Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | MARIA PURIFICAÇÃO CARVALHO | ||
Descritores: | APENSAÇÃO DE PROCESSOS PROCESSO JUDICIAL DE PROMOÇÃO E PROTECÇÃO DE MENOR EM PERIGO ALIMENTOS INCIDENTE DE IMCUMPRIMENTO | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 01/16/2014 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | REVOGADA | ||
Indicações Eventuais: | 2ª SECÇÃO CÍVEL | ||
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Sumário: | 1. A apensação de processos carece sempre de uma pré avaliação ao seu conteúdo, não se devendo assumir com um cariz necessário e automático. 2. Só poderá pois haver lugar à apensação de ações, considerando o elemento de prioridade e sem importar qual deles tenha sido instaurado em primeiro lugar, tutelar cível, de promoção e educação ou tutelar educativo, se, em qualquer dessas situações, ocorrer a necessidade de uma apreciação conjunta da situação do menor de modo a permitir a produção de decisões que convergissem harmoniosamente na satisfação das suas necessidades, proporcionando proteção e promoção do menor, por forma a garantir o seu bem estar, desenvolvimento e inserção digna e responsável na sociedade, que é o objetivo visado com os diplomas indicados, no art.º 2º, nº 1, da LTE, os artºs 1º e 3º, nº 1, da LPCJP, e, uma vez mais, o art.º 147º-A da OTM. | ||
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Decisão Texto Integral: | RELATÓRIO Nos autos de Promoção e Protecção do 3º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Guimarães, veio a Magistrada do Ministério Público, junto deste Tribunal, interpor recurso de apelação da decisão judicial proferida nos autos em 25/11/2013, que determinou ao abrigo do disposto no art.º 81 nº1 da LPCJP que estes autos fossem apensados ao processo de incidente de prestação de alimentos devidos aos menores em causa que corre seus termos no Tribunal de Família e Menores de Sintra. O recurso foi recebido como recurso de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo. Nas alegações de recurso que apresenta, o apelante formula as seguintes conclusões: Atendendo a que os menores J…, Â… e S…, se encontram a residir atualmente em Guimarães, (acolhidos no Lar de…), bem assim como a sua progenitora, a remessa dos autos para a comarca de Sintra acarretaria dificuldades de audição dos mesmos e dos técnicos da EMAT que acompanham o caso e, nessa medida, prejudicaria a celeridade que nestes processos, por força da lei, é exigida. II) Concentrar num só processo e perante o mesmo Tribunal ou Juízo todos os processos relativos à mesma criança ou jovem justifica-se neste âmbito, não tanto por razões de economia processual, mas sobretudo por exigência dos princípios do “interesse superior da criança e do jovem”. III) É precisamente o superior interesse destas crianças que determina e obriga, a nosso ver, a manter o processo nesta comarca. IV) Entendemos que não ocorrem relativamente aos presentes autos as razões de utilidade e necessidade que justifiquem o desvio das regras de competência e de distribuição dos processos. V) Tanto a Lei de Promoção e Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, como a OTM, têm como princípio enformador supremo, a defesa dos interesses e direitos dos menores. VI) O Tribunal que mais bem colocado se encontra para a defesa dos direitos dos menores é aquele que tenha ou possa ter maior conhecimento do ambiente familiar em que os menores vivem e onde se encontram a ser criados, ou seja, é o Tribunal da Comarca de Guimarães. VII) Reunir ambos os processos num único Tribunal poderá ser um ato útil, senão mesmo, necessário. Porém, tal junção terá forçosamente de ser feita nestes autos, pois é em Guimarães que o J…, a Â… e a S… se encontram a viver. Nestes termos e nos demais de Direito, que doutamente se suprirão, deverá o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser revogado o despacho recorrido e substituído por outra que contemple o teor das alegações expendidas e conclusões apresentadas, assim se fazendo INTEIRA JUSTIÇA. Não foram proferidas contra – alegações. O recurso veio a ser admitido neste tribunal da Relação na espécie e com os efeitos e regime de subida fixados no despacho de admissão do recurso na 1ª instância. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. A única questão a decidir é a de saber se no circunstancialismo em apreço, este processo deve ou não ser apensado ao processo incidente de incumprimento prestação de alimentos devidos aos menores em causa que corre seus termos no Tribunal de Família e Menores de Sintra. FUNDAMENTAÇÃO De facto Os elementos de facto e incidências processuais relevantes para a decisão são os constantes do antecedente relatório que aqui se dá por reproduzido. De Direito A regra geral de competência territorial relativamente aos processos tutelares cíveis, é enunciada pelo art.º 155º, nº 1, do LTM, que a atribui ao tribunal da residência do menor, a qual que vem a concretizar-se naqueles tribunais onde exista mais de um juízo, pelas regras da distribuição, conforme dispõem os artºs 60º, nº 1, e 203º e sgs do CPC e artºs 17º, 65º, nº 1 da Lei nº 3/99 de 13.01, a LOFTJ, para onde remete aquele primeiro preceito - Cf. Manuel A. Domingues de Andrade, “Noções Elementares de Processo Civil”, pg 90; Antunes Varela, Miguel Bezerra, Sampaio e Nora, “Manual de Processo Civil”, pg 187. Todavia aquela regra geral conhece desvios-Cf. Artur Anselmo de Castro, “Direito processual Civil Declaratório”, Vol. II, 1982, pg 70 um dos quais decorre do art.º 154º, nº 1, do mesmo diploma, com a redação dada pelo DL nº 133/99, de 28.08, que estabelece como competente para conhecer de processo tutelar cível, processo de proteção, por força da Lei nº 147/99 de 01.09, LPCJP, ou tutelar educativo, a que alude a Lei nº 166/99, de 14.09, quando sucessivamente instaurados, o tribunal do processo que o tiver sido em primeiro lugar. A alteração legislativa que resultou nos diplomas acima mencionados tinha como um dos seus objetivos a uniformização das regras relativas à competência por conexão de processos, já que elegendo como regra geral o tribunal da residência do menor, os artºs 79º, nº 1, da LPCJP e 31º, nº 1, da LTE, estabelecem idênticas exceções aos artºs 81º aquele primeiro, e 43º, nº 3, o segundo. Na redação anterior dada pelo DL nº 314/78, de 27.10, referia o mencionado art.º 154º, nº 1, da LTM que “quando a providência for conexa com a ação que se encontre a correr termos em tribunal de família, é este tribunal o competente para conhecer dela”, apontando alguns autores- Cf. Ary de Almeida Elias da Costa e Carlos Alberto de Frias Oliveira Matias, “Notas e Comentários à Lei Tutelar de Menores”, 2ª ed., pg 205, como ratio legis, o interesse em alcançar uma mais perfeita apreciação dos interesses do menor, partindo da ideia de que correndo a ação neste último tribunal haveria ali melhores elementos de informação que pudessem proporcionar uma melhor avaliação do menor nas suas várias vertentes, para além de não serem estranhas razões de economia processual, mas sempre exigindo como pressuposto que o processo não estivesse ainda findo. Atualmente, embora haja norma expressa que o preveja, aplica-se ainda assim o art.º 267º do CPC por força do art.º 161º da LTM, quanto à apensação de ações, que traduzindo uma manifestação do princípio da economia processual, visa permitir que no mesmo processo se resolva o maior número possível de litígios, impedindo a multiplicidade de processos judiciais, a que não são alheias também razões de coerência do sistema, de evitar a ocorrência de decisões contraditórias, objectivos que têm a ver com a disciplina das excepções de litispendência e do caso julgado e do seu conhecimento oficioso por parte do tribunal.