Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
98/14.4TBMTR.G1
Relator: PEDRO DAMIÃO CUNHA
Descritores: CONDOMÍNIO
LEGITIMIDADE PASSIVA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/30/2016
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I. As acções em que estejam em causa deliberações da assembleia de condóminos devem ser instauradas contra o Condomínio, representado pelo Administrador;
II. É que torna-se necessário levar a cabo uma interpretação actualista do art. 1433º, nº 6 do CC substituindo a expressão aí mencionada “condóminos” pela palavra “condomínio”, já que este preceito legal foi redigido numa época em que o condomínio não gozava de personalidade judiciária, estatuto processual que entretanto o Condomínio alcançou na sequência da reforma do CPC de 1995/1996
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.
I. RELATÓRIO.
Recorrente(s): -B.;
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B. veio intentar a presente acção que segue a forma de processo comum contra C., representada por D., com sede em .... terminando pedindo que:
-a presente acção seja julgada provada e procedente, e consequentemente, impugnada a deliberação registada em acta da Assembleia de Condóminos, por não corresponder ao que sucedeu em Assembleia, e por enfermar dos vícios que alegam na petição inicial, sendo a mesma, revogada com os devidos e legais efeitos.
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Devidamente citado, o réu apresentou contestação, onde termina da seguinte maneira:
“deverá: a) ser julgada provada e procedente a excepção peremptória de abuso de direito, por parte da autora, na modalidade de “venire contra factum próprium”, extintiva do direito exercido, com as legais consequências daí resultantes;
b) se assim não se entender, ser a presente acção julgada improcedente, por provada e, em consequência, ser o réu absolvido do pedido, com as legais consequências daí emergentes;”
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Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador tabelar, e logo designada data para a realização da Audiência de Julgamento.
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Iniciada a Audiência Final, e não tendo sido lograda a conciliação das partes, foi suscitada com a concordância dos Exmos. Mandatários das partes, a questão da excepção de ilegitimidade passiva do Réu.
Nessa sequência o Tribunal de Primeira Instância proferiu a seguinte decisão (reproduzindo-se aqui integralmente apenas a parte da decisão que se afigura relevante para a questão aqui em apreciação):
“ (…) Considerando estes prolegómenos, a questão que, agora, verdadeiramente se coloca prende-se em saber se o condomínio, representado pelo seu administrador, no exercício das respectivas funções, tem legitimidade passiva para intervir numa acção que visa a impugnação, mais concretamente a declaração de nulidade, de uma deliberação aprovada pela Assembleia de Condóminos do respectivo condomínio.
De outro modo, questionar-se-á se esta acção deveria ter sido instaurada contra todos os condóminos que votaram favoravelmente as deliberações alegadamente inválidas ou, pelo menos, que se tenham abstido.
Ora, a questão suscitada não é nova no contexto da jurisprudência dos nossos Tribunais superiores, bem como na doutrina de referência sobre o tema, sendo motivo de uma profunda divergência, ainda que se nos afigure que a posição que aqui acolhemos é a que tem vindo a ser maioritariamente defendida.
Importará chamar, assim, desde logo, os dispositivos legais eventualmente aplicáveis à situação dos autos. Assim, dispõe o artigo 1433.º n.º 6 do Código Civil que “a representação judiciária dos condóminos contra quem são propostas as acções compete ao administrador ou à pessoa que a assembleia designar para esse efeito”.
Ainda com relevância para este efeito, estabelece o artigo 1437.º do mesmo diploma que:
“1. O administrador tem legitimidade para agir em juízo, quer contra qualquer dos condóminos, quer contra terceiro, na execução das funções que lhe pertencem ou quando autorizado pela assembleia.
2. O administrador pode também ser demandado nas acções respeitantes às partes comuns do edifício.
3. Exceptuam-se as acções relativas a questões de propriedade ou posse dos bens comuns, salvo se a assembleia atribuir para o efeito poderes especiais ao administrador.”.
Refere-se, ainda, no artigo 12.º alínea e) do Código de Processo Civil, com pertinência para a apreciação da presente questão, que “têm ainda personalidade judiciária o condomínio resultante da propriedade horizontal, relativamente às acções que se inserem no âmbito dos poderes do administrador”. E, finalmente, no artigo 22.º do mesmo diploma, dispõe-se, sob a epígrafe “representação das entidades que careçam de personalidade jurídica”, que “salvo disposição especial em contrário, os patrimónios autónomos são representados pelos seus administradores e as sociedades e associações que careçam de personalidade jurídica, bem como as sucursais, agências, filiais ou delegações, são representadas pelas pessoas que ajam como directores, gerentes ou administradores”.
Pensamos, assim, que é ponto assente que, em termos jurisprudenciais e doutrinais, face ao regime legal e processual regulador da propriedade horizontal, que o condomínio não possui personalidade jurídica (cfr., por todos, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16/12/1999, in BMJ, 492, pág. 406), muito embora possa demandar e ser demandado, nos termos descritos nos supracitados artigos 1437.º do Código Civil e 6.º alínea e) e 22.º do Código de Processo Civil.
A redacção do primeiro dispositivo legal citado (o artigo 1437.º do Código Civil) parece permitir sustentar que o Administrador do Condomínio pode accionar e ser accionado, enquanto órgão executivo e representativo do Condomínio e a título pessoal, sem necessidade da presença em juízo deste último (neste sentido, cfr., por exemplo, MOITINHO DE ALMEIDA, Luís Pedro, in Propriedade Horizontal, 3.ª edição, Almedina, 2001, pág. 123), mas julgamos que o verdadeiro sentido e alcance das normas em análise deve extrair-se de uma leitura conjugada com as outras duas disposições de natureza adjectiva (o artigo 6.º alínea e) e o artigo 22.º do CPC) e que apontam em direcção diversa, ou seja, que é o Condomínio que recorre a Tribunal ou aí é interpelado, muito embora seja devidamente representado pelo dito Administrador (neste sentido parece ir MILLER, Rui Vieira, in A propriedade horizontal no Código Civil, Almedina, 1998, págs. 321 e 322 e Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 06/07/2000, proc. 9920855, Luís Antas de Barros, do Tribunal da Relação de Coimbra de 19/04/2005, proc. 381/05, Coelho de Matos e do Tribunal da Relação de Lisboa de 17/03/2004, proc. 10066/2003-4, Sarmento Botelho, todos in www.dgsi.pt). A não ser assim e atendendo ao regime acima reproduzido, teriam de coexistir acções judiciais propostas pelo Administrador e outras instauradas pelo Condomínio, embora representadas por aquele, com as inerentes dificuldades em dividir as matérias que poderiam ser alvo de umas e outras, num regime confuso e dúplice, que não pode ser o perseguido pelo legislador que, segundo o artigo 9.º n.º 3 do Código Civil, consagrou, presumivelmente, “as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”.
Mas tal problemática não se confunde com a específica questão da impugnação das deliberações tomadas em Assembleia de Condóminos, visto que, para esta, existe uma norma especial, que se encontra estabelecida no supra mencionado n.º 6 do artigo 1433.º do Código Civil: a representação judiciária dos condóminos contra quem são propostas as acções compete ao administrador ou à pessoa que a assembleia designar para esse efeito.
