Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | ARMANDO AZEVEDO | ||
Descritores: | PRAZO DE INTERPOSIÇÃO DE RECURSO DILAÇÃO CÚMULO JURÍDICO PENA DE MULTA DE SUBSTITUIÇÃO E PENA DE MULTA PRINCIPAL REPARAÇÃO OFICIOSA DO ARTIGO 82º-A DO CPP RECORRIBILIDADE | ||
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Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 06/25/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | SECÇÃO PENAL | ||
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Sumário: | I- O prazo do nº 1 do artigo 411º do CPP, no caso de recurso da sentença com fundamento em reapreciação da prova gravada, não deverá ser acrescido da dilação de 10 dias, ao abrigo do disposto no artigo 638º, nº 7 do CPC, aplicável por força do disposto no artigo 4º do CPP. II- Não há lugar à realização de cúmulo jurídico entre uma pena de multa substituição e uma pena (principal) de multa, porquanto não podem as mesmas deixar de ser consideradas penas de diferente natureza para efeitos do disposto no nº 3 do artigo 77º CP, motivo pelo qual deverão ser cumuladas materialmente. III- Atendendo à natureza da reparação, os requisitos de admissibilidade de recurso, no caso de reparação arbitrada ao abrigo do disposto no artigo 82.º-A do CPP, não estão no plano do recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil, decidida em ação civil no processo penal, mas antes, no domínio das regras de admissibilidade do recurso penal. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I- RELATÓRIO 1. No processo comum singular nº 2925/21.0JABRG, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Local Criminal de Guimarães – Juiz ..., em que é arguido AA, filho de BB e de CC, natural da freguesia ..., nascido em ../../1997, residente na Rua ..., ..., ..., ..., por sentença de 15.10.2024, depositada na mesma data, foi decidido o seguinte (transcrição)[1]: Julga-se a acusação procedente e, consequentemente, decide-se: a) Condenar o arguido AA pela prática de um crime de actos sexuais com adolescentes, p. e p. pelo artigo 173º, nº 1, do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão, que se substitui por 180 (cento e oitenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos). b) Condenar o arguido AA pela prática de um crime de importunação sexual, p. e p. pelo artigo 170º, do Código Penal, na pena de 90 (noventa) dias de multa, à taxa diária de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos). c) Condenar o arguido AA no pagamento à vítima DD da quantia de € 1.000,00 (mil euros), a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos, nos termos dos artigos 67.º-A, n.º 1, alínea a)-i), b), d) e n.º 3 do Código de Processo Penal, introduzido pela Lei n.º 130/2015, de 4-9, artigo 16.º, n.º 2 da Lei n.º 130/2015, de 4-9 e artigos 1.º, al. j) e 82.º-A do Código de Processo Penal. d) Condenar o arguido nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 3 (três) UC – artigos 513º e 514º, do CPP e artigo 8º, nº 5 e Tabela III, do RCP. 2. Não se conformando com tal decisão, dela interpôs recurso o arguido, sem contudo, formular conclusões. 3. No requerimento de interposição de recurso da sentença proferida nos autos, o arguido requereu que ao prazo de 30 dias previsto no artigo 411º, do CPP, fossem acrescidos 10 dias, nos termos do artigo 638º, nº 7, do CPC, uma vez que, o recurso interposto tem por objeto a reapreciação da prova gravada, o que foi indeferido por despacho datado de 09.12.2024, com o seguinte teor (transcrição): Veio o arguido deduzir recurso da sentença condenatória, alegando que aos 30 dias previstos no artigo 411º, do CPP, acrescem 10 dias, nos termos do artigo 638º, nº 7, do CPC, uma vez que, o recurso interposto tem por objecto a reapreciação da prova gravada. Assim sendo, alega que é tempestivo o recurso, apesar de interposto no terceiro dia útil após o aludido prazo de 30 dias. Pois bem. A questão levantada pelo arguido, com o devido respeito, está já mais que decidida pela doutrina e jurisprudência, no sentido de que não é aplicável no processo penal o referido prazo de 10 dias. Nem tal posição afronta qualquer direito constitucional, designadamente o previsto no artigo 32º, do CRP. Por todos, veja-se o Acórdão da Relação de Coimbra, de 11-11-2022, publicado em www.dgsi.pt: “I – O disposto no artigo 638.º, n.º 7, do Código de Processo Civil, não é aplicável (por força do disposto no artigo 4.º do Código de Processo Penal) ao recurso penal que impugna a matéria de facto. II – A simples afirmação de que o prazo de 30 dias para recorrer limita consideravelmente a defesa do arguido, violando as garantias constitucionais previstas no artigo 32.º, n.º 1 da Constituição, desacompanhada das premissas que a suportariam, não coloca uma questão a resolver e inviabiliza a respetiva avaliação, pelo que improcede ipso facto.” Assim, determina-se a notificação do arguido para, em 5 dias, proceder ao pagamento da multa devida pelo 3º dia útil (artigos 107º-A, do CPP e 139º, nº 6), sob pena de rejeição do recurso, por extemporâneo. 4. Não se conformando com o referido despacho, na parte em que se insurge com a dilação de 10 dias, dele interpôs recurso o arguido, sem também formular conclusões. 5. Ambos os referidos recursos interpostos pelo arguido (da sentença e do despacho) foram admitidos. 6. O arguido procedeu ao pagamento da multa por apresentação do recurso da sentença no terceiro dia após o termo do prazo, por forma a acautelar a hipótese de improcedência do recurso intercalar. 7. O Ministério Público, na primeira instância, respondeu aos recursos, pugnando pela sua improcedência. 8. Nesta instância, a Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta promoveu que o recorrente fosse convidado a apresentar conclusões da motivação dos dois recursos que interpôs, porquanto os recursos são completamente omissos no que às conclusões diz respeito, sob pena de, não o fazendo, os recursos serem rejeitados, em conformidade com o disposto nos artigos 412º, nº 1 e 417º, nº 3 do CPP, o que foi deferido por despacho do relator, tendo o arguido sido notificado nesse sentido e apresentado as seguintes conclusões (transcrição): - Conclusões do recurso do despacho interlocutório: 1 - Do despacho recorrido lê-se que: "Pois bem. A questão levantada pelo arguido, com o devido respeito, está já mais que decidida pela doutrina e jurisprudência, no sentido de que não é aplicável no processo penal o referido prazo de 10 dias. Nem tal posição afronta qualquer direito constitucional, designadamente o previsto no artigo 32º, do CRP." 2 - Em causa está a aplicabilidade da dilação supra referida. 3 - Diga-se que haver decisões em sentido inverso do que se defende, não basta para que se indefira seja o que for, pois é tal divergência que leva a declarações de inconstitucionalidade com força obrigatória geral, assim como à prolação de Acórdãos Uniformizadores de Jurisprudência, sendo que até mesmo havendo um AUJ, veio em pouco tempo a ser proferido novo AUJ sobre a mesma matéria em sentido muito diverso (vejam-se os AUJ 15/97 de 20/05 e 3/99 de 10/07). 4 - Para melhor análise da matéria, urge ver que o Artº 411º do CPP, na redação anterior à Lei 20/2013, fixava um prazo de 20 dias para recorrer, acrescido de 10 dias caso houvesse prova gravada, cfr nº 1 e 4 do artº 411º do CPP. 5 - Ora, o legislador entendeu alargar o prazo de recurso para 30 dias, à semelhança do que acontece no processo civil, que também foi alargado, mantendo-se a dilação do mesmo em caso de o recurso analisar prova gravada. 6 - Sendo que o legislador entendeu não ser necessário incluir no CPP o acréscimo de 10 dias ao prazo de recurso quando este verse prova gravada, porquanto tal já decorre da lei processual civil, que o artº 4 do CPP manda aplicar. 7 - Com efeito, a Lei 20/2013 referida no despacho recorrido, eliminou do CPP a dilação de 10 dias ao prazo de recurso quando este verse análise de prova gravada. 8 - Diga-se que o acréscimo de 10 dias aos prazos de recurso quando este verse prova gravada, verifica-se no CPC e o STJ decidiu já, numa altura em que também o CPP não previa expressamente aquele acréscimo, no Ac. de 27.11.2002, Proc. 02P3212: "O prazo adicional de dez dias que acresce ao prazo normal de recurso, quando o mesmo versa sobre matéria de facto, previsto apenas em processo civil é analogicamente aplicável em processo penal." 9 - Ora, aquando da prolação deste Acórdão do STJ, o CPP não concedia a dita dilação de 10 dias, considerando o STJ que a mesma era aplicável ao abrigo do CPC; analogicamente - e pela remissão do artº 4º do CPP. 10 - Este acréscimo verifica-se, diretamente ou por remissão para o CPC, em todas as áreas judiciais, podendo ver-se: Cod. Proc. Trib. Adm - Artigo 144.º Interposição de recurso e alegações 1 - O prazo para a interposição de recurso é de 30 dias e conta-se a partir da notificação da decisão recorrida. 4 - Se o recurso tiver por objeto a reapreciação da prova gravada, ao prazo de interposição e de resposta acrescem 10 dias. Direito do Trabalho: Acórdão STJ de 06-12-2016 1. O prazo normal para a interposição de recurso de apelação, em direito laboral, é o de 20 dias, mas se ele tiver por objeto a reapreciação da prova gravada a esse prazo acrescem 10 dias. 2. A justificação para esta extensão, ou alongamento, do prazo consiste na necessidade do recorrente ter que instruir as suas alegações com as especificações dos meios de prova cuja reapreciação, na sua opinião, determinam a modificação da decisão da matéria de facto. Direito Tributário - Acórdão do STA, de 20-01-2010 Acrescenta-se 10 dias nos termos do n.º 6 do artigo 698.° do CPC (redação do DL n. 180/96, de 25/09) ao prazo de 15 previsto no n.º 3 do artigo 282.° do CPPT para apresentação das alegações do recorrente no tribunal recorrido, no caso do recurso jurisdicional ter por objeto a reapreciação da prova gravada. 11 - Dispõe a Constituição da República Portuguesa: Artº 20º Acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva 1. A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos. Artº 32º Garantias de processo criminal 1. O processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso. 12 - No que ao conteúdo do artº 20º da CRP, dizem os professores Vital Moreira e Gomes Canotilho na sua CRP, 3ª Edição 1993, em anotação ao Artº 20º pág. 163: "O direito de acesso aos tribunais compreende desde logo um direito a prazos razoáveis de ação ou de recurso, proibindo prazos de caducidade exíguos do direito de ação ou de recurso (cfr. Ac. TC nº 148/87). " (sublinhado e negrito nossos). 13 - Em resumo, seria descabido que o processo penal, que por definição é a área do Direito mais delicada e que tem de ser a mais consistente em matéria de garantia de direitos de defesa, fosse o único dispositivo legal/processual a não conceder um acréscimo de dez dias para elaboração de recurso quando este verse matéria de facto com análise efectiva da prova gravada. 14 - Basta pensar que é no direito penal que estão em causa os mais elevados direitos de personalidade, maxime a liberdade, assim como é geralmente neste âmbito que se verificam os mais longos julgamentos, com maior número de testemunhas e outros intervenientes a serem ouvidos e, consequentemente, mais longa a efectivação da análise das gravações. 15 - Diga-se que o argumento por vezes invocado de que o processo penal não se compagina com "delongas" processuais é de todo absurdo, pois a aplicação da dilação em causa origina UM "atraso" de 10 dias após a sentença/acórdão em todo o decurso do processo, mas a verdade é que mesmo nestes processos de natureza criminal, todos os prazos se suspendem do Domingo de Ramos à segunda feria após a Páscoa, de 16 de julho a 31 de agosto e de 22 de dezembro a 03 de janeiro, ou seja, 69 dias em cada ano judicial que dure o processo!!! 16 - É comum a vários ramos do Direito que o acréscimo de 10 dias não esteja previsto dada a aplicação subsidiária do CPC, mas é sempre assegurado. 17 - A interpretação dada ao artº 411º do CPP, na medida em que entende que a não inclusão da dilação em apreço impede a aplicação subsidiária da mesma ao abrigo do artº 638º nº 7 do CPC, por remissão do Artº 4º do CPP viola o estatuído nos arts 2º, 20º nº 1 e 32º nº 1 da CRP, pois restringe em 10 dias o prazo de recurso de uma sentença em relação a qualquer outro ramo do direito, em similar situação. 18 - Por cautela, invoca-se também a inconstitucionalidade material do artº 3º da Lei 20/2013, de 21/02, que revogou o artº 411º nº 4 do CPP, quando interpretado no sentido de a que ao deixar de haver expressa dilação de 10 dias ao prazo de recurso quando este verse matéria de facto com análise de prova gravada, "proibiu" a aplicação subsidiária do artº 638º nº 7 do CPC, por remissão do artº 4º do CPP, por violação do disposto nos arts 2º, 20º nº 1 e 32º nº 1 da CRP que asseguram garantias de defesa aos cidadãos 19 - Sendo manifesto que as garantias processuais em processo crime não podem ser inferiores das vigentes no processo laboral, importa citar aqui o Acórdão do Tribunal Constitucional 24/2005, de 18.01, que decidiu: a) julgar inconstitucional a norma resultante da conjugação dos artigos 63º, nº 1, do Código do Processo de Trabalho de 1981 e 24º do Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro, aditado pelo Decreto-Lei nº 180/96, de 25 de Setembro, na medida em que determina que a admissão da gravação da prova da audiência de julgamento na primeira instância, não implica a extensão do prazo de recurso, à semelhança do que sucede em situações idênticas de reapreciação da prova gravada no Código de Processo Civil, por tal norma violar os artigos 2º e 20º, nºs 1 e 2, da Constituição; 20 - O entendimento subjacente ao indicado Acórdão é por maioria de razão aplicável no caso da não concessão do prazo suplementar de 10 dias quando o recurso verse a análise da prova gravada no processo penal. 