Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
307/23.9T9AVV.G1
Relator: ISILDA PINHO
Descritores: QUEIXA
CADUCIDADE
ISENÇÃO DO PAGAMENTO DE TAXA DE JUSTIÇA
NULIDADE DE INSUFICIÊNCIA DE INQUÉRITO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 07/10/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO PENAL
Sumário:
I. As declarações que o queixoso/assistente pretenda prestar e a inquirição de testemunhas que tenha indicado quanto à data em que teve conhecimento dos factos que o levaram a apresentar queixa crime contra o denunciado/arguido não consubstanciam um meio de prova legalmente imposto, nem configuram uma omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade, razão pela qual inexiste a nulidade prevista no artigo 120.º, n.º 2, al. d), do Código de Processo Penal.
II. Nada impede que, perante provas já existentes nos autos, o tribunal aprecie, a qualquer momento, a questão da caducidade do direito de queixa, porquanto, ocorrendo esta situação, falta um pressuposto do procedimento criminal.
III. O arquivamento dos autos ocorrido por caducidade do direto de queixa não consubstancia um caso de isenção do assistente de pagamento de taxa de justiça, a que alude o artigo 517.º do Código de Processo Penal, porquanto a razão que dita o arquivamento não só não é superveniente à acusação, pois existe desde o início do processo, como é imputável ao assistente, visto que o exercício extemporâneo do direito de queixa só a si se deve.
[sumário elaborado pela relatora]
Decisão Texto Integral:
Acordaram, em conferência, na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães:

I- RELATÓRIO

I.1 No âmbito do processo comum singular n.º 307/23.9T9AVV que corre termos pelo Juízo de Competência Genérica de Monção, Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo, em 19 de janeiro de 2025, foi proferida a seguinte decisão [transcrição]:
Questão prévia – da extinção do procedimento criminal por caducidade do direito de queixa – arts. 115.º e 117.º do Código de Processo Penal.
O arguido, na sua contestação, suscitou questão prévia, qual seja a da extinção do procedimento criminal por caducidade do direito de queixa no momento em que a mesma foi apresentada pelo assistente.
Ouviu-se o assistente e a Digna Magistrada do Ministério Público.
Ordenou-se ao Ilustre Mandatário do assistente a junção do original da procuração instruída com a queixa/participação criminal.
O Ilustre Mandatário juntou, nessa sequência, uma documento que consta da ref. n.º ...99
Cumpre apreciar e decidir.
Foi o Ilustre Mandatário do assistente notificado para juntar aos autos o original da procuração forense cuja cópia instruiu a queixa-crime.
Contudo, o documento junto com a ref. n.º ...99 não é o original da procuração que instruiu a queixa-crime.