A legitimidade activa está definida no n.º 1 da mesma disposição legal (qualquer condómino que não tenha aprovado a deliberação susceptível de ser anulada), ao passo que a legitimidade passiva é assacada aos demais condóminos que a votaram positivamente ou, pelo menos, que se abstiveram na votação, muito embora estes sejam representados judiciariamente pelo Administrador do Condomínio, na pessoa do qual deverão ser citados.
Sandra Passinhas (in A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, 2.ª edição, Almedina, Janeiro de 2002, págs. 346 e 437), defende que é o Condomínio que deve ser demandado, na pessoa do seu administrador, citando ainda o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 14/05/1998, in CJ, Tomo III, págs. 96 e segs. (cf., também nesse sentido e por todos, os Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 07/01/1999, proc. 9831363, Oliveira Vasconcelos e de 06/02/2006, proc. 0650237, Caimoto Jácome e o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 03/04/2014, proc. 1360/10.0TBVCT.G1, Isabel Rocha, todos in www.dgsi.pt), mas tal posição, salvo melhor opinião, impõe uma interpretação do regime legal aplicável que conflitua com o estatuído nos n.ºs 1 e 6 do artigo 1433.º do Código Civil, que coloca, claramente, nas correspondentes posições judiciais antagónicas os condóminos que não votaram as deliberações e aqueles que o fizeram (cfr., neste sentido, entre outros, NETO, Abílio, Manual da Propriedade Horizontal, 3.ª edição, Outubro de 2006, Ediforum, págs. 348 e 349 e Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 02/02/2006, proc. 05B4296, Moitinho de Almeida e de 29/11/2006, proc. 06A2913, Moreira Alves, os Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 31/03/2011, proc. 1842/05.6TVLSB.L1-6, Márcia Portela, de 13/07/2010, proc. 1063/09.9TVLSB.L1-6, Olindo Geraldes, de 12/02/2009, proc. 271/2009-6, José Eduardo Sapateiro e o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 04/10/2012, proc. 1371/11.9TJPRT.P1, Leonel Serôdio, todos in www.dgsi.pt. Cfr., ainda, os acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 04/02/2003, in CJ, 2003, Tomo I, páginas 99 e seguintes; do Tribunal da Relação de Coimbra de 19/06/2001, in CJ, 2001, Tomo III, páginas 27 e seguintes; e do Tribunal da Relação de Évora de 02/07/1998, in BMJ n.º 479, pág. 730).
Ainda que, “de jure constituindo”, se possa admitir tal solução, na medida em que a deliberação impugnada, caso não seja suspensa e enquanto não for declarada inválida pelo Tribunal, representa a vontade colectiva dos condóminos e, nessa medida, vincula juridicamente o condomínio e deve ser executada pelo administrador, que está obrigado a cumpri-la, já em termos de “jure constituto” e atendendo aos preceitos citados, parece-nos difícil, por falta de suporte normativo, poder sustentar que, do lado passivo, é legítimo o conjunto dos condóminos ou o condomínio.
Poder-se-ia chamar à colação o estatuído nos artigos 6.º e 22.º do Código de Processo Civil, como forma de justificar a demanda do condomínio, representado pelo administrador, em casos como o dos autos, mas importa dizer que a alínea e) do primeiro dos apontados preceitos restringe tal intervenção processual às acções que se inserem no âmbito dos poderes do administrador e que são aqueles que se mostram essencialmente descritos nos artigos 1436.º e 1437.º do Código Civil, não existindo sobreposição, ainda que parcial, entre as realidades a que cada um dos regimes em confronto respeitam, nem que seja pela relação de “especialidade” ou de exclusão recíproca existente entre aquele previsto nos n.ºs 1 e 6 do artigo 1433.º e aquele outro contemplado nas quatro disposições acima identificadas.
Seria de admitir, em tese, que o condomínio pudesse ser demandado, na pessoa do administrador, que o representaria, nos termos do artigo 1437.º n.º 2 do Código Civil, em acções de impugnação de deliberações que tivessem por objecto as partes comuns do edifício constituído em propriedade horizontal – afectação de espaços comuns gerais a interesses ou utilizações exclusivas de alguns condóminos – ou respeitassem aos outros poderes do administrador, mas não nos parece ser essa a ideia do legislador nem a posição defendida pela nossa doutrina e jurisprudência maioritárias.
No sentido para o qual aqui propendemos, pela sua relevância e sintetismo, citem-se os seguintes Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça: de 29/11/2006, proc. 06A2913, Moreira Alves; de 20/09/2007, proc. 07B787, Bettencourt de Faria; de 24/06/2008, proc. 08A1755, Moreira Camilo; de 06/11/2008, proc. 08B2784, Santos Bernardino, todos in www.dgsi.pt.
Perante o exposto e tendo a sociedade autora demandado o condomínio, ainda que representado pela respectiva sociedade administradora, outra conclusão não se pode chegar que não seja a de que, efectivamente, se verifica a excepção dilatória da ilegitimidade passiva nos presentes autos, como, de resto, as partes parecem agora estar de acordo.
A ilegitimidade passiva é, à luz do disposto no artigo 577.º alínea e) do Código de Processo Civil, uma excepção dilatória, de conhecimento oficioso (artigo 578.º do Código de Processo Civil), que determina a absolvição do réu da instância (artigos 278.º n.º 1 alínea d) e 576º n.º 2 todos do Código de Processo Civil), sendo certo que, in casu, por estarmos perante uma situação de ilegitimidade singular, que não é passível de ser sanada, não cabe ao Tribunal, oficiosamente, promover qualquer sanação ou sequer formular um convite à autora para suprir aquela excepção (sob pena de se proceder a uma modificação subjectiva de uma instância que se encontra já estabilizada, numa situação não prevista por lei – cfr. artigo 260.º do Código de Processo Civil).
Em face do exposto, julga-se procedente a excepção dilatória da ilegitimidade passiva e, em consequência, absolve-se da instância o réu C., representada por D...”
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É desta decisão que a Recorrente/Autora veio interpor o presente Recurso, concluindo as suas alegações pela forma seguinte:
“I - O presente recurso versa sobre a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal “ a quo”, através da qual absolveu da instância o Recorrido, porquanto, julgou procedente a excepção dilatória de ilegitimidade passiva, por aquele invocada; defendendo, em síntese, que a acção de impugnação de deliberação tomada em Assembleia de Condóminos, deve ser intentada, nos termos do Art.º 1433º n.º 6 do Cod. Civil, não contra o condomínio, como ocorreu in casu, mas sim contra “... os condóminos que a votaram positivamente ou, pelo menos, que se abstiveram na votação, muito embora estes sejam representados judiciariamente pelo Administrador do Condomínio, na pessoa do qual deverão ser citados”
II - O Mmo. Juiz do Tribunal “ a quo”, ao proferir a referida sentença violou salvo o devido respeito, por errada interpretação, o disposto nos Art. 1433º n.º 6 do Cod. Civil, e ainda os Arts. 12º al. e) e 30º do Cod. de Proc. Civil. De facto, e
III - Tal como referiu o Mmo. Juiz do Tribunal “ a quo”, a questão da legitimidade passiva do Condomínio, quando está em causa a impugnação de deliberações tomadas em Assembleia de Condóminos, é uma questão controversa, que divide doutrina e jurisprudência, (não tendo ainda sido proferido pelo STJ Ac. uniformizador), tendo o Mmo. Juiz optado pela posição, que considera ser a maioritária, e com a qual discorda a Recorrente.