21 - A interpretação conjugada dos dispositivos em causa é geral e abstracta, pois aplica-se a todo e qualquer processo previsto no CPP, bem como a todos aqueles cuja normas remetam para este Código. 22 - É ainda geral e abstracta a interpretação em apreço pois a mesmo afecta de igual modo todo e qualquer interveniente processual, seja o arguido, o Ministério Público, o assistente, o demandante cível ou outro qualquer interveniente que por algum motivo tenha legitimidade em recorrer. - Conclusões do recurso da sentença: 1 - Lê-se na própria sentença que: "É consabido que, neste tipo de criminalidade, as declarações das vítimas merecem uma ponderada valorização, uma vez que, como se referiu supra, estes factos ocorrem apenas na presença dos próprios participantes, o agente e a vítima, sem testemunhas, a coberto da sensação de impunidade e, por isso, preservado da observação alheia." 2 - Sucede que o Tribunal não fez essa "ponderada valorização", pois não atendeu à alteração das versões apresentadas pela alegada vítima. 3 - Assim, num primeiro momento, a alegada vítima diz à sua amiga, a testemunha EE que “03:27 – “(…) que também pegou ao colo (…)”. Def. 05:55: Quando diz que ele pegou nela ao colo, tem alguma ideia se foi ela que saltou para o colo dele, se ele mesmo que pegou nela, não tem ideia: EE: Foi ele. Def. Foi ele que agarrou nela! 4 - Também à mãe da ofendida, a testemunha FF, a alegada vítima disse, como consta da queixa: “(…) e pegou na mesma ao colo, agarrando-a de frente para si (…)” 5 - Contudo, das declarações para memória futura, pode ler-se na transcrição: “00:09:52 – Magistrado Judicial Pronto, era isso. Saltaste para o colo… Será na cintura, não é? 00:09:57 – DD Sim 00:10.00 – Magistrado Judicial E para te segurar? Tiveste que segurar… 00:10:03 – DD Nos ombros dele. 6 – Esta descrição não é de alguém que tivesse actuado coagido, receoso ou fosse o que fosse! 7 - Em relação ao acompanhamento psicológico que a alegada vítima fazia, a mãe desta esclareceu, como transcrito, que tal já acontecia anets e se devia a a mesma estar a fazer o luto do avô. 8 - Assim como também a mesma referiu, no tocante à necessidade/vontade de tomar banho, que tal seria normal após uma aula de equitação e ocorria sempre, como transcrito. 9 - Note-se que a alegada vítima, à perita que elaborou o relatório de 03.05.2023, já afirmou: “pediu para eu me sentar no colo dele” (…) “eu saltei a primeira vez (…)” – e saltar implica balanço e esforço. 10 - Assim como ao ser ouvida em declarações para memória futura, afirmou: “(…) e depois pediu para saltar para o colo dele (…)” Juiz: Olha, mas ele estava de pé ou sentado…? DD: Estava de pé. 11 - Naturalmente que salta à vista ser totalmente diversa uma situação em que alguém agarra uma pessoa à força e a coloca ao seu colo e outra em que alguém, sem cotejar por ora o condicionalismo, salta para o colo de outrem que está de pé. 12 - Anote-se que o relatório já citado refere que a alegada vítima tem "baixa autoestima, considera-se inferior aos demais": Def 16:44 É normal quando ela chega a casa depois das aulas, seja o que for, vai sempre tomar o seu banho? FF: É normal ela tomar duche depois de ter a aula de equitação, sim. 12 - Admitindo por hipótese que a alegada vítima inventou os factos dos autos, ou de uma normal conversa da sua iniciativa e de, por sua iniciativa, ter saltado de repente para o colo do arguido sem que este contasse e tivesse tido possibilidade de se desviar, passou depois a relatar a versão que genericamente consta dos autos, mas depois de a relatar à sua amiga e da reação desta, teve também de relatar a mesma versão à sua mãe. 13 - Claro que a amiga ia indagar da reação materna e ia saber caso tal relato não sucedesse, gerando naturais suspeitas, "forçando" a alegada vítima a contar à mãe a versão que inventara/deturpara, e segundo a qual foi o arguido que a agarrou e lhe pegou ao colo. 14 - É natural que sendo a versão inventada/deturpada, vendo a situação a tomar proporções mais sérias do que um mero relato entre amigas sobre um incidente por si imaginado, tenha começado a haver preocupação, medo, pânico, etc, mas das consequências da sua própria criatividade. 15 - Note-se que a alegada vítima foi de carro para casa com o irmão e nada lhe terá relatado. 16 - Desencadeadas todas as reações conhecidas, como manutenção (!) de idas à psicóloga e participação criminal, a alegada vítima, que tinha já 14 anos e meio, idade já frequentemente com maturidade, desenvolvimento e conhecimentos, deparou-se naturalmente com o receio de ser desmascarada e de ser tornado "público" que inventara a versão criada. 17 - Naturalmente que a ofendida ficou com receio de que algum detalhe da sua história fosse alvo de prova da falsidade, o que seria mais provável em relação ao que puedsse ter sido visto por terceiros. 18 - Mesmo de longe, caso alguém tivesse visto a alegada vítima a, sem mais, saltar para o colo do arguido, tal poderia ter sido relevante e poria aquela numa situação em que não só ninguém a agarrara, como ela teria inventado tal ocorrência ficando forçosamente mal vista perante a amiga (e demais colegas e amigas) e a família. 19 - De recordar que atentas a baixa autoestima e o complexo de inferioridade da alegada vítima, ser a mesma desmascarada numa invenção como a dos autos, deixá-la-ia completamente desesperada porque muito mal vista pela família e amigos. 20 - Assim, é perfeitamente lógico e verosímil que, com receio de que alguém a tivesse visto a saltar voluntariamente para o colo do arguido, tenha decido mudar "um pouquinho" a história que inventara, e passou a dizer, quer durante a perícia quer nas declarações para memória futura que saltou para o colo do arguido, mas porque este lhe disse para o fazer e teve receio porque o mesmo era instrutor no centro hípico – como se tal não implicasse uma aproximação que não existia e um esforço físico considerável e com impulso. 21 - Ora, não só o arguido nunca foi instrutor no centro hípico, como os proprietários do mesmo têm uma filha com 11 anos, como também tal eventual (mas descabido) receio nunca seriam aptos a que a alegada vítima saltasse para o colo do arguido e colocasse os braços à volta do seu pescoço e o agarrasse com as suas pernas à volta da cintura. 22 - O Tribunal não cotejou sequer esta mudança da versão da alegada vítima - que é crucial - e, por consequência, não indagou das possíveis causas da mesma. 23 – Uma verdadeira vítima de factos como os dos presentes autos nunca teria uma reação momentânea e espontânea como a que se verificou nas declarações para memória futura, concretamente na parte que foi assim transcrita nos autos: DD: 00:06:22 (…) É para eu contar o que aconteceu? Juiz: 00:06:24 – Sim DD: 00:06:25 – (Riso) Hum… 24 – Note-se que se tratou de um riso natural, nada indiciador de constrangimento ou sequer de perturbação. 25 – O Tribunal nem se apercebeu deste “riso” da alegada vítima ao perguntar se tinha de contar o que se passara; saíu-lhe sem querer, o que nunca sucederia caso os factos tivessem ocorrido de facto. 26 - Se é verdade que a lei determina a livre apreciação da prova, também é verdade que manda que tal seja feito segundo as " as regras da experiência”, cfr art, 127.º do CPP que se mostra violado. 27 - A alegada vítima situa os factos em dois momentos e lugares distintos. 28 - Ambos os locais são bem iluminados, têm boa visibilidade e havia diversas pessoas no local. 29 - A acrescer, ao mudarem de local, mesmo segundo a versão da alegada vítima, esta e o arguido passaram mesmo junto da entrada do picadeiro, local onde estavam os pais dos alunos que estavam a ter aula, bem como outros alunos que por ali circulavam e a filha dos proprietários do centro hípico. 30 - Mesmo atendendo só à versão da alegada vítima, ao passarem do lado direito do picadeiro para o esquerdo, ao passar junto da porta do picadeiro, além de ali estarem os pais dos alunos, bem podia aquela ter entrado no picadeiro, onde decorria aula e onde estavam a professora, a testemunha GG, bem como os alunos que estavam a ter aula. 31 - Nunca a alegada vítima afirmou que foi agarrada à força ou que foi levada à força para onde quer que fosse. 32 - Absolutamente nada impediria a alegada vítima, caso estivesse a ser vítima do que fosse, ou simplesmente a ter uma conversa que não lhe agradasse, de ao passar junto da porta do picadeiro, que está sempre aberta e é um portão largo, tivesse entrado para o mesmo ou tivesse ficado junto dos pais dos demais alunos que estavam a ter aula. 33 – A descrição do local e das pessoas que lá se encontarvam foi feita pela testemunha GG, remetendo-se para as respectivas transcrições no nº 48 da motivação. 34 – Da sentença consta: “14) Depois levou a ofendida para outra área do estabulo, perguntou-lhe se gostava de música tecno, ao que esta respondeu que sim. “ 35 – Ora, da própria transcrição das declarações da alegada vítima, lê-se: 00:11:30 – DD Aconteceu. Depois nós fomos para outra parte de onde nós estávamos, em vez de para o lado esquerdo do picadeiro, estávamos do lado direito, e ele aí começou a fazer perguntas… 36 – Daqui resulta que não só estiveram em ambos os lados do picadeiro, passando forçosamente (porque não há alternativa) junto da porta onde estão os pais dos alunos que estão a ter aula, bem como alunos e acompanhantes que não estejam a ter aula, podendo perfeitamente simplesmente ter ficado ali parada que certamente nenhum agressor (que o fosse) iria forçar uma vítima a seguir consigo para outro local, mesmo junto de várias pessoas adultas, mas também se vê que o discurso é “fomos”, o que tem implícita uma atitude concordante, ou teria dito “Ele levou-me para o outro lado”, ou “depois ele disse-me que tinha de o acompanhar para o outro lado”; mas não, disse: “fomos”! 36 – Nunca em lugar algum alguém referiu que o arguido teve a mínima intervenção, acto ou o que fosse que compelisse a alegada vítima a acompanhá-lo de um lado do picadeiro para o outro lado, leia-se de um lado da porta para o outro lado da porta do picadeiro, pois as boxes ficam todas no mesmo corredor. 37 - Acresce que o Tribunal não deu a mínima consideração à indagação levada a cabo pela proprietária e dona do centro hípico, que disse que na altura achou que nada se passara e que havia falado com a filha e com mais pessoas, limitando-se a dizer que a testemunha GG "Confirmou ter redigido a mensagem que consta de fls. 59, remetida ao pai da menor e após ter conversado com o arguido.". 38 – Contudo, a testemunha GG disse i.a. o que consta dos nºs 56 e 57 da motivação, para onde se remete, referindo a mesma variadas diligências, abordagens a várias pessoas e relatando nada de naad ter sido apontado. 39 - Lê-se ainda na sentença: "De referir, com relevo, que do teor da mensagem de fls. 59, resulta, inequivocamente, que o sucedido entre a ofendida e o arguido, exorbita dos padrões da normalidade, daí a necessidade de o arguido referir, à sua entidade patronal (a testemunha GG) que pretendia desculpar-se, que teria sido mal interpretado e que a conversa não tinha seriedade e foi apenas uma brincadeira, o que confere ainda maior credibilidade à versão da ofendida." 40 – Sucede que é perfeitamente verosímil que a alegada vítima tenha tido a iniciativa de abordar assuntos de natureza sexual, que tenha sido por sua livre iniciativa que tenha saltado para o colo do arguido, sentindo-se este constrangido e feito algum comentário que tivesse dado origem à mensagem em causa. 41 - A mensagem em si não prova absolutamente nada sobre o que tivesse ocorrido ou sequer tivesse sido dito, sendo que, como consta da sentença tal sms diria que “(…) teria sido mal interpretado e que a conversa não tinha seriedade e foi apenas uma brincadeira (…)” 42 – Sucede que ao contrário do que entendeu o Tribunal: “confere ainda maior credibilidade à versão da ofendida.”, a verdade é que a sms apenas se refere a “conversa” e não já a qualquer acto, como o simples facto de ouvir a alegada vítima tecer qualquer comentário sobre a sua vida sexual, tendo-lhe por exemplo dito para ter juízo e mudado de conversa era perfeitamente suficiente para o arguido ter dito o que consta da SMS. 43 – Diga-se aliás que tal sms é enviada pela proprietária do centro hípico ao pai de uma aluna, não podendo o Tribunal deixar de ponderar que tal é, quiçá, feito por muitas e variadas razões e influências, o que aliás foi esclarecido (mas ignorado) na trasncrição feita no nº 64 da motivação, para onde se remete. 