Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1030/04-2
Relator: ESPINHEIRA BALTAR
Descritores: APOIO JUDICIÁRIO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 11/03/2004
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário: 1-O pedido de Apoio Judiciário na modalidade de “dispensa de pagamento de honorários do patrono escolhido pelo requerente não é equivalente ao da nomeação e pagamento de honorários”, para efeitos da interrupção do prazo judicial, previsto no artigo 25 n.º 4 da lei 30-E/2000 de 30 de Dezembro.
2 – Há uma diferença substancial entre estas duas modalidades de Apoio Judiciário. Na de “ nomeação e pagamento de honorários do patrono” ainda não está nomeado patrono, pelo que existia o risco de indefesa do requerente do Apoio Judiciário se não se estabelecesse a interrupção do prazo em curso. Na outra, o patrono, estando constituído, aquando do pedido de Apoio Judiciário, com a sua indicação pelo requerente, poderá já tomar a defesa do requerente no processo.
3 – Assim, a modalidade de Apoio Judiciário “ pagamento de patrono escolhido pelo requerente” não se enquadra na previsão do artigo 25 n.º 4 da lei 30-E/2000 de 20 de Dezembro, não se interrompendo o prazo judicial, porque existe patrono com legitimidade para intervir no processo e fazer a defesa necessária ao requerente.
Decisão Texto Integral: Acordam em Conferência na Secção Cível da Relação de Guimarães

Agravo 1030/04 - 2ª
Embargo de Executado 163-B/99
Tribunal Judicial Esposende – 1º Juízo
Relator Des. Espinheira Baltar
Adjuntos Des. Silva Rato
Des. Carvalho Martins

"A" propôs acção executiva sob a forma ordinária contra "B" e mulher "C".

Estes deduziram embargos de executado, que foram apresentados em juízo a 4 de Novembro de 2003.

Foram indeferidos liminarmente no que se refere à pessoa da embargante por terem sido apresentados fora de prazo, uma vez que o prazo do embargante não se estende à embargante, porque os embargos são uma acção e não uma contestação, em que se aproveita o prazo mais longo.

Inconformada com o decidido, interpôs recurso de agravo formulando as seguintes conclusões:

3.1 - Quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de acção judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo (vd. art.º 25º, n.ºs 4 e 5 da Lei n.º 30-E/2000, de 20/12);

3.2- E nesse caso o prazo interrompido nos termos expostos no item anterior reinicia-se a partir da notificação ao patrono nomeado da sua designação;

3.3- Não há, pois, que distinguir se o pedido de apoio judiciário consiste na «nomeação e pagamento de honorários de patrono» ou, como nos presentes autos, no de «pagamento de honorários do patrono escolhido pelo requerente»;

3.4- Ora, tendo a citação da executada ora agravante (nos termos e para os efeitos dos art.ºs 806º, n.º2 e 808º, n.º1 do CPC) sido efectuada em 7/10/2004, o prazo de 20 dias para a mesma deduzir embargos de executado e oposição à liquidação só começou a decorrer em 31/10/2003, ou seja, no dia seguinte ao da notificação do ora signatário nos termos e para os efeitos previstos nos art.ºs 25º, n.ºs 4 e 5, 27º n.º1 e 33º da lei n.º 30-E/2000, de 20/12.

3.5- E, assim sendo, quando em 4/11/2003 a petição dos embargos de executado e da oposição à liquidação deram entrada neste tribunal, o aludido prazo de 20 dias ainda não se tinha esgotado.

3.6- Pelo que, ao ter decidido como decidiu, o despacho recorrido viola as normas dos art.º 25º n.ºs 4 e 5, 33º e 50º da Lei n.º 30-E/2000, de 20/12 e dos art.ºs 806º, n.º2 e 816º, n.º1 do CPC.
Termos em que no integral provimento do presente recurso, a decisão recorrida deverá ser revogada e substituída por outra que, no pressuposto de que o documento entrado em juízo em 23/04/2003 nos autos da execução interrompeu os prazos em curso nos autos, admita liminarmente os embargos de executado também no que à executada ora agravante diz respeito.

