Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
6479/09.8TBBRG.G1
Relator: RITA ROMEIRA
Descritores: HOMEBANKING
RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL
ÓNUS DA PROVA
PROTECÇÃO DE DADOS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/30/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I - O contrato de “homebanking” estabelecido entre o banco e o cliente consiste numa simplificação de processos e operações disponibilizados, a este último, possibilitando-lhe um acesso mais continuado e rápido e, permitindo-lhe a realização de outras operações, bem como a obtenção de vários serviços, de forma em princípio mais cómoda e, simultâneamente, com enormes poupanças de escala, por parte do banco, nomeadamente, na possível diminuição do número de funcionários em atendimento, o que explica a razão dos mesmos em promoverem estes serviços, insistentemente, junto dos seus clientes.
II – Assim, não é legítimo ao banco invocar a sua irresponsabilidade numa situação de fraude informática, designada “phishing” de dados de autenticação do cliente, como o argumento que tal ocorreu no computador deste e não em qualquer sistema informático seu ou por si dominado, sabido que, é pressuposto deste tipo de serviço a utilização de computadores pessoais e não do próprio banco.
III - É justa e equilibrada a indemnização no montante de € 20.000,00 a pagar pelo banco (guardião do depósito), a título de compensação pelos danos morais sofridos pela A. (cliente do banco), devido aos transtornos que lhe advieram por, da sua conta aberta naquele, sem sua autorização ter sido feita uma transferência no valor de € 13.000,00 (eventualmente, devido a burla informática) e, por isso vê devolvido um cheque apresentado a pagamento depois de concretizada aquela transferência.
IV- E, é assim, porque o cliente/ A. tinha avisado o banco do sucedido e da emissão do cheque e solicitado ao banco/R. que travasse aquela transferência, não logrando este demonstrar ter desenvolvido as diligências necessárias no sentido de o evitar, o que causou, não só, a sua devolução, com a “indicação de falta de provisão”, (apesar do banco reconhecer, antes do cheque ser apresentado a pagamento, da existência de uma página Web falsa, imitando a sua página de abertura) como a A., em virtude de comunição efectuada pelo seu próprio banco ao Banco de Portugal, vê o seu nome incluído na listagem de utilizadores de risco e sofre, por via disso, diversos danos, incluindo perda de clientes.
Decisão Texto Integral: Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães

I – RELATÓRIO
A A., “B..., Ldª.”, com sede em Braga, intentou a presente acção ordinária contra a R., “Banco C..., S.A.”, com sede no Porto, pedindo a condenação desta a indemnizá-la pelos prejuízos causados e/ou pagar-lhe a quantia de € 37.953,04, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação, bem como nos demais danos que vier a sofrer, a fixar em liquidação de sentença.
Para tanto alegou, em síntese, ter aderido ao serviço disponibilizado pela Ré para gestão de contas e realização de operações bancárias através da internet, denominado “C... Net Empresas”, que a mesma publicitava como um serviço seguro e confidencial, sem que lhe tenha sido dado conhecimento do respectivo clausulado, o que determina a nulidade das cláusulas 5.3, 6.1, 6.2, 7.2, 8, 12.2, 12.4, 14, 15 e 17.
No entanto, após ter acedido a esse serviço através da internet no dia 30 de Maio de 2008, foi-lhe retirada da conta a quantia de € 13.000,00 sem a sua autorização através de uma transferência não efectuada por si, supostamente mediante a criação por um terceiro de uma página web falsa e copiada na página de abertura do C... net.
Mais alega que a Ré, não obstante alertada a tempo, não diligenciou pelo cancelamento dessa transferência, o que determinou que a conta da Autora não estivesse provisionada no momento em que uma sua cliente pretendeu proceder ao desconto de um cheque no valor de € 12.602,00, que a Ré devolveu com a indicação de “falta de provisão” e, em virtude do sucedido, alegou ter ficado responsável pelo pagamento de despesas e comissões no valor de € 277,04, viu debitada indevidamente pela Ré a quantia de € 26,00 de despesas e imposto de selo, viu a convenção do uso do cheque rescindido por parte da Ré e o seu nome incluído na listagem de utilizadores de cheque que ofereciam risco, para além de ter sido despojada da referida quantia de € 13.000,00.
Alegou, ainda, que devido à conduta da Ré perdeu um importante cliente, que deixou de lhe proporcionar bem-estar económico e lucros, ficou impedida de competir com as empresas suas concorrentes pelo facto do seu nome se encontrar registado no Banco de Portugal e viu o seu bom nome afectado, pretendendo assim a fixação de uma compensação de valor não inferior a € 24.000,00.

Citada a Ré apresentou a sua contestação, nos termos que constam a fls. 163 e ss., dos autos, por excepção, deduzindo o incidente da incompetência territorial desde tribunal e impugnando a generalidade dos factos alegados na petição inicial, nomeadamente no que respeita ao conhecimento por parte da Autora das vantagens do serviço disponibilizado (que é o “C... Net Negócios” e não o “C... Net Empresas”) e do clausulado integral do contrato, que foi lido pelas representantes da Ré de forma pausada e esclarecida e compreendido.
Refutou, assim, a invocada nulidade parcial do clausulado.
Por outro lado, alegou que a transferência do montante de € 13.000,00 já havia sido enviada para a SIBS quando a gerente da Autora a alertou, tendo sido infrutíferas todas as diligências efectuadas pela Ré (que reagiu de imediato e com prontidão) junto da CGD no sentido de obter a devolução dos fundos. Mais, afasta qualquer responsabilidade da sua parte, pois a ser verdade o relatado pela Autora, a conduta fraudulenta e abusiva terá sido praticada por terceiros desconhecidos.
Alega, ainda, ter dado instruções em 26-11-2008 com vista ao reembolso à Autora da referida quantia, o que não veio a suceder face à recusa desta em subscrever uma minuta necessária para o efeito.
Por fim, impugnou os danos não patrimoniais invocados pela Autora, requereu a suspensão da instância até à conclusão do processo de inquérito que se encontrava pendente na Polícia Judiciária e invocou, ainda, o abuso de direito.
Concluiu que:
1. Verificada a procedência da excepção de incompetência relativa do presente Tribunal, devem os autos ser remetidos às Varas Cíveis de Lisboa.
2. Verificada a procedência da excepção de abuso de direito, deve o Banco, R., ser absolvido do respectivo pedido.
3. Pela verificação de causa prejudicial do citado processo de inquérito, quanto aos presentes autos deve ser ordenada a suspensão dos presentes autos, nos termos do artº 279/1 do CPC.
4. Sem prejuízo do conhecimento de tais excepções, ser considerada como não provada e improcedente a presente acção, deve o Banco, R., ser absolvido, na íntegra, do pedido formulado.
Notificada, a Autora apresentou a sua réplica, nos termos que constam a fls. 341 e ss., pugnando pela competência territorial deste tribunal e rejeitando a existência de abuso de direito da sua parte.
Deduziu, ainda, oposição ao pedido de suspensão da instância, impugnou os documentos juntos pela Ré com a contestação e reiterou o que havia alegado na petição inicial.
Concluiu como na p.i., devendo as excepções ser julgadas não provadas e improcedentes, e a causa prosseguir neste Tribunal e sem suspensões.
Procedeu-se a audiência preliminar, na sequência da qual a Ré veio a fls. 360 declarar que considerava “prejudicada a arguição da incompetência territorial”.
A fls. 363 foi decidido o indeferimento da suspensão da instância requerida pela Ré e proferido despacho saneador, tendo de seguida, sido seleccionada a matéria assente e a base instrutória, da qual reclamou a R. a fls. 381 e ss., o que foi parcialmente deferido nos termos que constam do despacho de fls. 395.
Instruídos, prosseguiram os autos para julgamento, tendo a matéria de facto sido respondida nos termos que constam do despacho de fls. 500 a 504, sem reclamações.
Por fim foi proferida sentença, a qual decidiu “... julgar parcialmente procedente a acção e, em consequência:
- condenar a R., “Banco C..., S.A.”, a pagar à Autora a quantia de € 33.303,04, acrescida de juros de mora, às taxas legais em cada momento em vigor nos termos da Portaria nº 597/2005, de 19/07, contados desde a citação até integral pagamento;
- absolver a R. do restante pedido.
Custas por Autora e Ré, na proporção do respectivo decaimento (art. 446º, nºs 1 e 2 do C.P.C.).”.

