Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
970/13.9TBPTL.G1
Relator: MARIA DOS ANJOS NOGUEIRA
Descritores: EMPREITADA
DEFEITO DA OBRA
RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
RESPONSABILIDADE EXTRA CONTRATUAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 01/12/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário: I - O regime especial, constante dos artigos 1218.º e seguintes do Código Civil tem como objecto limitado o dano da existência de defeitos na obra realizada em cumprimento de um contrato de empreitada, não se aplicando aos danos sequenciais desses defeitos, como sejam os danos colaterais no objecto da obra, onde inclui os danos não patrimoniais.
II - Nos casos em que ocorre um concurso ideal dos dois regimes de responsabilidade, o da responsabilidade contratual consome o da responsabilidade extracontratual, sendo ele o aplicável, uma vez que entre lesante e lesado existe uma relação obrigacional na qual ocorreu o facto lesivo, justificando-se, pois, a sobreposição da responsabilidade adequada à violação do contrato.
Decisão Texto Integral: Relatora - Maria dos Anjos S. Melo Nogueira
1º Adjunto: Desembargador José Carlos Dias Cravo

2ª Adjunta: Desembargador António Manuel Antunes Figueiredo de Almeida

v

Sumário do acórdão (art. 663.º n.º 7, do CPC):

I - O regime especial, constante dos artigos 1218.º e seguintes do Código Civil tem como objecto limitado o dano da existência de defeitos na obra realizada em cumprimento de um contrato de empreitada, não se aplicando aos danos sequenciais desses defeitos, como sejam os danos colaterais no objecto da obra, onde inclui os danos não patrimoniais.

II - Nos casos em que ocorre um concurso ideal dos dois regimes de responsabilidade, o da responsabilidade contratual consome o da responsabilidade extracontratual, sendo ele o aplicável, uma vez que entre lesante e lesado existe uma relação obrigacional na qual ocorreu o facto lesivo, justificando-se, pois, a sobreposição da responsabilidade adequada à violação do contrato.

v

- ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES -


1-Relatório:
A intentou a presente acção declarativa de condenação contra B pedindo a condenação desta na reparação de diversos defeitos de que padece a sua moradia e, subsidiariamente, se tal não for possível, a redução do preço, ou subsidiariamente, a pagar-lhe a quantia de € 15.700,00 relativa à reparação dos defeitos e, em qualquer caso, a condenação da ré no pagamento de uma indemnização no valor de € 5.500,00 pelos danos não patrimoniais sofridos.
Para o efeito, alegou que celebrou com a ré um contrato de empreitada mediante o qual esta se obrigou à construção de uma moradia, pronta a habitar, mediante o preço de € 93.000,00 e que a moradia padece de diversos defeitos, cuja reparação pretende obter mediante a presente acção.

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Citada a ré veio contestar, desde logo, invocando a excepção da caducidade, uma vez que o autor não exerceu os seus direitos no prazo de um ano a contar da denúncia dos mesmos.
Defendeu-se ainda por impugnação e deduziu incidente de intervenção de terceiro, alegando que, para a parte da pintura, celebrou com C um contrato de subempreitada, pelo que a ser condenada relativamente à reparação dos defeitos na pintura terá direito de regresso sobre o mesmo.

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O incidente foi admitido e citado o terceiro, o qual contestou defendendo-se por excepção, alegando a caducidade dos direitos da ré sobre si, e por impugnação.
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O autor foi convidado a esclarecer qual a data em que teve conhecimento dos defeitos, tendo apresentado requerimento de resposta ao convite.
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Realizou-se audiência prévia, com fixação do objecto do processo e dos temas da prova, após o que foi realizado o julgamento e proferida sentença que julgou procedente a excepção peremptória de caducidade alegada pela ré e pelo interveniente e consequentemente julgou caduco o direito de o autor exigir a reparação/eliminação dos defeitos da obra, pagamento do preço relativo à reparação ou redução do preço da obra, bem como julgou parcialmente procedente o pedido de indemnização formulado pelo autor e, nessa medida, condenou a ré a pagar ao autor a quantia de € 4.000,00 (quatro mil euros), a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos, acrescida de juros legais, vencidos e vincendos, desde a citação até pagamento.
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II. O Recurso
Não se conformando com a decisão proferida veio a Ré apresentar recurso, nele formulando as seguintes CONCLUSÕES:
1- Entendeu a Meritíssima Juiz a quo que não se provou que a recorrente não mandou construir o muro de suporte de terras, dando como não provado tal facto.

2.- Perguntado ao sócio gerente da recorrente quem é que construiu esse muro, este respondeu Esse muro foi o Senhor M, não sei o nome completo, sei que, M chega.” 00:06:34 a 00:06:40.

3.- E perguntado se celebraram o acordo deles um com o outro sem a sua intervenção daquele, este respondeu foi, foi. Ele pagou directamente, nem sei quanto foi o muro, tão pouco.” 00:07:32 a 00:07:39.

4.- Pelo que de tais declarações, resulta evidente que o muro em causa foi construído pelo referido M, sendo que o sócio gerente da recorrente se limitou a pôr o recorrido e aquele em contacto.

