Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
443/11.4TTBGC.G1
Relator: SÉRGIO ALMEIDA
Descritores: CTT
ACORDO DE EMPRESA
COMISSÃO DE SERVIÇO
SUBSÍDIO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 10/22/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO SOCIAL
Sumário: I. Nos CTT, face aos termos do Acordo de Empresa aplicável in casu, os cargos de direcção e chefia são exercidos em comissão de serviço, a qual supõe acordo entre empregador e trabalhador, não fazendo a chefia parte dos grupos profissionais.
II. Finda a comissão de serviço, ainda que por iniciativa do empregador, nos termos do AE, não é este obrigado a pagar-lhe os correspondentes subsídio de chefia e plafond de telefone, já que se prendem com o efetivo exercício das funções correspondentes à comissão de serviço.
III. Não é devida compensação pela deslocação em transporte próprio de um trabalhador que recusou o meio de transporte posto à disposição pelo empregador.
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Guimarães
RELATÓRIO
Autora (adiante, por comodidade, designado abreviadamente por A.): M...
Ré (adiante designada por R.) e recorrente: C.., S. A.
A A. alegou que
- foi admitida ao serviço da R. em 1982 para exercer funções de CE na estação de correios de..;
- é filiada no SINQUADROS;
- de 1988 a 1991 chefiou as estações de correios de.. e C.. e, após concurso, foi nomeada chefe da estação de.. de nível 2, em regime de comissão de serviço, cargo que exerceu durante mais de 20 anos;
- em 9/5/2006 a R. exonerou-a do cargo de gestor da LJ .., nível 3, cessando o direito ao subsídio de chefia no valor mensal de €148,40 e a telemóvel com plafond mensal de €20,00, com efeitos a 20/04/2009, no entanto, a A. continuou a exercer as mesmas funções de chefia que exercia até então, em regime de interinidade, às quais se acrescentou a responsabilidade de gerir o CAD (centro de atendimento e distribuição), tendo a R. passado a atribuir à A. um subsídio de interinidade de valor variável, o qual pagou em Maio de 2010, com efeitos retroactivos a Maio de 2009;
- em 12/4/2010 foi comunicado verbalmente à A. a exoneração do cargo e para passar a estação à TCN que anteriormente chefiava a estação de..;
- após um período de baixa médica a A. foi trabalhar no dia 31/5/2010 para a loja de .., como TPG, mediante ordem nesse sentido, tendo sido transportada em viatura da empresa;
- após período de férias iniciado em 1/6/2010, a A., mediante ordem verbal, em foi em 21/06/2010 para a loja de.., na qual ainda trabalha, apesar de estar adstrita à loja de..;
- a A. reclamou da ordem de deslocação, verbalmente e por escrito e requereu que a R. informasse qual a modalidade e tempo pelo qual era efectuada a mudança de local de trabalho e informou não aceitar ser transferida;
- na loja de.. trabalhava uma colega da A. de nome O.., com a mesma categoria profissional e com menos tempo de serviço, tanto na loja como nos CTT;
- a A. cumpriu a ordem de transferência do local de trabalho, na condição de regressar à loja de .. logo que ocorresse a licença de maternidade da colega O.. e passou a pernoitar em.., apenas regressando a.., local de residência, à sexta-feira e feriados;
- a R. tem ordenado à A., de forma cirúrgica e sem necessidade e justificação, para, esporadicamente, trabalhar na Loja de.., ocasiões em que transporta a A. em viatura da empresa e com motorista;
- a trabalhadora O.. entrou em licença de maternidade em 29/6/2010 e, depois, em gozo de férias e nesse período, a R. deslocou alternadamente para a loja de.. dois trabalhadores afectos à loja de .., mas não a A.;
- é do conhecimento da R. que as condições de saúde da A. desaconselham viagens de condução prolongada;
- a A. passou a reclamar junto da R. o pagamento das despesas de deslocação e a apresentar o modelo próprio para efeitos de abonos quilométricos, assim como ajudas de custo, bem como o subsídio de chefia e de telefone, despesas e subsídios que a R. recusa pagar;
- a A. deslocava-se em viatura própria, entre .. e .., aos fins de semana e feriados, percorrendo cerca de 50 Km para cada lado, não tendo a R. permitido que a A. efectuasse a deslocação dentro do seu horário de trabalho.
Com estes fundamentos pediu que seja:
A) Condenada a Ré a reconhecer que à Autora assiste o direito de auferir a retribuição base de € 1.293,20, acrescido do subsídio de chefia nível 2, no valor de €148,40, bem como subsídio de telefone, e condenada a pagar essas retribuições em dívida e as vincendas, que importa, actualmente, no valor de €4.758,40;
B) Condenada a Ré a reconhecer que assiste à A. o direito de auferir ajudas de custo pela sua deslocação na loja de .. no montante diário de €43,39 e condenada a pagar as prestações em dívida desde a data em que se encontra deslocada nessa loja e as vincendas, o que perfaz, actualmente, o montante de €9.285,46;
C) Condenada a reconhecer que à A. assiste o direito de ser paga a título de abonos quilométricos devidos pela sua deslocação em viatura própria do seu local de residência para o local onde foi deslocada, valor esse que importa no valor €3.708,00 até Setembro de 2011, devendo ser condenada a pagar esse montante em dívida e os montantes vincendos;
D) Ser reconhecido que assiste à A. o direito de ser paga como tempo de trabalho normal, o tempo gasto com a deslocação desde o seu local de residência – .. - até ao local de trabalho onde se encontra deslocada – .. – e condenada a Ré a pagar esse tempo de trabalho que importa, actualmente, no valor de €1.376,42, bem como os valores vincendos;
E) A não se entender ser devido o pagamento do subsídio de chefia que a A. auferia na data da exoneração, ser reconhecido que, os termos em que a A. desempenhou as funções de chefia após a sua exoneração, não configura um contrato válido comissão de serviço em regime de interinidade, pelo que é nulo;
F) Consequentemente, ser condenada a Ré a pagar à A. a retribuição que auferia há data da exoneração, com o respetivo subsídio de chefia de interinidade, que deveria ser o correspondente ao nível 2, no montante de €148,40, por não lhe ser lícito reduzir a retribuição, bem como os valores peticionados sob as al. A), B), C) e D)
G) A não se entender ser devido o pagamento das ajudas de custo, abonos quilométricos e tempo de trabalho gasto na deslocação, ser a Ré condenada a colocar a A. na loja de .., loja essa à qual está adstrita.
A ré contestou alegando que a deslocação da A. obedeceu ao regime definido no AE/CTT; que os cargos de direcção e chefia são exercidos em comissão de serviço, dadas as especiais exigências de confiança que supõem e a nomeação é da responsabilidade exclusiva da empresa e, finda esta, o trabalhador regressa às funções correspondentes à sua categoria profissional, que, no caso da A. era de TPG/TNA, pelo que, cessando o cargo, continuou a auferir a remuneração que vinha auferindo (vencimento base e diuturnidades), com excepção do subsídio de chefia e o plafond do telemóvel, que são complementos remuneratórios precários e apenas são devidos enquanto persistir a situação que lhes serve de fundamento; que o exercício de funções de chefia em regime de interinidade não obriga à observância dos requisitos formais para a constituição da comissão de serviço; que aquando da ordem de deslocação da A. para a loja de.. foi-lhe comunicado que a deslocação deveria ser efectuada dentro da hora de serviço em viatura da empresa ou transportes públicos e, por isso, não tem direito às ajudas de custo, nem ao abono quilométrico que reclama.
A A. respondeu, mantendo o alegado na petição inicial e acrescentando que a utilização de transportes públicos implicaria passar todo o tempo de trabalho na viagem, uma vez que não existem transportes públicos compatíveis com o horário de trabalho, impossibilitando-a, na prática, de prestar o seu trabalho, em violação do seu direito à ocupação efectiva.
