Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1325/22.0T8VCT.G1
Relator: JOSÉ CARLOS PEREIRA DUARTE
Descritores: PROPRIEDADE HORIZONTAL
PARTICIPAÇÃO NAS DESPESAS COM ELEVADORES
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 12/19/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
A aplicação do n.º 4 do art.º 1424º do CC - “Nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas fracções por eles possam ser servidas.” -, depende de saber se, no caso concreto:
- para aceder a determinada fracção autónoma, a partir da via pública e, naturalmente, para sair da mesma, para a via pública, é utilizável o elevador;
- para aceder a uma extensão dessa fracção autónoma, como seja uma arrecadação ou uma garagem, a partir da fracção autónoma e, naturalmente, para regressar à mesma, é utilizável o elevador.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

1. Relatório

EMP01..., Ldª intentou acção declarativa contra Condomínio ..., ... e ... e Travessa ... e ..., sito na União das Freguesias ... (... e ...) e ..., representado pela sua administradora “EMP02... – Unipessoal, Ldª” pedindo que seja anulada a deliberação tomada quanto ao ponto dois da Ordem de Trabalhos da assembleia de condóminos realizada no dia 31 de Agosto de 2020, no segmento da distribuição das despesas e encargos de conservação e fruição das partes comuns do edifício pelos condóminos do prédio, em violação do título constitutivo da propriedade horizontal, e o réu condomínio condenado a reconhecer essa anulação, com as legais consequências.

Alegou para tanto e em síntese, que é proprietária das fracções autónomas individualizadas pelas letras ..., ..., ... e ... do prédio urbano, sito na Rua ... e Travessa..., Lugar ..., ...; no dia 31 de Agosto de 2020, realizou-se uma assembleia de condóminos; o ponto 2 da ordem de trabalhos era a apresentação, análise, discussão e votação do orçamento e empresa a administrar o condomínio, para o período de 1 de maio de 2020 a 30 de abril de 2021; no âmbito deste ponto da ordem de trabalhos, a assembleia de condóminos votou  favoravelmente o orçamento apresentado pela “EMP02... – Unipessoal, Ldª e, consequentemente, foi a mesma nomeada para administrar o condomínio do prédio para o período de 1 de Maio de 2020 a 30 de Abril de 2021; o orçamento discrimina, por rúbricas, os valores parcelares orçamentados, bem como a distribuição, por cada uma das fracções autónomas, dos valores a suportar; indica a percentagem de cada fracção autónoma com referência ao valor global do prédio, de acordo com o título constitutivo e indica, também segundo o título constitutivo, as partes comuns a todas as fracções e, relativamente a sete conjuntos de fracções, indica as respectivas partes comuns;  as fracções autónomas  ... e ..., destinadas ao exercício de actividade comercial, têm acesso pela via pública através de uma parte comum do prédio (logradouro), e as fracções autónomas ... e ..., destinadas a garagem, situam-se no rés-do-chão, com acesso pela via pública, através de partes comuns do prédio; nenhum dos cinco elevadores do prédio é comum às fracções autónomas ..., ..., ... e ..., como não são comuns outras partes do edifício que indica; as fracções autónomas ... e ... só têm acesso pelos números de polícia ...1 e ...7, respectivamente, da Rua ..., pelo que, para aceder a tais fracções autónomas, não há necessidade nem possibilidade de utilizar ou percorrer qualquer parte comum interior do prédio; segundo o orçamento aprovado pela maioria dos condóminos as fracções autónomas propriedade da A. participam nos encargos relativos à manutenção e reparação dos elevadores, quando estes equipamentos não são comuns às mesmas fracções e também são chamadas a participar nos encargos de energia eléctrica; as fracções autónomas ... e ... não têm acesso pelos números de polícia ...3 e ...5, sendo, no entanto, chamadas a comparticipar nas despesas de electricidade com referência a esses mesmos números.

E já em sede de Direito invoca que no segmento da distribuição das despesas e encargos de conservação e fruição das partes comuns do edifício, o orçamento aprovado viola o disposto nos nºs 3 e 4 do artigo 1424º do C.C. e ainda o disposto no título constitutivo da propriedade horizontal.

O R. contestou, por excepção, invocando a caducidade e a ineptidão da petição inicial.
E por impugnação disse, em síntese, que o n.º 4 do art.º 1424º do CC é expresso no sentido de que participam nas despesas dos ascensores “os condóminos cujas fracções por eles possam ser servidas”; a A. omite que as fracções ... e ... possuem e são igualmente compostas por garagens que se situam ao nível do rés-do-chão; ambas as fracções são servidas por elevador que estabelece a comunicação com o rés-do-chão, onde se situam aquelas garagens; a Autora solicitou autorização aos condóminos para a  colocação na cobertura do prédio de máquinas de ar condicionado, que por aqueles lhe foi concedida, dispondo a A. das chaves da casa das máquinas situadas na cobertura do edifício, onde acede livremente através das escadas ou dos elevadores do edifício; também as fracções ... e ... que, embora se destinem a garagem, são servidas por um elevador; as fracções ..., ..., ... e ..., podem aceder livre e indiscriminadamente a todas as partes do edifício, designadamente através dos elevadores dos vários blocos de que se podem servir para o efeito e também podem ser acedidas através das partes comuns do prédio, designadamente através dos elevadores que igualmente servem aquelas fracções; a A. sempre participou nas despesas dos elevadores; é na cave que se encontram instalados equipamentos de interesse comum – quadro eléctrico, central de detecção de incêndio e bombas eléctricas destinadas a regular o nível freático das águas para evitar inundações no prédio – pelo que a A. não só pode servir-se do elevador para acesso à cave, como, caso pretenda aceder aos equipamentos de interesse comum em referência, necessita de aceder à cave e o que poderá fazer através dos elevadores.

A A. foi notificada para responder às excepções, o que fez.

Foi proferido despacho saneador que julgou improcedente a excepção de ineptidão da petição inicial, jugou verificados os pressupostos processuais, fixou valor à causa, julgou improcedente a excepção de caducidade, consignou o objecto do litígio e os temas da prova e pronunciou-se quanto aos requerimentos probatórios.

Realizou-se o julgamento, tendo sido proferida sentença cujo decisório tem o seguinte teor:
“Nestes termos, na parcial procedência da acção, decide-se anular a deliberação aprovada na Assembleia de Condóminos realizada no dia 31 de Agosto de 2020 no que respeita ao ponto dois da respectiva “Ordem de Trabalhos”, apenas na parte que põe a cargo da A. EMP01..., LDA. a obrigação de comparticipar nos encargos de conservação e manutenção dos elevadores do prédio sito na Rua ..., ... e ..., e na Travessa ... e ..., União das Freguesias ... (... e ...) e ..., concelho ....
Custas a cargo de A. e R., na proporção de 40% e 60%, respectivamente – artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, e 607.º, n.º 6, ambos do CPC. “

O Réu interpôs recurso, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões[1]:
1. Vem o presente recurso da sentença proferida no âmbito dos presentes autos no segmento que julgou parcialmente procedente a presente acção e decidiu anular a deliberação aprovada na assembleia de condóminos realizada no dia 31 de Agosto de 2020 no que respeita ao ponto dois da respectiva “ordem de trabalhos”, apenas na parte que põe a cargo da Autora a obrigação de comparticipar nos encargos de conservação e manutenção dos elevadores do prédio sito na Rua ..., ... e ... e na Travessa ... e ..., em ....
2. Crê-se, com o devido respeito, que o Tribunal a quo não procedeu a uma escorreita e cuidada apreciação de toda a prova produzida e que em tal aresto decisório fez incorrecta interpretação e aplicação do Direito e errado enquadramento fáctico-legal, inserindo-se no âmbito de um conflito jurisprudencial e ainda que a sentença recorrida padece de nulidade. O presente recurso tem por objecto a decisão proferida em sede de matéria de facto e de direito e envolve a reapreciação da prova gravada.