Inconformada com a decisão dela recorreu a ré, a fls. 536 e ss., terminando as suas alegações com as seguintes CONCLUSÕES:
1. Foram incorrectamente julgados quanto à MATÉRIA DE FACTO os pontos constantes das respostas dadas aos quesitos 14º, 16º, 17º 18º, 19º, 52º, 54º, 57º, 58º, 59º e 63º, da Base Instrutória.
2. As RESPOSTAS DADAS aos artigos 14º, 16º, 17º 18º, 19º, 52º, 54º, 57º, 58º, 59º e 63º da BI, devem ser alteradas respectivamente para:
• 14: NÃO PROVADO;
• 16, 17 e 18: Provado que no dia 30-5-2008 quando a representante da autora executava as tarefas indicadas para acesso ao BPI NET foi lhe exigido que fornecesse a coordenada A9, numa página similar á do BPINET.
• 19. PROVADO.
• 52. Provado que a operação referente à transferência foi autorizada pela autora, nos termos das respostas dadas aos quesitos 16 a 19.
• 54. PROVADO.
• 57. PROVADO.
• 58. PROVADO.
• 59. PROVADO.
• 63. PROVADO.
3. Inexistiu da parte do Banco apelante qualquer quebra de segurança, na criação, manutenção e execução de operações no seu site “c...net”.
4. Verificou-se quebra de segurança por parte da Apelada no acesso ao referido site, o que, de forma causal, determinou que um terceiro se tenha apropriado das credenciais da mesma recorrida para a realização de operações, via homebanking.
5. O Banco apelante não pode ser responsabilizado, por qualquer intromissão fraudulenta no computador do cliente, o que “in casu” aconteceu.
6. Só responde o apelante pela intromissão, que possa sofrer o seu site, a partir dos computadores e sistemas informáticos do próprio Banco.
7. Ora a recorrida tinha a noção clara da quebra de segurança, por si cometida ao facultar no dia 30/05/2008, no acesso em causa a coordenada A9, quando, de acordo com o teor contratual assinado, as normas de procedimento no acesso ao bpinet e também tendo em conta todas as noticias de segurança disponíveis no próprio site e no site institucional do Banco apelante.
8. A recorrida tinha a obrigação de não facultar tais solicitadas credenciais, mas sim reportar a predita situação.
9. Qualquer presunção de culpa que onerasse o Banco apelante, se encontra pois, de todo em todo, ilidida.
10. A vulnerabilidade verificada, ocorreu aliás confessadamente, no computador da apelada e não em qualquer sistema informático do próprio Banco apelante ou por si dominado.
11. Não colhe o argumento subsidiário da responsabilidade pelo risco, relativamente ao depósito bancário, precisamente porquanto inexistiu qualquer extravio ou dissipação da quantia depositada na referida conta bancária!
12. Factualmente ocorreu sim o fornecimento, por culpa própria da apelada, das credenciais de acesso e movimentação da sua conta bancária.
13. Consubstanciando a mesma utilização negligente das prerrogativas operacionais cometidas pelo contrato de homebanking celebrado, sendo a apelada responsável contratual e legalmente pelos prejuízos por si sofridos, emergentes da autorização da transferência em apreço.
14. Não sofrendo aliás a cláusula 6.2 do citado contrato qualquer tipo de nulidade.
15. Inexiste qualquer responsabilidade por parte do Banco apelante na efectivação da transferência em apreço, cuja execução apenas e só se deveu a flagrante quebra de segurança por parte da apelada.
16. De forma clara se percebe a licitude e legitimidade do mesmo Banco apelante para a devolução do cheque de € 12.602,00 e consequente rescisão da convenção de cheque e inclusão da própria apelada na LUR.
17. De forma alguma tal inserção do nome da apelada na referida LUR, consubstancia qualquer ofensa à personalidade moral da mesma apelada.
18. Tal inserção apenas e só espelhava a situação real e factual da ora recorrida perante o próprio Banco recorrente.
19. Como tal é a mesma insusceptível, causalmente, de poder produzir os danos não patrimoniais fixados, que além do mais e por mera cautela de patrocínio, se reputam no mínimo, como exagerados.
20. O que de todo em todo se diga em relação à responsabilização pelo pagamento das despesas em causa, no valor de € 303,04.
21. A decisão recorrida, no segmento em recurso, violou, por errada interpretação e aplicação as normas constantes dos artigos 19º e 22º, ambos do R.J.C.C.G., e artigos 70º, 483º, 484º, 496º, 562º, 566º, nº 3 e 799º, todos do C.C.
TERMOS em que no provimento integral do interposto recurso, deve a sentença recorrida, na parte em que, julgando parcialmente procedente a acção intentada, condenou o Banco apelante, a pagar à Autora a quantia de € 33.303,04, acrescida de juros de mora, às taxas legais em cada momento em vigor nos termos da Portaria nº 597/2005, de 19/07, contados desde a citação até integral pagamento, ser revogada, decretando-se a absolvição integral do Banco ora recorrente, do pedido formulado pela recorrida.
Assim se fazendo integral JUSTIÇA.

A fls. 660 e ss., a A. contra-alegou, terminando com as seguintes CONCLUSÕES:
1. A Ré, apelante, que tudo fez para obstaculizar a prova da A./apelada, como a perícia requerida, (valendo-se ainda de gravações incompletas), assenta aos suas “críticas” na deficiente valoração de alguns dos depoimentos, esquecendo outros e a demais prova, como a documental, apesar disso, pretende a reapreciação da matéria de facto sem que tivesse junto sequer a transcrição completa, muito menos indicado com exactidão as passagens da gravação em que se funda, em clara violação do disposto no n.º 1 e 2 do art.º 685.º B do CPC.
2. No âmbito do processo-crime, referenciado nestes autos, a Ré/apelante apresentou-se e intervém como lesada, o que, só por si, é muito elucidativo, tendo sido notificada recentemente do Despacho de arquivamento.
3. Impende sobre a Ré a presunção de culpa estabelecida no art.º 799.º do CC.), de que o acesso de terceiros, em via electrónica, à conta do cliente não se ficou a dever a vulnerabilidade do sistema de segurança pelo banco implementado, relativamente à movimentação online dos clientes aderentes ao serviço, tanto mais que “o acesso online fraudulento aos depósitos bancários conhece uma sofisticação e actualização permanentes, que exigem das instituições de crédito um esforço continuado naquele domínio, ao menos enquanto persistirem em apresentar-se como guardiãs confiáveis dos valores que lhes são entregues, no pressuposto de que assim fica garantida a salvaguarda daqueles.
4. Mesmo que assim não fosse, a Ré sempre seria responsabilizada a título de risco, nos termos do art.º 496.º n.º 1 do CC,…designadamente em sede de caracterização do contrato de depósito bancário, pois “é ao depositário, enquanto proprietário da coisa transferida, que cabe responder pelo risco do extravio ou dissipação da coisa, no caso a importância ilicitamente transferida, salvo quando haja culpa do cliente (que não é o caso, como já ficou demonstrado)”.
5. Não bastasse a sua actuação desconforme e ilegal, e o facto da Ré se apresentar no processo-crime como queixosa e lesada, a Ré é responsável pela falta de segurança e de fiabilidade do serviço C... NET Empresas e pela actuação dos seus auxiliares, que nada fizeram no sentido de impedir a concretização da transferência.
6. A Ré, sobre quem impendia o dever e responsabilidade de manutenção do serviço em segurança e pelos prejuízos advindos da quebra dessas condições por si garantidas como pressuposto para a adesão da Autora, (não bastasse a sua inoperância em evitar a transferência) devia ter diligenciado de forma pronta e eficaz pelo provisionamento da conta da Autora (nomeadamente através da retenção imediata da transferência, logo que a situação lhe foi comunicada pela Autora ou, caso essa solução não fosse viável, mediante o lançamento da importância correspondente na conta), de molde a evitar aquelas consequências/danos graves decorrentes da devolução do cheque que havia sido emitido.
7. A douta sentença considerou e respeitou em absoluto o disposto nos artigos 799.º, 2.º n.º 1 e n.º 3, al. a), 73.º, 74.º, 75.º, 77º, do D.L.298/92, de 31/12, (R.G.I.C.), al. f) do art.º 21º, 19.º e 22.º do DL. n.º 446/85; art.º 796.º, 70.º, 483.º, 484.º, 496.º, 562.º, 566.º n.º 3 todos do CC. e n.º 4 do art.º 3.º o D.L. 29/96, não violando qualquer norma legal, muito menos as citadas pela recorrente, devendo, por conseguinte, manter-se.
Termos em que o recurso da recorrida, “BPI S.A.”, deve ser julgado improcedente, com as devidas consequências legais, assim se fazendo Justiça.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

O objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das alegações (artºs 684º, nº 3, e 685º-A, nº 1, do CPC), salvo questões do conhecimento oficioso (artº 660º, nº 2, in fine).
Assim, as questões a decidir traduzem-se em saber:
– se deve ser alterada a matéria de facto impugnada;
– se deve ser revogada a decisão recorrida e a ré absolvida, integralmente, do pedido.

