Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
293/12.0TTBGC.G1
Relator: ANTERO VEIGA
Descritores: CATEGORIA PROFISSIONAL
CONDENAÇÃO ULTRA PETITUM
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/11/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário: 1 - A categoria profissional do trabalhador é aquela que corresponder às funções por si efetivamente exercidas, e não a que a entidade patronal lhe atribui. Estas não podem classificar em desarmonia com as tarefas pelos trabalhadores realmente exercidas.
2 - A categoria quando institucionalizada é vinculativa para a entidade patronal.
3 - A atividade exercida, entendida como a função principal do trabalhador, deve corresponder ao conteúdo fundamental da categoria normativa, deve encaixar no “núcleo essencial “ desta.
4 - Com o princípio da condenação extra vel ultra petitum, pretende-se em sede de direito laboral, fazer sobrepor o princípio da verdade material à verdade formal e é corolário da irrenunciabilidade dos direitos
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

Sara…, intentou a presente ação especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento contra Centro …, IPSS.
Frustrada a conciliação a R. empregadora deduziu o seu articulado de motivação do despedimento individual, com fundamento em extinção do posto de trabalho por motivos de ordem financeira, económica e estrutural.
Foram juntos aos autos dentro do prazo legal os documentos comprovativos do cumprimento das formalidades legais.
A A. trabalhadora foi regularmente notificada para contestar, o que fez, pela forma que consta de 43 a 65 do apenso B, por exceção e por impugnação, formulando, ainda, o seguinte pedido reconvencional:
“(…)que sejam reconhecidos à Autora os direitos e as retribuições que seguidamente se especificam e a Ré em conformidade condenada:
I - A título principal:
A) - A reconhecer a Autora como trabalhadora, por tempo indeterminado, dos seus quadros de pessoal com a categoria de «Diretora de Serviços», nível de qualificação em que devia ter sido enquadrada de acordo com as funções que lhe foram determinadas e que exerceu desde a data da sua admissão em 01/05/2003 até ao início do ano de 2008 (…).
B) – Declarada a ilicitude do «despedimento por extinção de posto de trabalho» da Autora proferido pela instituição Ré e, em conformidade, esta condenada:
B.1) - Na REINTEGRAÇÃO da trabalhadora no seu posto e local de trabalho sem prejuízo da sua (supra referida) categoria e antiguidade.
B.2) - No pagamento das RETRIBUIÇÕES (a título de salários, diuturnidades, subsídio de alimentação, férias, subsídio de férias e subsídio de Natal), devidamente atualizadas, já vencidos e que se vencerem desde a data do seu despedimento até ao trânsito em julgado da sentença que vier a declarar a ilicitude do despedimento.
C) - Condenada a Ré a pagar à Autora:
C.1) - As retribuições respeitantes às DIFERENÇAS SALARIAIS:
C.1.1) - Correspondentes ao trabalho prestado no período compreendido entre o dia 01/05/2003 (data da admissão) e o dia 29/02/2008 (data até à qual de forma efectiva exerceu funções enquadráveis na categoria profissional de «diretora de serviços») - tendo por um lado por referência as retribuições mínimas mensais previsto para a categoria («diretora de serviços») e as retribuições mensais auferidas da Ré - que se calculam no valor de (….)…………...……..….... 37.744,34€.
C.1.2) - Correspondentes ao período compreendido entre o dia 01/03/2008 (data em que a título principal a Autora passou a desempenhar outras funções) e o dia 29/05/2012 (data da cessação do contrato) - tendo por um lado por referência as retribuições mínimas mensais previsto para a categoria («diretora de serviços») e as retribuições mensais auferidas da Ré e o princípio da irredutibilidade da retribuição convencional radicado na esfera jurídica da Autora por força das funções anteriormente desempenhada - que se calculam no valor de (…)…..….... 25.496,80€.
Total: ………………………………………………………………….. 63.241,14€.
C.2) - As retribuições respeitantes ao TRABALHO SUPLEMENTAR desenvolvido:
C.2.1) - No ano de 2007 que - tendo por um lado por referência a retribuição mínima mensal previsto para a categoria («diretora de serviços») e o acréscimo de 50% sobre o valor da hora normal, a que alude a cláusula 65.º da CCT, tendo por base de cálculo a fórmula expressa na sua cláusula 62.ª e o valor médio de 30 horas mensais – se calcula no valor de (7.33€ x 1,50 =11€ x 30 horas mensais = 330€ x 11 meses) …………..….... 3.630,00€.
C.2.2) - No ano de 2008 que - tendo por referência os antecedentes pressupostos - se calcula no valor de (7.50€ x 1,50 =11,25€ x 30 horas mensais = 337,50€ x 11 meses) ….... 3.712,50€.
C.2.3) - Nos anos de 2009 e 2010 que - tendo por referência os antecedentes pressupostos – se calcula no valor de (7.60€ x 1,50 =11,40€ x 30 horas mensais = 342€ x 22 meses)..….... 7.524,00€.
Total: …………………………………………………………….…….. 14.866,50€.
C.3) - No pagamento dos DANOS MORAIS emergentes para a trabalhadora em resultado do seu despedimento, que se peticionam ao abrigo do disposto no artigo 389.º n.º 1, alínea a) do Código do
Trabalho e no valor de ………………………………….…… 1.000€.
C.4) - OS JUROS DE MORA, à taxa legal, incidentes sobre as importâncias especificadas nos antecedentes itens B.2), C.1 e C.2) a partir da data do seu vencimento e sobre a especificada no item C.3) desde a sentença a proferir e, em todas as situações, até integral pagamento.
II - A título subsidiário:
A) - Declarar-se que a Autora é trabalhadora por tempo indeterminado (sem termo) da Ré.
B) - Declarar-se a ilicitude do «despedimento por extinção de posto de trabalho» da Autora proferido pela instituição Ré e, em conformidade, esta ser condenada:
B.1) - Na REINTEGRAÇÃO da trabalhadora no seu posto e local de trabalho sem prejuízo da sua categoria e antiguidade.
B.2) - No pagamento das RETRIBUIÇÕES (a título de salários, diuturnidades, subsídio de alimentação, férias, subsídio de férias e subsídio de Natal), devidamente atualizadas, já vencidas e as que se vencerem desde a data do seu despedimento até ao trânsito em julgado da sentença que vier a declarar a ilicitude do despedimento.