44 – A simples audição pelo arguido de frases proferidas pela alegada vítima a falar sobre a sua virgindade, é apta a levar o arguido a afirmar o que resulta da mensagem, sobretudo quando a própria denunciante, mãe da alegada vítima relatou: FF 08:59 – Disseram também que a pessoa não teria grandes capacidades cognitivas, ou que, pronto, teria ali algumas limitações e que… 45 – Urge dizer que o relatório psicológico, ao referir factos concretos identifica SEMPRE o alegado abusador, por 3 vezes, como “HH” (o arguido não tem tal nome), e tem-no numa “posição de superioridade/autoridade deste (professor) “ – quando o arguido nunca foi professor ou o que fosse (tendo a perita sido ludibriada ou simplesmente enganou-se redondamente), assim como é expresso em relação à alegada vítima referindo que: “(…) identificam-se alguns indicadores de baixa autoestima como por exemplo, considerar-se inferior aos outros, não ter uma atitude positiva face a si mesma ou sentir-se inútil.” 46 – O Tribunal no Facto17 dá como provado que “Ante a conduta do arguido acima descrita, a vítima ficou afetada psicologicamente com o sucedido, tendo necessitado de acompanhamento psicológico, durante vários meses. “ 47 – O Tribunal não atentou no que disse a mãe da alegada vítima já fazia acompanhamento psicológico antes dos alegados factos, como consta da sentença e se transcreveu no nº 67 da motivação e não se apurou o real motivo pelo qual foi mantido. 48 – No tocante à veracidade e transparência da atitude em geral da alegada vítima para com a sua mãe e amiga, temos que ver que é pacífico que a mesma já frequentava uma psicóloga há algum tempo e que o relatório psicológico refere baixa autoestima e complexos de inferioridade. 49 – Contudo, no que respeita às consultas com psicóloga, a alegada vítima omitiu-as à sua amiga EE, como transcrito no nº 70 da motivação. 50 – Sendo que quanto à baixa autoestima e complexos da alegada ofendida, disse a sua mãe sobre a sua profissão: FF: 00:25 Psicóloga clínica. Def. 11:53 Acha que a sua filha tinha uma autoestima normal ou poderia ter algum problema de autoestima? FF: Eu, no meu entendimento e por aquilo que me foi transmitido o problema da minha filha não era de autoestima. Def. E foi-lhe transmitido? FF: Sim, pela colega que estava a acompanhar. 51 – A mesma referira também que o circunstancialismo familiar era de confiança em que tudo era partilhado, mas a verdade é que, ou a alegada vítima mentiu repetidas vezes, durante a perícia psicológica e as declarações para memória futura, ou a versão apresentada à mãe diverge de forma crucial, pois alguém agarrar outrem e colocá-lo “à força” no seu colo ou alguém dar um impulso e saltar para o colo de alguém que está de pé, de modo a agarrar-se ao respectivo pescoço para não cair é totalmente diverso. 52 – A intervenção pessoal, o esforço físico, etc, são completamente diferentes. 53 – Poderíamos aqui divagar sobre a causa da divergência das versões apresentadas pela alegada vítima quanto à forma como teria ido para o colo do arguido, que estava de pé, mas entraríamos num leque demasiado vasto, sendo que o relevante, é que qualquer hipótese seria sempre benéfica para o arguido e apta a descredibilizar todo o discurso daquela. 54 – A verdade porém, é que o Tribunal não curou de apurar a causa da divergência de versões, que nem referiu sequer, nem tão pouco a inviabilidade física de os factos imputados não terem sido presenciados por terceiros, e bem assim que ao passar junto da porta, onde estão sempre pessoas durante as aulas, sempre a alegada vítima poderia ter ai ficado, sendo que existe ainda contradição porquanto nunca o Tribunal refere que o arguido de algum modo forçou, coagiu o fosse o que fosse, de modo a que a alegada vítima o acompanhasse de um para outro lado da porta, das boxes do lado esquerdo para as do lado direito. 55 – Muito relevante, porque provindas de psicóloga clínica, disse a mãe da alegada vítima: Def.:12:20 “(…) só como psicóloga clínica, se houver alguém, nesta faixa etária, que tenha alguns problemas de autoestima, que se compare com os outros e que se ache inferior, porque é menos bonita, ou porque é menos jeitosa, ou porque é menos inteligente, ou porque não sabe tão bem conviver, poderia de alguma forma, uma situação de alguma FF. Se me vai perguntar se é possível, sim, é possível. Def. Ainda não fiz a pergunta. FF: Mas estamos a falar num campo de hipóteses e de cenários. Def.:Exactamente! Mas a pergunta é: se alguém com esta idade, tiver problemas de autoestima, é possível que crie uma situação de algum assédio para que amigos próximos achem que ela até despertou algum interesse? FF: Eu conhecendo o ser humano como conheço acho que tudo é possível! Def. (…) Se, sendo isso possível, num primeiro momento se faz um comentário só com uma determinada pessoa, nomeadamente uma amiga muito chegada, mas aquilo é logo empolado, fala com mais pessoas, eventualmente queixa e isto e aquilo, é possível que a pessoa se aperceba de que a situação está a ganhar uma dimensão superior e mais grave do que aquela que imaginou que seria possível, pode ficar perturbada, com receio? FF: De que consequência, de que contingência? Def.: 13:49 Não, uma coisa é eu falar com o meu amigo, “eh pá, aconteceu isto”, e fica entre nós, outra coisa é ele dizer: “ó pá, tens de falar com os teus pais, pode ser que FF: Isso pode transtornar ou não transtornar: depende da relação pré existente com os progenitores. E neste caso em concreto, a relação que temos em casa permite realmente que os meus filhos venham até nós em situações complexas, complicadas, nos momentos difíceis. A mensagem que foi sempre passada aos meus filhos é que nós estamos lá para viver as vitórias com eles mas também estamos lá, sobretudo para viver as derrotas e as dificuldades. E portanto que, havendo eventualmente qualquer coisa, seja do que for, tenham eles tido a iniciativa, tenham eles sido de facto envolvidos nas situações, elas são para ser relatadas. E portanto nós tivemos sempre em casa esta, esta postura, esta abertura, foi sempre esta a mensagem que foi passada aos meus filhos. Agora é assim: eu sei que há dinâmicas familiares que são diferentes e, portanto, sim, é verdade! A, há de facto temperamentos que são diferentes. Sim, há circunstâncias que são sentidas, vividas, pensadas pelas pessoas de forma diferente. Devido justamente a este temperamento com que nascem e as pessoas não escolhem os genes com que nascem, e também as experiências prévias de vida que tiveram, não é? A interação com isso torna-nos na versão que somos, qualquer um de nós que está aqui. Portanto, sim, que esse cenário é possível, é! É possível! Se ele seria possível no caso da minha filha? Não, por aquilo que lhe tenho dito. Por aquilo que agora acabei de expor. 56 - Como já visto e comprovado, ou a alegada vítima mentiu de forma descarada, grosseira e inequívoca durante a perícia psicológica e nas declarações para memória futura, ou o ambiente relatado pela mãe enquanto mãe e/ou psicóloga não existe! 57 – Se o ambiente fosse como a psicóloga clínica relatou e que a leva a não ter como “possível no caso da minha filha” nunca haveria as duas versões tão díspares quanto a um pormenor muito relevante, mas que se calhar fez com que a alegada vítima não fosse capaz de dizer à mãe que tinha sido ela a saltar para o colo de um rapaz que estava de pé – cada um que tire as suas conclusões. 58 – Note-se ainda que a alegada vítima não seria assim tão inexperiente e até faria sentido a versão da conversa trazida pela testemunha GG. 59 – Com efeito, disse a mãe da alegada vítima: Def. 17:06 Ela tem alguma relação, ou tem alguma evolução da própria relação de namoro ou namoros fora desta mesma circunstância? FF: Está a falar à data ou até Def.: Sim, até aquela data? FF: Que eu tenha conhecimento sim! Ela namoriscava com Def.: Namoriscava? FF: Sim, sim. 60 – Verifica-se assim nulidade da sentença por falta de fundamentação, devido à inexistência de valoração de todas as provas produzidas, como determina os art. 374.º nº 2 e 379.º nº 1 al. a) do CPP. 61 – A acrescer, o art. 127.º do CPP determina que “ (…) a prova é apreciada segundo as regras da experiência (…)”, e o Tribunal não respeitou tais regras, inclusive ao não ponderar sequer a falsidade da versão apresentada e sobretudo ao não detectar e averiguar a causa da divergência das versões da alegada vítima, mostrando-se assim violado tal dispositivo. 62 – Atenta a já demonstrada falta de credibilidade da única testemunha, a própria alegada ofendida que alterou a sua versão dos factos e que segundo a perícia realizada denota sérios problemas de autoestima e complexos de inferioridade, carece de prova suficiente a matéria constante dos factos 5 a 17 e 19 a 21, pelo que atentas as regras do ónus da prova em Direito Penal e os princípios da presunção de inocência e do in dubio pro reo, devem passar a matéria não provada. 63 – Sem prescindir, sempre se dirá que as medidas das penas se mostram exageradas. 64 – Com efeito, além das circunstâncias já referidas na sentença, a reduzida gravidade real dos factos, conexa com a ausência de qualquer incidente fosse de que natureza fosse do arguido em toda a sua vida até agora, sempre impunham que ambas as penas fossem fixadas nos mínimos legais, devidamente atenuados, mostrando-se violado o disposto nos artigos 71,º , 72.º al. d) e 73.º do Código Penal. 65 - Verifica-se que o arguido se mostra condenado numa pena de prisão substituída por multa e numa pena de multa. 66 – O Tribunal não procedeu ao cúmulo jurídico de penas, condenando o arguido numa pena única. 67 – É verdade que não podem ser cumuladas penas de diferente natureza, mas a pena de prisão ao ser convertida em multa gera no caso uma situação de obrigação de pagamento de duas multas. 68 - Conforme Ac. do STJ Proc. 01P4217, de 06-03-2002, tem de considerar-se a pena que efectivamente há a cumprir, mau grado a eventual possibilidade de futura alteração em caso de pagamento ou não pagamento da(s) multa(s). 69 - Com efeito, a situação dos autos é similar, pois que o arguido tem duas multas a pagar, sendo uma decorrente de uma pena originária de multa e outra decorrente de substituição de pena de prisão. 70 - Não deixa contudo o arguido de ter de pagar duas multas, pelo que se impõe-se a efectivação de cúmulo, que ao não ser efectuado gera nulidade da sentença. 71 - Verifica-se assim que deveria ter sido efectuado o cúmulo jurídico das penas, mostrando-se violado o disposto no artigo 77.º nºs 1 e 3 do Código Penal. 72 - Dado que é necessário preservar o direito ao recurso, seja por parte do arguido ou do Ministério público, a pena única deve ser determinada pela primeira instância, devendo ser ordenada a baixa para tal. 73 – Por consequência, deve ser revogada também a sentença na parte em que fixa uma indemnização à alegada vítima. 74 – Esta indemnização, mesmo face aos alegados factos e suas alegadas consequências, nunca poderia ser fixada além de 250 €. 9- A Exma. Senhora Procuradora- Geral Adjunta foi de parecer que ambos os recursos deverão ser julgados improcedentes. 10. Cumprido o contraditório quanto ao parecer da Exma. Senhora Procuradora- Geral Adjunta, não foi apresentada qualquer resposta. 11. Após ter sido efetuado exame preliminar, foram colhidos os vistos legais e realizou-se a conferência. II- FUNDAMENTAÇÃO 1- Objeto do recurso O âmbito do recurso, conforme jurisprudência corrente, é delimitado pelas suas conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, sem prejuízo naturalmente das questões de conhecimento oficioso[2] do tribunal, cfr. artigos 402º, 403º e 412º, nº 1, todos do CPP. Assim, considerando o teor das conclusões dos recursos interpostos no sentido acabado de referir, o objeto dos recursos centra-se no seguinte: - Recurso do despacho interlocutório - Saber se o prazo de recurso de 30 dias do nº 1 do artigo 411º do CPP, de recurso da sentença proferida nos autos com vista à apreciação da matéria de facto deverá ser acrescido da dilação de 10 dias, ao abrigo do disposto no artigo 638º, nº 7 do CPC, aplicável por força do disposto no artigo 4º do CPP; e - Inconstitucionalidade material do artigo 3º da Lei 20/2013, de 21/02, que revogou o artigo 411º nº 4 do CPP, quando interpretado no sentido de que ao deixar de haver expressa dilação de 10 dias ao prazo de recurso quando este verse matéria de facto com análise de prova gravada, "proibiu" a aplicação subsidiária do artº 638º nº 7 do CPC, por remissão do artº 4º do CPP, por violação do disposto nos arts 2º, 20º nº 1 e 32º nº 1 da CRP que asseguram garantias de defesa aos cidadãos - Recurso da sentença - Nulidade da sentença recorrida por falta de fundamentação devido à inexistência de valoração de todas as provas produzidas, em conformidade com o disposto nos artigos 374.º nº 2 e 379.º nº 1 al. a) do CPP. - Erro de julgamento da matéria de facto provada indicada pelo recorrente, em conformidade com o disposto no artigo 412º, nº s 2 e 4 do CPP; e violação dos princípios do in dubio pro reo e da presunção de inocência do arguido; - Excessividade das penas aplicadas; - Imposição legal de realização de cúmulo jurídico das penas de multa aplicadas (pena de multa de substituição e pena (principal) de multa); - Excessividade da quantia arbitrada oficiosamente pelo tribunal à vítima. 2- A decisão recorrida 1. Na sentença recorrida foram considerados provados e não provados os seguintes factos, seguidos da respetiva fundamentação da matéria de facto e do respetivo enquadramento jurídico (transcrição): A. FACTOS PROVADOS: Da acusação: 1) AA, nascido a ../../1997, à data dos factos com 24 anos, era colaborador no Centro Hípico ..., sito na Rua ..., ..., em Guimarães. 