Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
129/13.5TBBRG.G1
Relator: ANTÓNIO SANTOS
Descritores: REGISTO PREDIAL
EMOLUMENTOS
CERTIDÃO
TAXA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/21/2013
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: 1. - Os emolumentos a suportar pelo utente na Conservatória de Registo Predial e devidos em razão de pedido efectuado e decorrente da obrigatoriedade do Registo de constituição de DRHP são os que se mostram expressamente previstos no art.º 21º, do RERN (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de 14 de Dezembro );
2. - O valor indicado em 5.1. cobre já o custo dos certificados de registo predial emitidos e entregues ao utente no âmbito do referido processo de registo , não devendo ao mesmo acrescer a taxa a que alude o nº 4, do Artº 2º, da Portaria n.º 622/2008, de 18 de Julho;
3.- É que, a taxa a que alude a Portaria n.º 622/2008, de 18 de Julho, apenas é devida quando visa remunerar uma emissão avulsa de certidão/ certificado de registo predial, porque requisitada fora de um determinado processo de registo.
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes na 2ª Secção CÍVEL do Tribunal da Relação de Guimarães
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1.Relatório.
G.., Lda., com sede em Terras de Bouro, GERÊS, notificada que foi de liquidação de conta - elaborada na 2 dª Conservatória do Registo Predial de Braga - relativa à constituição do Direito Real de Habitação Periódica sobre prédio sito na freguesia de .., concelho de Terras de Bouro, e da mesma discordando parcialmente, deduziu a competente IMPUGNAÇÃO JUDICIAL , nos termos do artº 142º-A, nº1, do CRP.
1.1.- Na sequência da impugnação referida e apresentada a conta à apreciação do conservador, nos termos e para efeitos do artº 142º-A, nº1, do CRP, veio a ser proferido despacho de sustentação, considerando-se que, em face do disposto no art. 7°, n° 1 do D.L. 322-A/2001 de 14 de Dezembro, não existe fundamento legal para a emissão dos certificados prediais de forma gratuita, antes devendo ser pago o valor de 12,00€ por cada um, nos termos do nº 4 do art. 2° da portaria 622/2008.
1.2.- Remetidos os autos ao Tribunal competente, o de Braga, e emitindo o MP o seu parecer, foi de seguida proferida sentença, julgando-se a impugnação judicial de improcedente.
1.3.- Inconformada com a decisão/sentença referida em 1.2., da mesma apelou então a impugnante G.., Lda, concluindo do seguinte modo :
1a - Agora por via da sentença que a julgou válida, está em causa a impugnação de uma liquidação de emolumentos registrais relativos à constituição de um Direito Real de Habitação Periódica (DRHP) com 612 fracções temporais, mais concretamente, a impugnação de uma parcela de 7.332,00€, a título de taxa devida pela emissão dos 612 certificados de registo predial, correspondentes 612 fracções temporais (12 x 51, ou seja, 12 unidades de alojamento fraccionadas em 51 semanas por ano).
2a - Mantendo, embora, a sua convicção de que nada obrigava à emissão, que não solicitou, de todos os 612 certificados cujo pagamento (sem que tivesse solicitado o serviço) lhe foi exigido ao preço unitário de 12€, com invocação do art° 2°. 4 da Portaria 622/2008, a Recorrente deixa cair esse fundamento do recurso, que integrou a impugnação para o Tribunal quo, pelo que a Apelação vem limitada ao seu entendimento de que, tendo os certificados sido emitidos NO ÂMBITO do processo de registo do título constitutivo do DRHP, não era aplicável a taxa autónoma do art° 2°. 4 da Portaria 622/2008, apenas prevista para certificados emitidos FORA DO ÂMBITO do registo (como seriam as segundas vias ou outros pedidos de certificados sem pedido de registo de título constitutivo (5 a 16 e, em especial, 8, 15 e 16 supra)
3a - A Portaria 622/2008, conforme o seu preâmbulo, insere-se na lógica do DL 116/2008, de 4/7, que, na concretização do programa então designado SIMPLEX, "aprovou um vasto conjunto de medidas de simplificação, desmaterialização e desformalização de actos e processos na área do registo predial “ (10 parágrafo do preâmbulo da Porto 622/2008).