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Saneados os autos, após o julgamento, o Tribunal julgou a acção parcialmente procedente, e:
1) Condenou a R. C.., S.A. a reconhecer que assiste à A. M.. o direito de auferir ajudas de custo pela sua deslocação na loja de.. no montante diário de €10,85 (dez euros e oitenta e cinco cêntimos), bem como a pagar à autora as prestações devidas a tal título desde a data em que se encontra deslocada nessa loja, vencidas e vincendas, perfazendo as vencidas até à data da propositura da acção o montante de €3.352,65 (três mil trezentos e cinquenta e dois euros e sessenta e cinco cêntimos).
2) Absolveu a R. C.., S.A. dos demais pedidos.
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Inconformada, a A. recorreu, concluindo:
1.º A matéria de facto dada como provada e não provada, carece de reapreciação, na medida em que deu como provado os pontos 44, 51, 52 quando tal matéria, salvo o devido respeito, deveria ter sido dada como não provada. Ao contrário, deveria ter sido dado como provado que “a Ré não permitiu que a A . efectuasse a deslocação de casa para o trabalho no horário de trabalho", bem como deveria ter-se dado como provado que os problemas de saúde da A. são impeditivos da condução de viaturas automóveis na distância que separa .. de ...
2º Relativamente ao ponto 51, deu-se como provado ter-se realizado uma reunião em .. na presença da A ., do Sr . N.., P.., e G.. a pedido desta.
3º Pois bem, foi a própria G.. quem referiu que tal reunião não foi bem uma reunião, mas uma conversa que aconteceu numa das deslocações à loja do Sr. N.., em ponto algum referiu que tal reunião ocorreu a seu pedido.
4.º Relativamente a uma alegada conversa ou reunião que terá ocorrido em.., no gabinete dessa loja entre a A. e o Sr. N.. na qual terá sido comunicado à A . as condições da sua deslocação para .., a mesma também não pode ter acontecido, pois a A . nos dias que antecederam a sua deslocação para.., esteve de baixa médica, depois em gozo de férias, e o primeiro dia de trabalho após a baixa médica e o gozo de férias, foi em .., como tal a A. não se encontrava em ...
5.º E a verdade é que apesar da testemunha N.. ter confirmado esta reunião no gabinete de .., quando confrontado com estas circunstâncias, baixa médica, férias e primeiro dia de trabalho após baixa médica e férias ter sido .., deixou de ter certezas do que dizia, refugiando-se na falta de registos, falta de acesso a informações, apenas reiterando uma alegada reunião uns meses após em...
6.º Com efeito, não se compreende como poderia ter havido essa reunião em.. quando a A. esteve por um lado de baixa médica, a seguir em gozo de férias, e quando estava em gozo de férias recebeu um telefonema do Sr. N.. para que no seu primeiro dia de trabalho se apresentar em ...
7.º O que a A . fez e quando se encontrava em .. recebeu outro telefonema do Sr . N.. para se apresentar no dia seguinte em ...
8.º Foi o próprio Sr. N.. que referiu que quando deu ordens à A . para se deslocar para .., “já estava em cima da mesa a ideia de ir para ..”
9º Assim sendo, se no dia anterior a deslocar-se para .., a A. foi trabalhar para.. e nessa altura ainda não sabia que no dia seguinte iria trabalhar para .., como é possível ter ocorrido essa reunião em .. entre A. e o Sr. N..?
10.º Logicamente que não seria possível ter ocorrido essa reunião, e como tal não foram dadas ordens nessa data à A . para se deslocar em transportes públicos ou viatura da Ré e dentro do horário de trabalho.
11.º De qualquer modo, a dar-se como provado o ponto 44 da matéria de facto, isto é, que “Aquando da deslocação da A. para .. foi combinado entre esta e o responsável de zona N.. que a A. regressaria à Loja de .. logo que ocorresse a licença de maternidade da colega O..”, a verdade é que, com o gozo de licença de maternidade da colega O.., a Ré chamou outros colegas a substituir a O.. que não a Autora, mantendo-a deslocada em ...
12.º Não cumpriu, por isso, o acordo que firmou com a A. de lhe pagar 20km por dia e de a recolocar na loja de .., quando a colega O.. entrasse em gozo de licença de maternidade.
13.º Aquando da deslocação da A . para .., o chefe da Loja, Sr. T.., não deu à A. um horário de trabalho reduzido, isto é, um horário de trabalho que lhe permitisse deslocar-se de .. para .. dentro do horário de trabalho, antes pelo contrário, por não ter instruções noutro sentido, fixou-lhe um horário de trabalho de 7.49h por dia.
14º E esse horário de trabalho que lhe foi fixado pelo responsável da loja no primeiro dia de trabalho em .., não chegou a ser alterado.
15º Aliás, a A. registava o horário de trabalho por meios electrónicos do conhecimento da Ré, e nem assim a alertou ou lhe deu ordens para cumprir outro horário de trabalho diferente daquele que o Sr. T.. lhe fixou.
16.º Aquando da deslocação da A . de .. para .. quem chefiava a loja de .. era o Sr. T.., pelo que as condições de deslocação da A . deveriam ter sido comunicadas a este, e não à G.., ou se foram comunicadas à G.., embora em gozo de férias, esta deveria tê-las comunicado a quem a estava a substituir na chefia da loja.
17.º Daí não merecerem credibilidade as declarações prestadas pela Srª G.. no que concerne às condições da deslocação da A. para .., pois a mesma encontrava-se de férias e quando regressou à chefia da loja também não alterou as condições de trabalho da A., nomeadamente, não lhe alterou o horário de trabalho que lhe havia sido fixado.
18.º A A. é filiada no SINQUADROS – Sindicato Democrático dos Trabalhadores das Telecomunicações e Correios, sendo aplicável à relação laboral estabelecida entre as partes o Acordo de Empresa publicado no BTE, 1ª Série, nº 29, de 8 de Agosto de 2004 com as alterações de 9 de Junho de 2006 e o AE de 14 de Março de 2008, publicado no BTE nº 14 de 15/04/2008 e no BTE nº 1 de 8 de Janeiro de 2010.
19.º Nos termos da cláusula 35 “o trabalhador que tenha iniciado funções em comissão de serviço antes da entrada em vigor do presente AE e desde que a mesma tenha durado pelo menos seis meses, mantêm a remuneração que vinha auferindo até ao momento em que, por via de actualização salarial ou de progressão salarial garantida lhe couber remuneração e diuturnidades que somem quantitativos superiores, no caso de cessação de comissão de serviço cessar por iniciativa da empresa”
20.º A comissão de serviço perdurou por mais de 20 anos e cessou por iniciativa da Ré.
21.º Relativamente às ajudas de custo, relacionadas com o facto de a Ré ter ordenado à A. para passar a trabalhar noutra loja, que não aquela à qual está afeta, temos que ter em conta que só é possível a deslocação em serviço, quando, por um lado a decisão de deslocar seja fundamentada e decorra de uma necessidade transitória da Ré, não ultrapasse os 90 dias seguidos, e seja abonado ao trabalhador ajudas de custo, ajudas de custo essas que se apuram em função da retribuição, sendo que relativamente à A ., importam no valor diário de €43,39. – Cfr. Cláusulas 41ª, 43ª, nº 4, 44ª, nº 2 do AE.
22.º A Autora efectuou as deslocações para o trabalho fora do horário de trabalho que lhe havia sido fixado e imposto, isto apesar de se encontrar deslocada do seu local habitual de trabalho.
23.º Nos termos do disposto na clª 45ª, nº 1 al.c) o tempo de deslocação deve ser pago como tempo normal de trabalho
24.º Assim, salvo o devido respeito, a douta sentença proferida, violou, além do mais, as cláusulas supra referidas, do acordo de empresa celebrado entre o Sinquadros – Sindicato Democrático dos Trabalhadores das Telecomunicações e Correios, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego (BTE) , 1ª série, nº 29, de 8 de Agosto de 2004 com as alterações de 9 de Junho de 2006 e o Ae de 14 de Março de 2008, publicado no BTE nº 14 de 15/0472008 e no BTE nº 1 de 8 de Janeiro de 2010, nomeadamente as cláusulas 34ª, 31ª, 41ª, nº 2, 43ª, nº 4, 44ª, nº 2, 45ª, nº1, al. c). e o artigo 615.º nº 1, al. d) do CPC.
Impetrou enfim a revogação da sentença recorrida na parte em que não julgou procedente, conduzindo assim à procedência da acção.
