Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | ANTERO VEIGA | ||
Descritores: | CADUCIDADE DEFESA MOBBING SANÇÃO ABUSIVA | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 06/02/2016 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PARCIALMENTE PROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | SECÇÃO SOCIAL | ||
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Sumário: | No caso de aplicação de sanção abusiva, a censurabilidade da conduta da entidade patronal radica no “abuso do direito” que resulta da utilização do poder disciplinar para fins diversos daqueles a que se destina. Compete ao trabalhador, provar qualquer das circunstâncias referidas nas alíneas do artigo 331º do código do trabalho e sua relação direta com a sanção aplicada. O nº 2 do aludido normativo, estabelece uma presunção ilidível, em benefício do trabalhador, cabendo ao empregador demonstrar que a sanção disciplinar aplicada teria tido lugar ainda na ausência daquela circunstância. O simples facto de a resposta a processo disciplinar constituir o exercício de um direito de defesa, não é só por si impedimento à instauração de novo processo disciplinar, com base no teor da resposta. As imputações feitas à entidade patronal ou seu colaborador na defesa em processo disciplinar, devem ser lidas no quadro em que são proferidas, importando garantir o exercício do direito de defesa, sem a ameaça de por causa dele vir a sofrer novas remetidas. O direito de defesa deve ser exercido com obediência à lei e aos princípios que norteiam o estado direito, com respeito devido aos outros cidadãos, devendo no caso de conflito com direitos de outrem, como o direito ao bom nome, proceder-se a uma “concordância”, uma adequação entre os direitos, ou à prevalência do que seja considerado superior. O direito de defesa, desde que exercido de forma ética, e atento o seu relevante interesse público, não pode ser constrangido ou limitado no que tange à invocação de factos ocorridos, ou de que o exercitante do direito em face das circunstâncias conhecidas tem a convicção séria de terem ocorrido, sob pena de perigar toda a estrutura procedimental de um estado de direito, assente nos princípios do contraditório e de um amplo direito de defesa. O mobbing caracteriza-se, pela prática por banda da entidade empregadora de plúrimos comportamentos, durante um período de tempo mais ou menos longo, que na sua individualidade não assumem o relevo que a ação conjunta e a interação das suas consequências realmente importa, com consequências na saúde física e psíquica do trabalhador e no próprio emprego. Para efeitos de caducidade do direito à resolução do contrato, deve ter-se em atenção o conjunto. Assim só com a prática do último ato de assédio inicia a contagem do prazo. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães. Manuel …, intentou a presente ação declarativa de condenação com processo comum emergente de contrato individual de trabalho contra A…, Soc. Unipessoal, Lda., formulando o seguinte pedido: “(…)deve a presente ação ser julgada procedente por provada e consequentemente; a) Ser anulada a sanção disciplinar de suspensão com perda de perda de retribuição pelo período de 15 dias; b) Ser a Ré condenada a pagar ao Autor a quantia de 29.537,29€, acrescida de juros à taxa legal de 4% contados desde a data da citação e até efetivo pagamento, e ainda nas custas e demais encargos legais.” Alegou para tanto e em síntese: - Foi admitido ao serviço da R. em 1/2/1996 para exercer as funções de instrutor de condução, mediante a celebração de contrato de trabalho que vigorou até 22/01/2015, data em que procedeu à resolução do seu contrato de trabalho com invocação de justa causa, traduzida na prática pela Ré de um conjunto de ações atentatórias da sua dignidade pessoal e profissional, que enumerou na carta enviada à Ré, resolução que lhe confere o direito a uma indemnização de antiguidade a calcular em 45 dias de retribuição por cada ano de antiguidade, dado o grau de ilicitude do comportamento da ré; - A R. instaurou-lhe dois processos disciplinares, tendo-lhe aplicado sanções abusivas, traduzidas na repreensão registada e em 15 dias de suspensão com perda de retribuição e antiguidade, reclamando o A. a anulação de tais sanções; - Nos anos letivos de 2012/2013 e 2013/2014, a R. não concedeu ao A. o estatuto de trabalhador estudante, não obstante este ter comunicado que havia tido aproveitamento escolar no ano anterior e se encontrava matriculado no ano seguinte, descontando-lhe na retribuição todas as horas de faltas justificadas e o subsídio de refeição correspondente aos dias de frequência de aulas, reclamando o A. o pagamento das quantias descontadas; - Nos meses de fevereiro e março de 2014, a R. descontou a quantia de €130,00 no seu vencimento, sem apresentar justificação, reclamando o A. seu reembolso; - Todos os comportamentos da ré visaram uma estratégia indigna e humilhante com vista a promover a rotura do vínculo laboral, não restando ao A. outra alternativa que não fosse a resolução do contrato de trabalho; - A Ré sujeitou o A. a um tratamento persecutório, vexatório que lhe causaram grande sofrimento físico e moral, reclamando, por isso, uma indemnização por danos morais; A R. contestou suscitando a título de questão prévia, a inutilidade do pedido de anulação das sanções disciplinares aplicadas pela R. ao A., já que nunca foram cumpridas em virtude de, entretanto, ter cessado o contrato de trabalho por iniciativa deste, excecionando a caducidade do direito de resolução do contrato de trabalho e impugnando no essencial os factos alegados pelo A. Além disso, deduziu reconvenção, pedindo a condenação do A. a pagar-lhe a quantia de €1.400,50 a título de indemnização, por incumprimento do prazo de aviso prévio de denúncia do contrato de trabalho por parte do A. O A. respondeu, pugnando pela improcedência da exceção e da reconvenção. Realizado o julgamento e respondida a matéria de facto, a Mma Juíza proferiu a seguinte decisão: “A) Julgar parcialmente procedente, por em igual medida provada, a presente ação e, em consequência, condenar a Ré A…Soc. Unipessoal, Lda. a reconhecer que deve ao A. Manuel … a quantia de €2.963,21 (dois mil novecentos e sessenta e três euros e vinte e um cêntimos), a título de créditos laborais. B) Julgar procedente, por em igual medida provada, a reconvenção e, em consequência, condenar o A. Manuel … a reconhecer que deve à R. A…, Soc. Unipessoal, Lda. a quantia de €1.400,50 (mil quatrocentos euros e cinquenta cêntimos), a título de indemnização pela resolução ilícita do contrato de trabalho por parte do A. C) Declarar a compensação de créditos e, em consequência, condenar a Ré A…, Soc. Unipessoal, Lda. a pagar ao A. Manuel … a quantia de €1.562,71 (mil quinhentos e sessenta e dois euros e setenta e um cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação até integral pagamento…” Inconformado o autor interpôs recurso apresentando as seguintes conclusões: 1 – Ao recorrente foi aplicada uma sanção disciplinar de 15 dias de suspensão (meio mês de trabalho) com perda de retribuição, como consequência imediata da sua atuação, enquanto arguido/trabalhador, num processo disciplinar instaurado em 30 /10/2014, em que, na defesa escrita que deduziu, reclamou, designadamente, contra as suas condições de trabalho e o facto de tal processo constituir um ato persecutório; 2 - A reclamação efetuada contra as suas condições de trabalho e a dedução do direito de defesa no âmbito de um processo disciplinar, legitimamente exercido pelo recorrente, corresponde, desde logo, a um direito legalmente protegido do trabalhador e o seu sancionamento um comportamento abusivo; 3 - Os factos que o recorrente invoca no referido direito de defesa não são ofensivos da honra e consideração da empregadora ou do seu superior hierárquico, antes correspondem a factos verdadeiros e provados nos autos; 4 - Com efeito, resultou inelutavelmente provado que “Pelo menos em março de 2014 foi colocado um parafuso no dispositivo de regulação de afastamento do banco do carro que utilizava para as aulas práticas de condução que impedia o banco de deslizar até ao final da calha; (29) Em 5 de setembro de 2014, quando o Autor se preparava para iniciar uma aula, aquele Diretor Técnico ordenou-lhe expressamente, em voz alta e na presença dos alunos, que as aulas teóricas teriam que ser ministradas de porta aberta. (30); Por lhes ter sido pedido pelo A., alguns instruendos que presenciaram tal facto, declararam em documento escrito por eles subscrito que tal facto os prejudicava e não estavam concentrados, em função do ruído e distrações de entrada e saída de pessoas na escola (31); No dia 11 de agosto de 2014, o Autor foi confrontado com a presença de um gravador portátil no veículo em que lecionava a instrução/condução, o qual se encontrava em funcionamento e a gravar; (33) Ainda a Ré, mais uma vez através do seu diretor técnico, em fins de setembro, ordenou ao A. que se dirigisse para a sala onde se leciona mecânica e que aí permanecesse, o que o A. fez, tendo ali permanecido (35); Sendo certo que, uma vez que a porta da sala se mantinha aberta, o Autor era visto pelos alunos que se dirigiam para a escola, tanto mais que aquela sala deita diretamente para a entrada da mesma(36); No dia seguinte, 24 de setembro, o Autor depois de assinar o livro de ponto perguntou qual era o seu serviço para aquele dia, sendo informado pelo Sr. Carlos… que não tinha serviço e que se dirigisse novamente para a sala de mecânica, onde permaneceu até às 12 horas daquele dia (37); O Autor comunicou tais acontecimentos à Autoridade para as Condições do Trabalho, através de e-mails cujo teor consta de fls. 65 a 92 e aqui se considera integralmente reproduzido, tendo a ré tomado conhecimento do relatório final produzido por esta autoridade (38); 4 - Considerando que o recorrente não provou a veracidade dos factos que alegou na dita resposta à nota de culpa no seu núcleo essencial, isto é, “naquilo que a aprovar-se representaria atuação ilícita do seu superior hierárquico” , a Mm.