Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | FERNANDO MONTERROSO | ||
Descritores: | OMISSÃO DE AUXÍLIO ELEMENTOS ESSENCIAIS DO CRIME DOLO DE PERIGO | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 03/08/2010 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | CONCEDIDO PROVIMENTO | ||
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Sumário: | I) Comete o crime de omissão de auxílio "quem, em caso de grave necessidade, nomeadamente provocada por desastre, acidente, calamidade pública ou situação de perigo comum, que ponha em perigo a vida, a integridade física ou a liberdade de outra pessoa, deixar de lhe prestar o auxílio necessário ao afastamento do perigo, seja por acção pessoal, seja promovendo o socorro..."(artº 200º do CP). II) Trata-se de um crime que exige o dolo, ainda que na forma de dolo eventual. Sendo um crime de perigo concreto, exige-se o dolo do perigo concreto. Ensina o Comentário Conimbricense (Tomo I, pág. 853/854) que “não existirá dolo (...) quando o omitente erroneamente pensou que o perigo não era iminente e, portanto, não prestou imediatamente o auxílio necessário, embora estivesse na disposição de o vir a prestar, se tal se tornasse indispensável". III) In casu, de relevante, nos factos provados, refere-se que no dia 28-11-2007 a arguida, após ter atropelado duas menores que atravessavam a rua numa passadeira. "parou o veículo um pouco mais adiante (...) e, depois de falar com as ofendidas, deixou o local" "... Arrancou dali com a viatura, muito embora tivesse constatado que as menores seguiam para a escola sozinhas". Todavia, não se provou e nem sequer se alegou que a arguida, logo após o acidente e antes de abandonar o local, teve consciência da natureza e extensão das lesões que causara, ou, ao menos, que «representou» que podia ter causado lesões substanciais, conformando-se com essa eventualidade (dolo eventual). IV) Daí que não se provando o elemento subjectivo do crime (o qual dependeria da existência de sinais exteriores que revelassem que as menores necessitavam de ser socorridas, sob pena das consequências serem graves), impõe-se a absolvição da arguida pela prática do referido ilícito de omissão de auxílio. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães No 2° Juízo Criminal de Braga, em processo comum com intervenção do tribunal singular (Proc.n° 3545/07.8PBBRG), foi proferida sentença que: Condenou a arguida Vera A... como autora material de um crime de ofensa à integridade física por negligência p. e p. pelo artigo 148°, n.° 1, do CP (em concurso aparente com outro de igual natureza), na pena de 100 (cem) dias de multa, à taxa diária de € 6 (seis euros); Condenou a arguida Vera A... como autora material de um crime de omissão de auxílio p. e p. pelo artigo 200.°, nos. 1 e 2, do CP, na pena de na pena de 170 (cento e sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 6 (seis euros); Condenou a arguida Vera A... nos termos dos artigos 30.°, n.° 1, 77.°, 50.° e 51.° do Código Penal, em cúmulo jurídico das penas acabadas de referir, na pena única de 230 (duzentos e trinta) dias de multa, à taxa diária de € 6 (seis euros); Condenou a arguida Vera A... pela prática de uma contra-ordenação causal prevista no artigo 103.°, no. 2, punida pelo seu n.° 4, do CE, na sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 5 (cinco) meses. *** A arguida Vera A... interpôs recurso desta sentença.Suscita as seguintes questões: - impugna a decisão da matéria de facto, na parte relevante para a condenação pelo crime de omissão de auxílio; - visa a absolvição por este crime; - impugna a pena concreta pelo crime de ofensa à integridade física por negligência; e - impugna a medida concreta da sanção acessória fixada. Respondendo, o magistrado do MP junto do tribunal recorrido defendeu a improcedência do recurso. Nesta instância, o sr. procurador-geral adjunto emitiu parecer que o recurso merece provimento, com excepção da parte em que se impugna a medida concreta da sanção acessória de inibição de conduzir. Cumpriu-se o disposto no art. 417 n° 2 do CPP. Colhidos os vistos, cumpre decidir. *** I — Na sentença recorrida foram considerados provados os seguintes factos (transcrição):No dia 28-11-2007, cerca das 13:00 horas, estando o tempo bom, a arguida Vera A..., conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula n.