5.- Perguntado ao recorrido quem é que pagou ao referido M, este respondeu Pois eu, porque ele já me tinha dado o preço que era 60€ por metro quadrado, e eu depois paguei, como já sabia o preço, paguei-lhe, ele meteu os metros e o Sr. M veio falar comigo e disse que era X, e eu, pronto, simplesmente efectuei o pagamento...” 00:14:14 a 00:14:27.

6.- Perguntado quem é que foi reparar o muro, este respondeu pronto, o muro caiu, como é lógico, foi uma situação muito trágica para nós , como é lógico, devia ser 11 horas da noite naquele dia chovia torrencialmente eu tentei ligar ao Sr. M, pensei que a casa também ía, como é lógico, e o Sr. M veio também, não veio nessa noite, salvo erro não me recordo, sei que no dia a seguir tava a Engenheira, chamei a engenheira, chamei também o Sr. J e o Sr. M, o Sr. M veio mais tarde, o Sr. J disse que não tinha nada a

ver não foi ele que construiu o muro não era problema dele. A Engenheira afinal quem é que fez o muro? O Sr. J dizia que foi o Sr. M. Mas quem o contratou? O Sr. J diz que não fui eu só tinha sido intermediário. A Engenheira R ligou ao Sr. M questionado quem é que o tinha contratado para fazer o muro, O Sr. M disse que foi o Sr. J. Então tem que vir aqui, tem que por este muro de pé, porque isto não pode não é, estava a ocupar a via pública e estava em situação muito dramática podia cair mais pedras e aleijar alguém, depois o Sr. M disse-me que ia lá que punha o muro outra vez de pé, mas ficou combinado entre a engenheira que ele ia lá e punha o muro de pé, só que no dia a seguir disse que o punha de pé mas que teria que pagar metade do muro.” 00:16:16 a 00:17:34.

7.- E refere ainda “o muro foi mal reconstruído.” 01:03:17 a 01:03:18.

8.- E perguntado se a queda do muro em causa foi considerado como deslizamento de terras pela companhia de seguros, este respondeu “Exactamente. Aquilo foi na altura, tinha lá mencionado, discriminadamente deslizamento de terras. O muro também caiu, foi ali uma coisa muito incerta. O que interessa é que o seguro contribuiu após eu fazer pressão, eles tem de contribuir para.” 01:04:33 a 01:04:51.

9.- Perguntado à testemunha M quem o contratou, este respondeu O C que falou comigo.” 00:01:31 a 00:01:32 e continua “Perguntar como fazia (imperceptível) e se queria ir lá fazê-los. Eu disse, eu vou.” 00:01:34 a 00:01:36.

10.- Perguntado quem lhe pagou este respondeu “A mim quem me pagou foi o Sr. P.” 00:02:40 a 00:02:42 e continua “…Chegou ao fim fiz o auto de medição e medi. Já tinha tratado a como era o metro quadrado e quem me pagou foi o P 00:02:50 a 02:56.

11.- Perguntado se tal pagamento foi efectuado com o acordo do legal representante da recorrente, este respondeu, este respondeu “O Sr. J nem sequer interveio nisso.” 00:03:04 a 00:03:07.

12.- Perguntado, despois da queda do muro, se foi contactado para reconstruir o mesmo e por quem, este respondeu que “Pelo Sr. P.” 00:04:01 a 00:04:02 e repetindo, se nessa altura, já foi o recorrido, este respondeu “Sim” 04:04

13.- Perguntado porque razão o muro terá caído, este respondeu “Águas que se meteram para lá, estavam encaminhadas para lá, meteram-se lá e derrubaram o muro.” 00:04:26 00:04:31

14.- Perguntado se foi contactado pelo legal representante da recorrente, este respondeu Sim, fui contactado pelo Sr. J para dar preço para aquele muro, se queria fazer aquele muro.” 00:11:02 a 00:11:09 e continua A partir dali não tive mais nada com o Sr. J. Fiz o muro e depois quem me apareceu para pagar foi o Sr. P 00:11:10 a 00:11:14 e acrescente “é o elo de ligação.” 00:11:18 a 00:11:19.

15.- Perguntado se depois da abordagem pela recorrente no sentido de saber o preço para fazer o dito muro, os contactos foram com o recorrido, este respondeu “foi a partir dali” 00:11:47 a 00:11:50 e continua “a partir dali não tive mais nada com o C” 00:11:50 a 00:11:52.

16.- Perguntado perante quem no fundo se sentia obrigado, este respondeu “Perante o P, que foi quem nos pagou.” 00:17:47 a 00:17:49.

17.- De todos estes depoimentos forçoso será concluir que o muro em causa não foi construído pela recorrente, mas antes pela testemunha M, não lhe podendo ser assacada qualquer responsabilidade.

18.- Deste modo, e face a toda a prova produzida entendemos que a matéria de facto constante dos artigos 36º e 40º da contestação deveria ter sido dado como assente, e em consequência deve ser eliminado o número 14 da matéria dado como não provada para ser incluída na matéria dada como assente.

19.- Tendo sido declarado caduco o direito do recorrido, deveria o direito à indemnização ser declarado caduco.

