ao pagamento da quantia a que aquela tinha direito, desprezando e ignorando por completo os vários, constantes e sucessivos pedidos e apelos formulados pela Autora nesse sentido e mostrando-se completamente indiferente aos danos e prejuízos por esta sofridos e à sua privação do uso do veículo automóvel danificado. 
82- À data do acidente, a Autora não dispunha de condições financeiras para mandar proceder e pagar a reparação do veículo automóvel acidentado, facto de que avisou a Ré seguradora através dos e-mails suprarreferidos.
83- A Autora celebrou o contrato de seguro automóvel com a Ré, titulado pela apólice n.º ...93, e com as coberturas contratadas, nomeadamente com a cobertura que assegurava os danos próprios provocados no referido veículo a título de choque, colisão ou capotamento até ao capital seguro de 6.273,16 € para, caso sofresse um acidente de viação (choque, colisão ou capotamento) em que a culpa não fosse imputável a terceiro, como é o caso da situação concreta objeto dos presentes autos, a seguradora assumir a responsabilidade pelo pagamento dos danos sofridos até ao valor do capital seguro de 6.273,16 €, o que a Ré seguradora não fez até ../../2022. 
85- Face à recusa injustificada da Ré em regularizar o acidente e pagar à Autora o valor do dano ou prejuízo sofrido no montante de 4.029,06 €, a Autora ficou privada do uso do seu veículo automóvel de matrícula ..-QS-.. ou de qualquer outro em sua substituição desde a data do acidente (19/10/2020).
87- A Autora tinha necessidade do seu veículo automóvel, ou de outro, pois utilizava diariamente o seu veículo automóvel de matrícula ..-QS-.. em todas as suas deslocações de trabalho, passeio e lazer, nomeadamente nos fins-de-semana. 
88- Com a privação do uso do seu veículo, a Autora deixou de fazer muitas das deslocações que necessitava e/ou que pretendia efetuar e outras, sendo que para as poder fazer teve de recorrer a “boleias”, ao transporte de familiares e amigos, sujeitando-se aos seus horários, vontades e caprichos, bem como a transportes públicos.
89 e 90- A Autora esteve impossibilitada de se deslocar a seu bel-prazer desde ../../2020, o que lhe causou e continua a causar grandes transtornos, incómodos, frustração, aborrecimentos, “chatices” e arrelias, nervosismo e descontrolo emocional. 
91- Por via da privação do uso do seu veículo automóvel, a Autora ficou limitada na sua liberdade de deslocação e de movimentação até que a Ré lhe pagou a quantia necessária à reparação do veículo automóvel acidentado, no montante de 4.029,06 €.
93- 30,00 € por dia é o montante equivalente ao valor mínimo diário que a Autora despenderia caso tivesse optado por alugar um veículo automóvel da mesma categoria do veículo seguro, facto para o qual a Ré seguradora foi avisada e alertada através dos e-mails suprarreferidos.
94- A Autora esteve privada do uso do seu veículo automóvel ou de qualquer outro em sua substituição e a sofrer os danos daí decorrentes até a Ré lhe ter pago a quantia necessária à reparação do veículo automóvel acidentado, no montante de 4.029,06 €.
95- A Autora esteve privada do uso do seu veículo automóvel, ou de qualquer outro em sua substituição, pelo menos desde ../../2022 (9º dia após a devolução do recibo da quantia de 4.029,06 €) até à data do pagamento da quantia de 4.029,06 € (10/08/2022), montante necessário à reparação do veículo automóvel acidentado.
97- A Autora celebrou com a Ré um contrato de seguro para cobrir os danos e prejuízos resultantes de choque, colisão ou capotamento do seu veículo automóvel, tendo pago pontualmente os respetivos prémios de apólice.
98- A Ré recusou-se, sem qualquer justificação, a proceder ao pagamento dos danos sofridos pela Autora com o acidente (choque/colisão) do seu veículo automóvel, mesmo após ter assumido o pagamento e ter emitido e enviado à Autora o recibo no valor de 4.029,06 €, recibo esse que esta assinou e devolveu, sem que a Ré tenha procedido ao seu pagamento até ../../2022.
99- Em consequência direta, adequada e necessária da conduta da Ré e da sua recusa no pagamento da quantia necessária à reparação do veículo automóvel acidentado, a Autora, para além de ter sido privada do uso do seu veículo automóvel, sofreu desgosto, revolta, angústia, nervosismo e desespero, uma vez que ficou impossibilitada de o mandar reparar e, consequentemente, de o utilizar sempre que queria e necessitava ou pretendia.
101- Em consequência direta, adequada e necessária da conduta da Ré e da sua recusa ilegítima e do respetivo incumprimento contratual, a Autora sentiu-se incomodada e desgostosa e passou muitas noites sem dormir, sofreu nervosismo, ansiedade, aborrecimentos, transtornos e incómodos e muitas perdas de tempo, nomeadamente em contactos e deslocações para tentar resolver esta situação, para recolha de elementos, documentos, testemunhas, envio de e-mails e cartas, e em deslocações ao advogado e outras.
106- O contrato de seguro celebrado entre Autora e Ré, titulado pela apólice n.º ...93, na ocasião dos factos (19/10/2020) era válido e estava em vigor.
107- A Ré, na sequência de contacto da mesma através da participação de acidente apresentada pela Autora, no dia 21.10.2020 enviou-lhe uma comunicação escrita na qual informou:
Exma. Senhora, Informamos que podemos fazer peritagem no ..., mas alertamos desde já que não temos qualquer tipo de controlo sobre uma peritagem efetuada no estrangeiro, onde habitualmente as peritagens demoram várias semanas, por vezes meses, a serem concretizadas.
A efetivação da peritagem está dependente do nosso Representante em Portugal, do parceiro deste no estrangeiro e também do gabinete a quem a mesma é entregue.
Deste modo, nestes casos sugerimos vivamente que as peritagens sejam efetuadas em Portugal.
Pela experiência que temos de casos anteriores, mesmo que se perca algum tempo a transportar o veículo para Portugal, esse atraso é compensado com a rápida execução da peritagem e as situações são resolvidas num espaço de tempo significativamente inferior, minimizando os prejuízos com a imobilização e custos de parqueamento da viatura, os quais como sabem, não nos poderão ser imputados.
Com os nossos melhores cumprimentos.”
Na mesma comunicação escrita e conforme transcrito, a Ré alertou a Autora para os eventuais atrasos/demoras na realização de peritagens fora de Portugal.
108- A Ré mais informou expressamente a Autora, nessa mesma comunicação, de que, caso aquela, ainda assim, optasse por fazer a peritagem no estrangeiro, a Ré não assumiria os custos de parqueamento associados, devido às demoras alegadamente verificadas.
109- Não obstante esta comunicação/alerta expresso da Ré, a Autora optou/insistiu por manter o veículo no estrangeiro e aí fazer a respetiva peritagem.
110- A Ré providenciou no sentido de obter o relatório de averiguação.
111- Após receber o relatório em causa, a Ré em 11.11.2021 comunicou à Autora que pretendia indemnizá-la pelo valor € 4.029,06, correspondente ao valor do orçamento deduzido do respetivo IVA e da franquia contratualizada de € 250,00, enviando o respetivo recibo de quitação e solicitando o comprovativo de IBAN da Autora.
112- A Ré informou a Autora de que liquidaria o montante referente ao IVA da reparação mediante a apresentação da respetiva fatura de reparação.
113- Em resposta a esta comunicação, o mandatário da Autora, em 12.11.2021, solicitou o pagamento de outros montantes decorrentes da recolha do veículo (€ 1.269,41) e da paralisação do mesmo (€ 1.500,00).
114- Em 01.02.2022, perante as insistências do mandatário da Autora, a Ré informou o mesmo de que não poderia, nem iria assumir as despesas de parqueamento solicitadas, porquanto tinha a Autora sido expressamente alertada para essa não assunção em fase prévia à própria peritagem.
115- A Ré mais informou de que não forneceria veículo de substituição no estrangeiro, uma vez que tal hipótese estaria afastada pelas condições especiais da apólice, razão pela qual não poderia assumir, também, o pagamento de € 1.500,00 solicitado a título de paralisação.
116- Da apólice contratada e no que se refere à modalidade de seguro contratada com a Autora, consta quanto à cobertura de viatura de substituição que
Esta cobertura é garantida até aos limites fixados nas Condições Particulares e é válida exclusivamente em Portugal. Não obstante, caso se verifique um sinistro em país estrangeiro, após o repatriamento do veículo seguro para Portugal, serão aplicáveis os termos da cobertura aqui definidos.” – cfr. págs. 39/68 das condições gerais da apólice de seguro junta com a contestação como doc. n.º ... e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
117- A Ré procedeu ao pagamento, à Autora, da quantia de € 4.029,06, em 10.08.2022.
118- A Ré permanece disponível para proceder ao pagamento do montante referente ao IVA, mediante a apresentação da fatura de reparação do veículo da Autora.
119- A Ré tinha conhecimento da fatura da reparação de 5.006,50 € desde ../../2021 e do relatório da peritagem desde ../../2021.
120- Quanto às condições gerais da apólice juntas pela Ré, a Autora nunca foi informada e não lhe foi comunicado nem explicado o teor da clausula 11.3 que refere que a garantia do veículo de substituição é válida exclusivamente em Portugal.
121- Relativamente à privação do uso do veículo, o que a Autora reclama está relacionado com o incumprimento contratual da Ré por esta não ter pago à Autora atempadamente o valor da reparação.
122- A indemnização relativa à privação do uso do veículo está relacionada com o período posterior ao envio do recibo de indemnização (enviado em 01/02/2022) que apenas acabou por ser paga em 10/08/2022 e só após a instauração da presente ação.
*
E julgou como não provados os seguintes factos:

1- Uma vez que o acidente de viação em causa ocorreu no estrangeiro, não foi possível à Ré proceder às normais diligências de averiguação.
2- As peritagens fora de Portugal saem do controlo e da esfera da Ré, não podendo a mesma, nessa medida, garantir a cumprimento dos prazos legais estipulados – até porque os regimes jurídicos e as regras a cumprir nas próprias peritagens diferem de país para país.
3- A Ré desconhece em que data foi efetuada a peritagem à viatura da Autora, sendo que apenas tomou conhecimento da realização mesma através de comunicação da própria Autora já no final de dezembro de 2020.
4- Atenta a legislação e as regras praticadas no ..., a viatura em causa foi considerada como perda total, o que foi transmitido primeiramente à Ré pela ora Autora.
5- A informação descrita em 20º foi também a informação veiculada à Ré após solicitações aos serviços estrangeiros nesse sentido.
6- A Ré apenas conseguiu aceder ao relatório de averiguação já em setembro de 2021, pese embora as insistências que efetuou nesse sentido com os serviços de peritagem no estrangeiro.
7- O mandatário da Autora não procedeu ao envio do recibo de quitação, anteriormente remetido pela Ré, devidamente assinado pela Autora e sem o qual, como expressamente alertado pela Ré, a mesma não poderia proceder ao respetivo pagamento.
8- Quaisquer eventuais atrasos da Ré na regularização do sinistro aqui em causa devem-se ao facto de a Autora ter optado por proceder à peritagem do veículo no estrangeiro, isto pese embora os alertas efetuados à mesma Autora pela Ré quanto aos riscos que isso implicava.
9- Essa opção da Autora encontrava-se fora do poder de decisão e da esfera da Ré.
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IV- DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA

A- Das questões prévias suscitadas pela recorrida
A.1- Da não admissibilidade do recurso, por incumprimento do disposto no art. 637º do CPC.
Advoga a recorrida que o recurso interposto pela Ré EMP01..., S.A. é legalmente inadmissível e que, por isso, deve ser rejeitado em virtude daquela, no requerimento de interposição, não ter indicado a sua espécie, efeito e modo de subida, incumprindo com o disposto no art. 637º, n.º 1 do CPC.

Quid inde?

Estabelece o art. 637º, n.º 1 do CPC (a que se referem todas as disposições que se venham a citar sem menção em contrário) que: “Os recursos interpõem-se por meio de requerimento dirigido ao tribunal que proferiu a decisão recorrida, no qual se indica a espécie, o efeito e o modo de subida do recurso interposto”.
Decorre do dispositivo legal que se acaba de transcrever que, apesar de o recurso se destinar a um tribunal superior, o requerimento de interposição é apresentado no tribunal recorrido, onde será tramitada a sua fase preparatória, devendo, no requerimento em causa, o recorrente indicar a espécie, efeito e modo de subida, sem que essas menções vinculem o tribunal recorrido nem o tribunal superior[2].
Com efeito, na decisão em que admita o recurso, nos termos do no n.º 6 do art. 641º, cumpre ao juiz a quo fixar a sua espécie e determinar o efeito que lhe compete, sem que essa decisão vincule o tribunal superior, nem possa ser impugnada pelas partes, salvo a situação prevista no n.º 3 do artigo 306º.
Acresce que, nos termos do art. 652º, n.º 1, als. a) e b), incumbe ao relator corrigir o efeito atribuído ao recurso e o respetivo modo de subida (fixados pelo tribunal a quo) e verificar se alguma circunstância obsta ao conhecimento do recurso.
Daí que, salvo o devido respeito por opinião contrária, diversamente do entendimento sufragado pela recorrida, a circunstância do recorrente, em violação do disposto no art. 637º, n.º 1, não ter indicado, no requerimento de interposição do recurso, a sua espécie, efeito e modo de subida, não tem por consequência jurídica a rejeição do recurso, porquanto, contrariamente ao que acontece quanto à falta de alegações, à falta de conclusões e à falta de junção de cópia do acórdão fundamento no caso de recurso para uniformização de jurisprudência (n.º 2, do art. 640º), em que a lei sanciona expressamente essas omissões com a imediata rejeição do recurso, quanto à falta de indicação, no requerimento de interposição do recurso, da sua espécie, efeito e modo de subida, não só o CPC não prevê igual sanção, como não prevê nenhuma sanção para tais omissões.
Com efeito, por um lado, da interpretação a contrario do n.º 1 do art. 641º resulta que a omissão das ditas menções não é fundamento de indeferimento liminar do requerimento de interposição do recurso, e, por outro, que essas menções, quando indicadas, conforme é imposto ao recorrente pelo n.º 1 do art. 637º, não são vinculativas para o tribunal recorrido, nem para o tribunal ad quem, não podendo as partes nem sequer impugnar a decisão do tribunal recorrido que, no despacho de admissão de recurso, fixe ao recurso interposto espécie (que, aliás, atualmente, é única quanto aos recursos interpostos para a Relação – a apelação) e/ou efeito diverso ao por si indicados, e sem que essa decisão, por sua vez, vincule o tribunal superior. 
Neste sentido expendem Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro que: “A falta das indicações previstas neste n.º 1 não importa o indeferimento do requerimento (art. 641º, n.º 2, interpretado a contrario), sendo oficiosamente suprida pelo tribunal. Claro está que, nos casos em que a atribuição do efeito suspensivo está dependente de requerimento (art. 674º, n.º 4), a omissão desta referência levará a que o efeito seja meramente devolutivo. Também o erro na indicação feita é desprovido de consequências, cabendo ao tribunal a sua correção oficiosa (arts. 641º, n.ºs 1 e 5, 65º, n.º 2, al. a)). Em sentido concordante, estabelece-se no n.º 3 do art. 193º que o erro na qualificação do meio processual utilizado pela parte é corrigido oficiosamente pelo juiz, determinado que se sigam os termos processuais adequados”[3].
Em suma, a não indicação pela recorrente, no requerimento de interposição do recurso, da sua espécie, efeito e modo de subida não tem qualquer consequência jurídica, não implicando a rejeição do recurso, cumprindo ao tribunal recorrido suprir essas omissões, caso naturalmente admita o recurso (como foi o caso), sem que essa sua decisão possa ser impugnada pelas partes ou vincule o tribunal superior.
Destarte, sem mais considerações, por desnecessárias, improcede a questão prévia suscitada pela recorrida.