2) No âmbito de tal actividade conheceu a vítima, DD, nascida a ../../2011, que desde meados de setembro de 2021, frequentava aulas de equitação do mencionado Centro Hípico. 3) À data da prática dos factos, a vítima possuía 14 anos de idade e a altura, fisionomia e corpo condizente com essa idade. 4) No dia 24 de novembro de 2021, no final da aula, cerca 18:00 horas, o arguido, que estava a proceder a limpezas, encontrava-se com a junto ao estábulo. 5) Naquelas circunstâncias o arguido olhou para as nádegas da vítima e disse-lhe “Não tens nada aí”, querendo com tal frase dizer que não tinha rabo. 6) De seguida, perguntou-lhe se podia tocar. 7) A vítima disse-lhe que não. 8) O arguido, mesmo assim, com uma das mãos tocou-lhe numa das nádegas, apertou-a com a mão e disse-lhe que o rabo desta era fofinho. 9) Estando ambos de pé, o arguido disse-lhe para saltar para o seu colo. 10) A arguida, sentindo receio do arguido, fez o que este lhe pediu. 11) O arguido segurou-a, com ambas as mãos, pelas nádegas, puxando-a para este, ficando a vítima com as pernas entrelaçadas na cintura do arguido, defronte um para o outro, com as respetivas aéreas genitais a tocarem-se por cima da roupa. 12) Ainda nessa posição, perguntou à ofendida se lhe podia tocar nas mamas, ficando esta sem reação. 13) O arguido, sem resposta, tocou-lhe com a mão nas mamas da ofendida, por cima da roupa. 14) Depois levou a ofendida para outra área do estabulo, perguntou-lhe se gostava de música tecno, ao que esta respondeu que sim. 15) Depois disse-lhe ia a muitos festivais e que se envolvia sexualmente com várias raparigas e perguntou-lhe se era virgem, se cuspia ou engolia, referindo-se ao sémen após ejaculação na sequência da prática de sexo oral. 16) Incomodada com todo o sucedido, a vítima ligou ao seu irmão para a ir buscar. 17) Ante a conduta do arguido acima descrita, a vítima ficou afetada psicologicamente com o sucedido, tendo necessitado de acompanhamento psicológico, durante vários meses. 18) E deixou de frequentar o referido Centro Hípico. 19) O arguido sabia que a sua conduta era contrária ao interesse e prejudicial ao normal desenvolvimento da jovem; sabia que o jovem tinha 14 anos de idade à data dos factos e que, por tal facto, não tinha a capacidade e o discernimento necessário a uma livre decisão, nem tão pouco capacidade para entender a gravidade e natureza dos atos e da proposta que este lhe efetuava; e não obstante, aproveitando-se de tal circunstância, quis e conseguiu atuar da forma descrita - perpassando o corpo da vítima, questionando-a sobre a sua experiência sexual e propondo-lhe a prática de atos sexuais consigo -, visando obter prazer sexual, causar-lhe excitação e importunando-a. 20) Quis e conseguiu, desse modo, pôr em causa o sentimento de vergonha e pudor sexual, bem como a liberdade e autodeterminação sexual do jovem, prejudicando deste modo o livre e harmonioso desenvolvimento da sua personalidade, nomeadamente na esfera sexual. 21) O arguido agiu sempre de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas pela lei penal. Da situação pessoal e económica do arguido: 22) O arguido é trabalhador na área da construção civil, auferindo o salário mínimo nacional. 23) Vive a companheira, trabalhadora por conta de outrem, auferindo igualmente o salário mínimo nacional. 24) Vivem em casa arrendada, sendo a renda mensal de € 600,00. 25) Não têm filhos. 26) O arguido concluiu o 9º ano de escolaridade. 27) Não são conhecidos antecedentes criminais ao arguido. B. FACTOS NÃO PROVADOS: Da acusação: a) Foi o arguido quem solicitou que a vítima o acompanhasse até ao estábulo. III MOTIVAÇÃO: O Tribunal formou a sua convicção apreciando de forma crítica o conjunto da prova produzida em audiência, a qual foi apreciada segundo as regras da experiência e bom senso. Assim, o arguido exerceu o direito a não prestar declarações (artigo 61º, nº 1, alínea d) e 343º, nº 1, do CPP). Foram ouvidas em sede de audiência de julgamento as declarações para memória futura prestadas pela ofendida DD, prestadas em fase de inquérito, as quais, de resto, se encontram transcritas (fls. 154/173). Tais declarações que, com as limitações próprias da ausência de uma imediação com a vítima, soaram espontâneas e objectivas, tendo a factualidade provada sustentação em tais declarações. De resto, com relevo, importará atentar no teor do relatório de perícia psicológica forense realizada à ofendida, segundo o qual, entre o mais, se conclui que “a denúncia é apresentada de forma consistente, resultando num parecer positivo quanto à credibilidade do relator da menor, relato que contém um número expressivo de indicadores que apontam no sentido da credibilidade. Entre estes o carácter lógico da descrição dos factos, a quantidade de pormenores referentes ao contexto e à sequência da ocorrência, as emoções descritas face ao ofensor e a forte consistência entre as entrevistas. Não se identificaram processos que possam contaminar a veracidade do testemunho, nomeadamente a presença de distorções significativas de memória nem indicadores de eventual mentira da autoria da menor ou induzida por terceiros. Não houve incongruências ao longo do seu discurso e do seu relato. Não se percepcionam ganhos secundários que possam advir da denúncia. A menor demonstrou um desenvolvimento global de acordo com o esperado para a idade. Emocionalmente, foi evidente o mal-estar psicológico associado à situação de abuso, essencialmente manifestado através de sentimentos de desvalorização pessoal, ansiedade, baixa autoestima e autoconceito negativo. Foi evidente o receio sentido pela menor em face da denúncia e da possibilidade de ter que enfrentar novamente o abusador, tendo em conta a posição de superioridade/autoridade deste (professor) e o impacto negativo que esta experiência parece ter tido na autoestima da menor e na forma mais ansiosa como esta encara novas situações de interação social, “agora quando conheço alguém fico mais nervosa, tenho medo…” (sic). “(fls. 145/148). EE, amiga da ofendida, num registo seguro e objectivo, esclareceu que no dia dos factos, a ofendida ligou-lhe a contar-lhe o que havia sucedido, designadamente os toques de que havia sido alvo e o teor da conversa do arguido, nos termos dados como provados. Mais confirmou que a ofendida estava visivelmente em choque e triste. Mais referiu que a ofendida nunca lhe tinha falado, em momento anterior, da existência do arguido e muito menos de uma qualquer relação de proximidade com o mesmo. FF, mãe da ofendida, também num registo que se nos afigurou seguro, objectivo e descomprometido, relatou que a ofendida lhe contou, no próprio dia da ocorrência, o que havia sucedido, designadamente os toques físicos levados a cabo pelo arguido e o teor da conversa, nos termos dados como provados. Mais relatou que a ofendida estava visivelmente transtornada, o que prejudicou, entre o mais, o seu sono, o que, determinou, igualmente, que tal assunto fosse tratado no âmbito das consultas de psicologia, que, em boa verdade, já frequentava, mas relacionadas com a fase de luto que atravesso na sequência do falecimento do avô. Confirmou que a ofendida, perante o sucedido, deixou de frequentar o centro hípico. II, exploradora do centro hípico, não tendo assistido aos factos, relatou que tomou conhecimento do sucedido através do pai da ofendida. Confrontou o arguido com a acusação, o qual terá negado. Confirmou ter redigido a mensagem que consta de fls. 59, remetida ao pai da menor e após ter conversado com o arguido. Mais foi valorado o teor da certidão do assento de nascimento, do qual resulta, entre o mais, a data de nascimento da ofendida (fls. 16). Nos crimes como o que está em causa nos autos, pelas suas características, dificilmente existem testemunhas, tratando-se de factos do foro íntimo normalmente apenas presenciados pelos próprios participantes, o agente e a vítima. É essa a situação dos autos, já que não existem testemunhas, com conhecimento directo, dos factos imputados. É consabido que, neste tipo de criminalidade, as declarações das vítimas merecem uma ponderada valorização, uma vez que, como se referiu supra, estes factos ocorrem apenas na presença dos próprios participantes, o agente e a vítima, sem testemunhas, a coberto da sensação de impunidade e, por isso, preservado da observação alheia. Ora, da conjugação das declarações da ofendida, que nos termos sobreditos, se revelam credíveis (para além, de confortadas pelo já citado relatório de avaliação psicológica), bem como o depoimento das testemunhas de acusação, não teve o tribunal quaisquer dúvidas no sentido de que os factos ocorreram tal como foram dados como provados. De referir, com relevo, que do teor da mensagem de fls. 59, resulta, inequivocamente, que o sucedido entre a ofendida e o arguido, exorbita dos padrões da normalidade, daí a necessidade de o arguido referir, à sua entidade patronal (a testemunha II) que pretendia desculpar-se, que teria sido mal interpretado e que a conversa não tinha seriedade e foi apenas uma brincadeira, o que confere ainda maior credibilidade à versão da ofendida. No que concerne ao aspecto subjectivo da conduta, ponderou-se o iter criminis do arguido, ou seja, a acção objectiva apurada, apreciada à luz de critérios de razoabilidade e bom senso e das regras de experiência da qual se extrai a sua intenção, designadamente a de, mediante os toques em vários zonas do corpo da ofendida, satisfazer os seus instintos libidinosos e de a importunar, com conversas de teor sexual, bem sabendo que se tratava de menor e que, com a sua conduta, abusava da sua inexperiência (evidenciada pela idade da menor, pelo contexto e local em que ocorriam os factos, designadamente pela circunstância da menor estar convencida que o arguido seria, pelo menos, formador do centro hípico e, bem assim, a aparente incapacidade da menor responder enérgica e negativamente aos avanços do arguido, bem revelados na conduta “exploratória” que o mesmo empreendeu), pondo em causa a sua liberdade e autodeterminação sexual, conduta que igualmente sabia ser proibida e criminalmente punida, sendo certo que não foi produzida qualquer prova no sentido contrário. O arguido esclareceu a sua situação pessoal e económica, nos precisos termos dados como provados. A ausência de antecedentes criminais, resulta do CRC junto aos autos. A factualidade não provada resulta da falência da prova. IV. APLICAÇÃO DO DIREITO AOS FACTOS: Dispõe o artigo 173º, do Código Penal: “1 - Quem, sendo maior, praticar ato sexual de relevo com menor entre 14 e 16 anos, ou levar a que ele seja praticado por este com outrem, abusando da sua inexperiência, é punido com pena de prisão até 2 anos. 2 - Se o ato sexual de relevo consistir em cópula, coito oral, coito anal ou introdução vaginal ou anal de partes do corpo ou objetos, o agente é punido com pena de prisão até 3 anos. 3 - A tentativa é punível.” O bem jurídico tutelado por esta incriminação é “a liberdade de autodeterminação sexual do adolescente (menor entre 14 e 16 anos de idade), em face do processo fraudulento e enganoso de sedução utilizado pelo agente. Dito de outro modo, a incriminação visa proteger o processo de motivação do adolescente para a prática do ato sexual, penalizando o ato sexual tido como erro do adolescente sobre os motivos provocado ou explorado pelo agente” (vide Paulo Pinto de Albuquerque, in “Comentário do Código Penal”, 3.ª Ed., Novembro de 2015, pág. 692). Ou, como afirmam Mouraz Lopes e Tiago Milheiro, in “Crimes Sexuais – Análise Substantiva e Processual”, 1.