C) - Condenada a Ré a pagar à Autora as retribuições respeitantes ao TRABALHO SUPLEMENTAR desenvolvido, tendo por referência, por um lado, a retribuição mínima mensal auferida e o acréscimo de 50% sobre o valor da hora normal a que alude a cláusula 65.º da CCT, e por outro lado, a fórmula expressa na sua cláusula 62.ª e o valor médio de 30 horas mensais, que se calcula no valor:
C.1) - Ano de 2007 - meses de Janeiro e Fevereiro (3,47€ x 1,50 = 5,20€ x 30 horas mensais = 156€ x 2 meses) …….…..….... 312,00€.
C.2) - Ano de 2007 - meses de Março a Dezembro (3,60€ x 1,50 = 5,40€ x 30 horas mensais = 162 € x 9 meses) …….…..….... 1.458,00€.
C.3) - Ano de 2008 (3,81€ x 1,50 = 5,72€ x 30 horas mensais =171,50€ x 11 meses) 1.886,00€.
C.4) - Ano de 2009 (4,29€ x 1,50 = 6,43€ x 30 horas mensais =192,90€ x 11 meses) 2.121,00€.
C.5) - Ano de 2010 (4,29€ x 1,50 = 6,43€ x 30 horas mensais =192,90€ x 11 meses) 2.121,00€.
Total: ……………………………………………………….…….. 7.898,00€.
D) - Condenada a Ré no pagamento dos DANOS MORAIS emergentes para Autora em resultado do seu despedimento, que se peticionam ao abrigo do disposto no artigo 389.º n.º 1, alínea a) do Código do Trabalho e no valor de …….…… 1.000€.
C.4) - OS JUROS DE MORA, à taxa legal, incidentes sobre as importâncias especificadas nos antecedentes itens B.2) e C) a partir da data do seu vencimento e sobre a especificada no antecedente item D) desde a sentença a proferir e, em todas as situações, até integral pagamento.
Termos em que deve:
I - Declarar-se improcedente a licitude e regularidade do despedimento da trabalhadora decidido pela instituição Ré empregadora «CENTRO … IPSS».
II - Declarar-se a presente «CONTESTAÇÃO-RECONVENÇÃO» procedente, por provada, condenando-se em conformidade a instituição Ré em conformidade com o pedido principal formulado ou, no caso de assim se não entender, em conformidade com o seu pedido subsidiário.”
Alegou para tanto que desde a data da sua admissão até Fevereiro de 2008 exerceu funções a que deveria corresponder a categoria profissional de Diretora de Serviços, tendo, a partir dessa data, a R. atribuído o exercício de tais funções a outra trabalhadora e cometido à A. outras funções, baixando a sua categoria profissional; que prestou uma média de 30 horas mensais de trabalho suplementar entre 1/1/2007 e 31/12/2010 e que sofreu danos de natureza patrimonial em consequência do despedimento de que foi vítima.
A R. respondeu, impugnado no essencial os factos alegados pela A. em suporte do pedido reconvencional.
Foi convocada uma audiência preliminar com as finalidades referidas no despacho de fls. 143, a qual teve lugar em 14/01/2013, como se vê da respetiva ata, a fls. 144/145.
Em 5/11/2013 foi proferido despacho saneador por meio do qual se conheceu parcialmente do mérito da causa, quanto à questão da irregularidade e ilicitude do despedimento, tendo sido proferida decisão que declarou a ilicitude do despedimento da A. e condenou a R.:
a) a reintegrar a A. no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua antiguidade e categoria profissional;
b) a pagar à A. as retribuições que esta deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado desta decisão, às quais haverá que deduzir o subsídio de desemprego eventualmente atribuído à trabalhadora no período decorrido entre o despedimento e o trânsito em julgado desta decisão, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social, tudo a liquidar oportunamente, nos termos do art. 609º nº 2 do Cod. de Proc. Civil, uma vez que o Tribunal não dispõe de elementos para fixar o valor devido; ao valor que vier a ser liquidado acrescem os juros de mora, vencidos e vincendos, desde a data de vencimento de cada uma das retribuições vencidas e vincendas, à taxa legal, até integral pagamento (cf. Fls. 159 a 165).
Foi ordenado o prosseguimento do processo para apreciação dos demais pedidos formulados pela A. em reconvenção, tendo-se dispensado a delimitação do objeto do litígio e a enunciação dos temas da prova, tudo conforme consta de fls. 165.
Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida decisão nos seguintes termos:
“ Perante o exposto, sem prejuízo do já decidido no despacho saneador-sentença, julgo parcialmente improcedente, por não provada, a reconvenção deduzida pela trabalhadora … e, em consequência, absolvo a empregadora Centro … IPSS dos pedidos contra esta formulados a título principal sob os pontos I - A) e C) e a título subsidiário sob os pontos II – C) e D), respeitantes ao reconhecimento da categoria profissional de “diretor de serviços”, a diferenças salariais, a retribuição por trabalho suplementar e a danos morais.
Custas por ambas as partes, na proporção do decaimento. “
Inconformada a autora apresentou recurso concluindo em síntese:

1) A sentença recorrida julgou improcedentes os pedidos formulados pela trabalhadora/recorrente referentes ao reconhecimento da categoria profissional de «diretora de serviços», a diferenças salariais, a retribuição por trabalho suplementar e a danos morais.
2) Considera a recorrente que, atendendo a matéria de facto considerada provada e a inerente aplicação e interpretação do Direito a tal matéria, ou seja, da subsunção da matéria de facto dada como provada ao direito, dever-lhe-ia ter sido reconhecida a categoria profissional de ≪diretora de serviços≫.…

6) A categoria profissional, entendida em diversas acecões, determina-se por referência ao binómio classificação normativa/funcões exercidas.

8) A categoria profissional, enquanto atribuição ou expressão da posição contratual do trabalhador, e objeto proteção (legal e convencional) evidenciada a três níveis: na atividade a desenvolver; na remuneração devida; e na hierarquização do trabalhador no seio da empresa.