ª Juiz “a quo” violou as regras de apreciação da prova, invertendo o sentido que o referido art.º 331.º, n.º 2 do Código do Trabalho, impõe na apreciação desta questão; 5 - Outrossim, a sentença recorrida considerou provados factos de uma gravidade absolutamente indecorosa na relação de trabalho, designadamente, no tratamento que era dado pela recorrida, na pessoa do Diretor Técnico, ao recorrente; 6 – Com efeito, tendo a Mm.ª Juiz “a quo” ponderado que “ o assédio moral implica comportamentos real e manifestamente humilhantes, vexatórios e atentatórios da dignidade do trabalhador, de certa duração e com determinadas consequências.”, a sentença recorrida inculca uma contradição insanável entre toda a fundamentação de facto e de direito que adotou e a solução jurídica da sentença recorrida, estando por isso ferida de nulidade, que expressamente se invoca; 7 - O recorrente considera que existem factos alegados que concatenada com a prova produzida e as regras da experiência comum, foram incorretamente julgados, devendo os mesmos ser julgados como não provados, com os seguintes fundamentos, com a necessária reapreciação da matéria de facto; 8 – Com base nos depoimentos das testemunhas supra transcrito e do conjunto da prova carreada para os autos, resultou provado que o diretor técnico da recorrida ordenou ao recorrente que desse a aula de porta aberta para demonstrar a sua autoridade e em tom agressivo e a fim de constranger e perturbar o A. na presença dos alunos; 9 – Ainda com base nos mesmos depoimentos resulta provado que a recorrida ordenou ao recorrente que este permanecesse de pé na sala de mecânica, não lhe permitindo sentar-se, para o humilhar e pressionar psicologicamente; 10 – E inelutavelmente se provou que aquele diretor técnico pugnou por denegrir, junto dos instruendos, a imagem profissional do recorrente, com comentários depreciativos da sua conduta profissional; 11 - Por outro, nem a Mm.ª Juiz “a quo” não fundamentou em que assentou o seu entendimento de que resultou provado os pontos 47, 48 e 49 da matéria assente na medida em que, nenhuma prova foi produzida nesse sentido; 12 – A Mm.ª Juiz “a quo” não atendeu aos factos mais gravosos invocados pelo recorrente na sua carta de resolução do contrato de trabalho com justa causa já que os mesmos se reportavam a um momento para além dos trinta dias a que alude o 395.º, n.º 1 do CT em que o trabalhador tem o direito de resolver o contrato de trabalho, pelo que, relativamente a tais factos, a sentença considerou que caducou o seu direito de resolução com justa causa do contrato de trabalho; 13 - Ora, não é essa a orientação doutrinária e jurisprudencial maioritária – senão mesmo unânime – no que toca ao início da contagem do prazo para o trabalhador resolver o contrato de trabalho com fundamento em assédio, o qual só se inicia quando for praticado o último ato de violação do contrato, pois o conhecimento da situação ilícita renova-se permanentemente enquanto ela se mantiver; 14 – E tratando-se de factos instantâneos com efeitos duradouros, suscetíveis de agravamento com o decurso do tempo, aquele prazo apenas se inicia quando, no contexto da relação laboral, assumem tal gravidade que a subsistência do contrato de trabalho se torna a partir de então imediatamente impossível; 15 - Assim, a Mm.ª Juiz “a quo” considerou que o recorrente não logrou provar os factos que correspondem ao teor do exercício do direito de defesa que é a causa da aplicação da sanção de 15 dias de suspensão com perda de retribuição, fazendo recair sobre este o ónus da prova dos factos que alegou no direito de defesa; 16 - Pelo que, a Mm.ª Juiz “a quo” não julgou a ação de acordo com as regras de inversão do ónus da prova, estipulada no n.º 2, do referido art.º 395.º do CT, designadamente não fez impender a obrigação da recorrida fazer prova de que, o parafuso no dispositivo de regulação de afastamento do banco do carro que o recorrente utilizava para as aulas práticas de condução que impedia o banco de deslizar até ao final da calha não lhe causava desconforto, ao ponto das pernas ficarem adormecidas; Que o gravador portátil encontrado no veículo em que lecionava a instrução/condução, em funcionamento e a gravar, tinha um fim legítimo ou adequado ao exercício da atividade; Ou que as presenças consecutivas do recorrente na aula de mecânica sem ocupação efetiva, a ser visto pelos alunos, faziam parte das funções por si desempenhadas; 17 – Com efeito provados que estão os pontos 1.º, 2.º, 3.º, 5.º, 6.º, 9.º, 10.º, 11.º, 12.º, 13.º, 14.º, 15.º, 16.º, 17.º, 18.º, 20.º, 22.º, 23.º, 24.º, 25.º, 29.º, 30.º, 31.º, 32.º,33.º, 35.º, 36.º, 37.º, 38.º, 39.º, 40.º, 41.º, 42.º, 43.º, 44.º, 44.º (repetido), 45.º, 46.º, 50.º, 52.º e 53.º da fundamentação de facto, o destino da ação deverá ser bem diferente; 18 - Pelo que, ocorre erro de julgamento na aplicação das referidas normas dos art.ºs 29.º, 127.º, 129.º, 331.º e 399.º do Código do Trabalho feita pela sentença recorrida, na medida em que a resolução do contrato de trabalho pelo recorrente não é ilícita, tendo este mais que motivos para resolver o contrato de trabalho. 19 - Assim, a sentença recorrida violou, para além de outros o disposto nos art.ºs 14.º, 29.º, 126.º, 127.º, 129.º, 331.º, 394.º, 395.º, 396.º e 399.º do Código do Trabalho, art.º 342.º, 344.º e 350.º do Código Civil. A recorrida contra alegou sustentando a manutenção do julgado O Exmo Procurador deu o seu parecer no sentido procedência quanto ao caráter abusivo da sanção disciplinar, aludindo ao exercício do direito de defesa. Colhidos os vistos importa decidir. ** Factualidade: a) Factos provados por confissão ou admitidos por acordo nos articulados e por documento: 1- No dia 11 de dezembro de 2014, o Autor foi notificado pela Ré, sua entidade patronal, por carta registada, da instauração de um processo disciplinar com intenção ao seu despedimento com justa causa. 2- Alegando a Ré, na Nota de Culpa que tendo sido instaurado ao Autor um processo disciplinar no qual lhe foi aplicada a sanção de repreensão registada, este invocou “um conjunto de falsos factos e comportamentos que justificam a instauração de um novo processo disciplinar”, “Comportamentos e factos estes que, pela sua gravidade e consequências tornam imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.” 3- E enumerando os seguintes factos: “a) – Que o Diretor Técnico, Carlos… tem vindo a assumir um conjunto de comportamentos atentatórios contra a pessoa e a dignidade profissional do arguido, designadamente a colocação propositada de um parafuso no banco do carro que é ocupado pelo instrutor…” b) “Tal facto impediria a regulação do banco vendo-se obrigado a ministrar as aulas com as pernas encolhidas, ao ponto de ficarem adormecidas.” c) “ Exigência do Sr. Carlos… que a porta da sala de teórica (código), tenha de ficar aberta, durante o lecionamento do código - procedimento nunca antes perfilhado pela entidade empregadora;” d) “O recibo de retribuição mensal do mês de fevereiro de 2014 apresenta um desconto de 130,00 eur o qual foi feito sem consentimento desconhecendo a razão para tal desconto”. e) “Igual procedimento em março de 2014.” f) “ Já há algum tempo paga a lavagem e limpeza do carro que lhe está atribuído.” g) “Encontrou no automóvel em que exerce a instrução um gravador portátil destinado a gravarem-lhe as conversas existentes no interior do veículo alegando que o trabalhador terá furtado esse aparelho a um aluno que tirou a carta de pesados há cerca de um atrás.” h) “No dia 23 de setembro de 2014, o Diretor Técnico Carlos… ordenou-lhe que se dirigisse para a sala de mecânica e se mantivesse lá mas de pé, tendo o mesmo lá permanecido cerca de duas horas.” i) “Igual comportamento no dia 24/09/2014 tendo o trabalhador arguido permanecido lá o dia todo”. j) “Tendo já comunicado tais situações à Entidade Empregadora à ACT.” k) “Mais afirma o trabalhador arguido que vem sofrendo, desde a alguns meses, graves pressões provocadas por atitudes reiteradas do Sr. Carlos…” 4- Invoca ainda que, tais factos são inteiramente falsos e que os mesmos constituem uma grave infração disciplinar. 5- Tendo o Autor exercido o seu direito de resposta através de Carta registada com aviso de receção datada de 19 de dezembro de 2014, onde referiu que a factualidade descrita na nota de culpa reporta-se à mera descrição de factos que o trabalhador invoca, no exercício do seu direito de defesa que legitimamente lhe assiste, no âmbito do anterior processo disciplinar movido pela sua entidade empregadora. 6- Tendo o Autor sido notificado em 9 de janeiro de 2015, da decisão de aplicação da sanção disciplinar - Suspensão do trabalho com perda de retribuição e de antiguidade pelo período de 15 dias. 7- Por contrato de trabalho de 01 de fevereiro de 1996, o Autor foi admitido ao serviço da Ré, para sob as suas ordens, direção e subordinação, prestar trabalho próprio da categoria profissional de instrutor de condução. 8- E mediante o pagamento da retribuição, neste momento, fixada em 700,25€. 