A.2- Da rejeição do recurso quanto à impugnação do julgamento da matéria de facto, por incumprimento do ónus impugnatório secundário do art. 640º, n.º 2, al. a) do CPC
Sustenta a recorrida impor-se a imediata rejeição do recurso quanto à impugnação do julgamento da matéria de facto operada pela recorrente, uma vez que esta não cumpriu com os ónus impugnatórios do julgamento da matéria de facto do art. 640º, n.ºs 1 e 2, al. a), na medida em que não indicou nem especificou, com exatidão, as passagens da gravação dos depoimentos testemunhais em que funda a impugnação.
Vejamos se lhe assiste razão.
Na sequência das revisões operadas ao CPC pelos Decretos-Leis n.ºs 39/95, de 15/02 e 329-A/95, de 12/12, o legislador introduziu o registo da audiência final, com a gravação integral da prova produzida, e conferiu às partes o duplo grau de jurisdição em sede de julgamento da matéria de facto, de modo que a alteração da matéria de facto, que no regime anterior era excecional, passou a ser uma função normal da Relação.
Com a introdução desse novo regime foi propósito do legislador que o Tribunal da Relação realize um novo julgamento quanto à matéria de facto impugnada pelo recorrente submetida ao princípio da livre apreciação da prova, assegurando um efetivo duplo grau de jurisdição[4], devendo, nessa operação, proceder à efetiva reapreciação da prova produzida, considerando os meios de prova indicados no recurso, assim como, ao abrigo do princípio do inquisitório, outros que entenda pertinentes, tudo da mesma forma como faz o juiz da 1ª instância, embora, nessa tarefa, esteja naturalmente limitado pelos princípios da imediação e da oralidade.
Nesse novo julgamento, como verdadeiro tribunal de substituição, a Relação aprecia livremente as provas produzidas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto impugnado, exceto no que respeite a factos para cuja prova a lei exija formalidades especiais ou que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados por documento, acordo ou confissão (art. 607º, n.º 5 do Cód. Proc. Civil) e que, por isso, estejam submetidos a prova tarifada, a qual não deixa qualquer margem de subjetivismo ao julgador quanto ao sentido da decisão de facto a proferir.
Já quanto a factos submetidos ao princípio da livre apreciação da prova cujo julgamento de facto venha impugnado pelo recorrente (que é o princípio regra vigente no ordenamento jurídico civil nacional), a Relação está obrigada a realizar um novo julgamento, em que deve ordenar, mesmo oficiosamente, a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento (art. 662º, n.º 2, al. a)); e, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, deve determinar a produção de novos meios de prova (art. 662º, n.º 2, al. b)), o que evidencia que esta tem autonomia decisória no novo julgamento de facto que terá de realizar.
Destarte, quanto à matéria de facto que seja impugnada pelo recorrente e que se encontre submetida ao princípio da livre apreciação, o tribunal da Relação não está condicionado pela apreciação e fundamentação do tribunal recorrido, uma vez que o objeto da apreciação em 2ª instância é a prova produzida, tal como na 1ª instância, e não a apreciação que esta fez dessa mesma prova, podendo, na formação da sua convicção autónoma recorrer a presunções judiciais ou naturais nos mesmos termos em que o faz o juiz da 1ª instância[5].
Acontece que, não tendo sido propósito do legislador que o julgamento de facto a realizar pela Relação se transformasse na repetição do antes efetuado pela 1ª Instância, uma vez que, conforme se escreve no Preâmbulo do D.L. n.º 329-A/95, de 12/12, a garantia do duplo grau de jurisdição em sede de impugnação do julgamento da matéria de facto “nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência”, mas apenas “detetar e corrigir pontuais, concretos e seguramente excecionais erros de julgamento”, e com vista a evitar a interposição de recursos de pendor genérico, aquele rodeou a impugnação do julgamento da matéria de facto de uma série de ónus que terão de ser cumpridos pelo recorrente, sob pena de se impor a rejeição do recurso quanto ao julgamento da matéria de facto.
É assim que o legislador optou “por restringir a possibilidade de revisão de concretas questões de factos controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente”, pelo que se mantém o entendimento que, como tribunal de 2ª Instância, a Relação deverá ter competência residual em sede de reponderação ou reapreciação da matéria de facto[6], estando subtraída ao seu campo de cognição a matéria de facto fixada pelo tribunal a quo que não seja alvo de impugnação.
Depois, tal como se impõe ao juiz a quo a obrigação de fundamentar as suas decisões quanto ao julgamento da matéria de facto que realizou, também é imposto ao recorrente, como correlativo dos princípios da autorresponsabilidade, da cooperação, da lealdade e da boa-fé processuais, a obrigação de fundamentar o recurso, demonstrando (justificando) o desacerto em que incorreu o tribunal a quo em decidir a matéria de facto impugnada em determinado sentido, quando, perante a prova produzida, se impunha decisão diversa, devendo no cumprimento desse ónus, indicar não só a matéria de facto que impugna, como a concreta solução que, na sua perspetiva, se impunha que tivesse sido adotada quanto a essa concreta facticidade, bem como os concretos meios de prova que ancoram esse julgamento diverso que postula, com a respetiva análise crítica, isto é, com a indicação do porquê dessa prova por si indicada não consentir o julgamento de facto realizado pelo tribunal recorrido e antes impor o por si propugnado (n.º 1 do art. 662º do CPC).
Dito por outras palavras, “recai sobre o apelante o ónus de fundamentar a discordância quanto à decisão de facto proferida, ónus esse que atua numa dupla vertente: cabe-lhe rebater, de forma suficiente e explícita, a apreciação crítica da prova feita no tribunal a quo e tentar demonstrar que tal prova inculca outra versão dos factos que atinge o patamar da probabilidade prevalecente. Deve o recorrente aduzir argumentos no sentido de infirmar diretamente os termos do raciocínio probatório adotado pelo tribunal a quo, evidenciando que o mesmo é injustificado e consubstancia um exercício incorreto da hierarquização dos parâmetros de credibilização dos meios de prova produzidos, ou seja, que é inconsistente”[7].
Com efeito, “à Relação não é exigido que, de motu próprio, se confronte com a generalidade dos meios de prova que estão sujeitos à livre apreciação e que, ao abrigo desse princípio foram valorados pelo tribunal de 1ª instância, para deles extrair, como se se tratasse de um novo julgamento, uma decisão inteiramente nova. Pelo contrário, as modificações a operar devem respeitar em primeiro lugar o que o recorrente, no exercício do seu direito de impugnação da decisão de facto, indicou nas respetivas alegações que servem para delimitar o objeto do recurso”, conforme o determina o princípio do dispositivo[8], e como decorrência deste, mas também do contraditório, terá de indicar qual a concreta decisão fáctica que se impõe extrair da prova produzida em relação à matéria de facto que impugna; as concretas provas que alicerçam esse julgamento diverso que propugna; e as concretas razões pelas quais essa prova em que funda a sua impugnação afasta os fundamentos probatórios invocados pelo tribunal a quo para motivar o julgamento de facto que realizou, mas antes impõe o julgamento de facto que propugna.
Deste modo é que se compreende que, no art. 640º, n.º 1 do CPC, se estabeleça que: “Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas” (sublinhado nosso).
Depois, caso os meios probatórios invocados como fundamento de erro na apreciação da prova tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes (al. a), do n.º 2 do art. 640º).
Contudo, impõe-se enfatizar que a jurisprudência do STJ tem operado a distinção entre: a) ónus impugnatórios primários ou fundamentais de delimitação do objeto do recurso, onde os requisitos impostos ao recorrente se encontram ligados com o mérito ou demérito do recurso; e b) ónus impugnatórios secundários, que se prendem com os requisitos formais.
Quanto aos requisitos primários ou fundamentais de delimitação do objeto do recurso, onde se inclui a obrigação do recorrente de formular conclusões e nestas especificar os concretos pontos da matéria de facto que considera incorretamente julgados e que impugna e, bem assim, de indicar, na motivação do recurso, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto que impugna e de nela ter de especificar os concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados que, na sua perspetiva, sustentam esse julgamento diverso que postula (requisitos esses sobre que versa o n.º 1 do art. 640º do CPC), sem prejuízo do que infra se dirá, a jurisprudência tem considerado que o critério de rigor que deve ser observado em sede de cumprimento dos ónus impugnatórios, se aplica de forma estrita, não admitindo quaisquer entorses, pelo que sempre que se verifique o incumprimento de qualquer um deles se impõe rejeitar o recurso da matéria de facto na parte em que se verifique a omissão, sem que seja admitido despacho de convite ao aperfeiçoamento.
Já no que respeita aos ónus da impugnação secundários, que são os que se encontram enunciados no n.º 2 do art. 640º, em que se consagra a obrigação do recorrente, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas que tenha sido gravada, indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes, considera-se que, embora a observância desse ónus deva ser apreciado à luz do enunciado critério de rigor, “não convém exponenciar esse critério ao ponto de ser violado o princípio da proporcionalidade e seja denegada a reapreciação da decisão da matéria de facto com invocação de fundamentos que não encontram sustentação clara na letra ou no espírito do legislador”[9]
Argumenta-se que se está perante mero requisito de forma, destinado a facilitar a localização dos depoimentos relevantes no suporte técnico que contém a gravação da audiência, pelo que, o cumprimento desse ónus tem de ser “interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, não se justificando a imediata e liminar rejeição do recurso quando, apesar da indicação do recorrente não for totalmente exata e precisa, não exista dificuldade relevante na localização pelo tribunal dos excertos da gravação em que a parte se haja fundado para demonstrar o invocado erro de julgamento”[10].
Acresce precisar que, mesmo em relação aos ónus de impugnação primários, tem-se assistido ao nível da jurisprudência do STJ a um aliviar do enunciado critério de rigor, admitindo a apreciação do recurso ainda que as conclusões sejam omissas quanto à referência expressa dos concretos pontos da matéria de facto que o apelante impugna, desde que os factos impugnados resultem claramente identificados nas antecedentes alegações[11].
Assentes nas premissas que se acabam de enunciar, analisadas as alegações de recurso, constata-se que a recorrente cumpriu com os ónus impugnatórios primários do julgamento da matéria de facto previstos no n.º 1 do art. 640º do CPC, na medida em que indica nas conclusões, os concretos pontos do julgamento de facto realizado pela 1ª Instância que impugna (ponto 93º da facticidade julgada provada) e indica, na motivação do recurso e, inclusivamente erroneamente, nas conclusões, a resposta que deve recair sobre esse ponto (a facticidade nele vertida deve ser julgada não provada) e identifica os concretos fundamentos em que funda essa impugnação (inexiste qualquer meio de prova que permita julgar essa facticidade como provada, na medida em que o valor diário em causa não resulta de qualquer documento junto aos autos, sendo que o facto de a Autora referir esse valor à recorrente, na troca de e-mails entre ambas, não é suficiente para prova do mesmo, nem o referido valor resultou do depoimento de qualquer testemunha, pois que, as testemunhas BB e CC não se referiram a essa matéria, não tendo sequer sido questionadas quanto à mesma, e a testemunha DD limitou-se a referir desconhecer em absoluto os valores praticados no mercado para aluguer de veículos automóveis), o que nem sequer vem questionado pela recorrida.
O que a recorrida questiona é o cumprimento pela recorrente do ónus impugnatório secundário da al. a), do n.º 2 do art. 640º, concluindo pelo incumprimento do mesmo, na medida em que não indicou nem especificou, com exatidão, as passagens da gravação dos depoimentos das testemunhas em que funda a impugnação.
A questão suscitada pela recorrida apenas se coloca quanto ao depoimento da testemunha DD, que a recorrente sustenta ter-se limitado “a referir desconhecer em absoluto os valores praticados no mercado para aluguer de veículos automóveis – cfr. minutos 12 e ss. do respetivo depoimento”, na medida em que, quanto aos depoimentos das testemunhas BB e CC, a alegação da recorrente é no sentido de que estas não se referiram à facticidade em causa nem sequer foram questionadas quanto à mesma, pelo que não podia naturalmente cumprir o ónus impugnatório secundária da al. a), do n.º 2, do art. 640º em relação a algo que não existe (pronúncia destas concretas testemunhas quanto a essa específica facticidade). Por isso, competia à recorrida alegar que assim não é e cumprir com o identificado ónus impugnatório secundário, indicando o início e o termo da passagem, ou passagens, dos excertos em que essas testemunhas se tivessem pronunciado quanto a essa concreta facticidade.
No que respeita ao depoimento da testemunha DD, é um facto que a recorrente não deu cabal cumprimento ao ónus impugnatório secundário da al. a), do n.º 2 do art. 640º do CPC, na medida em que indicou o início, mas não o termo final do excerto da testemunha em causa em que funda a sua impugnação (“cfr. minutos 12.00 ss. do respetivo depoimento”).
Contudo, tratando-se de incumprimento de ónus impugnatório secundário, em que, inclusivamente, a recorrente indicou o início desse excerto, naturalmente que não existe qualquer dificuldade do tribunal, nem da recorrida, em detetar esse excerto em que a recorrente funda a sua impugnação.
Assim, atentas as razões já antes expendidas, sob pena de violação do princípio constitucional da proporcionalidade, impõe-se concluir pela improcedência da questão prévia suscitada pela recorrente, em ver rejeitado o recurso quanto à impugnação do julgamento da matéria de facto, decorrente do incumprimento do enunciado ónus impugnatório secundário (ao não indicar o termo do excerto do depoimento testemunhal em que funda a impugnação).
Decorre do excurso antecedente improceder a referida questão prévia suscitada pela recorrente.
     