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A R. C.. contra-alegou, pedindo a improcedência do recurso e concluindo:
I. O Recorrente refere de forma muito deficiente, quer no corpo da alegação de recurso quer nas conclusões, as razões e a importância, para o caso em apreço, da segunda apreciação da matéria de facto, por este Venerando Tribunal, não cumprindo o ónus de alegar, o que se traduz na indicação dos motivos da impugnação da decisão.
II. Os depoimentos que servem de base à impugnação da matéria de facto, são desprovidos de fundamentação idónea, inócuos para a boa decisão da causa.
III. O que só confirma que com a interposição deste recurso se pretende protelar o desfecho da acção, adiando uma decisão perfeitamente justa.
IV. No que respeita à manutenção do estatuto remuneratório, e atendendo ao disposto na Cl. 33.º do AE, após a cessação da comissão de serviço, a Recorrente mantém a remuneração, mas perde o direito aos subsídios que vinha auferindo atribuídos em função do trabalho e condições de execução do mesmo, nomeadamente o plafond de telemóvel.
V. A “remuneração” referida na Cláusula 33.º do AE não engloba todas as prestações complementares associadas ao exercício do cargo.
VI. É este o espírito do AE/CTT: o trabalhador, após ter permanecido algum tempo num cargo de direcção ou chefia adquire o direito à sua remuneração base e mantém-na até a atingir por força da progressão. É, no fundo, uma compensação por ter desempenhado funções melhor remuneradas do que as que correspondem à sua categoria profissional.
VII. Pelo que é lícito o não pagamento daquele subsídio na sequência de válida determinação da cessação do regime de comissão de serviço.
VIII. Razão pela qual deve a douta sentença de 1.ª Instância manter-se por ter procedido à correcta aplicação do Direito ao caso em concreto.
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O MºPº teve vista.
Colhidos os vistos legais cumpre decidir.
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FUNDAMENTAÇÃO
A questão a apreciar no recurso – considerando que o seu objecto é definido pelas conclusões da recorrente, sem prejuízo de questões de conhecimento oficioso (e exceptuando aquelas cuja decisão fique prejudicada pela decisão dada a outras, art.º 635/4, 608/2 e 663, todos do Código de Processo Civil) – consiste em saber há lugar à reapreciação da matéria de facto pretendida pela A. e em caso afirmativo se são devidas as verbas referidas pela A..
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b) da matéria de facto
A matéria de facto pode ser alterada pelo Tribunal da Relação nas situações contempladas no n.º 1 do art.º 662º do CPC: se os factos tidos por assentes ou a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
No nosso ordenamento jurídico vigora o princípio da liberdade de julgamento ou da prova livre (art.º 607.º, n.º 5, do CPC), segundo o qual “O juiz (…) aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto (…)”[1]. Ou seja, ao juiz cabe apreciar livremente as provas, sem constrangimentos nomeadamente quanto à natureza das provas, decidindo de harmonia com a convicção que tenha firmado acerca de cada facto controvertido.
O controlo da matéria de facto, nomeadamente com base na documentação (mormente na gravação), dos depoimentos prestados em audiência, está vinculado à observância dos princípios fundamentais do processo civil, entre os quais, além do próprio principio da livre apreciação das provas[2], o da imediação [3].
É na 1ª instância que, por natureza, se concretizam os aludidos princípios [4], estando, pois, em melhores condições de apreciar os depoimentos prestados em audiência, atento o imediatismo, impossível de obter na análise da matéria de facto na Relação, por ser quem conduz a audiência de julgamento e quem interage com a produção da prova e capta pormenores, reacções, hesitações, expressões e gestos, enfim os símbolos impossíveis de detectar em simples gravações [5].
O artigo 640 CPC estabelece os ónus que impendem sobre quem recorre da decisão de facto, sob pena de rejeição do recurso (art.º 640/1 e 2/a):
- especificar os concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados (nº 1, alínea a);
- especificar quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da recorrida (nº 1, alínea b);
- a decisão que, no seu entender, deve ser tomada sobre as questões de facto impugnadas (n.º 1, al. c).
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A A. insurge-se contra as respostas positivas contidas nos n.º 51, 52 e 44.
44- Aquando da deslocação da A. para .. foi combinado entre esta e o responsável de zona N.. que a A. regressaria à Loja de .. logo que ocorresse a licença de maternidade da colega O...
51- Aquando da deslocação da Autora para a Loja de .. a Ré, por intermédio do responsável N.. deu instruções à A. para se deslocar em viatura de serviço ou transportes públicos e dentro do horário de serviço, tendo reiterado tais instruções numa reunião, onde estavam presentes o responsável N.., P.., que, à data era assistente deste e a gestora de Loja de .. G.., convocada a pedido desta e na sequência de reclamações da A. sobre a sua situação.
52- A A., porém, não concordou com tais condições e não quis deslocar-se em viatura disponibilizada pela R.
Começa por referir nas alegações (a fls. 324 dos autos, 7 da peça processual), 1º parágrafo (§) que "tal matéria, salvo o devido respeito, deveria ser dada como não provada". Quanto ao 51 reforça o entendimento de não provado a fls. 10 vº.. E pede duas respostas diferente (cfr. também 1ª conclusão):
“a Ré não permitiu que a A. efectuasse a deslocação de casa para o trabalho no horário de trabalho"
"os problemas de saúde da A. são impeditivos da condução de viaturas automóveis na distância que separa .. de ..".
Contudo, é fácil ver que, podendo as respostas ser positivas, negativas, restritivas ou explicativas, estas nada têm a ver com aquelas.
Pior ainda, verifica-se que a primeira corresponde a matéria articulada dada por não provada (79 e 80 pi) e a segunda a matéria que a A. nem sequer alegou (alegou sim que era desaconselhável medicamente fazer longas viagens de automóvel - art.º 41 pi).
Estas respostas pretendidas não podem ser dadas, não se vendo sequer impugnação válida (a 2ª nem sequer se alcança, visto não estarem alegados os respetivos factos).
Temos as respostas positivas por validamente impugnadas.
Resta conhecer o seu mérito.
Relativamente à matéria dos n.º 44 e 51 o que releva especialmente é saber se o responsável N.. deu as instruções e acordou com a A. o referido aí.
O Tribunal a quo considerou especialmente relevante o depoimento do N.. (o qual a 4:30 e ss. deixou claro que até tem um processo judicial pendente contra a R., por não concordar com o exercício do poder disciplinar do empregador, o que não permite qualquer suspeição de parcialidade a favor desta), acrescido dos de P.. e G...
Ponderada a prova, entendemos que a convicção do Tribunal recorrido está estribada na prova produzida, destacando-se N.., que afirmou o referido em 44 (e que tinha problemas de coluna, mas não se manifestou impedida de se deslocar), 52 (a A. manifestou desagrado por ter sido escolhida em lugar de outra pessoa, justificando-se a testemunha com o facto de a outra estar grávida), 51 (a A. deslocava-se durante o tempo de serviço; o depoente esteve reunido com a A. várias vezes; por outro lado afirma que houve uma reunião entre ele, a G.. e a A. quando esta já estava em.., o que coincide com o "timing" da 2ª parte da matéria do 51, 34:00 e ss. da gravação).
Assim sendo, a recorrente pretende uma nova convicção e não a mera censura da convicção do Tribunal a quo.
Não se ignora que se defende que o recurso da matéria de facto pode ir além da simples censura; contudo não se vê motivo sério que imponha decisão de facto diferente.
Mantém-se, por isso, a decisão de facto.
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São estes os factos provados:
1- A Ré é uma sociedade anónima e tem como objecto a distribuição de correio em Portugal.
2- A Autora é sindicalizada no Sinquadros.
3- A Autora foi admitida ao serviço da Ré em Fevereiro de 1982, para sob a sua orientação, direcção e fiscalização exercer as funções CE na estação de correios de ...
4- De 1988 a 1991 chefiou as estações de correios de .. e .., a tempo.
5- Em 1991 foi aberto concurso para chefiar a estação de...
6- A Autora concorreu e foi nomeada chefe da estação de .. de nível 2, em regime de comissão de serviço.