IV - A legitimidade, tal como dispõe o Art.º 30 do C.P.C, deve ser aferida pela titularidade da relação material controvertida, nomeadamente no interesse em contradizer, que se manifesta pelo prejuízo que advenha da procedência da acção – Art.º 30º n. 1 e 2 do C.P.C.
V - O condomínio, enquanto órgão colegial, está obrigado/vinculado ás deliberações aprovadas em assembleia, pelo que, quem tem interesse directo em contradizer no pleito, é o condomínio, e não cada condómino de per se.
VI - Sandra Passinhas in a Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, 2ª edição, Almedina, pag. 346, também citada pelo Mmo. Juiz; do tribunal “a quo”, defende que: - “ A deliberação exprime a vontade do condomínio, do grupo, e não dos condóminos (individualmente considerados, ou dos que aprovaram a deliberação). E sendo um acto do condomínio a legitimidade passiva cabe ao administrador. A redacção do artigo 1433º n.º 4, é anterior á reforma de 94 e não foi objecto de actualização. As controvérsias respeitantes à impugnação de deliberações da assembleia só satisfazem exigências colectivas da gestão condominial, sem atinência directa com o interesse exclusivo de um ou vários participantes, com a consequência que, nessas acções a legitimidade para agir cabe exclusivamente ao administrador”
VII - No mesmo sentido, se pronunciaram os Srs. Juízes Conselheiros do STJ, no Acórdão prolatado a 29.05.2007, Proc. n.º 07A1484, relator: Urbano Dias, disponivel in www.dgsi.pt, tendo consignado no sumário que: - “ É ao administrador que cabe a representação do condomínio com vista a assegurar o contraditório numa acção de impugnação de deliberações, a menos que a assembleia consigne outra pessoa para tal”. - vide no mesmo sentido Ac. TRG, prolatado a 06.01.2011, Proc. n.º 2488/10.2TBBRG.G1, relator: Manso Rainho, da mesma relação Ac. prolatado a 03-04-2014, Proc. n.º 1360/10.0TBVCT.G1, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
VIII - A partir da reforma processual civil de 1995/96 (Dl n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, com a redacção do Dl n.º 180/96, de 25 de Setembro) o Art.º 12º al. e) do CPC; ou melhor o Art.º 6º al. e) do anterior CPC; passou a atribuir ao condomínio personalidade judiciaria relativamente ás questões, que se insiram no âmbito dos poderes do administrador, (note-se que a lei fala em poderes do administrador – o que engloba o poder de representação – e não em funções como, sucede no Art.º 1436º do CPC.), deixando assim de existir razão justificativa para demandar individualmente os condóminos
IX - Aragão Seia, a propósito da alteração introduzida no então Art.º 6º do CPC, e relacionando este com o disposto no n.º 6 do Art.º 1433º do CC; refere in Propriedade Horizontal, 2ª ed.; pags. 216 e 217, que: – “Face à actual redacção da alínea e) do artigo 6º do CPC, em consonância com o n.º 6 citado, diversamente do que acontecia antes da reforma de 1995, o condomínio, ou seja o conjunto dos condóminos, pode ser directamente demandado quando, designadamente, estejam em causa deliberações da assembleia, devendo o administrador ser citado como representante legal do condomínio – n.º 1 do artigo 231º do CPC (actual artigo 223º) – embora a assembleia possa designar outra pessoa para prosseguir a acção”.
X - Também Moitinho de Almeida, in Propriedade Horizontal, pag. 98; após as alterações legislativas ocorridas, defende que: – “Além das funções enumeradas no art.º 1436º, compete também ao administrador, nos termos do art.º 1433º n.º 6, a representação judiciaria dos condóminos contra quem são propostas as acções anulatórias de deliberações de condóminos”
XI - Com relevo, para a questão agora sobre recurso, leia-se o mui douto aresto do Tribunal da Relação de Lisboa, prolatado a 28.03.2006, Proc. n.º 2075/2005-7, relator: Arnaldo Silva, disponível in www.dgsi.pt, em que pelo acerto, rigor e profundidade exegética, transcreve-se alguns dos seus excertos fundamentais: i) – Após a reforma processual de 1995/96, o art.º 6º al. e) do Cod. de Proc. Civil ficou em consonância com o n.º 6 do Art.º 1433º do Cód. Civil ii) – A norma em questão (n.º 6 do art.º 1433º do Cód. Civil) integra-se na secção IV (administração das partes comuns do edifício) do capítulo VI (propriedade horizontal) do título II (do direito de propriedade), portanto colocada pelo sistema, na mesma secção onde se situa o art.º 1436º, onde se enumeram as funções do administrador, e visa precisamente, possibilitar a impugnação das deliberações da assembleia de condomínio (órgão administrativo deliberativo da propriedade horizontal), contra condóminos votantes da deliberação que estiver em questão
iii) – Com a concessão da personalidade judiciaria ao condomínio. Pela reforma processual de 1995/96, deixou de haver qualquer razão para demandar os condóminos votantes, como anteriormente justificadamente sucedia. E não faz qualquer sentido que, para os casos previstos no art.º 1437º do Cód. Civil, o condomínio tenha personalidade judiciaria, sendo representado pelo administrador, mas já não tenha quando se trate de impugnação das deliberações da assembleia de condomínio, quando o que está em questão continua, no fundo, a ser a administração do condomínio, relativamente ás decisões que toma.
iv) – Está em causa a gestão do condomínio e não interesses de outra natureza. Por isso tem de se concluir que com a reforma processual de 1995/96 o legislador minus dixit quam voluit, devendo o inciso constante do n.º 6 do art.º 1433º do Cod. Civil “ a representação judiciaria dos condóminos contra quem as acções são propostas (…) “, passar a ser interpretado extensivamente por forma a ver nele escrito que “a representação judiciaria do conjunto dos condóminos contra quem as acções são propostas (…) “;já que o condomínio, a quem o legislador veio a conceder personalidade judiciaria após a reforma processual de 1995/96, é o conjunto organizado dos condóminos.
v) – As deliberações da assembleia de condomínio (órgão colegial deliberativo do condomínio) exprimem, sem dúvida, a vontade do condomínio e não dos condóminos individualmente considerados, já que por lei é o órgão administrativo do condomínio que pode validamente deliberar.
vi) – Sendo assim um acto do condomínio, a legitimidade passiva para as acções de impugnação das deliberações do condomínio, cabe ao administrador do condomínio e não aos condóminos votantes.
XII - Acresce que, a demanda do condomínio, também se justifica pelo facto de prevenir/ evitar dificuldades reais, não só para quem demanda (atendendo às eventual dificuldade em identificar cabalmente todos os condóminos que votaram favoravelmente a deliberação e ainda os que se abstiveram), bem como para quem contesta, pela dificuldade em mobilizar todos os condóminos, para uma defesa comum.