9- Por carta registada com aviso de receção de 20 de janeiro de 2015 dirigida à Ré enviada para a sede desta, e por esta recebida em 22 de janeiro de 2015, o Autor notificou-a da resolução do seu contrato de trabalho que mantinha com a Ré com invocação de justa causa, alegando os seguintes factos: a) “No ano letivo de 2012/2013 foi-lhe recusado pela Ré, o estatuto de trabalhador estudante, tendo sido em consequência disso, descontadas essas horas na sua retribuição mensal bem como o subsídio de alimentação respeitante a esses dias em que frequentava as aulas”. b) “Posteriormente fui confrontado com a presença de um parafuso no banco do carro que é ocupado por mim, colocado pela entidade empregadora ou alguém a seu mando – visto ser a única que possui chaves do veículo -, que impedia assim a regulação do mesmo, vendo-me obrigado a ministrar as aulas com as pernas encolhidas, ao ponto de ficarem adormecidas.” c) “Por determinação expressa do Sr. Carlos…, as aulas teóricas ministradas por mim passaram a ser feitas numa sala de porta aberta - durante o lecionamento do código – com o intuito de me constranger e perturbar o trabalho desenvolvido, sendo certo que se tratou de um procedimento nunca antes perfilhado pela entidade empregadora.” d) “No recibo de retribuição mensal do mês de fevereiro de 2014 e março de 2014, sem o meu consentimento, a entidade empregadora procedeu ao desconto no valor de cento e trinta euros (130,00 eur), não tendo eu qualquer conhecimento do motivo que o levou a descontar aquela quantia”. e) “Por várias vezes, efetuei o pagamento da lavagem e limpeza do carro que me estava atribuído, sem que me fossem reembolsadas as respetivas quantias, para manter o veículo em condições de salubridade e limpeza.” f) “Outrossim, em 11 de agosto de 2014, foi encontrado por mim, no automóvel em que exerço a minha instrução, um gravador portátil com o propósito de me gravarem as conversas existentes no interior daquele alegando que furtei esse aparelho a um aluno, sendo certo que este já tirou a licença de condução de pesados há cerca de 1 ano atrás.” g) “No dia 23 de setembro de 2014, o Sr. Carlos… ordenou que me dirigisse para a sala de mecânica e me mantivesse lá, mas de pé, tendo lá permanecido cerca de duas horas, sem qualquer ocupação ou serviço.” h) “No dia seguinte e, por várias vezes, ordenou que me dirigisse para a sala de mecânica, permanecendo lá durante o tempo que bem entendia, sem qualquer ocupação ou serviço.” i) “Como é do V/ conhecimento, tais situações foram objeto de comunicação à entidade empregadora e Autoridade para as Condições do Trabalho.” j) “Outrossim, os motivos que originaram o processo disciplinar instaurado em 30/10/2014, alegadamente por me ter recusado a ministrar uma aula teórica foi mais um expediente usado pelo meu superior hierárquico para mais um ato de provocação e de humilhação, perante o aluno presente descredibilizando a minha imagem de instrutor qualificado, que culminou na aplicação da sanção - repreensão registada - invocando a violação dos deveres de obediência e correção perante o superior hierárquico.” k) “Sendo certo que, ao longo de todos estes meses, fui desrespeitado e menosprezado proporcionando-me más condições de trabalho, causando-me mau estar quer físico quer moral com o propósito de me transtornar e saturar exercendo, assim, graves pressões provocadas por atitudes reiteradas do referido Sr. Carlos...” l) “Tanto assim é que, em virtude da ocorrência de todas as descritas atitudes e comportamentos, os quais são atentatórios da minha integridade física e moral, honra e dignidade profissional, já me encontro de baixa médica por doença desde 23 de outubro de 2014 permanecendo até 01 de fevereiro de 2015.” m) “Acresce que, e à semelhança do que motivou a instauração, pela minha entidade patronal, daquele primeiro processo disciplinar, numa atitude persecutória, injusta e injustificada, foi-me ainda instaurado, em 10/12/2014, um novo processo disciplinar por ter exercido os direitos de defesa que legitimamente me assistem, no âmbito do anterior processo disciplinar instaurado em 30/10/2014”. n) Tendo-me sido aplicada a suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade por um período de 15 dias.” o) “De salientar que, os dois processos disciplinares foram instaurados no período em que eu já me encontro de baixa médica.” p) “Aplicando-me em ambos os processos, de uma forma abusiva sanções disciplinares, usando de tais expedientes como o único propósito de pressionar a rotura do vínculo contratual existente e, desta forma, tornar total e praticamente impossível a manutenção da minha relação laboral com V.ªs Ex.ªas.” 10- A Ré não concedeu ao A. o estatuto de trabalhador estudante a partir do ano letivo 2012/2013. 11- Quando a Ré lhe havia concedido tais direitos no ano letivo antecedente, isto é, 2011/2012. 12- Em 10/09/2014 o A. remeteu à Ré e esta recebeu a carta cuja cópia consta de fls. 69 dos autos e cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido, por meio da qual, além do mais, interpelou a Ré no sentido de esta esclarecer o motivo de ter sido determinado pelo seu Diretor técnico que a partir de 5/09/2014 as aulas de código teriam de ser lecionadas com a porta da sala aberta, referindo, ainda, que nunca foi o modo de funcionamento daquela escola lecionar o código naquela sala com a porta aberta. 13- A Ré respondeu através de carta enviada ao Autor em 16 de setembro de 2014, cuja cópia se encontra junta aos autos a fls. 72 e cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido, na qual transcreveu o teor do art. 128º do Código do Trabalho e exortou o A. “(…) a adotar um comportamento de adequado cumprimento dos seus deveres, sob pena de instauração de um processo disciplinar (…)”. 14- A Ré descontou ao Autor a quantia de 130€ nos meses de fevereiro e março de 2014, num total de 260€, efetuando tais pagamentos através de transferência bancária para a conta do Autor omitindo tal desconto no respetivo recibo. 15- O A. recebeu uma carta escrita por advogado, enviada a 25 de agosto de 2014, em representação de Pedro…, a solicitar a entrega de um gravador que havia sido encontrado num veículo onde o A. leciona a instrução/condução, carta essa cuja cópia se encontra junta aos autos a fls. 61 e cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido. 16- Tendo o Autor, no dia 28 de agosto de 2014, apresentado queixa-crime no que concerne à gravação das suas conversas no interior do seu veículo de instrução, no qual juntou o respetivo aparelho como prova, encontrando-se na fase de inquérito. 17- O A. encontrou-se em situação de baixa por doença entre 23 de outubro de 2014 e 01 de fevereiro de 2015. 18- Na pendência do período de incapacidade do Autor, por baixa médica, a Ré decidiu instaurar-lhe um processo disciplinar em 30/10/2014, na sequência do qual decidiu aplicar-lhe uma sanção disciplinar de Repreensão registada. 19- Tendo o mesmo sido judicialmente impugnado pelo Autor, mediante ação que correu termos neste Tribunal sob o n.º 572/14.2T8BGC. 20- Entretanto, a Ré instaurou o processo disciplinar com intenção de despedimento com justa causa, a que se referem supra os nºs 1 a 6, tendo como único fundamento os termos em que o Autor exerceu a sua defesa no âmbito daquele primeiro processo disciplinar. b) Factos provados da matéria controvertida constante dos temas da prova: 21- O Autor prestou efetivo serviço para a Ré, desde a data de admissão até, pelo menos, 23/10/2014, data em que entrou de baixa. 22- O Autor, nos anos letivos de 2012/2013 e 2013/2014, continuou a frequentar o Curso de Tecnologias da Comunicação …, pelo que pretendia continuar a beneficiar do estatuto de trabalhador estudante. 23- Para o efeito, passou a apresentar o horário de frequência de aulas de cada semana com a antecedência de, pelo menos uma semana. 24- No ano letivo de 2012/2013, por não ter concedido ao Autor o estatuto de trabalhador estudante, a Ré descontava as horas de faltas justificadas e não pagava o subsídio de alimentação referente aos dias de frequência das aulas. 25- Assim, a Ré não pagou ao Autor: Ano de 2012: Subsídio de Alimentação: Setembro: 2 dias = 7,00€ Ano de 2013 Janeiro: 1 dia =3,50€ Abril: 1 dia =3,50€ Junho: 1 dia = 3,50€ Julho: 22 dias = 77€ Agosto: 1 dia = 3,50€ Setembro: 5 dias = 17,50€ Novembro: 16 dias = 56€ Horas de faltas justificadas não pagas: Ano de 2012: Setembro: 8 horas = 34,48€ Ano de 2013: Janeiro: 3 horas = 12,93€ Fevereiro: 1 hora = 4,31€ Abril: 1hora = 4,31€ Setembro: 11 horas = 47,41€ Novembro: 29 horas = 124,99€ 26- Igualmente, a Ré não atribuiu ao Autor o estatuto de trabalhador estudante no ano letivo de 2013/2014, procedendo ao desconto de subsídio de alimentação e horas de faltas consideradas justificadas e não pagas. 27- Assim a Ré não pagou ao Autor: Ano de 2014 Subsidio de Alimentação: Janeiro: 12 dias x 3,50 = 42€ Fevereiro: 11 dias = 38,50€ Março: 12 dias = 42€ Abril : 10 dias = 35€ Maio : 11 dias = 38,50€ Junho: 4 dias = 14€ Julho: 22 dias = 77€ Agosto : 4 dias = 14€ Setembro: 2 dias = 7€ Horas de faltas justificadas não pagas: Janeiro : 25 horas x 4,31€ = 107,75€ Fevereiro: 28 horas = 120,68€ Março : 33 horas = 142,23€ Abril : 20 horas = 86,20€ Maio : 23 horas = 99,13€ Junho : 9 horas = 38,79€ 28- A partir de 3/09/2014, o Diretor Técnico da Ré passou a ser o Sr. Carlos..., marido da sócia-gerente da Ré, sendo esta quem, até essa data desempenhava, formalmente, tais funções, embora fosse aquele quem sempre se ocupou das questões relativas aos veículos, instrutores e contabilidade. 29- Pelo menos em março de 2014 foi colocado um parafuso no dispositivo de regulação de afastamento do banco do carro que utilizava para as aulas práticas de condução que impedia o banco de deslizar até ao final da calha. 30- Em 5 de setembro de 2014, quando o Autor se preparava para iniciar uma aula, aquele Diretor Técnico ordenou-lhe expressamente, em voz alta e na presença dos alunos, que as aulas teóricas teriam que ser ministradas de porta aberta. 31- Por lhes ter sido pedido pelo A., alguns instruendos que presenciaram tal facto, declararam em documento escrito por eles subscrito que tal facto os prejudicava e não estavam concentrados, em função do ruído e distrações de entrada e saída de pessoas na escola. 32- A sala de código encontra-se junto à entrada e junto da secretaria da escola. 