Relativamente aos preços dos actos de registo predial, alterando, em especial, o art° 21° do REGULAMENTO EMOLUMENTAR DOS REGISTO E DO NOTARIADO (RERN), cuja primeira versão foi aprovada pelo DL 322-A/2001, o DL 116/2008 concretizou a simplificação pela adopção de preços únicos, propalando que "os preços deixam de resultar da soma de várias parcelas avulsas, o que tornava extraordinariamente difícil, para os interessados, conhecer o custo real dos registos dos actos que pretendiam realizar. Com as alterações agora introduzidas, os preços passam a ter uma lógica de processo e a incluir, designadamente, as inscrições, descrições, averbamentos, certidões e emolumentos pessoais necessários a satisfação do pedido apresentado pelo interessado." (antepenúltimo parágrafo do preâmbulo do DL 116/2008). E, no dito art° 21°.1 do RERN, concretizou: "Os emolumentos previstos neste artigo têm um valor único, relativo a todos os actos de registo DECORRENTES OU CONEXOS COM O PEDIDO de registo e desde que respeitantes ao mesmo prédio" (incluindo, inscrições, descrições, genéricas e subordinadas, averbamentos e emolumentos pessoais). (16 a 20 supra)
4º - Por ser a que mais importa ao caso, também a Portaria 622/2008 invocou o objectivo SIMPLEX do DL 116/2008, lembrando: "os preços dos actos de registo passam a ser ÚNICOS e, por isso, mais transparentes. Os preços dos registos deixam de resultar da soma de várias parcelas avulsas, o que tornava extraordinariamente difícil, para os interessados, conhecer o custo real dos registos dos actos que pretendiam realizar. Com as alterações agora introduzidas, os preços passam a ter uma lógica de processo de registo e a incluir, designadamente, as certidões entregues, enviadas ou disponibilizadas aos interessados na sequência de cada processo de registo." (antepenúltimo parágrafo do preâmbulo daquela Portaria).
Conforme explicitou no seu preâmbulo, a Portaria 622/2008 visou estender o SIMPLEX à liquidação do "preço das certidões, fotocópias, informações e certificados de registo predial emitidos FORA DO ÂMBITO DE UM PROCESSO DE REGISTO" de modo que também esse preço "seja, preferencialmente, único" e, mais adiante, "A presente portaria destina-se, pois, a regulamentar os preços devidos aos serviços de registo pelas certidões, fotocópias, informações e certificados de registo predial, emitidas FORA DO ÂMBITO de um PROCESSO DE REGISTO."
5ª - Assim, no art° 1° da parte dispositiva da Portaria, onde se escreveu" A presente portaria regula as taxas devidas aos serviços de registo pela emissão de certidões, fotocópias, informações e certificados de registo predial', deve ser interpretada no sentido: A presente portaria regula as taxas devidas aos serviços de registo pela emissão de certidões, fotocópias, informações e certificados de registo predial, FORA DO ÂMBITO de um processo de registo.
E o nº 4 do art° 2° da mesma parte dispositiva, onde se escreveu " 4 - Por cada certificado predial relativo a direito real de habitação periódica - € 12.", deve ser interpretado com o sentido: 4 - Por cada certificado predial relativo a direito real de habitação periódica, FORA DO ÂMBITO de um processo de registo - € 12. (24 e 25 supra)
6ª - É certo que a emissão de um certificado de registo predial tem um custo que o Sr. Conservador e a Mma Juiz do Tribunal a quo não concretizaram mas qualificaram de "elevado" e a justiçar a taxa de 12€ do art° 2°.4 da Portaria 622/2008, por cada certificado, e os questionados 7.332,00€ para os 612 certificados.
A emissão dos 612 certificados pode ter custado uma parcela desses 7.332,00€ (1/2, 1/4?).
Mas não pode esquecer-se que, actualmente, por um registo do título constitutivo do direito real de habitação periódica com 612 fracções temporais (DRHP) são pagos 15.550,00€, de emolumentos, sendo 250€ nos termos do nº 2.12 e 15.300,00€ (= 612x25€ ) nos termos do nº 2.15, ambos do art° 21° do RERN, agora na versão do DL 209/2012.
Ora, 15.550,00€ é bastante mais que 7.332,00€, ou seja, 15.550,00€ é um quantitativo concretizado "MUITO ELEVADO".