XIII - No caso sub iudice, e atendendo às razões supra expostas, não se verifica, ao contrário do defendido pelo Mmo. Juiz do tribunal “a quo”, a ilegitimidade passiva do Recorrido, podendo e devendo aquele ser demandado na acção sob recurso, cabendo a sua representação em juízo ao administrador, ou a pessoa que a assembleia designar para esse efeito.
XIV - Acrescente-se ainda que, e tal como referido pela Recorrente na resposta que apresentou (cfr. req. ref.ª 21817949) o administrador do condomínio foi também a pessoa que representou a maioria dos condóminos que tomaram a deliberação, bastando atentar na acta (cfr. doc. n.º 2 junto com a P.I), para constatar que quem assinou pela quase totalidade dos condóminos, foi a sociedade Predibranco, identificada nos autos.
– Termos em que deve ao presente recurso ser concedido provimento, sendo revogada a sentença proferida nos presentes autos, e proferido Acórdão que declare, que:- O condomínio é parte legitima, não se verificando por conseguinte a excepção dilatória de ilegitimidade passiva; devendo a lide prosseguir os seus ulteriores trâmites, a fim de se decidir o mérito da acção”
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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Entretanto, a Autora, após ter sido notificada da decisão, invocando o disposto no art. 261º do CPC, veio ainda requerer a Intervenção principal provocada dos condóminos que votaram favoravelmente, a deliberação aqui questionada, identificando os mesmos, e alegando que existe uma situação de litisconsórcio necessário uma vez que a deliberação cuja revogação se pretende, foi aprovada em Assembleia de Condóminos (órgão deliberativo), e sendo um acto do condomínio, do grupo, deve este também ser demandado, conjuntamente com os condóminos.
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Sobre esse requerimento, proferiu o Tribunal Recorrido proferiu a seguinte decisão liminar:
“Cumprindo proferir despacho liminar sobre o incidente deduzido, desde já se diga que não assiste razão ao autor e que a questão até já havia sido abordada na sentença proferida nos autos.
Disse-se, nessa sede, que:
“A ilegitimidade passiva é, à luz do disposto no artigo 577.º alínea e) do Código de Processo Civil, uma excepção dilatória, de conhecimento oficioso (artigo 578.º do Código de Processo Civil), que determina a absolvição do réu da instância (artigos 278.º n.º 1 alínea d) e 576º n.º 2 todos do Código de Processo Civil), sendo certo que, in casu, por estarmos perante uma situação de ilegitimidade singular, que não é passível de ser sanada, não cabe ao Tribunal, oficiosamente, promover qualquer sanação ou sequer formular um convite à autora para suprir aquela excepção (sob pena de se proceder a uma modificação subjectiva de uma instância que se encontra já estabilizada, numa situação não prevista por lei – cfr. artigo 260.º do Código de Processo Civil).” (sublinhado nosso).
Com efeito, nos termos do artigo 316.º do Código de Processo Civil, o recurso ao mecanismo processual do incidente de intervenção principal provocada de terceiros por parte do autor apenas será de admitir em três situações distintas: i) ocorrendo preterição de litisconsórcio necessário (n.º 1); ii) nos casos de litisconsórcio voluntário (n.º 2 primeira parte); iii) dedução de pedido nos termos do artigo 39.º do mesmo diploma, isto é, em casos de pluralidade subjectiva subsidiária (n.º 2 parte final).
Ainda com pertinência para a apreciação da questão, dispõe o artigo 318.º do Código de Processo Civil que “o chamamento para intervenção só pode ser requerido: a) no caso de ocorrer preterição do litisconsórcio necessário, até ao termo da fase dos articulados, sem prejuízo do disposto no artigo 261.º; b) nas situações previstas no n.º 2 do artigo 316.º, até ao termo da fase dos articulados; c) nos casos previstos no n.º 3 do artigo 316.º e no artigo anterior, na contestação ou, não pretendendo o réu contestar, em requerimento apresentado no prazo de que dispõe para o efeito. (…)”.
No caso concreto do litisconsórcio necessário, importa atender, ainda, ao disposto no artigo 261.º do Código de Processo Civil que refere “até ao trânsito em julgado da decisão que julgue ilegítima alguma das partes por não estar em juízo determinada pessoa, pode o autor ou reconvinte chamar essa pessoa a intervir nos termos dos artigos 316.º e seguintes.”.
Ora, da conjugação dos normativos citados resulta que o recurso ao mecanismo previsto nos artigos 261.º e 316.º do Código de Processo Civil apenas é admissível, como forma de suprir a excepção dilatória da ilegitimidade passiva por faltar na acção uma determinada pessoa que se encontra numa relação de litisconsórcio necessário e, nesse sentido, em caso de legitimidade plural, isto é, quando a acção deveria ter sido, obrigatória e necessariamente, instaurada por ou contra uma pluralidade de partes, não tendo sido isso cumprido.
O litisconsórcio ocorre quando se discute em juízo uma determinada relação jurídica que envolve diversos sujeitos, os quais, em virtude de serem titulares da relação material controvertida, são interessados na acção. Ou seja, à unicidade da relação controvertida corresponde uma pluralidade de partes.
Este litisconsórcio pode ser voluntário ou necessário. Nesta última hipótese, que importa para o caso sub judice, o litisconsórcio necessário corresponde a uma pluralidade de partes obrigatória, não dependente da simples vontade dos interessados, significando isto que têm que estar em juízo todos os interessados na relação controvertida, sob pena de ilegitimidade, tal como estabelece o n.º 1 do artigo 33.º do Código de Processo Civil. Esta obrigatoriedade da presença simultânea de todos os interessados pode resultar da lei, do negócio ou da natureza da relação controvertida.
Ora, é justamente neste ponto que se verifica o óbice da pretensão agora manifestada pelo autor. É que, salvo melhor opinião, os terceiros que o autor pretende chamar não se encontram numa situação de litisconsórcio necessário (nem sequer de litisconsórcio voluntário, nem sequer ainda de coligação) com o réu originário, D... Haverá sim uma situação de litisconsórcio necessário entre todos os chamados, o qual decorre do citado artigo 1433.º n.º 6 do Código Civil (litisconsórcio necessário fundado na lei), mas estes não se encontram em igual relação com o réu da acção.
Daí que, na sentença, se tenha dito que, in casu, estávamos perante uma situação de ilegitimidade singular e não de ilegitimidade plural, razão essa que obstava a que o Tribunal, oficiosamente, convidasse o autor a suprir tal ilegitimidade plural, deduzindo o incidente que agora o autor, por sua iniciativa, veio suscitar.
É que a ilegitimidade singular é, pela sua própria natureza, insanável, conduzindo obrigatoriamente à absolvição da instância do réu.
A ser assim, o presente incidente não pode ser admitido, pois o autor, quando muito, deveria instaurar nova acção, desta feita, contra os agora terceiros chamados.
Em face do exposto, ao abrigo do artigo 226.º n.º 4 alínea d) do Código de Processo Civil, indefere-se liminarmente o incidente de intervenção de terceiros requerido pelo autor.“
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A Recorrente também veio interpor Recurso desta decisão, apresentando as seguintes conclusões:
“I - O presente recurso versa sobre o despacho proferido pelo Mmo. Juiz do tribunal “ a quo”, através do qual indeferiu liminarmente o Incidente, deduzido pela Recorrente, de Intervenção Principal Provocada, dos condóminos que votaram favoravelmente a decisão adoptada na assembleia de condóminos realizada a 06 de Março de 2014, em …e; por considerar que inexiste litisconsórcio necessário entre “... os terceiros que o Autor pretende chamar...” e “ … o réu originário D.”.