20.- Como refere e bem a Meritíssima Juiz a quo para que exista direito à indemnização a título de danos não patrimoniais é necessário que se possa estabelecer um nexo de causalidade entre a desconformidade e os danos.

21.- Pelo que, para que o recorrido seja indemnizado pelo pânico, medo, insegurança e inquietação provocado pela queda do muro, tem de se dar como provado que o muro foi construído pela recorrente, o que da prova produzida não resulta, atento tudo o supra exposto.

22.- Mas mesmo que assim se não entendesse, o que só por mera cautela se encara, para que exista tal nexo de causalidade, entendemos que, da matéria dada como assente, deveria poder concluir-se que a queda deveu-se à má execução do mesmo, e a verdade é que tal não consta dos factos dados como provados.

23.- Para dar como provado o facto constante no nº31, a Meritíssima Juiz a quo teve em consideração a prova pericial, a qual indiciou sobre o muro que se encontra construído nesta data e que foi realizado pelo construtor M, já que consta dos factos dados como assentes sob o número 15 que “o construtor M procedeu à reparação do mesmo” (entenda-se muro).

24.- Quanto aos factos constantes nos números 27, 28, 29, e 30 da matéria dada como assentes na douta sentença, importa referir que, pese embora não constar dos factos dados como assentes, tais partes da obra não ficaram a cargo da recorrente, como se escreve na douta fundamentação, e muito bem, já que corresponde à prova produzida na audiência de julgamento.

25.- A referida indemnização deverá ser proporcional à gravidade do dano, tomando em conta para a sua fixação as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida.

26.- Ora, entendemos que o facto da habitação apresentar um aspecto degradado, conceito genérico e abstracto, cuja degradação desconhecemos a origem, não pode ser qualificado de suficientemente grave para permitir o seu ressarcimento e uma vez que não há resultou qualquer condenação da recorrente na resolução dos alegados defeitos, não poderá também haver condenação em danos não patrimoniais.

27.- Por conseguinte, entendemos que o recorrido não tem direito a qualquer compensação a título de danos não patrimoniais, por não existir qualquer nexo de causalidade e qualquer dano a indemnizar.

28.- Porém, mesmo que assim se não entenda, o que só por mera cautela se encara, tal indemnização nunca poderá ser superior à quantia de EUR: 250,00 por se entender ser esta ajustada e equitativa, viabilizando o fim a que se destina, à luz dos critérios enunciados no artigo 496º, do Código Civil.

29.- A douta sentença violou por errada interpretação os artigos 496º e 1224º nº1 do C.C. e artigo 12º da Lei do Consumidor, e 607º nº4 e 5 do C.P.C..

Os AA. apresentaram as suas contra-alegações, pedindo, a final, que seja negado provimento ao presente recurso, julgando-o improcedente, mantendo-se, assim, a sentença recorrida nos seus precisos termos.


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III. Fundamentação:
Factos Provados
1. Está registado a favor do autor um prédio urbano, sito no lugar de F, freguesia da A, concelho de Ponte de Lima, prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia da Arcozelo, sob o artigo matricial nº… e descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponte de Lima sob o nº….
2. Sendo anteriormente uma parcela de terreno destinada à construção, com o artigo matricial nº e pretendendo o autor nela construir uma moradia para aí fixar a sua residência, celebrou verbalmente um acordo com a ré, mediante o qual aquela se obrigou a construir a referida moradia.
3. A moradia seria construída de acordo com o projecto já aprovado e na sequência do orçamento junto a fls. 23, fornecido e assinado pela ré.
4. Para tanto, foi acordado que o autor pagaria à ré pela moradia pronta a habitar, a quantia de 93.000,00€ (noventa e três mil euros).
5. Os pagamentos fizeram-se conforme o andamento da obra e sempre que solicitado pela ré.
6. O autor efectuou os seguintes pagamentos directamente à ré:
- 5.000,00 € em 18-10-2007, pelo cheque nº 8331586193, sacado sobre a Caixa Geral de Depósitos;
- 5.000,00€ em 26-11-2007, através de numerário;
- 15.000,00€ em 07-02-2008, através de numerário;
- 10.000,00€ em 17-06-2008, pelo cheque nº 5948950974, sacado sobre a Caixa Geral de Depósitos;
- 1.200,00€ em 06.11.2008, pelo cheque n.º 7463436726, sacado sobre a Caixa Geral de Depósitos;
- 6.000,00 € em 12-12-2008.
7. Acontece que, para a construção da referida moradia, a ré contratou subempreiteiros das várias especialidades, nomeadamente, para realização dos trabalhos de carpintaria e pintura, tendo solicitado ao autor para fazer os pagamentos directamente aos mesmos, pelo que estes emitiram as respectivas facturas em nome do autor.
8. A obra foi concluída em 20 de Outubro do ano de 2008, altura em que foi ocupada pelo autor e sua família.
9. Três meses após a entrega da moradia ao autor, em Janeiro de 2009, caiu parte do muro de suporte de terras e vedação, que possui 40 metros de cumprimento, entre 5 e 7,5 metros de altura.
10. E conformidade com o referido em 7 foi pago:
- 1.552,50€ em 30-04-2008 a J, pelos serviços de ladrilhador;