Acresce que, no acto do registo da transmissão de cada direito real, o emolumento é de 250€ nos termos do nº 2.12 do art° 21° do RERN, resultando o ELEVADÍSSIMO montante de 153.000,00€ (= 612x250€) para o registo da totalidade das fracções temporais. E a potencialização do futuro recebimento deste ELEVADÍSSIMO montante também converge para a razoabilidade da integração do custo da emissão dos certificados prediais no emolumento de 15.550,000 do registo do respectivo título constitutivo do DRHP. (26 a 36 supra)
7ª - Por todo o exposto, bem se compreende que o emolumento liquidado pelo registo de um título constitutivo do DRHP integre, como preço único, todos os custos incorridos NO ÂMBITO do processo desse registo, sem necessidade de se aplicar a taxa de 12€ do art° 2°4 da Portaria 622/2008, prevista para a emissão do certificado relativo a cada fracção temporal, até porque, conforme o preâmbulo da mencionada Portaria, as taxas que fixa estão pressupõem situações FORA DO ÂMBITO de um processo de registo - como serão as das 2as vias e outras de 8, 15 e 16 supra.
8a - Resultam violados na sentença recorrida os normativos do art° 2°.4 da Portaria 622/2008 e o art° 21°, 2.12 e 2.15, do RERN anexo ao DL 322-A/2001, com a redacção posterior ao DL 116/2008.
NESTES TERMOS e nos melhores de direito, revogando a sentença recorrida e anulando, por erro/violação da lei, a liquidação da conta notificada no âmbito do pedido de registo da AP. 3064, de 2012-09-28 relativamente ao montante de 7.332,00€ cobrado com invocação do art° 2° da Portaria 622/2008 e, por cobrada, ordenando a respectiva restituição à Impugnante.
1.4.- Não foram apresentadas contra-alegações.
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Thema decidendum
1.5. - Colhidos os vistos, cumpre decidir, sendo que , estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente ( daí que as questões de mérito julgadas que não sejam levadas às conclusões da alegação da instância recursória, delas não constando, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal ad quem - cfr. artºs. 684º nº 3 e 690º, nºs 1 e 2 , ambos do Código de Processo Civil ), e sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, a questão a apreciar e a decidir resume-se a saber :
a) Se a conta nº 15995/2012-AP 3064 de 2012/09/28, referente a processo de registo de Constituição do Direito de Habitação Periódica, mostra-se bem elaborada, maxime se dela deve constar, como consta, a parcela com o valor de € 7.332,00 e que à apelante foi cobrado com invocação do art° 2°, Alínea 4, da Portaria 622/2008, razão porque não se impõe a sua devolução ( como o pretende a apelante ).
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2. Motivação de Facto.
A factualidade assente/provada com interesse para a decisão da apelação, é, para além da que resulta do Relatório do presente Acórdão , a seguinte:
2.1.- Por requisição nº 12 159, de 28/9/2012, que deu entrada na 2ª Conservatória do Registo Predial de Braga, foi pedida a inscrição de constituição do direito de habitação periódica, com 12 fracções e 52 semanas cada, perfazendo o total de 612 fracções;2.2. – No seguimento do referido em 2.1., procedeu a Conservatória do Registo Predial de Braga à elaboração da Conta Nº 15995/2012 – AP 3064, de 28/9/2012, sendo ela do seguinte teor :
“ Conta N.o 15995/2012 - AP 3064 de 2012/09/28 13:19:27UTC - Constituição do Direito de Habitação Periódica
Emolumentos do Registo Predial
Artigo 2.º P. 622/2008
Alínea 4 - 7.332,00 €
Artigo 21.º
Alínea 13 - 30,00 €
Alínea 2.12 ¬ - 250,00 €
Alínea 2.15 - 2.750,00 €
Total Conta: € 10.362,00 €
2.3.- No seguimento da requisição identificada em 2.1., pela CRP foram emitidos 612 certificados (12 fracções x 51 semanas) , com o custo de 12,00€ cada um ;
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3.Motivação de direito.
3.1.- Se da conta nº 15995/2012-AP 3064 de 2012/09/28, referente a Constituição do Direito de Habitação Periódica, não deve constar a parcela de € 7.332,00, quantia cobrada com invocação do art° 2°, alínea 4, da Portaria 622/2008, razão porque deve tal valor ser restituído à apelante.