II – FUNDAMENTAÇÃO
A) OS FACTOS:
1. A autora dedica-se à actividade de importação, exportação e representação de produtos nacionais e internacionais, em especial produtos de limpeza industrial e mobiliário [A) dos factos assentes];
2. A ré dedica-se à actividade bancária [B) dos factos assentes];
3. Em 20-7-2004, as partes outorgaram um contrato de depósito bancário, com abertura de conta de depósitos à ordem (n.º 0-0000000), no Balcão de Ferreiros, em Braga [C) dos factos assentes];
4. Desde então e até 30-5-2008, a autora movimentou valores, a crédito e a débito, na sua conta de depósito [D) dos factos assentes];
5. Em 20 de Julho de 2004, na agência da ré de Ferreiros/Braga, a autora, representada pelas sócias gerentes D... e E..., outorgou um contrato denominado "C... Directo/C... Net - Contrato de Adesão", que as mesmas sócias assinaram no acto, conforme documento sob o n.º 1 junto com a petição inicial, cujo se teor se tem por reproduzido [E) dos factos assentes];
6. Na mesma ocasião, a ré forneceu à autora as chaves de acesso que permitiam a utilização do Serviço C... Directo/C... Net pelas duas sócias gerentes, a referida D... e E... [F) dos factos assentes];
7. A ré informou que o código secreto que indicou, com cinco caracteres numéricos, só era válido para o primeiro acesso, devendo ser alterado para um código secreto pessoal da autora, também com 5 caracteres numéricos, o que esta fez [G) dos factos assentes];
8. A autora utilizou o serviço no escritório com regularidade, desde 2004 e até 30-5-2008 [H) dos factos assentes];
9. No dia 2-6-2008, ao fim da tarde, numa caixa ATM verificou que tinha sido retirado da aludida conta a importância de 13.000,00€ [J) dos factos assentes];
10. Por força dessa transferência a conta ficou com um saldo no valor de 582,97€ [K) dos factos assentes];
11. A autora emitiu o cheque com o n.º ........, a favor da empresa “F..., S.L.”, no valor de 12.602,00€ [L) dos factos assentes];
12. Em 4-6-2008 o referido cheque foi apresentado a pagamento e não foi pago, tendo sido devolvido com a indicação de falta de provisão [M) e N) dos factos assentes];
13. Em 12-6-2008, a ré enviou uma carta à sócio-gerente da autora D..., a fim de regularizar a situação até 21-7-2008 (cf. DL. 454/91, de 28 de Dezembro) com a advertência de que, não o fazendo, rescindia a convenção do seu uso, ficando proibida de emitir cheques sobre qualquer instituição de crédito, bem como impedida (tal como as sócias) de celebrar ou manter convenção de cheque, com inclusão do nome na listagem de utilizadores que oferece risco, divulgada pelo Banco de Portugal [O) dos factos assentes];
14. Em 13-6-2008 a ré enviou à autora uma carta a informar que o cheque acima descrito, apresentado à compensação de 4-6-2008 foi devolvido por falta de provisão [P) dos factos assentes];
15. Em 13-6-2008 a ré enviou à autora um aviso de lançamento, a informar o débito na conta da autora, n.º 0-3409668/000/001, do valor de 26,00€, relativo a 25,00€, despesas com notificação cheques devolvidos e 1,00€ de imposto de Selo sobre Despesas de Notificação (TGIS 17.2.4: 4%) [Q) dos factos assentes];
16. Em 23-6-2008 o mandatário da autora enviou uma carta ao administrador executivo da ré que constitui o documento junto com a petição inicial sob o n.º 10 [R) dos factos assentes];
17. Em 8-7-2008, a autora enviou uma carta ao Banco de Portugal a informar/justificar o ocorrido, a devolução do cheque e a postura do C..., inclusive por não ter enviado sequer nota de lançamento do valor de 13.000,00€, apesar de devida e solicitada, e a dar conhecimento da pendência de processo-crime [S) dos factos assentes];
18. Em 21-7-2008 a ré enviou uma carta à autora a comunicar a Rescisão da Convenção do Uso de Cheque, devendo a autora abster-se de emitir cheques sobre a Ré ou qualquer outra e devolver no prazo de 10 dias úteis os módulos de cheques fornecidos e não utilizados [T) dos factos assentes];
19. Mais informou que a conta de depósito podia ser movimentada utilizando qualquer meio de pagamento que viesse a ser disponibilizado pela Ré, nomeadamente talões de levantamento e cheques bancários e que a decisão de rescisão ia ser objecto de comunicação ao Banco de Portugal, sendo o nome da autora incluído na listagem de utilizadores de cheque que ofereçam risco [U) dos factos assentes];
20. Em 19-11-2008 a autora enviou nova carta à ré, desta vez, na pessoa do Presidente, com conhecimento de Comissão de Auditoria, onde reproduziu a carta anterior [V) dos factos assentes];
21. No início do mês de Dezembro foi contactada a autora e foi-lhe apresentado um documento para assinatura, com vista a que ser creditada a conta com o valor de 13.000,00€ [W) dos factos assentes];
22. Tal documento referia o seguinte:
"Minuta de declaração
D..., residente em ..., Ferreiros, titular do bilhete de identidade n.º 00000000 e representante da empresa F..., Lda., com sede social na morada supra-citada, declara, para os devidos efeitos, perante o Banco C..., SA., o seguinte:
Em 02/06/2008, a conta à ordem n.º 0-0000000.000.000, da empresa F... foi debitada pelo montante de 13.000 euros;
O referido débito resultou de uima transferência bancária ordenada por via electrónica (serviço C... Net), ou seja, mediante a utilização dos códigos deste serviço que me formam fornecidos pelo banco;
A transferência referida em b) não foi, no entanto, efectuada por mim, mas por terceiros, a quem, inadvertidamente, forneci os códigos de serviço de acesso ao C... Net;
d) A transferência referida em b) foi feita de forma abusiva, uma vez que não correspondeu à minha vontade, não assenta em instruções que tenha dado para o efeito e não decorre de qualquer obrigação que tenha sido por mim assumida no sentido da sua realização ou da realização de pagamento por mim devido:
e) Em virtude do referido na alínea anterior apresentei em (preencher com a data da participação) participação criminal contra incertos, à qual ficou a caber o número (preencher o número da participação) (cópia do documento em anexo).
f) Apesar de ter presente que o Banco não é responsável pela transferência acima descrita e pelos danos que para mim dela resultam solicitei ao Banco que procedesse à reversão da transferência em apreço e ao crédito na minha conta 0-3409668.000.001 do valor transferido,
g) Em dd/mm/aaaa, o Banco C... satisfez a solicitação referida na alínea anterior, tendo a minha conta sido creditada pelo valor de 13.000,00 euros.
Braga, (data) de Novembro de 2008” [X) dos factos assentes];
23. A representante da autora não assinou a minuta e comunicou esse facto à ré, tendo remetido carta de 9-12-2008, através de mandatário, que constitui o documento junto com a petição inicial sob o n.° 20 [Y) dos factos assentes];
24. A ré, por carta de 7-1-2009. respondeu que não detectara qualquer indício de falha de segurança no serviço homebanking, e que provavelmente houve uma apropriação abusiva das credenciais para acesso e utilização do citado serviço por meios e/ou expedientes que o Banco não era responsável, contudo, prezando a relação de confiança que a autora mantinha com a ré e que gostaria de ver preservada, aceitou que fosse efectuado o reembolso dos valores transferidos antes da conclusão do inquérito, acrescentando que o banco aceitava antecipar-se às conclusões dessa averiguação [Z) dos factos assentes];
25. Mas não admitiu rever o texto da referida minuta [AA) dos factos assentes];
26. No âmbito da actividade desenvolvida pela autora era frequente a mesma ter relações comerciais com empresas estrangeiras, mercado europeu e africano, principalmente com Angola (resposta ao facto 1º da base instrutória);
27. A autora mantinha relações comerciais regulares com um cliente, "G..., Lda" sediado em Luanda, movimentando os valores através da ré (resposta ao facto 2º da base instrutória);
28. Por tal motivo e em virtude das condições de segurança anunciadas pela ré, a autora aderiu ao serviço referido em 5º (resposta ao facto 3º da base instrutória);
29. Relativamente às informações de segurança sobre o C... NET, a ré divulga o seguinte:
"Segurança O BPI garante confidencialidade e segurança nas operações realizadas através dos seus canais de acesso directo, com o uso de Chaves de Acesso e Cartão Pessoal de Coordenadas, únicas no sistema, bem como pela utilização das mais sofisticadas tecnologias de encriptação de dados. Comunicação através da Internet - Para garantir um elevado nível de segurança na comunicação através da Internet, o C... desenvolveu uma infra-estrutura que utiliza tecnologia avançada - encriptação com chaves a 128 bits- a qual, fora dos Estados Unidos, só está disponível para Instituições Financeiras. Browsers aprovados - Os acessos estão limitados aos browsers que apresentem as normas mínimas de segurança e que suportem encriptação de dados a 12 bits. Em particular, só são permitidos Browsers que não gravem no disco rígido do computador a informação bancária, excepto com a sua aprovação explícita. Assim, o acesso a estes serviços deverá ser efectuado através dos Browsers Microsoft Internet Explorer (versão 6.0 ou superior), Netscape Navigator (versões 4.79, 6.2 e 7.0) e Mozilla Firefox (versão 2.0). FireWall - Para segurança da infra-estrutura do sistema do Banco, existe um Firewall que tem como função restringir o acesso a Clientes que utilizem o protocolo definido - protocolo HTTPS - ou, noutras palavras, que utilizem a linguagem aceite pelo sistema.
Monitorização permanente - O Banco dispõe de quadros especializados que têm como responsabilidade a monitorização permanente da utilização do C... Net, C... Directo, C... Net Mobile e C... Net SMS, para certificação da segurança do sistema" (resposta ao facto 4º da base instrutória);
30. No acto da assinatura do contrato, as duas gerentes da autora declararam tomar conhecimento integral de todas as disposições do mesmo (resposta ao facto 5º da base instrutória);
31. As outorgantes procederam à leitura do contrato previamente à sua assinatura e foi entregue à autora uma cópia assinada por ambas as partes (resposta aos factos 6º e 7º da base instrutória);
32. A autora, na pessoa das suas duas gerentes, compreendeu e inteirou-se do teor integral das cláusulas do contrato, sem que, até à data dos factos em causa, tenha suscitado qualquer tipo de dúvida, reserva ou incompreensão quanto ao mesmo contrato (resposta aos factos 8º e 9º da base instrutória);
33. O acesso à internet e serviço bancário, bem como à conta respectiva da autora, era feito através do serviço Telecom e da linha 253674418 (resposta ao facto 9º- A da base instrutória);
34. 10. A autora usou o sistema de pagamento para território nacional e estrangeiro, sempre em conformidade com a recomendação da ré e sem qualquer incidente (resposta aos factos 10º, 11º e 12º da base instrutória);
35. Em 30-05-2008, durante a tarde, a autora, na pessoa da sócia gerente D..., voltou a usar o referido serviço, seguindo as indicações da ré para o acesso, desta feita para consulta de movimentos e saldo (resposta aos factos 13º e 14º da base instrutória);
36. Pretendia saber se havia sido apresentado a pagamento o cheque emitido pela autora, no valor de 12.602,00€ (resposta ao facto 15º da base instrutória);
37. No dia 30-05-2008, quando a representante da autora executava as tarefas indicadas para acesso ao C... NET, foi-lhe exigido que fornecesse coordenadas (resposta aos factos 16º, 17º e 18º da base instrutória);
38. Introduziu as coordenadas pedidas, colocou o número correspondente e, após aceder ao serviço, D... efectuou consulta de movimentos bancários (resposta aos factos 19º, 20º e 21º da base instrutória);
39. No dia 3-6-2008, pelas 9.14 horas, D... efectuou contacto telefónico para o C... geral, a quem comunicou que havia constatado um débito na conta da autora de 13.000,00€,
pretendendo saber a que se devia (resposta aos factos 22º, 23º e 24º da base instrutória);
40. Pelos serviços da ré foi dito que iam fazer a transferência da chamada para o Balcão de Ferreiros, o que fizeram acto contínuo (resposta aos factos 25º e 26º da base instrutória);
41. A autora solicitou a informação pretendida e, pelas 10,13 horas, voltou a contactar o C..., para insistir pela informação (resposta ao facto 27º, 28º e 29º da base instrutória);
42. Por indicação telefónica do balcão de Ferreiros, às 12,07 horas foi efectuada chamada para o C... Directo iniciada pelo filho de D... e que esta prosseguiu, reportando-se ao movimento bancário aludido na resposta ao quesito 24 e solicitando ajuda (resposta aos factos 33º e 34º da base instrutória);
43. Como não recebera mais nenhum contacto do Banco, dirigiu-se à agência de Ferreiros, por volta das 13 horas, sabendo-se nessa altura que a conta destino dessa transferência na CGD correspondia ao NIB 000000000000000000000 (resposta aos factos 35º e 37º da base instrutória);
44. A Ana Bela dirigiu-se de seguida a uma agência da CGD e, explicando a situação, pediu para reterem o dinheiro, tendo sido então informada pelo funcionário da CGD que deveria ser o C... a tratar do assunto (resposta aos factos 38º e 39º da base instrutória);
45. Por volta das 14 horas dirigiu-se novamente à agência de Ferreiros da Ré, procurando saber porque motivos não diligenciavam junto da CGD para evitar a transferência efectiva do capital (resposta aos factos 40º e 41º da base instrutória);
46. Foi-lhe sempre comunicado que se estava a tratar do assunto e foi-lhe solicitada confirmação de não ter sido a sócia a fazer a operação, o que confirmou (resposta aos factos 42º, 43º e 44º da base instrutória);
47. Pelas 17 horas Ana Bela Fernandes recebeu contacto telefónico do C... NET, feito pelo Sr. H..., dando informação sobre a existência de página Web falsa, imitando a página de abertura do C... NET (resposta ao facto 45º da base instrutória);
48. D... foi questionada sobre se alguma vez fornecera coordenadas no acesso ao C... NET e a mesma insistiu que apenas ela e a sua sócia acedem e possuem as coordenadas para aceder à conta, reiterando que não efectuaram qualquer transferência (resposta aos factos 46º, 47º e 48º da base instrutória);
49. Na mesma altura indagou D... se ainda era possível bloquear a transferência efectiva do dinheiro, tendo-lhe sido dado a entender que esse dinheiro havia acabado de ser levantado (resposta aos factos 49º e 50º da base instrutória);
50. A operação referente à transferência não foi efectuada ou autorizada pela autora (resposta ao facto 52º da base instrutória);
51. A ré cancelou, então, tal serviço e coordenadas de acesso (resposta ao facto 53º da base instrutória);
52. O pedido de coordenadas no acesso ao C... NET é uma situação anormal e irregular (resposta aos factos 56º e 57º da base instrutória);
52.A (60). Na área de Segurança do site da ré, consta o link .......http://www.banco....ptl pagina.asp?s=l&a=40&opt=a (resposta ao facto 60º da base instrutória);
53. Com frequência a ré presta aos seus clientes e público em geral, esclarecimentos, boas práticas e instruções, relativas ao acesso e utilização das plataformas homebanking que o mesmo Banco ofereceu e oferece (resposta ao facto 61º da base instrutória);
54. Nos sites C... NET e BANCO C..., a ré publicou notícias sobre ataques mediante o envio de um e-mail com o objectivo de obter códigos de acesso e dados financeiros (resposta ao facto 62º da base instrutória);
55. Cessaram todos os pagamentos e débitos directos que até então eram realizados através da conta bancária (resposta ao facto 64º da base instrutória);
56. O "Banco Santander S.A." onde fora depositado o cheque n.º 000000000 debitou ao cliente da ré o valor de 277,04€, por despesas e comissão cobrada, respectivamente, de 25,00€ e 252,04€ (resposta ao facto 65º da base instrutória);
57. A autora deixou de ter meios para solver o seu compromisso e de pagar o dito cheque (resposta ao facto 66º da base instrutória);
58. Encontrando-se devedora à dita empresa do seu valor e das despesas bancárias que suportou de 277,04€ (resposta ao facto 67º da base instrutória);
59. Por força do sucedido, o cliente "G..." deixou de recorrer aos serviços da autora (resposta ao facto 68º da base instrutória);
60. A autora deixou de ter acesso ao crédito e de poder competir com as concorrentes, em virtude do nome se encontrar registado no Banco de Portugal (resposta ao facto 69º da base instrutória);
61. O não pagamento do referido cheque pôs em causa o nome da autora e a comunicação ao Banco de Portugal agravou tal situação (resposta aos factos 74º e 75º da base instrutória);
62. A ré recusou à autora e sócia gerente D... cheques avulsos e cartões de débito (resposta ao facto 76º da base instrutória);
63. A autora viu-se obrigada a comunicar aos clientes que estava inibida do uso de cheques (resposta ao facto 77º da base instrutória);

