Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | MARIA CRISTINA CERDEIRA | ||
Descritores: | EXECUÇÃO SUSTAÇÃO DA EXECUÇÃO RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 04/12/2018 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 2.ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | I) - A sustação da execução ao abrigo do artº. 794º do NCPC só opera relativamente aos bens que já tenham sido objecto de penhora anterior, podendo a execução prosseguir em relação aos restantes bens penhorados, impendendo sobre o exequente o ónus de a impulsionar. II) - O artº. 794º, nºs 1 e 3 do NCPC faculta ao exequente uma de duas opções: ou mantém a penhora no bem que já foi penhorado no outro processo, ficando a sua execução sustada e podendo reclamar o seu crédito no processo em que foi efectuada a penhora em primeiro lugar; ou desiste da penhora relativamente ao bem penhorado, na acção executiva suspensa, e nomeia outros bens à penhora em sua substituição. III) - Estas opções são concedidas ao exequente e já não ao credor reclamante, dado que não foi este que tomou a iniciativa da propositura da acção, não lhe podendo ser reconhecida a qualidade de parte principal nem os direitos que a esta são conferidos a esse título. IV) - Tendo a execução sido sustada nos termos do artº. 794º do NCPC, e tendo a credora reclamante Banco X, S.A. reclamado o seu crédito no processo executivo fiscal em que a penhora é mais antiga, pode a execução prosseguir sobre outros bens do executado que foram penhorados, conforme requerido pelo exequente que não reclamou o seu crédito na execução fiscal. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO Na execução ordinária movida por Ana contra José e R. C., que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo – Juízo de Competência Genérica de Valença – Juiz 1, com o nº. 65/14.8T8VLN, foram penhorados os seguintes bens imóveis: a) Fracção autónoma designada pelas letras “AC”, correspondente ao rés-do-chão esquerdo traseiras (bloco três) - habitação, que faz parte integrante do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal pela apresentação 4 de 1997/07/28, sito na Rua …, da extinta freguesia de Paredes de Coura, actual União das Freguesias de Paredes de Coura e Resende, concelho de Paredes de Coura, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº. … - Paredes de Coura e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artº. … da referida União de Freguesias; b) Fracção autónoma designada pela letra “J”, correspondente a Cave - lugar nº. … - aparcamento automóvel, que faz parte integrante do prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal pela apresentação 4 de 1997/07/28, sito na Rua …, da extinta freguesia de Paredes de Coura, actual União das Freguesias de Paredes de Coura e Resende, concelho de Paredes de Coura, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº. … - Paredes de Coura e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artº. … da referida União de Freguesias; c) Prédio Urbano, composto por casa de rés-do-chão - comércio, denominado “Casa destinada a armazém”, sito em …, freguesia de …, concelho de Paredes de Coura, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº. … - Castanheira e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artº. … (cfr. certidões do registo predial de fls. 49 a 65). Aquando da penhora efectuada no âmbito dos presentes autos, sobre as duas fracções autónomas acima identificadas nas alíneas a) e b) já existia uma penhora registada a favor da Fazenda Nacional, no âmbito do processo de execução fiscal nº. …, que corre termos no Serviço de Finanças. (cfr. certidões do registo predial de fls. 52 a 65). Em 9/09/2010 foi proferido despacho a ordenar a sustação da presente execução quanto às referidas fracções “AC” e “J”, tendo a mesma prosseguido quanto ao prédio urbano supra identificado na alínea c) – cfr. fls. 29, 47 e 48. Em 9/02/2017 veio o executado José requerer a sustação da execução quanto à totalidade dos imóveis penhorados, por forma a abranger igualmente o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº. …, até que seja concretizada a venda das fracções previamente penhoradas à ordem do processo de execução fiscal, alegando, para tanto, que a sustação referida no artº. 794º do NCPC (anterior artº. 871º do CPC) deverá abranger todos os bens, e não apenas os bens que estão penhorados à ordem de outro processo, estribando-se no entendimento plasmado no acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido no âmbito do