Com referência ao valor de 7.332,00 €, incluído na conta indicada no item 2.2. do presente Acórdão e cobrado à apelante, e em sede de decisão de sustentação, teceu o Exmº Conservador as seguintes considerações :
“ (…)
2. Pagamento do certificado.
a. A previsão do custo de cada certificado consta da portaria 622/2008 de 18 de Julho, alterada pela portaria 426/2010 de 29 de Junho.
b. Nela se prevê, no art. 4°, o custo de 12,00€ por cada certificado predial relativo a direito real de habitação periódica, sem qualquer distinção entre emissão inicial e segunda via.
i. Situação que não é de estranhar se se considerar que o serviço prestado é exactamente o mesmo quer num caso quer noutro, atendendo à regra da proporcionalidade que perpassa por todo o sistema de taxas e emolumentos, vide art. 3° do RERN, sendo a tributação calculada com base no custo efectivo do serviço prestado.
ii. Acresce, por outro lado que, o custo do certificado a emitir é elevado, cuja impressão nas tipografias é pedida e paga pelos serviços.
iii. Não estando o seu custo, do certificado, incluído em qualquer verba do custo de registo do título constitutivo do direito real de habitação periódica.
c. Não é fácil, efectivamente, descortinar o sentido e alcance de tanto decreto e portaria e respectivas alterações, dando a sensação de que o próprio legislador não estava muito seguro do que queria. Todavia o legislador defende-se no artigo 9° do Código Civil: assim como alguém ser juiz em causa própria.
d. Todavia, salvo melhor opinião, parece-nos que o certificado deve ser pago.
e. A portaria 622/2008 previa, para o caso das certidões, que não para o caso dos certificados, no nº 11 do art. 2°, a gratuitidade da sua entrega nos termos dos n° 6
f. Esse n° 11 veio a ser revogado pela portaria 426/2010 de 29 de Junho, mas mantendo-se inalterado o artigo 110° do CRP, pelo que a certidão emitida por cada processo de registo continuava, e contínua, a ser gratuita.
g. Mas nada se refere quanto aos certificados.
h. Assim, quanto aos certificados, a falta de distinção entre emissão inicial e segunda via, a falta de previsão expressa de entrega gratuita de certificado - o decreto 275/93 só refere a necessidade de entrega - (diferentemente do que acontece para as certidões, art. 110°, nº 6 do CRP.)
e , porque de acordo com o art. 7°, n° 1 do D.L. 322-A/2001 de 14 de Dezembro que aprovou o Regulamento Emolumentar dos Registo e do Notariado, as isenções e reduções emolumentares que venham a ser criadas após a entrada em vigor do Regulamento Emolumentar deveriam ser inseridas no seu artigo 28° (nada constando quanto a certificados), e atento o elevado custo da sua impressão,
i. leva-nos a concluir que não existe, pois , nem essa foi a intenção do legislador, fundamento legal para a emissão dos certificados prediais de forma gratuita, antes devendo ser pago o valor de 12,00€ por cada um, nos termos do nº 4 do art. 2° da portaria 622/2008. “.
Por sua vez, e com referência à mesma questão, sufragando a decisão de sustentação do Exmº Conservador da 2ª CRPredial de Braga , sentenciou o Exmº Juiz a quo no sentido - julgando improcedente a impugnação judicial - de que “ (…) merecem total concordância os fundamentos do despacho de sustentação, reproduzindo-se aqui para todos os efeitos legais, quanto ao custo de cada um dos certificados prediais emitidos, previsto no artº 2º, nº4, da portaria nº 622/2008, de 18 de Julho, alterada pela portaria nº 426/2010 de 29 de Julho “.
Apreciando.
Como resulta das conclusões da apelante quando contrapostas à sentença recorrida ( que no tocante à questão decidenda limita-se a sufragar o entendimento do Exmº Conservador, remetendo para os fundamentos do respectivo despacho de sustentação), no âmbito da presente apelação tudo se resume a saber se, no âmbito de um processo de registo de constituição de D.R.H.P. ( Direito Real de Habitação Periódica), permitido/lícito é ao Conservador cobrar, para além dos emolumentos previstos no artº 21º, do Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado ( aprovado pelo Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de 14 de Dezembro), também – que àqueles acresce – a taxa a que alude o artº 2º, alínea 4, da Portaria n.º 622/2008, de 18 de Julho, sendo ela equivalente a €12,00 por cada certificado predial relativo a direito real de habitação periódica .
É que, “alinhando” o Exmº Conservador pelo entendimento que considera que a cobrança da referida taxa se justifica e impõe, já a apelante conclui que não existe fundamento legal que a suporte.