II - O Mmo. Juiz do tribunal “a quo”, salvo o devido respeito, ao proferir o referido despacho violou, por errada interpretação, o disposto nos Arts 33º n.º 2, 261º e 316º do CPC. Com efeito, e
III - Nos termos da lei, a figura/instituto do litisconsórcio – Art.º 33º CPC, surge, quando em juízo, se discute uma determinada relação jurídica que envolve diversos sujeitos, os quais, são por isso, partes na acção; ou seja à unicidade da relação controvertida corresponde, uma pluralidade de partes.
IV - De acordo com o supra referido normativo, o litisconsórcio diz-se necessário, quando os diversos sujeitos (do lado activo/passivo) que envolve a relação jurídica, tem obrigatoriamente que estar presentes em juízo, não dependendo tal presença da simples vontade dos interessados, podendo aquela obrigatoriedade resultar da lei, do negócio e até da natureza da relação controvertida.
V - Ao litisconsórcio necessário natural (i.e resultante da natureza da relação controvertida), em causa nos presentes autos, refere-se o n.º 2 do Art.º 33º do CPC, estipulando que: - “È igualmente necessária a intervenção de todos os interessados quando, pela própria natureza da relação jurídica, ela seja necessária para que a decisão a obter produza o seu efeito útil normal” acrescentando o n.º 3 do aludido normativo que “A decisão produz o seu efeito útil normal sempre que, não vinculando embora os restantes interessados, possa regular definitivamente a situação concreta das partes relativamente ao pedido formulado”.
VI - Segundo Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto in “ Código de Processo Civil Anotado” Vol. I, 1999, pág. 58, “A pedra de toque do litisconsórcio necessário é … a impossibilidade, de tido em conta o pedido formulado, compor definitivamente o litígio, declarando o direito ou realizando – o, ou ainda nas acções de simples apreciação de facto, apreciando a existência deste, sem a presença de todos os interessados, por o interesse em causa não comportar uma definição ou realização parcelar”, acrescentam ainda, que “Não se trata de impor o litisconsórcio para evitar decisões contraditórias nos seus fundamentos, mas de evitar sentenças – ou outras providências – inúteis por, por um lado, não vincularem os terceiros interessados e, por outro, não poderem produzir o seu efeito típico em face apenas das partes processuais” (Os n.ºs 2 e 3 do Art.º 33º, do actual CPC, têm a mesma redacção dos n.ºs 2 e 3 do Art.º 28, do CPC de 1961).
VII - No caso sub iudice, considera a Recorrente existir litisconsórcio necessário natural entre o C., representado pela D. e os condóminos ora chamados a intervir, uma vez que a decisão/sentença a proferir só produzirá o seu efeito útil normal, só regulara definitivamente a situação concreta das partes (declarando nula a deliberação adoptada), se na lide intervierem não só os condóminos que votaram favoravelmente a deliberação, posta em crise pela Recorrente, mas também aqueles que não estiveram presentes, nem representados, na assembleia de condóminos, na qual foi aprovada a referida deliberação.
VIII - Condóminos que, na lide, são representados, pelo condomínio. De facto
IX - As acções de impugnação de deliberações da assembleia de condóminos, devem ser propostas (legitimidade passiva) de acordo com uma das correntes, defendidas pela doutrina e jurisprudência Portuguesas, contra os condóminos que a(s) votaram favoravelmente - Art.º 1433º n.º 6 do CC (vide neste sentido Ac. TRP, prolatado a 04.10.2012, Proc. n.º 1371/11.9TJPRT.P1, disponível em www.dgsi.pt); e que no caso em apreço, são, precisamente, os condóminos, que foram chamados à lide, pela Recorrente, ao deduzir o Incidente de Intervenção Principal Provocada.
X - Ora, para além dos condóminos que votaram favoravelmente a aludida deliberação, existem outros, que também fazem parte do C., que não estiveram presentes, nem foram representados (cfr. docs. n.ºs 2 e 3 junto com a P.I do incidente, ou seja acta n.º 27 e fl. de presenças anexa) na assembleia de condóminos realizada a 06 de Março de 2014, em …; e que devem também, ser abrangidos pela sentença a proferir, nos autos principais, de modo a que esta componha definitivamente o litígio, dado estes nos termos do disposto no Art.º 286º do CC, terem legitimidade, agora activa, para intentarem a todo o tempo, acção destinada a declarar a nulidade, da deliberação adoptada pela assembleia de condóminos. Nulidade invocada nos autos principais.
XI - Segundo Sandra Passinhas in “A ASSEMBLEIA DE CONDOMINOS E O ADMINISTRADOR NA PROPRIEDADE HORIZONTAL”, 2ª edição, Almedina, pág. 251 “Quando a assembleia infrinja normas de interesse e ordem publica, as deliberações tomadas devem considerar-se nulas e, como tal, impugnáveis a todo o tempo e por qualquer interessado nos termos do artigo 286º. Se assim não fosse, estaria nas mãos dos condóminos derrogar os preceitos em causa; bastaria que, após a aprovação das deliberações, nenhum deles a impugnasse”.
XII- No caso sub iudice, a Recorrente intentou contra Recorrida, acção de Impugnação de Deliberação da Assembleia de Condóminos, sob a forma de processo comum, com o intuito de que fosse declarada nula, a deliberação aprovada a 06 de Março de 2014.em .., porquanto a acta (acta n.º 27) da referida Assembleia de Condóminos, ou seja o teor da mesma não corresponde, ao que sucedeu em Assembleia, enfermando aquela dos vícios descritos nos artigos 9º a 12º da P.I dos autos principais (cfr. doc. n.º 1, junto com a P.I. do incidente).
XIII – Acresce que, na presente lide, a intervenção do C., representada por D., também se justifica pelo facto, de o Administrador, ter representado a maioria dos condóminos que tomaram a deliberação, bastando atentar na acta da dita assembleia, para constatar, que quem assinou pela quase totalidade dos condóminos, foi a já referida, sociedade D..
XIV - Perante as razões supra aduzidas, considera a Recorrente que se verifica litisconsórcio necessário passivo, entre o “... os terceiros que o Autor pretende chamar...” e “ … o réu originário D.”, pelo que tem pleno cabimento a dedução do Incidente de Intervenção Principal Provocada, nos termos conjugados dos Arts 261º e 316º do CPC.
Termos em que deve ao presente recurso ser concedido provimento, sendo revogado o despacho proferido nos presentes autos, e proferido Acórdão que declare, que: - Se verifica litisconsórcio necessário natural entre o réu originário D. e os terceiros (condóminos), que a Recorrente chamou a intervir, mandando prosseguir os ulteriores trâmites do incidente deduzido”
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do(s) recorrente(s), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
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No seguimento desta orientação, a Recorrente/ Autora coloca(m) a(s) seguinte(s) questão(ões) que importa apreciar:
- no primeiro recurso:
1. saber se se verifica a excepção dilatória de ilegitimidade passiva julgada procedente pelo Tribunal de Primeira Instância;
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- no segundo recurso:
1. se deverá ser admitido o incidente de intervenção de terceiros por si deduzido, uma vez se verifica existir uma situação de litisconsórcio necessário passivo entre o Réu Condomínio e os pretendidos Intervenientes que identifica.
