Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | HELENA MELO | ||
Descritores: | ÓNUS DE IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO GRAVAÇÃO DA PROVA | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 09/10/2015 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | 1ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | Da interpretação conjugada dos diversos preceitos do DL 150/2014, entende-se ser de extrair que entre 26 de Agosto e 14 de Outubro os prazos previstos para a prática de qualquer acto que devesse ser praticado no sistema Citius foram suspensos e a partir dessa data e enquanto não foi publicitada a lista a que se refere o nº 2 do artº 2º os actos deveriam ter sido praticados em suporte físico, caso não pudessem ser praticados electronicamente. A exigência da indicação exacta das passagens da gravação em que se funda o recorrente quando pretende impugnar a matéria de facto, tem por base a celeridade que o legislador do DL 303/2007 quis imprimir à fase do recurso, conforme resulta do preâmbulo do diploma, propósito que o legislador da Lei 41/2013 também manteve. Deste modo vai permitir ao tribunal da Relação, principalmente nos casos de depoimentos longos ou de muitos depoimentos, ouvir, fácil e rapidamente, as passagens da gravação em o recorrente se funda, de forma a, num primeiro momento, avaliar se tais passagens são, por si só, idóneas a delas se extrair conclusão diversa da extraída pelo tribunal a quo, sem prejuízo de, em caso afirmativo, depois ter que ir para lá desses trechos, pois só assim poderá formular um juízo seguro e definitivo. O recorrente que se limita a transcrever parte de um depoimento, sem o localizar, nem nas conclusões nem no corpo alegatório do seu recurso, não dá cumprimento ao exigido pela alínea a) do nº 2 do artº 640º do CPC, pelo que o recurso, quanto à impugnação da matéria de facto, deverá ser rejeitado. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório AA, Lda, instaurou procedimento de injunção contra BB, Lda., alegando, em suma, que prestou serviços à requerida, constantes das facturas indicadas no requerimento de injunção, no valor global de 20.210,00€ e que a requerida, até ao presente, nunca os pagou. A requerida opôs-se ao requerimento de injunção, sustentando, em síntese, que de facto outorgou em 15/06/2006 um contrato de empreitada com CC com vista à construção de uma moradia e que nesse contexto contactou a requerente para que esta realizasse os trabalhos de electricista e pichelaria, tendo as partes acordado em conformidade. Todavia, alegou ainda a requerida, existem ainda trabalhos combinados com a requerente que, apesar de já pagos, não foram realizados, pelo que entendia nada dever à requerente. Em virtude da oposição da requerida, seguiram os autos os termos do disposto no artigo 3.º do Decreto-Lei nº 268/98, de 1 de Setembro. Foi realizada audiência de discussão e julgamento e a final foi proferida sentença que julgou totalmente procedente, por provada a acção e, em consequência condenou a requerida BB, Lda. a pagar à requerente AA, Lda. a quantia de 20.210,00€ (vinte mil, duzentos e dez euros) acrescida dos juros legais peticionados. A requerida não se conformou e interpôs o presente recurso, onde formulou as seguintes conclusões: 1 . º O presente recurso vem interposto da decisão proferida pelo tribunal a quo que decidiu pela condenação no pagamento da quantia de € 20.210,00 , acrescida dos juros legais. I – Impugnação da matéria de facto 2 . º Considerou o tribunal a quo que os seguintes factos não foram provados: 4 .º, 5 .º , 6 .º, 7.º , 8 .º , 9 .º, 10 .º e 11 .º . 3 . º A Recorrente não concorda com tal entendimento do tribunal a quo. 4 . º Resulta do depoimento da testemunha XX – gravado em CD com recurso ao programa informático Habilus Média Studio, com a identificação 20140630142512 - que a Recorrida recebeu da Recorrente pagamentos por conta de bens e serviços que não efectuou nem terminou. 5 . º A testemunha XX depôs de uma forma isenta. Na verdade, o seu depoimento foi bastante minucioso e objectivo relativamente aos factos. 6 . º Por tudo , devem ser considerados como provados os f a c t o s 4 .º , 5 .º , 6 .º , 7 .º, 8 .º , 9 .º , 10 .º e 11 .º . 7 . º Considerou o tribunal a quo como provados os factos 2.º e 3.º. 8 . º Tais factos não devem ser considerados como provados devido ao alegado anteriormente que se dá aqui integralmente reproduzido. 