9) A categoria profissional assenta e obedece aos princípios (que afiançam a salvaguarda dos interesses do trabalhador): da efectividade (no domínio da categoria-função relevam as funções substancialmente prefiguradas e não as meras designações exteriores); da irreversibilidade (no domínio da categoria-estatuto, uma vez alcançada certa categoria, o trabalhador não pode dela ser retirado ou despromovido); e do reconhecimento (a categoria estatuto tem de assentar nas funções efectivamente desempenhadas pelo trabalhador).

11) Para proceder ao concreto enquadramento da trabalhadora numa categoria profissional, atende-se ao núcleo essencial e prevalente das funções exercidas e não se impõe que sejam exercidas todas as funções correspondentes a determinada categoria…
12) Caso o trabalhador exerça diversas tarefas enquadráveis em diferentes categorias profissionais, deve ser classificado na categoria mais elevada que se aproxima das funções efectiva e essencialmente exercidas, ou seja, in dúbio deve enquadrar-se o trabalhador na categoria profissional que lhe e mais favorável ou vantajosa.

14) O momento fulcral para determinação da categoria profissional da recorrente reside no período temporal compreendido entre a data da sua admissão, em 01/05/2003, e Fevereiro 2008, por referência as funções contratadas e por si efectivamente desempenhadas nesse período - que correspondiam a funções próprias da categoria profissional de ≪Diretora de Serviços≫ e que se encontram especificadas sob os itens 4, 5, 20, 21, 22, 19, 8, 9, 24 e 13 dos factos provados da sentença recorrida- sendo que a partir de Marco de 2008 foi sendo despojada pela entidade empregadora (re) de parte de tais funções, como se elucidara.

19) De acordo com a cláusula 1.a do contrato de trabalho da recorrente (com data de 01/05/2003), esta e contratada pela ré para exercer as funções de vigilância (acto ou o efeito de vigiar; de observar atentamente; de zelar; de cuidar) supervisão (supervisionar: dirigir, orientar ou inspecionar em plano superior) e disciplina (conjunto de leis ou ordens; submissão; obediência a Autoridade/disciplinar: sujeitar a disciplina; corrigir e ensinar) – Cfr. Contrato junto aos autos e item 5 dos factos provados.
20) De acordo com os recibos de vencimento da recorrente, de Janeiro/2004 até Setembro/2004, que se encontram juntos aos autos, a recorrente era nos mesmos qualificada como ≪coordenadora≫ – item19 dos factos provados.

22) Da analise as funções contratadas e desempenhadas pela recorrente/trabalhadora, no lapso temporal situado entre 01/05/2003 e Fevereiro de 2008, e dadas como provadas, conclui-se que:
22.1) A recorrente, nos limites dos poderes de vigilância, supervisão e disciplina que lhe foram conferidos, ao coordenar, organizar, supervisionar, fiscalizar e gerir os recursos humanos e o competente exercício das funções dos demais trabalhadores da Ré - pelo menos nas áreas da limpeza, cozinha e serviços administrativos…

23) Comparando as tarefas atribuídas e exercidas pela recorrente desde a data da sua contratação até a data da cessação do seu contrato de trabalho – Cfr. itens 20 (fatualidade ocorrida desde a data de admissão da recorrente até 2008), 23 (fatualidade ocorrida de 2008 a 2010) e 25 (fatualidade ocorrida de 2011 até à data da cessação do contrato da recorrente) dos factos provados - verifica-se que a partir de Marco de 2008, em violação do principio da irreversibilidade da categoria profissional e do disposto nos artigos 23.o da L.C.T. e 313.o da Lei n.o 99/2003, passaram a ser-lhe conferidas pela entidade empregadora funções na sua generalidade de categoria profissional de nível de qualificação inferior (de escrituraria) e subtraídas, na sua maioria, as funções anteriormente exercidas e correspondentes a categoria de Diretora de Serviços.
24) Apenas manteve as seguintes tarefas que não são típicas de escriturária: desde Fevereiro de 2008 até 2010, manteve a gestão dos recursos humanos e materiais do Centro de Dia e Centro de Convívio da instituição (Cfr. item 23 dos factos provados) e exercia funções de coordenação da atividade desenvolvida pela Ré nas suas múltiplas respostas sociais (Cfr. item 12 dos factos provados);• e a partir do ano de 2011, exercia as funções de ≪responsável do Centro de Dia e Centro de Convívio≫ e de ≪organização e participação de e em atividades com os utentes≫ (Cfr. «subitens» 1 e 2 do Item 25 dos factos provados).

39) O CCT aplicável não prevê, em qualquer das suas cláusulas, a detenção de grau de licenciatura nem de qualquer formação ou carteira profissional como requisito para o exercício de funções próprias de Diretor de Serviços e para o acesso, admissão e reconhecimento desta categoria profissional que se inscreve no âmbito dos ≪trabalhadores administrativos≫ - vide Anexo I (≪Definição de Funções≫ para trabalhadores administrativos) e Anexo II (≪Condições Especificas≫ para trabalhadores administrativos) do CCT aplicável.

SUBSIDIARIAMENTE, PARA O CASO DE ASSIM NAO SER ENTENDIDO:
41) Nos termos do disposto no artigo 74.o do Código de Processo do Trabalho, ≪o juiz deve condenar em quantidade superior ao pedido ou em objeto diverso dele quando isso resulte da aplicação a matéria provada, ou aos factos de que possa servir-se, nos termos do artigo 514.o do Código de Processo Civil, de preceitos inderrogáveis de leis ou instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho.≫
42) Na fundamentação da sentença recorrida o tribunal de 1.a Instancia referiu ainda: ≪Apesar de ter formulado pedido subsidiário, não pede a A. a tal título, o reconhecimento de qualquer outra categoria profissional e as correspondentes retribuições, pelo que está vedado ao tribunal proceder à reclassificação profissional da mesma.» - Cfr. página 18 da sentença recorrida.

44) Sucede que, e salvo melhor opinião, os princípios e normas legais referentes a atribuição e reconhecimento de uma categoria profissional são inderrogáveis, designadamente o n.o1 da cláusula 6.a e o n.o2 da cláusula 5.a do CCT aplicável (versão publicada no BTE no 26, de 15/07/2006), pelo que, ao abrigo do supra citado artigo 74.o do CPT, o Tribunal recorrido devia ter procedido a reclassificação profissional da trabalhadora e apuramento das respectivas diferenças salariais (ao enquadramento e subsunção das concretas funções desempenhadas pela recorrente e que considerou provadas a correspondente categoria profissional tendo como referencia o conjunto daquelas que se encontram elencadas na CCT aplicável – CTT entre a CNIS e a FEPECES.)