ª Ed., Dezembro de 2015, págs. 172/174, “o que está em causa neste crime é tão só a utilização de menores, para a prática de atos sexuais de relevo, numa faixa etária muito precisa entre 14 e 16 anos, por maiores, abusando da sua inexperiência”. Estamos perante um crime de perigo abstracto, uma vez que não se exige um efectivo dano para o desenvolvimento livre, físico ou psíquico, bastando-se o legislador com a mera potencialidade de tal ocorrência, sendo ainda de mera actividade quanto à forma de consumação do ataque ao objecto da acção. Por acto sexual deve entender-se o comportamento que, de um ponto de vista predominantemente objectivo, assume uma natureza, um conteúdo ou um significado directamente relacionados com a esfera da sexualidade e, por conseguinte, com a liberdade de determinação sexual de quem o sofre ou de quem o pratica. Ainda que assim seja, para determinação do conteúdo do carácter sexual do acto poderá também relevar o circunstancialismo de lugar, de tempo e de condições que o rodeia e que o faça ser reconhecível pela vítima como sexualmente significativo (vide Figueiredo Dias, in “Comentário Conimbricense do Código Penal: Parte Especial”, 1999, pág. 448). Conforme resulta do preceito em análise, o conteúdo sexual do acto pode assumir diferente natureza, nomeadamente cópula, coito anal, coito oral ou introdução vaginal ou anal de partes do corpo ou objectos, o que alcança directo reflexo ao nível da moldura abstracta da pena a aplicar. O tipo objectivo consiste na prática de acto sexual de relevo, nos termos assinalados anteriormente, com um menor entre 14 e 16 anos, com abuso da sua inexperiência, sendo que a acção típica pode consistir em o agente levar o menor a praticar o acto sexual ou contacto sexual consigo ou com terceiro. Ato sexual de relevo é, pois, o conceito chave na matéria dos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexuais. Para o Prof. Figueiredo Dias, ato sexual é (...) todo aquele (...) que, de um ponto de vista predominantemente objectivo, assume uma natureza, um conteúdo ou um significado directamente relacionados com a esfera da sexualidade e, por aqui, com a liberdade de determinação sexual de quem o sofre ou o pratica (...) ao exigir que o acto sexual seja de relevo a lei impõe ao intérprete que afaste da tipicidade não apenas os actos insignificantes ou bagatelares, mas que investigue do seu relevo na perspectiva do bem jurídico protegido (...) é dizer, que determine – ainda aqui de um ponto de vista objectivo – se o acto representa um entrave com importância para a liberdade de determinação sexual da vítima (...) com o que ficam excluídos do tipo, actos que, embora ‘pesados’ ou em si ‘significantes’ por impróprios, desonestos, de mau gosto ou despudorados, todavia, pela sua pequena quantidade, ocasionalidade ou instantaneidade, não entravem de forma importante a livre determinação sexual da vítima (vide Comentário Conimbricense do Código Penal – Parte Especial, Tomo I, Coimbra, 1999, p.447-449). Aludindo ao conceito de ato sexual de relevo, SÉNIO REIS ALVES afirma: [o] acariciar dos seios é um acto sexual? E se sim, é de relevo? (…) Numa noção pouco rigorosa (diria sociológica) de acto sexual têm cabimento actos como os supra referidos (o acariciar dos seios e de outras partes do corpo). São aquilo que vulgarmente se designa como preliminares da cópula e, por isso, são actos de natureza sexual ou, se se preferir, actos com fim sexual, pelo que o acto sexual de relevo é, assim, todo o comportamento destinado à libertação e satisfação dos impulsos sexuais (ainda que não comporte o envolvimento dos órgãos genitais de qualquer dos intervenientes) que ofende, em grau elevado, o sentimento de timidez e vergonha comum à generalidade das pessoas e a relevância ou irrelevância de um acto sexual só lhe pode ser atribuída pelo sentir geral da comunidade (…) que considerará relevante ou irrelevante um determinado acto sexual consoante ofenda, com gravidade ou não, o sentimento de vergonha e timidez (relacionado com o instinto sexual) da generalidade das pessoas – sublinhado nosso (vide Crimes Sexuais – Notas e Comentários aos artigos 163º a 179º do Código Penal, Livraria Almedina, Coimbra, 1995, p.11ss). O acto, além de ter de configurar-se como sexual, necessita, para efeitos criminais, de ser, em si, sempre relevante, pois é este seu carácter de importância que o faz transportar para o iter criminis. Sobre este conceito múltiplo (ato sexual e de relevo) escreve MAIA GONÇALVES que (…) [t]rata-se de um conceito novo a que se faz apelo em outros preceitos (…) Tanto a cópula como o coito anal e oral são actos sexuais de relevo, precisamente os mais graves. (…) A referência a acto sexual de relevo ajusta-se melhor ao novo posicionamento e vinca ainda mais o pensamento legislativo de restringir o tipo. Assim se erradica (…) do direito criminal todo o dogmatismo moral, ficando no entanto dele somente condutas sexuais que ofendam bens jurídicos fundamentais das pessoas no que concerne à sua livre expressão do sexo. Não é porém possível estabelecer em parâmetros exactos o que se deve entender por condutas ou actos sexuais. E saliente-se a propósito que as dificuldades na definição desses parâmetros sempre serão mais facilmente superadas do que as que surgiram na definição do abandonado conceito de atentado ao pudor. (…) Parece-nos, porém, certo que acto sexual só pode ser considerado aquele que tem relação com o sexo (relação objectiva) e em que, além disso haja por parte do seu autor a intenção de satisfazer apetites sexuais (…) Esta definição do conceito de acto sexual, em que entra uma conotação subjectiva, que supomos predominante, não é porém unânime. Entre nós o Prof. Figueiredo Dias, Comentário Conimbricense, I, 448, sustenta uma interpretação objectivista, resolvendo depois os casos de escola como o do médico que examina o corpo de uma paciente ou o pai que beija uma filha através de causas de justificação ou de não correspondência à teleologia hodierna dos crimes sexuais. De qualquer modo, o tipo está limitado pelo uso de expressão restritiva de relevo. O direito criminal, como ultima ratio, implica que só seja tutelada a liberdade sexual contra acções que revistam certa gravidade. Em tais termos, actos como o coito oral e a masturbação devem aqui ser incluídos; o mesmo não sucederá, em regra, com os beliscões e os beijos, que só o deverão ser em casos extremos, ou seja naqueles em que existem grande intensidade objectiva e intuitos sexuais atentatórios da autodeterminação sexual. Trata-se, afinal, de afloramento do princípio bagatelar – de minimis non curat praetor. Deve em todo o caso anotar-se que não é indispensável o contacto mútuo com o corpo da vítima. (…). Mesmo o comportamento por omissão, como permanecer nu perante a vítima, pode eventualmente ser considerado acto sexual de relevo, tudo dependendo das circunstâncias em que esse comportamento tem lugar (…) – sublinhado nosso (vide Código Penal Português Anotado, 18ª edição, p.624). A Relação de Lisboa, em Acórdão datado de 18.11.2003, definiu “acto sexual de relevo como qualquer comportamento destinado à libertação e satisfação de impulsos sexuais que, ainda que não comporte o envolvimento de órgãos genitais de qualquer dos intervenientes, ofenda em elevado grau o sentimento de timidez e de vergonha, comum à generalidade das pessoas (vide Colectânea de Jurisprudência, 2003-V-129); mais recentemente, por Acórdão de 05.03.2024 (in www.dgsi.pt), o mesmo tribunal considerou como ato sexual de relevo “todo o comportamento que, de um ponto de vista essencialmente objetivo, pode ser reconhecido por um observador comum como possuindo carácter sexual e que, em face da espécie, intensidade ou duração, ofende em elevado grau a liberdade de determinação sexual da vítima”, considerando que “pratica um acto sexual de relevo” o arguido que agarra ou apalpa a mama de uma menor, por dentro e por fora da blusa que a mesma trazia vestida, e que fricciona com a sua mão, com intenção masturbatória, a zona púbica e vaginal da menor, por cima da roupa desta, com o propósito de satisfazer os seus instintos sexuais. (…)” No que concerne ao abuso sexual de crianças e de menores dependentes, a mesma Relação, em Acórdão datado de 05.06.2013, decidiu que o ato sexual de relevo será todo aquele que tenha uma natureza objectiva estritamente relacionada com a actividade sexual, ou seja, que normalmente apenas seja praticado no domínio da sexualidade entre pessoas, como é manifestamente o caso de acariciar/apalpar nádegas e parte interior das coxas, actos preliminares do acto sexual final que conduz ao orgasmo – sublinhado nosso (acessível em www.dgsi.pt). Aludindo aos atos sexuais de relevo, PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE enuncia os seguinte exemplos: a cópula, a cópula vulvar ou vestibular, a penetração peniana anal (vulgo “coito anal”), a penetração peniana oral (vulgo “coito oral”), o beijo lingual, o passar as mãos nos órgãos genitais, seios, nádegas, coxas e boca (vide Comentário do Código Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 2ª edição atualizada, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2010, p.505, nota 8). O tipo legal de crime em causa é um crime específico próprio uma vez que só pode praticado por uma pessoa maior de idade, de qualquer sexo - sendo que o terceiro com quem o adolescente é levado a praticar o acto sexual de relevo pode ser maior ou menor de idade. A vítima terá, necessariamente, de ter entre 14 e 16 anos de idade, sendo, contudo, irrelevante o seu sexo. A razão da punição está “no abuso da inexperiência do menor, por sedução, ainda que o acto sexual de relevo seja livre e conscientemente consentido” (cfr. Miguez Garcia e Castela Rio in “Código Penal - Parte geral e especial, com notas e comentários”, Março 2014, pág. 726). Trata-se, assim, de uma incriminação “com a especificidade de exigir, para a sua ocorrência, cumulativamente, o abuso da inexperiência da vítima, sendo aqui, nesta circunstância que reside a especificidade do crime” (Mouraz Lopes e Tiago Milheiro, ob. cit., págs. 174 e 175). E prosseguem estes autores, dizendo que “a inexperiência não pode significar desconhecimento «das coisas do sexo», sob o aspecto teórico. Assim, não se exige que a vítima seja alheia à vida social, totalmente inocente ou ingénua. Inexperiente será a pessoa que não possui o conhecimento prático das atividades sexuais, que não se mostra capaz de formular um juízo ético sobre esta atividade e as suas consequências”. Ou dito de outro modo, “o abuso da inexperiência consiste na exploração pelo agente da falta de experiência de vida do adolescente e, nomeadamente, da falta de conhecimento básico sobre a vida sexual” (Paulo Pinto de Albuquerque, ob cit., pág. 693, anotações 9 e 10). E prossegue este autor, dizendo “para apurar a inexperiência deve ter-se em conta o nível de maturidade, a condição psíquica e o grau educacional da vítima”. Seguindo de perto o entendimento vertido no acórdão do TRP de 07.07.2021 (in www.dgsi.pt), diremos que “(…) inexperiência não significa, de todo, não saber do que se trata ou, sequer, pelo menos no nosso modesto entendimento, virgindade; vai para além disso, significando ainda o colocar em causa a livre descoberta e o livre desenvolvimento sexual do adolescente. Não é por viver em meios “não fechados”, por se ter mais ou menos conhecimentos teóricos sobre a sexualidade, que um menor com 14 ou 15 anos deve ser considerado experiente – e logo, insuscetível de abuso - para efeitos do crime sub judice. Da mesma forma que não é por já ter tido contactos sexuais que merece deixar de ser protegida. Se assim fosse, o artigo 173.º representaria uma reminiscência moralista, voltando a tutelar a virgindade tal como fazia o Código Penal de 1886. A inexperiência só pode ser aferida casuisticamente e cremos estar intimamente ligada à vulnerabilidade e à fragilidade da vítima, à sua personalidade e capacidade de reatividade, assim como à relação que mantenha com o agente. O meio típico de execução abuso da inexperiência da vítima abrange as condutas exploratórias das diversas situações de carência (afetiva, psicológica, educativa) e até a mera curiosidade, a vontade de agradar e de fazer parte do grupo, a dificuldade em dizer não relativamente ao líder e o receio de perder prerrogativas no seio do grupo ou de ser colocado de parte, que sejam suscetíveis de levar o adolescente a consentir na prática de atos sexuais.” O abuso da inexperiência consiste, então, "na exploração pelo agente da falta de experiência de vida do adolescente e, nomeadamente, da falta do conhecimento básico sobre a vida sexual" (cfr. P.P. Albuquerque, CP Comentado, p. 693), na certeza de que, apesar da autonomia que o jovem começa a manifestar a partir dos 14 anos, facto é que a sua maturidade está ainda em construção, só com a idade se sedimentando. Sem descurar o nível de informação e conhecimento disponibilizado aos jovens nos tempos actuais, sempre se entende que (como se escreveu no Acórdão do TRG de 12.10.2020, in www.dgsi.pt) (…) “a experiência de vida (não apenas sexual) de um jovem com menos de 16 anos é necessariamente curta, porque curta foi ainda a sua vida: é curta a capacidade de lidar com situações desconhecidas; é curta a capacidade de pensar pela sua própria cabeça; é curto o discernimento para perceber sentimentos tantas vezes contraditórios. Só com o amadurecimento trazido pelos anos, o adolescente se vai afastando da infância, que aos 14 anos está ainda muito próxima e presente. (…) Deixou há pouco tempo de ser criança, mas a vida ainda não lhe deu a experiência que pensa que tem, que sente que tem. Seguramente pode afirmar-se que, em regra, entre os 14 e os 16 anos o adolescente ainda não possui o discernimento pleno e necessário para saber avaliar o sentido e o alcance de um relacionamento sexual (art. 38 nº 3 do C.P.). É, portanto, a atividade sexual prematura de um adolescente que a lei tende a proteger dada a vantagem em que haja um adequado desenvolvimento sexual em relação a cada fase específica do crescimento da pessoa. É por isso que o abuso da inexperiência de que fala o art.º 173.