A.3- Da rejeição do recurso por incumprimento pela recorrente dos ónus do art. 639º, n.º 2
Pretende a recorrida que o recurso tem de ser rejeitado, na medida em que a recorrente não deu cumprimento ao disposto no art. 639º, n.º 2, ao não indicar, no corpo das alegações, nem nas conclusões, as normas jurídicas violadas, bem como o sentido com que, no seu entender, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas, o que consubstancia, a seu ver, uma violação do preceituado nas alíneas a) e b), do n.º 2 do art. 639º do CPC, que impõe a rejeição do recurso; mas, antecipe-se desde já, sem manifesta razão.

Estabelece o art. 639º, que:

“1- O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.
2- Versando o recurso sobre a matéria de direito, as conclusões devem indicar:
a) As normas jurídicas violadas;
b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas;
c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada.
3- Quando as conclusões sejam deficientes, obscuras, complexas ou nelas se não tenha procedido às especificações a que alude o número anterior, o relator deve convidar o recorrente a completá-las, esclarecê-las ou sintetizá-las, no prazo de cinco dias, sob pena de se não conhecer do recurso, na parte afetada” (destacado e sublinhado nosso).
Resulta do dispositivo acabado de transcrever que uma coisa é a falta absoluta de conclusões, e outra, diversa, é a formulação pelo recorrente de conclusões deficientes, obscuras, complexas ou com omissão das especificações referidas no n.º 2 do art. 639º.
A omissão de conclusões nas alegações de recurso, nos termos do n.º 2, do art. 637º, determina a imediata rejeição do recurso interposto, posto que, “as conclusões, como proposições sintéticas, encontram paralelo na formulação do pedido que deve integrar a petição inicial”, uma vez que é nelas que o recorrente identifica os fundamentos por que pede ao tribunal superior a revogação, a modificação ou a anulação da decisão recorrida e, assim, delimita o objeto do recurso, ou seja, o âmbito de cognição e decisão do tribunal de recurso (n.º 4, do art. 635º)[12].
Por isso, as alegações de recurso em que falte a formulação de conclusões determinam que o recurso interposto não tenha objeto, impedindo que o tribunal de recurso possa entrar no conhecimento daquele, por não existirem quaisquer questões a apreciar e decidir.
 Já num recurso em que as alegações contenham conclusões existe objeto, isto é, questões colocadas pelo recorrente ao tribunal de recurso e que este terá de apreciar e decidir, sob pena de incorrer em nulidade do acórdão que venha a proferir, por omissão de pronúncia (art. 615º, n.º 1, al. d)).
Contudo, se as conclusões padecerem do vício da deficiência, da obscuridade, da complexidade e/ou quando nelas ocorra a omissão das especificações referidas no n.º 2 do art. 639º, porque esses vícios são suscetíveis de comprometerem a compreensibilidade do objeto do recurso por parte do recorrido e do tribunal de recurso, com o consequente comprometimento dos princípios (estruturantes do processo civil) do dispositivo e do contraditório, não existe compreensivelmente fundamento para se rejeitar, de imediato, o recurso  interposto dado que, reafirma-se, existem realmente conclusões; mas antes, conforme o determina o n.º 2 do art. 639º do CPC, impõe-se que o relator dirija ao recorrente convite para que supra os apontados vícios, no prazo de cinco dias, sob pena de se não conhecer do recurso, na parte afetada.
Revertendo ao caso dos autos, lidas as conclusões de recurso, dir-se-á que nelas a recorrente não invoca qualquer erro nas normas jurídicas que foram selecionadas pela 1ª Instância na sentença recorrida, nem qualquer erro na interpretação dessas normas, mas antes erro de julgamento no que respeita à sua aplicação à facticidade julgada provada e não provada nos presentes autos.
Daí que, salvo melhor opinião, não invocando a recorrente, nas conclusões de recurso, qualquer erro do tribunal a quo na seleção das normas jurídicas que foram consideradas na sentença recorrida, nem na interpretação que delas aí foi feita, aquele não tinha de dar cumprimento ao disposto no art. 639º, n.º 2, als. b), 1ª parte, e c).
Acresce que, salvo melhor opinião, e na nossa perspetiva, nas alegações de recurso a recorrente também cumpriu com o disposto na parte final dessa al. b), na medida em que expende o discurso argumentativo fáctico-jurídico que, na sua perspetiva, impõe que o valor diário da indemnização arbitrada pela 1ª Instância à recorrida pela privação do uso da viatura sinistrada deva ser reduzido de 30,00 euros para 10,00 euros ou, subsidiariamente, para a quantia diária de 14,70 euros; e, bem assim, para que a quantia de 2.500,00 euros arbitrada na sentença recorrida, a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos pela recorrida deva ser revogada e aquela ser absolvida desse pedido ou, subsidiariamente, essa compensação ser reduzida para a quantia de 500,00 euros.
Analisadas as conclusões de recurso diremos que o que nelas ocorre é um deficiente cumprimento por parte da recorrente do comando da al. a), do n.º 2, do art. 639º, decorrente de nelas não ter propriamente indicado as normas jurídicas violadas de forma direta, mas apenas indireta, ao identificar diversos acórdãos que sufragarão o entendimento jurídico por si defendido.
Ora, porque nesses arestos se encontram necessariamente identificadas aquelas normas jurídicas que, na perspetiva da recorrente, terão sido violadas pelo julgador a quo, e porque não existe, por isso, qualquer dificuldade do tribunal, nem da recorrida em identificar essas concretas normas (aliás, face ao teor das alegações de recurso inexiste qualquer dificuldade em identificá-las), estando, por isso, cabalmente salvaguardado o princípio do contraditório que assiste à recorrida, facto que, aliás, é sobejamente comprovado pela leitura das contra-alegações de recurso que apresentou, entendeu o aqui relator (e continua a entender) que, sob pena de estar a praticar um ato inútil e, por conseguinte, proibido por lei (art. 130º) - na medida em que nenhuma utilidade teria para a questão decidenda nos autos, nem para a salvaguarda dos legítimos direitos e interesses da recorrida, cujo direito ao contraditório, reafirma-se, lhe estava (e está) cabalmente salvaguardado -, não se justificava dirigir à recorrente convite para que aperfeiçoasse as conclusões de recurso, mediante a especificação das concretas normas jurídicas que considerava terem sido violadas pela 1ª Instância na sentença, quando estas são (e eram) por demais conhecidas.
Em todo o caso, conforme resulta do que se vem dizendo, sempre se impõe concluir pela improcedência da questão prévia suscitada pela recorrida, posto que o incumprimento das especificações do n.º 2 do art. 639º não constitui fundamento legal de rejeição do recurso interposto, mas antes de formulação de convite ao aperfeiçoamento dirigido à recorrente para que supra aquela omissão.
Destarte, improcede igualmente a questão prévia suscitada pela recorrida que se acaba de apreciar.
Tendo improcedido todas as questões prévias suscitadas no recurso, urge entrar nos seus fundamentos, aduzidos pela recorrente.