7- Durante mais de 20 anos exerceu as funções de chefe da estação nível 2.
8- Em 06/05/2009, mediante entrega em mão de cópia do Despacho 01482009C00, datado de 17/04/2009 A R. comunicou à A. que:
“Por proposta dos respectivos Directores, exonero a TCN M.. (685534) do cargo de Gestor da LJ .., nível 3, que vinha exercendo em comissão de serviço;
Cessa o direito ao “Subsídio de Chefia” (3B), no valor de 148,40 €, tal como telemóvel com o plafond mensal de €20,00”.
9- Dessa comunicação consta que tal despacho entra em vigor em 20-04-2009.
10- Desde que chefiou a referida estação a A. exerceu as seguintes funções:
• Coordenar e controlar toda a actividade da estação do Correio, designadamente nas áreas de atendimento, exactoria tendo em conta os objectivos Comerciais.
• Promover e assegurar o cumprimento dos padrões de qualidade definidos para os serviços postais e produtos comercializados pela EC.
• Assegurar a organização do trabalho e a gestão dos Recursos Humanos e materiais de modo a cumprir os padrões de produtividade e objectivos definidos para a EC.
• Identificar potenciais Clientes e oportunidades de negócio com o objectivo de aumentar as vendas e o tráfego da EC.
• Assegurar o atendimento personalizado de Clientes da EC informando e promovendo os produtos e serviços dos Correios.
• Assegurar a contabilização, controlo e movimentação de fundos da EC.
• Apoiar e motivar a equipa de Atendedores criando espírito de equipa e clima favorável à execução dos objectivos.
• Assegurar o bom estado de conservação das instalações.
11- A A., apesar de exonerada do cargo para o qual havia sido nomeada, continuou a exercer as mesmas funções de chefia que exercia até então.
12- Às quais se acrescentou a responsabilidade de gerir o CAD (centro de atendimento e distribuição).
13- Depois de exonerada, exerceu as funções de chefia da loja até 12 de Abril de 2010 em regime de interinidade.
14- Tendo a Ré passado a atribuir à A. um subsídio de interinidade de valor variável, embora só o tenha pago em Maio de 2010, com efeitos retroactivos a Maio de 2009, no valor total de €1.175,94.
15- Em 12 de Abril de 2010, foi comunicado à A., verbalmente, a exoneração do cargo e para passar a estação à TCN que anteriormente chefiava a estação de...
16- No dia 20 de Abril a A. entrou de baixa médica até 30/05/2010.
17- No dia 31 de Maio de 2010 a A. foi trabalhar para a loja .., como TPG, mediante ordem nesse sentido.
18- A Ré transportou a A. em viatura da empresa para .. e no regresso a...
19- No dia 1 de Junho de 2010 a A. entrou em gozo de férias até 18/06/2010.
20- No dia 21 de Junho de 2010, a A. foi trabalhar para a Loja de.., mediante ordem verbal nesse sentido.
21- Loja essa na qual ainda hoje trabalha.
22- A A. está adstrita e efectivada na Loja de ...
23- A Autora reclamou da ordem de deslocação do seu local de trabalho para.., quer verbalmente quer por escrito.
24- Na loja de .. trabalha a O.., com a mesma categoria profissional da A. e com menos tempo de serviço nos CTT e na própria loja de ...
25- A A. requereu à Ré que a informasse por escrito “qual a modalidade e tempo pela qual é efectuada a mudança do meu local de trabalho, desde 1991, localidade onde tenho residência”.
26- Mais informou que não aceitava ser transferida do local de trabalho.
27- A Ré respondeu à A. em 15/07/2010, nos termos constantes do documento que consta de fls. 30, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido.
28- A Ré tem ordenado à A. para, esporadicamente, trabalhar na Loja de...
29- Assim, após ter ido trabalhar para .., que se localiza a, pelo menos, 50 Km de .., a Ré ordenou à A. que fosse trabalhar para a Loja de .. e transportou-a de.. para .., em viatura da empresa e com motorista, nos dias 1 de Abril de 2011, no dia 16/6/11 e 19/09/11.
30- Com excepção do dia 19 da parte da manhã, a A. foi transportada em viatura da empresa de .., para ..e de .. para ...
31- No dia 19 de Setembro, por ter sido uma Segunda-Feira e .. ser o local de residência da A., não houve necessidade de a transportar de manhã, uma vez que pernoitou em.. nesse fim-de-semana.
32- Contudo, no final do dia, a A. foi transportada de .. para...
33- A trabalhadora O.., adstrita à Loja de.., entrou de licença de maternidade em 29/06/10 pelo período de 4 meses seguido do período de gozo de férias.
34- A A., afecta à Loja de.., não foi deslocada para essa Loja, nesse período de tempo.
35- A Ré sabe que a A. está afecta à Loja de.., que tem residência fixa em.., e que pretende trabalhar nessa Loja.
36- Em 19/04/2010 a A. entregou à R. declaração médica da qual consta que as condições de saúde da A. desaconselham viagens prolongadas e períodos longos de condução.
37- A A. passou a reclamar junto da Ré o pagamento das despesas de deslocação e a apresentar o modelo próprio para efeitos de abonos quilométricos, assim como ajudas de custo e tempo gasto na deslocação.
38- Bem como reclamou pela manutenção do subsídio de chefia e subsídio de telefone.
39- Despesas essas que a Ré se recusa a pagar bem como o respectivo subsídio de chefia.
40- O subsídio de telefone é no montante de €28,00.
41- O subsídio de chefia, em Março de 2009, era no montante de €148,40.
42- Desde 21/6/2010, data em que passou a trabalhar na loja de.., até à data propositura da acção – 4/11/2011 - a A . apenas não trabalhou em .., nos seguintes dias, para além daqueles em que foi deslocada para .. em 1/04/2011, 16/06/2011 e 19/09/2011:
29/07/10 motivo consulta médica;
16/08/10 a 31/08/2010 motivo férias;
21/10/10 consulta médica;
6/12/2010 motivo serviço ocupacional de saúde;
20/12/2010 motivo férias;
No ano de 2011:
07/03/2011 motivo férias;
28/07/2011 a 05/08/2011 motivo férias;
22/08/2011 a 26/08/2011 baixa médica;
02/09/2011 a 13/09/2011 motivo férias.
43- Em 3/02/2011 o Conselho de Administração da R. emitiu a ordem de serviço OS00062011CA, com efeitos reportados a 1/1/2011, relativa aos novos regimes remuneratórios a partir de 1/1/2011, cuja cópia se encontra junta aos autos a fls. 35 a 45 e cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido.
44- Aquando da deslocação da A. para .. foi combinado entre esta e o responsável de zona N.. que a A. regressaria à Loja de.. logo que ocorresse a licença de maternidade da colega O...
45- Na loja de .. trabalham, habitualmente, duas trabalhadoras, e ambas se encontravam ao serviço nos dias em que ocorreram as deslocações referidas supra no nº 29, com excepção do dia 19, em que apenas se encontrava uma trabalhadora.
46- Durante o período em que a trabalhadora O.. esteve de licença por maternidade a R. deslocou para a Loja de .., alternadamente, os trabalhadores A.. e M.., que são trabalhadores afectos à loja de ...
47- A A., nas deslocações entre.. e .. e vice-versa utiliza viatura própria, percorrendo cerca de 50 Km para cada lado, despendendo tempo não superior a uma hora em cada viagem e efectuando tais deslocações fora do seu horário normal de trabalho.
48- Após 12/04/2010, data em que as funções de chefia da loja de .. passarem a ser asseguradas pela trabalhadora V.., aquela loja ficava com um funcionário em excesso na parte relativa ao atendimento, que, por norma era constituído por dois trabalhadores.
49- Como a TCN O.. se encontrava grávida, o responsável da zona, N.., decidiu que a melhor solução era deslocar a Autora enquanto essa situação se mantivesse.
50- Finda a licença de maternidade a trabalhadora O.. gozou de dispensa de duas horas por dia para amamentação.