º não deve ser só entendido como abuso de inexperiência sexual. Até porque os atos sexuais praticados ou sofridos por um adolescente têm uma dimensão na sua vida que não se fica apenas pela vivência sexual. É o abuso da vulnerabilidade, da fragilidade, da incapacidade de reação a aferir em cada caso concreto. E assim, contrariamente ao que por vezes se pensa e ao que os adolescentes gostam de demonstrar, a vivência deles é escassa, porque escassa é também a experiência de vida. E é o tanto mais nitidamente quanto maior for a diferença de domínio, a assimetria, o desequilíbrio de poder entre os parceiros a aferir por fatores como a diferença de idades, a diferença de força física e psíquica, a inserção familiar do adolescente, o local da prática dos factos. (…)”. No que se refere ao elemento subjectivo do tipo de ilícito em apreço importa referir que se exige a existência de dolo, pelo menos sob a forma de dolo eventual, necessário relativamente à totalidade dos elementos constitutivos do tipo objetivo de ilícito. Do cotejo da factualidade provada, forçoso é concluir pelo preenchimento dos elementos objectivos e subjectivo do tipo. Na verdade, o arguido, ao apalpar a nádega e ao tocar as mamas da menor, ainda que por cima da roupa praticou actos sexuais de relevo. Ademais, resulta que o arguido estava ciente da diferença de idades entre si e a menor e sabia igualmente que esta não dispunha de capacidade e o discernimento necessário a uma livre decisão, circunstância de que se aproveitou, preenchendo o elemento objectivo “abuso da inexperiência”. Finalmente, importa dizer que se encontram igualmente provados os elementos do dolo, na forma de dolo direto (cfr. art. 14.º, n.º 1, do Código Penal): quer no momento intelectual (conhecimento das circunstâncias descritas no tipo legal de crime, designadamente a idade da menor e a sua inexperiência sexual), como também no momento volitivo ou intencional, porquanto o arguido quis cometer os factos ilícitos, de si bem conhecido, e pôs a sua realização como fim da sua conduta, sobrepondo conscientemente os próprios sentimentos e interesses ao perigo de dano dos interesses alheios que o direito penal pretende evitar, pretendendo a lesão do bem jurídico concretamente tutelado. Cometeu, assim, o arguido um crime de actos sexuais com adolescentes, p. e p. pelo artigo 173º, nº 1, do Código Penal. * Ao arguido vem ainda imputada a prática de um crime de importunação sexual, p. e p. pelo artigo 170º, do Código Penal (na redacção introduzida pela Lei 83/2015, de 05/08), nos termos do qual pune-se “Quem importunar outra pessoa, praticando perante ela atos de carácter exibicionista, formulando propostas de teor sexual ou constrangendo-a a contacto de natureza sexual, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias”.A pena referida é agravada de um terço nos seus limites mínimo e máximo, quando a vítima for pessoa particularmente vulnerável, em razão de idade, deficiência, doença ou gravidez – artigo 177º, nº 1, alínea c), do Código Penal. Por este normativo tutela-se a liberdade sexual contra a imposição de actos de índole sexual, seja por visualização, seja por contacto, tanto numa dimensão positiva ou dinâmica – direito a escolher os actos sexuais que lhe são dirigidos, bem como o seu parceiro sexual -, como numa dimensão negativa ou estática – direito a não suportar actuações sexuais contra a sua vontade. O crime de acto exibicionista é um crime de perigo concreto (quanto ao grau de lesão do bem jurídico protegido) e de resultado (quanto à forma de consumação do ataque ao objecto da acção). O crime de contacto de natureza sexual é um crime de dano (quanto ao grau de lesão do bem jurídico protegido) e de mera actividade (quanto à forma de consumação do ataque ao objecto da acção). Por acto exibicionista deve entender-se toda a actuação com significado ou conotação sexual realizada diante da vítima (cfr. Anabela Miranda Rodrigues, in “Comentário Conimbricense do Código Penal”, Tomo I, Coimbra Editora, Coimbra, 1999, págs. 533 a 537; Paulo Pinto de Albuquerque, in “Comentário do Código Penal”, UCE, Lisboa, 2008, pág. 468; José Mouraz Lopez, “Os crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual no Código Penal”, Almedina, Coimbra, 2002, pág. 78). Dir-se-á que, por regra, o termo «exibicionismo» é usado para descrever os actos de exibição dos órgãos genitais. Conforme referem M. Miguez Garcia e J.M. Castela Rio, Código Penal, Parte Geral e Especial – com notas e comentários, Almedina, 2014, página 713: “uma ação exibicionista consiste no desvendar das “partes” sexuais perante um estranho sem o seu acordo, só para satisfação do agente ou para observação das reacções dessa outra pessoa. É a consciente exibição do órgão sexual por motivações igualmente sexuais.” Conforme é referido no Acórdão da Relação do Porto, de 09-03-2011, publicado em www.dgsi.pt: “Nesta conformidade e tomando por base o bem jurídico aqui em causa, consideramos como acto exibicionista toda a acção com significado ou conotação sexual de exposição dos órgãos genitais que é imposta a outrem, por ser contra a sua vontade ou então quando a pessoa visada ainda não tem capacidade para manifestar esse consentimento, de modo a perturbar a sua liberdade sexual, no caso dos adultos, ou a violar a protecção da sexualidade e a preservação de um adequado desenvolvimento sexual, no caso dos menores de 14 anos. (…) Mas já não será um acto de importunação, de cariz exibicionista, como de resto sustenta o Ministério Público desta Relação e por muito inadequado socialmente que seja essa conduta, o facto do arguido descer o fecho das suas calças e aí introduzir uma das suas mãos, ao mesmo tempo que se deslocou na direcção do menor. E isto porque o arguido não chegou, em qualquer momento, a expor os seus órgãos genitais ao menor ou a quem quer que seja. Aliás e quanto muito, sempre se trataria de um acto preparatório, de uma acção exibicionista de carácter sexual que não é punível [21.º Código Penal]. Mas mesmo que o arguido tivesse o propósito de tirar o seu pénis para o exibir, sempre seria uma tentativa [22.º Código Penal], seja do crime de abuso sexual de menor da previsão do art. 171.º, n.º 3 al. a), que é punido com prisão até 3 anos, seja do crime de importunação sexual da previsão do art. 170.º, ambos do Código Penal, que é punido com uma pena de prisão até 1 ano ou pena de multa até 120 dias.” Por seu turno, por contacto de natureza sexual entende-se a acção com conotação sexual realizada na vítima, que não tem a gravidade do acto sexual de relevo. O contacto de natureza sexual pode incluir o toque (com objectos ou partes do corpo) da nuca, do pescoço, dos ombros, dos braços, das mãos, do ventre, das costas, da pernas e dos pés da vítima – cfr. Paulo Pinto de Albuquerque, in “Comentário do Código Penal”, UCE, Lisboa, 2008, pág. 468 O contacto de natureza sexual tem de ser imposto à vítima, isto é, ela tem de ser de algum modo “constrangida” ao contacto. O constrangimento pode ter lugar por qualquer meio, incluindo qualquer forma de pressão física ou psicológica. O meio mais frequente é o aproveitamento malicioso pelo agente da proximidade física com a vítima. De notar, ainda, que com o acréscimo, pela Lei 83/2015, de 05 de Agosto, de um elemento constitutivo, criminalizando a formulação de propostas de teor sexual, procedeu-se ao alargamento do âmbito de punibilidade da importunação sexual. Segundo Pinto de Albuquerque, no termo “propostas” estão incluídas “palavras ou sons exprimidos e comunicados pelo agente, tais como piadas, questões, considerações, exprimidas oralmente ou por escrito, bem como expressões ou comunicações do agente que não envolvam palavras ou sons, como por exemplo, expressões faciais, movimentos com as mãos ou símbolos.”, in Comentário do Código Penal à luz da Constituição da República Portuguesa e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 3ª ed. Lisbo, Universidade Católica Editora, 2015, 642. Julgamos enquadráveis neste novo conceito do crime de importunação sexual, alusões indesejadas, inoportunas, grosseiras, humilhantes e embaraçosas, assim como convites constrangedores, comentários de mau gosto à sua aparência física, conversas indecorosas sobre sexo, solicitação de favores sexuais e outras formas de pressão para encontros, saídas, etc. O tipo subjectivo admite qualquer forma de dolo – artigo 14º, do Código Penal. «No caso do ato exibicionista, o agente deve querer importunar (surpreender, chocar, atemorizar) a vítima. (…) No caso de contacto de natureza sexual, o agente deve querer aproveitar-se da proximidade física que tem da vítima, para manter um contacto sexual.» (cfr. Paulo Pinto de Albuquerque, in “Comentário do Código Penal”, UCE, Lisboa, 2008, pág. 469). Feitas estas considerações e atenta a factualidade provada, designadamente o facto referido em 15), é manifesto que estão preenchidos os elementos objectivos do crime na modalidade de proposta de natureza sexual. Ademais, está demonstrado que quis e conseguiu, desse modo, pôr em causa o sentimento de vergonha e pudor sexual, bem como a liberdade e autodeterminação sexual da vítima, importunando-a, prejudicando deste modo o livre e harmonioso desenvolvimento da sua personalidade, nomeadamente na esfera sexual, bem sabendo que a mesma era pessoa especialmente vulnerável. Mais está provado que que o arguido agiu sempre de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas pela lei penal. Assim, preenchidos os elementos objectivos e subjectivo da infracção e inexistindo qualquer causa de exclusão da culpa ou da ilicitude, deverá o arguido ser condenado pela prática de um crime de um crime de importunação sexual p. e p. pelo artigo 170º e 177º, nº 1, alínea c), do Código Penal. 3. Apreciação dos recursos 3.1- Recurso do despacho interlocutório 3.1.1- A questão suscitada pelo recorrente neste recurso consiste em saber se o prazo do nº 1 do artigo 411º do CPP, no caso de recurso da sentença com fundamento em reapreciação da prova gravada, deverá ser acrescido da dilação de 10 dias, ao abrigo do disposto no artigo 638º, nº 7 do CPC, aplicável por força do disposto no artigo 4º do CPP. Esta questão, em data muito anterior à entrada em vigor da Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro (diploma legal do qual resulta a atual redação do nº 1 do artigo 411º do CPP), foi resolvida pelo STJ no AFJ nº 9/2005, DR nº 233/2005, I-A, de 12.06.2005, o qual fixou jurisprudência no sentido de que: «Quando o recorrente impugne a decisão em matéria de facto e as provas tenham sido gravadas, o recurso deve ser interposto no prazo de 15 dias, fixado no artigo 411.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, não sendo subsidiariamente aplicável em processo penal o disposto no artigo 698.º, n.º 6, do Código de Processo Civil.». Ou seja, numa altura em que o prazo para interposição de recurso previsto no nº 1 do artigo 411º do CPP era de 15 dias, foi fixada jurisprudência pelo STJ no sentido de que estando em causa recurso em que o recorrente impugne a matéria de facto e as provas tenham sido gravadas não é aplicável subsidiariamente em processo penal o disposto no artigo 698.º, n.º 6, do Código de Processo Civil, que corresponde ao atual artigo 638º, nº 7 do mesmo código. E a razão essencial de assim se ter entendido foi que não havia qualquer lacuna no Código de Processo Penal que carecesse de ser preenchida, nomeadamente com recurso às normas do Código de Processo Civil, não sendo, pois, caso para proceder à aplicação do artigo 4º do Código de Processo Penal. Na verdade, foi entendido no referido aresto que o regime dos recursos previsto no CPP era um «…regime completo, que funciona com autonomia e que permite realizar, por inteiro e de modo razoável e constitucionalmente capaz, a função para que foi concebido, não há espaços não regulados que necessitem de complemento; não deixando espaços de regulamentação em aberto que importe preencher, não existe, pois, lacuna de regulamentação. E na sua completude é diverso, em momentos essenciais, do regime relativo à impugnação da matéria de facto em processo civil, e uma tal diversidade remete para o plano do legislador e não da pauta valorativa da lei.» «O regime de recursos em processo penal, tanto na definição do modelo como nas concretizações no que respeita a pressupostos, à repartição de competências pelos tribunais de recurso, aos modos de decisão do recurso e aos respetivos prazos de interposição, está construído numa perspetiva de autonomia processual, que o legislador pretende própria do processo penal e adequada às finalidades de interesse público a cuja realização está vinculado.» Por conseguinte, nessa altura, quer o recurso versasse matéria de direito, quer matéria de facto com reapreciação da prova gravada, ou matéria de direito e matéria de facto com reapreciação da prova gravada, o prazo para interposição de recurso era único e era sempre de 15 dias. Posteriormente, o legislador sensível à necessidade de alargar o prazo para a interposição de recurso, nomeadamente, quando estivesse em causa a reapreciação da prova gravada, com a Lei nº 48/2007, de 29 de agosto, o prazo de 15 dias previsto no nº 1 do artigo 411º do CPP foi aumentado para 20 dias, tendo sido acrescentado um número 4 ao artigo 411º do CPP, com a seguinte redação: “Se o recurso tiver por objeto a reapreciação da prova gravada, os prazos estabelecidos nos n.os 1 e 3 são elevados para 30 dias.” Sucede que atualmente, com a entrada em vigor da Lei nº 20/2013, de 21 de fevereiro, o prazo de nº 1 do artigo 411º do CPP foi alargado de 20 para 30 dias, tendo sido revogado o seu número 4. Ora, pese embora os referidos alargamentos do prazo para interposição de recurso, nada mudou no que se refere ao regime do processo penal para que se possa defender, com acerto, que ocorre uma lacuna, a qual, a existir, teria de ser preenchida com recurso às normas do Código de Processo Civil. Na verdade, primeiro com a Lei nº 48/2007, de 29 de agosto, em que foi decidido alargar o prazo para interposição de recurso de 15 para 20 dias, tendo também consagrado uma norma dizendo que no caso recurso tiver por objeto a reapreciação da prova gravada o prazo para interposição de recurso passava a ser de 30 dias; e depois, com a Lei nº 20/2013, de 21 de fevereiro, prevendo um prazo único de 30 dias para interposição de recurso, o legislador processual penal evidenciou estar atento à especificidade do prazo para interposição de recurso, designadamente do recurso com vista à reapreciação da prova gravada no âmbito do processo penal, estando também ciente da orientação jurisprudência sobre esta questão, nomeadamente da jurisprudência fixada pelo STJ no aresto acima citado, e decidiu alargar o prazo para interposição de recurso nos termos referidos, mantendo um regime especifico próprio e diferente no previsto no código de processo civil. Refira-se, aliás, que o legislador revelando mais uma vez estar atento à especificidade do prazo para interposição de recurso no processo penal, com a Lei nº 13/2022, de 01.08, alterou o referido prazo, que agora é de 60 dias nos processos classificados como de excecional complexidade, sendo que o juiz, a requerimento, pode fixar prazo superior, cfr. artigo 107º, nº 6 do CPP. A especificidade do processo penal em matéria de prazos na medida em que prescinde da figura da dilação já há muito tempo foi salientada, como nos dá nota a decisão do TRL de 07-04.2016, processo 1773/07.5PHLRS.L1-5, disponível em www.dgsi.pt, com o seguinte sumário: “I–Conforme decorre do acórdão de fixação de jurisprudência n.