B- Da impugnação do julgamento da matéria de facto.
B.1- Impugnação do ponto 93º dos factos julgados provados.

A recorrente impugna o julgamento da matéria de facto quanto à facticidade julgada provada no ponto 93º (em que a 1ª Instância julgou provado que: “30,00 euros por dia é o equivalente ao valor mínimo diário que a Autora despenderia caso tivesse optado por alugar um veículo automóvel da mesma categoria do veículo seguro, facto para o qual a Ré seguradora foi avisada e alertada através dos e-mails suprarreferidos), sustentando que o tribunal a quo não especificou os meios de prova em que se baseou para dar essa concreta facticidade como provada; e que dos autos não constam quaisquer meios probatórios que permitam concluir pela respetiva prova, “posto que o valor diário em causa não resultou de qualquer documento junto aos autos passível de prova do mesmo, sendo que o facto de a Autora o referir à companhia, na troca de e-mails entre ambas, não é suficiente para prova do mesmo”.
Acresce que, esse valor diário também não resultou apurado “do depoimento de qualquer testemunha, pois que nem a testemunha BB nem a testemunha CC se referiram ou foram sequer questionados quanto a tal matéria. A única testemunha questionada foi EE, que se limitou a referir desconhecer em absoluto o valor praticado no mercado para aluguer de veículos automóveis – cfr. minuto 12.00 ss. do respetivo depoimento”.
Antes de mais, incumbe precisar que a recorrente não coloca em crise a última parte da facticidade julgada provada no identificado ponto 93º, antes expressamente confessa que, nos mails que foram trocados entre ela e a recorrida (especificados nos pontos 16º e seguintes dos factos julgados provados na sentença), foi avisada e alertada que o aluguer de um veículo automóvel da mesma categoria do veículo seguro ascendia a 30,00 euros por dia, pelo que, quanto a essa facticidade, a mesma tem de permanecer  provada, porque não impugnada. Aliás, a prova desta concreta facticidade resulta evidenciada pelo teor dos identificados mails, que se encontram juntos aos autos.
O que a recorrente contesta (e que, consequentemente impugna) é que tenha sido produzida prova que permitisse ao julgador a quo julgar como provado (conforme julgou) que o custo diário de um veículo automóvel da mesma categoria do veículo seguro ascenda a 30,00 euros, concluindo em sentido negativo, por, na sua perspetiva, não ter sido produzida qualquer prova nesse sentido.
Ora, lida a fundamentação/motivação do julgamento da matéria de facto exarada na sentença sob sindicância, verifica-se que nela não se encontram especificados quais os concretos elementos de prova em que o julgador a quo alicerçou a sua convicção, para julgar provado que o valor diário de um veículo automóvel da mesma categoria do veículo seguro ascenda a 30,00 euros.
Acresce que, como bem diz a recorrente, não é pelo facto de nos mails trocados entre a mesma e a recorrida esta afirmar que esse valor diário ascende a 30,00 euros que permite ao tribunal julgar esse valor como provado, posto que se está na presença de declarações unilaterais emanadas pela recorrida, alicerçadas em pressupostos que se desconhecem; e que, por isso, poderão estar certos ou errados.
Ademais, compulsados e analisados os autos, constata-se que neles não se encontra junta qualquer outra prova documental (para além dos mails trocados entre recorrente e recorrida) quanto a essa concreta facticidade.
A recorrente alega que as testemunhas BB e CC não se pronunciaram quanto a esse valor diário e que nem sequer foram questionados quanto a ele, e que a testemunha DD, quando questionada sobre o valor diário de aluguer de uma viatura com as caraterísticas da segurada, referiu desconhecer em absoluto os valores praticados no mercado para aluguer de veículos automóveis.
Lidas as contra-alegações de recurso, constata-se que nelas a recorrida não sustenta não assistir razão à recorrente para a sua alegação e não identifica ou aduz qualquer passagem da prova pessoal que foi produzida em audiência final que contradiga a mesma.
No entanto, incumbe enfatizar que, ainda assim, procedemos à audição integral da prova pessoal que foi produzida em audiência final e confirmámos que a testemunha BB, que vive em união de facto com a Autora, de quem tem duas filhas, e a testemunha FF, tio da Autora, não se pronunciarem quanto ao preço diário do aluguer de uma viatura da mesma categoria do veículo automóvel acidentado, matéria essa a propósito da qual nem sequer foram questionadas.
Por sua vez, a testemunha DD, gestor de sinistros da recorrente e que fez a gestão do concreto sinistro sobre que versam os autos, quando questionado sobre esta específica matéria, foi perentória em afirmar desconhecer o valor em causa.
Logo, nos presentes autos não foi efetivamente produzida qualquer prova que consentisse ao julgador a quo ter concluído que o valor diário do aluguer de um veículo automóvel da mesma categoria do acidentado ascendia a 30,00 euros, impondo-se, por isso, concluir pela procedência da impugnação do julgamento da matéria de facto operada pela recorrente.

Destarte, na procedência da impugnação do julgamento da matéria de facto operada pela recorrente, altera-se a facticidade julgada provada no ponto 93º da sentença nos seguintes termos:
1- Julga-se provado que:
“93- Nos mails suprarreferidos a Autora alertou e avisou a Ré que o aluguer de um veículo automóvel da mesma categoria do veículo seguro ascendia a 30,00 euros por dia”;
2- Julga-se não provado (determinando-se que essa facticidade transite para o elenco dos factos julgados não provados na sentença sob sindicância) que:
“O custo diário do aluguer de um veículo automóvel da mesma categoria do veículo seguro ascenda a 30,00 euros”.
           
B.2- Conhecimento oficioso: matéria conclusiva, de direito e irrelevante, por repetida, constante do elenco dos factos provados.
Estabelece o n.º 3 do art. 607º que na sentença deve o juiz “discriminar os factos que considera provados”, o que significa que nas decisões que profira o julgador não se deve pronunciar (julgando provado ou não provado) sobre tudo o que tenha sido alegado pelas partes, na medida em que: por um lado, apenas deve julgar provados ou não provados “factos”; e, por outro lado, quanto aos “factos”, apenas deve fazer esse julgamento de facto em relação a factos essenciais, complementares ou instrumentais da causa de pedir ou das exceções de que tenha de conhecer, conforme dispõem os arts. 5º, n.ºs 1 e 2 e 607º, n.ºs 1 e 4 do CPC.
Daí que, salvo melhor opinião, o julgador deve abster-se de incluir nas decisões judiciais que profira meios de prova, expressões conclusivas, de direito, matéria de facto que se mostre inócua para a decisão de mérito a proferir, atento o objeto da ação (pedido, causa de pedir e exceções).
Com efeito, já defendia Alberto dos Reis que “é questão de facto tudo o que tende a apurar quaisquer ocorrências da vida real, quaisquer eventos materiais e concretos, quaisquer mudanças operadas no mundo exterior”[13]; e já expendia que a atividade do juiz se deve circunscrever ao apuramento dos factos materiais, devendo evitar que no questionário entrem noções, fórmulas, categorias ou conceitos jurídicos, inserindo apenas, nos quesitos e na matéria de facto assente, factos materiais e concretos”[14].
Na linha de que ao elenco dos factos provados e não provados na sentença, o juiz apenas deve levar factos materiais (aqui se incluindo as ocorrências concretas da vida real e o estado, a qualidade ou situação real das pessoas e das coisas; neles se compreendendo não só os acontecimentos do mundo exterior diretamente captáveis pelas perceções - pelos sentidos - do homem, mas também os eventos do foro interno, da vida psíquica, sensorial ou emocional do indivíduo)[15], se tem pronunciado a jurisprudência nacional maioritária, designadamente, após a entrada em vigor da Lei n.º 41/2013, de 26/06, que reviu o CPC, na sequência do que a sentença passou a incluir o julgamento da matéria de facto e de direito e que não contém  um dispositivo legal equivalente ao anterior art. 646º, n.º 4 do CPC.
Na verdade, tem-se continuado maioritariamente a considerar como não escritas as respostas do julgador sobre matéria qualificada como de direito; e a equiparar às conclusões de direito, por analogia, as conclusões de facto, isto é, os juízos de valor, em si não jurídicos, emitidos a partir dos factos provados (sem prejuízo de se dever equiparar a factos as expressões verbais, com um sentido técnico-jurídico determinado, que são utilizadas comummente pelas pessoas sem qualquer preparação jurídica, na sua linguagem do dia a dia, falada ou escrita, com um sentido idêntico, contanto que essas expressões não integrem o próprio objeto do processo, ou seja, não invadam o domínio de uma questão de direito essencial, traduzindo uma resposta antecipada da questão de direito decidenda)[16]
Ora, analisada a matéria de facto julgada provada pela 1ª Instância, verifica-se que a matéria constante dos pontos 71º, 72º, 83º (este exclusivamente quanto ao segmento: “como é o caso da situação concreta objeto dos autos”), 121º e 122º não encerra qualquer materialidade fáctica, mas matéria puramente conclusiva e de direito. E a facticidade constante do ponto 108º é repetição da que foi julgada provada no anterior ponto 107º. Daí que se imponha ordenar, ainda que oficiosamente, a sua eliminação do elenco dos factos provados na sentença.
Termos em que se ordena a eliminação do elenco dos factos provados na sentença sob sindicância a totalidade da matéria constante dos pontos 71º, 72º, 83º (este apenas quanto ao segmento: “como é o caso da situação concreta objeto dos autos”), 121º e 122º.
  
