Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
4232/21.0T8VNF.G1
Relator: ANTERO VEIGA
Descritores: IPATH
JUNTA MÉDICA
ANÁLISE DO POSTO DE TRABALHO
OPORTUNIDADE DE PRONÚNCIA DA JUNTA MÉDICA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/16/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário:
A junta médica constitui meio de prova obrigatório no processo de acidente de trabalho, devendo pronunciar-se quanto à incapacidade do sinistrado. Colocando-se a possibilidade de uma incapacidade para o trabalho habitual, deve haver pronúncia quanto à mesma por parte da Junta médica, não devendo o julgador considerar a verificação desta sem pronúncia da junta médica.
Tendo a junta médica opinado sobre a incapacidade para o trabalho habitual, solicitados oficiosamente outros pareceres, designadamente estudo do posto de trabalho e parecer sobre tal incapacidade, apenas se impõe uma nova pronúncia por parte da junta se se afigurar que a mesma reveste utilidade.
Deve ser considerada com incapacidade para o trabalho habitual a sinistrada, se, relativamente às tarefas de embaladora, executadas de pé e exigindo deambulação e transporte de pesos, apenas pode executar parte delas e com um modo de execução, sentada, espúrio, em relação ao normal, usado na organização produtiva em que estava inserida.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Social da Relação de Guimarães

Na presente ação especial emergente de acidente de trabalho em que é sinistrada AA, nascida em ../../1997, e entidade responsável “EMP01... - Companhia de Seguros, S.A.”, conforme decorre da tentativa de conciliação, as partes não se conciliaram, divergindo apenas do resultado do exame médico realizado na fase conciliatória do processo, no que toca à incapacidade e períodos de IT´S.
*
A sinistrada veio requerer o seu exame em junta médica, tendo apresentado os seguintes quesitos:

Quesito 1º
Quais as lesões de que a sinistrada padece como consequência direta do acidente?
Quesito 2º
Tendo em consideração que, posteriormente ao exame médico do INML de 15/3/2022, a sinistrada recaiu em ITA e foi submetida a novo tratamento cirúrgico, em 13/5/2022 para artrodese tibio-társica esquerda, alterando significativamente o seu estado sequelar, pode considerar-se adequada a avaliação considerada no referido exame do INML?
Quesito 3º
É de aceitar que, às partes, tenham sido propostas, as conclusões do relatório do INML de 15/3/2022, quando a examinanda ainda se encontrava em tratamento, e na situação de ITA?
Quesito 4º
Em caso de resposta negativa aos quesitos anteriores, deveria aguardar-se que a seguradora, considere uma nova data de consolidação médico-legal, e ser solicitada nova avaliação ao INML?
Quesito 5º
Em caso de resposta negativa, digam os senhores peritos, qual o estado sequelar atual da sinistrada?
Quesito 6º
Do acidente de trabalho, resultou alguma sequela incapacitante nos termos da TNI? Nomeadamente:
- Incapacidade temporária absoluta (ITA)?;
- Incapacidade permanente parcial (IPP)?;
- Incapacidade absoluta para o trabalho habitual (IPATH)?
Quesito 7º
Em caso afirmativo, quais e em que percentagem?
Quesito 8º
E quais os períodos e valores de IT's, que devem ser considerados?
Quesito 9º
E qual a data de consolidação médico-legal a ter em conta?
Quesito 10º
A necessidade constante de utilização de uma bengala canadiana à direita, que a sinistrada apresenta, é compatível com a sua atividade de operária fabril?
Quesito 11º
Ou deverá a examinanda ser considerada com IPATH?
Quesito 12º
Na sequência das lesões decorrentes do acidente, necessita a sinistrada de tratamento médico e/ou terapêutico, atualmente e no futuro?
Quesito 13º
Em caso afirmativo, qual o tratamento recomendado e por quanto tempo?
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Realizado que foi o pretendido exame por junta médica, os Exmos. Senhores Peritos que a compuseram responderam aos quesitos por unanimidade, concluindo que, por força do acidente sofrido, a sinistrada é portadora de sequelas que lhe determinam uma incapacidade permanente parcial (IPP) de 22 % (0,22).