º 2/96, do plenário da Secção Criminal do STJ (DR, 1.ª série-A, de 10/01/96) - que consagrou o princípio de que «a disciplina autónoma do processo penal em matéria de prazos prescinde da figura da dilação …» -, no processo penal não há que observar qualquer dilação para o início da contagem de prazos, contrariamente ao que sucede no processo civil. II–Consequentemente, não tem aplicação, em processo penal, o disposto no art. 245.º, do novo CPC, nomeadamente o seu n.º 3, não havendo qualquer dilação na contagem do prazo de 30 dias previsto no art. 411.º, n.º 1, do CPP, quando o arguido é notificado, no estrangeiro, da decisão final condenatória proferida após julgamento que decorreu na sua ausência.” Em suma, quanto à questão que ora nos ocupa, somos levados a concluir que o legislador processual penal atendeu à especificidade do processo penal e estabeleceu um regime próprio e específico do que vigora noutras jurisdições, nomeadamente, no processo civil decorrente do disposto no artigo 638º, nº 7 do Código de Processo Civil. Nessa medida, não se verifica caso omisso, não havendo, por isso, fundamento legal, para proceder à aplicação da referida norma do Código de Processo Civil, em resultado da aplicação do disposto no artigo 4º do Código de Processo Penal. Neste sentido, vide, v.g., para além da decisão do TRL acima citada, do TRG, decisão de 04.04.2017, processo 311/15.0GACBT-A.G1; do TRP, decisão de 04.07.2022, processo 4304/14.7TDPRT-A.P1; e do TRC, decisão de 11.11.2022, proc. 867/20.6PAMGR-A.C1, todas disponíveis em www.dgsi.pt. Nesta conformidade, improcede este segmento do recurso. 3.1.2- Para a hipótese de improceder a questão anteriormente apreciada, o que é o caso, o recorrente suscitou a “inconstitucionalidade material do artº 3º da Lei 20/2013, de 21/02, que revogou o artº 411º nº 4 do CPP, quando interpretado no sentido de que ao deixar de haver expressa dilação de 10 dias ao prazo de recurso quando este verse matéria de facto com análise de prova gravada, "proibiu" a aplicação subsidiária do artº 638º nº 7 do CPC, por remissão do artº 4º do CPP, por violação do disposto nos arts 2º, 20º nº 1 e 32º nº 1 da CRP que asseguram garantias de defesa aos cidadãos”. Porém, não lhe assiste razão, porquanto o legislador ordinário dispõe de um amplo poder de conformação legislativo no que se refere à fixação de prazos em matéria de recurso penal. O legislador ordinário, no artigo 411º nº 1 do CPP, fixou um prazo único de 30 dias para interposição de recurso, o qual, como vimos, inicialmente era de apenas 15 dias. A sucessivas alterações deste preceito legal, e especificamente a que decorreu da alteração que lhe foi introduzida pela Lei nº 20/2013, de 21.02, alargando o prazo de 20 dias do nº 1 do artigo 411º do CPP e eliminando a dilação de 10 dias quando estivesse em causa a reapreciação da prova gravada (revogação do nº 4 do artigo 411º do CPP) denotam uma preocupação do legislador em compatibilizar os interesses da celeridade e da eficácia da justiça penal e o direito de defesa do arguido. Um prazo de 30 dias é efetivamente suficientemente longo para que o arguido se possa efetivamente defender, sem prejuízo de atualmente estar legalmente previsto um prazo mais longo quando o processo seja classificado como sendo de especial complexidade. Neste sentido, não se mostram violadas as disposições legais da Constituição da República Portuguesa invocadas pelo recorrente, pelo que não se verifica a inconstitucionalidade suscitada, não assistindo, pois, razão ao recorrente, também nesta parte do recurso, assim improcedendo totalmente. 3.2- Recurso da sentença 3.2.1- O arguido, ora recorrente, suscitou a nulidade da sentença recorrida por falta de fundamentação devido à inexistência de valoração de todas as provas produzidas, como determina os artigos 374.º nº 2 e 379.º nº 1 al. a) do CPP. No sentido de fundamentar a referida alegação, o recorrente sustenta que na sentença não foi considerada, ou seja, nada foi dito sobre o facto de a ofendida ter apresentado duas versões dos factos, a saber: a versão por ela narrada à sua amiga, ou seja à testemunha EE, e à sua mãe no dia da alegada ocorrência dos factos, e a versão por ela apresentada em sede declarações para memória futura e à psicóloga aquando da realização da perícia constante dos autos. Vejamos se lhe assiste razão. O dever de fundamentação da sentença é uma exigência do Estado de Direito Democrático, como é o nosso, decorrendo tal dever de imposição constitucional, em conformidade com o disposto no artigo 205º da CRP, o qual no seu nº 1 diz que “As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”. Em consonância com o disposto na CRP, o n.º 5 do art. 97º do CPP, impõe que os atos decisórios dos juízes sejam sempre fundamentados, devendo ser especificados os motivos de facto e de direito da decisão. Da fundamentação devem constar os motivos ou a razão de ser da decisão. E os motivos ou razões que justificam a decisão são de facto e de direito. O artigo 379º, nº 1 al. a) do CPP, estabelece como sanção a nulidade da sentença que não contiver as menções referidas no nº 2 do artigo 374º. No que especificamente refere à sentença, o nº 2 do artigo 374º do C.P. Penal estabelece que da sentença deverá constar: “2 – (…) uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.” “Estes motivos de facto que fundamentam a decisão não são nem os factos provados (thema decidendum) nem os meios de prova (thema probandum) mas os elementos em que em razão das regras da experiência ou de critérios lógicos constituem o substrato racional que conduziu a que a convicção do tribunal se formasse em determinado sentido ou valorasse de determinada forma os diversos meios de prova apresentados em audiência. A fundamentação ou motivação deve ser tal que, intraprocessualmente, permita aos sujeitos processuais e ao tribunal superior o exame do processo lógico ou racional que lhe subjaz, pela via de recuso (…). E, extraprocessualmente, a fundamentação deve assegurar pelo conteúdo, um respeito efetivo pelo princípio da legalidade na sentença e a própria independência e imparcialidade dos juízes uma vez que os destinatários da decisão não são apenas os sujeitos processuais mas a própria sociedade”, cfr. Marques Ferreira, Jornadas de Direito Processual Penal, O Novo Código de Processo Penal, Almedina, 1989, pág. 229 e 230. Também o Prof. Germano Marques da Silva[3]esclarece que: “A fundamentação dos atos é imposta pelos sistemas democráticos com finalidades várias. Permite a sindicância da legalidade do ato, por uma parte, e serve para convencer os interessados e os cidadãos em geral acerca da sua correção e justiça, por outra parte, mas é ainda um importante meio para obrigar a autoridade decidente a ponderar os motivos de facto e de direito da sua decisão, atuando, por isso como meio de autodisciplina.” Acresce dizer, como refere Sérgio Poças, in Revista Julgar, nº 3/2007, in Da sentença penal – fundamentação de facto “…a exigência de motivação da decisão da matéria de facto, não se traduz em qualquer limitação ao princípio da livre apreciação da prova, tal como está consagrado no artigo 127.º do CPP. Ao motivar, o tribunal apenas dá a conhecer as razões — necessariamente racionais e objetivas — da decisão». (…) o dever de motivação só constituiria um travão a uma apreciação caprichosa, arbitrária da prova; não à apreciação que está consagrada no artigo 127.º do CPP — uma apreciação objetiva, de acordo com as regras da experiência. Diremos mais: a livre apreciação da prova como está prevista na norma, só é pensável com o dever de motivação consagrado na lei. Na verdade, num Estado de Direito Democrático, é porque o tribunal aprecia livremente a prova que existe a obrigação de motivar.” Neste sentido, na jurisprudência tem vindo a defender-se, de forma pacífica, que “A obrigatoriedade de indicação das provas que serviram para formar a convicção do tribunal, e do seu exame crítico, destina-se, pois, a garantir que na sentença se seguiu um procedimento de convicção lógico e racional na apreciação das provas, e que a decisão sobre a matéria de facto não é arbitrária, dominada pelas impressões, ou afastada do sentido determinado pelas regras da experiência”, cfr. Ac. STJ de 21.03.2007, processo 07P024, acessível em www.dgsi.pt. No entanto, as exigências de fundamentação, como foi salientado no Ac. STJ de 23-04-2008, CJ (STJ), 2008, T2, pág.205, não chegam ao ponto de ser exigível que o julgador "explane todas as possibilidades teóricas de conceptualizar a forma como se desenvolveu a dinâmica dos factos em determinada situação e muito menos que equacione todas as complexidades suscitadas pelos sujeitos processuais.” No que concerne ao conteúdo do exame crítico da prova, como se refere no Ac. RL de 12.10.2018, processo 36/14.4JBLSB.L1-5, disponível em www.dgsi.pt, “Não dizendo a lei em que consiste o exame crítico das provas, esse exame tem de ser aferido com critérios de razoabilidade, sendo fundamental que permita avaliar cabalmente o porquê da decisão e o processo lógico-formal que serviu de suporte ao respetivo conteúdo.” A fundamentação da sentença, para além de clara, deverá ser completa, ainda que concisa, o que nos reconduz à questão da suficiência da fundamentação, a qual se reveste de capital importância, porquanto “…uma decisão parcialmente fundamentada tem de ser entendida como não fundamentada, posto que inexiste meia fundamentação, tal como inexiste meia comunicação”[4]. “O que está em causa, na insuficiência é uma fundamentação inapropriada, manifestada em omissões na estrutura racional exigida para uma fundamentação adequada”, cfr. José António Mouraz Lopes, A Fundamentação da Sentença no Sistema Penal Português, Almedina, pág. 338. Na exigência legal de concisão “o que está em causa é um modelo de economia argumentativa onde o que deve ser dito para explicitação do juízo decisório deve sê-lo de uma forma não exaustiva, mas antes sintética e breve, não utilizando mais argumentos dos que os necessários para dizer o que é essencial”, cfr. Mouraz Lopes, ob. cit. pág. 261. Não obstante o que fica dito, importa ainda dar nota de um entendimento, com origem no âmbito do direito civil, da doutrina[5] e alguma jurisprudência[6], segundo o qual apenas a falta absoluta de fundamentação, e não a deficiente fundamentação, seria causa de nulidade do ato decisório. De modo diverso, em nosso entender, considerando a importância que assume a fundamentação das decisões judiciais num Estado de Direito, como é o nosso, em conformidade com o disposto no artigo 205º da CRP, a fundamentação deficiente que não permita conhecer minimamente a razão de ser da decisão deverá ser equiparada à absoluta falta de fundamentação e, por isso, motivo de nulidade do ato decisório. No sentido de que a deficiente fundamentação da sentença constitui causa de nulidade, vide v.g. Ac. RG de 10.07.2023, processo nº 212/18.0T9MNC.G1, não publicado, e a doutrina e jurisprudência nele citadas. No entanto, como se salienta no Ac. STJ de 15.02.2023, processo 38/17.9YGLSB.S1, disponível em www.dgsi.pt “…a apreciação da nulidade do acórdão por deficiências de fundamentação se processa sempre em concreto, no contexto do recurso em que tal nulidade é suscitada. Pois os recursos não servem o aprimoramento de decisões menos perfeitas, servem sim a reparação de erros de julgamento. E se, mau grado eventuais défices de fundamentação da matéria de facto, a sentença/acórdão ainda se revela compreensível de modo a viabilizar totalmente a sindicância da matéria de facto no contexto do recurso interposto e da impugnação concretamente efetuada, permitindo a prolação de correta decisão pelo tribunal a quo, não tem de haver lugar à declaração da nulidade.”