Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | CRUZ BUCHO | ||
Descritores: | CUMPRIMENTO PENA HABITAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 06/23/2008 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | ANULAR TODO O PROCESSADO SUBSEQUENTE AO REQUERIMENTO | ||
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Sumário: | I – O arguido veio requerer a reabertura da audiência para aplicação retroactiva de lei penal mais favorável, pretendendo que seja admitido a cumprir em regime de permanência na habitação a pena de prisão que lhe foi aplicada. II – E, efectivamente, em conformidade com a nova redacção do artigo 44° do Código Penal, que lhe foi conferida pela citada Lei nº 59/2007, passou a ser admissível o cumprimento da pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, sempre que o tribunal concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. III – Trata-se de uma nova pena de substituição que associa a vigilância electrónica que apenas estava prevista como mecanismo de fiscalização do cumprimento da medida de coacção da obrigação de permanência na habitação. IV – A reabertura da audiência para aplicação da lei nova que se mostre mais favorável ao arguido condenado com decisão transitada depende de vários requisitos e, desde logo da iniciativa processual do condenado, proporcionando-lhe o direito · de escolha sobre a possível alteração da pena em que se encontra condenado. V – No caso em apreço, dir-se-ia que este requisito estará verificado em face do requerimento apresentado pelo ilustre defensor em que se peticiona que “a pena seja executada em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância (…)” . VI – Mas não é assim. VII - Nos termos do citado artigo 44°, à semelhança do que se exige no regime de semidetenção (art. 46°, nº 1) e na prestação de trabalho a favor da comunidade (artigo 58°, nº 5), a nova pena de substituição depende do consentimento do condenado (“Se o condenado consentir … ), sendo que o citado artigo 44° é omisso sobre a forma como esse consentimento deve ser expresso bem como sobre a questão de saber se o mesmo pode ser prestado pelo defensor ou apenas pelo condenado. VIII - A resposta a tais questões encontra-se no artigo 9° da citada Lei nº 59/2007, que determina que: “O disposto no nº 1 do artigo 1º, no artigo 2.°, nos nºs 2 a 5 do artigo 3º, nos artigos 4.° a 6.°, nas alíneas b) e c) do nº 1 do artigo 8.° e no artigo 9.° da Lei nº 122/99, de 20 de Agosto, que regula a vigilância electrónica prevista no artigo 201° do Código de Processo Penal, é correspondentemente aplicável ao regime de permanência na habitação previsto nos artigos 44° e 62º do Código Penal.” IX – Ora, como refere o artigo 2° da Lei nº 122/99 de 20 de Agosto: 3 - O consentimento do arguido é prestado pessoalmente perante o juiz, na presença do defensor, e reduzido a auto. 4 – Sempre que a utilização de meios de vigilância electrónica for requerida pelo arguido, o consentimento considera-se prestado por simples declaração deste no requerimento. X – Assim, quando for requerida pelo arguido a lei exige uma declaração do arguido que ou assina o requerimento juntamente com o seu ilustre defensor onde declara que dá o seu consentimento ou anexa a este uma declaração consentindo na utilização de meios de vigilância electrónica, pois que o consentimento só pode ser prestado pelo arguido e não pelo seu defensor, salvo se este estiver munido de poderes especiais emitidos para esse concreto efeito. XI - Situação idêntica ocorre na semidetenção (art. 46°, nº 1), na prestação de trabalho a favor da comunidade (artigo 58°,nº 5), na imposição da regra de conduta de sujeição a tratamento médico ou a cura em instituição adequada (artigo 52°, nº 2) e em todas as situações em que estejam em causa direitos reservados pessoalmente ao arguido (cfr. artigo 63°, nº 1, in fine, do Código de Processo Penal) como os previstos nos artigos 281º, al. a), 300°, nº 3, 334º, nº 2, 356°, nº 2, al. b), 357°, nº 1, al. a), 359°, nº 2, 415°, nº 1 e 497º, nº 2, todos do Código de Processo Penal (cfr. Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, Lisboa, 2007, pág. 198). XII - Como no caso em apreço o requerimento apenas foi assinado pelo ilustre defensor do arguido, não foi acompanhado de qualquer declaração do arguido e o seu defensor não se encontra munido de poderes especiais, não pode reputar-se válida a declaração feita pelo mesmo defensor de que “desde já, o arguido dá o seu consentimento” para a utilização de meios de vigilância electrónica, pelo que não deveria ter-se designado nem realizado a audiência, sem que antes fosse junta a declaração em falta, depois de o defensor ser notificado para o efeito, sob pena de indeferimento. XIII – A omissão daquela formalidade configura irregularidade que, embora não arguida pelo Ministério Público no prazo a que alude o nº 1 do artigo 123°, do C. P. Penal, reveste grande gravidade, uma vez que se colocou em funcionamento toda a máquina da justiça ao serviço de uma pretensão que está na inteira disponibilidade do arguido, sem que este a tenha validamente formulado, dando o seu expresso consentimento à execução da pena em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meio de controlo à distância. XIV - Impõe-se, pois, a anulação de todo o processado subsequente ao requerimento referido, após o que deverá o ilustre Defensor do arguido ser notificado para juntar a declaração em falta sob pena de indeferimento. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães: * I- RelatórioNo processo comum singular nº 479/06.7PBGMR do 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Guimarães, por sentença de 18 de Fevereiro de 2008, foi indeferido o requerimento apresentado pelo arguido L... Mendes no qual solicitava o cumprimento em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, da pena de seis meses de prisão em que fora condenado nestes autos, por sentença transitada em julgado, pela prática de um crime de violação de proibições, p. e p. pelo art.º 353º do Código Penal, tendo sido determinado o cumprimento da pena nos moldes anteriormente definidos. * Inconformado com tal sentença, o arguido dela interpôs recurso, rematando a sua motivação com as seguintes conclusões que se transcrevem:«1ª- O Recorrente vive em habitação sem energia eléctrica. 2ª - Nos termos da informação da DGRS, a existência de energia eléctrica é condição indispensável para aplicação de meios de vigilância electrónica; 3ª- Consequentemente, o Recorrente está automaticamente excluído da possibilidade legal de cumprir a pena de prisão que lhe foi aplicada no regime de permanência na habitação, nos termos previstos pela Lei N° 122/99 de 20 de Agosto e pela norma do artigo 44°, N° 1, alínea a) do Código Penal, com a redacção dada pela Lei N° 59/2007 de 4 de Setembro; Como tal, o recorrente entende que: 4ª - A Lei N° 122/99 de 20 de Agosto (que regula a vigilância electrónica), é inconstitucional, por violação do n.O 2 do artigo 13° da Constituição da República Portuguesa (princípio da igualdade), na parte em que só permite a utilização de meios técnicos de controlo à distância para fiscalização do cumprimento da obrigação de permanência na habitação, nos casos em que o arguido vive numa habitação com energia eléctrica; e que 5ª - A norma do artigo 44°, N° 1, alínea a) do Código Penal, com a redacção dada pela Lei N° 59/2007 de 4 de Setembro, é também inconstitucional, por violação do n. ° 2 do artigo 13 ° da Constituição da República Portuguesa, na parte em que, nos casos em que ao arguido é aplicada pena de prisão não superior a um ano, só permite a aplicação do regime de permanência na habitação, se nesta existir energia eléctrica para instalar os meios técnicos de controlo à distância. Termos em que, deve ser admitido o presente recurso, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo e, consequentemente, na medida das articuladas conclusões e pelo douto suprimento, revogado o despacho recorrido, assim se fazendo JUSTIÇA.» * O Ministério Público junto do tribunal a quo pronunciou-se pela manutenção do julgado.* Por despacho constante de fls. 425 o recurso foi admitido, para o Tribunal da Relação de Guimarães, com subida imediata, nos próprios autos e efeito suspensivo. * Nesta Relação, o Exmo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer pronunciando-se pela improcedência do recurso.* Cumprido o disposto no artigo 417º, n.º2 do Código de Processo Penal e colhidos os vistos legais, vieram os autos à conferência pelo que cumpre conhecer. * II- Fundamentação1. É o seguinte o teor da decisão recorrida (transcrição): «1. Por decisão de fls. 98 e ss., transitada em julgado, foi L... Mendes condenado pela prática de um crime de violação de proibições, p. e p. pelo art.