Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1319/09.0TJVNF-A.G1
Relator: MANSO RAINHO
Descritores: APOIO JUDICIÁRIO
NOMEAÇÃO DE PATRONO
INTERRUPÇÃO DO PRAZO
REVOGAÇÃO DE MANDATO
EXTINÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/29/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: JULGADA IMPROCEDENTE
Sumário: I. Quando o pedido de apoio judiciário tendente à nomeação de patrono é apresentado na pendência de uma ação judicial, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo.
II. Para que tal efeito interruptivo se verifique não é necessário, nem tal faria sentido, que a parte que requereu a nomeação de patrono revogue o mandato que conferiu oportunamente ao advogado que a vinha representando, não se aplicando nem se ajustando ao caso o art. 47º do CPC.
III. Com a nomeação de patrono fica automaticamente extinta a preexistente relação de mandato, por aplicação (por analogia de situações) do art. 1171º do Código Civil.
Decisão Texto Integral: Acordam em conferência na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

AA…, judiciariamente representada por advogado, demandou, pelo Tribunal Judicial de Vila Nova de Famalicão e em autos de ação declarativa com processo na forma ordinária, BB e CC, e Outros.
A final foi proferida sentença que julgou improcedente a ação e parcialmente procedente a reconvenção que fora deduzida.
Dentro do prazo em que podia recorrer, atravessou a própria Autora requerimento onde aduzia que o prazo em curso se havia de suspender, por isso que apresentara pedido de apoio judiciário tendente à nomeação de patrono. Juntou o documento comprovativo da apresentação de tal pedido.
Foi então proferido despacho a declarar interrompido o prazo em curso.

Inconformados com o assim decidido, apelam os Réus e reconvintes António Pereira Salsa e mulher.

Da respetiva alegação extraem as seguintes conclusões:

1. O despacho de fls. 500 que declarou interrompido o prazo de recurso em curso nos termos do artigo 24.0 da Lei do Apoio Judiciário é ilegal;
2. Esta norma visa defender os cidadãos que não têm advogado, nem tem possibilidades económicas de constituir um e se encontram processos pendentes com prazos em curso.
3. Nos presentes autos A./Recorrida tem mandatário constituído.
4. Não consta dos autos qualquer renúncia ou revogação à procuração outorgada ao mandatário constituído pela A./Recorrida.
5. A junção aos autos do requerimento de apoio judiciário com a modalidade de nomeação de patrono, não possui por si só a virtualidade de revogar os poderes que foram concedidos ao mandatário constituído.
6. O que quer dizer que o mandato forense mantém-se incólume, continuando a causídica constituída em plenas funções, recaindo sobre ela o dever de assegurar o patrocínio na salvaguarda dos interesses da sua constituinte, e representá-la em todos os actos e termos do processo, mesmo perante os tribunais superiores nos termos do artigo 44º do CPC.
7. A intenção do legislador vertida no artigo 24º nº 4 do LAJ é suspender os prazos em curso quando a parte se encontra desacompanhada de advogado, tal não se verificando e estando a A./Reconvinte devidamente patrocinada, qualquer fundamento existe à interrupção do prazo de recurso.
8. A não ser assim, está encontrada a forma de se interromper prazos judiciais quando o decurso do mesmo é desfavorável para a parte, como é o caso dos autos.
9. O despacho de fls. 500 viola os artigos 24º nº 4 da Lei do apoio judiciário e os artigos, 43.°, 44.º e 47.º do CPC.

Terminam dizendo que deve ser revogado o despacho recorrido e substituído por outro que declare não interrompido o prazo pela existência de mandatário constituído pela Recorrida.

+

A Autora, a quem entretanto foi nomeado patrono, apresentou, representada por este, contra alegação, onde conclui pela improcedência da apelação.

+

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir, tendo-se sempre presentes as seguintes coordenadas:
- O teor das conclusões define o âmbito do conhecimento do tribunal ad quem, sem prejuízo para as questões de oficioso conhecimento, posto que ainda não decididas;
- Há que conhecer de questões, e não das razões ou fundamentos que às questões subjazam;
- Os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido.

+

É questão a conhecer a de saber se o prazo em curso podia ou não ser tido por interrompido.

+

Plano Factual:

Dão-se aqui por reproduzidas as incidências fático-processuais acima indicadas.


Plano jurídico-conclusivo:

Como resulta expresso do nº 4 do art. 24º da LAJ (Lei nº 34/2004), quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de uma ação judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo.
Foi o que se passou no caso vertente, e daqui que ao tribunal recorrido não restava senão, como fez, que declarar interrompido o prazo então em curso, o prazo para se recorrer da sentença que fora proferida.
Em sítio algum se exige na lei, para que tal efeito interruptivo ocorra, que a parte que tenha mandatário constituído revogue prévia ou coevamente o mandato, ou que o mandatário renuncie ao mandato. E se a lei não distingue, também o intérprete o não deve fazer.
Invocam os Apelantes o art. 47º do CPC em defesa do seu entendimento.
Mas a verdade é que tal norma não vem nada ao caso. Pois que o que lhe está subjacente é a vontade do mandante (ou do mandatário) em pôr fim à relação de mandato por não lhe convir mantê-la, enquanto que no caso vertente do que se trata é da atuação do regime do apoio judiciário, aqui pois em decorrência da incapacidade económica da mandante em ordem a manter a relação de mandato. Se na primeira situação se compreende que a revogação ou a renúncia não tenha por que determinar desde logo a sustação do processo, já o mesmo não faz sentido na segunda situação, sob pena até de obrigar o mandante a ter de continuar a prestar serviços a quem declaradamente os não poderá pagar.
Por isso, a questão nada tem a ver com os alegados (pelos Apelantes) deveres deontológicos de defender (continuar a defender) os direitos da Autora, mas simplesmente com a opção, imperativa, da lei em fazer interromper o prazo em curso até que o incidente esteja solucionado. Acresce dizer que a declaração do mandante, neste caso a Autora, de que requereu a nomeação de patrono, não pode deixar de valer para todos os efeitos como uma verdadeira declaração tácita de revogação do mandato que fora contratado anteriormente. Revogação essa a que, pela sobredita razão, não cai no âmbito do art. 47º do CPC, mas sim do art. 1171º do CCivil (por analogia de situações), e daqui que o mandato se extingue sem mais a partir do momento em que é conhecida a nomeação do patrono no âmbito do apoio judiciário.
Improcede pois a apelação, censura alguma merecendo o despacho recorrido.

+

Sumário (art. 663º nº 7 do CPC):
I. Quando o pedido de apoio judiciário tendente à nomeação de patrono é apresentado na pendência de uma ação judicial, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo.
II. Para que tal efeito interruptivo se verifique não é necessário, nem tal faria sentido, que a parte que requereu a nomeação de patrono revogue o mandato que conferiu oportunamente ao advogado que a vinha representando, não se aplicando nem se ajustando ao caso o art. 47º do CPC.
III. Com a nomeação de patrono fica automaticamente extinta a preexistente relação de mandato, por aplicação (por analogia de situações) do art. 1171º do Código Civil.

+
Decisão:

Pelo exposto acordam os juízes nesta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando a decisão recorrida.

Regime de custas:

Os Apelantes são condenados nas custas da apelação.
+
Guimarães, 29 de janeiro de 2015
Manso Rainho
Carlos Guerra
Conceição Bucho