51- Aquando da deslocação da Autora para a Loja de .. a Ré, por intermédio do responsável N.. deu instruções à A. para se deslocar em viatura de serviço ou transportes públicos e dentro do horário de serviço, tendo reiterado tais instruções numa reunião, onde estavam presentes o responsável N.., P.., que, à data era assistente deste e a gestora de Loja de.. G.., convocada a pedido desta e na sequência de reclamações da A. sobre a sua situação.
52- A A., porém, não concordou com tais condições e não quis deslocar-se em viatura disponibilizada pela R.
53- A carreira de transporte público que efectua a ligação entre .. e .., de manhã, parte daquela localidade entre as 7h00 e 8h00 e a o regresso efectua-se cerca das 16h00.
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De Direito
A pretensão da A. soçobrou quanto a quatro verbas que intentava receber: o subsídio de chefia, o subsidio de telefone (quanto ao plafond em causa), o abono quilométrico por deslocação em viatura própria e o pagamento do tempo de viagem como se fosse tempo de trabalho normal.
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Do abono quilométrico e do pagamento do tempo de viagem como tempo de trabalho normal
Quanto a estes dois últimos, o Tribunal a quo decidiu lapidarmente considerando que:
“Quanto ao abono quilométrico para reembolso das despesas de transporte em viatura própria, não tem a A. direito ao seu pagamento. Com efeito, de acordo com o disposto na cláusula 45º nº 1 al. a) do AE, os trabalhadores deslocados em serviço têm direito ao transporte de ida e regresso entre o local habitual de trabalho, ou a residência, se mais perto, e o local de deslocação, ou ao pagamento da despesa respectiva. De acordo com a OS referida no nº 43 (ponto 6.3), as deslocações são feitas, em regra, em veículos de serviço e, não sendo possível, preferencialmente em transportes colectivos de serviço público. O uso de automóvel próprio do trabalhador assume carácter excepcional e está sujeito a autorização do Director do respectivo serviço. Ora, provou-se que a R. ordenou à A. que se deslocasse em viatura de serviço ou em transporte público, ordem essa que a A. não acatou, decidindo, antes, fazer as deslocações em viatura própria. Assim sendo, por não estar autorizada pela R. a utilização de automóvel próprio, não tem a A. direito ao abono de subsídio de transporte que reclama.
No que concerne ao pagamento do tempo de viagem como tempo de trabalho normal, também carece de fundamento a pretensão da A., pois, tal como se provou, foi-lhe ordenado pela R. que realizasse as deslocações dentro do tempo de trabalho, não tendo a A. logrado provar que a R. não lhe tivesse permitido a deslocação dentro do seu horário de trabalho. Não tem, pois, aplicação o disposto na cláusula 45ª nº 1 al. c) do AE, a qual pressupõe que o trabalhador deslocado está obrigado a cumprir o seu horário de trabalho no local para onde foi deslocado”.
Argumenta a recorrente que:
Quanto às ajudas de custo, relacionadas com o facto de a Ré ter ordenado à A. para passar a trabalhar noutra loja que não aquela à qual está afeta, temos que ter em conta que só é possível a deslocação em serviço quando, por um lado a decisão de deslocar seja fundamentada e decorra de uma necessidade transitória da Ré, não ultrapasse os 90 dias seguidos, e seja abonado ao trabalhador ajudas de custo, que se apuram em função da retribuição, sendo que relativamente à A., importam no valor diário de €43,39. – Cfr. Cláusulas 41ª, 43ª, nº 4, 44ª, nº 2 do AE.
Ora, a Ré não fundamentou a decisão de transferir ou deslocar a A., manteve-a noutro local de trabalho que não o local ao qual está afecta, por mais de um ano. Logo, não se tratou de uma situação transitória, mas permanente.
Sendo a ordem ilegal assistia à A. o direito de a recusar, ou de recusar as condições que lhe foram impostas para essa deslocação.
A ser verdade, o que não se admite, que a Ré deu ordens à A. para fazer as deslocações em viatura da empresa ou transportes públicos e no horário de trabalho, a A. não estava obrigada a aceitar nenhuma dessas condições, pois a ordem foi ilegal. Contudo, como cumpriu a ordem de transferência do local de trabalho e teve que suportar os custos da deslocação, tem direito a receber da R. as ajudas de custo previstas no AE para estas situações.
Mas a verdade é que não pode ter havido reunião alguma prévia à ordem de deslocação, pois tal ordem foi dada pela via telefone quando a A. estava em período de gozo de férias, conforme ficou provado no ponto 19. E como referiu a testemunha G.., aquando da ordem de deslocação da A. não houve qualquer reunião, tendo referido que uns meses após já se encontrar a A. na loja de.., assistiu a uma conversa entre a A. e o Sr. N.., mas que não terá percebido muito bem o que se discutiu.
Conforme resulta dos documentos a fls. 182, a A. participou à ACT o facto de se encontrar deslocada na Loja de.. por período de tempo superior ao permitido no AE, e na resposta que a Ré deu à ACT, referiu ter realizado com a A. duas reuniões sendo que uma foi na Loja de.. e refere quais as pessoas que estiveram presentes nessa reunião, em momento algum refere ter estado presente a testemunha P...
Contudo, o Tribunal serviu-se, também, do depoimento desta testemunha para dar como provado o ponto 51 da matéria de facto.
A verdade é que foi a Ré quem nessa exposição à ACT indicou as pessoas que estiveram presentes nessa reunião e não indicou o Sr. P.., e seja como for, a ter existido tal reunião, a mesma terá ocorrido, como referiu G.., alguns meses após a deslocação da A. para a loja de...
Por outro lado, a ter havido a ordem para a A. se deslocar em viatura da Ré ou em transportes públicos dentro do horário de trabalho, seria de elementar acerto que o mesmo que deu essa ordem à A. tivesse dado instruções ao chefe da Loja de.. para atribuir à A. um horário de trabalho compatível com essa ordem de trabalho, isto é, que a A. tivesse um horário de entrada ao serviço mais tarde e uma ordem de saída mais cedo.
Mas nada disto aconteceu, o chefe da loja de.., Sr. T.., referiu que não adaptou o horário de trabalho da A. ao facto de ela se encontrar deslocada, e que não recebeu nenhuma ordem nesse sentido. Por essa razão, a A. cumpriu o horário de trabalho que lhe foi dado a conhecer, e que se encontrava afixado, aliás, a A. diariamente registou a hora de entrada e saído por meios electrónicos, e como tal era do conhecimento da Ré, que nunca se opôs ou informou a A. de que o horário de trabalho não era o que estava a cumprir
Assiste à A. o direito a ser-lhe pago as deslocações em viatura própria de.. para.., o que fez aos fins de semana e feriados.
Deve, por isso, o tempo de viagem ser contado como tempo de trabalho normal, e como tal deve ser remunerado".

Importa ver, por pertinentes, as seguintes disposições do Acordo de Empresa:
Cláusula 35.ª
Transferência de local de trabalho
1 - A empresa pode, sempre que o seu interesse o exija, proceder à mudança de trabalhadores para outro local de trabalho, desde que essa mudança não implique prejuízo sério para o trabalhador ou quando tal alteração resulte de mudança total ou parcial do estabelecimento em que aquele presta serviço.
2 - A movimentação dos trabalhadores dos centros de agrupamento e reserva contínua (CARC), desde que se processe dentro da área de influência destes centros, não é considerada mudança de local de trabalho.
Cláusula 36.ª
Modalidades
1 - Os trabalhadores podem mudar de local de trabalho por acordo ou por interesse da empresa nos termos da lei e do presente AE.
2 - As transferências por acordo podem resultar da iniciativa do trabalhador ou da empresa.
3 - Considera-se existir interesse da empresa quando a mudança visar nomeadamente a eliminação de excedente de pessoal resultante de reorganização ou extinção de serviços, ou o aproveitamento de trabalhadores com incapacidades parciais.
Cláusula 41.ª
Conceito de local de trabalho
1 - Entende-se por local habitual de trabalho, sem prejuízo do disposto no n.º 2, aquele em que o trabalhador foi colocado ou a que está adstrito, quando o trabalho, pela sua natureza, deva ser prestado em local não fixo.