º 353º do C.P., na pena de 6 (seis) meses de prisão. A fls. 352 e ss. veio requerer a reabertura da audiência para aplicação retroactiva de lei penal mais favorável, pretendendo que seja admitido a cumprir em regime de permanência na habitação a pena de prisão que lhe foi aplicada. Foi solicitada à DGRS a elaboração do relatório a que alude o art.º 3º, n.º 5 da Lei n.º 122/99, de 20.08. Foi reaberta a audiência. 2. Com interesse para a decisão, considero provados, para além dos factos constantes da decisão final, os seguintes factos: A habitação do arguido não dispõe de condições que permitam a instalação de meios e vigilância electrónica. 3. De acordo com o disposto no art.º 371º-A do C.P.P., se após o trânsito em julgado da condenação mas antes de ter cessado a execução da pena, entrar em vigor lei penal mais favorável, o condenado pode requerer a reabertura da audiência para que lhe seja aplicado o novo regime. Com a entrada em vigor da Lei n.º 59/2007, de 04.09, passou a ser admissível o cumprimento da pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, sempre que o tribunal concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. O arguido, de acordo com o relatório da DGRS, não apresenta condições compatíveis com esta forma de cumprimento da pena. Por outro lado, notificado do relatório da DGRS, não apresentou alternativas que permitissem cumprir em regime de permanência na habitação a pena de prisão que lhe foi aplicada. 4. Assim, indefere-se o requerido, determinando-se o cumprimento da pena de prisão nos moldes anteriormente definidos. Notifique, sendo-o o(a) condenado(a), também na pessoa do seu defensor. Notifique-o(a) ainda para, em 10 dias, informar se tem período de detenção, prisão preventiva ou obrigação de permanência na habitação a descontar no cumprimento da pena de prisão, nos termos do disposto no art.º 80º do CP. Comunique à DGRS. Após trânsito, passe mandados de condução do arguido ao EP.» 1. Modo de subida e efeito do recurso O recurso foi admitido com subida imediata, nos próprios autos e efeito suspensivo. Mas, como bem salienta o Ministério Público junto do tribunal a quo, a decisão recorrida não é subsumível em nenhuma das situações previstas no artigo 408º do Código de Processo Penal. Não estamos, nomeadamente, perante uma decisão condenatória e não se está diante de uma decisão que ordena a execução da prisão num caso de não cumprimento de pena não privativa da liberdade. A execução da pena de prisão foi determinada pelo trânsito em julgado do Ac. da Relação de Guimarães que manteve a decisão condenatória da 1ª instância Consequentemente, o recurso, embora de subida imediata, sobe em separado, com efeito meramente devolutivo. Impunha-se, pois, que os autos fossem devolvidos ao tribunal a quo a fim de aí se extraído o competente traslado. * 2. Questão prévia Sucede, porém, que um vício bem mais grave inquinou todo o processo posteriormente à interposição do requerimento de reabertura de audiência a que alude o artigo 371º-A do Código de Processo Penal. * §1. É sabido que com a recente reforma ao Código Penal introduzida pela Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, desapareceu o limite contido na parte final da versão anterior do artigo 2º n.º4 do Código Penal (trânsito em julgado de sentença condenatória).É hoje possível, após o trânsito em julgado aplicar ao condenado um regime mais favorável, desde que se verifiquem os respectivos pressupostos legais. Por força do artigo 371º-A do Código de Processo Penal o arguido pode, após o trânsito em julgado da condenação, mas antes de cessar a execução da pena, requerer a reabertura da audiência para aplicação retroactiva da lei penal mais favorável. No caso em apreço o arguido L... Mendes foi condenado, por decisão transitada em julgado, pela prática de um crime de violação de proibições, p. e p. pelo art.º 353º do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão. A fls. 352 e ss. o arguido veio requerer a reabertura da audiência para aplicação retroactiva de lei penal mais favorável, pretendendo que seja admitido a cumprir em regime de permanência na habitação a pena de prisão que lhe foi aplicada. Efectivamente, em conformidade com a nova redacção do artigo 44º do Código Penal, que lhe foi conferida pela citada Lei n.