- 5.757.50 € em 26-05-2008 a I, pelos serviços de estucagem;
- 375,00 € em 25-07-2008 a V, pelos serviços de carpintaria;
-1.000,00 € em 20-08-2008 a A, pelos serviços de pintura;
- 3.390,00 € em 21-08-2008 a V, pelos serviços de carpintaria;
- 3.350,00 € em 18-09-2008 a V, pelos serviços de carpintaria;
- 700,00 € em 18-09-2008 a V, pelos serviços de carpintaria;
- 5.000,000 em 26-06-2008 a B, através do cheque nº 6848950973, sacado sobre a Caixa Geral de Depósitos, pelos serviços de electricista;
-1.000,00 € em 26-06-2008 a J, através do cheque nº 7748950972, sacado sobre a Caixa Geral de Depósitos.
11. Pela aquisição de bens e materiais pela ré para a construção da referida moradia, pagou também o autor, a pedido daquela, directamente a fornecedores:
- 4.035,00 € em 19-10-2007 a B, através do cheque nº 1331586190, sacado sobre a Caixa Geral de Depósitos;
- 10.000,00€ em 26-11-2007 a G, sendo 5.000,00 € através do cheque nº 0431586191, sacado sobre a Caixa Geral de Depósitos;
- 9.000,00€ em 19-06-2008 a J. pelo fornecimento de bens;
- 799,99 € em 29-07-2008 à M, pelo fornecimento de um fogão de aquecimento;
- 255,00 € em 18-08-2008 à M, pelo fornecimento de umas escadas para sótão;
- 9.999,54 € em 09-10-2008 a G;
- 3.400,0 em Outubro de 2008 a C. através do cheque nº 7758675998, sacado sobre a Caixa Geral de Depósitos;
- 1.000,00 € em Outubro de 2008 a A, através do cheque nº6858675999, sacado sobre a Caixa Geral de Depósitos;
- 2.509,00 € em Outubro de 2008, a D, através do cheque nº 5958676000, sacado sobre a Caixa Geral de Depósitos.
12. A licença de utilização para habitação foi autorizada pela Câmara Municipal de Ponte de Lima através do despacho de 30.10.2008.
13. A queda do muro causou ao autor pânico, medo insegurança e inquietação.
14. O autor chamou a ré.
15. O construtor M procedeu à reparação do mesmo.
16. Nessa ocasião, o autor colocou caleiros e tubos de alumínio lacados à volta da moradia para evitar o acumular de águas e encharcamento de terras.
17. Tendo pago a quantia de € 400,00 pelos mesmos.
18. No inverno de 2009/2010, o autor começou a notar tinta a descascar e fendas nas paredes interiores e exteriores da moradia.
19. Por carta datada de 12/01/2010, o autor comunicou ao sócio-gerente da ré os problemas supra referidos de tinta a descascar e fendas e ainda de tinta com duas tonalidades.
20. No inverno de 2010/2011, o autor começou a notar humidades nos quartos e fissuras nos quartos, cozinha, paredes do corredor do primeiro andar, e no rés-do-chão, sala e garagem.
21. Pela mesma altura, as madeiras utilizadas nos parapeitos das janelas e rodapés apresentaram-se soltas e com humidade.
22. Por carta de 28/11/2011, o autor comunicou ao sócio-gerente da ré os problemas supra referidos.
23. Por carta de 03/07/2012, o autor através do seu advogado interpelou a ré para reparação dos defeitos e/ou pagamento da compensação reclamada.
24. Foram fornecidos 80 litros de tinta pela Dyrup, a fim de ser feita nova pintura, o que nunca veio a acontecer uma vez que a ré se nega a fazê-lo.
25. O alpendre da moradia, com o tecto revestido a madeira, encontra-se sem verniz e de cor escura.
26. Os passeios à volta da casa apresentam fendas, estão descolados das paredes da moradia, o que origina infiltrações de água.
27. O piso calcetado, situado junto ao muro cuja queda ocorreu em Janeiro de 2009, apresenta várias fendas, que após remendar voltam a abrir.
28. O que não transmite qualquer segurança ao autor e à sua família.
29. Não permitindo o estacionamento de qualquer veículo automóvel naquele local.
30. Causando ao autor e sua família temor sempre que têm que pisar aquele espaço.
31. O muro apresenta inclinação, provocada pela má construção, aliado ao deslocamento das terras que o suportam, originando perigo de desmoronamento.
32. Para a sua demolição e construção será necessário despender a quantia de pelo menos 9.700,00 € + Iva.
33. A ré nunca procedeu à reparação dos defeitos supra elencados.