C- Mérito
C.1- Valor diário atribuído à recorrida pela privação do uso da viatura automóvel
A 1ª Instância atribuiu à recorrida um valor diário de 30,00 euros, a título de indemnização pela privação do uso de veículo automóvel acidentado, de que é proprietária e, em consequência, condenou a recorrente a pagar àquela a quantia de 4.590,00 euros, a título de “indemnização/compensação pela privação do uso do veículo automóvel seguro ou de qualquer outro em sua substituição”, desde ../../2020 (não desde ../../2022, como por erro de escrita, decorrente daquele em que já tinha incorrido a recorrida na petição inicial, se escreve no ponto 4º da parte dispositiva da sentença) até à data da instauração da presente ação, em 13/06/2022, a que acresce o valor diário de 30,00 euros, desde esta última data até ../../2022.
A recorrente assaca ao decidido erro de direito, argumentando que, na fixação daquele valor diário, o tribunal a quo  não teve em consideração que nele estão englobados os custos de aquisição ou as rendas suportadas pelas empresas que se dedicam à atividade de aluguer de veículo automóveis junto do público, nem o lucro destas, concluindo que, em relação ao preço de aluguer diário que essas empresas de rent a car praticam junto da sua clientela, 2/3 são despesas e lucro, e que, por isso, a indemnização a fixar à recorrida pela privação diária do veículo seguro deve ser fixada em 10,00 euros. E em abono desta posição invoca diversos acórdãos, proferidos por diversos Tribunais da Relação, incluindo por esta Relação de Guimarães.
A título subsidiário, pretende que aquele valor diário fixado pela 1ª Instância seja reduzido para 14,70 euros, por ser o limite máximo fixado na apólice do contrato de seguro celebrado entre si e a recorrida.
A propósito do pedido subsidiário, cumpre desde já salientar que o valor máximo diário fixado na apólice do contrato de seguro em relação a uma viatura de substituição constitui questão nova, uma vez que, apesar desse limite máximo diário fixado na apólice constituir matéria de exceção, aquela não alegou essa exceção na contestação, conforme lhe era imposto pelo n.º 1 do art. 5º do CPC.
Daí que, não se tratando de questão que seja de conhecimento oficioso, a 1ª Instância não podia conhecer na sentença sob sindicância desse valor máximo diário fixado na apólice do contrato de seguro celebrado, assim como esta Relação também não pode dela conhecer, sob pena de incorrer em nulidade por excesso de pronúncia.
Posto isto, a indemnização pelo denominado dano da privação do uso de viatura não tem merecido tratamento uniforme ao nível da doutrina e da jurisprudência, onde se surpreende uma clivagem entre os que defendem que o dano em causa pode assumir natureza patrimonial ou não patrimonial, conforme se projete numa ou noutra das esferas jurídicas do lesado[17].
Acresce que entre os que reconhecem que o dano decorrente da privação do uso de veículo assume natureza patrimonial, assiste-se a novo dissenso.
Com efeito, uma corrente defende que ao arbitramento dessa indemnização não basta a mera alegação e prova pelo lesado em como ficou privado do uso do veículo, exigindo-se-lhe adicionalmente a alegação e prova dos específicos e concretos danos que efetivamente sofreu na sua esfera jurídico-patrimonial em consequência dessa privação[18] .
Trata-se do entendimento doutrinário e jurisprudencial tradicional, assente no art. 562º do CC, nos termos do qual ao dever de indemnizar não basta que o evento seja suscetível de, em abstrato, produzir danos na esfera jurídico-patrimonial do demandante, sendo ainda necessário que o mesmo alegue e prove quais os concretos e específicos danos que efetivamente sofreu em consequência da conduta ilícita e culposa do demandado (que o privou do uso do veículo).
Já uma outra corrente defende que a privação do uso de veículo constitui um dano patrimonial indemnizável, por se consubstanciar numa ofensa ao direito de propriedade sobre o veículo, conquanto o demandante alegue e prove que fazia ou pretendia fazer uso do veículo de que se viu privado em consequência da conduta ilícita e culposa de terceiro.
Precisando, de acordo com esta corrente, à afirmação do direito à indemnização pelo dano patrimonial decorrente da privação do uso de veículo não é necessário que o demandante alegue e prove os específicos e concretos danos que efetivamente sofreu na sua esfera jurídico-patrimonial em consequência de ter sido privado do seu uso do veículo, bastando-lhe a alegação e prova em como normalmente fazia uso do veículo em causa[19].
Finalmente, uma terceira corrente, à qual aderimos e que julgamos ser atualmente a maioritária, defende que a privação do uso de veículo configura de per se um dano patrimonial indemnizável, na medida em que configura sempre uma ofensa ao direito de propriedade sobre o veículo, posto que o direito de usar, fruir e dispor do veículo integram o conteúdo do direito de propriedade sobre ele, cabendo, por isso, ao proprietário a opção de livremente o utilizar ou não (art. 1305º do CC), sendo-lhe, inclusivamente, essas faculdades constitucionalmente garantidas nos termos do art. 62º da Constituição da República Portuguesa.
Segundo este entendimento, a mera privação do uso decorrente da conduta ilícita e culposa de terceiro deve, assim, ser economicamente valorizada, se necessário, mediante recurso à equidade, impondo-se a condenação do responsável pela privação do uso por esse prejuízo de natureza patrimonial, independentemente da alegação e prova de concretos e específicos prejuízos decorrentes dessa privação ou do uso efetivo do veículo.
Nesta perspetiva, que é a nossa, “o simples uso constitui uma vantagem suscetível de avaliação pecuniária, pelo que a sua privação constitui naturalmente um dano”[20], de natureza patrimonial, indemnizável; ou dito por outras palavras, o proprietário privado do uso da sua viatura em consequência de conduta ilícita e culposa de terceiro, por esse simples facto, independentemente da prova cabal da perda de rendimentos que obteria por via do uso daquela,  tem direito a ser indemnizado[21].
Posto isto, abordando a questão suscitada pela recorrente quanto ao invocado excesso do valor diário da indemnização arbitrada pela 1ª Instância à recorrida pela privação do uso do veículo automóvel acidentado de que é proprietária, de acordo com Menezes Leitão o quantum diário dessa indemnização deve ser determinado tendo como referencial o preço diário do aluguer praticado pelas empresas que se dedicam à atividade de aluguer de veículos, uma vez descontadas as despesas de exploração dessas empresas e o respetivo lucro[22].
No mesmo sentido pronuncia-se Paulo Mota Pinto, ao expender que “…o dano da privação do uso deverá ser quantificado em valor que pode ser obtido de uma das duas formas: ou (como de “cima para baixo”) a partir dos custos de um aluguer durante o lapso de tempo em causa, “mas depurados” (…), excluído o lucro do locador e custos gerais como os gastos com a manutenção da frota, as provisões para períodos de paragem dos veículos, as amortizações, etc.”, concretizando que “no direito alemão os valores constantes das referidas tabelas rondam cerca de um terço dos custos do aluguer normalmente praticados; ou (como “de baixo para cima”), designadamente, a partir dos custos de capital imobilizado necessário para obter a disponibilidade de um bem, como aquele durante o período de tempo necessário (por ex. os custos necessários para constituir uma reserva de um bem, como o que está em causa)”[23].
E Maria da Graça Trigo expende que, “…o valor locativo há-se servir como teto máximo para efeitos indemnizatórios”; “Até esse montante, o juiz deverá encontrar um valor equitativo ad hoc”[24].
Cientes que a indemnização diária pela privação do uso da viatura deverá ser fixada por recurso à equidade (n.º 3 do art. 566º do CC), tendo por referência o valor locativo cobrado pelas empresas de rent a car para uma viatura de características iguais/semelhantes às da viatura acidentada da recorrida junto dos seus clientes, deduzidos os custos de exploração daquelas, onde se incluem impostos, e o respetivo lucro, feito um breve percurso pela internet, constatamos que o preço/diário do aluguer de uma viatura de caraterísticas semelhantes aos da recorrida atualmente ronda entre os 34,00  e os 50,00 euros.
Considerando que a recorrida esteve privada do uso do veículo sobre que versam os autos de 19/10/2020 a 10/08/2022 (pontos 89º, 90º e 95º dos factos apurados), naturalmente que naquele período temporal o custo diário de uma viatura de características similares à sua praticado pelas empresas de aluguer junto dos seus clientes era inferior aos atualmente praticado, até porque, como é do conhecimento geral, nos últimos dois anos assistiu-se a um incremento do custo do nível de vida em consequência do aumento considerável da taxa de inflação.
Deste modo, em face do que se vem dizendo, entende-se que para o cálculo do montante concreto diário da indemnização a arbitrar à recorrida devemos partir de um preço/diário do aluguer de uma viatura similar à sua de 30,00 euros.
Nesse preço diário de aluguer de 30,00 euros estão necessariamente englobados os custos de exploração das empresas que se dedicam à atividade de locação de viaturas automóveis, onde se incluem os custos de aquisição ou de aluguer das viaturas, os custos administrativos, os impostos, etc., assim como o lucro por aquelas almejado, os quais absorvem seguramente mais de 60% do preço diário do aluguer que cobram aos seus clientes; pelo que  entende-se ser equitativo e razoável arbitrar à recorrida 11,00 euros diários, a título de indemnização pelo dano patrimonial que sofreu em consequência da privação do uso do veículo acidentado no período de 19/10/2020 a 10/08/2022.
Destarte, na parcial procedência do fundamento de recurso acabado de apreciar, impõe-se revogar o ponto 4º da parte dispositiva da sentença recorrida e, em sua substituição, condenar a recorrente a pagar à recorrida a quantia diária de 11,00 euros, no período de 19/10/2020 a 10/08/2022, a título de indemnização pelos danos patrimoniais que sofreu em consequência da privação do uso do seu veículo automóvel.

