Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2423/16.4T8VCT.G1
Relator: ANABELA TENREIRO
Descritores: IMPUGNAÇÃO PAULIANA
ATO IMPUGNADO
DEVEDORES SOLIDÁRIOS
ÓNUS DA PROVA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 12/18/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I- Na impugnação pauliana não se exige a alegação e prova que do acto impugnado resulta a insolvência do devedor, bastando a impossibilidade prática de pagamento forçado do crédito, verificada na data em que se concretizou aquele acto.

II- Incumbe ao credor, nos termos do art. 611º do Código Civil, a prova do montante das dívidas e ao devedor ou a terceiro interessado na manutenção do acto a prova de que o obrigado possui bens penhoráveis de igual ou maior valor.

III- Segundo a orientação pacífica do Supremo Tribunal de Justiça é irrelevante a eventual suficiência de bens no património de outros devedores solidários para satisfazer a dívida, que não intervieram no acto impugnado.

IV- Não tendo os réus logrado provar a existência de bens, no seu património, na data em que doaram o imóvel, que lhes pertencia, à sua filha menor, de valor igual ou superior à dívida que contraíram, na qualidade de avalistas, a impugnação pauliana devia ser, como foi, julgada procedente.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I- RELATÓRIO

O “Banco A S.A.”, com sede na Rua …, no Porto, intentou contra RS, e mulher ML, residentes na …, Guimarães, por si e em representação de CS, menor, filha dos réus e com eles residente, a presente acção comum, formulando o seguinte pedido:
- ser declarada ineficaz, em relação ao Banco, a doação efectuada pelos réus a favor da sua filha menor, pelo documento referido no artigo 9º da petição inicial, ordenando-se, em consequência, a restituição da raiz do prédio urbano, na medida do interesse da Autora, de modo a esta poder executá-lo no património dos obrigados à restituição, para satisfação integral do seu crédito.

Para tanto, em síntese, alegou que :

-Intentou, em 30.11.2011, contra os Réus e outros execução para pagamento de quantia certa, no valor inicial de € 120.161,45, baseada em livrança, avalizada pelos demandados e outros, todos accionistas e administradores da subscritora, “Empresa X, S.A.”;
-No seu decurso, foi promovida a penhora do imóvel identificado na petição, por pertencerem aos Réus, que a haviam registado, a seu favor, em 05.01.2001;
-O registo da penhora foi lavrado como provisório por natureza em virtude da citada fracção autónoma se encontrar registada a favor da representada dos Réus, a menor CS, por ap. de 16.08.2011;
-Por essa via, o Autor apercebeu-se que o imóvel havia sido doado “com reserva de usufruto simultâneo e sucessivo até à morte do último” pelos progenitores à sua filha CS, em 13.08.2011;
-Não são conhecidos aos avalistas outros bens ou direitos que possam garantir o cumprimento da dívida.
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Os Réus contestaram, alegando, em resumo, que:

• À data do incumprimento existiam bens suficientes no património da devedora principal Empresa X, S.A., para garantir o cumprimento da obrigação;
• Daquela doação não tinha resultado a impossibilidade ou diminuição da possibilidade de o Autor satisfazer o seu crédito;
• O crédito do Autor não era anterior ao acto impugnado, posto que a sociedade em causa passou por um Plano de Revitalização, o qual foi aprovado com voto favorável daquele.
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Proferiu-se sentença que julgou a acção totalmente procedente, declarando a ineficácia, em relação à Autora, da doação efectuada pelos Réus RS e ML a favor da filha CS – nos termos do documento mencionado no artigo 9º da petição inicial – e, em consequência, reconheceu à Autora o direito de executar no património da Ré, na medida do seu interesse e da satisfação integral do seu crédito.
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Inconformada com a sentença, a Ré, ML, interpôs recurso, formulando as seguintes