45) … as funções desempenhadas pela recorrente são inquestionavelmente de chefia, de coordenação, de direção e situadas num plano intermédio entre a direção da recorrida e os demais trabalhadores ao seu serviço e, consequentemente, num plano hierárquico superior a todos estes demais trabalhadores) e compulsado o anexo I do CCT aplicável (categorias profissionais no mesmo definidas) - constata-se que a não ser integrada na categoria de ≪diretor de serviços≫ (de que não se abdica) o núcleo essencial das funções exercidas pela recorrente só pode encontrar respaldo:
▪ no âmbito dos ≪trabalhadores administrativos≫ na profissão de ≪chefe de departamento≫ e dentro desta na categoria profissional de ≪chefe de serviços≫ (nível remuneratório VII);
▪ ou, no âmbito dos ≪trabalhadores com funções de chefia nos serviços gerais≫, nas categorias de ≪chefe de serviços gerais≫ ou ≪encarregado geral≫ (nível remuneratório VIII).

47) Pelo supra exposto, o Tribunal recorrido fez errada interpretação e aplicação do Direito aos factos provados, violando, entre outros, os princípios estruturantes da categoria profissional (princípios da efectividade, da irreversibilidade e do reconhecimento),
▪ as cláusulas 5.o, 6.o, 12.o, al. d); 15.o e as condições específicas de admissão da CCT aplicável
▪ os artigos 22.o; 21.o, n.o1, al. d) e 23.o da LCT (Decreto-Lei no 49408, de 24/11/1969), artigos 122.o, al. e); 313.o e 314.o da Lei no 99/2003, de 27/08; artigos 115.o, 118.o, 119.o, 129.o, n.o1, al. e) da Lei no 7/2009, de 12/02;
▪ artigo 74.o do Código do Processo do Trabalho.
Sem contra-alegações.
Neste tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
Colhidos os vistos dos Ex.mos Srs. Adjuntos há que conhecer do recurso.
***
Fatualidade:
1- A entidade empregadora «Centro … » é uma instituição particular de solidariedade social …, que tem por objeto a prestações de serviços de solidariedade social.
2- Serviço social que prossegue mediante o desenvolvimento das seguintes respostas sociais: Creche; CATL (Centro de Atividades e Tempos Livres); Centro de Dia; Centro de Convívio e SAD (Serviço de Apoio Domiciliário).
3- A trabalhadora, ora Autora, Sara… encontra-se habilitada com o grau académico de licenciatura em «Educação Social» desde 22/7/2009 e detém formação específica em «cuidados humanos básicos – higiene e apresentação pessoal» e «higiene da pessoa idosa em lares e centro de dia».
4- A Autora, no dia 01/05/2003, por «Contrato de Trabalho a Termo Certo», foi admitida ao serviço da Ré.
5- Contrato, junto aos autos a fls. 17 e 18 e cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido, no qual se explicita a admissão da Autora para exercer as «funções de Vigilância, Supervisão da Limpeza e Disciplina.»
6- Mediante a retribuição mensal ilíquida de 356,60€ (trezentos e cinquenta e seis euros e sessenta cêntimos).
7- Que a partir de 01/01/2004, passou a ser de 505€ (quinhentos e cinco euros).
8- Retribuição que a partir do mês de Outubro de 2004 se situou no valor de 525,78€ (quinhentos e vinte e cinco euros e setenta e oito cêntimos).
9- Data a partir da qual no correspondente recibo de remunerações a Ré passou a atribuir à Autora a categoria de «escriturária de 1.ª».
10- No mês de Agosto do ano de 2006 foi admitida ao serviço da Ré a trabalhadora Maria … para exercer as funções de «assistente social».
11- No mês de Março de 2008 a Ré nomeou como «diretora técnica» a citada trabalhadora …
12- A identificada Diretora Técnica, a partir da sua nomeação passou a delegar na Autora funções de coordenação da atividade desenvolvida pela Ré nas suas múltiplas respostas sociais sempre que tinha por necessário, justificável ou conveniente.
13- Tendo no período temporal compreendido entre os anos de 2008 e 2010 as funções da Autora passado, por determinação da Ré, a traduzir-se, fundamentalmente, nas que seguidamente se especificam:
. Redigir relatórios, cartas, notas informativas e outros documentos dando-lhe o seguimento apropriado.
. Examinar o correio recebido, separá-lo, classificá-lo e compilar os dados que são necessários para preparar as respostas.
. Elaborar, ordenar e preparar os documentos relativos à encomenda, distribuição, faturação e realização das compras e vendas.
. Receber pedidos de informação e transmiti-los à pessoa ou serviços competentes.
. Pôr em caixa os pagamentos de contas e entregas recebidos.
. Estabelecer o extracto das operações efectuadas e de outros documentos para informação superior.
. Atender os candidatos às vagas existentes; informá-los das condições de admissão e efectuar registos do pessoal.
. Preencher formulários oficiais relativos aos colaboradores ou à instituição.
. Ordenar e arquivar recibos, cartas ou outros documentos e elaborar dados estatísticos.
. Preparar e organizar processos.
. Prestar informações e outros esclarecimentos aos clientes e ao público em geral.
. Exercer polivalência sempre que exista necessidade.
. Reportar à Direcção toda a informação relevante conexa com as suas funções.
14- Correspondendo-lhe durante a pendência do contrato desenvolver as suas funções num horário normal de 7 horas diárias e 35 horas semanais, distribuídas de segunda a sexta-feira, com descanso semanal ao sábado e ao domingo.
15- E remuneração mensal ilíquida da Autora que passou a ser, a partir de:
. Março de 2007……………………………………..…. 545,78€.
. Março de 2008. .………………………………............ 578,10€.
. Outubro de 2009………………………………………. 650,00€.
. Janeiro de 2011………………………………………... 590,00€.
. Abril de 2012, até à data da cessação do contrato. ……650,00€.