9 . º Além disso, a testemunha YY não deve merecer a credibilidade atribuída devido ao facto de ser trabalhadora da Autora, e ainda, pelo facto de desempenhar as funções de canalizador e picheleiro e, mesmo assim, ter conhecimento de todas as negociações e preços acordados entre a Autora e a Ré. 10 . º Por tudo devem os factos 2.º e 3.º serem considerados como não provados . 1 1 . º Alterada a factualidade, não restam dúvidas dos requisitos da excepção de não cumprimento. 1 2 . º Foram violados os artigos 428º e 342º do CC. A recorrida contra-alegou, invocando a extemporaneidade do recurso e pugnando pela manutenção da decisão recorrida. II – Objecto do recurso Considerando que: . o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos recorrentes, estando vedado a este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso; e, . os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu acto, em princípio delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, as questões a decidir são as seguintes: . se o recurso é extemporâneo; e, se a matéria de facto deve ser alterada. III – Fundamentação Na 1ª instância foram considerados provados e não provados os seguintes factos: Factos provados: Da tempestividade do recurso Invoca a apelada que o recurso interposto pela apelante é extemporâneo pois que há muito que se mostra excedido o prazo de 30 dias de que gozava e que expirou em 16 de Outubro de 2014, sendo que o recurso apenas foi interposto em 10 de Novembro de 2014. No presente caso, tendo a recorrente pretendido impugnar a matéria de facto o prazo de que dispõe é o prazo de 40 dias e não o de 30 dias (artº638º nº 1 e 7 do CPC). A questão que se coloca é se o prazo para recorrer se suspendeu, por força do disposto no artº 5º do DL 150/2014. O nº 1 do artº 3º considera ocorrer justo impedimento para a prática de actos processuais por via electrónica no sistema CITIUS, independentemente de requerimento, alegação ou prova. O nº 2 do artº3º só considera justo impedimento para a prática do acto em suporte físico, os casos em que a impossibilidade de acesso ao processo ou parte dele, quer em suporte electrónico quer em suporte físico seja confirmada pela secretaria do tribunal. No nº 1 do artº 4º determina-se que, enquanto não for publicitada a declaração do Conselho Directivo do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, IP, (IGFEJ, IP), no qual se ateste a completa operacionalidade do sistema informático, os actos devem ser praticados em suporte físico, caso não possam ser praticados electronicamente (nº 1 do artº 4º). O referido diploma estabelece ainda que os prazos previstos para a prática de qualquer acto previsto no nº 1 do artigo anterior pelos sujeitos e intervenientes processuais, magistrados e secretarias judiciais ou do Ministério Público que se tenham iniciado após o dia 26 de Agosto de 2014 inclusive ou, tendo-se iniciado anteriormente, terminem após essa data, se consideram suspensos a partir de 26 de Agosto de 2014, retomando-se a sua contagem a partir da entrada em vigor do diploma, ou seja a partir de 14 de Outubro de 2014 (artº 5º nº 1 e 6º nº1). Da interpretação conjugada dos diversos preceitos do DL 150/2014, entende-se ser de extrair as seguintes conclusões: . Entre 26 de Agosto e 14 de Outubro os prazos previstos para a prática de qualquer acto que deva ser praticado no sistema Citius foram suspensos; . a partir dessa data e enquanto não foi publicitada a lista a que se refere o nº 2 do artº 2º os actos deveriam ter sido praticados em suporte físico, caso não pudessem ser praticados electrónicamente; .para que não fossem praticados em suporte físico, a secretaria do tribunal judicial teria que confirmar a impossibilidade de acesso ao processo ou a parte dele, quer em suporte electrónico, quer em suporte físico; . publicitada a declaração a que se refere o nº 2 do artº 2º, os actos ainda poderiam ser praticados em suporte físico até cinco dias úteis contados após a data da publicitação. . não pode ser atribuído qualquer efeito processual ou relativo ao regime de custas por falta da prática do acto por via electrónica, quando o acto foi processado em suporte físico nos termos descritos; .os actos que foram praticados após 26 de Agosto e até 14 de Outubro não ficam prejudicados, não sendo necessária a sua repetição. No acórdão