2 - O trabalhador pode ter mais do que um local de trabalho, nas seguintes situações:
a) Sempre que tal for acordado;
b) Para satisfação de necessidades de estabelecimentos que não justificam a afectação de trabalhador a tempo completo, obrigando-se a empresa ao pagamento do acréscimo de despesas de transporte entre os locais de trabalho, bem como a computar como tempo de trabalho o estritamente necessário à viagem entre os locais de trabalho.
Cláusula 42.ª
Mudança definitiva de local de trabalho
1 - No caso de mudança definitiva de local de trabalho, o trabalhador terá direito a que lhe sejam custeadas as despesas decorrentes de tal mudança, nos termos previstos no número seguinte.
2 - Quando da mudança definitiva de local de trabalho implicar a mudança de localidade e de domicílio, a empresa obriga -se aos seguintes encargos e deveres:
a) O transporte do trabalhador e do seu agregado familiar, entendendo-se por este os familiares, parentes e afins que vivam em comunhão de mesa e habitação com o trabalhador;
b) O transporte e seguro de móveis e bagagens;
c) O alojamento condigno a expensas da empresa para o trabalhador e seus familiares desde a data da sua chegada até ao 15.º dia, inclusive, salvo se o trabalhador tiver conseguido, entretanto, habitação;
d) Considerar em regime de ajudas de custo, no caso de acréscimo de encargos para o trabalhador, os dez primeiros meses de permanência do trabalhador transferido no novo local ou, por opção da empresa, assegurar-lhe mensalmente o pagamento do excedente entre a renda de casa paga pelo trabalhador no último mês no local donde é transferido, e aquela que, com o acordo da empresa, vier a pagar no primeiro mês na localidade para onde é transferido, até atingir o prazo de um ano após a transferência;
e) Conceder ao trabalhador dispensa de comparência ao serviço durante 10 dias úteis consecutivos dentro do prazo de 30 dias, fixado para a apresentação no novo local de trabalho. Por acordo entre a empresa e o trabalhador, a referida dispensa pode ser gozada noutro período;
f) Pagar, em casos especiais a definir pela empresa, antecipadamente o quantitativo a que se refere a primeira opção referida na alínea d), numa primeira prestação no montante igual a cinco meses de ajudas de custo, e o restante em cinco prestações mensais, a vencer no final de cada um dos meses seguintes.
3 - Não havendo lugar a mudança de domicílio e verificando-se um acréscimo de encargos com transporte entre o novo local de trabalho e o domicílio, a empresa garante ao trabalhador, consoante o caso, uma das compensações seguintes:
a) Pagamento da diferença do passe de transporte colectivo;
b) Pagamento ao correspondente acréscimo de despesas de transporte;
c) Por acordo entre as partes e em alternativa ao previsto nas alíneas anteriores, um mês de vencimento.
Cláusula 43.ª
Princípios
1 - O trabalhador encontra -se adstrito às deslocações inerentes ao exercício das suas funções ou indispensáveis à sua formação profissional.
2 - A empresa pode, por necessidade transitória de serviço, devidamente fundamentada, deslocar temporariamente qualquer trabalhador para que este exerça as suas funções fora do local habitual de trabalho, nos termos da presente secção.
3 - Para efeitos desta secção, entende -se por:
a) Deslocação em serviço - a prestação temporária de trabalho fora do local habitual;
b) Local habitual de trabalho - aquele em que o trabalhador foi colocado ou a que está adstrito, quando o trabalho, pela sua natureza, deva ser prestado em local não fixo;
c) Ajudas de custo - os abonos devidos aos trabalhadores deslocados em serviço para comparticipação em despesas de alimentação ou alojamento, nas condições previstas neste acordo.
4 - Salvo os casos de trabalho para a execução de projectos ou programas previamente aprovados, as deslocações em serviço não poderão exceder, em regra, 90 dias seguidos relativamente a cada trabalhador.
Cláusula 44.ª
Regresso ao local habitual de trabalho
1 - Nas deslocações em serviço, para uma distância igual ou inferior a 30 km, a empresa deverá assegurar o regresso diário do trabalhador ao local habitual de trabalho, ou à sua residência, se mais perto, desde que possível.
2 - Quando o trabalhador se encontre deslocado em serviço por dias sucessivos, a uma distância superior a 30 km e inferior a 100 km, a empresa deverá assegurar o regresso ao local habitual de trabalho, ou à sua residência, se mais perto, em fins-de-semana e na véspera de dias feriados, desde que possível.
3 - Nas deslocações para distâncias superiores a 100 km, a decisão sobre o regresso ao local habitual de trabalho, ou à sua residência, se mais perto, terá em conta as exigências de serviço, as necessidades de descanso dos trabalhadores e as possibilidades de transporte.
4 - O cálculo da distância a que o trabalhador se encontra deslocado, para os efeitos desta secção, efectua-se a partir do limite da localidade em que se situa o local habitual de trabalho, ou a sua residência, se mais perto, até ao limite da localidade de destino, entendendo -se como limites da localidade as placas toponímicas respectivas.
5 - Nas deslocações do continente para as Regiões Autónomas, ou vice-versa, e inter-ilhas, por um período igual ou superior a 60 dias, poderão os trabalhadores, se o desejarem, efectuar uma deslocação, por cada período de 30 dias, ao seu domicílio, com as despesas de viagem pagas pela empresa.
Cláusula 45.ª
Direitos dos trabalhadores deslocados em serviço
1 - Os trabalhadores deslocados em serviço têm direito:
a) Ao transporte de ida e regresso entre o local habitual de trabalho, ou a residência, se mais perto, e o local de deslocação, ou ao pagamento da despesa respectiva;
b) Ao pagamento das ajudas de custo durante a deslocação, nas condições fixadas no presente acordo;
c) Ao pagamento como trabalho suplementar em dia normal de trabalho do tempo necessário à deslocação entre a residência e o local temporário de trabalho, e vice -versa, na parte em que exceda o seu horário normal, quando se tratar de pequena deslocação, e como trabalho normal quando se tratar de grande deslocação.
2 - Consideram-se pequenas deslocações as que permitem, em condições normais, a ida e o regresso diário do trabalhador à sua residência habitual; consideram-se grandes deslocações as restantes.
3 - O disposto na alínea b) do n.º 1 desta cláusula aplica-se independentemente do disposto na alínea d) do n.º 2 da cláusula 42.ª
Cláusula 46.ª
Condições para atribuição de ajudas de custo
1 - Nas deslocações em que a saída e o regresso dos trabalhadores se verifiquem no mesmo dia a atribuição dos abonos far-se-á de acordo com as seguintes condições:
a) Pequeno-almoço - quando a saída ocorrer antes das 8 horas e o regresso depois das 8 horas;
b) Almoço - quando a saída ocorrer até às 12 horas e 30 minutos e o regresso depois das 13 horas e 30 minutos;
c) Jantar - quando a saída ocorrer até às 19 horas e o regresso depois das 20 horas.
2 - Nas deslocações por dias sucessivos a atribuição dos abonos far-se-á:
a) Nos dias de saída e de regresso, de acordo com o disposto no número anterior;
b) Por cada dia completo na mesma localidade, ajuda de custo completa;
c) Nos dias em que, por exigência de serviço, se efectuem despesas em localidades diferentes, pelo somatório das ajudas de custo referentes às refeições e alojamento.
3 - Nos dias de embarque e desembarque, seja qual for a hora a que se verifiquem, são devidos os abonos normais, se aqueles se efectuarem em localidade diferente daquela onde o trabalhador tem a sua colocação.
Cláusula 47.ª
Deslocações sem direito a ajudas de custo
1 - Não conferem direito a ajudas de custo as seguintes deslocações:
a) Aquelas em que a empresa ou outra instituição assegure alimentação ou alojamento ou ambos, ou suporte as respectivas despesas, na parte em que se encontrem garantidas;
b) Por motivo de frequência de estágio ou qualquer outra acção de formação, para locais e por períodos e em condições que permitam ao trabalhador tomar as suas refeições e ou alojar-se na forma habitual;
c) As resultantes de mudança definitiva de local de trabalho;
d) Efectuadas por trabalhadores em funções de distribuição, de condução ou análogas;
e) As que impliquem a utilização de transporte cujo preço inclua alimentação ou pernoita, pelo tempo de duração da viagem;
f) As que se verifiquem na área coincidente com o respectivo local de trabalho;
g) As que se verifiquem para local situado a uma distância igual ou inferior a 10 km, contados nos termos do n.º 4 da cláusula 44.ª;
h) As que se verifiquem para a localidade da residência do trabalhador.
