Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1420/06-2
Relator: ROSA TCHING
Descritores: EXPROPRIAÇÃO
NOMEAÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 07/20/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: CONCEDIDO PROVIMENTO
Sumário: 1º- Em processo de expropriação, a tramitação da avaliação é regulada pelas normas do Código das Expropriações, e, só nas lacunas existentes, pelo disposto no Código de Processo Civil.
2º- No que concerne à designação e nomeação dos peritos, o art. 62º do C.E. estabelece um regime específico, pelo que não lugar à aplicação subsidiária do disposto no art. 573º do C. P. Civil.
3º- Assim, se a designação de perito efectuada pelas partes não for válida, devolve-se a nomeação ao juiz, que poderá solicitar à parte a designação de outro perito, aceitar a indicação de outro perito feita pela parte para o caso de vir a considerar-se existir um qualquer obstáculo à nomeação do perito inicialmente designado ou proceder à sua substituição imediata, nos termos do artigo 62º do C. Expropriações.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

No processo principal de expropriação foi proferido despacho judicial que, com vista a aquilatar do eventual impedimento da Exm.ª Sr.ª Eng.ª, Carla M... de Paula P..., ordenou, para além do mais, a notificação da expropriante para, em dez dias, esclarecer se aquela indicada perita era sua trabalhadora.

Na sua resposta, veio a entidade expropriante informar que a Sr.ª Eng.ª Carla M... de Paula P... era sua funcionária e requerer que, caso viesse a ser entendido que o âmbito de aplicação do Decreto-Lei n.º 125/2002, de 10 de Maio se estende aos peritos indicados pelas partes, fosse admitida a sua substituição por José L..., engenheiro, residente na Urbanização da Arca, lote A10, Turiz, 4730, Vila Verde.

Foi proferido despacho que considerou que a Sr. Eng.ª indicada estava impedida de exercer as funções de perita de parte e, em sua substituição, nomeou o Ex.mo Eng.º Domingos B..., perito constante da lista oficial, ao abrigo do disposto no art. 573° do C.P.C.

Inconformada com esta decisão, apenas na parte em que foi indeferida a substituição do perito indicado, dela agravou a "EP-Estradas de Portugal. E.P.E., terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que se transcrevem:
“1ª. A aplicação subsidiária das normas do processo civil ao processo expropriativo só deverá ter lugar quanto aos seus princípios essenciais ou quando se mostre indispensável e compatível com o regime específico deste processo;
2ª. Para os processos de expropriação por utilidade pública, dispõe especificamente a 2ª parte da al. b) do n° 2 do art. 62° do Código das Expropriações (subordinado à epígrafe "Designação e nomeação dos peritos") que, «faltando a designação válida de algum perito, devolve-se a nomeação ao tribunal, aplicando-se o disposto na parte final da alínea anterior».
3ª. Mediante despacho de fls. 516 foi solicitado à agravante que esclarecesse se a Exma. Sr.ª Eng.ª Carla M... de Paula P..., indicada como perita no recurso subordinado da decisão arbitral, era de facto sua trabalhadora;
4ª. Em resposta a essa solicitação a agravante informou que essa Sr.ª. Engenheira era sua funcionária, mas requereu a respectiva substituição pelo Sr. Eng° José L..., no caso de se entender que o âmbito de aplicação do Decreto-Lei 125/2000, de 10 de Maio, era extensível aos peritos indicados pelas partes.
5ª. Ou seja, a agravante requereu a substituição da perita inicialmente indicada, naqueles moldes, em data anterior à prolação do despacho em crise.
6ª. Por ser assim, quando tal despacho foi proferido não faltava a indicação válida do perito da entidade expropriante.
7ª. Quer o elemento literal quer o racional da transcrita norma - 2ª parte da al. b) do n° 2 do art. 62° do Código das Expropriações - favorecem o entendimento sufragado.
8ª. Não se descortina, in casu, qualquer razão válida que justifique o afastamento da regra geral ínsita na al. a) do n° 1 do art. 62° do mesmo diploma, segundo a qual «Cada parte designa um perito e os três restantes são nomeados pelo tribunal de entre os da lista oficial».
9ª. De resto - e sem prescindir - ainda que assim não fosse, nenhuma razão justifica que se aplique o regime previsto no art. 573.° do CPC a situações, como a dos autos, em que, para o caso de vir a considerar-se existir um qualquer obstáculo à nomeação do perito inicialmente indicado, a parte indicou outro perito em sua substituição.
10ª. O douto despacho em crise, salvo melhor opinião, violou o disposto nos art. 62° do Código das Expropriações e 573° do Código de Processo Civil”.