E tal conclusão resulta da grosseira e notória discrepância entre ambos os documentos que constam dos autos, sendo manifesto que o segundo documento não se pode tratar do original do qual foi extraída a cópia que instruiu a queixa, pelas seguintes razões:
1. A rasura na data constante da cópia junta com a queixa (elemento cuja análise se pretendia como essencial) que não se verifica no alegado original junto
2. Por outro lado, a assinatura do mandante não esta localizada exatamente no mesmo local.
3. O carimbo do Ilustre mandatário aposto na cópia encontra-se invertido, contrariamente ao que sucede no carimbo original.
4. Há divergência gritantes quanto ao espaçamento, tipo de letra, espaço entre caracteres do texto entre os dois documentos.
Donde resulta que, apesar de notificado para o efeito o Ilustre Mandatário não juntou o original da procuração que instruiu a queixa.
Aliás, o retardamento no cumprimento do anteriormente ordenado quanto à junção do documento permite-nos concluir que o “original” agora junto foi necessariamente escrito e assinado após a elaboração e assinatura da procuração que efetivamente instruiu a queixa.
Assim será considerado para a ulterior tramitação, o que se consigna para os devidos efeitos, não se podendo assacar qualquer valor probatório ao documento ora junto, havendo justas e fundadas dúvidas sobre a eventual falsidade do documento ora junto – ex vi art. 170.º, n.º 3 do Código de Processo Penal.
Considerando que o documento ora junto não corresponde ao original da procuração que instruiu a queixa-crime, analisaremos, portanto, da importância de tal documento – cópia da procuração que integra a queixa-crime - para a dilucidação da questão prévia suscitada.
Isto posto, o denunciante/assistente participou os factos ora descritos na acusação em 13 de Outubro de 2023, pelas 18h47.
Na sua participação criminal referiu inicialmente “que o denunciante teve conhecimento que no dia 13 de Abril de 2023, o denunciado através da rede social Facebook, depois de uma publicação do jogador AA, escreveu o seguinte….”, juntando 3 documentos, nomeadamente printscreens efetuados, um 43 minutos após a alegada publicação e outro três dias depois da mesma.
No entanto, o Assistente, em 17 de Maio de 2024, quando apresenta a sua acusação, contrariamente ao que alegou na participação, refere “que o Assistente teve conhecimento que no dia 3 de Abril de 2023, o denunciado através da rede social Facebook, depois de uma publicação do jogador AA, escreveu o seguinte….”
Com efeito, realizada a investigação foi possível apurar que a publicação do jogador AA foi efetivamente realizada em 3 de Abril de 2023, sendo essa a data que consta da douta acusação proferida como sendo a data da publicação realizada na rede social.
Pese embora o assistente não o refira expressamente, nem na participação criminal, nem na sua acusação, o conhecimento imediato de tal realidade, tem de entender-se que, pelo menos, coincidente com a data da outorga da procuração a favor do Ilustre Mandatário, junta com a queixa-crime era conhecedor de tais factos.
Entende o Tribunal que, na falta de exibição do original da dita procuração, não se pode considerar, como pretende o assistente, que a mesma foi outorgada no dia 16.4.2023, mas antes no dia 6.4.2023.
Donde dimana que, efetivamente, na data da participação criminal já haviam decorrido 6 meses desde a prática dos factos e seu conhecimento por parte do denunciado – assim resulta da acusação particular deduzida e do compulso dos autos.
Ainda assim, analisemos com ulterior recorte a cópia da procuração junta com a queixa a 13.10.2023.
Esta aparenta uma rasura ao referir a data em que foi subscrita, designadamente sugerindo a adição do numeral “1” antes do “6”.
Tal conclusão é alicerçada pela análise do espaço entre carateres e pelo teor da rasura, assemelhando-se manualmente inserta num documento previamente redigido em computador e impresso), valendo aqui o disposto no art. 371.º, n.º 2 do Código Civil, considerando, ainda, que o Ilustre Mandatário não juntou o original da cópia da dita procuração – vide arts. 386.º, n.º 2 e 387.º do Código Civil.
Tal conclusão é sublinhada porque tal rasura manual não foi feita com indicação da autoria e da respetiva data.
Depois, acresce a evidente discrepância entre o teor da participação criminal e acusação particular no que diz respeito à data das publicações, ambas da lavra do assistente, não podendo tratar-se de mero lapso de escrita.
Por outro lado, na documentação que instruiu a queixa e a acusação consegue visualizar-se que os “print screens “foram efetuados, um 43 minutos após a alegada publicação e outro três dias depois da mesma (portanto, um no dia 03 de Abril de 2023 e outro no dia 06 de Abril de 2023, de acordo com a acusação particular formulada e que constitui o delimitador temporal da factualidade a considerar).
Donde resulta que, pelo menos no dia 6.4.2023 o denunciado já conhecia as publicações, na medida em que juntou os prints aos autos com tal referência temporal em relação à data da publicação, e que o assistente também reconhece ser de dia 3.4.2023, na sua douta acusação.
E tal coaduna-se com a data não rasurada da procuração outorgada a favor do seu Ilustre Mandatário: 6.4.2023, tendo em vista a realização da denúncia.
Assim, na data de apresentação da respetiva queixa-crime já se encontrava efetivamente ultrapassado o prazo de 6 meses, afigurando-se evidente que a rasura na referida procuração foi ulteriormente aposta ao documento inicialmente subscrito pelo assistente e Ilustre Mandatário por autor não concretamente identificado para garantir a tempestividade da apresentação do direito de queixa, mas não correspondendo à realidade quanto à data da outorga da procuração, valendo aqui o disposto no art. 371.º, n.º 2 do Código Civil, considerando, ainda, que o Ilustre Mandatário não juntou o original da cópia da dita procuração permitindo o respetivo cotejo – vide arts. 386.º, n.º 2 e 387.º do Código Civil.
Aliás, mesmo desconsiderando a data aposta na procuração, sempre os printscreens juntos como prova pelo assistente permitiram concluir que, pelo menos, no dia 6.4.2023, chegou ao conhecimento daquele primeiro o teor dos factos, e respetiva autoria, imputados ao arguido.
Segundo o disposto no nº 1 do Artigo 115º do Código Penal, “O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver conhecimento do facto e dos seus autores, ou a partir da morte do ofendido, ou da data em que ele tiver se tiver tornado incapaz.”, tornando o art. 117.º do Código Penal aplicável o aludido regime à tipologia criminal em apreço.
Assim, e nesse sentido, deve a invocada caducidade do direito de queixa/participação ser considerada procedente, pelo que o Tribunal declara a extinção do procedimento criminal por caducidade do direito de queixa/participação no momento em que esta ocorreu, ex vi art. 115.º e 117.º do Código Penal.
Custas pelo assistente – arts. 515.º, n.º 1, al. f) e 518.º Código de Processo Penal, fixando-se a taxa de justiça em 4UC.
Declaram-se imediatamente extintas as medidas de coação aplicadas à ordem destes autos – art. 214.º do Código de Processo Penal.
Notifique e, oportunamente, arquive-se.
Quanto ao pedido de indemnização civil deduzido, verifica-se impossibilidade superveniente da lide pois tornou impossível a apreciação de tal pedido de indemnização civil nestes autos, o qual é um enxerto na acção penal, estando, nessa medida, dependente da existência desta última, atento o princípio da adesão.
Em face do exposto, declaro extinta a instância civil que estava enxertada na acção penal, por impossibilidade superveniente da lide, nos termos do art.º 277, al. e) do Cód. Proc. Civil, aplicável ex vi do art.º 4.º do Cód. Proc. Penal.
Valor da ação cível conexa: o indicado pelo A.
Custas a cargo do demandante [art.º 536.º, n.º3 do CPC]
Registe e notifique
**
Após trânsito, remeta certidão integral do processado, incluindo a referida cópia de procuração forense e alegado original da mesma à Digna Magistrada do Ministério Público, ex vi art. 170.º, n.º 3 do Código de Processo Penal.
**
(…)”.

I.2 Recurso da decisão

Inconformado com tal decisão, dela interpôs recurso o assistente para este Tribunal da Relação, com os fundamentos expressos na respetiva motivação, da qual extraiu as seguintes conclusões [transcrição]:
“(…)
1ª. O Tribunal “a quo” concluiu pela caducidade do direito de queixa/participação e nesse pressuposto declarou extinto o procedimento criminal, é com esta decisão que o assistente e ora recorrente não se conforma.
3ª- Uma vez que a douta sentença deu por verificada a caducidade do direito de queixa/participação, sem que sobre a existência da mesma se tenha, procedido a um verdadeiro julgamento, e sem se produzisse qualquer prova, ou que se tenha procedido ao exercício ao pleno exercício ao contraditório quanto a esta matéria.
4ª- No sentido de que foram pelo Tribunal “a quo”, omitidas diligências que eram essenciais para a descoberta da verdade, nomeadamente, a inquirição do próprio assistente quanto à data, do conhecimento dos factos, assim como da data da outorga da procuração forense ao seu mandatário.
5ª- Acresce que dos prints, juntos pelo assistente aos autos, como documentos 1, 2 e 3, com a participação crime, também não resultam datas diferentes das por si alegadas na queixa crime.
6ª- Ao contrário do assumido pelo Tribunal “a quo”, não pode este dar por assente que a data das publicações das mensagens, é do dia 3 de Abril de 2023, e que as mesmas chegaram ao conhecimento do assistente ora recorrente, 42 ou 43 minutos depois e 3 dias depois.
7ª- Uma vez que o assistente, ora recorrente, não interveio nas mesmas, quem interveio nas mesmas, conforme resulta dos prints juntos com a participação crime, foram terceiras pessoas, mais concretamente, BB e CC e próprio DD e AA.
8ª- Salvo do devido respeito, Tribunal “a quo”, decidiu extemporaneamente, e na ausência da necessária produção de prova, para a descoberta da verdade material.
Sem prescindir,
9ª- A condenação em custas penais, no montante de 4 ucs, o que se afigura desajustado e exagerado, não devendo as mesmas ser superiora uma uc, e levando-se em conta o valor já pago.
10ª- Relativamente as custas cíveis, uma vez que foi declarada a inutilidade superveniente da lide, e o Tribunal não conheceu do mesmo, sempre devia o Demandante, ficar isento de custas, a ex vi do disposto no artigo 4.º n.º 1 alínea m) do Regulamento das Custas Processuais.
11ª-Ao assim não entender, o Tribunal “a quo”, violou além do mais, o disposto nos artigos 4º, alínea d) do nº 2 do Artigo 120º e 340º, 515º nº 1 f) e 518º todos do Código de Processo Penal, e ainda o nº 1 do Artigo 115º e 180º do Código Penal e do disposto no Art. 536º nº 3 do Código Civil.
Nestes termos e nos melhores de direito que V. Ex.ªs melhor suprirão, deverá ser dado provimento a este recurso e em consequência, ser revogada a decisão recorrida, substituindo-se por outra nos termos em que se defende, no sentido de considerar não verificada a caducidade do direito de queixa.
Decidindo deste modo, farão V. Ex.ªs como sempre inteira e sã justiça!
(…)”.