II. DO OBJECTO DO RECURSO

a) da nulidade da sentença
3. Na motivação da sentença recorrida, o Mm.º Juiz a quo refere que “não existem dúvidas que o prédio em questão é constituído por cinco blocos que, como se refere no documento complementar anexo à escritura de constituição da propriedade horizontal, “se interligam a nível da cave e de parte do rés-do-chão, tornando-se indistintos a esses níveis” (cfr. fls. 35). Ou seja, objectivamente, é possível aceder a cada um dos cinco blocos do prédio (cave, rés-do-chão, cada um dos seus três andares, cobertura e logradouro) por qualquer uma das entradas nele existentes – inclusivamente através das entradas com os n.º de polícia ...3 e ...5, afectas às fracções autónomas ... e ..., uma vez que as mesmas dispõem de porta de acesso para o patamar ou corredor de circulação existente ao nível do rés-do-chão onde se situam as garagens que constituem as fracções ... e ... – e calcorreá-lo integralmente através das escadas ou dos elevadores.” (sublinhado e negrito nosso)
4. Por sua vez, da fundamentação da sentença recorrida resulta que “(…) as fracções autónomas de que a A. é proprietária situam-se, todas elas, ao nível do rés-do-chão do edifício, não se vislumbrando por isso que aquela tenha necessidade de se servir dos elevadores para a elas aceder” (…) “ no acesso às fracções de que é proprietária a A. não utiliza nenhum dos elevadores instalados no edifício, ou, dito de outro modo, tais fracções autónomas não são nem podem ser servidas pelos ascensores instalados no edifício que é objecto de controvérsia nos autos. Como já vimos, este critério prende-se fundamentalmente com a possibilidade/necessidade de o condómino aceder à fracção através da utilização do(s) elevador(es)…”.
5. Pelo que, é manifesta a contrariedade do Mm.º Juiz a quo ao referir que, sem margem de dúvida, é possível aceder a cada um dos cinco blocos do prédio, que se interligam a nível da cave e de parte do rés-do-chão, tornando-se indistintos a esses níveis, incluindo no que diz respeito às fracções de que a A. é proprietária, e calcorreá-lo integralmente através das escadas ou dos elevadores, por um lado, mas que tais fracções não são nem podem ser servidas pelos ascensores, por outro lado.
6. Se as fracções da A,. são servidas por elevadores é uma questão, e se a A. tem necessidade de fazer uso de tais ascensores é outra questão, que não se confunde, nem se deve confundir, tal como assim sucede manifestamente na sentença recorrida.
7. Sendo que na fundamentação da sentença recorrida é ainda dito que: ”O mesmo raciocínio é válido quanto aos equipamentos de ar condicionado colocados na cobertura do prédio que beneficiam as fracções ... e .... Mesmo que, como se afigura natural, a A. utilize os elevadores ou as escadas para, subindo à cobertura do prédio, proceder à manutenção dos referidos aparelhos, estamos perante uma utilização muito esporádica quer daquele equipamento, quer daquela estrutura (…)” (sublinhado e negrito nosso).
8. Mas então, os elevadores são acessíveis às fracções da A., que deles pode fazer uso, sendo até natural que o faça para aceder à cobertura do edifício, embora o Mm.º Juiz a quo considere que não tem necessidade disso e não deu como provado que as fracções da A. são servidas pelos ascensores existente no prédio?
9. Então o Mm.º Juiz a quo não considerou, sem margem de dúvida, que é possível aceder a cada um dos cinco blocos do prédio, que se interligam a nível da cave e de parte do rés-do-chão, tornando-se indistintos a esses níveis, incluindo no que diz respeito às fracções de que a A. é proprietária, e calcorreá-lo integralmente através das escadas ou dos elevadores, mas afinal tais fracções não são servidas pelos ascensores existentes no edifício?
10. Por outro lado, e tal como resulta da motivação da sentença recorrida, o Mm.º Juiz a quo considera que “os ascensores ou elevadores não são forçosa nem necessariamente partes comuns do edifício” e ainda que “temos que o título constitutivo da propriedade horizontal em apreço exclui expressamente os elevadores existentes no edifício da compropriedade da A. sobre as partes comuns. (…) Não obstante, cremos que o argumento fundamental que permite considerar que a A. não deve ser chamada a comparticipar nas despesas decorrentes do funcionamento e manutenção/conservação dos elevadores decorre do teor das normas, já citadas, dos n.ºs 3 e 4 do artigo 1424.º do Código Civil. De facto, as fracções autónomas de que a A. é dona situam-se todas elas, ao nível do rés-do-chão do edifício, não se vislumbrando por isso que aquela tenha necessidade de se servir dos elevadores para a elas aceder”.
11. Na fundamentação de direito da sentença recorrida é ainda referido que do n.º 4 do artigo 1424.º do Código Civil é preceituado que “Nas despesas dos ascensores só participa, os condóminos cujas fracções por eles possam ser servidas”, concluindo que, a deliberação tomada em assembleia de condóminos no que respeita à repartição dos condóminos em função da permilagem das despesas com os elevadores viola o disposto no artigo 1424, n.º 3 e 4, como o disposto no título constitutivo da propriedade horizontal, pois pressupõe que os elevadores sejam uma parte comum em relação a todas as fracções que compõem o edifício.
12. O Mm.º Juiz a quo reconhece assim, tal como resulta do teor da sentença recorrida e do preceituado no artigo 1424.º, n.º 3 e 4 do Código Civil, que os ascensores ou elevadores não são forçosa nem necessariamente partes comuns do edifício e que os mesmos são acessíveis às fracções da A. (e a todos os proprietários do edifício), mas contrariamente decide pela anulação da deliberação tomada em assembleia de condóminos no que respeita à repartição dos condóminos em função da permilagem das despesas com os elevadores por considerar que a mesma “pressupõe que os elevadores sejam uma parte comum em relação a todas as fracções que compõem o edifício”.
13. Crê-se, assim, com todo o devido merecido respeito, que não só há contrariedade entre a matéria de facto dada como provada e não provada, com entre esta e a fundamentação e a motivação da sentença, como é manifesta a oposição entre os fundamentos e a decisão proferida: segundo o Mm.º Juiz a quo, o argumento fundamento é a alegada falta de necessidade de a A. se servir dos elevadores para aceder às suas fracções, quando reconhece que os mesmos são acessíveis àquela e a todos os proprietários do edifício, mas decide com fundamento diverso, designadamente na alegada elisão da presunção legal de que os ascensores se presumem partes comuns.
14. Nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1 alínea c) do Código de Processo Civil, a sentença é nula quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão, tal como sucede manifestamente no aresto decisório recorrido nos termos supra expostos - nulidade essa que expressamente se invoca para todos os efeitos legais - pelo que se impõe a sua correspondente revogação.
b) da matéria de facto
15. No que diz respeito à possibilidade de todos os condóminos sem excepção (e no que se inclui a Autora), poderem servir-se dos elevadores do prédio, foi produzida, além da que já resulta da factualidade dada como provada, a seguinte prova:
- O sócio gerente da administração e legal representante do Réu, AA, também proprietário de fracção e residente no edifício em referência nos autos, ouvido em sede de declarações de parte prestadas nos autos em 13.12.2022, aos minutos infra concretizados do seu depoimento gravado e registado digitalmente no aplicativo Habilus Média Studio, do momento 09.42.29 a 10.48.40, esclareceu o seguinte:
Quando questionado pelo Mm.º Juiz se a A. para aceder às suas fracções utiliza os elevadores, respondeu:
00:13:15 a 12:34: “sim, estão lá os elevadores, lá disponíveis, ou seja, não há qualquer entrave dele entrar na entrada ...0, no elevador e sair em qualquer zona comum, é livre acesso”.
00:13:56 a 00:14:20: “Eles podem, por exemplo, vamos supor, entram pela garagem e estão na zona da garagem e estão na sala de condomínio e está a chover, e eles podem aceder à entrada ...6, descer ao -1 e sair na entrada ...5 e estão logo na entrada de uma loja”.
Quando questionado pela Mandatária, aos minutos 00:45:54 se as portas corta-fogo e os elevadores de todos os blocos, nada está vedado a ninguém, se todos têm acesso, respondeu:
00:46:01: “Sim, todos têm acesso”
- Também a testemunha comum da A. e Réu, BB, ouvido em sede de depoimento prestado nos autos em 13.12.2022, aos minutos infra concretizados do seu depoimento gravado e registado digitalmente no aplicativo Habilus Média Studio, do momento 10:49:27 a 11:47:29., esclareceu o seguinte:
Quando questionado se é possível a A. utilizar dos elevadores, respondeu:
00:18:23 a 00:18:31: “poder, podem, mas não faz sentido”
00:38:39 a 00:38:44 “pois pode…pode, já aqui disse que pode”
Quando questionado, ao minuto 00:39:18, se as lojas podem usar o elevador, respondeu:
00:39:19: “as lojas podem, mas não faz sentido”
Quando questionado, aos minutos 00:43:36, se os aparelhos do ar condicionado que as lojas de que a A. é proprietária estão no bloco ... no bloco ..., respondeu que “Sim” – aos minutos 00:43:37 do seu depoimento.
Quando questionado, aos minutos 0:44:18, se o acesso vertical ao bloco ... e bloco ... só se consegue por escadas ou elevador, respondeu que “Sim” – aos minutos 00:44:19 do seu depoimento.
Questionado directamente, aos minutos 00:44:41, se reconhece que o elevador está à disposição para fazer uso e aceder à cobertura, o mesmo respondeu que “Sim” – aos minutos 00:44:43 do seu depoimento
- Também a testemunha do Réu, CC, funcionário judicial e residente no edifício em referência nos autos, ouvido em sede de depoimento prestado nos autos em 13.12.2022, aos minutos infra concretizados do seu depoimento gravado e registado digitalmente no aplicativo Habilus Média Studio, do momento 12:07:16 a 12:35:12, esclareceu o seguinte:
00:02:45 a 00:03:01: “são cinco entradas mas todas elas estão interligadas por escadas ou elevadores (…)”
00:05:27: “não há nenhuma área restrita (…)”
Quando questionado, aos minutos 00:17:20, se quiser fazer uso do elevador e descer ao -1 ou até ir à cobertura, tal utilização é livre, respondeu: “É tudo livre” - aos minutos 00:17:32 do seu depoimento.
- Também a testemunha do Réu, DD, residente no edifício em referência nos autos, ouvida em sede de depoimento prestado nos autos em 13.12.2022, aos minutos infra concretizados do seu depoimento gravado e registado digitalmente no aplicativo Habilus Média Studio, do momento 14:07:55 a 14:50:54., esclareceu o seguinte:
00:10:36 a 00:10:46: “Eu consigo usar o elevador que eu pretender ali dentro, eu e como qualquer outro habitante do edifício, todos eles são livres”
Quando questionada, ao minuto 00:10:49, se tal utilização livre também era possível à Autora, respondeu: “Óbvio, ele é morador, está dentro do edifício, consegue usar” – minutos 00:14:49 do seu depoimento.
Quando questionada, ao minuto 00:12:37, se vê a Autora ou seus inquilinos a fazer uso, respondeu: “Claro que sim, naquela zona das garagens é uma constante” – minutos 00:12:40 a 00:12:50 do seu depoimento.
- Também a testemunha do Réu, EE, residente no edifício em referência nos autos, ouvida em sede de depoimento prestado nos autos em 13.12.2022, aos minutos infra concretizados do seu depoimento gravado e registado digitalmente no aplicativo Habilus Média Studio, do momento 14:54:12 a 15:13:12, esclareceu o seguinte:
Quando questionado, ao minuto 00:02:20, relativamente à utilização dos elevadores, respondeu:
00:02:23: “É livre, todos os elevadores estão nas áreas das garagens”.
- Também a testemunha do Réu, FF, residente no edifício em referência nos autos, ouvida em sede de depoimento prestado nos autos em 13.12.2022, aos minutos infra concretizados do seu depoimento gravado e registado digitalmente no aplicativo Habilus Média Studio, do momento 15:13:55 a 15:26:28, esclareceu o seguinte:
Quando questionada, ao minuto 00:04:03, relativamente à utilização livre pela A. dos elevadores, respondeu:
00:04:05: “podem servir-se deles”.
- Também a testemunha do Réu, GG, residente no edifício em referência nos autos, ouvida em sede de depoimento prestado nos autos em 13.12.2022, aos minutos infra concretizados do seu depoimento gravado e registado digitalmente no aplicativo Habilus Média Studio, do momento 15:27:11 a 15:44:21, esclareceu o seguinte:
00:04:55: “Ando por ali dentro à vontade”
Quando questionado, aos minutos 00:06:08, se pode fazer uso do prédio de forma indiscriminada, respondeu: “tudo” – aos minutos 00:06:08 do seu depoimento.
Quando questionado, aos minutos 00:07:02, se já viu a A. ou seus inquilinos a fazer uso dos elevadores, afirmou que:
00:07:04 a 00:07:15: “já, já, uma vez ou outra”
Quando questionado, aos minutos 00:07:20, se já viu a A. fazer uso dos elevadores para aceder à cobertura, afirmou que::
00:07:25 “Sim, já vi”
16. Pelo que, não há dúvidas, que do cotejo da prova testemunhal produzida nos autos, ficou amplamente demonstrado que a Autora, como qualquer outro proprietário, podem fazer uso livre dos elevadores existentes no edifício.
17. Tanto assim é verdade que, tal como resulta da motivação da sentença recorrida, o Mm.º Juiz a quo refere que “não existem dúvidas que o prédio em questão é constituído por cinco blocos que, como se refere no documento complementar anexo à escritura de constituição da propriedade horizontal, “se interligam a nível da cave e de parte do rés-do-chão, tornando-se indistintos a esses níveis” (cfr. fls. 35). Ou seja, objectivamente, é possível aceder a cada um dos cinco blocos do prédio (cave, rés-do-chão, cada um dos seus três andares, cobertura e logradouro) por qualquer uma das entradas nele existentes – inclusivamente através das entradas com os n.ºs de polícia ...3 e ...5, afectas às fracções autónomas ... e ..., uma vez que as mesmas dispõem de porta de acesso para o patamar ou corredor de circulação existente ao nível do rés-do-chão onde se situam as garagens que constituem as fracções ... e ... – e calcorreá-lo integralmente através das escadas ou dos elevadores.” (sublinhado e negrito nosso)
18. E na fundamentação da sentença recorrida é ainda dito que: ”O mesmo raciocínio é válido quanto aos equipamentos de ar condicionado colocados na cobertura do prédio que beneficiam as fracções ... e .... Mesmo que, como se afigura natural, a A. utilize os elevadores ou as escadas para, subindo à cobertura do prédio, proceder à manutenção dos referidos aparelhos, estamos perante uma utilização muito esporádica quer daquele equipamento, quer daquela estrutura (…)” (sublinhado e negrito nosso).
19. Daí que tenha sido dada, e bem, como provada a seguinte factualidade:
“(…)
18. Os elevadores existentes no bloco ... e ... são acessíveis às frações ... e ...;
19. Os elevadores existentes no bloco ... e ... são acessíveis às frações ... e .... (…)
20. Ora, da matéria de facto dada como não provada, resulta que:
“(…)
3. A fracção ... é servida pelo elevador existente no bloco ....
4. A fracção ... é servida pelo elevador existente no bloco ....
5. As fracções ... e ... são servidas pelo elevador existente nos blocos ... e .... (…)”.
21. Vale dizer que o Mm.º Juiz a quo deu como não provado que a A. não pode fazer uso, não pode utilizar ou aproveitar-se dos elevadores existentes no prédio, quando do cotejo da prova produzida nos autos, resulta precisamente o contrário, ou seja, que a A. (como qualquer outro proprietário) pode utilizar ou fazer uso dos elevadores.
22. Na verdade, e tal como o Mm.º Juiz a quo assim o reconhece nos autos e resulta do teor da sentença recorrida, a A. pode fazer uso dos elevadores (sendo que até o faz, ainda que de forma esporádica, para aceder à cobertura do edifício para efeitos de manutenção dos aparelhos de ar condicionado, como o Mm.º Juiz assim faz constar do teor da sentença recorrida), no entanto “as fracções de que a A. é dona situam-se todas elas, ao nível do rés-do-chão do edifício, não se vislumbrando por isso que aquela tenha necessidade de se servir dos elevadores para a elas aceder”.
23. Pelo que, assim sendo e em face da prova produzida nos autos, impunha-se levar ao leque da matéria de facto dada como provada que as fracções da Autora são servidas pelos elevadores existentes no edifício e que deles pode fazer uso.
24. Questão diversa é se a Autora faz uso efectivo dos elevadores e/ou tem necessidade de fazer uso dos elevadores (pelo menos para aceder à cobertura do edifício para efeitos de manutenção dos aparelhos de ar condicionado, o Mm.º Juiz a quo assim o reconhece e faz constar do teor da sentença recorrida).
25. Uma correcta apreciação e valoração da prova produzida nos autos, nomeadamente da que supra vai indicada, impunha, como efectivamente impõe, que o Mm.º Juiz a quo desse como provada a factualidade vertida nos pontos 3), 4) e 5) dos factos não provados mas com a seguinte redacção única: “todas as fracções autónomas que integram o edifício sem excepção, no que se inclui as de que a Autora é proprietária, são servidas pelos elevadores existentes no prédio, que deles podem fazer uso”.
26. O tribunal a quo incorreu, de facto, num erro ostensivo na apreciação da prova produzida em audiência de julgamento, ignorando ou afrontando directamente as mais elementares regras da experiência, em termos de se poder dizer que existe uma flagrante desconformidade entre os elementos probatórios disponíveis e a decisão do tribunal recorrido sobre a matéria de facto, pelo que se impõe a alteração da matéria de facto dada como provada e não provada nos termos supra expostos.
c) da sentença
27. Tal como resulta do teor da sentença recorrida, o Mm.º Juiz a quo considera que “os ascensores ou elevadores não são forçosa nem necessariamente partes comuns do edifício” e ainda que “temos que o título constitutivo da propriedade horizontal em apreço exclui expressamente os elevadores existentes no edifício da compropriedade da A. sobre as partes comuns. (…) Não obstante, cremos que o argumento fundamental que permite considerar que a A. não deve ser chamada a comparticipar nas despesas decorrentes do funcionamento e manutenção/conservação dos elevadores decorre do teor das normas, já citadas, dos n.ºs 3 e 4 do artigo 1424.º do Código Civil. De facto, as fracções autónomas de que a A. é dona situam-se todas elas, ao nível do rés-do-chão do edifício, não se vislumbrando por isso que aquela tenha necessidade de se servir dos elevadores para a elas aceder”.
28. Na fundamentação de direito da sentença recorrida é ainda referido que do n.º 4 do artigo 1424.º do Código Civil é preceituado que “Nas despesas dos ascensores só participa, os condóminos cujas fracções por eles possam ser servidas”, concluindo que, a deliberação tomada em assembleia de condóminos no que respeita à repartição dos condóminos em função da permilagem das despesas com os elevadores viola o disposto no artigo 1424, n.º 3 e 4, como o disposto no título constitutivo da propriedade horizontal, pois pressupõe que os elevadores sejam uma parte comum em relação a todas as fracções que compõem o edifício.
29. Crê-se, com o devido e merecido respeito, que o Tribunal recorrido fez um errado enquadramento fáctico-legal e incorrecta interpretação e aplicação do Direito, sendo que ao decidir como decidiu, o Mm.º Juiz a quo violou o disposto no artigo 1424.º do Código Civil.
30. Nos termos do disposto no artigo 1424.º, n.º 4 do Código Civil, que rege quanto aos encargos de conservação e fruição, há norma expressa que rege relativamente às despesas com os elevadores, e o qual preceitua expressamente que “nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas fracções por eles possam ser servidas”, ou seja, tal normativo legal estabelece uma regra e/ou critério especial quanto à comparticipação nas despesas dos elevadores.
31. E, tal como resulta de tal normativo, a lei não faz depender a comparticipação nas despesas dos ascensores da circunstância de os mesmos serem, ou não, partes comuns, outrossim, tal norma é expressa no sentido de que participam nas despesas dos ascensores “os condóminos cujas fracções por eles possam ser servidas”.