16- E a partir de Maio de 2008, a auferir 1 (uma) diuturnidade, que nas datas que infra se especificam se situava nos seguintes valores:
. Maio de 2008. ……………………………..………….. 19,23€.
. Janeiro de 2009. .…………………………..………….. 20,00€.
. Outubro de 2009, até à data da cessação do contrato. ... 21,00€.
17- Por comunicação datada de 29/05/2012 e registada a 31/05/2012, expedida para o seu domicílio a Ré procedeu ao despedimento da Autora «por extinção de posto de trabalho» com efeitos a partir do dia 29/07/2012.
18- Por sentença transitada em julgado em 3/06/2014 foi declarada a ilicitude do despedimento da A. … e condenada a R. Centro …, IPSS:
a) a reintegrar a A. no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua antiguidade e categoria profissional;
b) a pagar à A. as retribuições que esta deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado desta decisão, às quais haverá que deduzir o subsídio de desemprego eventualmente atribuído à trabalhadora no período decorrido entre o despedimento e o trânsito em julgado desta decisão, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social, tudo a liquidar oportunamente, nos termos do art. 609º nº 2 do Cod. de Proc. Civil, uma vez que o Tribunal não dispõe de elementos para fixar o valor devido; ao valor que vier a ser liquidado acrescem os juros de mora, vencidos e vincendos, desde a data de vencimento de cada uma das retribuições vencidas e vincendas, à taxa legal, até integral pagamento.
b) Factos provados da matéria de facto controvertida:
19- A partir de 01/01/2004 e até Setembro de 2004, a Autora passou a ser qualificada nos respectivos «recibos de remunerações» como «coordenadora VG».
20- A A., entre a data da sua admissão e Fevereiro de 2008, por delegação do Presidente da Direcção da Ré, desempenhou as seguintes funções ao serviço da R.:
- Coordenava e supervisionava os demais trabalhadores da Ré, pelo menos nas áreas da limpeza, cozinha e serviços administrativos; assegurando, nesses departamentos, a gestão de recursos humanos e supervisionando o competente exercício das suas funções.
- Adquiria produtos, equipamentos e serviços necessários ao prosseguimento do objeto social da Ré, estabelecendo os necessários contactos com fornecedores.
- Efetuava e recebia pagamentos.
- Reunir com parceiros sociais através da EAPN (Rede Europeia Anti Pobreza).
- Geria e organizava o programa comunitário de ajuda alimentar a carenciados.
- Representava a instituição perante as técnicas da segurança social responsáveis pelo acompanhamento da atividade da Ré ao nível dos procedimentos a implementar e das respostas sociais tuteladas por aquele organismo e participava em reuniões da Direcção com tais técnicas.
- Promovia a integração dos utentes e organizava os seus processos individuais.
- Prestava informações e esclarecimentos aos utentes e ao público em geral.
- Elaborava ementas em colaboração com a cozinheira.
- Tratava de documentação diversa (correspondência, fiscal, segurança social etc.).
- Reunia e reportava regularmente à Direcção informação relevante conexa com a atividade da instituição.
21- Situando-se no seio da organização da instituição Ré em escalão hierárquico intermédio entre a Direcção e os demais trabalhadores.
22- No referido período temporal, pelo menos os trabalhadores dos setores da limpeza, cozinha e serviços administrativos obedeciam às orientações e recomendações da A. e esta organizava e fiscalizava a sua actuação.
23- A partir de Fevereiro de 2008 a A. passou a partilhar com a trabalhadora Maria… parte das funções anteriormente desempenhadas, tendo esta passado a ocupar-se da gestão dos recursos humanos e materiais afectos à valência de creche que foi implementada nesse ano, bem como da organização e orientação de todo o serviço relacionado com essa valência, passando a A., por delegação da dita trabalhadora a ocupar-se da gestão dos recursos humanos e materiais do Centro de Dia e Centro de Convívio, embora toda a correspondência e documentação relativa a todas as valências e respostas sociais da Ré fossem assinadas pela trabalhadora Maria…, tendo tal repartição de funções e tarefas sido determinada pela Direcção.
24- Até à sua nomeação como diretora técnica da instituição, a trabalhadora Maria… recebia instruções e orientações da A., que também fiscalizava o seu trabalho, por indicação do Presidente da Direcção, por ser a pessoa que melhor conhecia a instituição.
25- A partir do ano de 2011 até à data da cessação do contrato a Ré colocou a A. A exercer as seguintes funções:
. Responsável pelo Centro de Dia e Centro de Convívio.
. Organização e participação de e em atividades com os utentes.
. Organização de processos individuais de utentes.
. Higiene pessoal dos utentes do Centro de Dia e Convívio.
. Elaboração de registos e planos de atividades e de avaliação.
. Prestar informações e outros esclarecimentos aos utentes e ao público em geral.
. Apoio pedagógico no CATL.
. Apoio pedagógico no Centro Escolar….
. Transporte de crianças (escola-instituição e instituição-escola) e idosos (casa instituição e instituição-casa).
. Exercer polivalência sempre que exista necessidade.
26- Algumas vezes, no período temporal compreendido entre o dia 01/01/2007 e o dia 31/12/2010, a Autora prestou trabalho para além do seu horário normal de 7 horas diárias e 35 horas semanais.
27- A Autora para além da remuneração da sua força de trabalho, não dispõe de qualquer outra fonte de rendimento própria.
28- É mãe de uma filha a frequentar o ensino superior, recaindo as inerentes despesas de deslocação, alojamento, alimentação, escolares e outras, sobre a Autora e seu marido, este a residir e a trabalhar no estrangeiro.
29- O seu despedimento gerou-lhe inquietude, angústia e apreensão quanto ao seu futuro.
30- E determinou restrições de consumos e mudança de hábitos.
**
Conhecendo do recurso:
Nos termos dos artigos 635º, 4 e 639º do CPC, o âmbito do recurso encontra-se balizado pelas conclusões do recorrente.
Importa apreciar as seguintes questões:
- Erro de julgamento quanto à categoria profissional da autora.
- Reconhecimento da categoria de diretora de serviços.
- Subsidiariamente: atribuição da categoria devida nos termos do artigo 74º do CPT chefe de departamento/chefe de serviços, de ou de chefe de serviços gerais/encarregado geral, e respetivas diferenças salarias.