34. Tendo o autor, em 31 de Outubro de 2012, diligenciado junto da ré para que a mesma assinasse uma declaração de reconhecimento de obrigação de prestação de facto, isto é para que procedesse à reparação das rachadelas nas paredes interiores e exteriores da moradia e pintura da mesma, o que a mesma se recusou a fazer.
35. A habitação apresenta um aspecto degradado, o que desgosta o autor.
36. A ré não procedeu à construção das fossas sépticas e sumidouro, que constavam do orçamento.
37. As escadas de acesso ao sótão, para as quais seria necessário despender a quantia de 600,00 €, previstas no projecto assim como orçamentadas não foram construídas, tendo em alternativa a ré construído um alçapão e colocado umas escadas em madeira removíveis no valor de 255,00 €.
38. Para reparação e pintura das paredes interiores e exteriores, reparação e pintura das madeiras, e reconstrução do muro exterior e pavimentos da moradia, será necessário despender a quantia de pelo menos 15.700,00 €.
39. Os caleiros e tubos de alumínio à volta da casa não faziam parte do orçamento.
40. Os passeios à volta da casa e o piso calcetado não faziam pate do orçamento.
41. A ré entregou a terceiros a realização de trabalhos, nomeadamente, de pintura e carpintaria.
42. A pintura ficou a cargo de A.
43. Aquando da entrega da casa o autor teve logo conhecimento que a pintura apresentava duas tonalidades e aceitou a obra naquelas condições.
44. As madeiras foram escolhidas pelo autor e colocadas pelo carpinteiro V. A colocação de verniz no tecto do alpendre não era da responsabilidade da ré.
46. A ré não efectuou a construção das fossas sépticas e sumidouro por acordo com o autor, porque foi decidido efectuar a ligação directa à rede pública, deixando de haver necessidade de as construir.
47. O recuperador de calor foi aceite pelo autor.
48. A ré nunca comunicou ao interveniente A os defeitos da pintura.
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Factos não provados:
1. A ré procedeu à reparação do muro através do construtor M.
2. O autor contactou a ré denunciando tais defeitos para que esta se deslocasse à habitação e verificasse os defeitos procedendo à sua reparação.
3. A ré assentiu, deslocou-se a habitação, constatou a existência dos defeitos reclamados.
4. Todos estes defeitos foram por diversas vezes transmitidos à ré verbalmente.
5. O autor e o seu agregado familiar tiveram problemas de saúde em virtude dos elencados defeitos.
6. O autor não sente vontade de convidar amigos e família, pois que, a casa, apresenta-se desconfortável, o que se agrava no inverno, sendo demasiado fria.
7. O estado em que está a moradia levou a comentários de amigos e familiares, o que lhe causa dor psíquica.
8. O autor não consegue vendê-la no estado em que se encontra e dada a insegurança envolvente.
9. Para a construção das fossas sépticas e sumidouro e caixas de drenagem o autor despendeu o valor de 2.500,00.
10. Tendo-se apercebido da sua falta devido às infiltrações de água, e encharcamento dos jardins e passeios em redor da moradia.
11. Parte do desaterro que também se encontra orçamentado, foi realizado a expensas do autor porque a ré se negava a fazê-lo, tendo despendido a quantia de 600,00 €.
12. O recuperador de calor que estava orçamentado, e que estaria reservado para o mesmo o valor de 2.000,00 € foi substituído por outro no valor de 799,99 €.
13. Os motores colocados nos estores eléctricos necessitam de ser substituídos diversas vezes.
14. A ré não mandou construir o muro de suporte de terras, limitando-se a indicar uma pessoa de sua confiança para a reconstrução do mesmo.
15. A ré não procedeu à construção das caixas de drenagem que constavam do orçamento.
16. A ré procedeu à construção do dreno conforme o projeto.
17. As escadas do sótão não foram construídas como previsto a pedido do autor, que decidiu que preferia um alçapão e colocado uma escada de madeira removível.
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O recurso foi recebido como de apelação, com efeito devolutivo.