32. Aliás, e tal como até defendido pelo Mm.º Juiz a quo na sentença recorrida, os ascensores ou elevadores não são forçosa nem necessariamente partes comuns do edifício, tanto que não constam sequer do elenco previsto no nº 1 do art.º 1421º do Cód. Civil.
33. O elenco do preceito não é taxativo, entendendo-se que são necessariamente comuns não só as elencadas, mas ainda todas aquelas que transcendendo o âmbito restrito de cada uma das fracções autónomas, revestem interesse colectivo, por serem objectivamente necessárias ao uso comum do prédio. O que distingue as elencadas em cada um dos preceitos, é que enquanto as do nº 1 que respeitam à estrutura da construção, elas são forçosamente comuns, ainda que estejam afectas ao uso de um dos condóminos, pela razão de que a sua utilidade fundamental, como elemento essencial de toda a construção, se estende a todos os condóminos, enquanto as do nº 2, a sua utilidade pode ser mais ou menos ampla, mas a justificação da sua natureza está no facto de constituírem, isolada ou conjuntamente com outras, instrumentos do uso comum do prédio (Pires de Lima e Antunes Varela, in Cód. Civil Anotado, Vol. III, pág. 420).
34. Pelo que, o que releva para os termos da presente demanda e, nomeadamente, aferir da responsabilidade do condómino na comparticipação das despesas dos ascensores, é a serventia dos elevadores às fracções propriedade da Autora.
35. Tal como resulta da factualidade dada como provada (seu ponto 21), as fracções ... e ... encontram-se arrendadas, tendo sido solicitada autorização aos condóminos, em sede de assembleia realizada em 25 de Março de 2015, para a colocação na cobertura do prédio de máquinas de ar condicionado, que por aqueles lhe foi concedida, e entregue à Autora as respectivas chaves para acesso à cobertura do edifício, à qual apenas se acede através de escadas ou dos elevadores do edifício.
36. Ora, e tal como decidido no douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça em 24/02/2005, processo n.º 05B094, disponível in www.dgsi.pt: “Se uma "sala do condomínio" e uma "arrecadação geral" do edifício - partes comuns - se localizam no 11° piso do prédio, apenas aí sendo possível aceder através das escadas comuns e dos ascensores do imóvel - também partes comuns - há que concluir, segundo um critério aferidor de carácter objectivo - o único legalmente definidor da situação - ser manifesta a susceptibilidade (abstracta) de as diversas fracções poderem ser servidas pelas referidas partes e equipamentos comuns”.
37. Resulta do teor da certidão do auto de inspecção judicial ao local realizado no âmbito do processo n.º 3227/20.... e, nomeadamente, dos seus registos fotográficos n.ºs 5, 16, 17, 18 e 19, junto aos presentes autos, que o acesso à casa das máquinas e à porta de acesso à cobertura do edifício onde se encontram as unidades exteriores de ar condicionado apenas é possível através das escadas comuns ou dos elevadores.
38. Aliás, é tanto quanto resulta expresso no teor da sentença recorrida e da prova produzida, salientando-se os dizeres do Mm.º Juiz a quo: ”O mesmo raciocínio é válido quanto aos equipamentos de ar condicionado colocados na cobertura do prédio que beneficiam as fracções ... e .... Mesmo que, como se afigura natural, a A. utilize os elevadores ou as escadas para, subindo à cobertura do prédio, proceder à manutenção dos referidos aparelhos, estamos perante uma utilização muito esporádica quer daquele equipamento, quer daquela estrutura (…)” (sublinhado e negrito nosso).
39. Pelo que, citando o indicado aresto jurisprudencial, há que concluir, segundo um critério aferidor de carácter objectivo, que é manifesta a susceptibilidade das fracções da Autora poderem ser servidas, como efectivamente são, pelos elevadores que servem os vários blocos que integram o prédio, nomeadamente para acesso às partes comuns.
40. De resto, é tanto quanto resulta do teor do próprio título constitutivo de propriedade horizontal e documento complementar a ele anexo (fls. 33 a 47 e verso, dos autos), ao determinar que os blocos são servidos por um elevador que estabelece comunicação com partes comuns do prédio (cfr. artigo 1421.º do Código Civil) que não servem exclusivamente alguns dos condóminos, nomeadamente, à cave onde se localiza uma divisão destinada à recolha de materiais de limpeza das zonas comuns e ainda as instalações gerais de electricidade, as bombas eléctricas e os detectores de incêndio e gases do prédio; à cobertura do edifício e respectiva casa das máquinas ao nível da cobertura e ao rés-do-chão onde se situa a sala de condomínio, o acesso ao logradouro, mas também que estabelece comunicação com o rés-do-chão e aquela cave (piso -1).
41. Sendo que resulta do teor da sentença junta aos autos com a petição inicial sob documento n.º ...5 que as percepções recolhidas durante a inspecção ao local “permitiu verificar os acessos e entradas das fracções pertencentes à Autora, bem como a sua afectação, ocupação e composição actual. Por outro lado, permitiu perceber a estrutura interna do prédio, e a possibilidade de livre circulação de pessoas pelo seu interior, entre os blocos que o integram, não havendo quaisquer barreiras ou zonas estanques. A referida realidade decorre, ainda, das declarações de parte dos Rés e depoimento das testemunhas. Da inspecção ao local constatou-se que as fracções autónomas ... e ... embora tenham entradas exclusivas (nºs de polícia ...1 e ...7), podem aceder a todas as partes do edifício, designadamente aos elevadores dos vários blocos e, a partir daí, a todos os pisos (superiores ou inferior – cave), bem como às restantes zonas comuns. Por seu turno, o acesso às fracções autónomas ... e ... (garagens), localizadas no rés-do-chão é feito através do portão eléctrico com saída para os nºs de polícia ...0 e ...6, os quais também dão acesso às zonas de garagem que integram as fracções ... e .... Verificou-se, ainda, que todas as fracções identificadas podem ser acedidas através das partes comuns de prédio, não só às partes comuns das garagens (corredores de circulação), mas a todas as partes comuns interiores e exteriores e equipamentos comuns, designadamente elevadores. Constatou-se que não existe qualquer parte do prédio cujo o acesso esteja vedado aos ocupantes das referidas fracções, o que foi confirmado por todos os Réus ouvidos em declarações, sendo possível o acesso a qualquer bloco do prédio, bem como à cave, cobertura e logradouros, sendo que as referidas fracções têm acesso à via pública através do corredor de circulação das garagens que, por sua vez, dá acesso às entradas nºs ...6 e ...0”.
42. E, no mesmo sentido, o próprio Mm.º Juiz a quo reconhece na sentença recorrida proferida no âmbito da presente demanda que “não existem dúvidas que o prédio em questão é constituído por cinco blocos que, como se refere no documento complementar anexo à escritura de constituição da propriedade horizontal, “se interligam a nível da cave e de parte do rés-do-chão, tornando-se indistintos a esses níveis” (cfr. fls. 35). Ou seja, objectivamente, é possível aceder a cada um dos cinco blocos do prédio (cave, rés-do-chão, cada um dos seus três andares, cobertura e logradouro) por qualquer uma das entradas nele existentes – inclusivamente através das entradas com os n.ºs de polícia ...3 e ...5, afectas às fracções autónomas ... e ..., uma vez que as mesmas dispõem de porta de acesso para o patamar ou corredor de circulação existente ao nível do rés-do-chão onde se situam as garagens que constituem as fracções ... e ... – e calcorreá-lo integralmente através das escadas ou dos elevadores.” (sublinhado e negrito nosso)
43. Os elevadores são, assim, um instrumento de uso comum do prédio, que não servem exclusivamente algum ou alguns condóminos, como é manifestamente o caso dos autos, antes pelo contrário, pelo que todas as fracções autónomas do prédio sem excepção encontram-se objectivamente em condições de deles se servirem, como efectivamente é verdade.
44. Em face da estrutura particular interna do prédio, o regulamento geral de condomínio (junto a fls. 301, reverso a 306, dos autos) disciplina o uso das partes comuns estabelecendo na sua cláusula 4 que: “São partes comuns deste edifício, solo, alicerces, pilares, paredes mestras, cobertura e todos os elementos da estrutura do prédio, a entrada do prédio, escadas e corredores de passagem; entradas destinadas a veículos, vias de circulação de viaturas nas garagens, instalações de água e esgotos, electricidade, comunicações, gás, etc., logradouro e campo de jogos no interior do prédio, sala de condomínio, elevadores e casa dos elevadores, antenas colectivas de televisão e/ou cabo de ligação da TV ....” .
45. Aliás, na factualidade dada como provada (seus pontos 18 e 19), o Mm.º Juiz a quo julgou assente que os elevadores existentes nos blocos ... e ... são acessíveis às fracções ... e ... da Autora e que os elevadores existentes nos blocos ... e ... são acessíveis às fracções ... e ....
46. “Acessível” no dicionário português significa “que se pode atingir, alcançar ou obter facilmente”, pelo que o mesmo é dizer que os elevadores existentes nos blocos ..., ..., ... e ..., podem ser alcançados e, por conseguinte, podem ser utilizados pelas fracções ..., ..., ... e ... da Autora, como é verdade.
47. Ora, se todas as fracções da Autora podem ser acedidas através das partes comuns de prédio, não só às partes comuns das garagens (corredores de circulação), mas a todas as partes comuns interiores e exteriores e equipamentos comuns, designadamente elevadores, como efectivamente é verdade e assim é reconhecido pelo Mm.º Juiz a quo na sentença recorrida, é forçoso concluir que todas as fracções da Autora podem servir-se dos elevadores.
48. Veja-se que resulta da matéria de facto dada como não provada a factualidade alegada nos autos pela Autora, designadamente que as fracções ... e ... da Autora só têm acesso exclusivo pelos n.ºs polícia ... e ... da Rua ..., e que para aceder a tais fracções não é possível utilizar ou percorrer qualquer parte comum interior do prédio, o que não corresponde à realidade.
49. Assim sendo, e encontrando-se demonstrado nos autos que as fracções da Autora podem servir-se dos elevadores, como efectivamente é verdade, tal como resulta do disposto no artigo 1424.º, n.º 4 do Código Civil, a mesma deve participar nos respectivos encargos ou despesas.
50. E nem se diga, como faz o Tribunal recorrido e a Autora assim invoca na petição inicial, que a participação nos encargos com os ascensores só é exigível nos casos em que há um uso efectivo/regular e/ou em que há necessidade de fazer uso dos elevadores, pois que, tal como demonstrado nos autos, os elevadores são instrumentos acessíveis e susceptíveis de uso comum por todos os condóminos, incluindo a Autora.
51. Em primeiro lugar, como resulta demonstrado nos autos (ponto 20) da matéria de facto dada como provada) é na cave que se encontram instalados equipamentos de interesse comum – quadro eléctrico, central de detecção de incêndio e bombas eléctricas destinadas a regular o nível freático das águas para evitar inundações no prédio – pelo que a Autora não só pode servir-se do elevador para acesso à cave, como, caso pretenda aceder aos equipamentos de interesse comum em referência, necessita de aceder à cave e o que poderá fazer através dos elevadores.
52. Em segundo lugar, a cobertura do prédio é parte comum do edifício (cfr. artigo 1424.º do Código Civll) e é nessa cobertura que se encontram instaladas as máquinas de ar condicionado que abastecem as fracções da Autora (ponto 21) da matéria dada como provada), pelo que, a Autora não só pode servir-se dos elevadores para acesso à cobertura, como, caso pretenda aceder às suas máquinas de ar condicionado, necessita de aceder a essa cobertura e o que poderá fazê-lo através dos elevadores.
53. A Autora poderá, sempre que o entender e necessitar, aceder aos aludidos espaços condominiais, e sempre que o queira fazer poderá utilizar os meios de acesso de circulação vertical – elevadores – de que o edifício dispõe.
54. Vale dizer que as fracções da Autora beneficiam objectivamente – sendo que o critério aferidor de carácter objectivo é o único legalmente definidor da situação – dos elevadores que permitem o acesso à cave, à cobertura do edifício e aos demais espaços e partes comuns do prédio, a que livremente podem aceder, nada justificando pois, que se pretenda eximir ao pagamento com essas despesas.
55. Parte da jurisprudência e doutrina defende que o que releva é precisamente o uso que cada condómino pode fazer dos elevadores, independentemente do uso que efectivamente faça, entendimento esse que é sufragado pelo Recorrente.
56. O Recorrente pretende, aliás, ver resolvido tal conflito jurisprudencial e, para o efeito, junta cópia do acórdão fundamento, nomeadamente o que infra se concretiza e passa a citar: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça em 24/02/2005, processo n.º 05B094, disponível in www.dgsi.pt: “O que releva é o uso que cada condómino pode fazer das partes comuns, medido em princípio pelo valor relativo da sua fracção e não o uso que efectivamente se faça delas; a responsabilidade pelas despesas de conservação subsistirá mesmo em relação àqueles condóminos que, podendo fazê-lo, não utilizem (por si ou por intermédio de outrem) as respectivas fracções e se não sirvam, por conseguinte, das partes comuns do prédio”, que subscreve os dizeres de Pires de Lima e Antunes Varela, in " Código Civil Anotado ", vol. III, 2ª ed, pág 432.
57. No mesmo sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto proferido em 11/10/2001, processo n.º 0131262, disponível in www.dgsi.pt, no qual é defendido que: “I - A razão de ser da comparticipação dos condóminos nas despesas comuns reside na afectação ou possibilidade de aproveitamento da serventia de certos bens ou serviços ao uso de determinadas fracções do condomínio. II - A obrigação de contribuição para as referidas despesas não depende da efectiva utilização, mas, tão só, da possibilidade de utilização dessas coisas comuns ao serviço da utilização da fracção.”
58. Como observam P. de Lima e A. Varela (Cód. Civil Anotado, vol. III, pág. 432), nem sempre é fácil determinar a intensidade relativa do uso que cada condómino possa fazer das coisas comuns. O que conta para a nossa lei é a destinação objectiva dessas coisas – é o uso que cada condómino delas pode fazer, medido, em princípio, pelo valor relativo de cada fracção, e não o uso que efectivamente faça delas. A responsabilidade pelas despesas de conservação subsistirá mesmo em relação àqueles condóminos que, podendo fazê-lo, não utilizem as respectivas fracções e se não sirvam, por conseguinte, das partes comuns do prédio.
59. Escreve Aragão Seia, in " Propriedade Horizontal", 2ª ed., 202, pág. 129: "se no último piso houver um terraço de uso comum ou na cave existirem arrumos de todos os condóminos, ao lado de fracções utilizadas individualmente, todos os condóminos terão que suportar os encargos com as escadas que lhe dão acesso, embora as utilizem esporadicamente". E acrescenta: "não se pode considerar isento de responsabilidade pelos encargos de conservação e fruição das partes comuns do prédio, qualquer condómino cuja fracção esteja objectivamente em condições de ser servida por essas partes, só porque delas se não quer servir".
60. Face ao disposto no n.º 3 do artigo 1424.º do C. Civil, “as despesas relativas às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum ou alguns dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem", sendo que, nos termos do nº 4 da mesma disposição, "nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas fracções por eles possam ser servidas ".
61. Destinação, fruição ou afectação necessariamente exclusivas, pois, versus a possibilidade ou susceptibilidade da sua utilização comum; na primeira hipótese, as despesas deverão ser custeadas apenas pelos condóminos efectiva e exclusivamente utilizadores, na segunda por todos os condóminos que queiram e possam (para sua conveniência ou comodidade) utilizar as partes ou os equipamentos comuns.
62. No caso dos autos, é patente que os ascensores não servem exclusivamente algum ou alguns condóminos, antes podendo servir (também) todas as fracções autónomas do prédio sem excepção, pelo que se encontram objectivamente em condições de afectação ao uso comunitário dos condóminos.
63. Sendo que, e contrariamente ao defendido pelo Mm.º Juiz a quo, não releva a necessidade, ou não, de utilização dos elevadores, nem tão pouco a intensidade dessa utilização (esporádica ou frequente), mas sim o uso que casa condómino delas pode fazer (e não o uso que efectivamente faça delas).
64. Como demonstrado nos autos, a utilização dos ascensores do edifício quer pela Autora quer pelos demais condóminos sem excepção é totalmente livre, não só para circulação interior do prédio e, designadamente nas suas partes comuns, como necessária para aceder à cave onde se situam os equipamentos de interesse comum do edifício (vide ponto 20 da matéria de facto dada como provada) e à cobertura do edifício, em alternativa à escadaria.
65. Sendo que, contrariamente ao afirmado pelo Tribunal recorrido, para decidir da participação da Autora nas despesas dos elevadores não é decisivo o que consta do título constitutivo, o qual não se sobrepõe à Lei (até porque, a ser assim, a Autora proprietária das fracções e autora do título de propriedade horizontal estaria legitimada a uma subversão da Lei com recurso a tal expediente e o que jamais se aceita nem se concebe).
66. Não é pelo facto de o título constitutivo não estabelecer que os elevadores são comuns às fracções da Autora (sendo que, nos termos acima expostos, tal afirmação é inexacta) que a mesma fica desonerada de comparticipar nas respectivas despesas ou encargos; pois que tal responsabilidade resulta da Lei, nomeadamente e tal como estabelecido no artigo 1424.º, n.º 4 do Código Civil, da circunstância das suas fracções poderem ser servidas por elevadores, como efectivamente é verdade.
67. Assim sendo, e atento o pedido formulado nos autos – de anulação da deliberação tomada quanto ao ponto dois da ordem de trabalhos da assembleia de condóminos realizada em 31/08/2020 na parte em que põe a cargo da Autora a obrigação de comparticipar no encargos de conservação e manutenção dos elevadores – de acordo com a tese defendida pelo Supremo Tribunal de Justiça, acima identificado, com os fundamentos constantes do acórdão que aqui se junta e cujo teor se dá por reproduzido, supra transcritos, e que o Recorrente sufraga e adere na sua íntegra, não há dúvidas de que as fracções da Autora se encontram objectivamente em condições de poderem servir-se dos elevadores do edifício, pelo que a mesma deve participar nos respectivos encargos ou despesas.
68. O artigo 1424.º, n.º 1 do Código Civil estabelece a regra supletiva de distribuição dos encargos comuns em função da permilagem, o que significa que a participação de cada um dos condóminos nas despesas é estabelecida em função do valor relativo das respectivas fracções e o qual está prefixado no título constitutivo da propriedade horizontal, em percentagem ou permilagem.
69. Estabelece-se o valor que tem cada fracção no valor global do edifício e a repartição dos encargos faz-se segundo este critério, quando não houver especial critério de repartição desses encargos (neste sentido Mota Pinto, Direitos Reais, Coimbra, 1971, págs. 282 e ss.).
70. Assim, na falta de critério de repartição especial, é aplicável nos autos a regra supletiva legal do artigo 142.º, n.º 1 do Código Civil, ou seja, a Autora deve comparticipar nas despesas com os elevadores na proporção do valor das suas fracções, que é também o critério adoptado no regulamento de condomínio - sua cláusula 9ª, alínea a).
71. Em face da factualidade apurada nos autos e dada como provada e uma correcta interpretação e aplicação do Direito impunha, como impõe, ao Mm.º Juiz a quo uma decisão diversa na sentença recorrida, nomeadamente no sentido de improcedência da acção, pugnando-se que a Autora está obrigada a comparticipar nas despesas com os elevadores na proporção do valor das suas fracções, pelo que a mesma deverá ser revogada por violação do disposto no artigo 1424.º do Código Civil e substituída por outra em conformidade.