33- No dia 11 de agosto de 2014, o Autor foi confrontado com a presença de um gravador portátil no veículo em que lecionava a instrução/condução, o qual se encontrava em funcionamento e a gravar. 34- Tendo tal acontecimento chegado ao conhecimento do Diretor Técnico da Ré, Sr. Carlos..., este disse que o entregasse que não era do Autor e que pertencia a um antigo aluno. 35- Ainda a Ré, mais uma vez através do seu diretor técnico, em fins de setembro, ordenou ao A. que se dirigisse para a sala onde se leciona mecânica e que aí permanecesse, o que o A. fez, tendo ali permanecido. 36- Sendo certo que, uma vez que a porta da sala se mantinha aberta, o Autor era visto pelos alunos que se dirigiam para a escola, tanto mais que aquela sala deita diretamente para a entrada da mesma. 37- No dia seguinte, 24 de setembro, o Autor depois de assinar o livro de ponto perguntou qual era o seu serviço para aquele dia, sendo informado pelo Sr. Carlos... que não tinha serviço e que se dirigisse novamente para a sala de mecânica, onde permaneceu até às 12 horas daquele dia. 38- O Autor comunicou tais acontecimentos à Autoridade para as Condições do Trabalho, através de e-mails cujo teor consta de fls. 65 a 92 e aqui se considera integralmente reproduzido, tendo a ré tomado conhecimento do relatório final produzido por esta autoridade. 39- Por causa do mau relacionamento profissional que se estabeleceu entre o A. e o Diretor Técnico da Ré, o Autor recorrer aos serviços de saúde em 23/10/2014, tendo o médico que o assistiu determinado um período de baixa médica de 12 dias, por apresentar tensão arterial alta, de que já tinha antecedentes, e um elevado grau de ansiedade, que o A. relacionou com problemas laborais. 40- Por causa do dito mau relacionamento o A. vem sendo seguido desde novembro de 2014 na consulta de psiquiatria da Unidade Local de Saúde … devido a sintomatologia depressiva e ansiosa que enquadram o diagnóstico de “Reação de Ajustamento” com manifestações emocionais mistas, tendo sido medicado com antidepressivo e ansiolítico; em 27/01/2015 mantinha-se o acompanhamento do A. em consulta de psiquiatria. 41- O A. foi encaminhado pela sua médica de família para a consulta de psiquiatria por apresentar ansiedade marcada desde maio de 2014, que relacionava com problemas laborais e por tal situação se ter agravado em outubro de 2014, apresentando o A. alterações comportamentais, agressividade, incapacidade laboral e insónias. 42- A forma como ocorreu a cessação do contrato de trabalho provocou ao Autor grande tristeza e aborrecimento, sentindo este que tinha sido humilhado e descredibilizado como profissional de forma que reputava injustificada e injusta. 43- Durante os meses de setembro e outubro de 2014 e até ter entrado de baixa, o Autor sentia necessidade de se afastar de todas as pessoas com quem diariamente convivia, fechando-se sozinho em casa, evitando qualquer contacto social. 44- Tanto mais que o Autor para além de ser uma pessoa conhecida e bem considerada no seu meio social, sempre foi vista por todos como uma pessoa séria, honrada e trabalhadora. 44- E antes disso era uma pessoa alegre, saudável e que gostava de conviver com familiares e amigos, participando de forma habitual nas iniciativas sociais e recreativas do meio em que vive. 45- As sanções disciplinares de repreensão registada e de 15 dias de suspensão com perda de retribuição não foram aplicados porque o A. impugnou judicialmente a primeira, entrou de baixa e, entretanto, comunicou à ré a resolução imediata do seu contrato de trabalho. 46- Na sequência da apresentação pelo A. do seu horário escolar no início do ano letivo 2012/2013, a Ré comunicou-lhe a impossibilidade de ajustar o horário de trabalho ao horário de frequência de aulas, impossibilidade que justificou com as seguintes razões: “Sendo V/ Exa. de momento o único trabalhador habilitado a lecionar todas as categorias de veículos que a escola de condução ministra, a sua ausência vai prejudicar e irremediavelmente e impedir o normal funcionamento da mesma, contribuindo para que alguns formandos não optem pelos nossos serviços, para obtenção de carta de condução pela limitação em termos de horários disponíveis e se vejam na necessidade de recorrer a outras escolas concorrentes, o que acarreta como é evidente a prejuízos sérios, quer para esta empresa quer para satisfação de compromissos assumidos, uma vez que não tendo alunos deixa de ter possibilidades económicas para se manter.” 47- Mais lhe comunicou a Ré que, mesmo assim, teria em conta a sua situação de estudante e sempre que possível seria pontualmente ajustado o seu horário, por forma a minorar os efeitos menos bons que aquela decisão pudesse trazer à sua formação. 48- A Ré decidiu que as aulas passariam a ser ministradas com a porta aberta e/ou com a presença do Diretor Técnico, tendo em atenção que, várias vezes, se ouviam ruídos e gargalhadas vindos da sala de aula, tendo-se alguns alunos queixado na secretaria de que o A. atendia telefonemas e interrompia as aulas para tratar de assuntos pessoais. 49- O Autor recusou-se a lecionar as aulas com a porta aberta, bem como quando o Diretor Técnico o informou de que iria assistir à aula para avaliar a qualidade do ensino ministrado. 50- O desconto de € 130,00 efetuado no vencimento dos meses de fevereiro e março de 2014 constituíram o pagamento de duas prestações do preço da carta de condução do filho do A., tendo a Ré anexado ao recibo de vencimento o recibo de quitação correspondente aos ditos pagamentos, por desconto no salário. 51- A Ré dispõe de local, equipamento e produtos próprios para a limpeza e manutenção dos seus veículos de instrução, pagando as respetivas despesas e encargos. 52- O A. respondeu à nota de culpa produzida pela Ré no processo disciplinar movido em 30/10/2014, tendo alegado, na resposta escrita, remetida à Ré em 10/11/2014, além do mais, que: “(…) Ora, atenta a circunstância de, ao longo dos últimos meses o referido, Sr. Carlos..., ter vindo a assumir um conjunto de comportamentos atentatórios contra a pessoa e a dignidade profissional do arguido, designadamente: - Colocação de um parafuso no banco, propositadamente, do carro que é ocupado pelo instrutor impedindo assim a regulação do banco vendo-se obrigado a ministrar as aulas com as pernas encolhidas, ao ponto de ficarem adormecidas. - Exigência do Sr. Carlos... que a porta da sala de teórica (código), tenha de ficar aberta, durante o leccionamento do código - procedimento nunca antes perfilhado pela entidade empregadora; - O recibo de retribuição mensal do mês de fevereiro de 2014 e março de 2014, sem consentimento, procedeu ao desconto no valor de cento e trinta euros (130,00 eur), não tendo o trabalhador qualquer conhecimento do motivo que o levou a descontar aquela quantia. - Já há algum tempo paga a lavagem e limpeza do carro que lhe está atribuído. - Outrossim, foi encontrado pelo instrutor, no seu automóvel em que exerce a sua instrução, um gravador portátil com o propósito de lhe gravarem as conversas existentes no interior daquele alegando que o trabalhador terá furtado esse aparelho a um aluno que tirou a carta de pesados há cerca de 1 ano atrás. - No dia 23 de setembro de 2014, o Sr. Carlos... ordenou que o trabalhador se dirigisse para a sala de mecânica e se mantivesse lá mas de pé, tendo o mesmo lá permanecido cerca de duas horas.” - No dia seguinte, dia 24/09/2014, ordenou que se dirigisse para a sala de mecânica, tendo lá permanecido durante todo o dia – sendo certo que tais situações foram já objeto de comunicação à entidade empregadora e Autoridade para as condições do Trabalho; (…) O trabalhador/arguido temeu que o Sr. Carlos... se preparasse para mais um ato de provocação e de humilhação daquele, perante o aluno presente, descredibilizando a imagem de instrutor qualificado. (…) Assim, o trabalhador/arguido, não violou qualquer dever (…). (…) Representando, antes, um ato de legítima defesa da sua dignidade como profissional e saúde psicológica que há alguns meses vem sofrendo de graves pressões provocadas por atitudes reiteradas do referido Sr. Carlos....” 53- O A. obteve aproveitamento escolar nos anos letivos de 2012/2013 e 2013/2014. *** Conhecendo dos recursos: Nos termos dos artigos 635º, 4 e 639º do CPC, o âmbito do recurso encontra-se balizado pelas conclusões do recorrente. Questões colocadas: - Violação das regras de apreciação da prova, invertendo o sentido que resulta do art.º 331.º, n.º 2 do Código do Trabalho. - Ilicitude da sanção aplicada e caráter abusivo. - Nulidade por contradição insanável entre toda a fundamentação de facto e de direito que adotou e a solução jurídica da sentença recorrida. - Alteração da decisão relativa à matéria de facto no que concerne aos pontos 47, 48 e 49 da matéria, devendo ser considerados não provados. Deve considerar-se provado que: “O diretor técnico da recorrida ordenou ao recorrente que desse a aula de porta aberta para demonstrar a sua autoridade e em tom agressivo e a fim de constranger e perturbar o A. na presença dos alunos” “A recorrida ordenou ao recorrente que este permanecesse de pé na sala de mecânica, não lhe permitindo sentar-se, para o humilhar e pressionar psicologicamente” “Aquele diretor técnico pugnou por denegrir, junto dos instruendos, a imagem profissional do recorrente, com comentários depreciativos da sua conduta profissional” - Da não caducidade do direito à resolução – início da contagem do prazo. *** Comecemos pela questão da reapreciação da prova. Pretende o recorrente que deve considerar-se provado que: “O diretor técnico da recorrida ordenou ao recorrente que desse a aula de porta aberta para demonstrar a sua autoridade e em tom agressivo e a fim de constranger e perturbar o A. na presença dos alunos” “A recorrida ordenou ao recorrente que este permanecesse de pé na sala de mecânica, não lhe permitindo sentar-se, para o humilhar e pressionar psicologicamente” “Aquele diretor técnico pugnou por denegrir, junto dos instruendos, a imagem profissional do recorrente, com comentários depreciativos da sua conduta profissional” E que se considere não provada a seguinte matéria: 47- Mais lhe comunicou a Ré que, mesmo assim, teria em conta a sua situação de estudante e sempre que possível seria pontualmente ajustado o seu horário, por forma a minorar os efeitos menos bons que aquela decisão pudesse trazer à sua formação. 