º 59/2007, passou a ser admissível o cumprimento da pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, sempre que o tribunal concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Trata-se de uma nova pena de substituição (cfr. neste sentido as comunicações de Maria João Rodrigues e Jorge Gonçalves, citadas na resposta do Ministério Público junto do tribunal a quo, disponíveis in www.cej.mj.pt/) que associa a vigilância electrónica que apenas estava prevista como mecanismo de fiscalização do cumprimento da medida de coacção da obrigação de permanência na habitação. * §2. A reabertura da audiência para aplicação da lei nova que se mostre mais favorável ao arguido condenado com decisão transitada depende de vários requisitos (cfr. detalhadamente o Ac. da Rel. de Coimbra de 16-4-2008, proc.º n.º303703, rel. Fernando Ventura, in www.dgsi.pt), desde logo da iniciativa processual do condenado, proporcionando-lhe o direito de escolha sobre a possível alteração da pena em que se encontra condenado No caso em apreço, dir-se-ia que este requisito está verificado perante o requerimento junto a fls. 352-353 apresentado pelo ilustre defensor do arguido. Mas, não é assim. Por via daquele requerimento, o que se peticiona é que “a pena seja executada em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância (...)” Nos termos do citado artigo 44º, à semelhança do que se exige no regime de semidetenção (art. 46º, n.º1) e na prestação de trabalho a favor da comunidade (artigo 58º, n.º5), a nova pena de substituição depende do consentimento do condenado (“Se o condenado consentir…) O citado artigo 44º é omisso sobre a forma como esse consentimento deve ser expresso bem como sobre a questão de saber se o mesmo pode ser prestado pelo defensor ou apenas pelo condenado. A resposta a tais questões encontra-se no artigo 9º da citada Lei n.º 59/2007: “O disposto no n.º1 do artigo 1.º, no artigo 2.º, nos n.ºs 2 a 5 do artigo 3.º, nos artigos 4.º a 6.º, nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 8.º e no artigo 9.º da Lei n.º 122/99, de 20 de Agosto, que regula a vigilância electrónica prevista no artigo 201º do Código de Processo Penal, é correspondentemente aplicável ao regime de permanência na habitação previsto nos artigos 44º e 62º do Código Penal.» Ora o artigo 2º da citada Lei n.º 122/99 responde claramente as duas questões que deixamos enunciadas. É o seguinte o teor daquele preceito legal: Artigo 2.º Consentimento 1 - A utilização de meios de vigilância electrónica depende do consentimento do arguido. 2 - A utilização de meios de vigilância electrónica depende ainda do consentimento das pessoas que o devam prestar, nomeadamente das pessoas que vivam com o arguido e das que possam ser afectadas pela permanência obrigatória do arguido em determinado local. 3 - O consentimento do arguido é prestado pessoalmente perante o juiz, na presença do defensor, e reduzido a auto. 4 - Sempre que a utilização de meios de vigilância electrónica for requerida pelo arguido, o consentimento considera-se prestado por simples declaração deste no requerimento. 5 - As pessoas referidas no n.º 2 prestam o seu consentimento aos serviços encarregados da execução da vigilância electrónica por simples declaração escrita que deve acompanhar a informação referida no n. o 5 do artigo 3. o ou ser, posteriormente, enviada ao juiz. 6 - O consentimento do arguido é revogável a todo o tempo. Conforme decorre claramente dos n.ºs 3 e 4 do transcrito artigo 2º, a prestação do consentimento é um acto pessoal do arguido, que só por ele pode ser exercido. Quando prestado em acto presidido pelo juiz (v.g. interrogatório judicial de arguido detido, audiência de julgamento) tal consentimento é prestado pelo arguido “pessoalmente perante o juiz, na presença do defensor, e reduzido a auto (n.º 3) Quando for requerida pelo arguido a lei exige uma declaração do arguido que ou assina o requerimento juntamente com o seu ilustre defensor onde declara que dá o seu consentimento ou anexa a este uma declaração consentindo na utilização de meios de vigilância electrónica (n.º4). Conforme decorre daquele n.