Vejamos.
É ponto assente que a constituição do direito real de habitação periódica [ cfr. artºs 5º, 6º e 8º, nº1, todos do DL nº 275/93, de 5 de Agosto, e artºs 2º, nº1, alínea b) , 8º-A, nº1, alínea a), 81º e 83º, estes últimos todos do Código do Registo Predial, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 209/2012, de 19 de Setembro ] consubstancia um facto jurídico que está sujeito/obrigado a inscrição no registo predial, sendo que, a partir do registo, passam a existir tantos direitos parcelares quantas as fracções temporais previstas no título e descritas na conservatória ( cfr. art.º 83º, nº 3, do C.R.Predial).
Incontroverso é, outrossim ( como o decidiu o tribunal a quo , decisão esta que queda fora da instância recursória), que em sede de processo de registo de constituição de D.R.H.P., uma vez concluído o registo definitivo do título de constituição do direito real de habitação periódica, emita e entregue a CRP os competentes certificados prediais atinentes a cada um dos direitos, a favor do proprietário das unidades de alojamento sujeitas ao regime de direitos reais de habitação periódica ( cfr. art.º 10º, nºs 1 e 2, do D.L. 275/93, de 5 de Agosto ).
Porque de acto praticado nos serviços dos registos prediais se trata , está ele ( a inscrição no registo predial do título de constituição de D.R.H.P.) sujeito - porque não isento - a tributação emolumentar ( cfr. artºs 1º e 2º, do Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de 14 de Dezembro), sendo que, como resulta do artº 151º do CRPredial, os emolumentos pelos actos praticados nos serviços de registo são pagos em simultâneo com o pedido ou antes deste, sendo o responsável pelo pagamento o sujeito activo dos factos.
Ou seja, pelo processo de registo de titulo de constituição de D.R.H.P, e qual contrapartida legalmente fixada pela utilização de um serviço público de registo, obrigado está o utente [ recaindo a responsabilidade pelo pagamento dos emolumentos e taxas devidas pela prestação do serviço de registo solicitado sobre o sujeito activo dos factos – cfr. artº 151 nº 2 do CR.Predial ] a suportar um custo, consubstanciando assim a tributação emolumentar a retribuição dos actos praticados e sendo esta última calculada com base no custo efectivo do serviço prestado, tendo em consideração a natureza dos actos, a sua complexidade e o valor da sua utilidade económico-social .(1)
Em todo o caso, como bem refere Albino Matos (2), os emolumentos, quais prestações pecuniárias, estão legalmente previstas, ou seja , são tabeladas normativamente, e daí que devam tais tabelas ser afixadas nos serviços em local visível e acessível à generalidade dos utentes ( cfr. artº 6º do RERN).
Postas estas breves considerações, e tendo presente que em sede de aplicação da lei no tempo ( in casu do RERN), o acto que, normalmente, determina a prestação do serviço e de que o emolumento constitui contrapartida, é o pedido ou a promoção do registo [ cfr. artigos 6.º , 77.º e 151º, nº1, todos do CRPredial ] , temos assim que, não olvidando ainda o disposto no artº 12º, do Código Civil, ao processo de registo iniciado e desencadeado pela apelante ( a 28/9/2012 ) há-de aplicar-se os termos do RERN com a redacção em vigor à data da apresentação da requisição, ou seja , com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 99/2010, de 2 de Setembro ( entrou em vigor a 1/10/2010 – cfr. artº 7º ) , que não já com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 209/2012, de 19 de Setembro ( entrou em vigor a 1/10/2010 – cfr. artº 19 º ) e , a fortiori, pela Lei n.º 63/2012, de 10 de Dezembro. (3)
Ora, em consonância com o disposto no artº 21º do RERN, aplicável ao acto ( processo de registo de constituição de D.R.H.P.) despoletado pela apelante junto da CRPredial de Braga, e sob a epígrafe de “ Emolumentos do Registo Predial “, nada se impõe/justifica apontar ao facto de, em sede de liquidação definitiva (consignada na conta do acto) do custo do serviço prestado, terem sido incluídos na conta final nº 15995/2012, os valores parcelares de € 30,00, de 250,00€ e de 2.750,00€, pois que, todos eles, efectivamente, encontram suporte legal, respectivamente, nos itens 2.12., 2.15 e 13, todos do artº 21º do RERN.