Conclusões

A. A Recorrente alega nos art. 51.º e 52.º da sua contestação que o Autor tinha forma de satisfazer o seu crédito, à data de 13.08.2011, nomeadamente através da possibilidade do pagamento a efectuar pela Empresa X e que do acto a impugnar não resultou a impossibilidade do Autor satisfazer o seu crédito.
B. Resulta dos pontos 18, 19, 20 e 21 dos factos assentes que à data (do acto impugnado) o acervo patrimonial da Empresa X integrava os aludidos prédios no valor de 1.790.019,63 €.
C. Aliás consta na sentença que se dá por reproduzido o teor dos documentos de fls 121 a 127 dos autos e referem-se os documentos de fls. 260 a 278 .
D. À data do acto a impugnar existia património suficiente na esfera do devedor principal, Empresa X, S.A., para cumprir a obrigação.
E. Não deveria ser considerado que, após declarada insolvente, a sociedade Empresa X, S.A. tinha dividas que ascendiam a €7.359.026,59, pois a data que se deve considerar é a data da doação.
F. Pelo que, mal decidiu, data vénia a Mma. Juiz a quo ao atender ao valor da divida da Empresa X seis anos depois do acto impugnado e já depois de estarem vencidos todos os créditos por imposição legal da declaração de insolvência.
G. A Recorrente fez prova que, na data do acto sob impugnação, a devedora Empresa X S.A. tinha património com valor 90% superior ao valor da divida.
H. Ora a existência de património superior a um milhão e setecentos mil euros era mais do que suficiente para pagamento da divida. O ónus da prova de que esse património poderia não ser suficiente caberia como facto impeditivo ao Recorrido.
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Colhidos os vistos, cumpre decidir.

II- Delimitação do Objecto do Recurso

A questão decidenda, delimitada pelas conclusões do recurso, para além de se averiguar o preenchimento dos requisitos da impugnação pauliana, consiste essencialmente em saber da relevância, para a improcedência da acção pauliana, sobre a existência de bens, no património do co-devedor solidário, subscritor da livrança, igual ou superior ao valor do acto impugnado.
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III- FUNDAMENTAÇÃO

FACTOS (elencados na sentença)