48- A Ré decidiu que as aulas passariam a ser ministradas com a porta aberta e/ou com a presença do Diretor Técnico, tendo em atenção que, várias vezes, se ouviam ruídos e gargalhadas vindos da sala de aula, tendo-se alguns alunos queixado na secretaria de que o A. atendia telefonemas e interrompia as aulas para tratar de assuntos pessoais. 49- O Autor recusou-se a lecionar as aulas com a porta aberta, bem como quando o Diretor Técnico o informou de que iria assistir à aula para avaliar a qualidade do ensino ministrado. Invoca prova documental e os depoimentos de Manuel…, Helder…, Mariana… Relativamente aos factos 47 a 49 refere que não se mostram fundamentados. Da fundamentação resultam referências ao documento de fls. 127, no qual a ré refere ao autor que sempre que possível seria pontualmente ajustado o seu horário, por forma a minorar os efeitos menos bons que a decisão comunicada na primeira parte da missiva pudesse trazer à sua formação, que sustenta a resposta ao facto 47. Resulta ainda uma referência a depoimento de Ester…, que referiu que a ré procurava adequar o serviço para permitir a ausência do autor. Também quanto aos restantes factos esta testemunha referiu, e tal consta da fundamentação, que a ré deu ordens para dar as aulas de porta aberta devido às risadas e barulho que se ouviam no interior, referindo que este recusou dar aulas na presença física do diretor. Consta ainda da fundamentação a referência ao depoimento de António… no sentido de o autor ter recusado dar aulas de porta aberta. A decisão mostra-se suficientemente fundamentada. * A prova produzida não aponta no sentido pretendido pelo autor. Assim e quanto à ordem para dar as aulas de porta aberta, não foi referido que a ordem tenha sido em tom agressivo e muito menos com o fim de constranger o autor. Assim a testemunha Manuel… referiu que ouviu a ordem, estava a falar normal e só depois se alteraram os dois. Referiu até que tinha um papel na porta com tal referência, o que inculca que a ordem não era apenas para o autor. A Ester… confirmou que a ordem foi dada, justificando tal conduta com risadas e gargalhadas que se ouviam. Quanto à ordem para ficar de pé, nenhuma testemunha confirmou o facto. A Ester… explicou que em ocasião em que não havia trabalho o Sr. Carlos o mandou para aquela sala, dizendo-lhe para estudar mecânica, referindo que se ficou de pé foi porque quis. A própria testemunha Helena…, que referiu que uma vez passou e ele estava na sala de pé, tendo-o cumprimentado, aludiu a que na altura não achou nada de anormal. Referiu que nunca sentiu que o autor estivesse a ser maltratado e apenas o viu de pé aquela vez. Quando o autor estava na escola, às vezes estava de pé e às vezes sentado. Relativamente à imputação de o diretor técnico da ré pugnou por denegrir, junto dos instruendos, a imagem profissional do recorrente, com comentários depreciativos da sua conduta profissional, nada se demonstrou de relevante. A Marta… referiu que após ter chumbado duas vezes, foi perguntado pela direção da ré se tinha a ver com o instrutor, se ele fazia sempre o mesmo percurso, se faziam manobras, não tendo achado nada de anormal na pergunta. Mais confirmou que também lhe foram feitas perguntas relativamente ao instrutor João… que lhe deu o código, no sentido de saberem como eram as aulas. A testemunha Mariana… referiu que no final de uma aula de código lhe perguntaram se o autor estava a ensinar bem, aludindo a uma expressão de que “ estava a passar o tempo”. Contrariando declarações por si assinadas referiu que a conversa “ foi mais para mim”, referindo não saber se outros alunos ouviram. Não se confirma qualquer intento em denegrir a imagem profissional do autor. Resulta ainda da prova, que as declarações assinadas por alunas, vinham elaboradas limitando-se estas, concordando, a assinar. Resulta das declarações destas que o teor das mesmas apresenta múltiplas imprecisões e excessos, o que retira credibilidade às alegações do autor. Quanto aos factos considerados provados, os mesmos resultam da prova produzida. Assim o documento de fls. 127 e os depoimentos de Ester… e António…, que confirmaram os mesmos. * Quanto à violação das regras de apreciação da prova, invertendo o sentido do art.º 331.º, n.º 2 do Código do Trabalho. As regras relativas aos ónus de prova não são chamadas à colação em sede de julgamento de matéria de facto. Deve ser considerado provado aquilo que na convicção do julgador foi provado, independentemente da parte que produziu a prova, de acordo com o princípio da aquisição processual. As regras relativas ao ónus de prova apenas são chamadas à colação em sede de julgamento de direito, em termos tais que, na falta de prova de um facto, tal se volve em prejuízo da parte onerada com o respetivo ónus de prova. No caso, o nº 2 do artigo 331º do CT estabelece uma presunção do caráter abusivo da sansão aplicada em processo disciplinar, demonstrada que seja pelo trabalhador alguma das circunstâncias previstas na norma. * Refere o recorrente a nulidade por contradição insanável entre toda a fundamentação de facto e de direito que adotou e a solução jurídica da sentença recorrida. Refere que face aos factos provados e aos fundamentos de direito relativos ao assédio, a solução lógica seria diversa. Quanto à nulidade do 615º, 1, c) do CPC, o normativo prevê os casos em que os fundamentos da decisão estão em oposição com a decisão proferida. A nulidade invocada respeita à estrutura da decisão, a uma incongruência no silogismo judiciário. Entre os fundamentos e a decisão tem que ocorrer uma contradição lógica. Diferente é o caso de erro de julgamento, que ocorre quando o julgador entende erradamente que dos factos provados resulta determinada consequência jurídica. Estaremos então perante erro de interpretação e não perante um caso de nulidade. Ora, no caso vertente não ocorre qualquer nulidade. O julgador entendeu de determinado modo e explicou quais as razões de tal entendimento. Por outro, o julgador descreve a factualidade provada, aprecia a mesma face ao direito que julga pertinente e conclui decidindo em função dessa apreciação. Refere-se que a prova dos factos relativos ao assédio competia ao autor. Alude-se a que os comportamentos imputados encontram razão de ser gestionária e empresarial plausível, caso da não concessão do estatuto de trabalhador estudante, ou estão contidos nas faculdades de conformação, como lecionação de porta aberta e / ou na presença do diretor. Refere-se que da matéria provada não resulta que a conduta da ré fosse de molde a perturbar ou constranger o autor. Se erro há é de interpretação da factualidade, erro de julgamento, não propriamente contradição. Improcede o alegado. * - Ilicitude da sanção aplicada. O processo disciplinar em causa foi intentado com base nas imputações feitas à entidade patronal (em especial o diretor técnico) pelo autor, em sede de defesa num outro processo disciplinar. Refere o recorrente que existe relação direta entre a reclamação contra as suas condições de trabalho no primeiro processo e a dedução deste procedimento. Alude a que independentemente da ponderação da licitude ou ilicitude do comportamento do recorrente no teor da resposta dada naquele outro processo, a instauração deste é manifestamente abusiva, aludindo a que o caráter abusivo reside na natureza persecutória da punição, no facto de a verdadeira razão da aplicação da sanção se situar fora de uma conduta ilícita do trabalhador, citando o Ac. STJ de 5/12/2001, Ac. Dout. 487º, 1068. Refere ainda que os factos imputados na dita defesa são verdadeiros e têm o efeito de intimidar hostilizar e humilhar o trabalhador. Refere o artigo 331º do CT: Sanções abusivas 1 - Considera-se abusiva a sanção disciplinar motivada pelo facto de o trabalhador: a) Ter reclamado legitimamente contra as condições de trabalho; … d) Em geral, exercer, ter exercido, pretender exercer ou invocar os seus direitos ou garantias. 