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
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Como factualidade relevante interessa aqui ponderar apenas os trâmites processuais já atrás consignados no relatório do presente Acórdão e o teor das decisões proferidas que já se transcreveram quase na integralidade atrás e que aqui se dão por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais.

B)- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Quanto ao Primeiro Recurso:
Como supra se referiu a questão que importa apreciar e decidir consiste em saber se o Tribunal Recorrido, na decisão aqui posta em crise pela Recorrente, julgando procedente a excepção dilatória de ilegitimidade do Réu Condomínio, decidiu de uma forma acertada.
Ora, ponderando os argumentos apresentados pela Recorrente (em confronto com a fundamentação da decisão aqui posta em crise), afigura-se ao presente Tribunal que não se pode considerar que na presente acção exista uma situação de ilegitimidade passiva do Réu Condomínio.
A questão que se coloca é de saber se a A. pode demandar o Condomínio- como aqui efectuou na petição inicial- ou antes tem que demandar individualmente todos os condóminos que aprovaram a deliberação ou deliberações impugnadas- conforme se entendeu na decisão aqui posta em crise - por serem estes que têm interesse em contradizer.
A questão, como é sabido, tem sido objecto de decisões jurisprudenciais diversas.
Uma, defendendo a posição que a Autora aqui entendeu defender, sendo dessa posição exemplo:
- o Ac. da RL, de 14.5.98, CJ, t. III, 96, onde se defendeu que, após a reforma de 1995 do CPC, “o condomínio, ou seja, o conjunto dos condóminos, pode ser directamente demandado quando, designadamente, estejam em causa deliberações da assembleia”, sendo que, na falta de outra pessoa nomeada pela assembleia para o efeito, “é o administrador que deve ser citado como representante legal do condomínio”. No mesmo sentido pronunciaram-se o ac da RP, de 7.1.1999, in www.dgsi.pt, “na propriedade horizontal o condomínio tem personalidade judiciária e, nas acções em que estejam em causa deliberações da assembleia de condóminos, deve ser demandado o condomínio, representado pelo administrador, o qual deve ser citado nessa qualidade”, no ac da RP 5.02.2004 e de 06.02.2006 “ Ao demandarem o Condomínio, representado pela administradora, os autores asseguram a legitimidade passiva nesta acção de impugnação de deliberações da assembleia de condóminos” e Ac RL 14.11.2006 onde se defendeu que “a legitimidade passiva nas acções de impugnação de deliberações da assembleia de condóminos cabe ao condomínio, representado pelo administrador “; o ac. da RL de 25.6.2009 (relator: Ilídio Sacarrão) “Na propriedade horizontal o condomínio tem personalidade judiciária e, nas acções em que estejam em causa deliberações da assembleia de condóminos, deve ser demandado o condomínio, representado pelo administrador, o qual deve ser citado nessa qualidade.”; o ac da RE de 18.09.2008 onde se refere que: “Face à actual redacção da al. e) do artigo 6º do CPC, em consonância com o nº 6 do art.º 1433º do CC, diversamente do que acontecia antes da Reforma de 1995, o condomínio, ou seja, o conjunto dos condóminos, pode ser directamente demandado quando, designadamente, estejam em causa deliberações da assembleia, devendo o administrador ser citado como representante legal do condomínio.”; e o ac. da RP de 8.9.2014 (relator: Manuel Fernandes) onde se defendeu “O condomínio, ou seja, o conjunto dos condóminos, pode ser directamente demandado quando, designadamente, estejam em causa deliberações da assembleia”, sendo que, na falta de outra pessoa nomeada pela assembleia para o efeito, “é o administrador que deve ser citado como representante legal do condomínio”;
Outra posição vem defendendo a tese sustentada na decisão aqui posta em crise, sendo exemplo:
- o Ac. da RC, de 19.6.2001, CJ, t. III, pág. 27, onde se defendeu que nas acções de impugnação das deliberações da assembleia de condóminos a respectiva acção terá de ser intentada “contra todos os condóminos, individualmente considerados, que as hajam aprovado, se tenham abstido ou não tenham estado presentes ou representados, os quais, serão, assim, os verdadeiros demandados na acção, que a podem contestar, isoladamente, permitindo a lei, não obstante, que estes sejam representados pelo administrador ou pela pessoa designada para o efeito (...)”. Esse foi também o entendimento seguido no Ac. da RL, de 30.9.1997, CJ, t IV, pág. 96, onde se escreveu que a acção deve ser dirigida “contra (...) todos os condóminos que votaram as deliberações, identificando-os”, podendo, embora, depois, pedir-se que a sua citação se efectue na pessoa do administrador. Igualmente nos Acs. da RP, de 5.7.90, 10.4.97 e 7.12.99, e da RL, de 4.3.2003, in www.dgsi.pt, se defendeu que a acção de anulação ou declaração de nulidade de deliberações da assembleia dos condóminos deve ser intentada contra os condóminos que as aprovaram, “individualmente considerados”. O Supremo Tribunal de Justiça também já se pronunciou neste sentido no ac. datado de 2.2.2006 onde defendeu que “a legitimidade passiva do Administrador nas acções respeitantes às partes comuns do edifício não é extensível à impugnação das deliberações do condomínio onde estão em causa interesses dos condóminos de outra natureza. Resulta claramente do n.°6 do artigo 1433.° do Código Civil que, nas acções de impugnação da assembleia dos condóminos, estes são representados pelo administrador o que implica que devem também ser demandados. No mesmo sentido se pronunciou ainda o ac da RE de 17.10.2013: “I - Quem deve figurar como parte passiva em acção onde se pede a anulação de deliberações de Assembleia-geral de condóminos são os condóminos que votaram a deliberação em causa, pois: II -Não estamos no âmbito dos poderes do administrador para que possa ser parte em juízo nos termos do art.º 6º, al. e), do C.P.C. já que, em matéria de deliberação da assembleia de condóminos o administrador não tem quaisquer poderes nem exerce qualquer função administrativa. III - Pode até ser, ele próprio administrador, um condómino não votante e opositor da deliberação em crise. IV - O facto de o legislador ter previsto que o administrador represente judicialmente os condóminos no art. 1443º nº 6 do CC é decisivo para afastar a legitimidade do próprio condomínio e dá sentido à conclusão de que a acção deve ser proposta contra os condóminos e não contra o condomínio.”
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Cumpre decidir.
Ora, salvo o devido respeito por opinião contrária, julgamos que é a primeira das correntes jurisprudenciais aquela que deve ser acolhida.
E isto porque se deve partir da ideia de que o condomínio, isto é, o conjunto de condóminos, não sendo uma pessoa jurídica, não tendo personalidade jurídica, tem, no entanto, personalidade judiciária.
Tal asserção resulta inequívoca do disposto no art. 12º, al. e) do CPC, onde passou-se a prescrever que “o condomínio resultante da propriedade horizontal, relativamente às acções que se inserem no âmbito dos poderes do administrador”, tem personalidade judiciária.