2 - Nos casos previstos na alínea b) do n.º 1, aplicar-se-á, quanto aos dias de partida e chegada, o disposto no n.º 1 da cláusula 46.ª

Este normativo não suporta a argumentação da A. de que não houve qualquer transferência válida por falta de fundamentação da R. (o que se provou foi que a ordem foi verbal, o que não é a mesma coisa), e nem que a temporariedade era condição de validade da ordem.
De resto, a ser assim, sempre a ordem seria válida ao menos durante 90 dias (a menos que a empregadora afirmasse logo que a deslocação era por período superior, o que não ficou assente), não estando viciada à partida.
Mas mesmo que fosse de outro modo, caberia apurar, de acordo com o principio basilar da boa fé (art.º 126/1, do Código do Trabalho) quais os direitos da A. e os deveres da R., em termos equitativos e objetivamente (ou ao menos intersubjetivamente) válidos.
No caso, o que se provou foi que “aquando da deslocação da Autora para a Loja de .. a Ré, por intermédio do responsável N.. deu instruções à A. para se deslocar em viatura de serviço ou transportes públicos e dentro do horário de serviço” (51 dos factos provados) e que foi a A. quem “não concordou com tais condições e não quis deslocar-se em viatura disponibilizada pela R.” (52).
Quanto ao primeiro a situação é perfeitamente linear: se rejeitou o transporte na da R. sem que se veja motivo plausível para isso, seria abusivo pretender agora uma compensação pelas despesas que só suportou porque assim o quis.
E relativamente ao tempo de viagem, tendo-lhe sido determinado que se deslocasse dentro do tempo de serviço, seria preciso que demonstrasse a A. (art.º 342/1 do Código do Trabalho) que tal ordem foi inviabilizada pela própria R., o que não fez.
Pelo que não merece censura a sentença.
*
Dos subsídios de chefia e do plafond do telefone
Para a apreciação da questão em apreço relevam especialmente as clausulas 31 a 34 do AE/CTT 2008 (BTE 14/2008, de 15 de abril, e 1/2010, de 8.1), que dispõem o seguinte:

SECÇÃO III
Exercício de cargos ou funções em comissão de serviço
Cláusula 31.ª
Cargos de direcção e chefia
1 — Os cargos de direcção e chefia, dada a sua especificidade e exigência de uma especial relação de confiança, serão exercidos em comissão de serviço.
2 — O preenchimento de cargos de direcção e chefia é da competência da empresa.
3 — Sem prejuízo do disposto no número anterior, o preenchimento de cargos de chefia dos níveis 0, 1, 2, 3 e 4 será precedido de concurso e feito, prioritariamente, por recrutamento interno.
4 — O exercício de funções em comissão de serviço não prejudica a aplicação ao trabalhador das regras relativas à progressão salarial garantida.
5 — O acordo de comissão de serviço deverá observar os requisitos formais previstos na lei.
Cláusula 32.ª
Funções especiais
1 — Para além dos cargos referidos na cláusula anterior, serão exercidas em comissão de serviço as funções cujo exercício pressuponha a existência de uma especial relação de confiança, nomeadamente, funções de consultoria e de assessoria a directores ou a membros do conselho de administração, bem como de secretariado.
2 — O exercício de funções em regime de comissão de serviços será precedido de acordo escrito entre a empresa e o trabalhador, elaborado em consonância com as disposições legais.
3 — Mantêm-se em vigor os regimes internos existentes de comissões de serviço para exercício de funções especiais.
Cláusula 33.ª
Cessação da comissão de serviço
1 — A comissão de serviço pode ser dada por finda por iniciativa de qualquer das partes, através de comunicação escrita à outra parte, nos termos e prazos legais.
2 — Quando cessar a comissão de serviço, o trabalhador retoma as funções inerentes à sua categoria profissional, salvo diferente estipulação acordada entre as partes no acordo de comissão de serviço.
3 — O trabalhador que tenha iniciado funções em comissão de serviço antes da data de entrada em vigor do presente AE e desde que a mesma tenha durado pelo menos seis meses, mantém a remuneração que vinha auferindo até ao momento em que, por via de actualização salarial ou de progressão salarial garantida, lhe couber remuneração e diuturnidades que somem quantitativos superiores, no caso da cessação de comissão de serviço cessar por iniciativa da empresa.
4 — Os trabalhadores que venham a iniciar o exercício de funções em comissão de serviço após a data de entrada em vigor do presente AE beneficiam do regime legal relativo à comissão de serviço.
Cláusula 34.ª
Substituição
1 — No caso de substituição de trabalhador que exerça um cargo de direcção ou chefia, o trabalhador substituto auferirá, durante o tempo de substituição, a sua remuneração acrescida do subsídio específico relativo ao exercício do cargo.
2 — A situação de substituição não poderá exceder o período de oito meses, findo o qual se procederá à aplicação das normas do preenchimento de cargos de direcção e chefia.
3 — O disposto no número anterior não é aplicável no caso da ausência do titular do cargo ter sido determinada por impedimento que lhe não seja imputável, frequência de acções de formação e exercício de funções em organismos representativos dos trabalhadores, em autarquias ou outros órgãos do Estado.
4 — Independentemente do disposto nos números anteriores, o trabalhador na situação de substituição pode solicitar o regresso ao seu posto de trabalho, devendo o seu pedido ser satisfeito no prazo máximo de 30 dias.

É pacífico que na R. o exercício de cargos de direcção e chefia tem lugar em comissão de serviço, conforme estipula o n.º 1 da cláusula 31 do AE.
A A. prestou atividade de chefe de estação na loja de.., onde também reside, em regime de comissão de serviço, desde 1991 até ser exonerada em 2009, perdendo o subsídio de chefia e o plafond de telemóvel. Interinamente continuou a desempenhar as mesmas funções até 12.4.2010, percebendo então um subsídio de interinidade.
Desta matéria resulta que a A. esteve numa comissão de serviço no...
O exercício de funções em comissão de serviço pressupõe a concertação das partes, como dispõe o art.º 162/3 do Código do Trabalho, e, em especial, o n.º 5 da cláusula 31 do AE. O acordo era, pois, indispensável, e a partir de dada altura deixou de haver da parte do R.
O Supremo Tribunal de Justiça tem entendido a este propósito, que II - O regime da comissão de serviço instituído pelo DL n.º 404/91 de 16 de Outubro veio permitir o exercício de funções de direcção, sem que daí resultasse o direito do trabalhador à aquisição da categoria profissional correspondente, possibilitando-se às empresas o desempenho destas funções, sem que se produzisse o efeito estabilizador da aquisição da respectiva categoria. III- Estabelecendo os sucessivos AE/CTT, desde 1981, que os cargos de direcção e chefia, dada a sua especificidade, não farão parte dos grupos profissionais e serão exercidos em comissão de serviço, cargos a preencher por concurso aberto a todos os seus trabalhadores que reúnam os respectivos requisitos, com a submissão do trabalhador a processo concursal, acordado entre a empresa e os sindicatos, e posterior nomeação pela empresa, ficam satisfeitos os valores da certeza e da segurança jurídica que o documento escrito, referido no artigo 3.º do DL n.º 404/91, visa realizar – cfr. por todos o acórdão de 22.5.2013, citado e o de 20.11.2013 [sublinhados nossos][6] ).
O caso tem dois elementos que cumpre ponderar: primeiro, a A. exerceu a dita comissão de serviço durante quase 20 anos; segundo, foi a R. quem a fez cessar.