O mesmo já não se pode dizer, ao invés, da parcela de € 7 332,00 e que, para a 2ª Conservatória do Registo Predial de Braga, de quantia se trata que também é devida pelo utente e que acresce à conta do acto/serviço requisitado pelo mesmo, razão porque da conta final deve constar – no entender da Conservatória - e mostrando-se ela prima facie coberta pela Portaria n.º 622/2008 de 18 de Julho.
A nosso ver, porém, não tem in casu a Conservatória do Registo Predial razão no entendimento que perfilha, não se nos afigurando estar a interpretação que faz da letra da Lei em perfeita consonância com o comando que emerge do artº 9º,nº1 e 2, do Código Civil.
Senão, vejamos.
Em sede de Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 116/2008 , de 4 de Julho [ diploma este que veio aprovar medidas de simplificação, desmaterialização e desformalização de actos e processos na área do registo predial e de actos notariais conexos, e que, além do mais, introduziu alterações nos artigos 9.º, 14.º, 21.º, 22.º, 27.º -A e 28.º , todos do Regulamento Emolumentar dos Registos e do Notariado, aprovado pelo Decreto -Lei n.º 322-A/2001, 14 de Dezembro ], disse o legislador que “ (…) Finalmente, os preços dos actos de registo passam a ser únicos e, por isso, mais transparentes. Assim, em geral, os preços deixam de resultar da soma de várias parcelas avulsas , o que tornava extraordinariamente difícil, para os interessados, conhecer o custo real dos registos dos actos que pretendiam realizar. Com as alterações agora introduzidas, os preços passam a ter uma lógica de processo e a incluir, designadamente, as inscrições, descrições, averbamentos, certidões e emolumentos pessoais necessários a satisfação do pedido apresentado pelo interessado “.
Com o referido diploma legal de 2008, portanto, e com as alterações introduzidas no RERN, inquestionável é que o legislador teve por desiderato, através delas - alterações -, alterar o sistema de tributação dos actos de registo, passando doravante o respectivo custo a ser calculado e cobrado com referência a valores únicos por cada tipo de pedido de registo, deixando doravante de resultarem da soma de tantos valores quantos os actos a registar e ou a praticar, sendo todos tributados como integrando um acto único, para efeitos emolumentares ( em consonância de resto com o disposto no artº 13º, do RERN ).
Dito de uma outra forma, dir-se-á (4) que, com a reforma do registo predial levada a cabo pelo Decreto-Lei n.º 116/2008, de 4 de Julho, foi introduzida uma nova modelação em matéria emolumentar, passando a tributação a centrar-se na prestação de serviço normalmente suscitada pelo processo de registo em causa, que não no resultado ou nas vicissitudes que àquele mesmo processo viessem a corresponder , e daí que , tenha o RERN sido actualizado ajustando-o aos custos decorrentes dos serviços efectivamente prestados e em consonância com a regra da proporcionalidade enquanto um dos seus princípios fundamentais e estruturantes ( cfr. decorre expressamente dos preâmbulos do Decreto-Lei n.º 99/2010 e Decreto-Lei n.º 209/2012, de 19 de Setembro).
Em consonância com o objectivo visado e concretizado através do Decreto-Lei n.º 116/2008 , de 4 de Julho [ no sentido, como vimos já, de os preços dos actos de registo passarem a ter uma lógica de processo ], e de imediato, logo a 18 de Julho de 2008, e através da Portaria n.º 622/2008, de 18 de Julho, veio o legislador ( cfr. Artigo 1.º ), coerentemente a regular as taxas devidas aos serviços de registo pela emissão de certidões, fotocópias, informações e certificados de registo predial, ou seja, a fixar qual o custo/preço dos actos [ quais taxas relativas a actos avulsos, porque praticados fora de um acto único ou processo de registo ] praticados pelos serviços públicos fora do âmbito de um determinado processo de registo.