2 - Presume-se abusivo o despedimento ou outra sanção aplicada alegadamente para punir uma infração, quando tenha lugar: a) Até seis meses após qualquer dos factos mencionados no número anterior; … 3 - O empregador que aplicar sanção abusiva deve indemnizar o trabalhador nos termos gerais, com as alterações constantes dos números seguintes. … 5 - Em caso de sanção pecuniária ou suspensão do trabalho, a indemnização não deve ser inferior a 10 vezes a importância daquela ou da retribuição perdida. … A norma em causa constitui, pode dizer-se, uma explicitação da figura do abuso de direito consagrada no artigo 334º do CC em sede de procedimento disciplinar. Visa-se o estabelecimento de princípios informadores de tal procedimento, em moldes tais que o mantenham dentro dos limites em que ele deve mover-se, e é, enquanto mecanismo destinado a sancionar comportamentos ilícitos do trabalhador no quadro da relação laboral. Assim, no caso de aplicação de sanção abusiva, a censurabilidade da conduta da entidade patronal radica no “abuso do direito” que resulta da utilização do poder disciplinar para fins diversos daqueles a que se destina. Refere-se a propósito no Ac. STJ de 13/12/2000, processo nº 00S2449, disponível na net (DGSI): “ A razão de ser da penalização da entidade patronal por aplicação de sanções abusivas radica na utilização do poder disciplinar para fins diferentes dos que o Direito associa ao seu reconhecimento: a intenção da entidade patronal não é a de punir o trabalhador pela prática de uma infração disciplinar, mas sim prejudicá-lo pelo facto de este exercer um direito que lhe assiste (ou - acrescente-se - que ele está convencido que lhe assiste). Assim perspetivadas, as sanções abusivas surgem como uma das formas típicas que pode assumir, no âmbito laboral, a figura do abuso do direito ou do exercício inadmissível de posições jurídicas, representando uma clara violação do princípio geral da boa fé (cfr. Mário Pinto, Pedro Furtado Martins e António Nunes de Carvalho, Comentário às Leis do Trabalho, volume I, ed. Lex, Lisboa, 1994, pág. 161). Como refere António Menezes Cordeiro (Manual de Direito do Trabalho, ed. Almedina, Coimbra, reimpressão, 1999, págs. 755 e 756): "O princípio da boa fé apresenta-se aqui sob a sua dupla faceta de tutela da confiança e da primazia da materialidade subjacente. (...) A primazia da materialidade subjacente veda a utilização do processo disciplinar para quaisquer outros fins que não aqueles para que a lei o estabelece: o apuramento duma efetiva infração disciplinar e a sua punição. Justamente este ponto dá lugar a delicados conflitos de interesses: o empregador pode usar o poder disciplinar para retaliar contra trabalhadores incómodos ou para os desincentivar no exercício das suas posições sindicais. A lei especificou, assim, a categoria das sanções abusivas, que mais não são do que um afloramento desta regra geral…” E adianta-se no acórdão: “O abuso implica, se bem se atentar, a conjugação entre dois elementos: - um elemento objetivo, traduzido no facto de, a uma determinada atuação do trabalhador em defesa dos seus direitos, se seguir um procedimento disciplinar; - um elemento subjetivo consistente no facto de, com o procedimento disciplinar, a entidade empregadora visar responder ao exercício, pelo trabalhador, das suas posições.” Em sentido idêntico refere-se no Ac. RC de 11/4/2013, processo nº 217/12.5TTLRA.C1: “… Exige-se, também, uma relação direta de causa /efeito entre uma situação enquadrável numa das 4 alíneas desse nº 1 do artº 331º e a sanção aplicada. No Ac. do STJ de 5/12/2001, in Ac. Doutrinais, 487º, 1068, decidiu-se, em termos que mantêm plena atualidade, que a ratio legis do caráter abusivo da sanção reside na natureza persecutória da punição, ou seja, no facto de a verdadeira razão da aplicação da sanção disciplinar se situar fora da punição da conduta ilícita e culposa do trabalhador. Inexistindo ilicitude da conduta disciplinarmente punida, ou, acrescentamos nós, invalidade do procedimento disciplinar, a sanção aplicada ao trabalhador mostra-se ilegal, mas não abusiva, quando não está demonstrado que, subjacente ao exercício do poder disciplinar, se encontrava uma medida de retaliação da entidade empregadora face ao exercício de direitos por parte do trabalhador…” Resulta da norma no que tange ao nº 1 que compete ao trabalhador, nos termos do artigo 342º do CC, provar qualquer das circunstâncias referidas nas respetivas alíneas e a sua relação direta com a sanção aplicada. A circunstância é motivadora da sanção, como flui do corpo do normativo. O nº 2 do normativo pretende obviar ao facto de ser difícil provar o elemento subjetivo acima referido, a relação direta entre a sanção aplicada e as circunstâncias enunciadas nas alíneas do nº 1, estabelecendo uma presunção ilidível, em benefício do trabalhador. Nestes caso, compete a este demonstrar a circunstância ou pressuposto da presunção, previstas nas alíneas do nº 2, cabendo à entidade patronal ilidir aquela, demonstrando que a sanção disciplinar aplicada teria tido lugar ainda na ausência daquela circunstância, para o que relevará por exemplo a demonstração da pratica disciplinar da empresa em relação aos comportamentos imputados e a prova destes ou a demonstração da seriedade do seu convencimento quanto à verdade dos mesmos. É que o simples facto de não se lograr a demonstração dos comportamentos infratores imputados ao trabalhador não implica por si só, ainda na presença de uma circunstância do nº 2 do artigo referido, que a sanção seja abusiva. No caso o PD teve por base imputações feitas pelo trabalhador à entidade patronal tidas por falsas. Os factos imputados à patronal são os seguintes. “a) – Que o Diretor Técnico, Carlos... tem vindo a assumir um conjunto de comportamentos atentatórios contra a pessoa e a dignidade profissional do arguido, designadamente a colocação propositada de um parafuso no banco do carro que é ocupado pelo instrutor…” b) “Tal facto impediria a regulação do banco vendo-se obrigado a ministrar as aulas com as pernas encolhidas, ao ponto de ficarem adormecidas.” c) “ Exigência do Sr. Carlos... que a porta da sala de teórica (código), tenha de ficar aberta, durante o leccionamento do código - procedimento nunca antes perfilhado pela entidade empregadora;” d) “O recibo de retribuição mensal do mês de fevereiro de 2014 apresenta um desconto de 130,00eur o qual foi feito sem consentimento desconhecendo a razão para tal desconto”. e) “Igual procedimento em março de 2014.” f) “ Já há algum tempo paga a lavagem e limpeza do carro que lhe está atribuído.” g) “Encontrou no automóvel em que exerce a instrução um gravador portátil destinado a gravarem-lhe as conversas existentes no interior do veículo alegando que o trabalhador terá furtado esse aparelho a um aluno que tirou a carta de pesados há cerca de um atrás.” h) “No dia 23 de setembro de 2014, o Diretor Técnico Carlos... ordenou-lhe que se dirigisse para a sala de mecânica e se mantivesse lá mas de pé, tendo o mesmo lá permanecido cerca de duas horas.” i) “Igual comportamento no dia 24/09/2014 tendo o trabalhador arguido permanecido lá o dia todo”. j) “Tendo já comunicado tais situações à Entidade Empregadora a à ACT.” k) “Mais afirma o trabalhador arguido que vem sofrendo, desde a alguns meses, graves pressões provocadas por atitudes reiteradas do Sr. Carlos....” Naquele processo imputava-se ao autor a recusa em lecionar uma aula programada de teoria da condução, porque o Srº Carlos... estava presente para assistir, tendo escrito no espaço destinado a descrever a matéria lecionada: “ O Srº João anda a fazer pressão psicológica, agora obriga-me a dar aulas na presença dele procedimento nunca adotado antes. Depois de conversa desagradável à frente do aluno…” Refira-se que o simples facto que a dita resposto que deu origem a novo processo constituir em si mesmo o exercício de um direito de defesa, não é só por si impedimento à instauração de novo processo disciplinar, nem implica só por si que o recurso a novo procedimento seja abusivo. Concorda-se contudo com o entendimento no sentido de que a sanção não deixa de ser abusiva pelo facto de ao trabalhador não assistir o direito que pretendeu exercer e que veio a ser a causa motivadora do procedimento disciplinar, isto porque o que releva é a distorção o aproveitamento do mecanismo legal para perseguir o trabalhador, situando-se a aplicação da sanção “fora de uma conduta ilícita do trabalhador”. Pretender exercer direitos que afinal não se têm não é ilícito. Para as questões que surgem no desenvolvimento da relação laboral, estabelece a lei os mecanismos adequados de resolução, que não passam pela instauração de procedimento disciplinar. Mas esta razão justifica o que justifica, não pode dar cobertura a condutas ilícitas. O trabalhador não pode ser perseguido porque exerceu o direito de defesa num outro processo disciplinar, mas tal não lhe dá o direito de cometer ilícitos, quiçá criminais no exercício desse direito. Por esses atos ilícitos já nada obsta a que seja instaurado procedimento. As imputações devem no entanto ser lidas no quadro em que são proferidas, e é, no âmbito da defesa em sede de procedimento disciplinar. É que importa garantir o exercício desse direito, sem a ameaça de por causa dele vir a sofrer novas remetidas. Um dos princípios fundamentais do PD é o principio do contraditório, e o direito de defesa que vem consagrado no artigo 329º, nº 6 e 355º do CT, o qual implica não apenas o direito a ser ouvido, mas sobretudo o direito a contestar e apresentar prova. A sua falta implica nulidade do PD. O exercício desse direito implica que o visado tenha conhecimento integral dos factos e infração imputados a fim de poder cabalmente defender-se. Refere o artigo 355º do CT. 1 - O trabalhador dispõe de 10 dias úteis para consultar o processo e responder à nota de culpa, deduzindo por escrito os elementos que considera relevantes para esclarecer os factos e a sua participação nos mesmos, podendo juntar documentos e solicitar as diligências probatórias que se mostrem pertinentes para o esclarecimento da verdade. … O direito de defesa não é absoluto, no sentido de que o visado não pode dizer o que bem lhe aprouver, alegando factos falsos e injuriosos, imputações graves e falsas, falseando dados, etc… O direito de defesa deve ser exercido também ele com obediência à lei e aos princípios que norteiam o estado direito, com respeito devido aos outros cidadãos. Há uma ética no exercício do direito, que se funda nos princípios do estado de direito. A não ser assim permitir-se-ia em sede de defesa a violação de direitos de outrem constitucionalmente consagrados e protegidos. O cabal exercício do direito de defesa pode contender com direitos de outrem, como o direito ao bom nome, reputação, etc… Exercido dentro destes limites e pressupostos, o exercício do direito de defesa, pode mesmo assim no caso concreto, para ser eficaz e cabal, conflituar com direitos alheios. No caso presente digladiam-se de um lado o direito de defesa do recorrente com o direito ao bom nome e reputação da ré e de um superior hierárquico do autor. O conflito implica a necessidade de proceder a uma “concordância”, uma adequação entre os direitos, ou à prevalência