I.3 Resposta ao recurso

Efetuada a legal notificação, quer o arguido, quer a Ex.mª Sr.ª Procuradora da República junto da 1.ª instância, responderam ao recurso interposto pelo assistente, pugnando o arguido pela sua improcedência e o Ministério Público pela sua procedência, tendo apenas este apresentando conclusões que se passam a transcrever [transcrição]:

Resposta do Ministério Público:
“(…)
1. Se uma peça processual denota um «lapsus calami» ostensivo, como in casu, aparentemente, decorre, determina-se a retificação do escrito à luz do princípio geral de direito acolhido no referido art. 249.º do Código Civil, de que são expressão, os arts. 380.º, n.º 1, b) e 3 e art. 97.º, n.º 3 do Código de Processo Penal, sem que isso viole os princípios de igualdade de armas ou do contraditório, tratando-se, desta feita, de mera irregularidade cuja correcção sana.
2. Segundo o disposto no artigo 115.º, n.º 1, do Código Penal, o direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores.
3. Não é completamente seguro afirmar, pelo menos, sem a realização de audiência de julgamento, que o assistente teve conhecimento dos factos e do seu autor, necessariamente, no dia em que os mesmos ocorreram, leia-se, publicação de comentários e posts em rede social Facebook.
4. Ora, o princípio da livre apreciação da prova, art. 127.º do Código de Processo Penal, assume especial relevância na audiência de julgamento, encontrando afloramento, nomeadamente, no art. 355.º do Código de Processo Penal. É aí que existe a desejável oralidade e imediação na produção de prova, na recepção directa de prova.
5. O princípio da imediação estipula que deve existir uma relação de contacto directo, pessoal, entre o julgador e as pessoas cujas declarações irá valorar, e com as coisas e documentos que servirão para fundamentar a decisão da matéria de facto.

Nestes termos e nos demais de Direito, deverá o presente Recurso ser julgado procedente e, em consequência, revogar-se a decisão recorrida, substituindo-a por uma outra que não obste ao conhecimento do mérito da causa e permita a realização de sessão de audiência julgamento, nos termos e para os efeitos dos arts. 127.º e 340.º do Código de Processo Penal, assim se fazendo Justiça.
 (…)”. [sublinhado e negrito nossos].

I.4 Parecer do Ministério Público

Remetidos os autos a este Tribunal da Relação, nesta instância o Exmo. Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu fundamentado parecer que culminou com a seguinte conclusão [transcrição]:
“(…)
1. O recurso do assistente, por um lado, deverá ser julgado improcedente porquanto aquando do exercício do seu direito de queixa pela autoria de um crime de difamação, estando comprovada a data em que já tinha efectivo no conhecimento dos factos e dos seus autores, havia já transcorrido o prazo previsto no art.º 115, n.º 1 do CPenal, verificando-se, por isso, uma causa superveniente que obsta à prossecução do procedimento criminal contra o arguido;
2. Por outro lado, deverá ser julgado procedente relativamente à verificada condenação do assistente em custas, em face do estabelecido no art.º 517 do CPPenal, pois que a reconhecida causa superveniente não adveio de uma vontade do assistente.
(…)”. [sublinhado e negrito nossos].

I.5. Resposta

Pese embora tenha sido dado cumprimento ao disposto no artigo 417º, n.º 2, do Código de Processo Penal, não foi apresentada resposta ao sobredito parecer.

I.6. Concluído o exame preliminar, prosseguiram os autos, após os vistos, para julgamento do recurso em conferência, nos termos do artigo 419.º do Código de Processo Penal.
Cumpre, agora, apreciar e decidir:

II- FUNDAMENTAÇÃO

II.1- Poderes de cognição do tribunal ad quem e delimitação do objeto do recurso:
Conforme decorre do disposto no n.º 1 do art.º 412.º do Código de Processo Penal, bem como da jurisprudência pacífica e constante [designadamente, do STJ[1]], são as conclusões apresentadas pelo recorrente que definem e delimitam o âmbito do recurso e, consequentemente, os poderes de cognição do Tribunal Superior, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso a que alude o artigo 410º do Código de Processo Penal[2].

Assim, face às conclusões extraídas pelo recorrente da motivação do recurso interposto nestes autos, as questões a apreciar e decidir reportam-se em:
® Saber se se encontra verificada a nulidade ínsita no artigo 120.º, n.º 2, alínea d), do Código de Processo Penal.
® Saber se o assistente exerceu atempadamente o direito de queixa contra o arguido;
® Saber se existe erro de julgamento quanto à condenação em custas processuais.

II.2- Apreciação do recurso

Da invocada nulidade ínsita no artigo 120.º, n.º 2, alínea d), do Código de Processo Penal:

Defende o assistente/recorrente a existência da nulidade da alínea d), do n.º 2, do artigo 120º ex vi artigo 340º ambos do Código de Processo Penal, uma vez que, no seu entender, foram omitidas diligências que eram essenciais para a descoberta da verdade, porquanto, prossegue o assistente/recorrente, se o Tribunal “a quo”, tinha dúvidas sobre a data em que foi outorgada a procuração, devia pelo menos, convocar o assistente, para explicar, qual a data efectiva em que este teve conhecimento da situação e em que data procedeu a outorga da procuração ao seu mandatário, e inquirir as testemunhas arroladas, o que de resto, sempre podia, e devia fazer, em sede de audiência de discussão e julgamento.