A A. contra alegou tendo terminado as suas alegações com as seguinte conclusões:

a) A douta sentença recorrida não enferma de qualquer nulidade, nomeadamente a apontada pela recorrente;
b) Não se verifica qualquer contrariedade do Mm.º Juiz a quo e, consequentemente da sentença recorrida, ao referir que é possível aceder a cada um dos cinco blocos do prédio, que se interligam a nível da cave e de parte do rés-do-chão, por um lado, mas que as fracções autónomas de que a autora é proprietária não são servidas pelos ascensores, por outro lado;
c) Aceder e utilizar são conceitos diferentes;
d) Aceder significa que se pode atingir, alcançar, chegar lá e utilizar significa servir-se de, ou usar algo;
e) Materialmente, os elevadores existentes no prédio são acessíveis às fracções autónomas individualizadas pelas letras ..., ..., ... e ..., mas não cobra qualquer justificação o seu uso, porquanto todas elas estão localizadas no rés-do-chão, precisamente ao nível da entrada para as ditas fracções autónomas;
f) Utilizar o elevador nesta circunstância significa um contra-senso, sem qualquer justificação minimamente atendível;
g) O condómino da fracção autónoma localizada no rés-do-chão quando não utilize o elevador por não possuir qualquer arrecadação ou garagem nos pisos superiores ou inferiores, está isento de contribuir para as despesas do elevador;
h) É este e só este o critério do disposto no nº 4 do artigo 1424º do C.C.;
i) Decorre do teor do documento complementar do título constitutivo da propriedade horizontal que não é comum às fracções ..., ..., ... e ... qualquer um dos elevadores existentes no prédio;
j) Não ocorre, assim, qualquer contradição entre os factos provados elencados nos pontos 18 e 19 e os não provados constantes dos pontos 3, 4 e 5;
k) Relativamente à matéria de facto não cobra qualquer justificação nem fundamento a pretensão formulada pela recorrente;
l) A transcrição parcial dos depoimentos selecionados pela recorrente são absolutamente insanes, insusceptíveis de alterar a matéria de facto não provada no segmento propugnado pela recorrente;
m) Contrariamente ao sustentado pela recorrente, o tribunal recorrido fez correcto e judicioso enquadramento fáctico-legal e muito correcta e criteriosa interpretação e aplicação do Direito, nomeadamente do disposto no artigo 1424º do C.C.;
n) As fracções autónomas propriedade da autora não têm qualquer elemento constitutivo na cave nem nos pisos superiores, incluindo a cobertura do edifício;
o) A recorrente constrói uma narrativa totalmente artificiosa e falaciosa quanto ao interesse da recorrida no uso dos elevadores;
p) Como muito assertivamente é dito na douta sentença recorrida: “o facto de ser possível transitar pelos cinco blocos que compõem o prédio, designadamente fazendo uso dos elevadores ou as escadas desde o rés-do-chão até à cave, e depois da cave novamente para o rés-do-chão (através de um trajecto, como já referimos, sinuoso e carecido de qualquer lógica utilitarista), e desse modo aceder a qualquer uma das fracções de que a A. é dona, não autoriza a R. a colocar sobre os ombros daquela a obrigação de comparticipar nas despesas respectivas.”;
q) Nem a existência do equipamento exterior do ar condicionado colocado na cobertura do prédio altera a situação;
r) O que releva para efeitos da aplicação do disposto no nº 4 do artigo 1424º do C.C. é que a utilização do elevador sirva a fracção autónoma propriamente dita;
s) Na fracção autónoma incluem-se as suas partes componentes, nomeadamente arrecadações, garagens ou quaisquer outras divisões, o que manifestamente não sucede com referência às fracções propriedade da autora, já que não dispõem destas partes componente, como resulta do título constitutivo da propriedade horizontal;
t) O título constitutivo da propriedade horizontal é um acto modelador do estatuto da propriedade horizontal e as suas determinações têm natureza real e, portanto, eficácia erga omnes, sendo certo que o mesmo título só pode ser alterado nos termos do disposto no nº 2 do artigo 1419º do C.C.;
u) Não merece, assim, qualquer censura a douta decisão recorrida, que deverá manter-se integralmente.

O Sr. Juiz a quo pronunciou-se quanto à nulidade invocada, considerando não se verificar a mesma e indeferindo-a.

2. Questões a apreciar

O objecto do recurso é balizado pelo teor do requerimento de interposição (artº 635º nº 2 do CPC), pelas conclusões (art.ºs 608º n.º 2, 609º, 635º n.º 4, 637º n.º 2 e 639º n.ºs 1 e 2 do CPC), pelas questões suscitadas pelo recorrido nas contra-alegações em oposição àquelas, ou por ampliação (art.º 636º CPC) e sem embargo de eventual recurso subordinado (art.º 633º CPC) e ainda pelas questões de conhecimento oficioso, cuja apreciação ainda não se mostre precludida.

O Tribunal ad quem não pode conhecer de questões novas (isto é, questões que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que “os recursos constituem mecanismo destinados a reapreciar decisões proferidas, e não a analisar questões novas, salvo quando… estas sejam do conhecimento oficioso e, além disso, o processo contenha elementos imprescindíveis” (cfr. António Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, 7ª edição, Almedina, p. 139).

Pela sua própria natureza, os recursos destinam-se à reapreciação de decisões judiciais prévias e à consequente alteração e/ou revogação, pelo que não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objeto de apreciação da decisão recorrida.

As questões que cumpre apreciar são:
- a sentença é nula nos termos da alínea c) do n.º 1 do art.º 615º do CPC, porque os fundamentos estão em oposição com a decisão?
- os pontos 3), 4) e 5) dos factos não provados, devem considerar-se provados?
- a sentença recorrida violou o disposto no art.º 1424º, n.º 4, do CC?

3. Nulidade da sentença
3.1. Enquadramento jurídico
Dispõe o o art.º 615º do CPC:
“1. É nula a sentença quando:
(…)
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão (…)”

A sentença pode ser vista como trâmite ou como acto: no primeiro caso, atende-se à sentença no quadro da tramitação da causa; no segundo, considera-se o conteúdo admissível ou necessário da sentença.

As nulidades da sentença e dos acórdãos referem-se ao conteúdo destes actos, ou seja, estas decisões não têm o conteúdo que deviam ter ou têm um conteúdo que não podiam ter (cfr. Miguel Teixeira de Sousa, in O que é uma nulidade processual? in Blog do IPPC, 18-04-2018, disponível em https://blogippc.blogspot.com/search?q=nulidade+processual).

Os fundamentos devem possuir uma relação lógica com a decisão, ou seja, deve haver uma relação de concordância entre os fundamentos e a decisão.

Assim, a oposição entre os fundamentos e a decisão verifica-se quando ocorre incompatibilidade entre os fundamentos e a decisão, ou seja, em que a fundamentação aponta num sentido que contradiz o resultado final (Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa, CPC Anotado, I, 2ª edição, pág. 763).

Se na fundamentação de direito da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, mas, no decisório, concluir noutro sentido, oposto ou divergente, esta oposição será causa da nulidade da sentença.

A contradição entre fundamentos e a decisão é estritamente no plano lógico da construção da decisão.

Se se concluir que é contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, estamos perante um erro de julgamento da matéria de facto, que não dá lugar à nulidade da sentença, mas à aplicação do disposto na alínea c) do n.º 1 do art.º 662º do CPC – anulação da decisão proferida na 1.ª instância, se não constarem do processo todos os elementos que, nos termos do número 1, permitam suprir aquela contradição; supressão da contradição, se constarem do processo todos os elementos para tal.

A este respeito refere o Ac. da RC de 20/01/2015, proc. nº 2996/12.0TBFIG.C1, consultável in www.dgsi.pt/jtrc: “Apesar de actualmente o julgamento da matéria de facto se conter na sentença final, há que fazer um «distinguo» entre os vícios da decisão da matéria de facto e os vícios da sentença, distinção de que decorre esta consequência: os vícios da decisão da matéria de facto não constituem, em caso algum, causa de nulidade da sentença, considerando além do mais o carácter taxativo da enumeração das situações de nulidade deste último acto decisório.
Realmente a decisão da matéria de facto está sujeita a um regime diferenciado de valores negativos - a deficiência, a obscuridade ou contradição dessa decisão ou a falta da sua motivação - a que corresponde um modo diferente de controlo e de impugnação: qualquer destes vícios não é causa de nulidade da sentença, antes é susceptível de lugar à actuação por esta Relação dos seus poderes de rescisão ou de cassação da decisão da matéria de facto da 1ª instância (artº 662 nº 2 c) e d) do NCPC).”