1. Em 30 de Novembro de 2011, o Autor intentou contra os réus e outros uma execução comum, para pagamento de quantia certa, no valor de € 120.161,45, distribuída, sob o nº 4392/11.8TBGMR, ao (então) 1º Juízo de Execução de Guimarães.
2. A execução mencionada em 1. baseava-se em livrança, no valor de € 118.062,34, emitida em 6 de Junho de 2011 e com vencimento em 16 de Junho de 2011, subscrita pela Empresa X, S.A. e avalisada pelos réus RS e ML e outro, todos seus accionistas e administradores.
3. Na pendência da execução foi penhorada uma fracção autónoma designada pela letra “D”, correspondente ao “primeiro andar esquerdo no Bloco um - T-2”, destinado a habitação, com uma garagem na subcave, do prédio urbano sito na …, freguesia de …, descrita na ficha …/… da Conservatória do Registo Predial e inscrita no art.º … da respectiva matriz.
4. A fracção encontrara-se registada a favor dos réus pela Apresentação 22 de 5 de Janeiro de 2001.
5. O registo da penhora sobre essa fracção foi lavrado provisório por natureza, ao abrigo do artigo 92º, nº 2, alínea a) do Código do Registo Predial, nos termos da apresentação 593, de 13 de Setembro de 2013.
6. Pelo facto de a aludida fracção autónoma se encontrar registada a favor de CS, pela apresentação 1208, datada de 16 de Agosto 2011.
7. Foi dado cumprimento ao disposto no artigo 119º, nº 1 do Código do Registo Predial e a titular inscrita veio declarar, através da progenitora, que a dita fracção lhe pertencia.
8. Foi proferido despacho em 21 de Junho de 2016, nos termos constantes do documento junto a fls. 38 dos autos a remeter “os interessados para os meios processuais comuns”. 9. Por documento intitulado de “doação”, datado de 13 de Agosto de 2011, junto aos autos a fls. 39-41, os primeiros outorgantes (aqui réus RS e ML), na qualidade de doadores declararam doar à sua filha menor, CS, a fracção descrita em 3. dos factos provados, atribuindo à doação o valor de € 23.081,49, com reserva do usufruto simultâneo e sucessivo até à morte do último.
10. A ré CS é filha dos réus doadores e nasceu no dia 5 de Abril de 2001.
11. Reside com os progenitores e deles depende economicamente.
12. A livrança mencionada em 2. dos factos provados titulou um empréstimo, sob a forma de abertura de crédito, no montante, global, de € 225.000,00, concedido à sociedade Empresa X em 26 de Abril de 2010, destinado a reforçar os “capitais permanentes” da sociedade mutuária e por ela efectiva e integralmente utilizado.
13. Nos termos da cláusula décima do contrato de empréstimo, “Em garantia do integral e tempestivo cumprimento das obrigações decorrentes para a mutuária do presente contrato, a mutuária entregou ao Banco uma livrança por si devidamente subscrita e avalizada pelos Avalistas com montante e data de vencimento em branco (..)”.
14. No ano de 2012, a sociedade Empresa X, S.A. requereu a sua revitalização, correndo o processo os seus termos sob o nº5699/12.2TBGMR, no (então) 5º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Guimarães.
15. No dia 5 de Março de 2013 foi proferido despacho de homologação do plano, transitado em julgado em 21 de Março de 2013.
16. Em 31 de Maio de 2016 o débito perante o Autora ascendia a € 81.833,84.
17. Em 3 de Setembro de 2011, por documento intitulado de “compra e venda”, junto aos autos a fls. 71v-74, os primeiros outorgantes, aqui réus ML e RS, na qualidade de vendedores, declararam vender a AC um meio indiviso do prédio misto, descrito na CRP …, sob o nº …/… pelo preço de dois mil e cem euros.
18. Existe uma bouça destinada à exploração de pedra, sita na …, no valor patrimonial de € 1.414.860,00 (um milhão quatrocentos e catorze mil oitocentos e sessenta euros), com uma área total de 47.162.0000 m2, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo … e nela figurando como titular a sociedade “Empresa X, S.A.”.
19. Existe um prédio urbano, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o registo n.º …, sito na Rua … Guimarães, no valor patrimonial de € 145.820,63 (cento e quarenta e cinco mil oitocentos e vinte euros e sessenta e três cêntimos), com uma área total de 202,2000 m2, inscrito na matriz …, e nela figurando como titular a sociedade “Empresa X, S.A.”.
20. Existe um prédio urbano, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o registo n.º…, sito na Rua … Guimarães, no valor patrimonial de € 68.589,13 (sessenta e oito mil quinhentos e oitenta e nove euros e treze cêntimos), com uma área total de 90,3000 m2, inscrito na matriz … e nela figurando como titular a sociedade “Empresa X, S.A.”.
21. Existe um prédio urbano, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o registo n.º …., sito na Praceta … - Vizela, no valor patrimonial de € 160.750,00 (cento e sessenta mil setecentos e cinquenta euros), com uma área total de 256,0000 m2, inscrito na matriz … e nela figurando como titular a sociedade “Empresa X, S.A.”.
22. No dia 6 de Março de 2017, no âmbito do processo nº 820/17.7T8GMR, no Juízo de Comércio de Guimarães do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juiz 1, foi proferida sentença a declarar a insolvência da sociedade Empresa X, S.A..
23. No dia 27 de Abril de 2014 foi realizada a assembleia de apreciação do relatório no âmbito da aludida insolvência, no âmbito da qual foi determinado que se procedesse à liquidação do activo da massa insolvente e declarado o encerramento formal e definitivo do estabelecimento da insolvente.

Factos não provados

O Autor votou favoravelmente o plano de revitalização.
O Autor preencheu abusivamente a livrança em violação do acordo que assumiu no processo especial de revitalização.

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IV- DIREITO

A discordância manifestada pela Recorrente relativamente à sentença fundamenta-se na alegação, constante dos artigos 51.º e 52.º da contestação, no sentido de que a obrigada principal, a sociedade Empresa X, S.A.”, na data em que foi doado o imóvel, tinha património suficiente para satisfazer a dívida do Autor.
Ficou provado, em resumo, que em 30 de Novembro de 2011, o Autor intentou contra os réus e outros uma execução comum, para pagamento da quantia de € 120.161,45, com base em livrança, no valor de € 118.062,34, emitida em 6 de Junho de 2011 e com vencimento em 16 de Junho de 2011, subscrita pela “Empresa X, S.A.” e avalizada pelos réus RS e ML e outro, todos seus accionistas e administradores.
Em 13 de Agosto de 2011, os Réus RS e ML, na qualidade de doadores, declararam doar à sua filha menor, CS, com eles residente, a fracção fracção autónoma designada pela letra “D”, correspondente ao “primeiro andar esquerdo no Bloco um - T-2”, destinado a habitação, com uma garagem na subcave, do prédio urbano sito na Rua …, freguesia de …, Viana do Castelo, com reserva do usufruto simultâneo e sucessivo até à morte do último.
A impugnação pauliana apresenta-se como uma forma de garantia geral das obrigações, salvaguardando a garantia consagrada no art. 601º do C. Civil, que, segundo Almeida Costa(1), consagra o princípio geral da responsabilidade patrimonial ilimitada do devedor.