Que assim é, disse-o expressamente o legislador no Preâmbulo da Portaria n.º 622/2008, de 18 de Julho, pois que, ao mesmo tempo que volta a reafirmar o que já havia dito no Preâmbulo do Decreto-Lei n.º 116/2008 , de 4 de Julho [ de que os preços dos actos de registo passam a ser únicos e, por isso, mais transparentes, deixando eles de resultar da soma de várias parcelas avulsas, o que tornava extraordinariamente difícil, para os interessados, conhecer o custo real dos registos dos actos que pretendiam realizar, e passando doravante a ter uma lógica de processo de registo e a incluir, designadamente, as certidões entregues, enviadas ou disponibilizadas aos interessados na sequência de cada processo de registo ] , diz ainda o legislador que impunha-se também que o preço das certidões, fotocópias, informações e certificados de registo predial emitidas fora do âmbito de um processo de registo fosse, preferencialmente, único e facilmente compreensível para os interessados.
E daí que, esclarece e precisa o legislador no referido Preâmbulo da Portaria n.º 622/2008, que visa e se destina este último diploma, portanto, a regulamentar os preços devidos aos serviços de registo pelas certidões, fotocópias, informações e certificados de registo predial, emitidas fora do âmbito de um determinado processo de registo.
Ora, tendo presente que em sede de interpretação da Lei obrigado está o seu aplicador a reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico e as circunstâncias em que foi ela elaborada, não podendo o intérprete atender a um qualquer pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, e , em todo o caso, na fixação do seu sentido e alcance, há-de o intérprete presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir seu pensamento em termos adequados ( cfr. artº 9º, do CC ), temos para nós que o entendimento sufragado pela CRP de Braga e subjacente à elaboração da Conta nº 15995/2012 não é de corroborar.
É que, e desde logo, importa reconhecer que, sobretudo o elemento racional ou teleológico, consistindo ele na razão de ser da norma (ratio legis), ou seja, no fim visado pelo legislador ao editar a norma e nas soluções que tem em vista e que pretende realizar, aponta decisivamente ( como expressamente resulta do respectivo preâmbulo ) para a conclusão de que as taxas devidas aos serviços de registo e plasmadas na Portaria 622/2008, não reflectem os montantes exigíveis aos utentes/interessados de um concreto processo de registo e no âmbito do qual, e apenas por causa dele, tenham sido disponibilizadas quaisquer certidões, fotocópias, informações e/ou certificados de registo predial.
Do mesmo modo, também o elemento histórico (5) afasta a interpretação do Exmº Conservador, sabendo-se como se sabe que na sequência de decisão do Tribunal de Justiça e das Comunidades Europeias (TJCE) (6), logo tratou o nosso legislador, através da Portaria n.º 996/98, de 25 de Novembro ( no artº 22º ), por fixar limites máximos de emolumentos a cobrar por cada acto, fixando-o à data em 15 000 000$00.
Mas, ainda que viáveis e possíveis fossem diversas outras interpretações, maxime a sufragada pelo Exmº Conservador, urge atentar ainda que, no âmbito do próprio RERN, reza o respectivo Artº 5º ( sob a epígrafe de “ Interpretação e integração de lacunas” ) que “ As disposições tabelares não admitem interpretação extensiva, nem integração analógica e, em caso de dúvida sobre o emolumento devido, cobrar-se-á sempre o menor “ ( cfr. nºs 1 e 2 ).
Não se olvida, por fim, que apenas com as alterações introduzidas no artº 21º do Regulamento Emolumentar dos Registos e do Notariado através do artº 3º, do Decreto-Lei n.º 99/2010, de 2 de Setembro, maxime com o acrescento do item 2.15 [ rezando ele que “ Ao emolumento previsto para o registo dos factos que determinem a constituição da propriedade horizontal, do direito real de habitação periódica, de empreendimentos turísticos e de operações de transformação fundiária, acresce € 15 por cada descrição subordinada, unidade, lote ou parcela, para além da quinta, até ao limite de € 3000 “ ] , foi de alguma forma ajustada e actualizada a remuneração devida pelo desencadear de um processo de registo de constituição de D.R.H.P., passando de então em diante a existir uma maior correspondência e proporcionalidade entre o custo efectivo da actividade referente ao acto de registo em concreto e o preço/remuneração/contraprestação suportado pelo utente.