Responderam nos seguintes termos:

1- Fratura bimaleolar exposta esquerda;
2 – Não
3 – Não.
4 - Prejudicado;
5 – Artrodese da articulação tibiotársica esquerda, em posição favorável e rigidez da articulação subastragalina em inversão;
6 – ITA, desde ../../2020 a 15-11-1022; ITP de 60% de 16-11-2022 a 7-12-2022 e de 30% de 8-12-2022 a 4-1- 2023; IPP ver quadro anexo. Não consideram atribuição de IPATH, desde que haja adaptação ao posto de trabalho;
7 – Respondido no quesito anterior
8 – Respondido no quesito anteiror;
9 – 4-1-2023
10 – Sim, desde que haja adaptação ao posto de trabalho, previligiando a posição de sentada;
11 –Prejudicado;
12 – Nesta data não se preconizam;
13 – Prejudicado.
O senhor perito da sinistrada referiu ser de considerar a aplicação do fator 1,5 conforme o n.º 5 das instruções gerais da TNI face à impossibilidade de ter havido, até ao momento, uma adaptação ou reconversão ao seu posto de trabalho.
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Em face das respostas dadas designadamente a 6 e 10, foi determinado oficiosamente a realização de inquérito profissional e análise do posto de trabalho da sinistrada, por forma a apurar da existência de uma situação de IPATH e/ou da impossibilidade de adaptação ou reconversão ao seu posto de trabalho, solicitado ao CRP... (Centro de Reabilitação ...).
*
O CRP... emitiu parecer com a seguinte conclusão:
“Somos de parecer que a examinada se encontra com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual de embaladora, podendo beneficiar do plano de reabilitação e reintegração profissional proposto.”
Consta do parecer, além, do mais:


Identificação das exigências funcionais requeridas:



Impacto das limitaçõs…


Funções profissionais compatíveis…


…”
***
- Notificadas as partes do relatório do CRP... nada disseram.
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Por sentença de 5-12-2023 decidiu-se:

“Nestes termos, e pelo exposto, condena-se a “EMP01... - Companhia de Seguros, S.A.” a pagar à sinistrada AA:
» a pensão anual e vitalícia de € 5.648,11, com início em 05.01.2023, a que acrescem juros legais contados desde o dia a seguir à alta (05.01.2023) até efetivo e integral pagamento;
» a quantia de € 4.628,04, a título de subsídio por elevada incapacidade permanente, acrescida de juros legais desde o dia a seguir à alta (05.01.2023) até efetivo e integral pagamento;
» a quantia de € 10.148,81, relativamente a indemnização por incapacidades temporárias sofridas, acrescida de juros desde a data do vencimento de cada uma das prestações e até efetivo e integral pagamento;
» a quantia de € 20 a título de despesas de deslocação, acrescida de juros de mora desde a data da realização da diligência de não conciliação (31.05.2022) até integral pagamento (artigo 805.º, n.º 1 do Código Civil).
(…)”
- Considerou-se na sentença:
Face ao exposto, decide-se que a sinistrada:
» esteve em situação de incapacidade temporária absoluta entre ../../2020 e ../../2022;
» esteve em situação de incapacidade temporária parcial de 60 % entre ../../2022 e ../../2022;
» esteve em situação de incapacidade temporária parcial de 30 % entre ../../2022 e ../../2023;
» encontra-se clinicamente curada, mas portadora da incapacidade permanente parcial (IPP) de 33 %
(22 % x 1,5), com IPATH, desde o dia imediato ao da alta (alta que ocorreu em ../../2023).
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Mais resulta dos autos que:

A. AA foi vítima de um acidente de trabalho no dia 22.07.2020, pelas 8 horas, em ..., quando trabalhava, sob as ordens, direção e fiscalização de “EMP02..., S.A.”.
B. A sinistrada exercia as funções de operária fabril, auferindo a retribuição anual global bruta de € 9.979.
C. A responsabilidade infortunística encontrava-se integralmente transferida para a seguradora.
D. A seguradora reconheceu o acidente como acidente de trabalho, o nexo de causalidade entre as lesões e o acidente, o salário auferido pela sinistrada à data do acidente e a sua responsabilidade na reparação.
E. A seguradora pagou à sinistrada a quantia de € 7.174,19, a título de indemnização pelos períodos de incapacidade temporária de que esteve afetada.
F. O sinistrado despendeu a importância de € 20 em transportes, para se deslocar ao GML e a este Tribunal.
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Inconformada a requerida interpôs recurso apresentando as seguintes conclusões:

1. Proferiu o Tribunal a quo Sentença, por haver considerado encontrar-se dotado de todos os elementos, os quais, no seu entendimento, eram aptos à decisão, designadamente de facto.
2. Salvo melhor opinião, cometeu o Tribunal a quo erro de julgamento, precisamente porque os elementos de que o tribunal dispunha não o aptavam à decisão que acabou por tomar.
3. Considera a ora Apelante incorretamente julgados os factos que dão como provado que a sinistrada “encontra-se clinicamente curada, mas portadora da incapacidade permanente parcial (IPP) de 33 % (22 % x 1,5), com IPATH, desde o dia imediato ao da alta (alta que ocorreu em ../../2023).”
4. Conclusão alicerçada, única e exclusivamente, no parecer técnico do Centro de Reabilitação ... que conclui que: “a examinada se encontra com incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual de embaladora, podendo beneficiar do plano de reabilitação e reintegração profissional proposto.” concluindo, também assim, o Tribunal a quo.
5. A Apelante discorda de tal conclusão, pois que, não obstante o que resulta do referido Parecer do CRP..., a Junta Médica reunida nos autos desfechou – de forma unânime -, com base nos seus conhecimentos técnico-científicos, não se encontrar a sinistrada afetada de IPATH, reconhecendo que a sinistrada pudesse beneficiar de uma adaptação do posto de trabalho, privilegiando-se a posição de sentada.
6. Ora, finda a junta médica veio o Tribunal a quo requerer o parecer técnico do CRP..., para efeitos de “apurar da existência de uma situação de IPATH e/ou da impossibilidade de adaptação ou reconversão ao seu posto de trabalho.” – que, concluiu nos termos já avançados.
7. O erro de julgamento assenta igualmente no facto de o Tribunal o quo após a obtenção do resultado do parecer técnico não o ter submetido à apreciação do colégio dos peritos, para que aqueles se pronunciassem sobre o resultado daquele documento e o confrontassem com a sua anterior avaliação.
8. Outrossim, contrariamente àquela que tinha sido a visão unânime do colégio dos peritos, expressa na junta médica, veio o tribunal a quo, considerar encontrar-se a sinistrada afetada de uma IPATH, sustentando-se unicamente na circunstância de o parecer do CRP... considerar a sua eventualidade, contra todos os outros elementos presentes nos autos.
9. Tudo isto resultou numa total e exacerbada valoração do parecer do CRP..., em detrimento da opinião unânime de um colégio pericial e dos demais elementos presentes nos autos – designadamente, exames médicos, perícia médica singular e boletim de alta atribuída pela Seguradora.
10. Julgou o Tribunal a quo dar como provado encontrar-se a sinistrada afetada de uma IPATH, contrariamente à opinião médico-legal do perito médico singular do INML que avaliou a mesma a 26/06/2022; e contra a opinião de outros três peritos médicos que constituíram a junta médica dos autos e unanimemente consideraram uma Incapacidade Permanente Parcial sem IPATH.
11. No entanto, afigura-se inquestionável a força probatória dos autos de exame por junta médica mesmo sujeita ao princípio da livre apreciação pelo juiz.
12. Neste sentindo, ensina-nos o Tribunal da Relação do Porto, em Acórdão de 01/09/2020, “não estando o juiz adstrito às conclusões da perícia médica (…) apenas dela deverá discordar, (…) com base em opinião científica em contrário, em regras de raciocínio ou máximas da experiência que possa extrair no âmbito da sua prudente convicção.”
13. Sufragamos, então, que o parecer junto aos autos não consente, sem mais, o julgamento de facto efetuado pelo Tribunal a quo, considerando inaceitável uma decisão contra o colégio unânime dos peritos médicos, ainda mais sem a submissão do referido parecer à sua análise, na medida em que este visa apenas esclarecer eventuais dúvidas, não se sobrepondo, sem mais, à opinião de, pelo menos, quatro peritos médicos que avaliaram a sinistrada.
14. O parecer do CRP... não pode ter a força probatória que o Tribunal a quo lhe concedeu, devendo o mesmo ter sido submetido à apreciação da junta médica colegial, sobretudo quando os próprios peritos médicos se pronunciaram sobre a IPATH.