do que seja considerado superior. Na analise da concreta ponderação deve levar-se em linha de conta a natureza dos direitos e valores em causa, o seu peso e relevância no tecido sociojurídico, sopesando-os de acordo com os princípios da proporcionalidade, razoabilidade, adequação, em ordem à salvaguarda na medida do possível de cada um dos direitos. No caso concreto o direito de defesa contende com o direito à justiça em sede de procedimento disciplinar, sendo este um dos pilares do estado de direito, contendendo com o direito à estabilidade no emprego – artigo 53º da CRP -, e com a realização da dignidade humana – artº 1º da CRP -. Anda-lhe associado o interesse público na realização da justiça – artigos 20º e 32º da CRP -. O direito ao bom nome, à honra, contende com a esfera pessoal da dignidade humana – artigos 25º e 26º da CRP e 70º do CC -. No caso concreto, o impacto de um e outro é diferente. Relativamente ao autor a limitação do direito de defesa comporta consequências bem mais gravosas, por contender, dada a anunciada intenção de despedimento com justa causa, quer com o direito ao emprego, a um rendimento, condição sem a qual não estão criadas as condições para uma vida com um mínimo de dignidade, quer com a honorabilidade do autor. O direito de defesa, contando que, como já referido, exercido de forma ética, e atento o seu relevante interesse público, não pode ser constrangido ou limitado no que tange à invocação de factos ocorridos, ou de que o exercitante do direto em face das circunstâncias conhecidas tem a convicção séria de terem ocorrido, sob pena de perigar toda a estrutura procedimental do estado de direito, assente nos princípios do contraditório e de um amplo direito de defesa. O que não pode é o exercitante utilizar expressões ofensivas, denegrir de forma gratuita, ir além do necessário à sua defesa quanto a alegação põe em causa direitos de outrem. Vejamos se o direito de defesa excede os limites do necessário a uma defesa eficaz, analisando alínea a alínea. “a) – Que o Diretor Técnico, Carlos... tem vindo a assumir um conjunto de comportamentos atentatórios contra a pessoa e a dignidade profissional do arguido, designadamente a colocação propositada de um parafuso no banco do carro que é ocupado pelo instrutor…” Como já dissemos não é necessário que se demonstre a veracidade do alegado, pois múltiplas razões podem ocorrer para tal, limitar a “legalidade “ da defesa à prova do alegado constituiria em si já uma forte limitação ao direito de defesa. Quanto ao facto referido, não vem demonstrado o seu contrário. Dos factos resulta que efetivamente foi colocado um parafuso no banco do veículo ocupado pelo instrutor – facto 29 (Pelo menos em março de 2014 foi colocado um parafuso no dispositivo de regulação de afastamento do banco do carro que utilizava para as aulas práticas de condução que impedia o banco de deslizar até ao final da calha), embora não se tenha apurado quem o colocou nem a razão de tal colocação. Contudo, no quadro de uma relação conturbada que vinha de trás, não pode dizer-se que a alegação do facto em sede de defesa em processo disciplinar seja excessiva. No PD o autor vinha acusado de ter recusado dar uma aula na presença do diretor técnico, facto que segundo ele nunca antes tinha ocorrido, e que entendeu como um ato de provocação e humilhação. No quadro da defesa arquitetada, no sentido de a pretensão em assistir à aula vinha na sequência de um conjunto de comportamentos atentatórios da sua dignidade, a invocação do facto tem cabimento. Certo que não se demonstrou que tenha sido por ordem daquele que o parafuso foi colocado, a prova falhou, mas certo é também que o parafuso foi colocado. Considerando a função e peso do diretor técnico, marido da sócia-gerente e que como se refere no ponto 28, “sempre se ocupou das questões relativas aos veículos, instrutores e contabilidade na ré”, a imputação não é excessiva, no quadro do exercício do direito de defesa. c) “ Exigência do Sr. Carlos... que a porta da sala de teórica (código), tenha de ficar aberta, durante o leccionamento do código - procedimento nunca antes perfilhado pela entidade empregadora;” A exigência existiu, conforme facto 30, e nada nem de estranha a invocação. d) “O recibo de retribuição mensal do mês de fevereiro de 2014 apresenta um desconto de 130,00eur o qual foi feito sem consentimento desconhecendo a razão para tal desconto”. e) “Igual procedimento em março de 2014.” O desconto existiu, para cobrança de divida relativa a prestações do preço da carta de condução do filho do autor, e não se demonstrou que o autor tenha dado autorização. f) “ Já há algum tempo paga a lavagem e limpeza do carro que lhe está atribuído.” Não ocorre imputação de qualquer comportamento à ré, é inócuo. g) “Encontrou no automóvel em que exerce a instrução um gravador portátil destinado a gravarem-lhe as conversas existentes no interior do veículo alegando que o trabalhador terá furtado esse aparelho a um aluno que tirou a carta de pesados há cerca de um atrás.” Valem as considerações expendidas a propósito da questão da colocação do parafuso. O gravador estava efetivamente no veículo, em funcionamento e a gravar, conforme facto 33. Tanto que como resulta do facto 34, tendo tal acontecimento chegado ao conhecimento do Diretor Técnico da Ré, Sr. Carlos..., este disse que o entregasse que não era do Autor e que pertencia a um antigo aluno. E resulta ainda do facto 15 que o autor recebeu uma carta escrita por advogado, em representação de Pedro…, a solicitar a entrega de um gravador que havia sido encontrado num veículo onde o A. leciona a instrução/condução. h) “No dia 23 de setembro de 2014, o Diretor Técnico Carlos... ordenou-lhe que se dirigisse para a sala de mecânica e se mantivesse lá mas de pé, tendo o mesmo lá permanecido cerca de duas horas.” i) “Igual comportamento no dia 24/09/2014 tendo o trabalhador arguido permanecido lá o dia todo”. j) “Tendo já comunicado tais situações à Entidade Empregadora a à ACT.” Relativamente a esta matéria vem provado, factos 36 e 37, que a Ré, mais uma vez através do seu diretor técnico, em fins de setembro, ordenou ao A. que se dirigisse para a sala onde se leciona mecânica e que aí permanecesse, o que o A. fez, tendo ali permanecido. No dia seguinte, 24 de setembro, o Autor depois de assinar o livro de ponto perguntou qual era o seu serviço para aquele dia, sendo informado pelo Sr. Carlos... que não tinha serviço e que se dirigisse novamente para a sala de mecânica, onde permaneceu até às 12 horas daquele dia. Conquanto não se tenha demonstrado que a ordem foi para ficar em pé, existiram ordens, sendo que num dos dias o autor foi visto em pé por uma das alunas, conforme já referido na parte em que se apreciou a decisão relativa à matéria de facto. Quanto à comunicação à ACT, corresponde ao exercício de um direito. k) “Mais afirma o trabalhador arguido que vem sofrendo, desde a alguns meses, graves pressões provocadas por atitudes reiteradas do Sr. Carlos....” Trata-se de uma imputação genérica que se compreende no quadro das relações tensas alegadamente existentes, sem excesso, sem injúrias ou apreciações à pessoa do seu superior. Assim sendo carece de sentido quer a dedução do procedimento disciplinar quer a sanção aplicada. Tendo o procedimento por base exclusivamente resposta a nota de culpa em um outro processo disciplinar, mostra-se demonstrada a presunção de abuso da sanção aplicada, prevista no nº 2 do artigo 331º, al. a), com referência à al. d) do nº 1. Assim deve ser anulada a sanção disciplinar. *** - Da não caducidade do direito à resolução – início da contagem do prazo. O recorrente sustenta que não ocorreu a caducidade de resolução do contrato, aludindo a que se trata de factos instantâneos com efeitos duradouros, suscetíveis de agravamento com o decurso do tempo, iniciando-se o prazo apenas quando no quadro da relação assumem gravidade tal que a subsistência do contrato se torna impossível. Alude por outro a que resolveu o contrato com fundamento em assédio, iniciando-se o prazo apenas quando for praticado o último ato de violação do contrato. O artº 395.º do CT dispõe quanto ao prazo nos seguintes termos: Procedimento para resolução de contrato pelo trabalhador 1 – O trabalhador deve comunicar a resolução do contrato ao empregador, por escrito, com indicação sucinta dos factos que a justificam, nos 30 dias subsequentes ao conhecimento dos factos. … Foi considerado que tendo a resolução ocorrido a 22/1/2015, os factos alegados sempre teriam ocorrido antes de 22/12/2014, pelo que caducou o direito à resolução. Por carta registada com aviso de receção de 20 de janeiro de 2015 dirigida à Ré, e por esta recebida em 22 de janeiro de 2015, o Autor notificou-a da resolução do seu contrato de trabalho com invocação de justa causa, alegando vários factos, conforme referidos no ponto 9, consubstanciados na imputação de comportamentos vários à entidade patronal, tais como; Recusa do estatuto de trabalhador estudante no ano letivo de 2012/2013, colocação de parafuso no banco do carro, ordem para passar a das aulas teóricas de porta aberta com intuito de constranger e perturbar, desconto nos recibos de 2 e 3 de 2014, pagamento por si de lavagens da viatura, colocação de gravador na viatura encontrado em 11/8/2014, ordem para ficar de pé na sala de mecânica em 23/9/2014, no dia seguinte e por várias vezes, colocação na mesma sala sem ocupação, dedução do processo disciplinar de 30/10/2014 com intuito provocatório e de humilhação, instauração de novo processo em 10/12/2014 com idêntico intuito, sendo aplicada a sanção de 15 dias de suspensão com perda de retribuição. Com exceção da sansão aplicada neste último processo disciplinar, notificada a 9/1/2015, todos os factos descritos ocorreram antes de 22/12/2014, constando aliás muitos deles da defesa apresentada no primeiro processo disciplinar. O artigo 395.