B) O DIREITO
A primeira questão consiste em saber se deve ser alterada a matéria de facto.
A recorrente considera que foram incorrectamente julgados os pontos constantes das respostas dadas aos artigos 14º, 16º, 17º 18º, 19º, 52º, 54º, 57º, 58º, 59º e 63º da base instrutória, alegando que atento o depoimento de parte da gerente da A. D..., à matéria dos quesitos 16º 19º, 54º, 57º, 58º, 59º e 63º, o depoimento de parte do representante do Banco apelante I..., à matéria dos quesitos 14º, 52º, 54º, o depoimento da testemunha J..., à matéria dos quesitos 16º, 17º 18º, 19º, 52º, 54º, 57º, 58º, 59º e 63º, o depoimento da testemunha L..., à matéria dos quesitos 16º, 17º 18º, 19º, 52º, 54º, 57º, 58º, 59º e 63º, todos entre si conjugados e concatenados, e cruzados reciprocamente com os documentos 1 a 31 juntos com a contestação do Banco ora apelante, bem como quanto às declarações gravadas da gerente da A. constante de registo fonográfico constante dos autos e reproduzido em sede de audiência de julgamento, aos mesmos impunha-se decisão diversa.

Tal como resulta do disposto no artigo 712º, nº 1, do CPC, a decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação nas seguintes situações: a) se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa ou se, tendo ocorrido gravação dos depoimentos prestados, tiver sido impugnada, nos termos do artigo 685º-B, a decisão com base neles proferida; b) se os elementos fornecidos pelo processo impuserem decisão diversa, insusceptível de ser destruída por quaisquer outras provas; (…)».
As alterações que a recorrente propugna filiam-se nas citadas alíneas a) e b).
Dispõe, por sua vez, o nº 1 do artigo 685º-B que “quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida”.
Considerando o corpo das alegações e as suas conclusões, pode-se dizer que a recorrente cumpriu formalmente os ónus impostos pelo nº 1 do artº 685-B do CPC, tendo em conta que o que realmente importa “é que, de maneira clara, haja indicação dos concretos meios de prova e, se testemunhal, a identificação das testemunhas e também a inequívoca indicação dos pontos de facto que se pretendem ver reapreciados”, cfr. Ac.STJ de 23.2.2010 in www.dgsi.pt.
A apelante, no caso, indica os concretos pontos da materialidade fáctica que considera erradamente julgados, com referência ao que foi decidido na sentença recorrida e refere os concretos meios de prova que, na sua óptica, impunham decisão diversa, de modo satisfatório.

Quanto à questão da alteração da matéria de facto face à incorrecta avaliação da prova testemunhal, cabe a esta Relação, ao abrigo dos poderes conferidos por aquele artº 712, referido e, enquanto tribunal de 2ª instância, reapreciar, não apenas, se a convicção expressa pelo tribunal “a quo” tem suporte razoável naquilo que a gravação da prova e os restantes elementos constantes dos autos revelam, mas também, avaliar e valorar (de acordo com o princípio da livre convicção) toda a prova produzida nos autos em termos de formar a sua própria convicção relativamente aos concretos pontos da matéria de facto objecto de impugnação, modificando a decisão de facto se, relativamente aos mesmos, tiver formado uma convicção segura da existência de erro de julgamento da matéria de facto. Em relação a este aspecto, a jurisprudência tem vindo a evoluir no sentido de se formar um entendimento mais abrangente no que se refere aos poderes de alteração da matéria de facto pela Relação, considerando-os com a mesma amplitude que a dos tribunais de 1ª instância. Nessa medida e, no que respeita à questão da convicção, já não estará em causa cingir, apenas, a sua actividade de apreciação ao apuramento da razoabilidade da convicção do julgador da 1ª instância, mas, antes, formar a sua própria convicção nos elementos probatórios disponíveis nos autos, cfr. entre outros, Ac. STJ de 16.12.2010, acessível no lugar da internet supra referido.
No entanto, pese embora isso, deve ter-se sempre presente que o sistema legal, tal como está consagrado, com recurso à gravação sonora dos meios probatórios oralmente produzidos, não assegura a fixação de todos os elementos susceptíveis de condicionar ou influenciar a convicção do julgador perante o qual foram produzidos os depoimentos em causa, sofrendo a apreciação da matéria de facto pela Relação, naturalmente, a limitação que a inexistência da imediação, de forma necessária, acarreta.
Os depoimentos de que a Relação dispõe, que pode, apenas, ouvir, não são susceptíveis de transmitir tudo aquilo que determinou a convicção do julgador da 1ª instância, perante o qual os mesmos foram prestados. Isto, porque os depoimentos não são apenas palavras, por vezes os silêncios da testemunha e toda a expressão corporal da mesma, que não são possíveis ouvir na gravação, de que dispõe a Relação, podem valer mais para formar a convicção do tribunal do que o depoimento uníssono de todas as outras. Uma coisa é aquilo que as testemunhas dizem e outra, muito diferente é o valor daquilo que dizem, aferido por tudo o que se observa a nível do comportamento das mesmas enquanto o dizem. Os depoimentos das testemunhas têm de se valorar caso a caso, no contexto em que se inserem, e tendo em conta a razão de ciência que invocam e a sua razoabilidade face à lógica, à razão, às máximas da experiência e aos conhecimentos científicos.
Assim, porque privado do contacto directo com as provas (princípio da imediação), ao Tribunal da 2ª instância escapa, necessariamente, muita coisa, por dispor apenas do registo sonoro do que foi dito.
Na realidade, existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas poderão ser apreendidos, interiorizados e valorados, por quem os presencia directamente, e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção do julgador.
Como refere Abrantes Geraldes, in “Temas da Reforma do Processo Civil, II Vol.(3ª ed. revista e ampliada), pág. 273, nota 433, citando Eurico Lopes Cardoso, “os depoimentos não são só palavras, nem o seu valor pode ser medido apenas pelo tom em que foram proferidas. Todos sabemos que a palavra é só um meio de exprimir o pensamento e que, por vezes, é um meio de ocultar. A mímica e todo o aspecto exterior do depoente influem, quase tanto como as suas palavras, no crédito a prestar-lhe. O magistrado experiente sabe tirar partido desses elementos intraduzíveis e subtis. Nisto consiste a sua arte. As próprias reacções quase imperceptíveis do auditório se vão acumulando no espírito do julgador, ávido de verdade, e vão formar uma convicção cujos motivos lhe será muitas vezes impossível explicar.”.