15. A este propósito refere o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 15/02/2022, no processo 873/19.3T8CLD.C1, Relator Jorge Manuel Loureiro: “Mostrando-se controvertida a questão da IPATH do sinistrado de um acidente de trabalho deve ordenar-se a realização de exames ou pareceres complementares ou requisitar-se pareceres técnicos tidos por úteis, designadamente parecer técnico do I.E.F.P. (…), por forma a que os resultados desses exames ou pareceres sejam ponderados por ocasião da junta médica que se pronuncie sobre a incapacidade do sinistrado.”
16. O mesmo princípio foi aplicado recentemente numa decisão do Juízo do Trabalho de Penafiel, de 10/11/2023, no Proc. 2169/21...., no âmbito da qual após junta médica maioritária (voto contra do perito apresentado pelo sinistrado) no sentido da não atribuição de IPATH, o Tribunal requereu o parecer técnico do IEFP acerca das funções que concluiu pela atribuição de IPATH por não haver possibilidade de adaptação do posto de trabalho, tendo nesse seguimento sido ordenada junta médica de esclarecimentos que, após análise do referido documento, concluiu, fundamentadamente, nos termos iniciais. E assim também veio a concluir o Tribunal a final.
17. Em nenhum momento dos autos foi equacionada a atribuição de uma IPATH, motivo pelo qual deve impor-se uma criteriosa avaliação do parecer oferecido pelo CRP..., pela junta médica que anteriormente havia reunido.
18. A mera realização da junta médica pressupõe, de per se, a pronúncia dos peritos sobre todo o tipo de lesões que o sinistrado possa padecer, tendo sempre presente todas as idiossincrasias relativas a cada posto de trabalho.
19. E, no caso concreto, a junta médica pronunciou-se unanimemente (i.e., com a validação clínica do próprio perito médico da sinistrada), no sentido de estar a sinistrada apta à realização da sua profissão habitual, reconhecendo apenas que beneficiaria de uma adaptação do posto de trabalho, privilegiando-se a posição de sentada.
20. Assim, quiseram os senhores peritos médicos afirmar que, tal como em qualquer caso em que é atribuída uma I.P.P., caberá à entidade patronal, em conjunto com a medicina do trabalho, apurar uma eventual adaptação do posto de trabalho.
21. Também não resulta da demais matéria de facto dada como provada que a sinistrada não tenha retomado ou não possa retomar a sua atividade profissional!
22. A sinistrada só não retomou a atividade laboral porque entrou em baixa médica por gravidez, tendo informado a sua entidade empregadora que estaria de baixa por sentir enjoos e náuseas decorrentes da gravidez.
23. Sempre se diga assim que todos os intervenientes nos autos, exceto o CRP..., concordam que a mesma pode retornar ao trabalho, ainda que com IPP e, com o devido respeito, a sentença decide unicamente com base no relatório técnico sem a apreciação do mesmo pela junta médica.
24. Não dispondo o tribunal a quo de quaisquer elementos de prova que confirmem ou infirmem a conclusão de que a sinistrada não tenha retomado ou não possa retomar a sua atividade profissional, contra, a opinião científica de, pelo menos, 4 peritos médicos que a consideram apta para o desempenho da sua profissão habitual, a sua adesão a àquele juízo conclusivo inquina o processo de formação da convicção conducente à decisão, estando esta também afetada.
25. Assim, arreigamo-nos também do disposto no Acórdão da Relação de Guimarães, de 17/12/2019, - Proc. 1185/16.0T8BGC.G1 – no qual é referido que a “determinação da existência, ou não, de IPATH nem sempre é fácil (…)”. E que o “exercício do trabalho habitual corresponde à execução de um conjunto de tarefas que constituem o núcleo essencial de determinada atividade profissional (…).”
26. Para que se pudesse dar como provado encontrar-se a sinistrada afetada para a sua profissão habitual sempre teria de poder afirmar-se, contra a opinião de um perito singular do INML e de um colégio pericial, que aquela estaria incapaz para realizar aquele núcleo duro de tarefas – o que não ocorre - porque a junta médica não teve oportunidade de se pronunciar sobre o referenciado parecer técnico do CRP... e sobre a descrição de tarefas lá explanado.
27. Não poderia assim ter-se dado como provado que a sinistrado se mostra afetada de uma IPATH.