Nos termos do art. 610.º do C. Civil, os actos que envolvam diminuição da garantia patrimonial do crédito e não sejam de natureza pessoal podem ser impugnados pelo credor, se concorrerem as circunstâncias seguintes:

a) Ser o crédito anterior ao acto ou, sendo posterior, ter sido o acto realizado dolosamente com o fim de impedir a satisfação do direito do futuro credor;
b) Resultar do acto a impossibilidade, para o credor, de obter a satisfação do seu crédito, ou agravamento dessa impossibilidade.

São, assim, requisitos gerais da impugnação:

A) Prejuízo causado pelo acto impugnado, à garantia patrimonial;
B) Anterioridade do crédito em relação ao dito acto.
C) Para os actos que tenham sido realizados a título oneroso, o art. 612º do CCivil exige um terceiro requisito, o da má-fé dos contraentes, considerando-se má-fé a consciência do prejuízo que o acto causa ao credor.
Por diminuição de garantia deve entender-se, segundo os ensinamentos de A. Varela (2), o acto que se pode traduzir “tanto numa perda ou decréscimo do activo (v.gr., a doação dum imóvel), como num aumento do passivo (por ex., assunção da dívida de outrem, afiançamento de débito alheio), visto por qualquer dessas vias se poder diminuir o conjunto de valores penhoráveis que, nos termos do artigo 601.º, respondem pelo cumprimento da obrigação.
Acrescenta este autor, com interesse, que não é necessário que do acto resulte a insolvência do devedor, bastando a impossibilidade prática, de facto, de pagamento forçado do crédito, verificada na data do acto impugnado. (3)
Incumbe ao credor, nos termos do art. 611º do citado Código, a prova do montante das dívidas e ao devedor ou a terceiro interessado na manutenção do acto a prova de que o obrigado possui bens penhoráveis de igual ou maior valor.
Segundo a orientação do STJ (4), isto significa, em termos práticos, que, provada pelo impugnante a existência e a quantidade do direito de crédito e a sua anterioridade em relação ao acto impugnado, se presume a impossibilidade de realização do direito de crédito em causa ou o seu agravamento.
No caso em apreço, inexiste qualquer dúvida sobre a verificação dos requisitos relacionados com a anterioridade do crédito do Autor e prejuízo causado com a doação do imóvel pertencente aos devedores avalistas, na medida em que deixou de figurar na respectiva esfera jurídica.
Com efeito, na execução intentada contra os Réus pelo Autor, para obter o pagamento coercivo do crédito, o imóvel em causa foi penhorado, sendo que o respectivo registo foi lavrado provisório por natureza, pelo facto de a aludida fracção autónoma se encontrar registada a favor de CS, filha dos Réus.
Significa isto que o exequente, aqui Autor, em consequência da doação, que constitui o acto impugnado, perdeu a garantia do seu crédito consistente na penhora e consequente venda do mencionado imóvel (doado) para pagamento da dívida.
Competia ao devedor alegar e provar a existência de bens penhoráveis, de igual ou maior valor, susceptíveis de satisfazer o crédito do impugnante.
E é justamente sobre esta questão que a Recorrente argumentou que, na data em que foi doado o dito imóvel, a sociedade “Empresa X, S.A.”, subscritora da livrança, possuía um património, descrito nos pontos 18 a 21 da matéria provada, que permitia o cumprimento da obrigação assumida perante o aqui Autor.
Portanto, a questão central que se suscita no recurso é a de saber se a suficiência de bens, cuja prova, nos termos do citado art. 611.º do CC, incumbe ao devedor ou a terceiro interessado na manutenção do acto, pode ser avaliada em relação ao património do devedor solidário, não demandado na acção de impugnação pauliana, porque não interveio no acto impugnado.