- Cf. Acs Rl Coimbra, de 06.01.87, BMJ 363º-608, e de 29.06.06. in www.itij.pt Ainda que no âmbito de um processo de jurisdição voluntária como são os tutelares cíveis, assim o refere o art.º 150º da LTM, aqueles valores são também de acautelar, designadamente o último, ainda que as decisões possam ser alteradas conforme o previsto no art.º 1411º, nº 1, do CPC - Cf. Alberto dos Reis, “Processos Especiais”, Vol. II, reimpressão, pg 403. No entanto, e não obstante o que fica mencionado, há de facto no concreto domínio em que nos encontramos, fortes razões de harmonização das decisões e que dão fundamento aos desvios previstos no art.º 154º, nº 1, á regra geral de competência estabelecida no art.º 155º do LTM, bem como nos artºs 79º, nº 1, e 81º, nº 1, da LPCJP e artºs 31º, nº 1, e 43º, nº 3, da LTE, já acima indicados, e que decorre primordialmente do interesse do menor que importa acautelar, o qual se encontra expressamente estatuído no art.º 148º, nº 1, e tendo ainda em consideração o disposto no art.º 147º-A, daquele primeiro diploma, art.º 4º do segundo e, art.º 2º do último, às quais juntam-se aquelas outras razões de racionalidade do sistema e de economia processual. Em nosso entender, e perante o que fica mencionado, só poderá pois haver lugar à apensação de ações, considerando o elemento de prioridade e sem importar qual deles tenha sido instaurado em primeiro lugar, tutelar cível, de promoção e educação ou tutelar educativo, se, em qualquer dessas situações, ocorrer a necessidade de uma apreciação conjunta da situação do menor de modo a permitir a produção de decisões que convergissem harmoniosamente na satisfação das suas necessidades, proporcionando proteção e promoção do menor, por forma a garantir o seu bem estar, desenvolvimento e inserção digna e responsável na sociedade, que é o objetivo visado com os diplomas indicados, no art.º 2º, nº 1, da LTE, os artºs 1º e 3º, nº 1, da LPCJP, e, uma vez mais, o art.º 147º-A da OTM. Ou seja, a apensação de processos carece sempre de uma pré avaliação ao seu conteúdo, não se devendo assumir com um cariz necessário e automático. E mesmo na jurisprudência a propósito da apensação em geral tem-se referido que "A apensação de acções é uma das formas previstas no Código de Processo Civil para, em determinados casos, se recolherem vantagens manifestas de economia processual e se tentar evitar a contradição de julgados, embora não decorrendo de um poder vinculado - Nº Convencional: JTRP00017632-Nº do Documento: RP199603059521045 - Ac. de 05-03-96 da Relação do Porto ". Em suma ,concentrar num só processo e perante o mesmo tribunal ou juízo todos os processos pendentes relativos à mesma criança ou jovem justifica-se neste âmbito, não só ou não tanto por razões de economia processual mas sobretudo por exigência dos princípios do “interesse superior da criança e do jovem” e da “proporcionalidade e actualidade da intervenção” previstos e definidos nas als. a) e e) do art. 4.º da LPCJP, os quais impõem a apreciação em conjunto e de forma harmonizada e actualizada de todas as situações que justificaram a sua instauração. É neste sentido e contexto que a apensação se configura como um acto aglutinador, necessário e útil às finalidades dos processos de promoção e protecção pendentes, de modo a justificar um desvio às regras de competência territorial e/ou da distribuição entre Juízes do mesmo tribunal territorialmente competente, a que o superior interesse da criança e do jovem que caracteriza e domina este tipo de intervenção judicial terá sempre que sobrepor-se. Acontece que, pensamos, que as mesmas razões de utilidade e necessidade não se colocam, pelo menos com a mesma acuidade, relativamente à interdependência entre este processo e o processo de incumprimento do poder paternal. Neste incidente, o que de facto se vai apreciar é a conduta do progenitor faltoso e a respectiva sanção para tal conduta. Se ocorre mesmo o pagamento, o processo pode até findar. Em suma este incidente normalmente não contém quaisquer elementos relevantes sobre a criança ou jovem para as finalidades concretas do novo processo. Não podemos esquecer que toda a OTM, designadamente a parte atinente à regulação do exercício do poder paternal, tem como princípio enformador supremo, a defesa dos interesses e direitos dos menores.