Não obstante, como dissemos, as Relações têm “a mesma amplitude de poderes que tem a 1ª instância, devendo proceder à audição dos depoimentos e fazer incidir as regras da experiência, como efectiva garantia de um segundo grau de jurisdição”. E quando um Tribunal de 2.ª instância, ao reapreciar a prova ali produzida, a valora de acordo com o princípio da livre convicção (a que também está adstrito) e consegue formar “relativamente aos concretos pontos impugnados, uma convicção segura acerca da existência de erro de julgamento da matéria de facto, deve proceder à modificação da decisão, fazendo jus ao reforço dos poderes que lhe foram atribuídos enquanto tribunal de instância que garante um segundo grau de jurisdição.”, cfr., novamente, Abrantes Geraldes, in “Recursos em Processo Civil - Novo Regime”, 2010, págs. 315 a 322, Amâncio Ferreira, in “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 9ª ed., pág. 227, e Acs. do STJ de 01.07.2008 e de 28.05.2009, acessíveis in www.dgsi.pt.

Tecidas estas considerações, avancemos na análise do recurso, analisando se na parte impugnada, a referida análise crítica corresponde à realidade dos factos ou se a matéria merece, ser alterada nos termos pugnados pela apelante, por ter havido manifesto erro na apreciação das provas.
Têm a seguinte redacção os pontos objecto de discórdia:
Quesito 14 - Seguindo as indicações da ré para o acesso, desta feita para consulta de movimentos e saldo?
Resposta dada - Provado
Resposta pretendida - Não Provado
Quesito16 - Abriu o seu navegador, Internet Explorer (da Microsoft) e, colocando no campo da ligação, www.banco....pt, apareceu a página habitual do C..., na qual, no sítio nela referenciado, C... NET, digitou o seu número de cliente (nome acesso) e código secreto de utilizador?
Quesito 17 - O acesso foi-lhe negado?
Quesito 18 - Introduziu os mesmos dados pela segunda vez e nessa altura foi-lhe solicitado o número que se encontrava no cartão matriz na posição “A9”?
Resposta dada - Provado apenas que no dia 30-5-2008 quando a representante da autora executava as tarefas indicadas para acesso ao C... NET foi-lhe exigido que fornecesse coordenadas;
Resposta pretendida - Provado que no dia 30-5-2008 quando a representante da autora executava as tarefas indicadas para acesso ao C... NET foi-lhe exigido que fornecesse a coordenada A9, numa página similar à do C... NET.
Quesito 19 - Introduziu as coordenadas pedidas e colocou o número correspondente?
Resposta dada - Provado com referência à resposta dada aos Quesitos 16 a 18;
Resposta pretendida - Provado.
Quesito 52 - A operação referente à transferência em questão tinha a descrição de Pagamento Serviços Auto, serviço, pessoa ou entidade desconhecida da autora?
Resposta dada - Provado apenas que a operação referente à transferência não foi efectuada ou autorizada pela autora.
Resposta pretendida - Provado que a operação referente à transferência foi autorizada pela autora, nos termos das respostas dadas aos quesitos 16 a 19.
Quesito 54 - Quando a gerente da autora alertou a ré a transferência já tinha sido enviada para a SIBS e já se encontrava creditada na conta de destino na CGD?
Resposta dada - Não Provado
Resposta pretendida - Provado
Quesito 57 - Por tal motivo, a autora deveria ter reportado à ré de imediato e com cariz de urgência?
Resposta dada - Provado apenas o que consta da resposta ao quesito 56
Resposta pretendida - Provado
Quesito 58 - A página em que a gerente da autora fornecera as coordenadas não é do C... NET?
Resposta dada - Não Provado
Resposta pretendida - Provado
Quesito 59 - Mas antes uma página da total responsabilidade de terceiros?
Resposta dada - Não Provado
Resposta pretendida - Provado
Quesito 63 - A autora foi vítima de um desse tipo de ataques conhecido por “phishing”?
Resposta dada - Não Provado
Resposta pretendida - Provado

Comecemos por transcrever, em síntese, o modo como a Mª Juíza “a quo” fundamentou a douta decisão de facto e, concretamente, nos pontos objecto de impugnação:
“… As respostas dadas à matéria de facto da base instrutória basearam-se na análise do conjunto da prova documental e testemunhal, com recurso às regras de experiência comum e normalidade.
Assim, quanto à matéria atinente ao contrato e às informações da ré sobre o serviço e segurança, atendeu-se ao teor dos documentos juntos com a petição inicial e com a contestação, resultando do depoimento da testemunha Nuno Martins que não foi reportada qualquer duvida sobre as clausulas contratuais.
Relativamente aos acessos ao C... NET no dia 30-5-2008 considerou-se o teor dos documentos juntos com a contestação, tendo-se em conta o que foi admitido pela ré em sede de articulados (cfr. artigos 36 e 105 contestação), não se tendo produzido outros meios de prova, uma vez que a prova testemunhal, nomeadamente o filho e marido da representante da autora, M... e N..., e os funcionários da ré, J... e L..., não revelaram conhecimento directo sobre a matéria, nada acrescentando o depoimento prestado por D..., visto que não foi produzida confissão.
No que concerne aos contactos telefónicos estabelecidos entre as parte considerou-se o teor das gravações e o registo escrito apresentado pela ré.
Quanto à operação bancária em causa nos autos, valorou-se o teor dos talões juntos com a petição inicial e os registos de movimentação da conta juntos com a contestação. Mais se ponderou a prova testemunhal, nomeadamente o depoimento de J... e L..., considerando-se insuficiente tal meio de prova para, por si só, sustentar a matéria de facto invocada pela ré, sem apoio documental ou comprovação pericial.
Igualmente se constatou a ausência de prova documental de diligências encetadas pela ré no sentido de evitar a concretização final da operação bancária, considerando-se insuficientes e imprecisos, quanto à mesma matéria, os depoimentos das testemunhas O..., P... e Q....
Relativamente às diligências encetadas pela representante da autora atendeu-se à prova testemunhal, nomeadamente ao depoimento de M... e N..., na medida em que narraram o acompanhamento que fizeram da situação, relatando o marido de D... que acompanhou a mesma até à CGD, embora tivesse ficado no exterior, por virtude de dificuldade de estacionamento, regressando de novo à agência do C....
Ponderou-se também o depoimento de N... quanto à actividade desenvolvida pela autora e os prejuízos decorrentes da operação bancária em causa, em conjugação com os documentos juntos com a petição inicial e as regras da normalidade e experiência comum.”