Ora, um dos poderes do administrador é precisamente o da representação judiciária dos condóminos contra quem sejam propostas acções de impugnação das deliberações da assembleia (art. 1433º, nº 6 do CC) (1).
O administrador do condomínio é, pois, “ope legis”, o representante judiciário dos condóminos nas acções de impugnação (ou no procedimento cautelar de suspensão das deliberações da assembleia). E, enquanto representante judiciário, age em nome e no interesse do colectivo de condóminos, ou seja, do condomínio.
O que se compreende, dado que o que está em causa é, como escreve Sandra Passinhas (2), uma deliberação que “ exprime a vontade do condomínio, do grupo, e não dos condóminos (individualmente considerados) ”, sendo que “as controvérsias respeitantes à impugnação de deliberações da assembleia apenas satisfazem exigências colectivas da gestão condominial, sem atinência directa com o interesse exclusivo de um ou vários participantes, com a consequência que, nessas acções, a legitimidade para agir cabe exclusivamente ao administrador”.
No condomínio actua um interesse colectivo, e a assembleia de condóminos (órgão deliberativo) exprime a vontade do condomínio, “completamente desvinculada e autónoma das posições individuais de cada condómino” (ob. cit., 176).
Não faria sentido, por isso, que, perante um pedido de anulação de uma deliberação, cada um dos condóminos que a aprovou pudesse opor-se a tal e defender uma sua singular posição.
Tal tarefa recai sobre o administrador, como representante orgânico e judiciário do condomínio (ou sobre outra pessoa para o efeito nomeada pela assembleia), que será a voz do conjunto dos condóminos, e, concretamente, dos que aprovaram a deliberação em causa.
A tese contrária, no entanto, argumenta com a letra da lei, ou seja, com o teor do disposto no art. 1433, nº 6 do CC onde se refere que “ a representação judiciária dos condóminos contra quem são propostas as acções compete ao administrador…”.
Mas a verdade é que essa argumentação não atende às alterações legislativas entretanto introduzidas no CPC quanto ao condomínio e já atrás referidas.
Com efeito, “… a solução para o problema passa, precisamente, em nosso entender, pela interpretação actualista do art. 1433, nº 6 do CC. Vejamos porquê. Esta norma- cuja redacção deriva do DL 267/94 de 25/10- foi redigida numa época em que o condomínio não gozava de personalidade judiciária, ou seja, não podia, enquanto tal, ser parte activa ou passiva num processo cível. A causa dizia respeito ao condomínio? Pois bem, tornava-se indispensável a intervenção, no processo, do lado activo ou do lado passivo de todos os condóminos.
Só muito mais tarde a reforma processual de 1995/96 veio estender no art. 6º, al. e) a personalidade judiciária do condomínio. E o art. 231º, nº1 cuja redacção deriva da mesma reforma, acrescentou que o condomínio é citado ou notificado na pessoa do seu representante legal (o administrador). Quer dizer o condomínio é a parte, e parte legítima, assumindo o administrador o papel de representante de uma entidade desprovida de personalidade jurídica, sendo incorrecto, por isso afirmar-se que a legitimidade pertence ao Administrador.
Torna-se assim necessário levar a cabo uma interpretação actualista do citado art. 1433º, nº 6 do CC substituindo a expressão condóminos pela palavra condomínio…” (3).
Acresce que esta solução também é aquela que melhor resolve em termos práticos a questão que aqui se coloca.
É que “… a necessidade de identificar todos os condóminos pode ser “diabólica”, por duas razões: por causa do elevado número de condóminos de certos edifícios sujeitos ao regime de propriedade horizontal; por causa também da impossibilidade prática, na esmagadora maioria das vezes de identificar, na acta da Assembleia, os condóminos que votaram a favor de uma deliberação. O art. 1º do DL 268/94 de 25/10 exige apenas que as actas das assembleias de condóminos sejam “assinadas por quem nelas tenha servido de presidente e subscritas por todos os condóminos que nelas hajam participado.
Estas duas razões de fundo levam-nos a pensar que a tese negatória da personalidade judiciária do condomínio, ao rejeitar a interpretação actualista do art. 1433º, nº6 do CC constitui uma solução pouco prática e até espinhosa…”.
Ora, aqui chegados, julga-se que, pelos argumentos apresentados, a melhor solução para a questão que aqui se coloca é justamente aquela que é defendida pela primeira corrente Jurisprudencial (4).
Assim sendo, conclui-se que a presente acção, contrariamente ao defendido na decisão aqui posta em crise, não tinha que ser dirigida contra os condóminos individualmente considerados e identificados que aprovaram a deliberação, mas sim contra o conjunto dos condóminos ou condomínio, representado, no caso, pelo respectiva administrador, o que a Autora efectuou no caso concreto.
Pelo exposto, e tendo em consideração os dispositivos legais citados, conclui-se que a decisão recorrida não se pode manter, uma vez que, contrariamente ao aí decidido, se entende que o Réu Condomínio é parte legítima nos presentes autos.
Nesta conformidade, julgando-se procedente o Recurso e revogando-se a decisão recorrida, deverão os autos prosseguir os seus ulteriores termos processuais.
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Tendo sido Julgado procedente o Recurso, não tem, assim, o Tribunal que se pronunciar sobre o recurso que a Autora também deduziu contra a decisão que lhe indeferiu a intervenção principal provocada dos Condóminos, uma vez que este Recurso fica prejudicado na sua apreciação, tendo em conta que se tornou inútil a requerida intervenção provocada (que visava, na perspectiva da Autora, sanar a ilegitimidade do Réu condomínio).
Pelo exposto, e sem necessidade de mais alongadas considerações, julga-se que o conhecimento desta parte do Recurso se mostra prejudicado pela primeira decisão proferida no presente Recurso.
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Sumário ( elaborado pelo Relator- art.º 663º, nº 7 do CPC ):

“I. As acções em que estejam em causa deliberações da assembleia de condóminos devem ser instauradas contra o Condomínio, representado pelo Administrador;
II. É que torna-se necessário levar a cabo uma interpretação actualista do art. 1433º, nº 6 do CC substituindo a expressão aí mencionada “condóminos” pela palavra “condomínio”, já que este preceito legal foi redigido numa época em que o condomínio não gozava de personalidade judiciária, estatuto processual que entretanto o Condomínio alcançou na sequência da reforma do CPC de 1995/1996 “.
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III-DECISÃO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação interposta procedente por provada e, consequentemente, revoga-se a decisão recorrida, ordenando-se o prosseguimento da acção face à legitimidade processual do condomínio demandado, representado pela respectiva administradora..
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Sem custas.
Notifique.
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Guimarães, 30 de Novembro de 2016
(Dr. Pedro Alexandre Damião e Cunha)
(Dra. Maria João Marques Pinto de Matos)
(Dra. Elisabete de Jesus Santos de Oliveira Valente- (vencida, nos termos da declaração junta)

(1) Embora inaplicável ao caso concreto não deixa de ter interesse verificar que o nº 2 do art. 393º do CPC relativo à providência cautelar de suspensão das deliberações da assembleia de condóminos, estabelece que “é citada para contestar a pessoa a quem compete a representação judiciária dos condóminos na acção de anulação”.