A final, pede seja revogado o despacho recorrido e a sua substituição por outro que admita a indicação do Sr. Eng° José L... como perito de parte da agravante, em substituição da Srª. Engª. Carla M... de Paula P....

Não foram apresentadas contra-alegações.

Foi proferido despacho de sustentação.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir:


FUNDAMENTAÇÃO:

Como é sabido, o âmbito do recurso determina-se pelas conclusões da alegação do recorrente – art. 660º, n.º2, 684º, n.º3 e 690º, n.º1, todos do C. P. Civil - , só se devendo tomar conhecimento das questões que tenham sido suscitadas nas alegações e levadas às conclusões, ainda que outras, eventualmente, tenham sido suscitadas nas alegações propriamente ditas. Vide Acórdãos do STJ de 21-10-93 e de 12-1-95, in CJ. STJ, Ano I, tomo 3, pág. 84 e Ano III, tomo 1, pág. 19, respectivamente.


Assim, a única questão a decidir traduz-se em saber se, no caso de a designação efectuada pelas partes não ter sido válida, o juiz procede à sua substituição imediata, nos termos do disposto no artº. 573º do Código de Processo Civil.


Dos elementos constantes dos autos, resulta que:

1º- A fls. 516 dos autos principais foi proferido despacho judicial que, com vista a aquilatar do eventual impedimento da Exmª Sr.ª Eng.ª, Carla M... de Paula P..., ordenou, para além do mais, a notificação da expropriante para, em dez dias, esclarecer se aquela indicada perita era sua trabalhadora (cfr. fls. 13).

2º- Na sua resposta, veio a entidade expropriante informar que a Srª. Engª. Carla M... de Paula P... era sua funcionária e requerer que, caso viesse a ser entendido que o âmbito de aplicação do Decreto-Lei n.º 125/2002, de 10 de Maio se estende aos peritos indicados pelas partes, fosse admitida a sua substituição por José L..., engenheiro, residente na Urbanização da Arca, lote A10, Turiz, 4730, Vila Verde (cfr. fls. 14).

3º- Foi proferido despacho que decidiu julgar impedida a Exma. Srª. Engª. Carla M... de Paula P... de exercer as funções de perito avaliador nos presentes autos. E, considerando que nos termos do disposto no artº. 573º do Código de Processo Civil é ao Tribunal que incumbe nomear novo perito, indeferiu a substituição requerida e, em substituição daquela perita, nomeou o Exmo. Sr. Eng. Domingos B... (cfr. fls. 16 e 17).

Sustenta, porém, a agravante que, inexiste justificação para se aplicar o regime previsto no art. 573.° do CPC a situações, como a dos autos, em que, para o caso de vir a considerar-se existir um qualquer obstáculo à nomeação do perito inicialmente indicado, a parte indicou outro perito em sua substituição.