Não houve contra alegações.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

Para efeitos do recurso, damos como assente os seguintes factos:
1 – A acção executiva proposta por "A" contra "B" e mulher "C" deu entrada em Juízo a 24 de Junho de 2003 ( doc. fls.42).
2 – "B" e mulher, juntaram a 23 de Abril de 2003 um requerimento ao processo executivo com o n.º 163-B/99, subscrito pelo advogado R... S..., com procuração nos autos, instruído com dois documentos que se referem ao requerimento do apoio judiciário para os efeitos previstos no artigo 25 n.º 4 e 5 da lei 30-E/2000 de 20/12 ( doc. fls. 59).
3 – O "B" e mulher "C" subscreveram um requeriemnto cada um, dirigido ao departamento da Segurança Social Competente, pedindo o Apoio Judiciário para deduzir embargos no processo executivo com forma ordinária n.º 163-B/99, nas modalidades “dispensa total de pagamento de taxa de justiça e pagamento de honorários do patrono escolhido pelos requerentes”, que entregaram a 22 de Abril de 2003 ( doc. fls. 60 a 64).
4 – A 30 de Abril de 2003, foi dada uma informação ao juiz, no processo executivo 163-B/99, no sentido de que “os executados/requerentes têm procuração passada a favor do ilustre subscritor do requerimento que antecede, a fls. 70 a 74 dos autos de arresto apensos 163-A/99). O juiz, em face desta informação, proferiu o seguinte despacho – “ Os requerentes têm mandatário constituído nos autos pelo que não tem qualquer aplicação o disposto no artigo 25 n.º 4 da lei 30-E/2000 de 20/12, que visa evitar os efeitos de decurso do prazo sem que a parte esteja patrocinada ( doc. fls. 65).
5 – O Advogado R... S... foi notificado pela Ordem dos Advogados a 30 de Outubro de 2003, que foi nomeado patrono oficioso à "C", para o processo 163-B/99 que corre termos pelo 1º Juízo do Tribunal Judicial de Esposende ( doc. fls. 73).
6 – A recorrente foi citada para a execução a 7 de Outubro de 2003 ( doc. fls. 86).
7 – Na Acção Ordinária que correu termos pelo 1º Juízo do Tribunal Judicial de Esposende, com o número 163/99, em que foram réus "B" e mulher e autor "A", aqueles constituíram seu mandatário judicial o advogado R... S... ( doc. fls. 51 a 58).

Das conclusões, ressalta a seguinte questão:

O pedido de Apoio Judiciário na modalidade de “dispensa de pagamento de honorários do patrono escolhido pelo requerente é equivalente ao da nomeação e pagamento de honorários do patrono”, para efeitos da interrupção do prazo judicial, prevista no artigo 25 n.º 4 da Lei 30-E/2000, de 20/12.

O artigo 25 n.º 4 da Lei 30-E/2000 de 2012, visa acautelar os interesses daqueles que, não tendo capacidade económica para exercerem os seus direitos em juízo, venham requerer o apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, cabendo ao Estado o pagamento dos custos pelos serviços prestados pelo patrono nomeado pela Ordem dos Advogados. Pois, se não houvesse a interrupção do prazo judicial, poderia acontecer que o pedido de apoio judiciário não fosse decidido a tempo de ser nomeado um patrono, ou em prazo, mas ficando este mais curto para organizar a defesa, o que implicaria uma desigualdade entre as partes. Na verdade, as que não tivessem poder económico para constituírem mandatário judicial, veriam o seu direito de acesso aos tribunais gravemente afectado, porque não poderiam defender-se nas mesmas circunstâncias que aqueles que gozam de capacidade económica para o fazer.

Em face da teleologia deste normativo, é de concluir que há uma diferença substancial entre estas duas modalidades de apoio judiciário. Na de “ nomeação e pagamento de honorários do patrono” ainda não está nomeado patrono, pelo que existia o risco de indefesa do requerente do apoio judiciário se não se estabelecesse a interrupção do prazo em curso. Na outra, o patrono, estando já nomeado, aquando do pedido de apoio judiciário, com a sua indicação pelo requerente, poderá já tomar a defesa do mandante, no processo. A questão do apoio judiciário cinge-se apenas ao pagamento dos honorários, pelos serviços prestados pelo patrono já constituído, nada impedindo que o processo continue, sem qualquer prejuízo para o requerente.

Daí que a actividade do patrono não esteja condicionada com a decisão sobre o pedido de apoio judiciário. Apenas esta decisão irá reflectir-se na determinação de quem irá pagar os honorários pelos serviços prestados, se o Estado ou o requerente, conforme seja deferido ou não o pedido formulado, junto das autoridades administrativas competentes.

O certo é que o patrono em causa tem legitimidade para intervir no processo, por força da indicação do requerente, sendo os seus honorários pagos ou pelo Estado ou pelo requerente.