Atenta a nossa total concordância com esta decisão, tornar-se-ía desnecessário consignar, aqui, qualquer síntese, da nossa própria apreensão após a audição dos depoimentos e análise dos documentos e registos constantes dos autos a que a apelante alude.
Fazemo-lo, apenas, para rebater as conclusões da recorrente e reforçar a falta de razão que lhe assiste ao pôr em causa a apreciação da prova feita pelo Tribunal recorrido.
Depois de ouvirmos integralmente os depoimentos de parte dos representantes da A. e da R. e de todas as testemunhas inquiridas nas diversas sessões da audiência de julgamento que teve lugar no âmbito desta acção e, não apenas, aqueles que a apelante considera cruciais para fundamentar a sua pretensão, ficámos plenamente convencidos que a Mª Juíza “a quo” os apreciou correctamente, foi uma Juíza activa durante a produção da prova, colocando as questões que teve por pertinentes e fundadas, demonstrando um especial interesse ao longo de todo o julgamento, no sentido de se inteirar em pormenor das questões colocadas, atenta a especificidade das mesmas, no esforço sentido de tentar compreender como terá acontecido e, não nos subsistem dúvidas que apreciou convenientemente toda a prova produzida, conjugando-a e complementando-a entre si e, tendo em atenção as regras da normalidade e da experiência comum.
Como é evidente, não podendo formular qualquer convicção sobre os factos, em relação aos quais não foi feita qualquer prova ou prova segura e credível, nomeadamente, documental ou até como referido na decisão recorrida comprovação pericial.
Ficámos, plenamente, convencidos que nem os depoimentos de parte e testemunhais, nem os concretos documentos e registos a que a recorrente alude, em sede de impugnação, foram desvalorizados ou erradamente apreciados.
Ao contrário, é nossa convicção que foi feita uma minuciosa e acertada apreciação dos mesmos.
Da sua análise não resulta outra convicção que não seja a que se formou no Tribunal recorrido.
Os meios de prova a que a apelante se refere, nesta sede, como susceptíveis de imporem uma decisão diversa daquela que foi proferida, salvo o devido respeito, não têm essa virtualidade.
Os mesmos não são suficientes e credíveis de modo a alterar as respostas positivas e restritivas que foram dadas aos quesitos 14º, 16º, 17º, 18º, 19º, 52º e 57º, nem de modo algum a responder de modo positivo aos quesitos 54º, 58º, 59º e 63º, estes cuja prova, essencialmente, seria documental ou pericial é, também, nossa convicção, que não foi produzida qualquer prova quanto aos mesmos.
Tal como decidiu o Tribunal recorrido é nossa convicção que na ausência de prova documental ou pericial que tivesse apurado a verificação do que efectivamente aconteceu, estes referidos quesitos não podem de modo algum ser respondidos de forma positiva, já que os depoimentos produzidos a respeito, nada afirmam de concreto, todos se baseiam em suposições do que terá acontecido, mas sem a certeza exigível para que se possa dar por provado que a página a que a gerente da A. acedeu e onde lhe foi exigido que fornecesse coordenadas não era do C… NET, mas uma página da total responsabilidade de terceiros, nem tão pouco que se tratasse de qualquer tipo de ataque conhecido por “phishing”.
De igual modo, não se provou que, quando a gerente da autora alertou a ré a transferência já tinha sido enviada para a SIBS e já se encontrava creditada na conta de destino na CGD. Sobre as dúvidas que ficaram quanto a esta questão, basta ter-se em atenção os depoimentos das testemunhas da A., o seu filho e o seu marido, que apesar de não a terem acompanhado pessoalmente junto do balcão, acompanharam-na, efectuando telefonemas o primeiro e o segundo deslocando-se de carro com a mesma, quer ao balcão do C… em Ferreiros, quer ao balcão da CGD, presenciando a ansiedade da gerente da A., ainda que não tivessem conhecimento directo e presencial do que se estava a passar, nas conversas travadas entre a gerente da A. e os funcionários do banco e da CGD.
Nem tal seria possível, sob pena de contradição com os factos assentes 47 a 49, de onde se conclui que quando a A. alertou a R., na manhã de dia 3 teria sido possível à R. travar a concretização daquela transferência, já que o dinheiro só por volta das 17 h foi levantado.
Acrescendo que, os depoimentos das testemunhas da R., que à data trabalhavam no balcão, o gerente P…, nada soube esclarecer a este respeito, referindo que não teve contacto directo com a empresa nem falou pessoalmente nem por telefone com a gerente da A.. Disse que o Sr. Q… e a Dr.ª O… é que estavam a tratar do assunto. De concreto nada sabe, as respostas que deu a este propósito foram no sentido de “admito que se a transferência tivesse sido feita até às 11h da manhã do dia 2, naquele dia 3 já estivesse efectuada”, mais disse que pensa que o balcão terá falado à D… para ela ir ver à CGD se conseguia travar a situação, achando normal que isso tenha acontecido.
De seguida, a testemunha Q…, que segundo a anterior terá sido quem tratou do assunto com a gerente da A., também, a este propósito nada esclareceu, revelando pouco se recordar sobre o assunto, não sabendo como tomou conhecimento da situação se foi por telefone se foi directamente pela gerente da A., nada dizendo com certeza, referindo a determinado momento: “…tenho a ideia, mas não me recordo, eu acho, não sei, tenho a dúvida, se foi ao balcão ou por telefone…”, dizendo, ainda, para justificar a falta de lembrança que revelou ter sobre o caso, que tinha guardado tudo o que foi feito de importante neste processo, mas já não dispõe desse arquivo.
Já a testemunha O…, também, pouco ou nada esclareceu sobre esta questão, referindo que a D… a meio da manhã telefonou para o banco a dizer que havia um movimento na conta no dia anterior que ela não reconhecia, que tinha visto numa caixa multibanco e, face a isso diz: “Avisei os serviços internos a dizer que tinha havido um movimento naquela conta que a cliente não conhecia e, passado uma hora dei-lhe a indicação para ela bloquear o acesso à conta através da internet, a minha intervenção cessou desde aquele dia 3 de Junho por volta das 11 h, depois do telefonema e passei a situação para o responsável do balcão”.
Face aos depoimentos que antecedem, não há dúvidas que a resposta a dar ao quesito 54, só podia ser não provado e, contrariamente ao que defende a recorrente os depoimentos das testemunhas J… e L…, não depuseram de modo a que aquele pudesse ser dado como provado, bem pelo contrário, nenhuma delas trabalhavam à data dos factos na área de segurança do BPI, tendo ocupado os cargos que actualmente desempenham depois daquela, não revelando por isso qualquer conhecimento directo que, eventualmente, seriam do conhecimento dos seus antecessores mas que não foram indicados como testemunhas.
A testemunha J… disse que não teve intervenção directa, no momento, depois teve acesso ao processo e disse só estar na área de segurança do BPI desde Julho de 2008. Refere, a propósito, que no dia 2 de Junho há uma transferência para a CGD às 12h34. Ora daqui, se não fica a certeza, resulta pelo menos a dúvida, atento o referido pela testemunha P…, que no dia 3 quando a gerente da A. contactou o banco (C…), antes das 11h da manhã, atento o depoimento da testemunha O… e conforme resulta dos factos assentes 39 e ss., a transferência ainda não estava efectuada, pois que a mesma só tinha ocorrido às 12h34 do dia 2 para a CGD e não até às 11h, hora que o gerente do balcão, P…, admitia que tivesse sido feita para já estar concretizada naquele dia 3.
Por sua vez, a testemunha L…, responsável pela segurança informática no banco (BPI) desde Junho de 2009, referiu que só teve conhecimento deste assunto quando foi contactado para ser testemunha e viu o processo, dizendo que em 2008 a pessoa que era responsável pela segurança não está indicada como testemunha.
Esclareceu que não lhe passou rigorosamente nada pelas mãos e, no mais, baseou o seu depoimento em hipóteses sobre o que poderá ter acontecido. Disse: “…houve acessos à conta por meios não normais, referindo que já no dia anterior eles tentaram uma transferência. A cliente terá colocado a coordenada. O normal no phishing não é pedir uma só coordenada, mas pedir as coordenadas todas, esclarecendo que o software malicioso é instalado no computador do cliente e este fica infectado, a pessoa que fornece esses elementos, na sua boa-fé fornece-os convencida que está a fornecê-los ao banco”.
Pensa que isto pode ter acontecido com o computador da cliente, mas disse não ter feito nenhuma análise ao mesmo.
Donde se constata que, este depoimento, quanto aos restantes quesitos cujas respostas foram impugnados, respeitantes ao modo como terá ocorrido o acesso feito pela gerente da A. ao C… NET no dia 30 de Maio, também não revelou conhecimento sobre esses factos de modo a formular-se uma convicção segura sobre os mesmos.
O mesmo acontece, neste aspecto, com o depoimento da testemunha R…, a qual, também, não revelou ter qualquer conhecimento concreto, disse: “…penso, se bem me recordo, que a D… disse que terá fornecido a coordenada A9 duas vezes por volta do dia 30 e, julgo que a captura terá acontecido nesse dia, provavelmente terá sido um caso de phishing”.
Após audição dos depoimentos, que em síntese, se transcreveram, concordamos integralmente com a decisão recorrida, quando refere que estes depoimentos, não revelaram conhecimento directo sobre a matéria e o depoimento prestado por D… nada acrescentou visto que não foi produzida confissão.
De igual modo, não é perceptível o entendimento da apelante quando defende que o depoimento de parte do representante da R., I… impunha que fosse dada aos quesitos 14º, 52º e 54º resposta diversa daquela que lhe foi dada, uma vez que através do seu depoimento não foi produzida confissão, conforme constatámos do seu depoimento e já se verificava da análise da acta de audiência de dia 30 de Março de 2012, uma vez que não existia qualquer redução a escrito do mesmo, o que teria que ter ocorrido, caso tivesse havido confissão, cfr. artº 563, do CPC.
É certo como refere a decisão recorrida que os depoimentos prestados não foram suficientes para dar por provada a matéria impugnada, acrescendo que os mesmos se encontram desacompanhados de qualquer outra prova convincente, nomeadamente documental.
Não se vislumbra que tenha havido qualquer erro de julgamento quanto aos pontos da matéria de facto impugnada, nem tão pouco se vislumbra, atenta a análise que fizemos e o que deixámos exposto que os concretos meios de prova indicados pela apelante para suportar a sua pretensão tenham tido a virtualidade de impor outra decisão diversa da que foi proferida.