*
O contrato entre autora e ré foi celebrado na vigência do Dec. Lei 49 408, de 24/11/1969 (LCT) e desenvolveu-se sob a tutela do Código do Trabalho de 2003, aprovado pela lei 99/2003 de 27/08 e entrado em vigor em 1/12/2003 e, posteriormente, do Código do Trabalho de 2009, aprovado pela lei 7/2009 de 12/02, em vigor desde 17/2/2009.
É aplicável o CCT entre a CNIS - Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade Social e a FEPCES - Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritório e Serviços e outros e com origem no CCT entre a UNIPSS - União das Instituições de Solidariedade Social e a FENPROF - Federação Nacional dos Professores e outros (nos quais se inclui a FEPCES - Federação Portuguesa dos Sindicatos do Comércio, Escritório e serviços e outros), cujo clausulado base se encontra publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1ª Série, nº 6, de 15/02/2001, com alterações nos BTE n.º 8, de 28/02/2002; 26, de 15/07/2006; 47, de 22/12/2007; 11, de 22/03/2009 e 45, de 8/12/2009.
*
Categoria profissional da autora:
É entendimento pacífico que a categoria profissional do trabalhador é aquela que corresponder às funções por si efetivamente exercidas, e não a que a entidade patronal lhe atribui. Estas não podem classificar em desarmonia com as tarefas pelos trabalhadores realmente exercidas.
Por outro, a categoria quando institucionalizada é vinculativa para a entidade patronal.
No caso presente a ré encontra-se qualificada como escriturária, pretendendo que seja classificada como diretora de serviços.
No caso temos que os conteúdos funcionais correspondentes às categorias estão pré-determinados. A entidade patronal é obrigada a atribuir ao trabalhador uma das categorias convencionalmente fixadas, devendo atribuir aquela que corresponder às funções efetivamente exercida pelo trabalhador. A classificação profissional sendo contratualizada no âmbito das CCTs, assume dimensão normativa. Contudo importa atentar em que a CCT, quanto às categorias, não pretende ser nem é um modelo de organização do trabalho.
O empregador não fica adstrito a apenas poder encarregar o trabalhador de exercer as funções que constam do conteúdo funcional correspondente à categoria.
O art. 22º/1 LCT, (depois após 1/12/2003 os artigos 122º al. e), 313º e 314º do Código do Trabalho, sem alterações substanciais, e no atual código os artigos 129, 1, e), 118, 2, 119, 120) dispunha que “o trabalhador deve, em princípio, exercer uma atividade correspondente à categoria para que foi contratado”. Abre-se espaço a algumas variações, como dos normativos resulta.
A atividade exercida não tem por outro que corresponder a todos os conteúdos funcionais previstos.
Fora do âmbito dessas variações, deve entender-se que a atividade exercida, entendida como a função principal do trabalhador, deve corresponder ao conteúdo fundamental da categoria normativa, deve encaixar no “núcleo essencial “ desta, aquelo que na essência a carateriza. STJ de 21/10/2009, www.dgsi.pt, processo nº 1996/05.1TTLSB.S1.
Dispõe a CCT publicado no BTE 6/2001, no anexo I – Definição de funções:
Diretor de serviços. - Estuda, organiza e dirige, nos limites dos poderes de que está investido, as atividades da instituição; colabora na determinação da política da instituição; planeia a utilização mais conveniente da mão-de-obra, equipamento, materiais, instalações e capitais; orienta, dirige e fiscaliza a atividade da instituição segundo os planos estabelecidos, a política adoptada e as normas e regulamentos prescritos; cria e mantém uma estrutura administrativa que permita explorar e dirigir a instituição de maneira eficaz; colabora na fixação da política financeira e exerce a verificação dos custos.
Escriturário. - Executa várias tarefas, que variam consoante a natureza e importância do escritório onde trabalha; redige relatórios, cartas, notas informativas e outros documentos, manualmente ou à máquina, dando-lhe o seguimento apropriado; examina o correio recebido, separa-o, classifica-o e compila os dados que são necessários para preparar as respostas; elabora, ordena e prepara os documentos relativos à encomenda, distribuição, faturação e realização das compras e vendas;
Recebe pedidos de informação e transmite-os à pessoa ou serviços competentes; põe em caixa os pagamentos de contas e entregas recebidos; escreve em livros as receitas e despesas, assim como outras operações contabilísticas; estabelece o extracto das operações efectuadas e de outros documentos para informação superior; atende os candidatos às vagas existentes e informa-os das condições de admissão e efectua registos do pessoal; preenche formulários oficiais relativos ao pessoal ou à instituição; ordena e arquiva notas de livrança, recibos, cartas ou outros documentos e elabora dados estatísticos; escreve à máquina e opera com máquinas de escritório; prepara e organiza processos; presta informações e outros esclarecimentos aos utentes e ao público em geral.
A categoria de “diretor de serviços” está enquadrada no 1º nível de qualificação estabelecido no anexo III, isto é, enquadra-se nos “Quadros superiores”, ao passo que a de “escriturário” se enquadra no nível 5, dos profissionais qualificados.
A A., entre a data da sua admissão e Fevereiro de 2008, por delegação do Presidente da Direcção da Ré, desempenhou as seguintes funções ao serviço da R.:
-Coordenava e supervisionava os demais trabalhadores da Ré, pelo menos nas áreas da limpeza, cozinha e serviços administrativos; assegurando, nesses departamentos, a gestão de recursos humanos e supervisionando o competente exercício das suas funções.
-Adquiria produtos, equipamentos e serviços necessários ao prosseguimento do objeto social da Ré, estabelecendo os necessários contactos com fornecedores.
-Efetuava e recebia pagamentos.
-Reunir com parceiros sociais através da EAPN (Rede Europeia Anti Pobreza).
-Geria e organizava o programa comunitário de ajuda alimentar a carenciados.
-Representava a instituição perante as técnicas da segurança social responsáveis pelo acompanhamento da atividade da Ré ao nível dos procedimentos a implementar e das respostas sociais tuteladas por aquele organismo e participava em reuniões da Direcção com tais técnicas.
-Promovia a integração dos utentes e organizava os seus processos individuais.