E o que os mencionados preceitos legais trazidos à colação pelo assistente/recorrente dispõem, no que ora releva, é o seguinte:
Artigo 120.º
Nulidades dependentes de arguição
“(…)
2 - Constituem nulidades dependentes de arguição, além das que forem cominadas noutras disposições legais:
(…)
d) A insuficiência do inquérito ou da instrução, por não terem sido praticados actos legalmente obrigatórios, e a omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade.
(…)”. [sublinhado e negrito nossos].
Artigo 340.º
Princípios gerais
“1 - O tribunal ordena, oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa.
(…)
4 - Os requerimentos de prova são ainda indeferidos se for notório que:
(…)
b) As provas requeridas são irrelevantes ou supérfluas;
(…)”. [sublinhado e negrito nossos].
Ora, in casu, não estamos perante qualquer insuficiência do inquérito ou da instrução, por não terem sido praticados actos legalmente obrigatórios, desde logo, porquanto a sua pretendida inquirição e das testemunhas quanto à data em que teve conhecimento dos factos ou em que outorgou a procuração que juntou aquando da queixa apresentada que deu origem aos presentes autos, não constituem actos legalmente obrigatórios. E também não constituem qualquer omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade, porquanto o tribunal a quo já dispunha dos elementos necessários para assim decidir, designadamente prova documental junta pelo próprio assistente/recorrente [como o são prints dos mencionados comentários no facebook e procurações que emitiu a favor do seu ilustre mandatário] e a sua própria posição/declaração vertida nos autos quanto à data em que teve conhecimento dos factos, nos termos que infra melhor se explicará aquando da análise da questão respeitante à tempestividade do exercício do direito de queixa. 
Ou seja, as diligências que, na ótica do recorrente, deveriam ter sido realizadas e não o foram não consubstanciam um meio de prova legalmente imposto, nem configuram uma omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade, razão pela qual inexiste a nulidade prevista no artigo 120.º, n.º 2, al. d), do Código de Processo Penal.
E não se diga que ao assim proceder o tribunal a quo violou o disposto no artigo 340.º do Código de Processo Penal.
Com efeito, como vimos supra, o que decorre do seu n.º 1 é que o tribunal ordena, oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa, e, na verdade, não se afigurou necessário ao tribunal a quo  [e bem, diga-se], ordenar, oficiosamente, a produção de quaisquer outros meios de prova, designadamente a agora reclamada audição do assistente/recorrente e testemunhas, porquanto, aquando da prolação da decisão recorrida, o tribunal a quo já sabia que segundo as palavras do próprio assistente/recorrente a data em que alegadamente teve conhecimento dos factos foi o dia 13 de abril de 2023 [como, o refere no seu requerimento dirigido aos autos a 10-10-2024, com a ref.ª citius n.º 4615339 - “O Queixoso, conforme vem evidenciado na participação crime, só teve conhecimento no dia 13 de Abril de 2023.” -, posição que reitera no presente recurso, de que é exemplo o seguinte trecho “O assistente, conforme vem evidenciado na participação crime, só teve conhecimento no dia 13 de Abril de 2023”].
E também não tinha o tribunal a quo que se socorrer do disposto no artigo 340.º do Código de Processo Penal a requerimento, porquanto nem sequer o próprio assistente/recorrente requereu a produção de qualquer meio de prova a esse respeito.
Assim sendo, no alinhamento dos considerandos acabados de expor, só nos resta concluir pela inexistência da apontada violação dos preceitos legais invocados pelo assistente/recorrente, ou, diga-se, de quaisquer outros, não se verificando qualquer nulidade que ora cumpra declarar.
Improcede, portanto, o recurso quanto a esta concreta questão.

Do alegado exercício atempado do direito de queixa:

O assistente/recorrente deduziu acusação particular contra o arguido/recorrido imputando-lhe a prática de dois crimes de difamação, previstos e punidos pelo artigo 180.º do Código Penal.

Ora, como é sabido, nos crimes semipúblicos e particulares a existência de queixa é um pressuposto processual, sendo, segundo as palavras do Prof. Figueiredo Dias, um pressuposto positivo de punição.[3]
E, de acordo com o disposto no artigo 188.º, n.º 1 do Código Penal, o crime de difamação previsto e punido nos termos do artigo 180.º, n.º 1 do mesmo código, depende de acusação particular, sendo, por isso, necessário que o ofendido se queixe, se constitua assistente e deduza acusação particular [artigo 50.º, n.º 1, do Código de Processo Penal].
Em boa verdade, a punição efetiva de um facto depende não apenas do preenchimento de exigências substantivas, mas também da verificação de condições de procedimento.
Em suma, o prosseguimento do procedimento criminal pelo crime de difamação denunciado nos presentes autos pelo assistente/recorrente contra o arguido/recorrido depende da circunstância de a queixa ter sido apresentada no prazo legalmente previsto para o efeito, isto é, do exercício atempado do direito de queixa que, in casu, o tribunal a quo entende não se ter verificado e ao que o assistente/recorrente apoda de erro de julgamento ao assim ter decidido.

Vejamos se lhe assiste razão:

A este respeito, sob a epígrafe, extinção do direito de queixa, refere, no que ora releva, o artigo 115.º, do Código Penal o seguinte:
“1 - O direito de queixa extingue-se no prazo de seis meses a contar da data em que o titular tiver tido conhecimento do facto e dos seus autores, ou a partir da morte do ofendido, ou da data em que ele se tiver tornado incapaz, exceto no caso do direito de queixa previsto no n.º 1 do artigo 178.º, que se extingue no prazo de um ano.
(…)”. [sublinhado e negrito nossos].
O prazo de seis meses é um prazo de caducidade e o período de tempo decisivo para a contagem deste prazo é aquele que medeia entre a tomada de conhecimento [do facto e dos seus autores] e a deposição da queixa.
E, in casu, como bem o concluiu o tribunal a quo, na data em que o assistente/recorrente apresentou a queixa-crime que deu origem aos presentes autos já se encontrava efetivamente ultrapassado o aludido prazo de 6 meses e, como tal, cumpria declarar a extinção do procedimento criminal por caducidade do direito de queixa/participação no momento em que esta ocorreu, ante o exposto no artigo 115.º, n.º 1 e 117.º do Código Penal.
Na verdade, constitui um facto incontestado que a queixa foi apresentada pelo assistente/recorrente a 13 de outubro de 2023.
E é, igualmente, incontestável, ao contrário do defendido pelo assistente/recorrente, que pela análise concatenada dos documentos juntos aos autos pelo próprio assistente/recorrente [concretamente, printscreens da publicação e dos comentários, no  facebook em causa], com a queixa crime/participação criminal e documento junto pelo arguido/recorrido mediante a ref.ª citius n.º 4622479 de 15-10-2024 [concretamente, printscreen da publicação no  facebook em causa], que a alegada publicação ocorreu a 3 de abril de 2023 [data esta que ainda hoje foi possível percecionar mediante a consulta do facebook através do link https//..., link este dado a conhecer aos autos pelo assistente/recorrente] e os comentários em causa, alegadamente efetuados pelo arguido/recorrido ocorreram nessa data [3 de abril de 2023] e 3 dias depois, ou seja, a 6 de abril de 2023, sendo certo que na acusação particular deduzida pelo assistente/recorrente contra o arguido/recorrido o próprio situa os factos no tempo precisamente a 03 de abril de 2023.
São essas as datas dos comentários da publicação trazidos à colação pelo assistente/recorrente na acusação particular que aqui deduziu contra o arguido/recorrido e, ao contrário do que sustenta na peça recursiva, o tribunal a quo não confundiu a data das publicações [leia-se, dos comentários imputados ao arguido/recorrido] com a data do conhecimento das mesmas por parte do assistente/recorrente, como resulta, de forma inequívoca, do seguinte trecho do despacho recorrido que se passa a transcrever:
“Com efeito, realizada a investigação foi possível apurar que a publicação do jogador AA foi efetivamente realizada em 3 de Abril de 2023, sendo essa a data que consta da douta acusação proferida como sendo a data da publicação realizada na rede social.
Pese embora o assistente não o refira expressamente, nem na participação criminal, nem na sua acusação, o conhecimento imediato de tal realidade, tem de entender-se que, pelo menos, coincidente com a data da outorga da procuração a favor do Ilustre Mandatário, junta com a queixa-crime era conhecedor de tais factos.
Entende o Tribunal que, na falta de exibição do original da dita procuração, não se pode considerar, como pretende o assistente, que a mesma foi outorgada no dia 16.4.2023, mas antes no dia 6.4.2023.
Donde dimana que, efetivamente, na data da participação criminal já haviam decorrido 6 meses desde a prática dos factos e seu conhecimento por parte do denunciado – assim resulta da acusação particular deduzida e do compulso dos autos.
(…)”. [sublinhado e negrito nosso].

Defende, ainda, o assistente/recorrente que o tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, porquanto não atendeu que, conforme vem evidenciado na participação crime, o assistente só teve conhecimento no dia 13 de abril de 2023, como, aliás, este o confirmou aquando das suas declarações prestadas nos autos a 21-02-2024, nas quais, além do mais, referiu Que confirma na integra o teor da participação que deu origem aos presentes autos por corresponder à verdade.”, declarações estas, igualmente, não atendidas, tal como não se atendeu que da inquirição das testemunhas, arroladas pelo Assistente, e inquiridas nos autos, nomeadamente, EE, FF e GG, não resulta que o assistente, tenha tido conhecimento efectivo das publicações, antes do dia 13 de Abril de 2023.

Porém, não lhe assiste qualquer razão:

Com efeito, analisada a mencionada participação crime é possível constatar que ali se escreveu o seguinte [transcrição]:
“… Sucede que o Denunciante, teve conhecimento que no dia 13 de Abril de 2023, o Denunciado através da rede social Facebbok, depois de uma publicação do jogador AA, escreveu o seguinte comentários …”. [sublinhado e negrito nossos].
Ou seja, ali o assistente/recorrente não diz ter tido conhecimento, dos factos ou do seu autor, no 13 de abril de 2023, mas sim que os comentários [cuja autoria imputa ao arguido/recorrido] foram efetuados/escritos pelo arguido/recorrido no dia 13 de abril de 2023, o que, como o próprio reconhece, corresponde a realidades distintas.
E não se venha agora dizer que ao mencionar no artigo 7.º da acusação particular que “… o Assistente, teve conhecimento que no dia 3 de Abril de 2023, o Denunciado através da rede social Facebbok, depois de uma publicação do jogador AA, escreveu o seguinte comentários … [sublinhado e negrito nossos], ou seja, no dia 3 em vez do dia 13, corresponde a um manifesto lapso de escrita, quando confrontado com a participação crime, cuja rectificação importava fazer pelo tribunal a quo, ao abrigo do artigo 249.º do Código Civil, ex vi artigo 4.º do Código de Processo Penal, porquanto é precisamente o dia 03 de abril de 2023 [e não 13 de abril de 2023] que corresponde à data da publicação e do primeiro comentário que é imputado ao arguido/recorrido, conforme já o mencionamos supra e decorre, como vimos, da análise conjugada da documentação junta aos autos, designadamente pelo próprio assistente/recorrente.
Prossegue o assistente/recorrente argumentando que o tribunal a quo também não podia ter concluído que os referidos comentários chegaram ao seu conhecimento 42 ou 43 minutos depois e 3 dias depois de terem sido efetuados, porquanto não interveio nas mesmas, quem interveio nas mesmas, conforme resulta dos prints juntos com a participação crime, foram terceiras pessoas, mais concretamente, BB e CC e próprio DD e AA, ou seja, que não pode de forma alguma extrair-se que o assistente tenha tido conhecimento dos factos e das publicações, no dia 3 de Abril de 2023.
Porém, o tribunal a quo também não extraiu tal ilação, mas sim que tal conhecimento dos factos e do seu autor ocorreu pelo menos a 06-04-2023 e explicou porque assim o entendeu, nos termos que aqui se relembram:
“(…)
Por outro lado, na documentação que instruiu a queixa e a acusação consegue visualizar-se que os “print screens “foram efetuados, um 43 minutos após a alegada publicação e outro três dias depois da mesma (portanto, um no dia 03 de Abril de 2023 e outro no dia 06 de Abril de 2023, de acordo com a acusação particular formulada e que constitui o delimitador temporal da factualidade a considerar).
Donde resulta que, pelo menos no dia 6.4.2023 o denunciado já conhecia as publicações, na medida em que juntou os prints aos autos com tal referência temporal em relação à data da publicação, e que o assistente também reconhece ser de dia 3.4.2023, na sua douta acusação.
E tal coaduna-se com a data não rasurada da procuração outorgada a favor do seu Ilustre Mandatário: 6.4.2023, tendo em vista a realização da denúncia.
Assim, na data de apresentação da respetiva queixa-crime já se encontrava efetivamente ultrapassado o prazo de 6 meses, afigurando-se evidente que a rasura na referida procuração foi ulteriormente aposta ao documento inicialmente subscrito pelo assistente e Ilustre Mandatário por autor não concretamente identificado para garantir a tempestividade da apresentação do direito de queixa, mas não correspondendo à realidade quanto à data da outorga da procuração, valendo aqui o disposto no art. 371.º, n.º 2 do Código Civil, considerando, ainda, que o Ilustre Mandatário não juntou o original da cópia da dita procuração permitindo o respetivo cotejo – vide arts. 386.º, n.º 2 e 387.º do Código Civil. (…)”. [sublinhado e negrito em grande parte nossos].
Finalmente, argumenta o assistente/recorrente que a questão da data constante da procuração forense, não pode ser aferida com a data do conhecimento efectivo pelo assistente dos factos, mais aludindo esclarecer que o mandatário do assistente, por mero lapso, quando deu entrada a participação crime em 13 de Outubro de 2023, pelas 18:46 horas, juntou aos autos uma procuração, com um digito manuscrito na data, e quando foi notificado pelo Tribunal, sem que nada tivesse a esconder, juntou aos autos a mesma procuração, que já tinha no seu dossier com a data devidamente corrigida, ou seja, sem manuscritos.
Prossegue, o assistente/recorrente que a procuração é a mesma, veja-se o tipo de letras, o seu conteúdo e a própria disposição, e assinada pelo assistente, naquela data.
Porém, sem razão.
Desde logo, não podemos deixar de atentar que, mais uma vez, o assistente/recorrente sustenta o seu recurso com base na existência de um lapso cometido da sua parte, o que, como é bom de ver, não pode servir de fundamento ao propugnado prosseguimento dos autos com vista a sujeitar o arguido/recorrido a julgamento.
E, quanto ao alegado facto de a procuração junta com a participação criminal não poder servir para aferir a data do conhecimento efetivo pelo assistente/recorrente dos factos, porquanto a procuração a ter em conta deverá ser a original, entretanto junta aos autos após determinação do tribunal a quo, da qual resulta aposta a data de 16-04-2023, sendo esta procuração o original daquela que foi junta com a participação criminal, cumpre atentar, que não se pode, de todo, extrair tal conclusão.
Com efeito, como bem salienta o tribunal a quo “… o documento junto com a ref. n.º ...99 não é o original da procuração que instruiu a queixa-crime.
E tal conclusão resulta da grosseira e notória discrepância entre ambos os documentos que constam dos autos, sendo manifesto que o segundo documento não se pode tratar do original do qual foi extraída a cópia que instruiu a queixa, pelas seguintes razões:
1. A rasura na data constante da cópia junta com a queixa (elemento cuja análise se pretendia como essencial) que não se verifica no alegado original junto
2. Por outro lado, a assinatura do mandante não esta localizada exatamente no mesmo local.
3. O carimbo do Ilustre mandatário aposto na cópia encontra-se invertido, contrariamente ao que sucede no carimbo original.
4. Há divergência gritantes quanto ao espaçamento, tipo de letra, espaço entre caracteres do texto entre os dois documentos.
Donde resulta que, apesar de notificado para o efeito o Ilustre Mandatário não juntou o original da procuração que instruiu a queixa.
(…)”.
Ou seja, a procuração em causa, entretanto junta aos autos pelo assistente/recorrente não pode, de todo, aqui ser atendida, porquanto não corresponde ao original da procuração junta com a participação criminal e que o tribunal a quo determinou que se juntasse.
E, ao não poder ser atendida, resta a procuração junta aos autos com a participação criminal e esta sustenta, sem qualquer dúvida, a posição vertida pelo tribunal a quo no despacho recorrido.

Como bem refere o Ex.mº Procurador-Geral Adjunto no seu douto parecer,  
“… No caso, apresenta-se fora de qualquer dúvida que o assistente tomou conhecimento dos factos ilícitos em causa e dos seus autores pelo menos no dia 06 de Abril de 2023. Tal decorre de prova documental incontroversa e da própria confissão do assistente. A documental é a procuração que o assistente subscreveu ao seu mandatário. Ela possui uma concreta data, inequívoca, 06/04/2023. A rasura que dela consta é desprezível pois que o assistente não só não apresentou em juízo, sequer, o original da mesma, como também não afecta nem colide com a sua específica e a concreta numeração que, integrando a sua datação, se apresenta imaculada. Mas sendo a procuração explícita quanto a tal data, certo é que nela o assistente atribui poderes especiais ao seu mandatário, poderes para este “… apresentar queixa crime contra DD e incertos”. Ou seja, em tal data, aquele já conhecia pelo menos um autor do facto ilícito em causa e como tal o aclarou. E a sobredita data mostra-se em consonância com a que ficou a constar do documento essencial que define o objecto do processo, da acusação que aquele elaborou e apresentou aos demais sujeitos processuais. Na acusação, o assistente expressamente refere, no seu artigo 7.º que “o Assistente, teve conhecimento que no dia 3 de Abril de 2023, o Denunciado através da rede social Facebook, depois de uma publicação do jogador AA, escreveu o seguinte…”. Ou seja, a 03/04/2023 verificaram-se os factos em causa e a 06/04/2023 já a eles o assistente estava a reagir através da outorga de uma procuração, a sobredita procuração, conhecendo, como dela consta, de pelo menos um dos seus autores. Assim sendo, como a queixa formal apresentada pelo mandatário do assistente municiado com a referida procuração só entrou em juízo, por correio electrónico, a 13/10/2023, às 18,47 horas, então, quando tal ocorreu, os 6 meses previstos no dito art.º 115 do CPenal já haviam transcorrido…”. [sublinhado e negrito nossos].
Deste modo, tendo tido conhecimento, dos factos e do seu autor, pelo menos a 6 de abril de 2023, quando, a 13 de outubro de 2023, o assistente/recorrente apresentou a queixa/participação criminal contra o arguido/recorrido já tinha caducado o direito do exercício de queixa, pelo decurso do prazo de seis meses previsto no n.º 1, do artigo 115.º, do Código Penal.
E, tendo caducado o seu direito do exercício de queixa, pressuposto positivo da punição, impunha-se declarar a extinção do procedimento criminal movido contra o arguido/recorrido, pelo que bem andou o tribunal a quo ao assim decidir nos termos que constam do despacho recorrido.
E não se defenda que ao decidir pela existência da mencionada caducidade do direito de queixa/participação o tribunal a quo pecou por excesso, sem que sobre a existência da mesma se tenha procedido a um verdadeiro julgamento, e sem se produzisse qualquer prova, ou se tenha procedido ao exercício ao pleno exercício ao contraditório.
Com efeito, o tribunal a quo decidiu com base em provas, provas essas que indicou e apreciou, trazidas aos autos, aliás, na sua maioria, pelo próprio assistente/recorrente e fê-lo após o pleno exercício do contraditório, tendo concedido prazo para o assistente/recorrente se pronunciar quanto à concreta questão suscitada a esse respeito pelo arguido/recorrido na sua contestação, e dando-lhe a oportunidade de juntar a procuração original já mencionada. Note-se, aliás, que quando lhe foi concedido prazo para exercer o direito ao contraditório sobre a invocada questão da caducidade do direito de exercício de queixa, veio o assistente/recorrente pronunciar-se sobre tal questão, mediante requerimento dirigido aos autos a 10/10/2024 [ref.ª citius n.º 4615339] e nessa altura, não requereu a produção de qualquer outra prova e também não invocou o agora apontado lapso respeitante à junção da procuração, nem, diga-se, juntou o original da mesma, tendo sido o tribunal a quo que tomou a iniciativa para que o fizesse e, mesmo assim, não o fez de imediato, mas apenas após uma segunda notificação que lhe foi dirigida para o efeito com a cominação de que a ausência de resposta seria valorada como omissão grave do dever de cooperação com o Tribunal, nos termos do art. 7.º e 417.º do Código de Processo Civil, ex vi art. 4.º do Código de Processo Penal, tendo em conta que se discutia a apreciação dos pressupostos da prossecução penal – caducidade do direito de queixa do assistente.
Além disso, nada impedia que, perante as provas já constantes dos autos, o tribunal a quo apreciasse, desde logo, a questão, pois, como é sabido, e já assim se decidiu neste Tribunal da Relação de Guimarães, designadamente, mediante acórdão datado de 28-05-2012, Processo n.º 1296/10.5TABCL.G1, in www.dgsi.pt, “… a qualquer momento se podem e devem retirar as consequências do facto de a queixa não existir ou não ser juridicamente relevante na medida em que ocorrendo esta situação falta um pressuposto do procedimento…”. [sublinhado e negrito nossos].
Não se verifica, portanto, qualquer violação das normas legais apontadas pelo assistente/recorrente, nem, diga-se, de quaisquer outras, improcedendo o recurso também quanto a esta concreta questão.
   