28. Deve assim proceder a alteração da decisão nos termos do nº1 do artigo 662º do CPC, aplicável por remissão do artigo 1º, nº2 al. a), do CPT,
29. Pois a sentença recorrida violou e interpretou erroneamente todo o disposto nº 5 das Instruções Gerais da TNI, devendo a sinistrada ser considerada desvalorizado numa incapacidade permanente parcial de 33,00%.
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Em contra-alegações sustenta-se o julgado.
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A Exmª PGA deu parecer no sentido da improcedência.
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A Factualidade considerada provada é a que resulta do precedente relatório.
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O recorrente invoca no essencial o erro de julgamento relativamente à IPATH, referindo a falta de pronúncia por parte da junta médica, quanto à mesma, em face do parecer do CRP... e da descrição do posto de trabalho aí referenciado.
Refere a recorrente que no caso concreto, a junta médica pronunciou-se unanimemente (i.e., com a validação clínica do próprio perito médico da sinistrada), no sentido de estar a sinistrada apta à realização da sua profissão habitual, reconhecendo apenas que beneficiaria de uma adaptação do posto de trabalho, privilegiando-se a posição de sentada. Mais refere que não resulta da demais matéria de facto dada como provada que a sinistrada não tenha retomado ou não possa retomar a sua atividade profissional.
Previamente à apreciação do invocado erro de julgamento, importa tecer algumas considerações quanto à necessidade de nova pronúncia por parte da junta médica, já que se trata de meio de prova obrigatório neste tipo de processo – artigos 117º, e 132º, 138º, do CPT -, relativamente à IPATH, após parecer do CRP....
Resulta dos termos dos artigos referenciados que a junta se deve pronunciar quanto à incapacidade de que o sinistrado é portador.
Assim e por regra, após outros diligências e pareceres, deve a junta pronunciar-se tendo em conta os elementos novos de que anteriormente não dispunha.
Contudo tal apenas será necessário se implicar efetiva utilidade – é o caso paradigmático de os próprios peritos solicitarem ou sugeriram a realização de exames, e outros pareceres, designadamente técnicos.
O nº 7 do artigo 139º do CPT prevê a possibilidade de o juiz se o considerar necessário, pode determinar a realização de exames e pareceres complementares ou requisitar pareceres técnicos. E após estes não tem necessariamente que ouvir a junta sobre os mesmos. A determinação destes pode ter ocorrido para o juiz se esclarecer relativamente a pontos do laudo da junta, relativamente aos quais não se considerou devidamente esclarecido. Pressupondo não tenham sido levantadas questões novas não apreciadas pela junta.
Ora no caso a junta médica pronunciou-se quanto à IPATH, não tendo requerido ou solicitado qualquer esclarecimento.
Justificadamente, diga-se, em face da pronúncia relativamente a tal incapacidade, o julgador entendeu esclarecer-se, solicitando parecer ao CRP... nos termos que que o fez.
É de salientar que, ao contrário do pretendido, a opinião dos peritos médicos quanto à IPATH, não tem a clareza que lhe é atribuída. Parte-se do pressuposto de que as tarefas da sinistrada podem ser executadas, sem prejuízo do seu núcleo essencial, em posição sentada.
Resulta das respostas dadas aos quesitos 6 e 10 que consideram não haver ITATH, “desde que” haja adaptação ao posto de trabalho, previligiando a posição de sentada.
Ora, não compete aos peritos médicos determinar se as tarefas podem ser exercidas ou não em posição sentada, não é questão médica. Trata-se de realidade relativa ao “modus operandi “das tarefas executadas, no quadro de uma organização produtiva, devendo tal possibilidade ser avaliada em termos práticos tendo em conta tal “modus operandi” e as normais caraterísticas de uma organização produtiva.