- artº 2.º e 180.º da OTM. Acresce que, em nosso entender é o Tribunal aonde o processo se encontra que tem um conhecimento mais aprofundado e próximo das condições de vida dos menores, progenitora com quem os menores se encontrava, seus problemas, dramas e vicissitudes ocorridas nesta comarca e que levaram à intervenção por mais de uma vez da comissão de proteção. Ou seja a razão de intervenção do Tribunal aconteceu nesta comarca aonde os menores já vivem com a progenitora desde pelos menos 2010, sendo que em Sintra apenas reside o progenitor o qual segundo consta do artº 4 do requerimento apresentado para abertura deste processo “ manifesta profundo desinteresse pela vida dos menores” Seguir-se-ia portanto, de tudo quanto foi dito, que caberia ao juízo aonde este processo se encontra, a competência para conhecer do presente processo de promoção por aplicação da regra geral determinada pela distribuição, posto não haver motivo no caso vertente para que pudesse ser afastada. De anotar recente acórdão desta Relação de Guimarães datado de 31.01.2013 o qual exclui a apensação no caso de o processo a apensar respeitar a mais do que um menor, tal como ocorre no caso em apreço. Escreve-se em tal acórdão o seguinte: No caso sub judice, os autos de Regulação das Responsabilidades Parentais e os de Promoção e Proteção n.º 3281/12,3TBGMR, não respeitam a um só e mesmo menor, como a lei indica com vista à sua apensação, mas a dois irmãos, os menores, V… … e B… …, e, assim, consideramos estar excluída no caso concreto a regra de competência por conexão e apensação previstas nos n.º 1 e 2 do art.º 154º da OTM, como expressamente resulta do n.º3, parte final, do citado preceito legal ( “3 – O disposto no n.º1 não se aplica às providências tutelares cíveis que digam respeito a mais que um menor” ), e artigo 81.º, n.º 1, da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo (LPCJP) – (“1 – Quando relativamente à mesma criança ou jovem forem instaurados sucessivamente processos de promoção e proteção, tutelar educativo ou relativos a providências tutelares cíveis, devem os mesmos correr por apenso, sendo competente para deles conhecer o juiz do processo instaurado em primeiro lugar ). Síntese conclusiva . A apensação de processos carece sempre de uma pré avaliação ao seu conteúdo, não se devendo assumir com um cariz necessário e automático. . Só poderá pois haver lugar à apensação de ações, considerando o elemento de prioridade e sem importar qual deles tenha sido instaurado em primeiro lugar, tutelar cível, de promoção e educação ou tutelar educativo, se, em qualquer dessas situações, ocorrer a necessidade de uma apreciação conjunta da situação do menor de modo a permitir a produção de decisões que convergissem harmoniosamente na satisfação das suas necessidades, proporcionando proteção e promoção do menor, por forma a garantir o seu bem estar, desenvolvimento e inserção digna e responsável na sociedade, que é o objetivo visado com os diplomas indicados, no art.º 2º, nº 1, da LTE, os artºs 1º e 3º, nº 1, da LPCJP, e, uma vez mais, o art.º 147º-A da OTM. DECISÃO Face a tudo quanto fica exposto, acordam pois os Juízes que compõem a 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães em atribuir ao 3º Juízo do Cível do Tribunal Judicial da comarca de Guimarães a competência para conhecer do presente processo de promoção e proteção Sem custas. Guimarães, 16 de Janeiro de 2014 Purificação Carvalho Espinheira Baltar Henrique Andrade |