° ....-38-37, marca Fiat, pertencente a "M..., Lda.", circulando pela Rua André S..., desta cidade de Braga, no sentido Este-Oeste. Ia, ao serviço da sociedade referida, buscar à escola primária um aluno. Circulava a uma velocidade de cerca de 50 kmlhora. Na Rua André S... entronca a Rua Dr. Costa J..., que tem no início, considerado o sentido de trânsito Norte-Sul, uma passadeira para peões. A passadeira para peões era visível e obedecia á marca transversal M11 (marcas transversais - passagem para peões) que consta do art°. 61 °. do RST (quadro XXXVIII), A Rua Dr. Costa J... tem uma largura de cerca de 5 metros, medida entre os dois passeios que a marginam. A arguida chegou a este entroncamento entre a Rua André S.... e a Rua Dr. Costa J..., parou e virou à esquerda, atento o seu sentido de marcha, em direcção à Rua Dr. Costa J... no sentido Norte-Sul, a velocidade não apurada. Na passadeira da Rua Dr. Costa J... referida, no sentido Oeste-Este, transitavam as irmãs, de menor idade, Filipa D... e Maria J..., que se dirigiam para a Escola que frequentavam, situada ali próximo. Havendo no início da Rua Dr. Costa J..., atento o sentido de marcha da arguida, um sinal de informação H7 que consta do art°. 34°. desse RST (quadro XXIX). O local tem boa visibilidade. E uma recta, atento o sentido de marcha da arguida. A arguida entrou nessa rua, conduzindo aquele veículo e porque seguia momentaneamente desatenta no exercício da condução, não avistou a tempo a Filipa D... e a Maria J... que faziam essa travessia dentro da passadeira destinada a peões. Por conseguinte, a arguida não deteve a marcha indo embater nas menores sensivelmente no início da travessia e com a parte frontal do veículo que conduzia, matrícula n.° ....-38-37. O embate deu-se dentro da passadeira de peões ali existente, sensivelmente no início da travessia dos peões, da direita para a esquerda, atento o sentido de marcha da arguida, a uma distância do passeio desse lado de cerca de 1 metro. As ofendidas foram colhidas pela parte da frente do veículo e foram projectadas ao solo a uma distância desconhecida, onde ficaram estateladas. A arguida parou o veículo mais adiante, a uma distância que não foi possível apurar, porque, depois de falar com as ofendidas, deixou o local. As menores foram socorridas posteriormente, já na escola que frequentavam, indo de ambulâncias para o Hospital de S. Marcos, desta cidade de Braga. Em consequência do embate, a Filipa D... (nascida em 05-04-1997) sofreu dores, porque foi projectada ao solo, o que lhe ocasionou traumatismo no membro superior direito, com cicatriz hipocrómica de 2,5x0,5 centímetros no terço médio do antebraço. A Maria J... (nascida em 03-05-1993) também foi projectada ao solo, sofrendo traumatismo no joelho esquerdo, que lhe determinaram directa e necessariamente 30 dias de doença sem afectação da capacidade de trabalho geral e sem afectação da capacidade de trabalho profissional. Como consequências permanentes, o joelho esquerdo da Maria J...mostra-se reactivo à pressão digital na sua face externa e apresenta a nível da mobilidade articular, um ângulo de flexão de 135 graus, sendo o contra-lateral de 140 graus; a nível de extensão, O graus, sendo o contra-lateral de O graus; o perímetro da coxa de 45 centímetros; ausência de amiotrofias; o perímetro da perna de 34 centímetros, sendo o contra-lateral de 34 centímetros; sem alterações, a nível ligamentar. Traduzem-se tais consequências permanentes em gonalgias e sequelas de foco de contusão óssea na margem postero-lateral da epifíse tibial esquerda. A arguida sabia que devia conduzir com toda a atenção e cuidado e perícia, bem como que em aproximação a uma passadeira para peões, num local onde existe grande probabilidade de atravessamento, se encontrava sujeito a um dever especial de cuidado de atentar se algum peão fazia o atravessamento da via e agir