E, em nosso entender, assiste-lhe razão.
Senão vejamos.
É consabido que, em processo de expropriação, a tramitação da avaliação é regulada pelas normas do Código das Expropriações, e, só nas lacunas existentes, pelo disposto no Código de Processo Civil, nomeadamente os artigos 568º e seguintes.
No que concerne à designação e nomeação dos peritos, dispõe o art. 62º do C.E. que:
“1- A avaliação é efectuada por cinco peritos, nos termos seguintes:
a) Cada parte designa um perito e os três restantes são nomeados pelo tribunal de entre os da lista oficial;
b) (…) faltando a designação válida de um perito, devolve-se a nomeação ao tribunal, aplicando-se o disposto na parte final da alínea anterior. (….)”.
Por sua vez, estabelece o art. 573º do C. P. Civil que “Quando houver lugar á nomeação de um novo perito, em consequência do reconhecimento dos obstáculos previstos no artigo anterior, da remoção do perito inicialmente designado ou da impossibilidade superveniente de este realizar a diligência, imputável ao perito proposto pela parte, pertence ao juiz a respectiva nomeação”.
Mas, se é o próprio art. 62º Código das Expropriações a estipular que, na falta de designação válida de um perito, a nomeação devolve-se ao tribunal, que designará um perito de entre os da lista oficial, então, é bom de ver que arredada fica a aplicação, à referida situação, do disposto no citado art. 573º, porquanto, nesta parte, não se verifica lacuna da lei expropriativa.
Resta-nos, por isso, indagar se, em caso de falta de designação válida de perito, o citado art. 62º consente que o juiz, em vez de proceder à substituição imediata do perito indicado pela parte por um outro perito de entre os da lista oficial, solicite à parte a designação de outro perito ou aceite a indicação de outro perito feita pela parte para o caso de vir a considerar-se existir um qualquer obstáculo à nomeação do perito inicialmente indicado.
E a este respeito, diremos, desde logo, que a nossa resposta não pode deixar de ser afirmativa, pois que não se vislumbra que a lei se oponha a qualquer uma das enunciadas alternativas.
Aliás, neste mesmo sentido se pronunciou Pedro Elias da Costa, in, “Guia das Expropriações Por Utilidade Pública”, págs. 187 e 188
É que resulta, claramente, do sistema de avaliação consagrado no artigo 62º do Código das Expropriações que a nossa lei reconhece às partes o direito de nomear o seu perito, privilegia, no que respeita a dois dos cinco peritos, a nomeação feita por cada uma das partes, e só subsidiariamente confia ao juiz a nomeação de tais peritos.
E isto acontece por se reconhecer que, num sistema de prova livre, como é o nosso, os laudos dos peritos das partes contribuem para um maior equilíbrio e podem, a final, dar ao juiz uma ideia mais completa e esclarecedora dos factos.
Daí entender-se não haver motivo para, no caso dos autos, não se aceitar a indicação do perito feita pela entidade expropriante em substituição do perito por ela inicialmente designado.

Procedem, pois, as conclusões da agravante.


CONCLUSÃO:

Do exposto, poderá extrair-se que:

1º- Em processo de expropriação, a tramitação da avaliação é regulada pelas normas do Código das Expropriações, e, só nas lacunas existentes, pelo disposto no Código de Processo Civil.

2º- No que concerne à designação e nomeação dos peritos, o art. 62º do C.E. estabelece um regime específico, pelo que não lugar à aplicação subsidiária do disposto no art. 573º do C. P. Civil.

3º- Assim, se a designação de perito efectuada pelas partes não for válida, devolve-se a nomeação ao juiz, que poderá solicitar à parte a designação de outro perito, aceitar a indicação de outro perito feita pela parte para o caso de vir a considerar-se existir um qualquer obstáculo à nomeação do perito inicialmente designado ou proceder à sua substituição imediata, nos termos do artigo 62º do C. Expropriações.


DECISÃO:

Pelo exposto, concede-se provimento ao agravo e, consequentemente, revoga-se o despacho, nomeando-se, em substituição da Sr.ª Eng.ª Carla M... de Paula P..., o Sr.º perito designado pela agravante: o Sr.º Eng.º José L....

Sem custas, por não serem devidas.

Guimarães, 20/07/2006