-Prestava informações e esclarecimentos aos utentes e ao público em geral.
- Elaborava ementas em colaboração com a cozinheira.
-Tratava de documentação diversa (correspondência, fiscal, segurança social etc.).
-Reunia e reportava regularmente à Direcção informação relevante conexa com a atividade da instituição (nº 20).
-Situando-se no seio da organização da instituição Ré em escalão hierárquico intermédio entre a Direcção e os demais trabalhadores (nº 21).
-No referido período temporal, pelo menos os trabalhadores dos setores da limpeza, cozinha e serviços administrativos obedeciam às orientações e recomendações da A. e esta organizava e fiscalizava a sua actuação (nº 22).
Comparando as atividades exercidas com o conteúdo funcional correspondente a diretor de serviços, conclui-se que as mesmas não correspondem ao que constitui o núcleo essencial da categoria de diretor. Isto não obstante, como se refere na decisão recorrida englobassem “ uma componente de chefia, gestão, coordenação e supervisão dos recursos humanos e materiais em vários setores de atividade da R., não se reduzindo a tarefas de caráter técnico-administrativo próprias da categoria profissional de escriturário”.
Está ausente das funções da autora o estudo, organização e direção das atividades da instituição. O facto de organizar o programa comunitário de ajuda alimentar a carenciados e as ementas, não é de molde a poder fazer-se o enquadramento nesta categoria. Quer-se mais. A nota essencial da categoria de diretor é o de “dirigir “ a instituição, em todas as suas atividades ou pelo menos em algumas das atividades, implicando estudo, planeamento, organização, e a colaboração na determinação da política da instituição, circunstância estas totalmente arredada das funções da autora.
Conquanto reunisse com parceiros sociais através da EAPN e representasse a instituição perante as técnicas da segurança social responsáveis pelo acompanhamento da atividade da Ré ao nível dos procedimentos a implementar e das respostas sociais tuteladas por aquele organismo e participasse em reuniões da Direcção com tais técnicas, de tais factos não se conclui que colabora-se na determinação da política da instituição, na tomada das mais importantes decisões sobre a vida desta, nem tal se alega. Tais atos só por si não implicam mais que “representar “ dentro de ordens recebidas, eventualmente para cada ato, sem necessidade de tomada de decisão com alguma autonomia – a decorrente dos limites dos poderes concedidos -. Está ausente o estudo tendo em vista a tomada de decisões inerentes à função e com a liberdade inerente ao cargo (dentro dos poderes investidos).
Assim e nesta parte é de confirmar a decisão.
*
Contudo, as funções exercidas e no que têm de fundamental, extravasam das funções de escriturária em que se encontra categorizada.
Invoca a autora que deveria ter sido classificada na categoria correta, invocando o disposto no artigo 74º do CPT e as cláusulas 6ª, 1 e 5ª, 2 da CCT de in BTE 26/2006.
Nos termos do 74.º do CPT “O juiz deve condenar em quantidade superior ao pedido ou em objeto diverso dele quando isso resulte da aplicação à matéria provada, ou aos factos de que possa servir-se, nos termos do artigo 514.º do Código de Processo Civil, de preceitos inderrogáveis de leis ou instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho.”
Os preceitos inderrogáveis são aqueles que consagram direitos irrenunciáveis do trabalhador.
A cl 6ª aludida refere no nº 1 que “os trabalhadores abrangidos pela presente convenção são obrigatoriamente integrados nas profissões a que alude o anexo I, devendo, desde logo, ser-lhes atribuída uma das categorias profissionais constantes do mesmo”. O mesmo dispunham as anteriores, designadamente a CCT de 2001 na cl. 4ª.
Com o princípio da condenação extra vel ultra petitum, pretende-se em sede de direito laboral, fazer sobrepor o princípio da verdade material à verdade formal e é corolário da irrenunciabilidade dos direitos.
A condenação tem como limite a causa de pedir invocada. STJ, de 12 de Dezembro de 2001, processo nº 01S2271; de 23/4/2008, processo nº 07S3905, de 30 de Abril de 2008, Processo n.º 07S3658, disponíveis em www.dgsi.pt.
A possibilidade de condenação além do pedido deve ser contudo bem entendida. Desde logo importa atentar na circunstância de estarmos ainda numa situação em que se mantém a subordinação jurídica, seja, na plena vigência do contrato de trabalho, ou não. É que alguns direitos com expressão pecuniária, irrenunciáveis na vigência do contrato, após a cessação daquele estado de subordinação, podem tornar-se renunciáveis. STJ, de 12/12/2001, www.dgsi.pt, porcesso nº 01S2271.
“Os limites da condenação ultra vel extra petitum devem então encontrar-se nos direitos, que, do ponto de vista do trabalhador, são irrenunciáveis, quer quanto à sua existência, quer quanto ao seu exercício” (…) – Pedro Madeira de Brito, A tramitação do Processo Declarativo Comum no Código do Processo do Trabalho, Estudos do Instituto de Direito do Trabalho, volume 3, p. 471.
Refere-se no Ac. STJ de 18/6/2014, www.dgsdi.pt, processo nº 450/07.1TTCSC.L1.S1, citando Abílio Neto:
“ Prossegue este autor referindo que «têm a doutrina e a jurisprudência feito uma distinção básica entre os direitos de existência necessária, mas que não são de exercício necessário, como é o caso do direito ao salário após a cessação do contrato, e os direitos cuja existência e exercício são necessários, aí situando justamente o caso dos direitos a reparação por acidente de trabalho (…) e, também, do direito ao salário na vigência do contrato. É pacífico que a condenação “extra vel ultra petitum” só se justifica neste segundo tipo de direitos, que têm subjacentes interesses de ordem pública, cabendo ao juiz o suprimento dos direitos de exercício necessário imperfeitamente exercidos pelo seu titular (ou seu representante)»
Assim, após a cessação da subordinação jurídica, serão irrenunciáveis apenas aqueles a cujo exercício o seu titular nunca poderá renunciar. Será o caso da reparação por acidente de trabalho e por doença profissional - As normas respetivas são imperativas, sendo nulas as cláusulas em sentido contrário como decorre do artigo 12º da LAT. O processo corre oficiosamente – artigo 26º, 1, e) e 3 do CPT -, estando abrangidos obrigatoriamente na qualidade de beneficiários, os trabalhadores por conta de outrem ou legalmente equiparados e os trabalhadores independentes.