em conformidade. Não obstante, a arguida conduzia da forma já supra descrita, de modo descuidado e desatento, motivo pelo qual não se apercebeu atempadamente, como podia e devia, que Filipa D... e a Maria J... faziam a travessia da via, pela passadeira, a passo, o que originou o embate do veículo conduzido pela arguida nas menores e respectiva queda no solo. Circulava sem atenção aos peões e, em especial, à passadeira de peões existente no local, por onde transitavam as vítimas, não conseguindo travar a tempo de evitar que o veículo que conduzia embatesse nelas. Não parou no local apropriado para que os peões efectuassem, ou iniciassem ou completassem, a travessia normalmente, embora soubesse que ali havia uma passadeira de peões, devidamente assinalada e visível no asfalto. 26.Sabia que a paragem era obrigatória antes da passadeira para peões devidamente assinalada e visível no chão, caso por ali aqueles transitassem ou iniciassem a travessia, como efectivamente o faziam as vítimas. 27. Agiu com manifesta imperícia, inconsideração e desrespeito pelos utentes da via, em especial a vítima, que atravessava a estrada dentro das mais elementares normas regulamentares. A arguida não previu que, em resultado da sua conduta, viesse a molestar corporalmente Filipa D... e Maria J... ou de terceiro, embora pudesse e devesse tê-lo previsto. A arguida deixou o local do acidente, arrancando dali com a viatura, muito embora tivesse constatado que as menores seguiam para a escola sozinhas. Não promoveu, como lhe competia, sobretudo por ter causado o acidente, as diligências de que fossem prestados às ofendidas os socorros necessários, em especial chamando a ambulância para assistência nela ou em unidade hospitalar ou mesmo cuidando dos primeiros socorros. Ao não ter promovido as diligências de que fossem prestados às ofendidas os socorros necessários agiu de forma deliberada, livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei. Não obstante, a arguida tomou essa atitude por se sentir assustada com o sucedido. A arguida nesse dia foi trabalhar, tendo falado com colegas do trabalho sobre o acontecimento. No dia seguinte de manhã, a arguida por orientação dos pais foi ao posto da PSP apresentar-se. Ao final do dia seguinte ao do acidente foi à casa da mãe das menores, acompanhada pelo pai e pelo sócio da empresa "M..., Lda." para falar com os pais das menores e assumir a responsabilidade pelos danos causados pelo acidente. A arguida tinha 19 anos à data da prática dos factos. Nessa altura já conduzia há um ano. A arguida é solteira, vive com os pais e é uma pessoa habitualmente bem comportada. Trabalha como operadora de supermercado, auferindo mensalmente € 450. Tem o 12.° ano de escolaridade. Não tem antecedentes criminais. Do seu histórico de condutor não consta a prática de qualquer contra-ordenação estradal. A arguida confessou toda a factualidade relativa ao acidente. *** Considerou-se não provado (transcrição):Que na Rua André S..., a arguida circulava a uma velocidade não concretamente apurada. Que em consequência do embate, a Filipa D... sofreu traumatismo nos membros inferiores. Que a Maria J... sofreu traumatismo na cabeça. FUNDAMENTAÇÃO 1 - O crime de omissão de auxílio A recorrente pretende impugnar a decisão sobre a matéria de facto, na parte relevante quanto a este crime, mas não fez as especificações previstas nos n°s 3 e 4 do art. 412 do CPP. Porém, em caso de impugnação da decisão sobre a matéria de facto a Relação nunca faz um novo julgamento, decidindo, através da consulta do registo da prova e dos elementos dos autos, quais os factos que considera «provados» e «não provados». Como escreveu o Prof. Germano Marques da Silva, talvez o principal responsável pelas alterações introduzidas no CPP pela Lei 59/98 de 25-8, "o recurso em matéria de facto não se destina a um novo julgamento, constituindo apenas um remédio para os vícios do julgamento em primeira instância" – Fortim Justitiae, Maio/99. É que "o julgamento a efectuar em 2° instância está condicionado pela natureza própria do meio de impugnação em causa, isto é, o recurso... Na