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Foram colhidos os vistos legais.

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IV. O objecto do recurso
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, tendo por base as disposições conjugadas dos art.º 608.º, nº. 2, 635.º, nº. 4 e 639.º, nº. 1, todos do Novo Código de Processo Civil (NCPC), aprovado pela Lei nº. 41/2013, de 26/6.
Face às conclusões das alegações de recurso, são as seguintes as questões a decidir:
-Reapreciação da matéria de facto, concretamente apurar se a matéria de facto constante dos artigos 36º e 40º da contestação deve ser dada como assente, e, em consequência, ser eliminado o número 14, da matéria dada como não provada, para ser incluída na matéria dada como assente.

- Reapreciação da decisão de mérito, concretamente, apurar se:

· Os danos podem ser assacados à Ré;
· É possível concluir-se que a queda do muro se ficou a dever a má execução;
· Tendo sido declarado caduco o direito do recorrido, deveria o direito à indemnização ser declarado caduco também;
· É devida indemnização e se esta é proporcional à gravidade do dano.

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Para o efeito de reapreciação da prova, há que ter em conta que as regras de julgamento a que deve obedecer a Relação são as mesmas que devem ser observadas pelo tribunal da 1ª. Instância: Tomar-se-ão em consideração os factos admitidos por acordo, os que estiverem provados por documentos (que tenham força probatória plena) ou por confissão, desde que tenha sido reduzida a escrito, extraindo-se dos factos que forem apurados as presunções legais e as presunções judiciais, advindas das regras da experiência, sendo que o princípio basilar continua a ser o da livre apreciação das provas, relativamente aos documentos sem valor probatório pleno, aos relatórios periciais, aos depoimentos das testemunhas, e agora inequivocamente, às declarações da parte – cf. Art.ºs 466.º, n.º 3 e 607.º, n.º 4 e 5 do C.P.C., que não contrariam o que acerca dos meios de prova se dispõe nos art.ºs 341.º a 396.º do Código Civil (C.C.).
Deste modo, é assim inequívoco que a Relação aprecia livremente todas as provas carreadas para os autos, valora-as e pondera-as, recorrendo às regras da experiência, aos critérios da lógica, aos seus próprios conhecimentos, das pessoas e das coisas, socorrendo-se delas para formar a sua convicção.
Como dispõe o art.º 341.º, do Código Civil (C.C.), as provas têm por função a demonstração da realidade dos factos.
E, como ensina Manuel de Andrade, aquele preceito legal refere-se à prova “como resultado”, isto é, “a demonstração efectiva (…) da realidade dum facto – da veracidade da correspondente afirmação”.
Não se exige que a demonstração conduza a uma verdade absoluta (objectivo que seria impossível de atingir) mas tão-só a “um alto grau de probabilidade, suficiente para as necessidades práticas da vida” - in “Noções Elementares de Processo Civil”, págs. 191 e 192
Quem tem o ónus da prova de um facto tem de conseguir “criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto”, como escreve Antunes Varela - in “Manual de Processo Civil”, Coimbra Editora, pág. 420.
O juiz aprecia livremente as provas e decide segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto – cf. art.º 607º., nº. 5, do C.P.C. - cabendo a quem tem o ónus da prova “criar no espírito do julgador um estado de convicção, assente na certeza relativa do facto”, como refere Antunes Varela – obra supracitada.
Se se instalar a dúvida sobre a realidade de um facto e a dúvida não possa ser removida, ela resolve-se contra a parte a quem o facto aproveita, de acordo com o princípio plasmado no art.º 414.º, do C.P.C., que, no essencial, confirma o que, sobre a contraprova, consta do art.º 346º., do C.C.
Postos em evidência tais princípios, importa ter em conta as concretas questões que são suscitadas, analisando os factos que a recorrente entende, com base nos argumentos que aduz, terem sido mal julgados, de acordo com a prova produzida, por forma a apurar se assim é.
Ora, nos artigos 36 e 40 da contestação consta o seguinte:
Art. 36.º
Quanto ao muro de suporte de terras e vedação a que se alude no artigo 13º da douta petição inicial, importa referir que não foi a Ré quem construiu esse muro nem o mandou construir a quem quer que fosse.
Art. 40.º
Pelo que, quando soube da queda do muro em questão, a Ré foi consultada pelo A, o qual solicitou que lhe indicasse uma pessoa da sua confiança para a reconstrução daquele muro.
E dos factos dados como não provados, o seguinte:
14. A ré não mandou construir o muro de suporte de terras, limitando-se a indicar uma pessoa de sua confiança para a reconstrução do mesmo.
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Quanto a esta matéria o tribunal apontou como motivação para não ter dado essa factualidade como provada o declarado pelo autor e M, no sentido de levar a concluir que foi a ré e não o autor quem contratou o mesmo para fazer os muros.
Após termos procedido à audição das gravações quanto às declarações do A. e do legal representante da Ré, conjugadas com o depoimento da testemunha M e M, foi possível formar igual convicção pois, embora o legal representante da Ré tivesse tentado transmitir a ideia de que se limitou a indicar ao A. o dito M como habilitado à construção do muro em causa, o facto é que tal circunstancialismo foi devidamente apurado e esclarecido pelas declarações prestadas pelo A. que esclareceu como tudo se passou, mencionando que a construção a que a Ré estava obrigada não englobava a edificação dos muros de pedra da parte de fora, mas que, fruto do facto de não conhecer, nem ter ninguém com capacidade para realizar tal obra, falou com o legal representante da Ré que, assim, contactou o dito M para executar esse serviço, limitando-se, tal como se verificou quanto a outros trabalhos, a pagar-lhe directamente o valor estabelecido em conformidade com a indicação dada para esse efeito, esclarecendo que não conhecia sequer o referido M, nada tendo acordado com ele ou sequer contactado o mesmo previamente, limitando-se a emitir e entregar o cheque em conformidade com a indicação dada pelo legal representante da Ré, afirmando peremptoriamente que aquele foi directamente contratado pela Ré, o que foi corroborado pela testemunha M, engenheira civil, na medida em que atestou que quando viu o muro perguntou logo quem o tinha construído, face ao estado que apresentava, tendo logo, nessa altura, obtido a informação de ter sido o indicado M a proceder a essa execução de obra, como contratado pela Ré, tal como o próprio o confirmou.
Confirmação essa que igualmente foi possível colher do próprio depoimento dessa testemunha - M– ao esclarecer que foi o Sr. J, quem contactou consigo, tendo sido entre eles fixado o preço desse trabalho, nunca com o A. tendo falado, contactado ou estabelecido qualquer acordo.
Como tal, perante a prova produzida, no sentido contrário ao alegado pela Ré quanto a essa factualidade, cujo ónus de prova lhe incumbia, é de manter como não provada a matéria que consta do seu ponto 14.
Assim, daqui resultando que a Ré não logrou afastar o respectivo vínculo contratual firmado com o A. quanto à execução dessa obra, ainda que por intermédio de terceiro por si contratado, há que apurar da sua responsabilidade
Ora, tendo em conta o ora exposto, bem como o facto de ter sido dado como provado que o muro apresenta inclinação, provocada pela má construção, aliado ao deslocamento das terras que o suportam, originando perigo de desmoronamento e que, três meses após a entrega da moradia ao autor, em Janeiro de 2009, caiu parte do muro de suporte de terras e vedação e que a queda do muro causou ao autor pânico, medo insegurança e inquietação, estabelecido está, perante a evidência de tais factos, o respectivo pressuposto que os danos sofridos pelo A. decorrente da queda do muro foram provocados pelo facto do muro não ter sido devidamente construído, dado que o foi com inclinação, o que fazia antever o perigo de desmoronamento que, efectivamente, veio a ocorrer pela sua má execução.
Assim, é possível concluir que a queda do muro se ficou a dever a uma má execução do muro que a Ré deu de empreitada a terceiro, e que, consequentemente, os danos causados ao A. com a queda do mesmo devem ser assacados à Ré.