Dispõe o n.º 3 da clausula 33 que “O trabalhador que tenha iniciado funções em comissão de serviço antes da data de entrada em vigor do presente AE e desde que a mesma tenha durado pelo menos seis meses, mantém a remuneração que vinha auferindo até ao momento em que, por via de actualização salarial ou de progressão salarial garantida, lhe couber remuneração e diuturnidades que somem quantitativos superiores, no caso da cessação de comissão de serviço cessar por iniciativa da empresa”
Há, ainda, um outro elemento de facto que importa não esquecer: já anteriormente a A. exercia funções de chefe de estação (cfr. n.º 4 dos factos provados), antes de .. nas estações de .. e ... O que significa que exerceu essa atividade durante mais de 20 anos, e até que a R. cessou a comissão
Ora, o que importa é, fundamentalmente, determinar se essas verbas integram a retribuição da A..
O Tribunal recorrido entendeu que tal não ficou demonstrado.
No caso do plafond do telefone, no montante de € 28,00, afigura-se-nos claro que se trata – até pelo seu modesto valor – de uma compensação pelas despesas que o exercício das funções de chefia em causa acarreta (neste sentido cfr. o acórdão da RL de 27 de maio de 2015, proc. n.º 3511/11.9TTLSB.L1, relatado pelo aqui também relator). Se assim não fosse em concreto teria de ser demonstrado pela A. – e não o foi.
E quanto ao subsídio de chefia?
Não ignoramos que a jurisprudência tem tido mais do que um entendimento, podendo citar, no sentido pugnado pela A., os Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa de 12/09/2008, nº 4800/08-4 (fundamentação): “…Quando a situação específica determinante de um certo complemento retributivo se altera ou desaparece, em principio a supressão do dito complemento não altera o equilíbrio entre as prestações de cada uma das partes no contrato (…) Não obstante isso e certamente por reconhecer que a supressão de prestações que foram pagas de forma regular e continuada é indesejável na medida em que provoca quebras bruscas no orçamento pessoal e familiar do trabalhador afectado, as partes contratantes outorgantes do AE acordaram no regime de absorção consagrado no nº 3 da Cláusula 74ª do AE publicado no BTE nº 21/96 de 8.06.96, que permite esbater no tempo os referidos efeitos”. (…) “Justifica-se, por conseguinte, que a Ré seja condenada a pagar a diferença entre a remuneração auferida pelo Autor….até que aquela seja absorvida por esta”; e de 8/05/2013, nº 4436/11.3TTLSB.L1: “O alcance da dita cláusula [Clausula 74 que antecedeu a 33 – nota do ora relator [7]] é o seguinte: o trabalhador, após o decurso de um prazo mínimo de 6 meses em situação de comissão de serviço e caso esta seja cessada por iniciativa da empregadora C.., tem direito a manter, em termos quantitativos, o nível remuneratório que, ao abrigo da mesma, lhe tinha sido atribuído, até o mesmo ser absorvido no futuro pelos aumentos salariais, diuturnidades e modificação retributivas derivadas de promoções e evolução profissional na carreira.
Em sentido negativo tem-se entendido (cfr. acórdão desta RL de 20.11.2013, Processo 2819/11.8TTLSB.L1, Relat. Jerónimo Freitas), que "As funções exercidas em comissão de serviço são reversíveis. Cessada a comissão de serviço cessa igualmente o direito ao estatuto que correspondia à função desempenhada, nomeadamente remuneratório, retornando o trabalhador à categoria base e ao correspondente estatuto, podendo tal implicar descida na valorização relativa das funções e no montante da retribuição. A lei não obsta à aplicação de regimes de cessação da comissão de serviço mais favoráveis constantes de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho ou de contrato individual do trabalho. É no âmbito dessa possibilidade que se inscreve a Cláusula 74.ª do AE/CTT, que indo para além do regime legal mínimo estabelecido no n.º1, do art.º 247.º do CT/03, para a cessação da comissão de serviço interna, isto é, o direito do trabalhador “exercer a actividade desempenhada antes da comissão de serviço ou as funções correspondentes à categoria a que entretanto tenha sido promovido”, veio ainda garantir ao trabalhador que veja cessada a comissão de serviço por iniciativa da empresa, desde que pelo menos tenha “decorrido um período de adaptação de seis meses”, o direito a manter a remuneração que auferia - enquanto desempenhava funções em comissão de serviço - “até ao momento em que lhe couber, por actualização de tabelas salariais ou por evolução em categorias ou grupos profissionais, remuneração e diuturnidades que somem quantitativos superiores”. “(…) O trabalhador que cessa a comissão de serviço por iniciativa da empresa - depois de decorrido um período de adaptação de seis meses - mantém o direito à remuneração base e diuturnidades que auferia durante o desempenho das funções em comissão, até que, “por actualização de tabelas salariais ou por evolução em categorias ou grupos profissionais”, venha a auferir remuneração base e diuturnidades, cujo somatório exceda o quantitativo que então recebia e continuou a receber por efeito desse direito".
A razão é que, conforme refere na fundamentação, estes "subsídios ... estão para além da retribuição base, englobando a noção mais ampla de retribuição ou, na expressão do AE/CTT, de remuneração. Tratam-se de prestações complementares, regulares e periódicas, (... auferidas) em contrapartida das funções de chefia que passou a exercer no âmbito da comissão de serviço, atendendo às especificidades das mesmas e de acordo com os usos da empresa. (... O subsídio) de chefia (...) – nem integra o elenco de subsídios previstos no instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.
Trata-se, pois, citando o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça 22-09-2011, no proc.º 913/08.1TTPNF.P1.S1, Relat. Consº Sampaio Gomes, disponível em www.dgsi.pt (apud mencionado ac. RL de 20.11.2013) de “(..) prestações complementares auferidas em função da natureza das funções ou da especificidade do desempenho (subsídio nocturno, isenção de horário e outros subsídios) [que] apenas são devidas enquanto persistirem as situações que lhes servem de fundamento, podendo a entidade empregadora suprimir as mesmas logo que cesse a situação específica que esteve na base da sua atribuição, sem que isso implique violação do princípio da irredutibilidade da retribuição".
Afigura-se-nos ser assim: a razão da atribuição deste subsídio (de chefia e depois SEF) prende-se com o exercício das funções correspondentes à comissão de serviço, pelo que a R. podia efetivamente por fim ao seu pagamento com a cessação da comissão.
Destarte, improcede o recurso
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DECISÃO
Pelo exposto, o Tribunal julga o recurso improcedente e confirma a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Guimarães, 22 de outubro de 2015
Sérgio Almeida
Antero Veiga
Manuela Fialho
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[1] Cf. o que é corolário das regras do direito substantivo cível art.º 396 (“A força probatória dos depoimentos das testemunhas é apreciada livremente pelo tribunal”), 391 (“O resultado da inspecção é livremente apreciado pelo tribunal”) e 389 (“A força probatória das respostas dos peritos é fixada livremente pelo tribunal”).
[2] “O que torna provado um facto é a íntima convicção do juiz, gerada em face do material probatório trazido ao processo (bem como da conduta processual das partes) e de acordo com a sua experiencia de vida e conhecimento dos homens; não a pura e simples observância de certas formas processuais. O que decide é a verdade material e não a verdade formal” (Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Cb. Edit., 384).
[3] “O princípio traduz-se principalmente no contacto pessoal entre o juiz e as diversas fontes de prova (Manuel de Andrade, idem, 386).
[4] E ainda, acrescente-se, o da oralidade.
[5] E o problema não está no mero áudio mas na natureza estática da documentação. Ainda que se grave som e imagem é fácil ver que só o Tribunal que recolhe a prova pode pôr as testemunhas à prova para dissipar duvidas, aperceber-se in loco de cumplicidades e tensões inconfessadas, etc.
[6] Cfr. cláusulas 78ª, n.º 1, do AE publicado no B.T.E. nº 24/81, de 29/06/81; e 69 das versões do AE de 1998, 2008 (BTE 25/2008) e de 2010 (este no B.T.E. nº 34/2010).
[7] Está em causa a interpretação da cláusula 74ª, n.º 3 do AE/CTT/2000, a qual, dispõe:
“Se a cessação da comissão de serviço for da iniciativa da empresa, depois de decorrido um período de adaptação de seis meses, o trabalhador mantém o direito à remuneração que auferia até ao momento em que lhe couber, por actualização de tabelas salariais ou por evolução em categorias ou grupos profissionais, remuneração e diuturnidades que somem quantitativos superiores”.