No caso mantêm-se o contrato, pelo que, cabendo a categorização e os créditos de diferenças salariais na causa de pedir que sustentou a pretensão formulada (até porque quem pede o mais pede o menos), deve fazer-se uso do aludido princípio, atendendo-se ainda ao princípio da irreversibilidade e do reconhecimento.
*
Vejamos as categorias em que eventualmente pode enquadrar-se a atividade da autora:
Trabalhadores administrativos:
Chefe de departamento. — Estuda, organiza e coordena, sob a orientação do seu superior hierárquico, num ou em vários dos departamentos da instituição, as atividades que lhe são próprias; exerce, dentro do departamento que chefia e nos limites da sua competência, a orientação e a fiscalização do pessoal sob as suas ordens e de planeamento das atividades de departamento, segundo as orientações e fins definidos; propõe a aquisição de equipamento e materiais e a admissão de pessoal necessário ao bom funcionamento do departamento e executa outras funções semelhantes.
As categorias de chefe de serviços, chefe de escritório e chefe de divisão, que correspondem a esta profissão, serão atribuídas de acordo com o departamento chefiado e grau de responsabilidade requerido.
Trabalhadores com funções de chefia nos serviços gerais:
Chefe dos serviços gerais. — Organiza e promove o bom funcionamento dos serviços gerais; superintende a coordenação geral de todas as chefias da área dos serviços gerais
Encarregado geral (serviços gerais). — Coordena e orienta a atividade dos trabalhadores da área dos serviços gerais sob a sua responsabilidade.
As funções da autora enquadram-se na categoria de chefe de Serviços (chefe de departamento). Faz mais que mera organização coordenação e orientação.
A autora além de coordenar e supervisionar outros trabalhadores da Ré, pelo menos nas áreas da limpeza, cozinha e serviços administrativos; assegura, nesses departamentos, a gestão de recursos humanos. Os trabalhadores desses setores obedeciam às orientações e recomendações da A. e esta organizava e fiscalizava a sua atuação. A Autora adquiria produtos e contactava com fornecedores.
Tal categoria enquadra-se no nível VII.
Assim, considerando os valores remuneratórios pagos temos as seguintes diferenças salariais, até 29/5:
vencimento auferido encarregado geral saldo
01-05-2003 356,6 678,86 322,26
jun 356,6 678,86 322,26
jul 356,6 678,86 644,52
ag 356,6 678,86 322,26
set 356,6 678,86 322,26
out 356,6 678,86 322,26
nov 356,6 678,86 644,52
dez 356,6 678,86 322,26
jan-04 505 736,2 231,2
fev 505 736,2 231,2
mar 505 736,2 231,2
abr 505 736,2 231,2
mai 505 736,2 231,2
jun 505 736,2 231,2
jul 505 736,2 462,4
ag 505 736,2 231,2
set 505 736,2 231,2
out 525,78 736,2 210,42
nov 525,78 736,2 420,84
dez 525,78 736,2 210,42
jan-05 525,78 751 225,22
fev 525,78 751 225,22
mar 525,78 751 225,22
abr 525,78 751 225,22
mai 525,78 751 225,22
jun 525,78 751 225,22
jul 525,78 751 450,44
ag 525,78 751 225,22
set 525,78 751 225,22
out 525,78 751 225,22
nov 525,78 751 450,44
dez 525,78 751 225,22
jan-06 525,78 751 225,22
fev 525,78 751 225,22
mar 525,78 751 225,22
abr 525,78 751 225,22
mai 525,78 751 225,22
jun 525,78 751 225,22
jul 525,78 751 450,44
ag 525,78 751 225,22
set 525,78 751 225,22
out 525,78 751 225,22
nov 525,78 751 450,44
dez 525,78 751 225,22
jan-07 525,78 788 262,22
fev 525,78 788 262,22
mar 545,78 788 242,22
abr 545,78 788 242,22
mai 545,78 788 242,22
jun 545,78 788 242,22
jul 545,78 788 484,44
ag 545,78 788 242,22
set 545,78 788 242,22
out 545,78 788 242,22
nov 545,78 788 484,44
dez 545,78 788 242,22
jan-08 545,78 807 261,22
fev 545,78 807 261,22
mar 578,1 807 228,9
abr 578,1 807 228,9
mai 578,1 807 228,9
jun 578,1 807 228,9
jul 578,1 807 457,8
ag 578,1 807 228,9
set 578,1 807 228,9
out 578,1 807 228,9
nov 578,1 807 228,9
dez 578,1 807 457,8
jan-09 578,1 820 241,9
fev 578,1 820 241,9
mar 578,1 820 241,9
abr 578,1 820 241,9
mai 578,1 820 241,9
jun 578,1 820 241,9
jul 578,1 820 483,8
ag 578,1 820 241,9
set 578,1 820 241,9
out 650 820 170
nov 650 820 340
dez 650 820 170
jan-10 650 820 170
fev 650 820 170
mar 650 820 170
abr 650 820 170
mai 650 820 170
jun 650 820 170
jul 650 820 340
ag 650 820 170
set 650 820 170
out 650 820 170
nov 650 820 340
dez 650 820 170
jan-11 590 820 230
fev 590 820 230
mar 590 820 230
abr 590 820 230
mai 590 820 230
jun 590 820 230
jul 590 820 460
ag 590 820 230
set 590 820 230
out 590 820 230
nov 590 820 460
dez 590 820 230
jan-12 590 820 230
fev 590 820 230
mar 590 820 230
abr 650 820 170
29-mai 628,3333333 792,6666667 164,3333
total 29106,09
*
DECISÃO:
Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar procedente em parte a apelação, condenando-se a ré a reconhecer à autora a categoria profissional de “ chefe de serviços”, a pagar-lhe as diferenças salarias devidas, que até 29/5 de 2012 montam a € 29.106,09, acrescidas de juros à taxa legal a contar da data de vencimento de cada prestação.
Custas nesta relação na proporção de metade, sendo as de primeira instância na de decaimento.
Guimarães, 11/06/2015
Antero Veiga
Manuela Fialho
Moisés Silva