Nesta matéria, a jurisprudência do STJ (5) tem entendido que a suficiência dos bens, como garantia da dívida, terá de reportar-se ao próprio demandado, não relevando que outros devedores solidários continuem a dispor de património bastante para garantir o pagamento da dívida, visto que quando foi constituída a obrigação o credor ficou a poder contar com a garantia consubstanciada pelos patrimónios dos vários credores solidários.
Esta conclusão decorre da análise do elemento literal e do espírito da lei (cfr. arts. 610.º e 611.º do CC) como também do regime aplicável aos responsáveis solidários (6), como é o caso dos autos.
Com efeito, sendo a obrigação solidária, cada um dos devedores responde pela prestação integral, mesmo que estejam obrigados em termos diversos ou com diversas garantias-cfr. arts. 512.º, n.º s 1 e 2, 518.º e 519.º do C.Civil.
Nesta linha argumentativa, sublinhou-se no Acórdão do STJ de 14/12/2006 (7) que o ónus da prova que recai sobre o devedor, de que possui bens penhoráveis de igual ou maior valor, só incide sobre ele e não sobre os demais responsáveis perante o credor, sob pena de haver um arrastamento em cadeia de novos responsáveis solidários por outras dívidas, o que tornaria impossível ou diabólica a prova a fazer.
Acrescenta-se no referido aresto, citando o acórdão do STJ de 11/05/95 (BMJ 447-508), que a jurisprudência, uniforme, sobre essa questão concluiu ser irrelevante, para a improcedência da acção de impugnação pauliana, a eventual suficiência de bens no património de outros devedores solidários para satisfazer ou/e garantir a dívida. (8)
Ora, como se notou na sentença, os Réus não provaram ter bens, na data em que doaram o referido imóvel à sua filha menor, de valor igual ou superior à dívida que contraíram, na qualidade de avalistas, razão pela qual, a impugnação pauliana devia ser, como foi, julgada procedente.
Nos termos do art. 616º, nº 1, do C. Civil, julgada procedente a impugnação, o credor tem direito à restituição dos bens na medida do seu interesse, podendo executá-los no património do obrigado à restituição e praticar os actos de conservação da garantia patrimonial autorizados por lei.
Acrescenta-se no n.º 4, do mesmo preceito, que os efeitos da impugnação aproveitam apenas ao credor que a tenha requerido.
Ao pressupor a validade do acto impugnado, a acção de impugnação pauliana tem natureza meramente obrigacional (9), permitindo ao credor prejudicado pelo acto, a execução dos bens no património do obrigado à sua restituição.
No caso concreto, e em termos práticos, o Recorrido pode executar, na acção pendente intentada contra os aqui Réus, o imóvel que, nessa sede, nomeou à penhora.
Pelas razões aduzidas, deve ser julgado improcedente o recurso da Ré.
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V- DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes que constituem este Tribunal da Relação em julgar improcedente o presente recurso, e em consequência, confirmam a sentença.
Custas pela Apelante.
Notifique e registe.
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(Processado e revisto com recurso a meios informáticos)
Guimarães, 18 de Dezembro de 2017


(Anabela Andrade Miranda Tenreiro)
(fernando Fernandes Freitas)
(Alexandra Maria Rolim Mendes)

1. Direito das Obrigações, pág. 588.
2. Cfr. Das Obrigações em Geral, vol. II, 4.ª edição, Almedina, pág. 435.
3. Cfr. ob. cit., pág. 436 e 437.
4. Cfr. Acórdãos de 26/02/2009 e de 08/10/2009 disponíveis em www.dgsi.pt.
5. Cfr. Acórdãos de 29/09/1993, 11/05/1995 e 14/12/2006 disponíveis em www.dgsi.pt.
6. Cfr. art. 32.º ex vi art. 77.º da Lei Uniforme sobre Letras e Livranças.
7. Disponível em www.dgsi.pt
8. V. no mesmo sentido, Cura Mariano, Impugnação Pauliana, págs. 171 e 172.
9. Neste sentido v. Lima, Pires de, Varela, Antunes, Código Civil Anotado, I, p. 633, nota 1.