Resta, como tal, apurar se, tendo sido declarado caduco o direito do recorrido, deveria o direito à indemnização ser declarado caduco também e, por último, se a indemnização devida é proporcional à gravidade do dano.

Tal como referido na decisão proferida, ocorrendo uma situação de defeitos em obra, o dono da mesma tem diversos direitos ao seu alcance, por esta ordem: se os defeitos puderem ser suprimidos e não houver desproporção em relação ao proveito, o direito de exigir do empreiteiro a sua eliminação ou, no caso de não poderem ser eliminados, nova construção; se tal direito não puder ser efectivado, pode o dono exigir alternativamente a redução do preço ou a resolução do contrato (artigos 1221º e 1222º do Código Civil); em qualquer caso, tem o dono o direito a ser indemnizado (artigos 1223º, 798º e 799º, nº 1, todos do Código Civil), destinando-se a indemnização a compensar os danos que tenham um nexo de causalidade com os vícios ou defeitos da obra.

Igualmente, tal como referido no artigo 12º da lei de Defesa do Consumidor, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei nº 67/2003, de 8 de Abril, para além do direito à qualidade dos bens, o consumidor tem direito à reparação dos danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes do fornecimento de bens ou prestações de serviços defeituosos.

Como tal, tendo sido julgada procedente a excepção peremptória de caducidade e, como tal, caducado o direito do autor exigir a reparação/eliminação dos defeitos de obra, pagamento do preço relativo à reparação ou redução do preço da obra, entende a recorrente que igualmente deveria ter sido julgado caducado o direito à indemnização.

Quanto a esta questão João Cura Mariano, in Responsabilidade Contratual do Empreiteiro Pelos Defeitos da Obra, 3.ª edição revista, Almedina, páginas 119, 143 e 144, defende que o regime especial, constante dos artigos 1218.º e seguintes do Código Civil tem como objecto limitado o dano da existência de defeitos na obra realizada em cumprimento de um contrato de empreitada, não se aplicando aos danos sequenciais desses defeitos, como sejam os danos colaterais no objecto da obra, onde inclui os danos não patrimoniais.

Na tese do autor citado, estes danos sequenciais dos defeitos da obra estão sujeitos ao regime geral da responsabilidade contratual, não se lhes aplicando as regras especiais relativas à verificação da obra, sua aceitação, denúncia dos defeitos, e atribuição e exercício dos direitos conferidos nos artigos 1221.º a 1225.º do Código Civil, nomeadamente no que respeita aos prazos de caducidade.

Também, como refere Pedro Romano Martinez, in Direito das Obrigações, Parte Especial, Contratos, 2.ª edição, Almedina, pág. 492, nos artigos 1218.º a 1225.º do Código Civil, não foram estabelecidos prazos de prescrição, mas apenas curtos prazos de caducidade para o exercício dos direitos conferidos ao dono da obra, a fim de o desvincular da responsabilidade emergente dos defeitos da obra, em caso de inércia do comitente, visando, nomeadamente, permitir que o empreiteiro mais facilmente proceda à eliminação do defeito.

No entanto, tais prazos de caducidade apenas se aplicam aos direitos do dono da obra previstos nos artigos 1221º, 1222º e 1223º, do C. Civil, nomeadamente no que concerne à reparação do prejuízo consubstanciado na existência de defeitos na obra e não os danos colaterais deles resultantes.

Esta parece ser a melhor interpretação da previsão do n.º 1 do artigo 1224.º, do Código Civil, que se refere à caducidade dos “direitos de eliminação dos defeitos, redução do preço, resolução do contrato e indemnização”, reportando-se aos prejuízos residuais (que não obtiverem reparação através do exercício daqueles outros direitos) e aos prejuízos complementares (nas hipóteses em que os direitos de eliminação e/ou de redução do preço,

apenas conduziram a uma reparação parcial do dano

consubstanciado na própria existência do defeito da obra).