º4, o consentimento só pode ser prestado pelo arguido e não pelo seu defensor, salvo se este estiver munido de poderes especiais emitidos para esse concreto efeito. Situação idêntica ocorre na semidetenção (art. 46º, n.º1), na prestação de trabalho a favor da comunidade (artigo 58º, n.º5), na imposição da regra de conduta de sujeição a tratamento médico ou a cura em instituição adequada (artigo 52º, n.º2) e em todas as situações em que estejam em causa direitos reservados pessoalmente ao arguido (cfr. artigo 63º, n.º1, in fine, do Código de Processo Penal) como os previstos nos artigos 281º, al.a), 300º, n.º3, 334º, n.º2, 356º, n.º2, al. b), 357º, n.º1, al. a), 359º, n.º2, 415º, n.º1 e 497º, n.º2, todos do Código de Processo Penal (cfr. Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, Lisboa, 2007, pág. 198). Pode, pois, concluir-se que o requerimento de reabertura de audiência nos termos do artigo 371º-A do Código de Processo Penal para aplicação da pena de prisão em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância deve ser também assinado pelo arguido, (juntamente com o defensor), onde declara que dá o seu consentimento, ou anexa àquele requerimento uma declaração sua consentindo na utilização de meios de vigilância electrónica. Como no caso em apreço o requerimento apenas foi assinado pelo ilustre defensor do arguido, não foi acompanhado de qualquer declaração do arguido e o seu defensor não se encontra munido de poderes especiais, não pode reputar-se válida a declaração feita pelo mesmo defensor de que “desde já, o arguido dá o seu consentimento”(fls. 353 in fine) para a utilização de meios de vigilância electrónica. Consequentemente, não deveria ter-se designado nem realizado a audiência sem que antes fosse junta a declaração em falta, depois de o defensor ser notificado para o efeito, sob pena de indeferimento. A omissão daquela formalidade configura irregularidade que não foi arguida pelo Ministério Público no prazo a que alude o n.º 1 do citado artigo 123º, ou seja, nos três dias seguintes a contar daquele em que foi notificado para qualquer termos do processo. Sucede, porém, que o n.º 2 do mesmo normativo permite a reparação oficiosa de qualquer irregularidade, quando a mesma puder afectar o valor do acto praticado. Como bem esclarece o Cons.º Maia Gonçalves, em anotação ao citado preceito legal, apesar de as irregularidades serem consideradas em geral vícios de menor gravidade do que as nulidades, a grande variedade de casos que na vida real se podem deparar impõe que se não exclua a priori a possibilidade de ao julgador se apresentarem irregularidades de muita gravidade mesmo susceptíveis de afectar direitos fundamentais dos sujeitos processuais. Daí a grande margem de apreciação que se dá ao julgador, nos n.ºs 1 e 2, que vai desde o considerar a irregularidade inócua e inoperante até à invalidade do acto inquinado pela irregularidade e dos subsequentes que possa afectar, passando-se pela reparação oficiosa (Código de Processo Penal, 15ª ed., Coimbra, 2005, pág. 306). No caso em apreço a irregularidade cometida reveste grande gravidade, uma vez que se colocou em funcionamento toda a máquina da administração da justiça ao serviço de uma pretensão que está na inteira disponibilidade do arguido, sem que este a tenha validamente formulado, dando o seu expresso consentimento à execução da pena em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meio de controlo à distância. Impõe-se, pois, a anulação de todo o processado subsequente ao requerimento junto a fls. 352-353, após o que deverá o ilustre defensor do arguido ser notificado para juntar a declaração em falta sob pena de indeferimento. No caso de tal declaração vir a ser junta chama-se a atenção para a conveniência da audição do arguido, com a emissão de mandados de detenção para comparência se necessário, e da junção do competente relatório social, bem como para a necessidade do estrito cumprimento do disposto nos artigo 372º, n.ºs 3, 4 e 5, 373º e 374º, n.º 2, todos do Código de Processo Penal. * III- Decisão* Nestes termos e sem necessidade de maiores considerações, acordam os juízes desta Relação, em anular todo o processado subsequente ao requerimento junto a fls. 352-353, e determinam que, nos moldes supra indicados seja proferida despacho que supra a apontada irregularidade. * Sem tributação.* Guimarães, 23 de Junho de 2008 |