processo nº. 7048/05.5TBALM-A e acessível em www.dgsi.pt (fls. 12 a 15vº). A credora reclamante Banco X, S.A. pronunciou-se no sentido do indeferimento desta pretensão por entender, por um lado, que a mesma é extemporânea e, pelo outro, que não tem sustentação legal no artº. 794º do CPC, requerendo, ainda, o prosseguimento da execução com as diligências tendentes à venda do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº. … (cfr. fls. 75 a 79). Em 27/04/2017 foi proferido despacho a indeferir a sustação integral da execução nos termos requeridos pelo executado e a determinar a notificação da exequente para tomar posição nesta matéria, de forma a não esvaziar o conteúdo do nº. 3 do artº. 794º do CPC (cfr. fls. 16 a 17vº). Em resposta a tal notificação, veio a exequente requerer o prosseguimento da execução apenas com a penhora do prédio urbano descrito na CRP sob o nº. … (cfr. fls. 18 e 19). Em 6/07/2017 foi proferido o seguinte despacho [transcrição]: «Fls. 585/586: No seguimento da fundamentação de facto e de direito exarada no despacho que antecede, que aqui dou por integralmente reproduzida, defiro o requerido pela exequente. Em face da declaração efectuada pela exequente no requerimento ora em apreço, fica o esclarecimento que entendemos que se mantém a penhora que incide sobre as fracções previamente penhoradas no âmbito da execução fiscal e que determinou a sustação da execução quanto às mesmas (art. 794º, nº 3, a contrario, do CPC). Notifique». Inconformado com tal despacho, o executado José dele interpôs recurso, extraindo das respectivas alegações as seguintes conclusões [transcrição]: I. O presente recurso versa sobre o Douto Despacho proferido pelo Meritíssimo Juiz a quo com a referência 41307645, que ordenou o prosseguimento da presente execução (quanto ao prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial sob o número …), entendendo que se mantém a penhora que incide sobre as fracções previamente penhoradas no âmbito da execução fiscal e que determinou a sustação da execução quanto às mesmas (art. 794º, nº 3, a contrario, do CPC). II. A interposição de recurso sobre o referido Despacho neste momento justifica-se pela inutilidade da decisão em caso de recorrer juntamente com a decisão final, porquanto o final dos presentes autos executivos seria atingido com a venda ou adjudicação do bem em causa, tornando inócua a decisão a proferir. III. Havendo vários bens penhorados, e estando alguns deles penhorados à ordem de outro processo executivo - como é o caso - tem pleno acolhimento o estabelecido no artigo 794º do C.P.C., nomeadamente, o estabelecido no número 3 do referido artigo. IV. Por tal disposição legal, a sustação referida no artigo 794º do NCPC deverá abranger todos os bens, e não apenas os bens que estão penhorados à ordem de outro processo - in casu, à ordem do processo de execução fiscal …, que corre termos no Serviço de Finanças, impondo-se que a execução fique igualmente sustada quanto ao prédio urbano descrito sob o número …, acima identificado. V. Tal é a interpretação a fazer-se do regime estatuído pelo artigo 794º do NCPC, sob pena de completo esvaziamento do n.º 3 do mesmo. VI. O Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 09/10/2014, proferido no âmbito do processo 7048/05.5TBALM-A.L1-6, professa esse mesmo entendimento, que entendemos, salvo o devido respeito por opinião contrária, ser o correcto: “Acresce que, salvo melhor opinião, o art.º 794º não pode interpretar-se nos termos invocados pela apelante, ou seja, a execução ficaria sustada em relação ao bem penhorado (está ainda subjacente à tese da apelante que não obstante tal suspensão reclamaria o seu crédito no processo onde o bem foi inicialmente penhorado) mas poderia prosseguir, sem qualquer óbice, relativamente a outros bens. Nesta tese o nº 3 do art.º 794º ficaria sem qualquer conteúdo útil, pois o exequente nunca precisaria de desistir da penhora relativamente aos bens apreendidos no outro processo, para indicar outros em sua substituição. Afigurasse-nos antes que o art.º 794º e especialmente o seu nº 3 faculta ao exequente é uma opção: ou mantem a penhora no bem que já foi penhorado no outro processo, ficando a sua execução sustada e reclamando no processo em que foi efectuada a penhora em primeiro lugar o seu crédito; ou desiste da penhora relativamente ao bem penhorado e indica outros em sua substituição. Compreende-se facilmente que assim seja pois como refere Lopes Cardoso “o nº 1 do art.º 871º [correspondente ao actual nº 1 do art.