Realidade diversa é, ainda, o próprio silogismo estar errado no seu mérito, por conter uma contradição com os factos ou com o direito: trata-se, então, de erro de julgamento (de direito), por o juiz decidir contra os factos ou contra “lei” que lhe impunha uma decisão diversa (Rui Pinto, Manual do Recurso Civil, AAFDL Editora, pág. 83).

A este respeito afirmam Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in CPC Anotado, Vol. 2, 3ª edição, pág. 736-737;
“Entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta para determinada consequência jurídica e na conclusão é tirada outra consequência, ainda que esta seja a juridicamente correcta, a nulidade verifica-se.”

3.2. Em concreto

Em primeiro lugar e como ficou a constar do enquadramento jurídico, qualquer eventual contradição entre determinados factos, não determina a nulidade da sentença, mas a aplicação do disposto na alínea c) do n.º 2 do art.º 662º do CPC.
Destarte, a alegação do recorrente de que há uma contradição entre os factos provados e não provados, não tem qualquer préstimo para considerar a sentença nula à luz do disposto no art.º 615º, n.º 1, alínea c) do CPC.

Sempre se dirá que, como foi considerado pelo Ac. do STJ de 17/11/2023, proc. 8344/17.6T8STB.E1.S1, consultável in /www.dgsi.pt/jstj (sublinhado nosso): “Em regra, não há contradição entre «respostas» positivas e negativas, pois, no que respeita a estas, seria como se não existissem ou tivessem sido alegadas. Mas, excepcionalmente, há casos em que pode haver contradição, como sucede na situação em que as respostas negativas não acolham facto que integra antecedente lógico necessário de resposta afirmativa ou a resposta negativa tenha conteúdo sobreponível ao da resposta positiva. Não ocorrendo nenhuma dessas situações, não há motivo para se concluir pela contradição.”

Em segundo lugar verifica-se que o recorrente invoca o afirmado na motivação da decisão de facto.

Sucede que os “fundamentos” a que se refere a alínea c) do n.º 1 do art.º 615º, são os “fundamentos de direito”, pois são esses que conduzem directamente à decisão final e não a motivação da decisão de facto, que actua, apenas, no plano da decisão de facto, ou seja, justifica apenas e tão só a decisão de considerar dado facto como provado ou não provado.

Destarte, a alegação do recorrente de que há uma contradição entre a motivação da decisão de facto e a decisão final da sentença, também não tem qualquer préstimo para considerar a sentença nula à luz do disposto no art.º 615º, n.º 1, alínea c) do CPC.

Em terceiro lugar o recorrente convoca o afirmado em sede de “Fundamentação de direito” e que tem o seguinte teor:
“Como já se disse, os ascensores ou elevadores não são forçosa nem necessariamente partes comuns do edifício.
(…)
Assim sendo, temos que o título constitutivo da propriedade horizontal em apreço exclui expressamente os elevadores existentes no edifício da compropriedade da A. sobre as partes comuns.
(…)
Não obstante, cremos que o argumento fundamental que permite considerar que a A. não deve ser chamada a comparticipar nas despesas decorrentes do funcionamento e manutenção/conservação dos elevadores decorre do teor das normas, já citadas, dos n.ºs 3 e 4 do artigo 1424.º do Código Civil. De facto, as fracções autónomas de que a A. é dona situam-se, todas elas, ao nível do rés-do-chão do edifício, não se vislumbrando por isso que aquela tenha necessidade de se servir dos elevadores para a elas aceder. Na verdade, as fracções ... e ... têm um acesso directo desde a via pública, através do logradouro situado a poente, através de entradas exclusivas com os n.ºs de polícia ...1 e ...7; e o acesso às fracções ... e ... é feito através do acesso comum às garagens situadas no rés-do-chão – portão eléctrico –, e através das entradas com os n.ºs de polícia ...6 e ...0. Ou seja, no acesso às fracções de que é proprietária a A. não utiliza nenhum dos elevadores instalados no edifício ou, dito de outro modo, tais fracções autónomas não são nem podem ser servidas pelos ascensores instalados no edifício que é objecto de controvérsia nos autos. Como já vimos, este critério prende-se fundamentalmente com a possibilidade/necessidade de o condómino aceder à fracção através da utilização do(s) elevador(es)…
(…)
O mesmo raciocínio é válido quanto aos equipamentos de ar condicionado colocados na cobertura do prédio que beneficiam as fracções ... e .... Mesmo que, como se afigura natural, a A. utilize os elevadores ou as escadas para, subindo à cobertura do prédio, proceder à manutenção dos referidos aparelhos, estamos perante uma utilização muito esporádica quer daquele equipamento, quer daquela estrutura, que não se deve confundir com o acesso à fracção em si mesma (…)” (cfr. pág.s 20, 21 e 22 da sentença).

Importa recordar o decisório:
“Nestes termos, na parcial procedência da acção, decide-se anular a deliberação aprovada na Assembleia de Condóminos realizada no dia 31 de Agosto de 2020 no que respeita ao ponto dois da respectiva “Ordem de Trabalhos”, apenas na parte que põe a cargo da A. EMP01..., LDA. a obrigação de comparticipar nos encargos de conservação e manutenção dos elevadores do prédio sito na Rua ..., ... e ..., e na Travessa ... e ..., União das Freguesias ... (... e ...) e ..., concelho ....”

Lendo a fundamentação de direito, a mesma, tomando como premissa de direito o n.º 4 do art.º 1424º do CC, o qual dispõe que “Nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas fracções por eles possam ser servidas”, considerou que “a A. não deve ser chamada a comparticipar nas despesas decorrentes do funcionamento e manutenção/conservação dos elevadores”, porque “as fracções autónomas de que a A. é dona situam-se, todas elas, ao nível do rés-do-chão do edifício, não se vislumbrando por isso que aquela tenha necessidade de se servir dos elevadores para a elas aceder.”

Sendo este, muito resumidamente, o cerne da fundamentação de direito, não há qualquer oposição entre ela e a decisão de anular a deliberação aprovada na Assembleia de Condóminos realizada no dia 31 de Agosto de 2020, na parte que põe a cargo da A. a obrigação de comparticipar nos encargos de conservação e manutenção dos elevadores do prédio sito na Rua ..., ... e ..., e na Travessa ... e ..., União das Freguesias ... (... e ...) e ..., concelho ....

Pelo contrário: há uma relação de concordância entre a fundamentação de direito e a decisão final.

Em face do exposto e sem necessidade de ouras considerações por desnecessárias, julga-se improcedente a invocada nulidade da sentença.