C.2- Do montante compensatório fixado por danos não patrimoniais
A 1ª Instância condenou a recorrente a pagar à recorrida a quantia de 2.500,00 euros, a título de compensação por danos não patrimoniais sofridos, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a prolação da sentença até efetivo e integral pagamento, com o que não se conforma a recorrente, assacando ao decidido erro de direito, advogando que essa compensação não é devida porque destina-se a compensar a recorrida pelos danos não patrimoniais que sofreu por via da paralisação do veículo automóvel, quando a compensação destes já se encontra incluída no montante indemnizatório fixado pela privação do uso do veículo acidentado, impondo-se, por isso, que seja absolvido deste pedido. Antecipe-se, desde já, sem razão, incorrendo a recorrente num duplo equívoco.
Com efeito, a indemnização pela privação do uso do veículo acidentado destina-se, conforme antedito, a indemnizar o proprietário pelos danos patrimoniais que sofreu na sua esfera jurídico-patrimonial por via de, por ato ilícito e culposo de terceiro (no caso da recorrente, que incumpriu o contrato de seguro celebrado com a recorrida, conforme já referido, e cuja culpa se presume – art. 799º, n.º 1 do CC ); se ter visto privado do uso e gozo do seu veículo (uma das faculdades inerentes ao direito de propriedade sobre o veículo - art. 1305º do CC), e não a compensá-lo pelos danos não patrimoniais que daí decorram para si.
Depois, contrariamente ao entendimento que vem sufragado pela recorrente, a compensação arbitrada pela 1ª Instância à recorrida não se destinou apenas a compensá-la pelos danos de natureza não patrimonial que sofreu em consequência de ter sido privada do uso do veículo acidentado, a que aludem os pontos 88º, 89º, 90º, 91º e 99º dos factos apurados, mas também pelos que sofreu em consequência do incumprimento do contrato de seguro, a que alude o ponto 101º da facticidade apurada.
Ora, como é consabido, os danos não patrimoniais ou morais são os “prejuízos (como as dores físicas, os desgostos, os vexames, a perda de prestígio ou de reputação, os complexos de ordem estética), que, sendo insuscetíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem estar, a liberdade, a beleza, a perfeição física, a honra ou o bom nome), que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados”[25] dentro daquilo que é humanamente possível, ou seja, mediante a obrigação imposta ao responsável civil de satisfazer uma prestação pecuniária ao lesado para que este dela retire proveito de modo a atenuar o seu sofrimento moral.
Contudo, nem todos os danos não patrimoniais são tutelados pela ordem jurídica, na medida em que o n.º 2 do art. 496º do CC, apenas declara serem compensáveis os que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
Essa gravidade do dano tem de “medir-se por um padrão objetivo, e não à luz de fatores subjetivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada). Por outro lado, a gravidade apreciar-se-á em função do direito: o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado” e essa compensação deverá ser determinada por recurso à equidade, tendo em conta as particularidades do caso concreto, nomeadamente, o grau de culpa do lesante, a sua situação económica e a do lesado e as demais circunstâncias do caso o justifiquem (art. 496º, n.º 4, ex vi, art. 494º do CC).
Acresce que, não se pode descurar que a compensação por danos não patrimoniais tem “natureza acentuadamente mista: por um lado, visa reparar de algum modo, mais do que indemnizar, os danos sofridos pela pessoa lesada; por outro lado, não lhe é estranha a ideia de reprovar ou castigar; no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente”[26] .
No caso sobre que versam os autos, a recorrente celebrou um contrato de seguro com a recorrida, tendo por objeto o veículo automóvel de marca ..., modelo ..., com a matrícula ..-QS-.., de que é proprietária, cuja cobertura assegurava, para além do mais, os danos próprios que este viesse a sofrer em caso de choque, colisão ou capotamento, até ao capital de 6.273,16 euros (cfr. pontos 1º a 5º dos factos apurados).
Esse veículo sofreu um acidente no dia 19/10/2020, no ..., em consequência do que decorreram vários estragos, que o impediam de circular (cfr. pontos 6º a 8º dos factos apurados).
Pese embora a recorrida tivesse, logo, no dia 19/10/2020, participado o acidente à recorrente e acionado o contrato de seguro, verifica-se que, apesar das múltiplas insistências feitas junta desta para que diligenciasse pela célere peritagem e reparação daquele, e feita a peritagem do mesmo, para que, em alternativa, lhe entregasse a quantia de 5.006,50 euros, com IVA incluído, necessária à sua reparação (nomeadamente, os múltiplos mails que lhe enviou com tais insistências, onde a alertava para os prejuízos que a paralisação do veículo lhe estava a demandar e para a sua vida familiar e advertindo-a para os custos do depósito exigidos pela oficina onde aquele se encontrava aguardar ordem de reparação), a recorrente não deu essa ordem de reparação (cfr. pontos 10º a 70º dos factos apurados). E apenas em 10/08/2022, quase dois anos após o sinistro e sobre a imobilização do veículo, já depois de ter sido citada para a presente ação (cfr. fls. 120), entregou à recorrida o custo de reparação, sem IVA (ponto 95º dos factos apurados); e não lhe entregou ainda o custo do depósito do veículo reclamado pela oficina onde aquele esteve depositado a aguardar ordem de reparação.
Ao assim agir, a recorrente incumpriu, de modo reiterado e persistente, reafirma-se, ao longo de cerca de dois anos, as suas obrigações contratuais para com a recorrida, emergentes do contrato de seguro que com ela celebrou, parte das quais ainda estavam por cumprir, à data da prolação da sentença recorrida.
A recorrente recusou-se a  disponibilizar à recorrida um veículo de substituição, quando esta tinha necessidade de dispor de veículo  para os seus afazeres diários, com o que a forçou a ter de recorrer a boleias, ao transporte de familiares e amigos, a ter de se sujeitar aos seus horários, vontades e caprichos, bem como a transportes públicos, limitando-a na sua liberdade de deslocação e de movimentação (pontos 85º a 88º, 91º e 98º dos factos apurados), em consequência do que lhe causou, e continuar a causar, grandes transtornos, incómodos, frustração, aborrecimentos, chatices, arrelias, nervosismo e descontrolo emocional, revolta, angústia, nervosismo e desespero (pontos 89º, 90º e 99º dos factos provados).
E por via da recusa em cumprir com as obrigações que para si emergiam do contrato de seguro que celebrou com a última, nos moldes já antes descritos, a recorrente provocou à recorrida incómodos, desgostos, noites sem dormir, nervosismo, aborrecimentos, transtornos e muitas perdas de tempo, nomeadamente, em contactos e deslocações para tentar resolver a situação, para recolha de elementos, documentos, testemunhas, envio de mails e cartas, e em deslocações ao advogado (ponto 101º dos factos apurados).
Os danos de natureza patrimonial sofridos pela recorrida em consequência das condutas persistente e reiteradamente inadimplentes da recorrente (que só ao fim de cerca de um ano e dez meses lhe entregou a quantia necessária à reparação do veículo, sem que ainda lhe tivesse pago o custo do seu depósito na oficina onde ficou a aguardar reparação) que se acabaram de descrever são objetivamente graves, sendo, por isso, compensáveis, o que nem sequer vem contestado pela recorrente (que, conforme se referiu, apenas contesta a compensação dos mesmos por ter considerado erroneamente que essa compensação já se encontrava englobada na indemnização arbitrada a título de privação do uso da viatura sinistrada, o que não tem fundamento fáctico nem jurídico).
Daí que se mostre totalmente infundada e improcedente a pretensão da recorrente em ser absolvida do pedido compensatório pelos danos não patrimoniais que a requerida sofreu em consequência daquelas suas descritas condutas, as quais se mostraram, reiterada e persistentemente, lesivas das obrigações contratuais para com a recorrida e da boa fé que deve presidir ao cumprimento dos contratos; e por isso, gravemente ilícitas e culposas.
 Pretende a recorrente que o montante compensatório de 2.500,00 euros arbitrado pela 1ª Instância peca por excesso, pretendendo que essa compensação seja reduzida para 500,00 euros, argumentado que a recorrida “não sofreu qualquer lesão ou dano corporal, nem viu afetada a sua integridade física ou mental”, apenas tendo sofrido “meros incómodos e aborrecimentos decorrente de uma situação prática e de certa forma, usual, na vida de todos nós, com que, em princípio, nos depararemos mais tarde ou mais cedo: as tramitações inerentes à regularização de um sinistro”.
Acontece que a alegação da recorrente que se acaba de transcrever não tem qualquer arrimo possível em face do quadro factual que acima se descreveu, em que a regularização do sinistro sobre que versam os autos nada tem (nem teve) de “normal”, mas antes se assistiu a um incumprimento contratual com elevado grau de ilicitude e merecedor de forte censurabilidade, com as consequências gravosas na vida da recorrida, do seu agregado familiar e no seu estado psíquico e emocional, que nos abastemos de repetir, por fastidioso e desnecessário.
A recorrente é uma empresa seguradora de considerável dimensão, que atua no mercado junto dos consumidores, com quem celebra múltiplos contratos de seguro, sendo sua obrigação legal e contratual, que cumpra prontamente e de boa fé os compromissos assumidos junto dos mesmos, o que manifestamente não ocorreu para com a recorrida, com as consequências não patrimoniais na sua vida pessoal e  familiar, as quais se refletiram no seu estado psíquico e emocional de forma relevante, nos termos já enunciados e analisados.
O que se acaba de referir, aliado à natureza mista conferida pelo legislador à compensação por danos não patrimoniais, leva a que se considere que o montante compensatório de 2.500,00 euros fixado pela 1ª Instância é equitativo, necessário e adequado, face às condutas persistentemente inadimplentes da recorrente e, consequentemente, com considerável grau de ilicitude e de culpa,  e à dimensão e gravidade dos danos não patrimoniais que delas emergiram para a recorrida, improcedendo este fundamento de recurso.
Decorre do excurso antecedente proceder parcialmente a presente apelação.
*
Sumário (elaborado pelo relator – art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil).
1- A falta de indicação, no requerimento de interposição do recurso, da sua espécie, efeito e modo de subida, não constitui fundamento de rejeição do recurso, mas antes cumpre ao tribunal recorrido, no caso de admitir o recurso, no despacho de admissão, suprir essas omissões, sem que essa sua decisão possa ser impugnada pelas partes ou vincule o tribunal superior.
2- A falta de especificações nas conclusões de recurso das menções do art. 639º, n.º 2 do CPC não constitui fundamento de rejeição do recurso, mas apenas é fundamento para que o relator dirija ao recorrente convite para que, no prazo de cinco dias, supra essas omissões, sob pena do recurso ser rejeitado na parte afetada.
3- A mera privação do uso de veículo, na medida em que priva o proprietário de uma das faculdades inerentes ao seu direito de propriedade sobre ele (o uso), constitui, em si mesmo, um dano de natureza patrimonial, que carece de ser indemnizado pelo responsável civil pela privação ilícita e culposa desse uso, independentemente da alegação e prova dos concretos danos sofridos pelo proprietário em consequência dela, ou da alegação e prova em como fazia efetivamente uso (ou pretendia fazer uso) do veículo.
4- O montante concreto da indemnização a arbitrar ao proprietário pela privação do uso do veículo automóvel é determinado por recurso à equidade, partindo do custo diário do aluguer de um veículo de características semelhantes à daquele praticado pelas empresas de aluguer de veículos junto da sua clientela e descontando-lhe os custos de exploração e o lucro dessas empresas. 
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V- Decisão