Das custas processuais:

Quanto às custas respeitantes à instância criminal:
No âmbito da decisão recorrida foi o assistente/recorrente condenado quanto às custas criminais nos seguintes termos:
“Custas pelo assistente – arts. 515.º, n.º 1, al. f) e 518.º Código de Processo Penal, fixando-se a taxa de justiça em 4UC.”.
Insurge-se o assistente/recorrente contra tal decisão, invocando para o efeito, na conclusão 9.ª do recurso, o seguinte:
“A condenação em custas penais, no montante de 4 ucs, o que se afigura desajustado e exagerado, não devendo as mesmas ser superiora uma uc, e levando-se em conta o valor já pago.
E, a esse respeito, na motivação, refere apenas o seguinte:
“Acresce que o Tribunal “a quo”, veio ainda condenar o assistente ora recorrente, no pagamento de 4 ucs de taxa de justiça crime, e sem levar de resto em consideração o já pago.
O que é também salvo o devido respeito, absolutamente exagerado e completamente desajustado.”.
Na parte final do recurso, alude, ainda, às normas jurídicas violadas, da seguinte forma:
“A decisão recorrida violou além do mais, o disposto nos artigos 4º, alínea d) do nº 2 do Artigo 120º e 340º, 515º, nº 1 al. f) e 518º, todos do Código de Processo Penal, e ainda o nº 1 do Artigo 115º e 180º do Código Penal, bem como do no Art. 536º nº 3, do Código de Processo Civil.”.
Ou seja, não indica o assistente/recorrente, qualquer razão, argumento, de facto ou de direito, suscetível de concretizar, de especificar, tal entendimento, baseando-se tal impugnação em meras generalidades - “desajustado e exagerado” e “sem levar em consideração o já pago” - e numa mera indicação global das normas violadas no recurso, sem identificar/especificar os erros, de facto e/ou de direito, em que, alegadamente, incorreu o julgador, o que impede este tribunal de apreciar se lhe assiste ou não razão, ou seja, de conhecer o recurso quanto a esta concreta conclusão.
O assistente/recorrente desrespeitou o disposto no artigo 412.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, o que dita a rejeição do recurso, nessa parte, por não ser admissível, ante o exposto no n.º 2, do artigo 414.º do Código de Processo Penal.
O incumprimento do n.º 1, do artigo 412.º, do Código de Processo Penal constitui, assim, uma falta de fundamentação/motivação, que conduz à rejeição, nessa parte, do recurso.

Neste sentido, veja-se, a título de exemplo:

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 28-02-2002, Processo n.º 477/02, in www.dgsi.pt:

“I-  Nas respectivas alegações de recurso o recorrente deve concretizar minimamente as razões da sua pretensão, sendo que nas correspondentes conclusões o recorrente deve efectuar o resumo de tais razões.
II-  Sem a indicação das indicadas razões não é possível censurar a decisão recorrida, constituindo tal omissão uma violação do preceituado no art. 412.º, n.º 1, do CPP, o que determina a rejeição do recurso, por falta de motivação do mesmo.”. [sublinhado e negrito nossos].
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18-02-2004, Processo n.º 4411/03-3, in www.dgsi.pt:
“I - Os recursos visam a reparação da desconformidade das decisões com a ordem jurídica, impondo-se aos recorrentes a identificação dos erros ou vícios nelas contidos, com indicação dos fundamentos da impugnação, para que o tribunal superior possa apreciar se assiste razão aos recorrentes, sem embargo de, dentro dos limites legais, apreciar oficiosamente outras questões.
II - Não basta para se submeter uma decisão a recurso uma vaga impugnação da mesma, esperando-se que o tribunal de recurso se substitua ao recorrente na identificação e abordagem dos vícios da decisão carecidos de reparação.” [sublinhado e negrito nossos].