verdade, seria manifestamente improcedente sustentar que o recurso para o tribunal da Relação da parte da decisão relativa à matéria de facto devia implicar necessariamente a realização de um novo julgamento, que ignorasse o julgamento realizado em 1 ° instância. Essa solução traduzir-se-ia num sistema de "duplo julgamento ". A Constituição em nenhum dos seus preceitos impõe tal solução..." – ac. TC de 18-1-06, DR, iia série de 13-4-06. Por isso é que as ais. a) e b) do n° 3 do art. 412 do CPP dispõem que a impugnação da matéria de facto implica a especificação dos «concretos» pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados e das «concretas» provas que impõem decisão diversa. Este ónus tem de ser observado para cada um dos factos impugnados. Em relação a cada um têm de ser indicadas as provas concretas que impõem decisão diversa (é mesmo este o verbo - «impor» - utilizado pelo legislador) e em que sentido devia ter sido a decisão. É que há casos em que, face à prova produzida, as regras da experiência permitem ou não colidem com mais do que uma solução. Ora, a recorrente não fez as especificações indicadas. Verdadeiramente, na motivação, faz a sua análise crítica da prova, indicando a decisão que teria tomado se tivesse sido o juiz do seu próprio caso. Põe-se, no entanto, uma questão prévia, que é a de saber se os factos considerados provados na sentença recorrida (que, no essencial, reproduzem os que já constavam da acusação) integram a autoria do crime de omissão de auxílio. De relevante, nos factos provados, refere-se que no dia 28-11-2007 a arguida, após ter atropelado duas menores que atravessavam a rua numa passadeira. "parou o veículo um pouco mais adiante (...) e, depois de falar com as ofendidas, deixou o local" (facto n° 16). "... Arrancou dali com a viatura, muito embora tivesse constatado que as menores seguiam para a escola sozinhas" (facto n° 29). * Comete este crime "quem, em caso de grave necessidade, nomeadamente provocada por desastre, acidente, calamidade pública ou situação de perigo comum, que ponha em perigo a vida, a integridade física ou a liberdade de outra pessoa, deixar de lhe prestar o auxílio necessário ao afastamento do perigo, seja por acção pessoal, seja promovendo o socorro...".Ensina o Comentário Conimbricense (tomo I, pag. 849) que "o conceito de grave necessidade significa e exige que se trate de um risco ou perigo iminente de lesão substancial (grave) dos referidos bens jurídicos. Assim, caem fora do âmbito deste tipo de crime as situações de perigo de lesão não iminente e as situações de perigo de leves lesões corporais ou da liberdade (mesmo que iminentes). É um crime que exige o dolo, ainda que na forma de dolo eventual. Sendo um crime de perigo concreto, exige-se o dolo do perigo concreto. Volta a transcrever-se: "Não se tratando de um crime de perigo abstracto, mas sim de perigo concreto, naturalmente que o erro sobre qualquer um dos elementos integrantes do tipo objectivo do ilícito de omissão de auxílio excluirá o dolo e, consequentemente, a punibilidade. Assim, não existirá dolo (...) quando o omitente erroneamente pensou que o _perigo não era iminente e, portanto, não prestou imediatamente o auxílio necessário, embora estivesse na disposição de o vir a prestar, se tal se tornasse indispensável" (pags. 853/854) — sublinhado do relator. Ou seja, no caso destes autos, independentemente do facto das lesões apresentadas pelas menores, poderem ser qualificadas como "substanciais", era necessário que se tivesse, primeiro alegado e depois provado, que a arguida, logo após o acidente e antes de abandonar o local, teve consciência da natureza e extensão das lesões que causara, ou, ao menos, que «representou» que podia ter causado lesões substanciais, conformando-se com essa eventualidade (dolo eventual). A prova desse elemento subjectivo do crime (o qual não foi sequer alegado pela acusação) dependeria da existência de sinais exteriores que revelassem que as menores necessitavam de ser socorridas, sob pena das consequências serem graves. Nada disso está configurado quer nos factos da acusação, quer nos