º 794º] só consente que se reclame numa execução o crédito objecto doutra, desde que esta seja sustada. Antes disso, haveria até litispendência”. Com a consequência inerente, acrescentaremos nós, ou seja, o exequente poder obter o pagamento duplamente. Os princípios da celeridade e utilidade processuais invocados na conclusão XI das alegações em nada serão postos em causa, cabendo apenas ao exequente optar pela solução processual que, em seu entender, melhor os satisfaça. Não podem é ser alcançados a qualquer custo, nomeadamente com a eventualidade de ser obtido o pagamento duplamente.” VII. Não tem aplicação no presente caso o disposto no art.º 752º nº 1, uma vez que o mesmo traduz a possibilidade de, no âmbito do processo em que a penhora se iniciou em bens sobre que incide garantia real, se se constatar, nesse processo, “a insuficiência deles para garantir a execução”, então a penhora pode recair noutros bens. VIII. Para aferir da insuficiência dos bens, e no seguimento da doutrina de Eurico Lopes Cardoso (1), se torna insuficiente a simples avaliação dos bens, devendo os mesmos ser excutidos para que sobre eles se possa emitir um juízo de suficiência ou insuficiência, o que, nos referidos autos de execução fiscal, ainda não sucedeu. IX. inexistindo naqueles outros autos de execução fiscal a venda dos bens penhorados (fracção “AC” e fracção “J”), prejudicada fica a possibilidade de se fazer tal juízo de insuficiência, não podendo o credor reclamante lançar mão do disposto no artigo 752º, n.º 1 do NCPC. X. Ao interpretar a declaração da exequente no sentido de se entender “...que se mantém a penhora que incide sobre as fracções previamente penhoradas no âmbito da execução fiscal e que determinou a sustação da execução quanto às mesmas (art. 794º, nº 3, a contrario, do CPC)..:”, ordenando o normal prosseguimento dos autos quanto à execução sobre o prédio … de Castanheira, o Meritíssimo Juiz a quo viola precisamente o estipulado no número 3 do artigo 794º do NCPC, porquanto o esvazia de conteúdo XI. à exequente apenas restaria optar por uma de duas posições: ou desiste da penhora sobre os bens penhorados à ordem do outro processo (execução fiscal), para poder prosseguir com a penhora e execução do armazém - descrição … de Castanheira, ou, querendo manter a penhora sobre os outros bens, sujeita-se a ver também a execução sobre este bem ser sustada. XII. Ao manter o interesse em todas as penhoras (quer do bem “livre do ónus”, quer nos bens penhorados à ordem de outros autos executivos), incorre a exequente numa pretensão sem acolhimento legal. XIII. A decisão do Meritíssimo Juiz a quo ordenando o prosseguimento da presente execução, mantendo a exequente a penhora dos bens anteriormente penhorados à ordem de outro processo executivo, viola do disposto no número 3 do artigo 794º do NCPC. XIV. Devendo a mesma ser alterada/revogada por outra que, atenta a vontade da exequente de manter a penhora sobre os bens penhorados à ordem do processo de execução fiscal …, que corre termos no Serviço de Finanças, ordene a sustação da presente execução, com as devidas e legais consequências. Termina entendendo que deve ser dado provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogado o despacho recorrido, ordenando-se a sustação da presente execução, em virtude da exequente manter o interesse nas penhoras dos prédios penhorados à ordem de outro processo executivo. Não foram apresentadas contra-alegações. O recurso foi admitido por despacho certificado a fls. 20. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. II. FUNDAMENTAÇÃO O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, tendo por base as disposições conjugadas dos artºs 608º, nº. 2, 635º, nº. 4 e 639º, nº. 1 todos do Novo Código de Processo Civil [doravante NCPC], aprovado pela Lei nº. 41/2013 de 26/6. Nos presentes autos, o objecto do recurso interposto pelo executado José, delimitado pelo teor das suas conclusões, circunscreve-se à questão de saber se a sustação da presente execução deverá abranger todos os imóveis supra identificados, e não apenas os que estão penhorados à ordem do processo de execução fiscal. Com relevância para a apreciação e decisão da questão suscitada no presente recurso, importa ter em consideração a dinâmica processual supra referida, em sede de relatório. * Apreciando e decidindo.Vem o executado interpor recurso do despacho proferido em 6/07/2017 que deferiu o pedido formulado pela exequente de prosseguimento da execução apenas com a penhora do prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº. … e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artº. …, com o entendimento de que se mantém a penhora que incide sobre as fracções previamente penhoradas no âmbito da execução fiscal e que determinou a sustação da execução quanto às mesmas. Entende o recorrente que a sustação referida no artº. 794º do NCPC deverá abranger todos os bens, e não apenas os bens que estão penhorados à ordem do processo de execução fiscal, impondo-se que a execução fique igualmente sustada quanto ao prédio urbano acima identificado descrito sob o nº. …, e ao interpretar a declaração da exequente no sentido de ela manter o interesse na penhora dos três imóveis acima identificados, a Mª Juíza “a quo” está a violar o estipulado no nº. 3 daquele preceito, porquanto o esvazia de conteúdo. Vejamos se lhe assiste razão. Dispõe o artº. 794º do NCPC (anterior artº. 871º do CPC ) o seguinte: 1. Pendendo mais de uma execução sobre os mesmos bens, o agente de execução susta quanto a estes a execução em que a penhora tiver sido posterior, podendo o exequente reclamar o respectivo crédito no processo em que a penhora seja mais antiga. 2. Se o exequente ainda não tiver sido citado no processo em que a penhora seja mais antiga, pode reclamar o seu crédito no prazo de 15 dias a contar da notificação de sustação; a reclamação suspende os efeitos da graduação de créditos já fixada e, se for atendida, provoca nova sentença de graduação, na qual se inclui o crédito do reclamante. 3. Na execução sustada, pode o exequente desistir da penhora relativa aos bens apreendidos no outro processo e indicar outros em sua substituição. 4. A sustação integral determina a extinção da execução, sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo 850.º. O pressuposto da sustação prevista neste preceito legal é pender “mais de uma execução sobre os mesmos bens”. Essa pendência tanto pode ser de execução comum, como de execução fiscal, caso em que a ulterior reclamação de créditos deve fazer-se no processo de execução tributária, ao abrigo do disposto nos artºs 239 e seguintes do CPPT, incluindo o respectivo artº. 240º, nº. 4. De acordo com o disposto no citado artº. 794º do NCPC, o agente de execução susta a execução apenas quanto aos bens em que a penhora tenha sido posterior (cfr. Rui Pinto, Manual da Execução e Despejo, Agosto de 2013, Coimbra Editora, pág. 863 e 864). Resulta, desde logo, deste preceito que não existe fundamento legal para acolher a pretensão do executado no que concerne à sustação da execução quanto ao prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº. …. Com efeito, ao contrário do que sucede com as fracções autónomas designadas pelas letras “AC” e “J”, ambas descritas na Conservatória do Registo Predial sob o nº. … e inscritas na matriz predial urbana sob o artº. … da referida União de Freguesias, não incide sobre o referido prédio urbano, descrito na mesma Conservatória sob o nº. … e inscrito na matriz predial urbana sob o artº. …, penhora anterior à destes autos. Daí que a decisão de sustação da execução, proferida nestes autos em 9/09/2010, tivesse incidido apenas sobre as aludidas fracções “AC” e “J” por terem sido objecto de penhora anterior em processo de execução fiscal. E refere-se no despacho de 27/04/2017 que resulta da informação avançada pelo Serviço de Finanças que tal penhora permanece em vigor, estando o processo executivo na fase de venda e tendo a Banco X, S.A. ali reclamado o seu crédito. Entendemos, pois, que a sustação da execução ao abrigo do artº. 794º do NCPC só opera relativamente aos bens que já tenham sido objecto de penhora anterior, podendo a execução prosseguir em relação aos restantes bens penhorados, impendendo sobre o exequente o ónus de a impulsionar (cfr. acórdão da RG de 17/12/2013, proc. nº. 4321/10.6TBGMR, acessível em www.dgsi.pt). Assim sendo, continua a aplicar-se, neste caso, a doutrina defendida por Eurico Lopes Cardoso, no âmbito do anterior artº. 871º do CPC (in Manual da Acção Executiva, pág. 528), de que só se suspende a execução sobre os bens duplamente penhorados, podendo ela prosseguir sobre outros bens que não tenham sido objecto de penhora anterior. E se o exequente quiser obter pagamento do seu crédito pelo produto dos bens duplamente penhorados, terá de reclamá-lo na execução onde foi efectuada a penhora anterior, para aí ser graduado com a preferência da respectiva penhora (neste sentido se pronunciou também Fernando Amâncio Ferreira, Curso de Processo de Execução, 7ª ed., Almedina, pág. 306 a 309). E