Em termos de conclusão, no que à operação bancária em causa respeita, tudo parece indicar que a apelada terá acedido a uma página Web falsa a imitar a página de abertura do C… NET (veja-se, nomeadamente o ponto 47 da matéria assente) onde terá introduzido dados necessários de acesso à conta bancária, a qual vinha utilizando desse modo, com regularidade desde 2004. Referindo o representante da R., no seu depoimento que, apesar de não saber como a gerente da A. utilizou o sistema naquele dia 30, nada existia que denunciasse que a mesma “até à data não tenha utilizado o sistema do modo que mandamos utilizar”.
Que o tenha feito de modo diferente, naquele preciso dia 30, não o confessou a gerente da A., nem logrou a Ré provar que isso tenha acontecido, aliás o contrário resulta da resposta positiva dada ao quesito 14, que julgamos acertada.
Uma das hipóteses, de entre as várias que se colocaram como possíveis, é a possibilidade, uma vez que não se apurou quantas coordenadas a A. forneceu, se apenas uma ou várias, uma vez que apenas se provou que lhe foi exigido que fornecesse coordenadas, e estando assente que a mesma no dia 30 acedeu por duas vezes à conta, supostamente, pode ter acontecido que estivesse a aceder a um site falso e tivesse fornecido a este os dados de acesso à conta, convencida que estava a interagir com o próprio Banco (BPI).
Aliás, isso é referido pela gerente da A. no seu depoimento, quando diz: “No dia 30 o que me pediram foi o normal, a página era igualzinha à do BPI, sem tirar nem pôr, igualzinha. Soube mais tarde que era uma página falsa. Dei o que me pediram, porque pensei que era para certificar toda a segurança, dei a matriz, acedi e estava tudo correcto. Achei normal, porque como a primeira vez me negaram o acesso, eu pensei que o que me pediram era para certificar toda a segurança e o que me pediram dei e tive imediatamente acesso”.
É nossa convicção que não é possível atribuir qualquer falta de diligência à actuação da A. perante a forma que a mesma descreve que efectuou o acesso, aliás o depoimento do actual responsável pela segurança informática do banco, L…, é no sentido de admitir que pudesse existir software malicioso no computador do cliente, sendo involuntário da parte do mesmo, este ser infectado e, aí diz ele “a pessoa que fornece esses elementos na sua boa fé fornece-os convencida que está a fornecê-los ao banco. Acresce, a este propósito o depoimento do próprio representante da R., I…, o qual disse: “podem enviar um vírus para o computador do cliente e captam a informação à cabeça, através de páginas falsas. Disse mais, temos uma equipa cuja função é monotorizar estes canais, esta equipa está sempre a tentar captar as novas técnicas dos hackers”.
Este depoimento é bem elucidativo de que o sistema é falível e não é totalmente seguro para o cliente, nem para a própria instituição bancária, tendo o mesmo dito, também que “o banco já teve outras situações além desta”.
E, assim sendo, atenta a ausência de culpa por parte da A. e o referido nestes depoimentos, faz todo o sentido o apelo nesta sede ao bem fundamentado da decisão recorrida quando cita o Ac. da RL de 24.5.2012, acessível in www.dgsi.pt na parte em que refere: “…o acesso online fraudulento aos depósitos bancários conhece uma sofisticação e actualização permanentes, que exigem das instituições de crédito um esforço continuado naquele domínio, ao menos enquanto persistirem em apresentar-se como guardiãs confiáveis dos valores que lhes são entregues, no pressuposto de assim ficar garantida a salvaguarda daqueles.”.
E, se as próprias instituições bancárias são vítimas destes ataques que têm sistemas de segurança e especialistas a trabalhar, permanentemente, para detectar os avanços sofisticados dos sibernautas e, ainda assim, não o conseguem evitar, como é possível exigir ao cliente que o faça quando sabemos que estes sites aparecem na maioria das vezes como idênticos aos originais através de ligação de segurança e com URL muito similar.
Pois, como é sabido, as páginas Web falsas construídas com o propósito de se apropriarem de dados de acesso a contas bancárias são, muitas vezes, exactamente iguais às páginas do banco e identificadas como ligações seguras. Existem diversas técnicas conhecidas que o fazem: “phishing”, “web based delivery”, “instante messaging”, “link manipulation”, “website forgery”, etc.
Até pessoas com conhecimentos técnicos avançados podem ser ludibriados por estas técnicas. Em termos de aspecto, as páginas falsas são altamente credíveis.
Lembre-se aqui de novo o que foi dito pela testemunha Mário Fernandes que confirma isto mesmo.
De entre aquelas técnicas referidas, a propósito de “phishing” veja-se o site http://pt.wikipedia.org/wiki/Phishing, onde se lê: “Em computação, phishing, termo oriundo do inglês (fishing) que quer dizer pesca, é uma forma de fraude eletrônica, caracterizada por tentativas de adquirir dados pessoais de diversos tipos; senhas, dados financeiros como número de cartões de crédito e outros dados pessoais. O ato consiste em um fraudador se fazer passar por uma pessoa ou empresa confiável enviando uma comunicação eletrônica oficial. Isto ocorre de várias maneiras, principalmente por email, mensagem instantânea, SMS, dentre outros. Como o nome propõe (Phishing), é uma tentativa de um fraudador tentar "pescar" informações pessoais de usuários desavisados ou inexperientes.”.

Assim é, nossa convicção que não se apurou, de entre as técnicas de fraude referidas, o modo como aconteceu aquela transferência da conta da A..
No entanto, dúvidas não se suscitam que a mesma não foi por si efectuada nem ela a autorizou.
Perante o que se apurou, é possível admitir que tenha ocorrido uma situação idêntica, àquelas que usualmente são designadas de “phishing”, (atento o que esta significa nos termos que deixámos transcrito) mas, como referido na decisão recorrida, por ausência de prova documental que suporte essa possibilidade, não pode a mesma ser dada por assente, até porque como vimos as técnicas utilizadas pelos hackers são diversas e, em permanente evolução e sofisticação.
Concordamos assim, inteiramente, com as respostas restritivas e negativas que foram dadas aos quesitos 52º, 58º, 59º e 63º e, concordamos com a resposta dada ao quesito 14º, uma vez que é, também nossa convicção que a gerente da autora, no dia 30 de Maio de 2008, fez os acessos em causa seguindo as indicações da ré, do modo que o tinha feito até aí e sem qualquer suspeita de que a página a que acedeu não fosse, eventualmente, do C….

Em suma, a resposta de não provados dada aos quesitos impugnados, mostra-se acertada, já que não foi feita prova credível e convincente quanto aos mesmos para puderem ser dados como provados, evidenciando-se, aqui, o quesito 54º, no que respeita à questão de a R. ter feito todas as diligências que poderia ter desenvolvido para travar a efectivação da transferência. Pois, como referiu a decisão recorrida a “imprecisão” dos depoimentos das testemunhas O..., P... e Q..., acrescentando nós, falta de lembrança e desconhecimento, sobre o que aconteceu no dia 3 de Junho, não nos deixam dúvidas que, a R. não logrou demonstrar que fez todas as diligências ao seu alcance no sentido de evitar a concretização final da operação bancária, nem provou que quando a gerente da A. a alertou a transferência já tinha sido enviada para a SIBS e já se encontrava creditada na conta de destino na CGD, pelo que acertada a resposta de “não provado” dada ao quesito 54º.
Salvo o devido respeito, é clara a falta de razão da recorrente, quando refere que o douto Tribunal errou, nestes pontos da decisão da matéria de facto, na apreciação que fez da prova.
Não podemos, de modo algum, corroborar esta conclusão.
O despacho que fundamentou aquela decisão reflecte a postura interventiva que a Mª Juíza “a quo”, revelou ao longo de todo o julgamento, o maior interesse e cuidado em se esclarecer, colocando as questões pertinentes, que sentia necessidade de ver esclarecidas, sendo disso notório o modo como conduziu o interrogatório feito às testemunhas, de modo a formar uma convicção correcta e segura que lhe permitisse decidir, com rigor e de modo fundamentado, as questões suscitadas, o que, em nosso entender, conseguiu fazer, de forma subsistente e convincente como espelha a decisão recorrida.
É por demais evidente que, o tribunal “a quo”, na pessoa da Mª Juíza julgadora, não se limitou a identificar os meios de prova em que baseou a sua convicção positiva ou negativa, especificou com clareza a razão de ser daquela sua convicção, que de modo empenhado formou através da análise de toda a prova recolhida para os autos.
Pelo que, quanto a todas as respostas dadas aos quesitos impugnados subscrevemos a decisão recorrida, sendo nossa convicção que lhes foi dada a resposta correcta.
Não coincidente foi a convicção da recorrente, a qual, como é evidente, não subscrevemos, como já dito.

Resulta assim do exposto, que não se vislumbra, pela análise das provas produzidas, que agora fizemos e deixámos explicada, qualquer erro de apreciação e julgamento em matéria de facto ou prova que imponha factos diferentes daqueles que foram dados como provados e não provados, nem qualquer desconsideração da prova testemunhal e documental produzida, mas sim uma correcta apreciação dessa prova, não se patenteando a inobservância de regras de experiência ou lógica, que imponham entendimento diverso do acolhido.
Improcede, por isso, a pretensão da apelante quanto à alteração da matéria de facto apurada em 1ª instância, que se mantém e, consequentemente, as conclusões 1 e 2.

Mantendo-se a decisão do tribunal “a quo” quanto à matéria de facto dada como provada e não provada, nenhuma censura há, de igual modo, a fazer à sentença recorrida, onde foi feita, correcta e com a profundidade devida, a subsunção dos factos ao direito, acrescendo que, a resposta negativa que foi definitivamente dada àquela matéria constante da impugnação da recorrente acarreta, necessariamente, como bem foi decidido a procedência parcial da acção, com a, consequente, condenação da ré, nos termos proferidos na decisão recorrida que se mantém na íntegra e, para onde remetemos, nos termos do disposto no artº 713, nº 6, do CPC.