da sentença, os quais, como se disse, são coincidentes. Pelo contrário. Como considera o sr. procurador-geral adjunto no seu parecer, que se passa a transcrever, "no caso vertente, dúvidas não ficam que a arguida, após o acidente que provocou, parou o veículo que conduzia e foi-se inteirar das consequências do seu acto. Dirigiu-se às menores e com elas falou. Ou seja, não se arredou das consequências da sua conduta estradal, não lhe sendo aquelas indiferentes. Não pediu socorro porque, importa dizê-lo, no caso não se lhe afigurou necessário. E tal se pode afirmar, porque as menores, aparentemente, não possuíam lesões corporais, pois até continuaram o percurso que tomavam em direcção à escola que frequentavam. O prosseguimento da caminhada até à escola, ou seja, a deslocação delas entre o local do acidente e a escola, é revelador, para qualquer um, que elas estavam em condições de o poder fazer, que o acidente, afinal, não tinha produzido lesões à integridade física que reclamassem a prestação dum efectivo e necessário socorro. Com efeito, só na escola, em momento posterior, é que as sequelas do acidente, as verdadeiras sequelas, começaram a surgir e daí a necessidade de tratamento hospitalar". Tem, pois, a arguida de ser absolvida por este crime. 2 — A medida concreta da pena pelo crime de ofensa à integridade física_por negligência e da sanção acessória Não vem questionada a opção pela pena de multa, nem a taxa fixada para cada dia de multa. Numa moldura de 10 a 120 dias foram fixados 100 dias de multa. Isto é uma pena concreta que se aproxima do limite máximo. É certo que a culpa é elevada e exclusiva. Trata-se de um atropelamento numa passadeira. Perante isto, visto o disposto no art. 103 n° 2 do Cod. da Estrada, é improcedente o argumento da arguida de que "as meninas também podiam ter visto o veículo em direcção à passadeira", talvez aduzido para convencer da existência duma divisão de culpas. Porém, sendo embora elevada a culpa, não é possível a conclusão de que a arguida fazia uma condução temerária. Nada nos factos permite afirmar que o atropelamento foi resultado de mais do que uma distracção momentânea. Poucos condutores, mesmo entre os mais hábeis e cuidadosos, estarão isentos de, uma só vez, terem um momento de distracção. Isto, sem justificar o comportamento, não permite atirar a culpa para os patamares mais elevados, como resulta da pena fixada na sentença recorrida — cfr. art. 40 n° 2 do Cod. Penal. Por outro lado, a ilicitude, aferida pelas consequências do atropelamento, não é significativa. São de grau médio as exigências de prevenção geral positiva. Finalmente, militam a favor da arguida a confissão e a inexistência de antecedentes criminais, o que releva para efeitos de prevenção especial. Deve, assim, a pena situar-se um pouco acima do meio da moldura penal, fixando-se em 70 (setenta) dias de multa. Quanto à medida da sanção acessória (cuja moldura penal abstracta é de um mês a um ano – arts. 145 al. i) e 147 n° 2 do Cod. da Estrada), está em causa apenas o perigo abstracto decorrente da não cedência de passagem a peões. As consequências concretas do atropelamento já foram valoradas na punição do crime de ofensas corporais negligentes. Tendo em conta as considerações acima feitas quanto à culpa e exigências de prevenção, com especial relevância para a inexistência de qualquer contra-ordenação estradai anterior aos factos (facto 42), fixa-se a mesma em 3 (três) meses de inibição de conduzir. Não vem questionada a possibilidade de suspensão da execução desta sanção. Tem, pois, de ser concedido provimento ao recurso. DECISÃO Os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães concedendo provimento ao recurso: 1 – Absolvem a arguida Vera A... da autoria de um crime de omissão de auxílio p. e p. pelo artigo 200 n°s. 1 e 2, do Cod. Penal; 2 – Fixam em 70 (setenta) os dias de multa pelo crime de ofensa à integridade física por negligência p. e p. pelo artigo 148 n.° 1, do Cod. Penal; e 3 – Fixam em 3 (três) meses a sanção acessória de inibição de conduzir. No mais, mantêm a sentença recorrida. Sem custas nesta instância. |