4. Fundamentação de facto

4.1. A decisão de facto recorrida tem o seguinte teor:
A. FACTOS PROVADOS.
1. Encontram-se descritas na Conservatória do Registo Predial ..., a favor da A., por permuta, sob os n.ºs ...51..., ...51..., ...51... e ...51..., as fracções autónomas individualizadas pelas letras ..., ..., ...” do prédio urbano sito na Rua ... e na Travessa..., Lugar ..., ..., inscritos nas matrizes prediais respectivas sob os artigos ... União de freguesias ... (... e ...) e ....
2. No dia 31 de Agosto de 2020, pelas 20h30, realizou-se uma Assembleia Geral de Condóminos do prédio urbano supra identificado, com a seguinte ordem de trabalhos:
- Ponto 1: apresentação, análise, discussão e votação das contas do condomínio referentes ao período de 1 de Maio de 2019 a 30 de Abril de 2020;
- Ponto 2: apresentação, análise, discussão e votação do orçamento e empresa a administrar o condomínio para o período de 1 de Maio de 2020 a 30 de Abril de 2021.
- Ponto 3: outros assuntos de interesse do condomínio.
3. A realização da Assembleia de Condóminos foi precedida da convocatória enviada aos condóminos do prédio.
4. Nessa Assembleia estiveram presentes e representados os condóminos das fracções autónomas individualizadas pelas letras ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ..., representativas de 63,86% do valor total do edifício.
5. Relativamente ao ponto dois da ordem de trabalhos consta da acta n.º ...8, de 31 de Agosto, de 2020, o seguinte: “Para o período de 1 de maio de 2020 a 30 de abril de 2021, foram apresentados orçamentos, pela empresa de EMP03..., Unip., Ldª. e pela empresa “EMP02...”
Colocados a votação, os dois orçamentos, o resultado foi a favor da empresa e orçamento apresentado pela empresa “EMP02...”, com os votos a favor das fracções ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ... (33,97%), Abstenções “..”, “..” e “..”(9,24 %), Contra, “..”, “..”, “..”, “..”, “..” e “..”(20,65 %).
Assim, foi nomeada para administrar o condomínio a empresa EMP02... a partir de 1.09.2020., recebendo os honorários de administração a empresa cessante de maio a agosto de 2020”.
6. Até à realização da Assembleia de condóminos, o condomínio do prédio foi administrado pela empresa EMP03..., Unipessoal, Lda.
7. O orçamento apresentado na referida Assembleia pela sociedade EMP02..., Unipessoal, Lda. tinha o valor de 19.710,00 €, e o orçamento apresentado pela empresa EMP03..., Lda., em funções na altura, tinha o de 18.917,71 €.
8. Ambos os orçamentos discriminavam, por rúbricas, os valores parcelares orçamentados, bem como a distribuição por cada uma das fracções autónomas dos valores a suportar.
9. A maioria dos condóminos presentes na Assembleia de Condóminos realizada no dia 31 de Agosto de 2020 aprovou o orçamento apresentado pela sociedade EMP02..., Unipessoal, Lda. que, consequentemente, foi nomeada para administrar o condomínio do prédio para o período de 1 de Maio de 2020 a 30 de Abril de 2021.
10. De acordo com o orçamento aprovado na referida Assembleia, a A. comparticipa nos encargos de conservação e manutenção dos elevadores e das despesas com a electricidade consumida nas partes comuns dos blocos com entrada pelos n.ºs de polícia ...3 e ...5, em função da permilagem das respectivas fracções autónomas.
11. Por escritura pública celebrada no dia 13 de Março de 2009, a sociedade EMP01..., Lda., constituiu o prédio identificado em regime de propriedade horizontal e declarou que o mesmo tem a seguinte composição:
A – bloco ...
- fracção autónoma ... (...) 6,94%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 3,20%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 3,07%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 3,45%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 3,46%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 3,12%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 3,04%
B – bloco ...
- fracção autónoma ... (...) 6,14%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 3,13%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 3,21%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 3,49%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 3,42%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 2,97%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 3,01%
C – bloco ...
- Fracção autónoma ... (... andar) 3,67%
- Fracção autónoma ... (... andar) 3,67%
- Fracção autónoma ... (... andar) 3,94%
Ação de Processo Comum
D – bloco ...
- fracção autónoma ... (...) 1,06%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 2,50%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 2,98%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 2,48%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 3,04%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 2,34%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 2,81%
E – bloco ...
- fracção autónoma ... (...) 0,97%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 3,16%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 3,20%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 3,11%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 3,35%
- Fracção autónoma ... (... andar) 3,03%
- Fracção autónoma ... (... andar.) 3,04%.
12. Segundo a referida escritura pública e documento complementar anexo, as fracções autónomas individualizadas pelas letras ... e ... destinam-se a comércio, as fracções ... e ... destinam-se a garagens de aparcamento automóvel, e as fracções ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ... destinam-se a habitações.
13. Estabelece, ainda, a referida escritura que “São comuns a todas as fracções: - um logradouro com a área de noventa e dois metros quadrados e trinta decímetros, situado no lado poente do prédio e por intermédio do qual se faz o acesso às fracções situadas nos blocos ... e ... proveniente da Rua ..., logradouro este identificado na planta de implantação junta pelo algarismo um; - um logradouro com a área de setenta metros quadrados e dez decímetros no qual se engloba parte de uma rampa, situado no lado poente do prédio e por intermédio do qual se faz o acesso automóvel à cave, proveniente da Rua ..., logradouro este identificado na planta de implantação junta pelo algarismo dois; - um logradouro com a área de oitocentos e quarenta e seis metros quadrados e noventa e seis decímetros no qual se engloba um parque desportivo, situado nos lados sul e nascente do prédio e que está identificado na planta de implantação junta pelo algarismo três: - uma divisão no rés-do-chão com uma pequena cozinha e uma instalação sanitária, destinada a sala de condomínio; - um hall no rés-do-chão que estabelece a comunicação entre o logradouro identificado pelo algarismo três, a sala de condomínio e uma área interior de circulação automóvel.
É comum às fracções ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ..., uma área ampla de circulação a nível da cave destinada à manobra de veículos para aparcamento nas respectivas garagens;
É comum às fracções ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ..., uma área ampla de circulação a nível do rés-do-chão, destinada à manobra de veículos para aparcamento nas respectivas garagens, sendo permitida a utilização desta área às restantes fracções que compõem o prédio apenas para o acesso à sala do condomínio que nesse piso se localiza, bem como o acesso ao logradouro identificado pelo algarismo três.
É comum às fracções ..., ..., ..., ..., ... e ...: - o elevador que estabelece a comunicação entre a cave, o rés-do-chão, o primeiro, o segundo e o ... andar do bloco ..., bem como a respectiva casa das máquinas a nível da cobertura; - um átrio exterior e um vestíbulo interior, situados a nível do rés-do-chão do bloco ..., que comunicam entre si por intermédio de uma porta de entrada com o número de polícia ... e por intermédio dos quais se faz o acesso às fracções destinadas a habitações proveniente da Rua ...; - a escada interior que tendo início no vestíbulo interior atrás referido dá acesso aos andares; - a escada interior que tendo início no vestíbulo interior atrás referido dá acesso à cave; - um hall a nível da cave, que estabelece a comunicação entre a área de circulação automóvel, a caixa de escadas e o elevador que servem o bloco ...; - uma divisão situada na cave sob o lanço de escadas que liga este piso ao rés-do-chão, destinada a recolha de materiais de limpeza das zonas comuns deste bloco.
- É comum às fracções ..., ..., ..., ..., ... e ...: - o elevador que estabelece a comunicação entre a cave, o rés-do-chão, o primeiro, o segundo e o ... andar do bloco ..., bem como a respectiva casa das máquinas a nível da cobertura; - um átrio exterior e um vestíbulo interior, situados a nível do rés-do-chão do bloco ..., que comunicam entre si por intermédio de uma porta de entrada com o número de polícia setenta e três e por intermédio dos quais se faz o acesso às fracções destinadas a habitações proveniente da Rua ...; - a escada interior que tendo início no vestíbulo interior atrás referido dá acesso aos andares; - a escada interior que tendo início no vestíbulo interior atrás referido dá acesso à cave; - um hall a nível da cave, que estabelece a comunicação entre a área de circulação automóvel, a caixa de escadas e o elevador que servem o bloco ...; - uma divisão situada na cave sob o lanço de escadas que liga este piso ao rés-do-chão, destinada a recolha de materiais de limpeza das zonas comuns deste bloco.
É comum às fracções ..., ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e ...; - um átrio exterior e um vestíbulo interior, situados a nível do rés-do-chão dos blocos ... e ..., que comunicam entre si por intermédio de uma porta de entrada com o número de polícia vinte e seis e por intermédio dos quais se faz o acesso às fracções destinadas a habitações proveniente da Travessa...; - a escada interior que tendo início no vestíbulo interior atrás referido dá acesso à cave; - um hall a nível da cave, que estabelece a comunicação entre a área de circulação automóvel, a caixa de escadas e o elevador que serve o bloco ...;
É comum às fracções ..., ... e ...: - o elevador que estabelece a comunicação entre a cave, o rés-do-chão, o primeiro, o segundo e o ... andar do bloco ..., bem como a respectiva casa das máquinas a nível da cobertura; - a escada interior que tendo início no vestíbulo interior atrás referido dá acesso aos andares do bloco ...; - uma divisão situada na cave sob o lanço de escadas que liga este piso ao rés-do-chão, destinada a recolha de materiais de limpeza das zonas comuns do bloco ...; - um hall a nível do rés-do-chão, junto do elevador que serve este bloco ..., que estabelece a comunicação entre o vestíbulo interior atrás referido e a área de circulação automóvel a nível do rés-do-chão.
É comum às fracções ..., ..., ..., ..., ... e ...: - o elevador que estabelece a comunicação entre a cave, o rés-do-chão, o primeiro, o segundo e o ... andar do bloco ..., bem como a respectiva casa das máquinas a nível da cobertura; - a escada interior que tendo inicio no vestíbulo interior atrás referido dá acesso aos andares do bloco ...; - um hall a nível do rés-do-chão, junto do elevador que serve este bloco ..., que estabelece a comunicação entre o vestíbulo interior atrás referido e a área de circulação automóvel a nível do rés-do-chão; - uma divisão situada na cave, destinada a recolha de materiais de limpeza das zonas comuns do bloco ...; - um hall a nível da cave, que estabelece a comunicação entre a área de circulação automóvel, o arrumos do condomínio e o elevador que serve o bloco ....
É comum às fracções ..., ..., ..., ..., ... e ...: - o elevador que estabelece a comunicação entre a cave, o rés-do-chão, o primeiro, o segundo e o ... andar do bloco ..., bem como a respectiva casa das máquinas a nível da cobertura; - um átrio exterior e um vestíbulo interior, situados a nível do rés-do-chão do bloco ..., que comunicam entre si por intermédio de uma porta de entrada com o número de polícia cinquenta e por intermédio dos quais se faz o acesso às fracções destinadas a habitações proveniente da Travessa...; - a escada interior que tendo início no vestíbulo interior atrás referido dá acesso aos andares; - a escada interior que tendo início no vestíbulo interior atrás referido dá acesso à cave; - um hall a nível da cave, que estabelece a comunicação entre a área de circulação automóvel, a caixa de escadas e o elevador que servem o bloco ...; - uma divisão situada na cave sob o lanço de escadas que liga este piso ao rés-do-chão, destinada a recolha de materiais de limpeza das zonas comuns deste bloco; - um hall a nível do rés-do-chão, junto do elevador que serve este bloco ..., que estabelece a comunicação entre o vestíbulo interior atrás referido e a área de circulação automóvel a nível do rés-do-chão”.
14. As fracções autónomas individualizadas pelas letras ... e ..., destinadas ao exercício de actividades comerciais, têm acesso directo da via pública através do logradouro situado a poente, e entradas exclusivas através dos n.ºs de polícia ...1 e ...7, sitas na Rua ....
15. Também é possível aceder às fracções autónomas individualizadas pelas letras ... e ... pelas entradas correspondentes aos n.ºs de polícia ...3 e ...5 (blocos ... e ...), com o esclarecimento que, para o efeito, tem que se percorrer um trajecto mais longo.
16. As fracções autónomas individualizada pelas letras ... e ... eram compostas, cada uma delas, por uma garagem, situadas, igualmente, no piso do rés-do-chão, cujo acesso é feito pelo portão eléctrico a que correspondem os números de polícia ...6 e ...0, com o esclarecimento de que, actualmente, esses espaços de garagem estão ocupados por gabinetes.
17. As fracções autónomas individualizadas pelas letras ... e ..., destinadas a garagem, situam-se no rés-do-chão, cujo acesso é feito da via pública através do portão eléctrico a que correspondem os n.ºs de polícia ...6 e ...0 (blocos ... e ...).
18. Os elevadores existentes nos blocos ... e ... são acessíveis às fracções ... e ....
19. Os elevadores existentes nos blocos ... e ... são acessíveis às fracções ... e ....
20. Na zona da cave (piso -1) estão instalados um quadro eléctrico, uma central de detecção de incêndios e bombas eléctricas destinadas a regular o nível freático das águas para evitar inundações no prédio.
21. As fracções autónomas individualizadas pelas letras ... e ... encontram-se arrendadas, tendo sido solicitada autorização aos condóminos, na Assembleia realizada no dia 25 de Março de 2015, para a colocação na cobertura do prédio de máquinas de ar condicionado, autorização que aqueles concederam, dispondo a A. da chave da cobertura do edifício, à qual se acede apenas através das escadas ou dos elevadores do edifício.
22. Segundo a cláusula 4. do “Regulamento Geral do Condomínio” do edifício, “São partes comuns deste prédio:
i.Solo, alicerces, pilares, paredes-mestras, cobertura e todos os elementos da estrutura do prédio;
ii.Entrada do prédio, escadas e corredores de passagem;
iii.Entradas destinadas a veículos;
iv.Vias de circulação de viaturas nas garagens;
v.Instalações de água e esgotos, electricidade, comunicações, gás, etc.;
vi.Logradouro e campo de jogos no interior do prédio;
vii.Sala de Condomínio;
viii.Elevadores e casa dos elevadores;
ix.Antenas colectivas de televisão e/ou cabo de ligação da TV ...”.
23. Segundo a cláusula 14.ª, alínea a) do regulamento supra referido, “Os condóminos têm direito de utilizar não só a sua fracção como as partes comuns do prédio, conforme a Propriedade Horizontal”.
24. Apesar de ser composto de cinco blocos, o edifício em causa possui apenas quatro contadores de energia eléctrica associados aos serviços comuns distribuídos e localizados da seguinte forma:
1. Entrada com o n.º de polícia ...6, que regista a contagem dos serviços comuns do bloco com entrada pelo referido n.º 26, e ainda os consumos das zonas comuns da garagem colectiva comum aos quatro blocos n.ºs ...6, ...0, ...3 e ...5;
2. Entrada com o n.º de polícia ...0, que regista a contagem dos serviços comuns do bloco com a entrada pelo referido n.º ...;
3. Entrada com o n.º de polícia ...3, que regista a contagem dos serviços comuns do bloco com entrada pelo mesmo número de polícia;
4. Entrada com o n.º de polícia ...5, que regista a contagem dos serviços comuns do bloco com entrada pelo mesmo número de polícia.
25. A sala do condomínio, o logradouro onde se situa o corte de ténis (parque desportivo) e as bombas eléctricas que regulam o nível freático das águas para evitar inundações no prédio não possuem contador de electricidade autónomo.
26. A A. é a sociedade construtora e vendedora das respectivas fracções autónomas do prédio urbano sito na Rua ..., ... e ..., e na Travessa ... e ..., em ....
*
B. FACTOS NÃO PROVADOS.

1. As fracções autónomas individualizadas pelas letras ... e ... só têm acesso pelos números de polícia ...1 e ...7, da Rua ....
2. Para aceder a tais fracções, não é possível utilizar ou percorrer qualquer parte comum interior do prédio.
3. A fracção ... é servida pelo elevador existente no bloco ....
4. A fracção ... é servida pelo elevador existente no bloco ....
5. As fracções ... e ... são servidas pelo elevador existente nos blocos ... e ....
6. Os funcionários da empresa arrendatária das fracções autónomas ... e ... servem-se e usam indiscriminadamente as entradas com os n.ºs de polícia ...3 e ...5.
7. A A. sempre comparticipou nas despesas dos elevadores.
8. Para além do referido em 21, a A. dispõe da chave da casa das máquinas situada na cobertura do edifício

4.2. Impugnação da decisão de facto
O recorrente pretende que os pontos 3, 4 e 5 dos factos não provados devem ser considerados provados.

Tais pontos têm o seguinte teor:
3. A fracção ... é servida pelo elevador existente no bloco ....
4. A fracção ... é servida pelo elevador existente no bloco ....
5. As fracções ... e ... são servidas pelo elevador existente nos blocos ... e ....

Antes de mais, cabe perguntar se o conteúdo dos pontos da decisão de facto em referência, constituem efectivamente “factos“ ou estamos perante matéria de direito.

E a questão coloca-se porque o n.º 4 do art.º 607º do CPC dispõe (sublinhado nosso):
“Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados….”

Na parte citada, este normativo dirige um comando ao juiz cujo primeiro sentido é este: na fundamentação (de facto) da sentença, só devem constar factos e não matéria de direito e/ou conclusões ou generalidades.

Ou seja: resulta claro deste normativo que na fundamentação de facto apenas cabem asserções de facto e não asserções conclusivas, genéricas, matéria de direito.

É objecto de discussão a distinção entre matéria de facto e de direito.

Tal discussão não tem aqui cabimento.

Apenas se impõe notar que: i) só casuisticamente se poderá afirmar o que é facto e o que é Direito; ii) em traços gerais podemos assentar que: a) é matéria de facto tudo o que respeita às ocorrências da vida real, todos os acontecimentos concretos da vida, que sirvam de pressuposto às normas legais aplicáveis, sejam eles realidades do mundo exterior, como realidades psíquicas ou emocionais do indivíduo; b) é matéria de direito tudo o que diz respeito à interpretação e aplicação da lei e dos negócios jurídicos.

Retomando a sequência, refere Manuel Tomé Soares Gomes, in Da Sentença Cível, CEJ, 2014, in https://elearning.cej.mj.pt/mod/folder/view.php?id=6202, pág. 19-22, sobre a  linguagem dos enunciados de facto (a expressão é do autor citado), que (o sublinhado é nosso) deve ser expurgada de valorações jurídicas, de locuções metafóricas e de excessos de adjetivação.

E também Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, 6ª edição, pág. 350-351, refere:
“Outro vício que pode detetar-se (...), pode traduzir-se na integração na sentença, na parte em que se enuncia a matéria de facto provada (e não provada), de pura matéria de direito (…).
(…)
Por isso, a patologia da sentença neste segmento apenas se verificará, em linhas gerais, quando seja abertamente assumida como “matéria de facto provada” pura e inequívoca matéria de direito.”

Está em causa nos autos a aplicação do disposto no disposto no art.º 1424º, n.º 4 do CC, o qual dispõe:
Nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas fracções por eles possam ser servidas.

Saber se determinada fracção autónoma pode, ou não, ser servida pelo elevador, é uma conclusão que se há-de extrair do confronto entre a interpretação que for alcançada daquela norma e a factualidade provada, conclusão essa de cariz jurídico, na medida em que produz efeitos jurídicos: se dada fracção autónoma puder ser servida por elevador, o respectivo condómino comparticipa nas despesas dos ascensores, como manda o n.º 4 do art.º 1424º; se dada fracção autónoma não puder ser servida por elevador, o respectivo condómino não comparticipa nas despesas dos ascensores, estando afastada a aplicação do n.º 4 do art.º 1424º.

Destarte, os pontos 3, 4 e 5 dos factos não provados integram uma conclusão jurídica.

Contendo a sentença juízos conclusivos ou matéria de direito, coloca-se agora a questão de como o resolver.

Hoje não existe nenhum normativo idêntico ao artigo 646º, n.º 4 do CPC revogado, que determinava terem-se por não escritas as respostas do tribunal colectivo sobre questões de direito e que se aplicava, por analogia, à matéria conclusiva.
           
Mas o princípio que estava subjacente ao preceito não desapareceu, como tem vindo a decidir a jurisprudência.

Assim:
- no Ac. do STJ de 28/09/2017, proc. 809/10.7TBLMG.C1.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj:
 “Muito embora o art. 646.º, n.º 4, do anterior CPC tenha deixado de figurar expressamente na lei processual vigente, na medida em que, por imperativo do disposto no art.º 607.º, n.º 4, do CPC, devem constar da fundamentação da sentença os factos julgados provados e não provados, deve expurgar-se da matéria de facto a matéria susceptível de ser qualificada como questão de direito, conceito que, como vem sendo pacificamente aceite, engloba, por analogia, os juízos de valor ou conclusivos”.

- no Ac. desta RG de 20.09.2018, proc. 778/16.0T8BCL.G1, consultável in www.dgsi.pt/jtrg em cuja fundamentação consta:
“O Código do Processo Civil de 2013 eliminou o citado preceito [646º n.º 4 do CPC de 1961], no entanto é de considerar que se mantém tal entendimento, interpretando a contrario sensu o n.º 4 do art. 607.º, segundo o qual, na fundamentação da sentença o juiz declara quais os factos que julga provados. Ou seja o tribunal só pode e deve considerar como provado em resultado da prova produzida “os factos” e não as conclusões ou juízos de valor a extrair dos mesmos à luz das normas jurídicas aplicáveis, o que é uma operação intelectual bem distinta.