Daí que a modalidade de apoio judiciário “ pagamento de honorários de patrono escolhido pelo requerente”, não se enquadre na previsão do artigo 25 n.º 4 da lei 30-E/2000 de 20/12. O que quer dizer que, nesta situação, não se interrompe o prazo judicial, porque existe patrono com legitimidade para intervir no processo e fazer a defesa necessária ao requerente.

Apenas a de “ nomeação e pagamento de honorários de patrono” tem aplicação ao caso do normativo referido, porque ainda não existe patrono. Espera o requerente que o Estado, através da Ordem dos Advogados, nomeie um para poder fazer-lhe a defesa adequada ao caso. Esta é a doutrina do acórdão 467/2004 de 23 de Junho, do Tribunal Constitucional, publicado no D. R. II série, n.º 190 de 13 de Agosto, pag. 12208 a 12211, que se debruçou sobre a diferença material destas duas modalidades de apoio judiciário, para decidir sobre a inconstitucionalidade da interpretação diferenciada das duas modalidades de apoio judiciário, por violação do princípio da igualdade das partes e do acesso aos tribunais, em que a de “ pagamento de honorários do patrono escolhido pelo requerente”, não se subsumia ao n.º 4 do artigo 25 da lei 30-E/2000 de 20/12.

E esta questão vem na sequência duma decisão no 5º Juízo Cível da Comarca de Guimarães, proferida a 17 de Dezembro de 2003, que foi no sentido do acima exposto, seguindo a doutrina do acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 8 de Janeiro de 2003, proferido no agravo 1487/2002. E esta é a jurisprudência dominante deste Tribunal Superior, ( conferir - Crónica do Tribunal Relação de Guimarães, SCIENCIA IVRIDICA, SEPARATA, Janeiro – Abril 2004, Tomo LIII – N.º 298, pag. 180 – Ac. de 29/10/03, proc.1645/03, 1ª Secção; Ac. de 10/03/04, recurso 2010/04, 2ª Secção, sendo Relator – Silva Rato).

Aplicando a doutrina ao caso sub judice, é de concluir que a apresentação da petição de embargos pela embargante foi intempestiva, porque não há interrupção do prazo judicial, nos termos do artigo 25 n.º 4 da lei 30-E/2000 de 20/12, uma vez que estamos perante um pedido de apoio na modalidade de “ pagamento de honorários do patrono escolhido pelo requerente” e não na de “ nomeação e pagamento de honorários de patrono”.

Mesmo que assim se não entenda, temos que ponderar que o patrono indicado pela requerente, no pedido de apoio judiciário, estava constituído mandatário na acção principal, que deu origem ao processo executivo, e no arresto que estava apenso aos autos. O que quer dizer que estamos perante um mandato devidamente constituído, que produziu os seus efeitos judiciários, em todos os processos, nos termos do artigo 36 e 37 do CPC.. Assim, até que houvesse revogação ou renúncia do mandato nos termos legais, o mandatário estava constituído e podia deduzir a defesa adequada no processo executivo, onde foram deduzidos os embargos.

Assim, o pedido judiciário na modalidade já referida, nunca poderia produzir os efeitos pretendidos, de interrupção do prazo, porque o pedido apenas iria produzir efeitos para o futuro, o que viria a acontecer depois de expirado o prazo para deduzir os embargos.

Além disso, teremos de ter em conta o despacho do juiz, que se pronunciou sobre o requerimento, junto aos autos de execução, a 23 de Abril de 2003, que decidiu no sentido de estar constituído mandatário, não se aplicando o disposto no artigo 25 n.º 4 da lei 30-E/2000 de 20/12. Isto é, o prazo não se interromperia. E o certo é que tal despacho não foi objecto de recurso, pelo que produziu efeitos de caso julgado formal. Daí que o recorrente não possa fazer uso do requerimento e documentos juntos, a comunicar o pedido de apoio judiciário, a 23 de Abril de 2003, para agora fazer funcionar a interrupção do prazo judicial ao abrigo do artigo 25 n.º 4 da lei 30-E/2000 de 20/12.

Em face de todo o exposto, é de concluir que o prazo judicial não se interrompeu, e os embargos deduzidos pela recorrente foram apresentados fora de prazo.

Decisão

Pelo exposto, acordam os juizes da Relação em negar provimento ao recurso.

Custas pela recorrente.

Guimarães,