bem se compreende que assim seja, pois o que a lei pretende evitar, através do mencionado artº. 794º do NCPC, é que em processos diferentes se opere a adjudicação ou a venda dos mesmos bens. Como escreve José Alberto dos Reis, “a liquidação tem de ser única e há-de fazer-se no processo em que os bens foram penhorados em primeiro lugar” (in Processo de Execução, Vol. II, Coimbra Editora, pág. 287). Importa, ainda, referir que o exequente que viu a execução sobre determinado bem ser declarada suspensa pode, relativamente ao bem que já foi penhorado no outro processo: a) manter a penhora desse bem, ficando a sua execução sustada, e ir reclamar o seu crédito no processo em que foi efectuada a penhora em primeiro lugar (artº. 794º, nº. 1 do NCPC); b) ou desistir da penhora na acção executiva suspensa e nomear outros bens à penhora em sua substituição, ao abrigo do artº. 794º, nº. 3 do NCPC (cfr. Rui Pinto, ob. cit., pág. 865 e 866; Salvador da Costa, Concurso de Credores, Almedina, pág. 262). Como bem refere o Tribunal “a quo”, no despacho de 27/04/2017, estas opções são concedidas ao exequente e já não ao credor reclamante, como é aqui o caso, dado que não foi este que tomou a iniciativa da propositura da acção, não lhe podendo ser reconhecida a qualidade de parte principal nem os direitos que a esta são conferidos a esse título. Ora, no caso dos autos a exequente veio requerer, nos termos do artº. 794º, nº. 3 do NCPC, o prosseguimento da execução apenas com a penhora do prédio urbano descrito na CRP, sob o nº. …, não merecendo qualquer censura o despacho recorrido que deferiu tal pretensão e clarificou o seu entendimento de que se mantém a penhora que incide sobre as fracções previamente penhoradas no âmbito da execução fiscal e que determinou a sustação da execução quanto às mesmas. Assim, inexistindo fundamento legal que permita acolher a pretensão do executado, tendo a execução sido sustada nos termos do artº. 794º do NCPC (anterior artº. 871º do CPC), e tendo a credora reclamante Banco X, S.A. reclamado o seu crédito no processo executivo fiscal em que a penhora é mais antiga, entendemos que a execução pode prosseguir sobre outros bens do executado que foram penhorados, nomeadamente sobre o prédio urbano supra identificado, conforme requerido pela exequente. Tanto mais que não consta destes autos que a exequente tenha reclamado o seu crédito no âmbito da execução fiscal, não se podendo olvidar que o objectivo desta acção é, em primeira linha, o da cobrança coerciva do crédito da exequente, sem prejuízo obviamente da cobertura que merecem os créditos graduados antes dele. Por tudo o que se deixou exposto, improcede o recurso interposto pelo executado. * SUMÁRIO:I) - A sustação da execução ao abrigo do artº. 794º do NCPC só opera relativamente aos bens que já tenham sido objecto de penhora anterior, podendo a execução prosseguir em relação aos restantes bens penhorados, impendendo sobre o exequente o ónus de a impulsionar. II) - O artº. 794º, nºs 1 e 3 do NCPC faculta ao exequente uma de duas opções: ou mantém a penhora no bem que já foi penhorado no outro processo, ficando a sua execução sustada e podendo reclamar o seu crédito no processo em que foi efectuada a penhora em primeiro lugar; ou desiste da penhora relativamente ao bem penhorado, na acção executiva suspensa, e nomeia outros bens à penhora em sua substituição. III) - Estas opções são concedidas ao exequente e já não ao credor reclamante, dado que não foi este que tomou a iniciativa da propositura da acção, não lhe podendo ser reconhecida a qualidade de parte principal nem os direitos que a esta são conferidos a esse título. IV) - Tendo a execução sido sustada nos termos do artº. 794º do NCPC, e tendo a credora reclamante Banco X, S.A. reclamado o seu crédito no processo executivo fiscal em que a penhora é mais antiga, pode a execução prosseguir sobre outros bens do executado que foram penhorados, conforme requerido pelo exequente que não reclamou o seu crédito na execução fiscal. III. DECISÃO Em face do exposto e concluindo, acordam os Juízes da Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pelo executado José e, em consequência, confirmar o despacho recorrido. Custas a cargo do recorrente. Notifique. Guimarães, 12 de Abril de 2018 (processado em computador e revisto, antes de assinado, pela relatora) (Maria Cristina Cerdeira) (Raquel Baptista Tavares) (Margarida Almeida Fernandes) 1. Eurico Lopes Cardoso, in Manual da Acção Executiva, Imprensa Nacional da Casa da Moeda, 1987, página 104. |