do TRC de 24.02.2015, proferido no proc. 185/11, defendeu-se que a suspensão a que alude o artº 5º nº1 apenas se reporta aos casos em que existe total impossibilidade de praticar o acto, e por todos os meios legalmente admissíveis, ou seja, quer electronicamente, quer em suporte físico ou telecópia, o que tem que ser atestado neste último caso pela secretaria do tribunal. Se existir apenas impossibilidade electrónica, mas existir a possibilidade de o praticar fisicamente, a parte é obrigada a praticá-lo por esta via, não podendo beneficiar da suspensão, e arcando com as inerentes consequências se omitir tal prática. Não obstante todo o respeito que nos merece o acórdão referido, não concordamos com o entendimento nele vertido. É que, a nosso ver, não se pode considerar, que um diploma publicado a 13 de Outubro obrigue à prática de actos em suporte físico num período anterior, pelo que se entende que esta obrigatoriedade de praticar o acto em suporte físico, quando não seja possível por via electrónica, apenas vale para os actos praticados a partir de 14 de Outubro e nas circunstâncias descritas em 4º nº 1 No sentido defendido, ver a propósito o blog do Instituto do Português do Processo Civil em http://blogippc.blogspot.pt/2014/10/dificuldades-de-acesso-ao-sistema.html.. Assim: A apelante foi notificada da sentença em 12 de Setembro de 2014. O prazo para a apelante recorrer suspendeu-se até 14 de Outubro de 2014 e a apelante ao vir praticar o acto em 10 de Novembro de 2014, praticou-o dentro do prazo, pois que não tinham ainda decorridos os quarenta dias de que dispunha para interpor recurso, a partir da data em que cessou a suspensão do prazo. A apelante não estava obrigada a praticar o acto até 16 de Outubro de 2014, como defende a apelada. Pelas razões expostas, julga-se improcedente a invocada extemporaneidade do recurso. Da impugnação da matéria de facto Nos termos do artº 662º nº 1 do CPC a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos por assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. E bem se entende que assim seja. Há casos em que os depoimentos podem durar várias horas e vários dias e a testemunha responde a toda a matéria, quantas vezes extensa, e apenas se pretende a alteração de um ou alguns pontos precisos da matéria de facto, pelo que, há que circunscrever o depoimento à precisa parte que se entende permitir uma alteração da resposta do Tribunal, sem prejuízo do Tribunal, se assim o entender, ouvir os depoimentos invocados na sua totalidade e ainda os que entender por convenientes. À parte contrária, por sua vez, caberá indicar com precisão os excertos dos depoimentos que infirmam os depoimentos ou segmentos de depoimentos em que se funda o recorrente (alínea b) do nº 2 do artº 640º do CPC). Esta exigência legal tem por base, nomeadamente, a celeridade que o legislador do DL 303/2007 quis imprimir à fase do recurso, conforme resulta do preâmbulo do diploma, propósito que o legislador da Lei 41/2013 também manteve. A exigência da indicação com exactidão das passagens vai permitir ao Tribunal da Relação, principalmente nos casos de depoimentos longos ou de muitos depoimentos ouvir, fácil e rapidamente, as passagens da gravação em que o recorrente se fundamenta, de forma a, num primeiro momento, avaliar se tais passagens são, por si só, idóneas a delas se extrair conclusão diversa da extraída pelo tribunal a quo, sem prejuízo de, em caso afirmativo, depois ter que ir para lá desses trechos, pois só assim poderá formular um juízo seguro e definitivo. “E tem-se igualmente em vista que o recorrente, para suscitar esta questão, oiça, novamente, o que efectivamente se disse, de forma a confirmar ou infirmar a ideia com que ficou, aquando do julgamento, quanto ao que então foi dito, visto que, em princípio, não conseguirá indicar "com exactidão as passagens" em causa sem ouvir a respectiva gravação. Ao obrigar o recorrente a, neste aspecto, melhor fundamentar o seu recurso, pretende-se evitar o uso abusivo e injustificado da faculdade de impugnar a decisão relativa à matéria de facto” Cfr. se defende no Ac. do TRG de 10.11.2014, proferido no proc.1258/11, já citado.. A lei não prevê o convite ao aperfeiçoamento, nos casos do não cumprimento dos ónus ou de alguns dos ónus do artº 640º do CPC. Cfr. se defende no Ac. do STJ de 09.02.2012, proferido no proc. nº proc. 1858/06. |