Acresce que, na esteira do defendido por Almeida Costa, in Direito das Obrigações, 4.ª edição, Coimbra Editora, pág. 358, «Se, dum vínculo negocial, resultam danos para uma das partes, o pedido de indemnização deve alicerçar-se nas regras da responsabilidade contratual. A mesma directiva se impõe quando o facto que produz a violação do negócio jurídico – “rectius”, da relação que dele deriva – simultaneamente preenche os requisitos da responsabilidade aquiliana».

Igualmente, na obra já citada, João Cura Mariano defende a sobreposição da disciplina legal da responsabilidade contratual, nas situações de cumprimento defeituoso do contrato de empreitada, com base nos seguintes fundamentos: «É certo que muitos dos danos sofridos pelo dono da obra, como os danos não patrimoniais resultantes do cumprimento defeituoso da prestação, os estragos na obra ou noutras coisas provocados pelos defeitos e os danos na sua integridade física, além de terem origem numa violação positiva do contrato de empreitada, são também consequência de violações dos chamados direitos absolutos, pelo que o mesmo dano tem simultaneamente uma origem contratual e extracontratual. Na definição do regime aplicável, deve atender-se à vontade das partes. (…). Se as partes não previram a definição do regime aplicável em caso de ocorrerem prejuízos por força do cumprimento defeituoso da prestação do empreiteiro, como ocorrerá normalmente, deve aplicar-se o regime subsidiário legal, especialmente previsto para as consequências da violação positiva do contrato. Nestes casos em que ocorre um concurso ideal dos dois regimes de responsabilidade, consideramos que o da responsabilidade contratual consome o da responsabilidade extracontratual, sendo ele o aplicável, uma vez que entre lesante e lesado existe uma relação obrigacional na qual ocorreu o facto lesivo, justificando-se, pois, a sobreposição da responsabilidade adequada à violação dos contratos».

O mesmo entendimento é perfilhado no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 8.05.2003, proferido no Processo n.º 03B1021, acessível em http://www.dgsi.pt, onde, citando Almeida Costa, se refere: «… perante uma situação concreta, sendo aplicáveis paralelamente as duas espécies de responsabilidade civil, de harmonia com o assinalado princípio, o facto tem, em primeira linha, de considerar-se ilícito contratual. Sintetizando: de um prisma dogmático, o regime da responsabilidade contratual consome o da extracontratual. Nisto se traduz o princípio da consunção».

Como escreveu Vaz Serra “se o direito não deve tutelar somente os interesses económicos, mas, também, os espirituais, dos homens, é razoável que o dano não patrimonial, derivado da inexecução de uma obrigação, seja susceptível de satisfação, tal como o dano patrimonial que dela, eventualmente, resulte” (BMJ, 83º, 102 e ss).

Esta conclusão resulta, aliás, na opinião da maioria, da leitura dos arts. 798º e 804º, 1 do CC que, ao aludirem à reparação do prejuízo e à ressarcibilidade dos danos causados ao credor, não fazem qualquer distinção entre uma e outra categoria de danos ou a restringem aos danos patrimoniais (cfr., além da Vaz Serra, Galvão Telles, Direito das Obrigações, 3ª ed, 339 e ss. e A. Pinto Monteiro, Cláusula Penal e Indemnização, nota 77 da pág 31 e na jurisprudência do STJ, entre outros os Acórdãos de 30.01.1981, BMJ, 303.º, 216 e 2 17, 9.12.1993, CJ (STJ)1993, t 3, 174, 25.11.1997, CJ (STJ) 1997, t 3, 140 de 20.01.2008, p.º07A4154, e de 21.05.2009, p.º 08B1356, in base de dados do ITIJ).

Comungando-se do mesmo entendimento, no sentido de considerar que, emergindo a obrigação de indemnizar de um dano decorrente do incumprimento contratual por

parte da empreiteira (ré), estamos perante uma situação de responsabilidade contratual, aplicando-se esse regime, nomeadamente no que concerne ao prazo prescricional, naufraga, em consequência, a tese da recorrente, considerando que, face à factualidade provada, não decorreu o prazo prescricional de vinte anos.

Improcede, pois, o recurso nesta parte.

Relativamente à quantificação desse dano não patrimonial, fixado em € 4.000,00 (quatro mil euros), tendo em conta que a queda do muro causou ao autor pânico, medo insegurança e inquietação, entendemos ser adequado e equitativo manter o quantitativo fixado, não o reduzindo como pretendido pela recorrente, tendo em consideração que, por referência ao acórdão do Supremo Tribunal de 24.01.2012, no proc. 540/2001.P1., in base de dados do ITIJ, com contornos próximos do caso em análise, se fixou em €10.000 a respectiva indemnização.


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VI-Dispositivo

Nestes termos, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente o recurso, ao qual se nega provimento, mantendo na íntegra a sentença recorrida.

Custas do recurso pela Apelante.

Notifique.

v
TRG, 12.1.2017
(O presente acórdão foi elaborado em processador de texto pela primeira signatária)




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Maria dos Anjos S. Melo Nogueira





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José Carlos Dias Cravo





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António Manuel Antunes Figueiredo de Almeida