º como já vimos refere que o trabalhador deve comunicar a resolução do contrato ao empregador, por escrito, com indicação sucinta dos factos que a justificam, nos 30 dias subsequentes ao conhecimento dos factos. O mobbing caracteriza-se, no que à questão importa, pela prática por banda da entidade empregadora de determinados comportamentos, durante um período de tempo mais ou menos longo, apresentando portanto natureza repetitiva, e com consequências na saúde física e psíquica do trabalhador e no próprio emprego. O mobbing contém naturalmente plúrimos comportamentos, que na sua individualidade não assumem o relevo que a ação conjunta e a interação das suas consequências realmente importa. Podem mesmo na sua individualidade mostrar-se relativamente inócuos, insignificantes, não adequados às consequências que se lhes imputam. O mobbing só é apreensível numa visão global de todos os comportamentos, tendo em conta a sua relação e ação conjunta. Para efeitos de caducidade do direito à resolução do contrato, deve ter-se em atenção naturalmente o conjunto. Assim só com a prática do último ato de assédio inicia a contagem do prazo. Importa lembrar que em matéria de resolução do contrato o princípio orientador será o “da atualidade da justa causa”, traduzindo-se na imposição de que a resolução deve ocorrer o mais próximo possível do facto que lhe serve de fundamento. Assim e invocando-se uma situação de mobbing, deve partir-se naturalmente da data em que tal situação teve termo. Voltando ao caso, e não obstante o referido, o autor não demonstrou o invocado assédio, valendo-nos aqui das considerações tecidas na decisão recorrida, para que se remete e de que se transcreve o seguinte excerto: “De tal factualidade decorre que os comportamentos que se provaram e que o A. qualificou como persecutórios e vexatórios relativamente à sua pessoa, encontram uma razão gestionária e empresarial plausível (caso da não concessão do estatuto de trabalhador estudante), ou estão contidos na faculdade de conformação e de fiscalização da atividade do trabalhador que cabe no poder de direção do empregador (ordem para lecionar de porta aberta e presença do Diretor Técnico nas aulas lecionadas pelo A.) – não cabendo aqui formular qualquer juízo de adequação e eficácia das decisões gestionárias e conformadoras da atividade do A. tomadas pela ré. Por outro lado, não se pode concluir da matéria de facto apurada que a conduta da Ré, ainda que não intencional, fosse de molde a perturbar ou constranger o A., a afetar a sua dignidade, a criar-lhe um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador. Assim, apesar das vicissitudes ocorridas na execução do seu contrato de trabalho se terem repercutido negativamente na vida pessoal e profissional do A. e provocado neste sofrimento físico e psicológico, bem como sentimentos de humilhação e injustiça, a atuação da Ré não é subsumível ao conceito de assédio moral, pois não implicou tratamento manifestamente humilhante, vexatório e atentatório da dignidade do trabalhador, reconduzindo-se, assim, a um normal conflito laboral entre trabalhador e empregador…” Assim sendo, com exceção da invocação de aplicação de sanção abusiva, ocorreu a caducidade relativamente aos factos invocados para sustentar a resolução do contrato, sendo nesta parte de confirmar o decidido. * Da justa causa de resolução do contrato, com base na exercício abusivo do poder disciplinar. Refere o artigo 394.º Justa causa de resolução 1 – Ocorrendo justa causa, o trabalhador pode fazer cessar imediatamente o contrato. 2 – Constituem justa causa de resolução do contrato pelo trabalhador, nomeadamente, os seguintes comportamentos do empregador: … c) Aplicação de sanção abusiva; … 4 – A justa causa é apreciada nos termos do n.º 3 do artigo 351.º, com as necessárias adaptações. Nos termos do art. 394.º, nº 4 do C.T. a justa causa de resolução por parte do trabalhador, deve ser apreciada nos termos do nº 3 do art. 351º, com as necessárias adaptações. Deve ponderar-se o grau de lesão dos interesses do trabalhador, o caráter das relações entre as partes e demais circunstâncias que se mostrem relevantes, de molde a poder aquilatar-se da impossibilidade imediata e prática da subsistência do vínculo laboral. Na apreciação desta impossibilidade há que considerar que o trabalhador é a parte mais fraca da relação, contendendo o seu estatuto de sujeição na relação com dimensões da dignidade humana. Há ainda que ponderar que enquanto o empregador dispõe de um acervo de sanções para reagir contra comportamentos infratores por parte do trabalhador, este não tem outras formas de reação que não a rescisão. Por tais razões, a apreciação daquela impossibilidade assume ao nível da rescisão contornos próprios em relação à mesma apreciação quando invocada pela entidade patronal. Em face da aplicação de sanção abusiva, considerando ainda que a instauração do PD constitui por si e no caso concreto uma forma de constrangimento ao exercício do direito de defesa em processo disciplinar, é de considerar verificada a justa causa. Consequentemente nesta parte procede a apelação, improcedente consequentemente a reconvenção. * Nos termos do artigo 396º do CT, assiste ao trabalhador direito a indemnização a determinar entre 15 a 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau da ilicitude do comportamento do empregador, não podendo ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades. No caso de fração de ano de antiguidade, o valor da indemnização é calculado proporcionalmente. Nos termos do nº 3 do normativo, o valor da indemnização pode ser superior ao que resultaria da aplicação do n.º 1 sempre que o trabalhador sofra danos patrimoniais e não patrimoniais de montante mais elevado. No caso presente não vêm demonstrados danos não patrimoniais que justifiquem tutela, com relação ao processo disciplinar e sanção aplicada. Note-se que no decurso deste já o autor estava de baixa. Apenas vem provado, que a forma como ocorreu a cessação do contrato de trabalho provocou ao Autor grande tristeza e aborrecimento, sentindo este que tinha sido humilhado e descredibilizado como profissional de forma que reputava injustificada e injusta. O facto alude a sentimentos decorrentes de factualidade que o autor não logrou provar, como as alegadas humilhações e descredibilizações. Considerando as circunstâncias referidas na 2ª parte do nº 1 do artigo 396º, atendendo ao facto de que embora no entendimento perfilhado o recurso ao procedimento disciplinar foi indevido e abusiva a sanção, porque o autor exercera um direito fundamental à defesa, os dizeres daquela resposta poem em cheque o comportamento da ré e do diretor técnico, atingindo-os na sua honorabilidade, afigura-se adequada a fixação de uma indemnização de 20 dias. A indemnização monta a 8.858,16 €. Assim e nesta parte procede a apelação. DECISÃO: Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar parcialmente procedente a apelação, julgando improcedente a reconvenção, anulando-se a sanção disciplinar de 15 dias de suspensão, e na procedência da justa causa de resolução do contrato condenando a ré a pagar ao autor a indemnização de € 8.858,16, com juros desde a citação à taxa legal. No mais confirma-se a decisão. * Custas nesta instância pelo apelante e apelada na proporção de metade, sendo as de primeira instancia na proporção de decaimento. *** Guimarães, 2 de Junho de 2016 Sumário: no caso de aplicação de sanção abusiva, a censurabilidade da conduta da entidade patronal radica no “abuso do direito” que resulta da utilização do poder disciplinar para fins diversos daqueles a que se destina. Compete ao trabalhador, provar qualquer das circunstâncias referidas nas alíneas do artigo 331º do código do trabalho e sua relação direta com a sanção aplicada. O nº 2 do aludido normativo, estabelece uma presunção ilidível, em benefício do trabalhador, cabendo ao empregador demonstrar que a sanção disciplinar aplicada teria tido lugar ainda na ausência daquela circunstância. O simples facto de a resposta a processo disciplinar constituir o exercício de um direito de defesa, não é só por si impedimento à instauração de novo processo disciplinar, com base no teor da resposta. As imputações feitas à entidade patronal ou seu colaborador na defesa em processo disciplinar, devem ser lidas no quadro em que são proferidas, importando garantir o exercício do direito de defesa, sem a ameaça de por causa dele vir a sofrer novas remetidas. - O direito de defesa deve ser exercido com obediência à lei e aos princípios que norteiam o estado direito, com respeito devido aos outros cidadãos, devendo no caso de conflito com direitos de outrem, como o direito ao bom nome, proceder-se a uma “concordância”, uma adequação entre os direitos, ou à prevalência do que seja considerado superior. O direito de defesa, desde que exercido de forma ética, e atento o seu relevante interesse público, não pode ser constrangido ou limitado no que tange à invocação de factos ocorridos, ou de que o exercitante do direito em face das circunstâncias conhecidas tem a convicção séria de terem ocorrido, sob pena de perigar toda a estrutura procedimental de um estado de direito, assente nos princípios do contraditório e de um amplo direito de defesa. O mobbing caracteriza-se, pela prática por banda da entidade empregadora de plúrimos comportamentos, durante um período de tempo mais ou menos longo, que na sua individualidade não assumem o relevo que a ação conjunta e a interação das suas consequências realmente importa, com consequências na saúde física e psíquica do trabalhador e no próprio emprego. Para efeitos de caducidade do direito à resolução do contrato, deve ter-se em atenção o conjunto. Assim só com a prática do último ato de assédio inicia a contagem do prazo. |