Sucede que, se anteriormente às alterações introduzidas no artº 21º do Regulamento Emolumentar dos Registos e do Notariado através do artº 3º, do Decreto-Lei n.º 99/2010, de 2 de Setembro, lícito era sustentar-se existir uma manifesta desproporção - por defeito, que não por excesso - entre a tributação/contraprestação emolumentar devida e paga em sede de processo de registo de DRHP, e o custo efectivo do correspondente serviço específico que exigia e que no âmbito do mesmo era e é prestado, a verdade é que, com as alterações introduzidas no artº 21º do RERN com o Decreto-Lei n.º 209/2012, de 19 de Setembro [ passou o respectivo item 2.15.- a dispor que “Ao emolumento previsto para o registo dos factos que determinem a constituição da propriedade horizontal, do direito real de habitação periódica, de empreendimentos turísticos e de operações de transformação fundiária, acresce € 25 por cada descrição subordinada, unidade, lote ou parcela, até ao limite previsto no n.º 1.2” ( que é de € 30 000 ) ] , tal visão/entendimento deixou de uma vez por todas de fazer sentido, e isto porque, manifestamente, passou o emolumento acrescido cobrado a ser perfeitamente adequado para fazer face ao custo de todo serviço efectivamente prestado, e nele se incluindo outrossim a emissão e entrega de cada certificado predial relativo a direito real de habitação periódica .
Na sequência do acabado de expor, e mais não se justifica adiantar, importa portanto reconhecer que assiste razão à apelante quando considera que o entendimento do Sr. Conservador do Registo Predial é infundado por não estar em conformidade com a lei , e , bem assim , que a sentença apelada, ao sufragar tal entendimento, incorre em última análise em error in judicando , razão porque , impondo-se a procedência da apelação, urge decidir pela sua revogação.
Em conclusão, procedendo in totum as conclusões da alegação da recorrente, deve a sentença recorrida ser revogada.
5- Sumário ( cfr. artº 713º, nº7, do CPC):
5.1. - Os emolumentos a suportar pelo utente na Conservatória de Registo Predial e devidos em razão de pedido efectuado e decorrente da obrigatoriedade do Registo de constituição de DRHP são os que se mostram expressamente previstos no art.º 21º, do RERN (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de 14 de Dezembro );
5.2. - O valor indicado em 5.1. cobre já o custo dos certificados de registo predial emitidos e entregues ao utente no âmbito do referido processo de registo , não devendo ao mesmo acrescer a taxa a que alude o nº 4, do Artº 2º, da Portaria n.º 622/2008, de 18 de Julho;
5.3.- É que, a taxa a que alude a Portaria n.º 622/2008, de 18 de Julho, apenas é devida quando visa remunerar uma emissão avulsa de certidão/ certificado de registo predial, porque requisitada fora de um determinado processo de registo.
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6. Decisão.
Em face de todo o supra exposto, acordam os Juízes na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, em , julgando procedente a apelação de G.., Lda :
6.1. - Revogar a sentença do tribunal a quo ;
6.2.- Ordenar que à apelante seja restituído o montante de 7.332,00€ cobrado pela Conservatória do Registo Predial com invocação – em sede de conta - do artº 2º da Portaria 622/2008 ,de 18 de Julho.
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Custas a cargo do Recorrido ( Conservador do Registo Predial ), porque de isenção de custas não beneficia em sede de processo de impugnação judicial das decisões registais (6) e tendo presente o disposto no artº 446º, nº1 e 2, do CPCivil.
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(1) Cfr. Preâmbulo do DL nº n.º 322-A/2001, de 14 de Dezembro.
(2) In “ Temas de Direito Notarial ”, I Doutrina – Jurisprudência - Prática , 1992, Coimbra , Almedina, pág. 306.
(3) Com referência à questão da aplicação no tempo das alterações introduzidas no RERN vide v.g. o Parecer aprovado pelo IRN em sessão do Conselho Técnico de 19 de Janeiro de 2011, e com referência ao Processo C.P. 89/2010 SJC-CT.
(4) Cfr. bem se nota no Parecer do IRN indicado na nota 3.
(5)Vide Francesco Ferrara, in Interpretação e Aplicação das Leis, tradução de Manuel de Andrade, 4ª ed., 1987, pp. 143 e segs.;
(6) Caso Modelo SGPS AS ( processo C-56/98 ) .
(7) Como o reconheceu já o próprio IRN, no âmbito do Parecer proferido a 25/6/2009 - homologado pelo Exmo. Senhor Presidente em 30.06.2009 - e no âmbito do Pº R.P. 242/2008 SJC-CT- .
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Guimarães, 21/05/ 2013
António Manuel Fernandes dos Santos ( O Relator)
António Manuel Figueiredo de Almeida ( 1º Adjunto)
Ana Cristina Oliveira Duarte ( 2º Adjunto)