- no Ac. desta RG de 11.10.2018, proc. 616/16.3T8VNF-D.G1, consultável no mesmo sítio do anterior, onde consta:
“ De resto, ainda que o actual CPC não inclua uma disposição legal com o conteúdo do art.º 646º n.º 4 do pretérito CPC (o qual considerava não escritas as respostas sobre matéria de direito), (…) que tal não permite concluir que pode agora o juiz incluir no elenco dos factos provados meros conceitos de direito e/ou conclusões normativas, e as quais, a priori e antecipada e comodamente, acabem por condicionar e traçar desde logo o desfecho da acção ou incidente, resolvendo de imediato o “thema decidendum”.

- no Ac. do STJ de 19/01/2023, processo 15229/18.7T8PRT.P1.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj consta do respetivo texto que “por imperativo do estatuído no artigo 607º nº 4 do CPC, devem constar da fundamentação da sentença os factos – e apenas os factos – julgados provados e não provados, o que significa que deve ser suprimida toda a matéria deles constante susceptível de ser qualificada como questão de direito, conceito que, como vem sendo pacificamente aceite, engloba, por analogia, juízos de valor ou conclusivos.”
Este mesmo Ac. refere ainda que “saber se um concreto facto integra um conceito de direito ou assume feição conclusiva ou valorativa constitui questão de direito, porquanto não envolve um juízo sobre a idoneidade da prova produzida para a demonstração ou não desse mesmo facto enquanto realidade da vida.”

Em face do exposto, integrando os pontos 3, 4 e 5 dos factos não provados, uma conclusão jurídica, os mesmos não se podem manter, por violação do disposto no art.º 607º n.º 4 do CPC, pelo que se impõe e decide eliminar os mesmos.

Em consequência, está prejudicada a apreciação da deduzida impugnação da decisão quanto àqueles pontos dos factos não provados.

5. Fundamentação de direito
5.1. Contextualização
Decorre da factualidade provada (ponto 1 dos factos provados) que a A., aqui recorrida, é proprietária das fracções autónomas individualizadas pelas letras ..., ..., ...” do prédio urbano sito na Rua ... e na Travessa..., Lugar ..., ..., União de freguesias ... (... e ...) e ....

Adiante precisaremos qual a concreta localização das referidas fracções autónomas.

Resulta também da factualidade provada (ponto 2) que a 31 de Agosto de 2020 realizou-se a Assembleia de Condóminos do prédio sito na Rua ..., ... e ..., e na Travessa ... e ..., União das Freguesias ... (... e ...) e ..., concelho ..., cujo ponto 2 da Ordem de trabalhos era: apresentação, análise, discussão e votação do orçamento e empresa a administrar o condomínio para o período de 1 de Maio de 2020 a 30 de Abril de 2021.

Resulta ainda da factualidade provada que em tal assembleia foi deliberado aprovar um orçamento (ponto 5), de acordo com o qual (ponto 10) a A. comparticipa nos encargos de conservação e manutenção dos elevadores e das despesas com a electricidade consumida nas partes comuns dos blocos com entrada pelos n.ºs de polícia ...3 e ...5, em função da permilagem das respectivas fracções autónomas.

A A., tendo votado contra esta deliberação, requereu a sua anulação.

O tribunal recorrido julgou procedente a pretensão da A., tendo anulado a deliberação em referência, na parte que põe a cargo da A. a obrigação de comparticipar nos encargos de conservação e manutenção dos elevadores do prédio sito na Rua ..., ... e ..., e na Travessa ... e ..., União das Freguesias ... (... e ...) e ..., concelho ....

Insurge-se o Condomínio contra a referida decisão, pretendendo a sua revogação.

5.2. Enquadramento jurídico
Dispõe o n.º 1 do artigo 1433.º do Código Civil:
“As deliberações da assembleia contrárias à lei ou a regulamentos anteriormente aprovados são anuláveis a requerimento de qualquer condómino que as não tenha aprovado”.

Não está aqui em causa a legitimidade da A. para requerer a anulação da deliberação, sendo certo que, como já ficou referido, a mesma votou contra.

O que aqui está em causa é saber se tal deliberação é “contrária à lei”.

A contrariedade à lei é colocada perante o n.º 4 do art.º 1424º do CC.

Mas para que se possa proceder a uma cabal análise de tal normativo, há que ter em consideração a globalidade do preceito, que tem o seguinte teor:
1 - Salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e relativas ao pagamento de serviços de interesse comum são da responsabilidade dos condóminos proprietários das frações no momento das respetivas deliberações, sendo por estes pagas em proporção do valor das suas frações.
2 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, as despesas relativas ao pagamento de serviços de interesse comum podem, mediante disposição do regulamento de condomínio, aprovada, sem oposição, por maioria dos condóminos que representem a maioria do valor total do prédio, ficar a cargo dos condóminos em partes iguais ou em proporção à respetiva fruição, desde que devidamente especificadas e justificados os critérios que determinam a sua imputação.
3 - As despesas relativas às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem.
4 -  Nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas fracções por eles possam ser servidas.
5 - Nas despesas relativas às rampas de acesso e às plataformas elevatórias, quando colocadas nos termos do n.º 3 do artigo seguinte, só participam os condóminos que tiverem procedido à referida colocação.
6 - Caso o estado de conservação das partes comuns referidas no n.º 3 do artigo 1421.º afete o estado de conservação ou o uso das demais partes comuns do prédio, o condómino a favor de quem está afeto o uso exclusivo daquelas apenas suporta o valor das respetivas despesas de reparação na proporção indicada no n.º 1, salvo se tal necessidade decorrer de facto que lhe seja imputável. 

O n.º 1 do art.º 1424º, estabelece a regra aplicável à responsabilidade e repartição das “despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e relativas ao pagamento de serviços de interesse comum”: “são da responsabilidade dos condóminos proprietários das frações no momento das respetivas deliberações, sendo por estes pagas em proporção do valor das suas frações.”

Mas esta regra só se aplica, como afirma o preceito logo no seu inicio “[s]alvo disposição em contrário”.

Esta expressão tem um triplo significado:
a) desde logo, salvo disposição legal em contrário, ou seja, quando não exista norma legal que preveja uma diferenciação quanto à imputação/responsabilidade, quer quando estejam em causa “despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício”, quer quando estejam em causa despesas “relativas ao pagamento de serviços de interesse comum”.
É o que sucede nos casos previstos nos n.ºs 3, 4 e 5 do art.º 1424º do CC (não se incluindo o n.º 6, por se tratar de norma que manda aplicar, precisamente, a regra geral constante do n.º 1).
Estes normativos têm em vista hipóteses especiais de “despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício” e de despesas “relativas ao pagamento de serviços de interesse comum” e que são:
- n.º 3: “As despesas relativas às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos…”;
- n.º 4: “[…]as despesas dos ascensores…”;
- n.º 5: “[…]as despesas relativas às rampas de acesso e às plataformas elevatórias, quando colocadas nos termos do n.º 3 do artigo seguinte…”.
E estabelecem para as mesmas uma diferenciação quanto à imputação/responsabilidade:
- n.º 3 – “….. ficam a cargo dos que delas se servem.”
- n.º 4 -  “…só participam os condóminos cujas fracções por eles possam ser servidas.”
- n.º 5 – “… só participam os condóminos que tiverem procedido à referida colocação.”
Tal diferenciação radica na conjugação dos princípios da igualdade (tratando o que é igual de forma igual e o que é desigual de forma desigual, diferenciando o que é diferente) e da proporcionalidade (a contrapartida exigível deve ter em consideração o benefício efectivo ou a possibilidade desse benefício).
Assim, quem beneficia (n.ºs 3 e n.º 5) ou pode beneficiar (n.º 4) de determinado equipamento ou serviço, é quem deve comparticipar na respetiva despesa.
b) salvo disposição do título constitutivo relativamente às “despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício” em geral.
 “Salvo disposição do título constitutivoporque o n.º 2 do art.º 1424º, ao prever  a possibilidade de “disposição do regulamento de condomínio, aprovada, sem oposição, por maioria dos condóminos que representem a maioria do valor total do prédio”, fá-lo, apenas, tão só e especificamente, no que diz respeito às “despesas relativas ao pagamento de serviços de interesse comum”.
Ao não abranger na possibilidade de “disposição do regulamento do condomínio”, as “despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício”, isso não pode deixar de significar que, para o n.º 1 ter sentido útil, a fonte da “disposição em contrário” para as mesmas, só pode ser o título constitutivo.
c) salvo “disposição do regulamento de condomínio, aprovada, sem oposição, por maioria dos condóminos que representem a maioria do valor total do prédio”, no que diz respeito às “despesas relativas ao pagamento de serviços de interesse comum” em geral (n.º 2 do art.º 1 424º).

Quanto à expressão “em geral” por nós utilizada no final das alíneas b) e c) e concretamente das expressões “despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício” e “despesas relativas ao pagamento de serviços de interesse comum”, quer significar que, como já referido, a regra constante do n.º 1 apenas tem em vista tais despesas “em geral”, porquanto os n.ºs 3, 4 e 5 do preceito preveem hipóteses especiais de despesas, para as quais estabelecem uma diferenciação quanto à imputação/responsabilidade, hipóteses relativamente às quais o legislador não estabeleceu a possibilidade de “disposição em contrário “, como fez no n.º 1, o que tudo conjugado não pode deixar de significar que a norma neles estabelecida não é afastável por disposição do título constitutivo ou do regulamento de condomínio e, ainda menos, por deliberação da assembleia de condóminos, o que a suceder determinará a sua anulabilidade nos termos do n.º 1 do art.º 1433º do CC, por contrariedade à lei.

Para a situação dos autos interessa o n.º 4 do art.º 1424º, cujo teor já acima referimos, sendo essencial aferir o sentido da expressão “cujas fracções por eles possam ser servidas.”

Vejamos para tanto e em primeiro lugar a doutrina.

Henrique Mesquita, in A Propriedade Horizontal, em Rev. Dir. Est. Sociais, XXIII, 1976, p. 130, nota 117 referia
“O que conta, para determinar a participação dos condóminos nas despesas, não é o uso ou fruição que eles fazem das coisas comuns, mas antes o uso ou fruição que podem fazer.”

Pires de Lima e Antunes Varela, in CC Anotado, III, 2ª edição revista e actualizada, anotação ao art.º 1424º, pag.s 432-433, referiam:

“O Código português não perfilhou a regra especial adoptada pelo Código Civil italiano (art.º 1123º, II), quanto às partes comuns do prédio ou coisas comuns do edifício, destinadas a servir os condóminos em medida diferente. Esse critério (da utilidade, que pode ser abstracta ou concretamente determinada) é o da repartição proporcional ao uso que cada condómino possa fazer.
            Embora mais justo, o critério do ei cui interest presta-se às maiores dificuldades de aplicação prática, por nem sempre ser fácil determinar a intensidade relativa do uso que cada condómino possa fazer das coisas comuns (dependente do número de familiares de cada ocupante – condómino, arrendatário ou subarrendatário –, do número de visitas ou clientes de cada um deles, da frequência com que entrem ou saiam de casa, da altura a que a fracção se situe em relação ao rés-do-chão, etc.). O que conta para a nossa lei é a destinação objectiva das coisas comuns – é o uso que cada condómino pode fazer dessas coisas, medido em princípio pelo valor relativo da sua fracção, e não o uso que efectivamente faça delas. A responsabilidade pelas despesas de conservação subsistirá mesmo em relação àqueles condóminos que, podendo fazê-lo, não utilizem (por si ou por intermédio de outrem) as respectivas fracções e se não sirvam, por conseguinte, das partes comuns do prédio.”

E especificamente quanto aos ascensores, referiam:
“Quanto aos ascensores, embora também eles percorram diversos lanços ou pavimentos do prédio, não se estabelece nenhuma repartição seccionada de encargos, semelhante à que é adoptada para os diversos lanços da escada. A limitação estabelecida no n.º 3 leva apenas a excluir dos encargos de manutenção e conservação dos elevadores os titulares das fracções que não possam ser servidas por eles. A exclusão aproveitará em regra aos condóminos cujas fracções estejam situadas no pavimento donde arranca o ascensor ou em piso inferior.
Entre os condóminos que participam nas despesas, o critério de repartição destas é o fixado no n.º 1 (principio da proporcionalidade em função do valor da fracção). Não se atende ao uso mais intensivo dos andares superiores (…), como não toma em conta o uso mais frequente das fracções com maior número de ocupantes, de visitas, de clientes, etc.”.

Abílio Neto, in Manual da Propriedade Horizontal, 1992, pág. 131, referia:
“Nas despesas dos ascensores, salvo estipulação diversa, participam os condóminos cujas fracções por eles possam ser servidas (…). Também aqui o que releva é a possibilidade de utilização do ascensor, e não o seu uso efectivo. Assim, o condómino cuja fracção se situa ao mesmo nível da parte inferior do percurso do ascensor, não pode utilizá-lo como forma de acesso à respectiva fracção e, daí, estar isento das correspondentes despesas. Outro tanto não sucede em relação ao condómino que não utiliza o ascensor porque não quer (v.g., vive no 1º piso e prefere subir a escadas): tal facto não constitui motivo bastante para não partilhar das inerentes despesas.”

Aragão Seia, in Propriedade Horizontal, 2ª edição, Março de 2002, pág. 129 referia:
“Quanto aos ascensores já não é possível uma repartição de encargos semelhantes [na proporção da utilização]: apenas ficam isentos de contribuir para as despesas os condóminos cujas fracções não são servidas por eles, como os do rés do chão, a menos que possuam algum arrumo no último piso ou na cave, no caso desta ser também servida por elevador, ou até se houver no último piso um terraço que possa ser usado por todos os condóminos. A repartição das despesas com os ascensores, por quem tiver de as suportar, obedece ao principio estabelecido no n.º 1, ou seja, em proporção do valor das respectivas fracções; mas se o condómino do rés do chão apenas tiver acesso a um arrumo ou ao uso do terraço comum no último piso, deve ser estabelecida outra proporção, que tenha em consideração o uso diminuto dado por ele ao elevador.”