Aqui chegados, atentos os considerandos acabados de expender, cumpre rejeitar o recurso interposto pelo assistente/recorrente, na parte atinente à impugnação das custas processuais respeitantes à parte criminal.
De qualquer forma, atento o exposto no douto parecer quanto a esta concreta questão, em que se defende que o assistente/recorrente se encontra isento de custas, ao abrigo do artigo 517.º do Código de Processo Penal, sempre se dirá que, salvo o devido respeito por posição diversa, tal disposição legal nunca seria aqui aplicável.
Com efeito, o que da mesma decorre, é que:
“O assistente é isento do pagamento de taxa de justiça quando, por razões supervenientes à acusação que houver deduzido ou com que se tiver conformado e que lhe não sejam imputáveis, o arguido não for pronunciado ou for absolvido.”.
Ora, in casu, a razão que ditou o arquivamento dos autos não só não é superveniente à acusação, porquanto existe desde o início do processo, como é imputável ao assistente/recorrente, porquanto o exercício extemporâneo do direito de queixa só a si se deve, uma vez que a decisão de o exercer ou não e de quando o fazer só dependia da sua vontade e de mais ninguém.

Quanto às custas respeitantes à instância cível:
O despacho proferido pelo tribunal a quo quanto à parte cível foi o seguinte [transcrição]:
“Quanto ao pedido de indemnização civil deduzido, verifica-se impossibilidade superveniente da lide pois tornou impossível a apreciação de tal pedido de indemnização civil nestes autos, o qual é um enxerto na acção penal, estando, nessa medida, dependente da existência desta última, atento o princípio da adesão.
Em face do exposto, declaro extinta a instância civil que estava enxertada na acção penal, por impossibilidade superveniente da lide, nos termos do art.º 277, al. e) do Cód. Proc. Civil, aplicável ex vi do art.º 4.º do Cód. Proc. Penal.
Valor da ação cível conexa: o indicado pelo A.
Custas a cargo do demandante [art.º 536.º, n.º 3 do CPC]
Registe e notifique”.

Insurge-se o assistente/recorrente contra o mesmo, na parte respeitante à sua condenação nas custas reportadas à parte civil, porquanto, no seu entender, tendo sido declarada a inutilidade superveniente da lide e o Tribunal não conhecido do mesmo, sempre devia o demandante, ficar isento de custas, ante o disposto no artigo 4.º, n.º 1, alínea m), do Regulamento das Custas Processuais.

Vejamos:
O invocado artigo 4.º do Regulamento das Custas Processuais, sob a epígrafe, isenções, prevê, no que ora releva, o seguinte:
1 - Estão isentos de custas:
(…)
m) Os agentes das forças ou dos serviços de segurança, os guardas prisionais, os profissionais na área da educação e da saúde, bem como os profissionais que desempenhem funções de inspeção e de interação com o público na Autoridade Tributária e Aduaneira e na Autoridade Tributária e Aduaneira da Região Autónoma da Madeira, e os agentes de fiscalização e fiscais de exploração das empresas concessionárias ou prestadoras de serviço de transporte coletivo de passageiros, em processo penal, por ofensa sofrida no exercício das suas funções ou por causa delas;
n) O demandante e o arguido demandado, no pedido de indemnização civil apresentado em processo penal, quando o respectivo valor seja inferior a 20 UC;
(…)”.
Ora, desde logo facilmente se constata, pela mera análise da apontada alínea m), do n.º 1, do artigo 4.º do Regulamento das Custas Processuais, que tal norma legal não é aplicável ao caso dos presentes autos.
E também não o é a sua alínea n), única que poderia ter relevo para a apreciação da questão aqui em apreço, porquanto o pedido de indemnização civil deduzido não é inferior a 20 UC - ou seja, 2.040,00€ -, mas sim superior, concretamente de 4.000,00€.
Acresce que o tribunal a quo sustentou a sua decisão no artigo 536.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, aqui aplicável, ante o exposto no artigo 523.º do Código de Processo Penal e, de facto, o que decorre de tal preceito legal é o seguinte:
“3 - Nos restantes casos de extinção da instância por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, a responsabilidade pelas custas fica a cargo do autor ou requerente, salvo se tal impossibilidade ou inutilidade for imputável ao réu ou requerido, caso em que é este o responsável pela totalidade das custas.
4 - Considera-se, designadamente, que é imputável ao réu ou requerido a inutilidade superveniente da lide quando esta decorra da satisfação voluntária, por parte deste, da pretensão do autor ou requerente, fora dos casos previstos no n.º 2 do artigo anterior e salvo se, em caso de acordo, as partes acordem a repartição das custas.”. [sublinhado e negrito nossos].
Ora, tal preceito legal não só prevê, que em caso de extinção da instância por impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide a responsabilidade pelas custas fica, em regra, a cargo do requerente [ou seja, transportando para o caso dos autos, a cargo, precisamente, do ora demandante/requerente/recorrente], como in casu a impossibilidade da lide não é imputável ao demandado/requerido/recorrido, porquanto na sua causa se encontra o exercício extemporâneo do direito de queixa por parte do requerente/recorrente, causa que apenas a este é imputável.
Improcede, portanto, também quanto a esta questão, o presente recurso.

III- DISPOSITIVO

Pelo exposto, acordam os Juízes Desembargadores da Secção Penal deste Tribunal da Relação de Guimarães em:

A. Rejeitar o recurso interposto pelo assistente/recorrente no que respeita à impugnação das custas reportadas à parte criminal.
Quanto ao demais: 
B. Julgar improcedente o recurso interposto pelo assistente/demandante.
Consequentemente:
C. Confirma-se a decisão recorrida.

Custas pelo assistente/demandante/recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UCS [artigo 515º, nº 1, al. b) e 518.º do Código de Processo Penal e artigo 8º, nº 9, do RCP, com referência à Tabela III anexa ao mesmo].
Notifique.
Guimarães, 10 de julho de 2025
[Elaborado e revisto pela relatora - artigo 94.º, n.º 2, do Código de Processo Penal]

Os Juízes Desembargadores

Isilda Pinho [Relatora]

Pedro Cunha Lopes [1.º Adjunto]

Anabela Varizo Martins [2.ª Adjunta]


[1] Indicam-se, a título de exemplo, os Acórdãos do STJ, de 15/04/2010 e 19/05/2010, in http://www.dgsi.pt.
[2] Conhecimento oficioso que resulta da jurisprudência fixada no Acórdão do STJ n.º 7/95, de 28 de dezembro, do STJ, in DR, I Série-A, de 28/12/95.
[3] Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, edição Notícias Editorial, 1993, pág. 662.