Diga-se, apenas, pese embora o que já deixámos expresso quanto à nossa concordância quanto ao desfecho parcial do pedido, para rebater a falta de razão da argumentação da recorrente expressa nas conclusões 3 e ss. da sua alegação, oferece-nos dizer o seguinte.
Não se discute que entre as partes foi estabelecida uma “relação contratual bancária” que se iniciou com o “contrato de abertura de conta” à ordem nº 0-3409668.
Relação esta que se caracteriza, segundo Engrácia Antunes in “Direito dos Contratos Comerciais”, 2009, págs. 484, 486 e 487, “por ser uma relação económico-social e jurídica duradoura (destinada a prolongar-se no tempo) e multifacetada (consubstanciada numa pluralidade de negócios jurídicos individuais e subsequentes) que é estabelecida entre um banco e o respectivo cliente”, a qual, tendo como ponto de partida o referido contrato de conta bancária, “apenas ganhará sentido económico e densidade negocial através da celebração futura e sequencial dos diferentes contratos bancários especiais”, renovando-se “sucessivamente mediante a movimentação da conta”.
Na sequência daquele estabeceram as partes, logo na mesma data, 20.07.2004, um outro contrato denominado “C... Directo/C... Net – Contrato de Adesão, cfr. consta dos pontos 3 e 5 da matéria assente.
Esta relação estabelecida entre as partes desenvolveu-se normalmente, desde aquela data até 30.05.2008, a A. utilizou com regularidade no seu escritório aquele serviço, que a autora, supra referida, designa como os contratos “simplesmente eventuais”, no caso, um contrato de homebanking .
Acontece que no dia 02.06.2008, a gerente da A., numa caixa ATM, verificou que tinha sido retirada daquela conta a quantia de € 13.000.00, operação que não foi efectuada ou autorizada pela autora, cfr. factos assentes 9 e 50.
Devido àquela transferência e às consequências advindas da mesma, alegou a A. ter sofrido prejuízos cuja ressarcibilidade peticionou através desta acção intentada contra a R..
A decisão recorrida deu parcial acolhimento à pretensão da A., considerando que a R. se constituiu na obrigação de indemnizá-la pelos prejuízos que a mesma sofreu devido àquela transferência efectuada da sua conta sem a sua autorização.
A recorrente discorda alegando que qualquer presunção de culpa que a onerasse se encontra ilidida e porque a vulnerabilidade verificada, ocorreu no computador da apelada e não em qualquer sistema informático do próprio Banco apelante ou por si dominado, não colhe o argumento subsidiário da responsabilidade pelo risco, relativamente ao depósito bancário, precisamente porquanto inexistiu qualquer extravio ou dissipação da quantia depositada na referida conta bancária, ocorreu sim o fornecimento, por culpa própria da apelada, das credenciais de acesso e movimentação da sua conta bancária, consubstanciando a mesma utilização negligente das prerrogativas operacionais cometidas pelo contrato de homebanking celebrado.
Ora, salvo o devido respeito, não lhe assiste qualquer razão.
Pois, como resulta das conclusões 3 e ss. da sua alegação, a recorrente insurge-se contra a decisão recorrida, com fundamento em factos que definitivamente não se deram por provados e com o argumento de considerar que não pode ser responsabilizada, “por qualquer intromissão fraudulenta no computador do cliente”.
No entanto, não poderia a mesma estar mais despida de razão, primeiro porque se baseia em factos que não ficaram assentes e segundo porque o homebanking pressupõe acesso através de computadores pessoais.
Como é sabido, através do contrato, designado “homebanking”, o banco disponibiliza ao cliente um serviço através do qual lhe confere a possibilidade de estabelecer relações com o banco consistentes, designadamente, na aquisição de serviços, realização de consultas e de operações bancárias relativamente às contas de que ele seja o único titular ou co-titular em regime de solidariedade, e que possa livremente movimentar, utilizando para o efeito telefone (serviço telefónico) ou internet (serviço on-line). Sendo, como não poderia deixar de ser, pressuposto deste serviço a utilização de computadores pessoais e não do banco.
Depois, não assiste qualquer razão à recorrente, porque não se apurou qualquer facto susceptível de imputar à A. o que aconteceu, do mesmo modo que não se provou que não tenha existido qualquer quebra de segurança no site “bpinet”.
Como bem se decidiu na sentença recorrida e, que com a devida vénia do seu subscritor, aqui transcrevemos, por estarmos inteiramente de acordo com o ali decidido, “um dos motivos que levou a autora a aderir a este serviço de “homebanking” proporcionado pela ré prendia-se com as condições de segurança anunciadas, nomeadamente: a garantia dada de segurança nas operações realizadas através dos seus canais de acesso directo; segurança na comunicação através da Internet (publicitando a utilização de tecnologia avançada; segurança da infra-estrutura do sistema do Banco, através de Firewall; e monitorização permanente para certificação da segurança do sistema (pontos 28º e 29º dos factos provados).
Porém, essa segurança ficou seriamente comprometida com a falsa página criada por um terceiro, que iludiu a representante da autora e a levou a divulgar dados confidenciais, contra a sua vontade. Da factualidade provada não é possível, porém, concluir que esta divulgação tenha resultado de uma conduta imprudente, descuidada ou negligente e que essa imprudência tenha, efectivamente, possibilitado a operação bancária efectuada por terceiros.
Pelo contrário, apesar dos anúncios previamente efectuados, foi a ré quem não logrou desenvolver todas as acções que se impunham em ordem a garantir a segurança do depósito bancário da autora.
O cliente, por seu turno, não tem qualquer controlo sobre os sofisticados meios informáticos da entidade bancária, nem dispõe da assessoria técnica com que os departamentos respectivos daquela se apetrecham.
Concordamos, assim, ...no sentido de que recai sobre a instituição bancária o ónus da prova (face à presunção de culpa estabelecida no art.º 799º do Cód. Civil) de que o acesso de terceiros, em via electrónica, à conta do cliente não se ficou a dever a qualquer vulnerabilidade do sistema de segurança por ela implementado, relativamente à movimentação online dos clientes aderentes ao serviço.
Não tendo a ré logrado efectuar a prova deste facto, conclui-se naturalmente que a mesma terá que ser responsabilizada pelo prejuízo advindo desta “fraude virtual”, uma vez que lhe cabe o dever de manter o seu serviço em segurança. Como tal, terá que repor o montante transferido indevidamente da conta da autora, no valor de € 13.000,00.
Mas, mesmo que assim não fosse, a ré sempre seria responsabilizada a título de risco, conforme resulta do que se foi referindo supra, designadamente em sede de caracterização do contrato de depósito bancário.
Efectivamente é ao depositário, enquanto proprietário da coisa transferida, que cabe responder pelo risco do extravio ou dissipação da coisa, no caso a importância ilicitamente transferida, salvo quando haja culpa do cliente (que não é o caso, como já ficou demonstrado).
Transferida a propriedade do dinheiro depositado para o banco depositário, deixou de haver um equilíbrio entre as posições do depositante e da instituição, que justifique sequer a solução da repartição do risco. “Pois dificilmente alguém poderá sustentar o razoável de o depositante individual suportar – ainda que em parte – o risco de a instituição de crédito a quem confiou os seus valores, se revelar afinal incapaz de assegurar a intangibilidade daqueles por terceiros. O depositante contrata com o banco no inarredável pressuposto de ser estranho às vicissitudes por que passe a instituição de crédito em matéria de segurança, e para as quais ele não contribua.
A não ser assim estar-se-ia a frustrar o cerne da motivação que esteve na base da celebração do contrato de abertura de conta e dos contratos “acessórios” daquele, como o de depósito.”.
Nesta conformidade, o risco do desaparecimento da quantia de € 13.000,00 da conta à ordem titulada pela autora terá que ficar integralmente a cargo da ré, a quem incumbirá a obrigação de indemnizar a mesma nesse montante (neste sentido, vd. Ainda o Ac. da R.L., de 26-10-2010, Proc. nº 1943/09.1TJLSB.L1-7 in www.dgsi.pt/jtrl, a propósito também de uma situação de facto similar à dos presentes autos).”.

Este foi o entendimento da decisão recorrida, com o qual concordamos integralmente e, tudo o que pudéssemos dizer por palavras próprias mais não seria que uma repetição o que determina a improcedência a alegação da apelante, quando a mesma defende ser a autora a responsável pelos prejuízos por si sofridos e peticionados na presente acção.
Não só essa alegação não procede, como não procede a pretensão da Ré em ser absolvida dos demais prejuízos advindos à autora causados pela transferência em causa.
É evidente que a devolução do cheque do valor de € 12.602,00 que foi apresentado a pagamento no dia 4 de Junho, o qual foi devolvido com a indicação de falta de provisão só ocorreu, porque ocorreu aquela transferência da conta do autora, sem que a mesma a tenha efectuado nem autorizado.
Da fraude que tinha ocorrido era a ré sabedora, tendo logo no dia 3 de Junho pelas 17 h, através do subgerente do balcão de Ferreiros, informado a gerente da A. da existência da página Web falsa. Ora, tendo a gerente da A., como deixámos expresso supra, solicitado à R., que tentasse travar aquela transferência, a mesma não só não logrou demonstrar ter diligenciado para a evitar, como nada fez para garantir o pagamento do cheque que a A. lhe deu conhecimento ter emitido e, inevitavelmente, seria como foi devolvido por falta de provisão.
Da matéria de facto assente constata-se que, a R. não só nada fez no sentido de evitar a devolução do cheque em causa e, as consequências daí decorrentes, que não podia ignorar seriam gravosas para a A., devido à conta da mesma ter ficado desprovida de fundos, como, ainda fez a comunicação ao Banco de Portugal da Rescisão da Convenção do Uso de Cheque, com a inerente inclusão do nome da A. na listagem de utilizadores de cheque de risco, penalizando ainda mais a sua situação.
Não podem, assim, subsistir dúvidas, perante tudo o que supra ficou exposto, da censurabilidade da conduta da R. para com a A. e da sua responsabilidade pelo ressarcimento dos danos por esta sofridos, em consequência do comportamento daquela, quer patrimoniais quer morais.
Concordamos, assim, de todo, também neste aspecto com o decidido na sentença recorrida, incluindo o valor de € 20.000,00 fixado a título de danos não patrimoniais que, contrariamente, ao entendimento da recorrente, não consideramos exagerado, mas sim de montante razoável e justo.

Improcede, assim, de todo a apelação.

SUMÁRIO (artº 713, nº7, do CPC):
I - O contrato de “homebanking” estabelecido entre o banco e o cliente consiste numa simplificação de processos e operações disponibilizados, a este último, possibilitando-lhe um acesso mais continuado e rápido e, permitindo-lhe a realização de outras operações, bem como a obtenção de vários serviços, de forma em princípio mais cómoda e, simultâneamente, com enormes poupanças de escala, por parte do banco, nomeadamente, na possível diminuição do número de funcionários em atendimento, o que explica a razão dos mesmos em promoverem estes serviços, insistentemente, junto dos seus clientes.
II – Assim, não é legítimo ao banco invocar a sua irresponsabilidade numa situação de fraude informática, designada “phishing” de dados de autenticação do cliente, como o argumento que tal ocorreu no computador deste e não em qualquer sistema informático seu ou por si dominado, sabido que, é pressuposto deste tipo de serviço a utilização de computadores pessoais e não do próprio banco.
III - É justa e equilibrada a indemnização no montante de € 20.000,00 a pagar pelo banco (guardião do depósito), a título de compensação pelos danos morais sofridos pela A. (cliente do banco), devido aos transtornos que lhe advieram por, da sua conta aberta naquele, sem sua autorização ter sido feita uma transferência no valor de € 13.000,00 (eventualmente, devido a burla informática) e, por isso vê devolvido um cheque apresentado a pagamento depois de concretizada aquela transferência.
IV- E, é assim, porque o cliente/ A. tinha avisado o banco do sucedido e da emissão do cheque e solicitado ao banco/R. que travasse aquela transferência, não logrando este demonstrar ter desenvolvido as diligências necessárias no sentido de o evitar, o que causou, não só, a sua devolução, com a “indicação de falta de provisão”, (apesar do banco reconhecer, antes do cheque ser apresentado a pagamento, da existência de uma página Web falsa, imitando a sua página de abertura) como a A., em virtude de comunição efectuada pelo seu próprio banco ao Banco de Portugal, vê o seu nome incluído na listagem de utilizadores de risco e sofre, por via disso, diversos danos, incluindo perda de clientes.

III - DECISÃO
Nos termos expostos, acordam os juízes desta secção em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pela ré, mantendo-se a decisão recorrida.

Custas pela apelante.

Guimarães, 30 de Maio de 2013
Rita Romeira
Amílcar Andrade
José Manso Rainho