(2)In “ A Assembleia de Condóminos e o Administrador na propriedade Horizontal”, pág. 337;
(3)Miguel Mesquita, in “ A personalidade judiciária do condomínio nas acções de impugnação de deliberações da Assembleia de Condóminos”, in CDP, nº 35 (Julho/Setembro de 2011), págs. 54;
(4)Além das decisões jurisprudenciais e da doutrina já citadas, têm também este entendimento, Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto in “ Código de Processo Civil Anotado, Vol 1º, pág. 21 “, Aragão Seia , in Propriedade Horizontal, Condóminos e Condomínios 2ª edição, pág. 216 e Lopes do Rego, in “Comentários ao Código de Processo Civil”, vol I, pág. 43;


DECLARAÇÃO DE VOTO
Com todo o respeito pela decisão contrária, teríamos confirmado a decisão recorrida, porque à semelhança do que já entendemos no Ac. que relatámos no TRE de 17.10.2013, proc. nº 7579/11.0TBSTB.E1, entendemos que a acção de impugnação de deliberação da Assembleia de condóminos, deve ser proposta contra os condóminos que aprovaram a deliberação.
Com todo o respeito, não cremos que o art. 1433º nº 6 do CC seja a chave desta questão, pois do mesmo não resulta que o administrador tenha poderes em matéria de deliberação da Assembleia (apenas resulta que este representa os condóminos contra quem é posta a acção, mas não estabelece de forma alguma que a acção deva ser posta contra o condomínio – aliás até fala em condóminos).
A defesa de que a acção em causa deve ser proposta contra os condóminos que aprovaram a deliberação não se baseia nesta artigo (que é um artigo apenas relativo à representação do condomínio) mas sim no facto de as deliberações das assembleias não serem matéria que caiba no âmbito dos poderes do administrador.
O critério é pois saber se estamos no âmbito dos poderes do administrador para que possa ser parte em juízo, ou, caso contrário, compete aos condóminos, agir em juízo em seu nome próprio.
Ora, em matéria de deliberação da assembleia de condóminos o administrador não tem quaisquer poderes nem exerce qualquer função administrativa.
Como bem explica o Ac. RP de 15.05.2012, p. nº 570/11.8TJPRT.P1:
« Sem ignorar as razões ponderosas em que se fundam, sobretudo as de ordem prática, relacionadas com as dificuldades de fazer citar e intervir todos os condóminos, é prevalecente na jurisprudência o entendimento (…) Nos termos do art.º 6º, al. e), do C.P.C., tem ainda personalidade judiciária” o condomínio resultante da propriedade horizontal relativamente às acções que se inserem no âmbito dos poderes do administrador”. Consagra tal preceito uma extensão da personalidade judiciária a entidades que não gozam de personalidade jurídica e, como tal, não seriam susceptíveis de demandar ou ser demandadas como partes em função da regra geral decorrente do n.º 2 do art.º 5.º do mesmo diploma. No entanto, como consequência que é de norma excepcional, aquela extensão só actua nos precisos limites que o legislador aí definiu. Ou seja, e no que ora nos ocupa, só no âmbito dos poderes do administrador, o condomínio tem personalidade judiciária. Fora desse âmbito, não pode ser parte em juízo, competindo, assim, aos condóminos, agir em juízo em seu nome próprio.
Por ser assim, no art.º 6º, al. e) do C.P.C. não cabe a situação de representação judiciária prevista no nº 6 do Art.º 1433.º do C.C., já que, em matéria de deliberação da assembleia de condóminos o administrador não tem quaisquer poderes nem exerce qualquer função administrativa. Diversamente, e como se escreve no Ac. STJ de 29-11-2006, Proc.º 06A2913, in www.dgsi.pt, “apreciação e votação das questões submetidas à assembleia de condóminos só a estes pertence, não desempenhando, nessa sede, o administrador, qualquer papel. O que lhe compete, isso sim, é o dever de executar as deliberações da assembleia (art.º 1436 b) do C.C.) e nessa actividade funcional, se porventura a execução da deliberação tiver a ver com actos conservatórios relativos às partes comuns, já nada impedirá que o condomínio prejudicado, por ex, accione directamente o administrador. Então, estaremos em pleno âmbito do disposto no art.º 1437, nº 2. Mas, não é esta a perspectiva do art.º 1433º. Segundo o nº 1 do preceito “as deliberações da assembleia contrárias à lei ou a regulamentos anteriormente aprovados são anuláveis a requerimento de qualquer condómino que os não tenha votado”, o que significa que a conduta pode ser sancionada com a anulabilidade, isto é, a deliberação contrária à lei ou ao regulamento, é da exclusiva responsabilidade dos condóminos que a votarem, não envolvendo o exercício de qualquer poder ou desempenho de funções da parte do administrador, enquanto tal.”. Em certos casos, o administrador pode mesmo ser ele próprio um condómino não votante e opositor da deliberação em crise, situação em que muito mal se entenderia a sua intervenção promovendo os interesses dos condóminos que votaram a deliberação impugnada.
Não cabendo as acções de impugnação das deliberações tomadas pela assembleia de condóminos no âmbito dos poderes do administrador, nesse domínio já não goza o condomínio de personalidade judiciária, conforme resulta do art.º 6 do C.P.C. e já resultava implicitamente do disposto no art.º 1437.º do C.C.. Acresce que o nº 6 do art.º 1433.º refere expressamente que tais acções são propostas contra os condóminos – “A representação judiciária dos condóminos contra quem são propostas as acções compete ao administrador ou à pessoa que a assembleia designou para o efeito”. Logo, as acções desta natureza devem ser propostas contra os próprios condóminos, atenta a falta de personalidade judiciária do condomínio e a ausência de especial solução consagrada pelo legislador que permita supri-la.
Já no tocante à representação em juízo desses condóminos, previu o legislador que ela caiba ao administrador ou à pessoa que a assembleia designar para o efeito. Alternativa que não teria sentido caso a acção devesse ser intentada contra o condomínio dotado de personalidade judiciária e organicamente representado pelo respectivo administrador. A representação judiciária dos condóminos – e não do condomínio – prevista no n.º 6 do art.º 1433.º resultará, essencialmente, de razões de ordem prática: ciente da dificuldade prática de mobilização de todos os condóminos para a defesa comum, o legislador centralizou a representação judiciária dos condóminos demandados na pessoa do administrador ou de outra pessoa para o efeito designada. Mas sem que tal invalide que a acção deva ser proposta contra os condóminos que votaram a favor da aprovação deliberação da deliberação impugnada, enquanto titulares do interesse relevante em contradizer, como bem se refere na douta decisão recorrida.»
Também com este entendimento– vide entre outros, Acs. STJ de 29.05.2007, proc. nº 07ª1484, CJ/STJ, 2007, 2º, p. 97, de 24.06.2008, proc. nº 08ª1755, de 6.11.2008, proc nº 08B2784; de 29/11/2006, Proc. 06A2913, da RP de 09-02-1993, Proc.º 9240946 e de 27-01-2011, Proc. 2532/08.3TBVCD.P1 e de 27.01.2011, proc. nº 2532/08.3TBVCD.P1, todos acessíveis em www.dgsi.pt.
(Dra. Elisabete de Jesus Santos de Oliveira Valente