Nesta conformidade, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar a presente apelação parcialmente procedente e, em consequência:
a- Ordenam a eliminação do elenco dos factos provados na sentença recorrida da matéria supra identificada;
b- Revogam o ponto 4º da parte dispositiva da sentença recorrida e, em sua substituição, condenam a recorrente EMP01..., S.A. a pagar à recorrida AA a quantia diária de 11,00 (onze) euros, no período de 19/10/2020 a 10/08/2022, a título de indemnização pelos danos patrimoniais que sofreu em consequência da privação do uso do seu veículo automóvel acidentado;
c- No mais, confirmam a sentença recorrida.
*
Custas da apelação pela recorrente e pela recorrida na proporção do respetivo decaimento, que se fixa em 60% para o recorrente e em 40% para a recorrida (arts. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC e 304º do CIRE).
*
Notifique.
*
Guimarães, 29 de maio de 2024

José Alberto Moreira Dias – Relator
Fernando Manuel Barroso Cabanelas – 1º Adjunto
Maria João Marques Pinto de Matos – 2ª Adjunta




[1] Ferreira de Almeida, “Direito Processual Civil”, vol. II, 2015, Almedina, págs. 395 e 396.
[2] Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2017, 4ª ed., Almedina, págs. 123 e 124.
[3] Paulo Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, “Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil”, 2014, vol. II, Almedina, págs. 39 e 40.
[4] Ac. STJ. de 14/02/2012, Proc. 6823/09.3TBRG.G1.S1, in base de dados da DGSI, onde se encontram todos os acórdãos a que se venha a fazer referência, sem menção em contrário.
[5] Ac. RG. de 01/06/2017, Proc. 1227/15.6T8BGC.C1.
[6] António Abrantes Geraldes, ob. cit., pág. 153.
[7] Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. I, 2ª ed., Almedina, pág. 797.
[8]António Abrantes Geraldes, ob. cit., pág. 228.
[9] Abrantes Geraldes, in ob. cit., págs. 160 e segs; Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, ob. cit., págs. 797 e 798, nota 6.
[10] Ac. STJ. 29/10/2015, Proc. n.º 233/09.4TBVNG.G1.S1, in base de dados da DGSI.
[11] Acs. do STJ, de 08/02/2018, Proc. n.º 765/13.0TBESP.L1.S1; de 08/02/2018, Proc. n.º 8440/14.1T8PRT.P1.S1; de 06/06/2018, Proc. n.º 552/13.5TTVIS.C1.S1, e de 13/11/2018, Proc. n.º 3396/14.
[12] Abrantes Geraldes, ob. cit., pág. 147.
[13] Alberto dos Reis, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. III, 4ª ed., Coimbra Editora, págs. 206 e 207.
[14] Alberto dos Reis, ob. cit., pág. 212.
[15] Ac. STJ., de 09/03/2003, Proc. 03B1816.
[16] Acs. STJ., de 01/10/2019, Proc. 109/17.1T8ACB.C1.S1; de 07/05/2014, Proc. 39/12.3T4AGD.C1.S1; de 11/07/2012, Proc. 3360/14.0TTLSB.L1.S1; e de 14/11/2006, Proc. 06A2992.
[17] Acs. RG., de 27/10/2016, Proc. 224/14.3T8FAF.G1; RC. de 06/02/2018, Proc. 189/16.7T8CDN.C1.
[18] Acs. STJ., de 18/11/2008, Proc. 08B2732, RP de 03/05/2011, Proc. 2618/08.6TBOVR.P1.
[19] Ac. STJ., de 16/03/2011, Proc. 3922/07.2TBVCT.G1.S1.
[20] Menezes Leitão, “Direito das Obrigações”, vol. I, 4ª ed., Almedina, pág. 317; Abrantes Geraldes, “Temas de Responsabilidade Civil – Indemnização do Dano da Privação do Uso”, 2ª ed., Almedina.
[21] Acs. STJ., de 28/09/2011, Proc. 2511/07.8TACSC.L2.S2; de 06/05/2008, Proc. 08A1279; R.G., de 19/10/2020, Proc. 1060/18.3T8FAF.G1, relatado pelo aqui relator; de  RL., de 21/05/2009, Proc. 1252/08.3TBFUN.L1; de 20/12/2017, Proc. 1817/16.0T8LSB.L1-2.
[22] Menezes Leitão, ob. cit., pág. 339.
[23] Paulo Mota Pinto, “Interesse Contratual Negativo e Interesse Contratual Positivo”, vol. I, Almedina, pág. 592.
[24] Maria da Graça Trigo, “Responsabilidade Civil – Temas Especiais”, Almedina, 2015, pág. 64.
[25] Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, vol. I, 10ª ed., Almedina, pág. 601.
[26] Antunes Varela, ob. cit., págs. 606 a 608.