Na jurisprudência encontraram-se (sem preocupação de exaustão):
- Ac. da RP de 11/10/2001, proc. 0131262, de que apenas está publicado o sumário in www.dgsi.pt/jtrp e que tem o seguinte teor:
I - A razão de ser da comparticipação dos condóminos nas despesas comuns reside na afectação ou possibilidade de aproveitamento da serventia de certos bens ou serviços ao uso de determinadas fracções do condomínio.
II - A obrigação de contribuição para as referidas despesas não depende da efectiva utilização, mas, tão só, da possibilidade de utilização dessas coisas comuns ao serviço da utilização da fracção.
III - Assim, desde que os titulares do gozo de uma fracção autónoma possam utilizar o "ascensor" para a ela aceder ou a partir de qualquer das suas partes componentes aceder a outra parte que faça parte ou esteja incluída na fracção, a obrigação existe.

- o Ac. do STJ de 24/02/2005, proc. 05B094, consultável in www.dgsi.pt/jstj, cujo sumário tem o seguinte teor:           
I. O que releva é o uso que cada condómino pode fazer das partes comuns, medido em princípio pelo valor relativo da sua fracção e não o uso que efectivamente se faça delas; a responsabilidade pelas despesas de conservação subsistirá mesmo em relação àqueles condóminos que, podendo fazê-lo, não utilizem (por si ou por intermédio de outrem) as respectivas fracções e se não sirvam, por conseguinte, das partes comuns do prédio.
II. Se uma "sala do condomínio" e uma "arrecadação geral" do edifício - partes comuns - se localizam no 11° piso do prédio, apenas aí sendo possível aceder através das escadas comuns e dos ascensores do imóvel - também partes comuns - há que concluir, segundo um critério aferidor de carácter objectivo - o único legalmente definidor da situação - ser manifesta a susceptibilidade (abstracta) de as diversas fracções poderem ser servidas pelas referidas partes e equipamentos comuns.
III. Não se pode considerar isento de responsabilidade pelos encargos relativos às partes comuns, qualquer condómino cuja fracção esteja objectivamente em condições de ser servida por essas partes ou equipamentos comuns.
IV. Apenas deverão ficar isentos de contribuir para as despesas de manutenção e conservação dos elevadores os condóminos cujas fracções não são (nem podem ser) servidas por eles como os do rés-do-chão, a menos que possuam algum arrumo no último piso ou na cave (neste incluída uma garagem ou um lugar de aparcamento) no caso desta também ser servida por elevador, ou se houver no último piso um terraço, sala de reuniões ou de convívio que possa ser usada por todos os condóminos.
V. É possível instituir, por acordo maioritário da assembleia de condóminos, um critério equitativo/proporcional de repartição de despesas distinto do da proporcionalidade (permilagem) do valor das respectivas fracções, quiçá em função da regularidade ou da intensidade da utilização das partes ou equipamentos comuns.

- o Ac. da RL de 23/09/2010, proc. 5879/08.5TBCSC.L1-8, consultável in www.dgsi.pt/jtrl, em cujo sumário consta:           
– Os autores, como condóminos donos de uma fracção situada no ... andar do prédio, não estão obrigados ao pagamento das despesas com os elevadores que têm o seu ponto de início exactamente nesse ... andar.
– Isto porque tais elevadores não servem a fracção dos autores que, obviamente, não os podem utilizar nem para sair nem para entrar no prédio e na fracção.

- o Ac. da RL de 06/12/2012, proc. 4/09.4TJLSB.L1-6, consultável in www.dgsi.pt/jtrl, constando o respectivo sumário:
1. De acordo com o disposto no artigo 1424º nº 4 do Código Civil não participam nas despesas de conservação e reparação dos ascensores os condóminos cujas fracções não sejam por eles servidas;
2. Situando-se a fracção no ..., no vestíbulo da entrada principal do prédio, e local de onde parte o elevador, os respectivos proprietários não comparticipam nas despesas com o elevador;
3. É anulável a deliberação tomada em assembleia geral de condóminos na parte em que, contra o voto dos respetivos proprietários, se decidiu que a fracção correspondente ao ... comparticiparia nas despesas de reparação e substituição do elevador.

- o Ac. da RE de 15/09/2022, proc. 2715/19.0T8FAR.E1, consultável in www.dgsi.pt/jtre, em cujo sumário consta:           
1-O critério subjacente à norma constante do n.º 4 do artigo 1424.º do Código Civil relativa à comparticipação de condóminos nas despesas com ascensores, ou elevadores, prende-se essencialmente com a possibilidade de aceder à fracção através da utilização do elevador, independentemente de existir maior ou menor necessidade de tal utilização, ou de esse uso ser ou não efectivo por parte do condómino.
2-Não resultando em concreto demonstrada a possibilidade de tal acesso impõe-se reconhecer o condómino Apelante como desobrigado de comparticipar em tais despesas.

Aqui chegados e atentando no teor literal da norma (o sublinhado é nosso) - Nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas fracções por eles possam ser servidas –, a aplicação da norma depende de saber, no caso concreto, se:
- para aceder a determinada fracção autónoma, a partir da via pública e, naturalmente, para sair da mesma, para a via pública, é utilizável o elevador;
- para aceder a uma extensão dessa fracção autónoma, como seja uma arrecadação ou uma garagem, a partir da fracção autónoma e, naturalmente, para regressar à mesma, é utilizável o elevador.

Assim e face ao teor literal da norma, ressalvado o devido respeito, que é muito, não se acompanha a interpretação ampla veiculada por Aragão Seia – “se houver no último piso um terraço que possa ser usado por todos os condóminos” - seguida pelo Ac. do STJ de 24/02/2005 – “ou se houver no último piso um terraço, sala de reuniões ou de convívio que possa ser usada por todos os condóminos.”

É que o que a norma toma como referencial são as fracções em si mesmas consideradas, incluindo as suas extensões, como sejam garagens ou arrecadações e é com base nelas nelas que estabelece o critério de imputação das despesas e elevadores: poderem ser servidas por elevador, ou seja, para entrar ou sair das mesmas, a partir ou para a via pública ou para aceder a alguma a alguma arrecadação ou garagem que integre as fracções, a partir destas, é utilizável o elevador.

5.3. Em concreto

Como referido supra, decorre da factualidade provada (ponto 1 dos factos provados) que a A., aqui recorrida, é proprietária das fracções autónomas individualizadas pelas letras ..., ..., ...” do prédio urbano sito na Rua ... e na Travessa..., Lugar ..., ..., União de freguesias ... (... e ...) e ....

Impõe-se agora precisar a sua localização.

Resulta do ponto 11 da factualidade provada:
- a fracção autónoma ... situa-se no ... do bloco ...;
- a fracção autónoma ... situa-se no ... do bloco ...;
- a fracção autónoma ... situa-se no ... do bloco ...;
- a fracção autónoma ... situa-se no ... do bloco ....

Além disso, resulta do ponto 12 da factualidade provada que as fracções ... e ... destinam-se a comércio, as fracções ... e ... destinam-se a garagens de aparcamento automóvel.

Resulta do ponto 14 da factualidade provada que as fracções ... e ..., destinadas ao exercício de actividades comerciais, têm acesso directo da via pública através do logradouro situado a poente, e entradas exclusivas através dos n.ºs de polícia ...1 e ...7, sitas na Rua ....

E consta do ponto 15 da factualidade provada que também é possível aceder às fracções ... e ... pelas entradas correspondentes aos n.ºs de polícia ...3 e ...5 (blocos ... e ...), com o esclarecimento que, para o efeito, tem que se percorrer um trajecto mais longo.

O ponto 16 precisa um aspecto: as fracções ... e ... eram compostas, cada uma delas, por uma garagem, situadas, igualmente, no piso do rés-do-chão, cujo acesso é feito pelo portão eléctrico a que correspondem os números de polícia ...6 e ...0, com o esclarecimento de que, actualmente, esses espaços de garagem estão ocupados por gabinetes.

Finalmente resulta do ponto 17 que as as fracções pelas letras ... e ..., destinadas a garagem, situam-se no rés-do-chão, cujo acesso é feito da via pública através do portão eléctrico a que correspondem os n.ºs de polícia ...6 e ...0 (blocos ... e ...).

Ou seja: todas as fracções propriedade da A. situam-se ao nível do ... e têm acesso directo da e para a via pública.

Perante esta factualidade impõe-se concluir que nenhuma das fracções em causa pode ser servida por elevador, pois para se chegar a qualquer uma delas, a partir da via pública ou para sair de qualquer uma delas para a via pública, não é necessário utilizar o elevador, pois todas elas se situam no ... e todas elas têm acesso directo da e para a via pública: i) as fracções ... e ... através do logradouro situado a poente, e entradas exclusivas através dos n.ºs de polícia ...1 e ...7, sitas na Rua ... ou pelas entradas correspondentes aos n.ºs de polícia ...3 e ...5 (blocos ... e ...), mas, neste caso, com um trajecto mais longo; ii) as fracções ... e ..., através do portão eléctrico a que correspondem os n.ºs de polícia ...6 e ...0 (blocos ... e ...).

Note-se que não resulta da factualidade provada que qualquer uma das fracções autónomas em causa tenha uma garagem ou arrecadação em outro piso do edifício.

É irrelevante o que consta dos pontos 18 - os elevadores existentes nos blocos ... e ... são acessíveis às fracções ... e ... – e 19 - os elevadores existentes nos blocos ... e ... são acessíveis às fracções ... e ....

Estes factos apenas dizem – e só podem dizer isso - que acaso se pretenda aceder à cave ou aos pisos superiores ao ..., a partir daquelas fracções, é possível utilizar o elevador.
Mas não é isso que está em causa. O que está em causa é saber se para aceder às fracções autónomas em causa, a partir da via pública ou para sair das mesmas para a via pública, é utilizável o elevador. E a resposta é claramente negativa.

É também irrelevante o que consta do ponto 20 da factualidade provada: na zona da cave (piso -1) estão instalados um quadro eléctrico, uma central de detecção de incêndios e bombas eléctricas destinadas a regular o nível freático das águas para evitar inundações no prédio.

E isso porque as fracções autónomas de que a A. é proprietária não se situam na cave. E, como já disse, o que aqui está em causa, é o acesso às fracções autónomas a partir da via pública ou a saída das mesmas para a via publica.

É ainda irrelevante o que consta do ponto 21: as fracções autónomas individualizadas pelas letras ... e ... encontram-se arrendadas, tendo sido solicitada autorização aos condóminos, na Assembleia realizada no dia 25 de Março de 2015, para a colocação na cobertura do prédio de máquinas de ar condicionado, autorização que aqueles concederam, dispondo a A. da chave da cobertura do edifício, à qual se acede apenas através das escadas ou dos elevadores do edifício.

É que, como já disse, o que aqui está em causa, é o acesso às fracções autónomas em si mesmo consideradas a partir da via pública ou a saída das mesmas para a via pública e não a outras partes comuns do prédio.

E finalmente é irrelevante o que resulta:
- do ponto 22 da factualidade provada: a cláusula 4. do “Regulamento Geral do Condomínio” do edifício, qualifique como partes comuns viii.Elevadores e casa dos elevadores;
- do ponto 23 da factualidade: segundo a cláusula 14.ª, alínea a) do regulamento supra referido, “Os condóminos têm direito de utilizar não só a sua fracção como as partes comuns do prédio, conforme a Propriedade Horizontal”.

O critério de imputação das despesas com ascensores não é a natureza jurídica de tais elementos – partes comuns do prédio -, mas sim a possibilidade de determinada fracção ser servida ou não pelo elevador.

Em face de tudo o exposto: a decisão recorrida deve manter-se e em consequência o recurso deve ser julgado improcedente.

5.4. Custas
As custas da apelação são a cargo do recorrente por vencido – art.º 527º, n.º s 1 e 2 do CPC

6. Decisão

Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes da 1ª Secção desta Relação em manter a decisão recorrida e, em consequência, julgar improcedente o recurso.
*
Custas pelo recorrente – art.º 527º n.ºs 1 e 2 do CPC
*
Notifique-se
*
Guimarães, 19/12/2023
(O presente acórdão é assinado electronicamente)
 
Relator: José Carlos Pereira Duarte
1º Adjunto: Maria João Marques Pinto de Matos    
2º Adjunto: Fernando Manuel Barroso Cabanelas



[1] Dispõe o n.º 1 do art.º 639º do CPC:
“O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão.”
Este normativo impõe dois ónus: o de alegação e o de conclusão.
No caso releva este último e traduz-se na necessidade de finalizar as alegações recursivas com a formulação sintética de conclusões, em que é suposto que o apelante resuma ou condense os fundamentos pelos quais pretende que o tribunal ad quem modifique ou revogue a decisão proferida pelo tribunal a quo (cfr. Ac. RP de 09/11/2020, proc. 18625/18.6T8PRT.P1, consultável in www.dgsi.pt/jtrp).
Referia Alberto dos Reis, in Código de Processo Civil Anotado, V volume, 1984, pág. 359: “As conclusões são as proposições sintéticas que emanam naturalmente do que se expôs e considerou ao longo da alegação”.
No mesmo sentido Aveiro Pereira, in “O ónus de concluir nas alegações de recurso em processo civil“, pág. 31, acessível in www.trl.mj.pt/PDF/Joao%20Aveiro.pdf, onde refere que as conclusões são as “ilações ou deduções lógicas terminais de um raciocínio argumentativo, propositivo e persuasivo, em que o alegante procura demonstrar a consistência das razões que invoca contra a decisão recorrida.”
No caso, as conclusões apresentam-se patentemente prolixas, já que, em grande medida, são uma repetição dos argumentos contidos nas alegações, sem qualquer preocupação de síntese, como determina o n.º 1 do art.º 639º do CPC, ou seja, sem qualquer preocupação de indicar as ideias centrais do recurso.
E há um aspecto que não se teve sequer em consideração: o que deve constar da motivação e o que deve constar das conclusões. Assim, pretendendo o recorrente que esta Relação dê como provados determinados factos que a sentença recorrida considerou não provados, nas conclusões apenas deve indicar esses factos, não havendo necessidade de transcrever os meios de prova que determinam a prova dos mesmos, sejam eles depoimentos, sejam eles documentos.
No entanto, não se dá cumprimento ao disposto no n.º 3 do art.º 639º a fim de não dilatar mais a resolução do processo.