O conceito remete para uma impossibilidade em termos práticos. As tarefas devem poder ser executadas tendo em atenção as circunstâncias normais da sua execução, no quadro de uma organização produtiva, tendo em conta o modo como em concreto as tarefas são desenpenhadas, na sua inserção no processo produtivo. Devem ser executáveis, considerando designadamente os ritmos das tarefas, os ritmos do sinistrado na sua nova condição, e interferência ou não destes nos ritmos próprios da cadeia de produção e nos ritmos de produção da própria organização.
Não é de considerar existir tal incapacidade quando o trabalhador retome ou possa retomar o essencial das suas anteriores tarefas, ainda que com esforço acrescido e eventualmente com algumas modificações técnicas ou outras, que visam precisamente adaptar o local ou a forma de prestação, de modo permitir a execução dessas tarefas em função das limitações funcionais adquiridas. Ac. RG de 24/10/2019, processo nº 1730/15.8T8VRL.G1
Pode não ser praticável, num quadro de tarefas que são executas em pé, exigindo ainda um considerável grau de mobilidade, introduzir no processo produtivo um elemento com um modo de funcionamento diferente, sentado, que por isso apresentaria um desempenho, considerando a produtividade, muito além da “margem de tolerância”, admissível, entre as várias tarefas da cadeia produtiva, e desempenhando apenas uma parte das funções, não abarcando sequer a totalidade das que constituem o núcleo essencial. Trata-se de questão técnica que o CRP..., sem contestação das partes, apreciou.
As tarefas da autora eram as referidas no relatório, acima indicadas. Saliente-se a colocação de produtos na máquina de embalar, tirando do contentor para a linha de embalagem, colocação dos produtos em sacos, etiquetar produtos e caixas, colocar os produtos assim embalados em caixas, formar paletas, a que acrescem outras relativas a limpeza. A posição sentada permitiria por exemplo o etiquetamento e eventualmente a introdução dos produtos nos sacos e nas caixas. Já quanto às restantes tarefas teria quer ser um outro trabalhador, já que se mostra inviável a sua execução na posição de sentada.
Consta do relatório, quanto ao modo de executar as tarefas, que exige “posição contínua em bipedestação”, alude-se ao transporte de objetos com pesos diferentes, deslocação por diversos espaços e por pisos. Alude-se às restriões “à postura ortostática e/ou deambulação por períodos prolongados” restrições de carga de peso e movimentação acima de 5 Kg, e restrição ao uso de sapato de segurança próprio na empresa.
A autora apresenta dores, claudicação, uso de apoio, canadiana, rigidez no tornozelo esquerdo. Considerando o próprio parecer dos Srs. Peritos médicos, e tendo em conta as especificas exigências das tarefas, a conclusão de primeira instância quanto à matéria questionada está devidamente ancorada. Os peritos médicos não atribuem a imcapacitdade para o trabalho habitual, “pressupondo”, pode dizer-se, que as tarefas possam ser executadas em posição sentada, o que, mesmo considerando o núcleo essencial destas – que abrangerá a colocação dos produtos na máquina de embalar, a etiquetagem, e embalamentos, primeiro em sacos de plástico e depois as peças em caixas -, não se mostra possível.
A recorrente refere não resultar dos autos que não tenha retomado as funções. Não resulta efetivamente, mas também não resulta que as tenha retomado, antes se depreendendo dos autos que não ocorreu.
No caso concreto, não se impõe uma nova pronúncia por parte da junta médica, que sobre a questão emitiu a sua opinião, em termos tais que o julgador entendeu suficientes para fundar a sua convicção, tendo em consideração os demais elementos de prova juntos aos autos e a peritagem que entendeu solicitar para esclarecer a questão da incapacidade para o trabalho habitual, sobre a qual a junta se pronunciara. A diligência, num certo sentido, em face da posição dos Srs. Peritos e das razões por eles apontadas, parece até inútil. Que poderiam acrescentar em face da descrição de tarefas e das condições em que as funções eram e são executadas?
Consequentemente, é de confirmar o decidido.
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DECISÃO:

Pelos expostos fundamentos, acordam os juízes os juízes do tribunal da Relação de Guimarães na improcedência do recurso, confirmando-se o decidido.
Custas pela recorrente.
16-5-2024

Antero Veiga
Francisco Pereira
Leonor Barroso