. Acresce dizer que as exigências de fundamentação da sentença não são sempre as mesmas, dependendo das particularidades do caso, do tipo de prova (direta ou indireta), etc.. Por último, importa dizer que no âmbito da questão em apreciação - nulidade da sentença por falta ou insuficiente exame critico da prova- não está em causa saber do acerto da fundamentação, se esta convence ou não, se é ou não admissível, se padece de algum erro de raciocínio, nomeadamente de algum vício, ou de erro de julgamento, v.g. se as testemunhas não disseram o que consta da fundamentação. Este tipo de questões tem outra sede própria de análise, que é, dos vícios do artigo 410º, nº 2 do CPP e do erro de julgamento da matéria de facto do artigo 412º, nºs 3 e 4 do mesmo código. 3.2.2- No caso vertente, em que o arguido, no exercício do direito que lhe assiste, se remeteu ao silêncio sobre os factos que lhe foram imputados, as declarações prestadas pela ofendida foram consideradas fundamentais para a convicção alcançada pelo tribunal recorrido acerca da matéria de facto, até porque não foram arroladas testemunhas presenciais dos factos. Os factos considerados como provados na sentença recorrida, a serem verídicos, ocorreram entre o arguido e a ofendida sem que ninguém os tenha presenciado. No sobredito contexto, a sentença recorrida encontra-se suficientemente fundamentada, designadamente quanto à alegada falta de coincidência entre o declarado pela ofendida à sua amiga EE e à sua mãe, e o por ela declarado em sede de declarações para memória futura e em sede de entrevista aquando da realização da perícia. É que, independentemente daquela falta de coincidência integral, o tribunal recorrido, por um lado, não tinha que proceder à análise exaustiva das declarações e depoimentos prestados e, por outro lado, fundamentou a sua convicção, explicando a razão de ser da sua decisão, o mesmo é dizer, porque lhe mereceram credibilidade as declarações prestadas pela ofendida, dizendo, nomeadamente, que: “Foram ouvidas em sede de audiência de julgamento as declarações para memória futura prestadas pela ofendida DD, prestadas em fase de inquérito, as quais, de resto, se encontram transcritas (fls. 154/173). Tais declarações que, com as limitações próprias da ausência de uma imediação com a vítima, soaram espontâneas e objectivas, tendo a factualidade provada sustentação em tais declarações. De resto, com relevo, importará atentar no teor do relatório de perícia psicológica forense realizada à ofendida, segundo o qual, entre o mais, se conclui que “a denúncia é apresentada de forma consistente, resultando num parecer positivo quanto à credibilidade do relator da menor, relato que contém um número expressivo de indicadores que apontam no sentido da credibilidade. Entre estes o carácter lógico da descrição dos factos, a quantidade de pormenores referentes ao contexto e à sequência da ocorrência, as emoções descritas face ao ofensor e a forte consistência entre as entrevistas. Não se identificaram processos que possam contaminar a veracidade do testemunho, nomeadamente a presença de distorções significativas de memória nem indicadores de eventual mentira da autoria da menor ou induzida por terceiros. Não houve incongruências ao longo do seu discurso e do seu relato. Não se percepcionam ganhos secundários que possam advir da denúncia. A menor demonstrou um desenvolvimento global de acordo com o esperado para a idade. Emocionalmente, foi evidente o mal-estar psicológico associado à situação de abuso, essencialmente manifestado através de sentimentos de desvalorização pessoal, ansiedade, baixa autoestima e autoconceito negativo. Foi evidente o receio sentido pela menor em face da denúncia e da possibilidade de ter que enfrentar novamente o abusador, tendo em conta a posição de superioridade/autoridade deste (professor) e o impacto negativo que esta experiência parece ter tido na autoestima da menor e na forma mais ansiosa como esta encara novas situações de interação social, “agora quando conheço alguém fico mais nervosa, tenho medo…” (sic). “(fls. 145/148). EE, amiga da ofendida, num registo seguro e objectivo, esclareceu que no dia dos factos, a ofendida ligou-lhe a contar-lhe o que havia sucedido, designadamente os toques de que havia sido alvo e o teor da conversa do arguido, nos termos dados como provados. Mais confirmou que a ofendida estava visivelmente em choque e triste. Mais referiu que a ofendida nunca lhe tinha falado, em momento anterior, da existência do arguido e muito menos de uma qualquer relação de proximidade com o mesmo. FF, mãe da ofendida, também num registo que se nos afigurou seguro, objectivo e descomprometido, relatou que a ofendida lhe contou, no próprio dia da ocorrência, o que havia sucedido, designadamente os toques físicos levados a cabo pelo arguido e o teor da conversa, nos termos dados como provados. Mais relatou que a ofendida estava visivelmente transtornada, o que prejudicou, entre o mais, o seu sono, o que, determinou, igualmente, que tal assunto fosse tratado no âmbito das consultas de psicologia, que, em boa verdade, já frequentava, mas relacionadas com a fase de luto que atravesso na sequência do falecimento do avô. Confirmou que a ofendida, perante o sucedido, deixou de frequentar o centro hípico. II, exploradora do centro hípico, não tendo assistido aos factos, relatou que tomou conhecimento do sucedido através do pai da ofendida. Confrontou o arguido com a acusação, o qual terá negado. Confirmou ter redigido a mensagem que consta de fls. 59, remetida ao pai da menor e após ter conversado com o arguido. Mais foi valorado o teor da certidão do assento de nascimento, do qual resulta, entre o mais, a data de nascimento da ofendida (fls. 16). Nos crimes como o que está em causa nos autos, pelas suas características, dificilmente existem testemunhas, tratando-se de factos do foro íntimo normalmente apenas presenciados pelos próprios participantes, o agente e a vítima. É essa a situação dos autos, já que não existem testemunhas, com conhecimento directo, dos factos imputados. É consabido que, neste tipo de criminalidade, as declarações das vítimas merecem uma ponderada valorização, uma vez que, como se referiu supra, estes factos ocorrem apenas na presença dos próprios participantes, o agente e a vítima, sem testemunhas, a coberto da sensação de impunidade e, por isso, preservado da observação alheia. Ora, da conjugação das declarações da ofendida, que nos termos sobreditos, se revelam credíveis (para além, de confortadas pelo já citado relatório de avaliação psicológica), bem como o depoimento das testemunhas de acusação, não teve o tribunal quaisquer dúvidas no sentido de que os factos ocorreram tal como foram dados como provados. De referir, com relevo, que do teor da mensagem de fls. 59, resulta, inequivocamente, que o sucedido entre a ofendida e o arguido, exorbita dos padrões da normalidade, daí a necessidade de o arguido referir, à sua entidade patronal (a testemunha II) que pretendia desculpar-se, que teria sido mal interpretado e que a conversa não tinha seriedade e foi apenas uma brincadeira, o que confere ainda maior credibilidade à versão da ofendida.” A fundamentação aduzida na sentença recorrida, tendo em conta as particularidades do caso, é bastante para que seja compreensível a razão de ser da decisão. O tribunal recorrido, que não gozou da imediação das declarações prestadas pela ofendida (declarações prestadas para memória futura), explicou que se convenceu da veracidade do declarado pela ofendida, considerando a conjugação da prova. Ou seja, da apreciação crítica das declarações da ofendida, dos depoimentos efetuados pelas testemunhas inquiridas em audiência de julgamento, da perícia de natureza psicológica e do documento de fls. 59, referindo não ter tidos dúvidas na formação da sua convicção e explicando o porquê da sua decisão. Nesta medida, aos olhos da comunidade em geral, dos sujeitos processuais e naturalmente também deste Tribunal da Relação, são claras as razões do convencimento do tribunal recorrido para ter considerado os factos como provados. E, sendo assim, mostram-se cumpridas as exigências de fundamentação, não sendo, por isso, nula a sentença recorrida por falta ou insuficiente fundamentação. A questão do mérito da fundamentação aduzida, ou seja, a questão de saber se as razões aduzidas pelo tribunal recorrido convencem ou não, se existe algum erro ou não, como dissemos supra, já não pertencem ao âmbito da questão em análise. Nos termos expostos, improcede este segmento do recurso. 3.3- O arguido, ora recorrente, insurge-se contra os pontos da 5 a 17 e 19 a 21 dos factos provados da sentença recorrida, pretendendo a sua alteração e /ou a sua consideração como não provados, porquanto, no seu entender, não estão de acordo com a prova produzida em audiência de julgamento. O erro de julgamento em matéria de facto ocorre quando o tribunal dá como provado um facto sem que se tenha feito prova do mesmo, ou quando dá como não provado um facto que deveria, em face da prova produzida, ter sido considerado como provado. O artigo 412º, nº 3, aI. a) e b), do CPP é claro ao estabelecer que quando o recorrente impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve especificar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, assim como as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida. É propósito do legislador com a referida norma delimitar claramente o âmbito do recurso interposto sobre a decisão a matéria de facto, em termos de o permitir apenas nos casos em que haja uma identificação do concreto erro de julgamento ocorrido, bem como dos específicos meios de provas que concretamente o demonstram. Por outro lado, o nº4 do artigo 412 do CPP dá concretização naquela norma, estabelecendo que no caso de as provas terem sido gravadas, as especificações previstas na aI. b) do nº 3 se fazem por referência ao consignado na ata, nos termos do disposto no nº 3 do art.º 364º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação. Como resulta da fundamentação da sentença recorrida, a prova foi apreciada pelo tribunal recorrido de acordo com o princípio da livre apreciação da prova, em conformidade com o disposto no artigo 127º do CPP, o qual estabelece que “Salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.” Este princípio assume particular relevo na fase de julgamento. Se é certo que a convicção do juiz não pode ser puramente subjetiva, imotivável e por isso, o art.374.º n.º2 do C.P.Penal exige que a sentença contenha “uma exposição tanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto e de direito, que fundamentaram a decisão, com a indicação do exame crítico das provas que serviram para fundamentar a decisão do tribunal” também não se pode esquecer que a decisão do juiz é sempre uma convicção pessoal, «até porque nela desempenham um papel de relevo não só a atividade cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis (v.g. a credibilidade que se concede a um certo meio de prova) e mesmo puramente emocionais» in Jorge de Figueiredo Dias, “Direito Processual Penal”, Coimbra Editora, edição 1974, pág.204. Ao princípio da livre apreciação da prova, estão intimamente associados os princípios da imediação e da oralidade. Na verdade, o juiz, mercê do contacto direto com o arguido, o assistente, a testemunha, ao valorar o por eles declarado, tem de atender a vários aspetos que têm a ver, designadamente, com a razão de ciência, a imparcialidade, a espontaneidade do depoimento, as hesitações, as contradições, os gestos, etc. Ao tribunal de recurso compete sindicar a aplicação no caso concreto do princípio da livre apreciação da prova consagrado no artigo 127º do CPP. Para tanto, deverá socorrer-se da motivação em sede de matéria de facto da sentença, por forma a constatar o caminho percorrido pelo tribunal de primeira instância ao abrigo do disposto no artigo 374º, nº 2 do CPP. Contudo, conforme tem sido, unânime e repetidamente, sustentado pela jurisprudência[7] e doutrina[8], o recurso da matéria de facto visa a deteção do erro de julgamento em matéria de facto, constituindo um remédio jurídico e não um segundo julgamento, como se não tivesse ocorrido um julgamento anterior. Ora, no caso vertente, ouvida a gravação da prova (e não apenas os excertos indicados, em conformidade com o disposto no artigo 412º nº6 do CPP), desde já adiantamos não assistir razão ao recorrente. É que as provas indicadas pelo recorrente não têm a virtualidade de impor decisão diversa da sentença recorrida, como iremos explicar. Segundo o recorrente, o erro em que incorreu o tribunal recorrido consistiu, em síntese -estando aqui em causa os pontos 9 e 10 dos factos provados - no facto de a ofendida ter apresentado duas versões dos factos e o tribunal nada ter dito sobre tal divergência. Ou seja, na falta de coincidência entre o declarado pela ofendida à sua amiga EE e à sua mãe, e o por ela declarado em sede de declarações para memória futura e em sede de entrevista aquando da realização da perícia. No entender do recorrente, este facto, aliado à circunstância de a ofendida padecer de baixa autoestima e de complexo de inferioridade, justifica a alteração da matéria de facto provada que refere, considerando-a como não provada. Relativamente a este ponto, segundo o recorrente a vítima teria dito à sua amiga EE e à sua mãe que, estando ambos de pé, o arguido pegou nela ao colo, enquanto que em sede de declarações para memória futura e na entrevista aquando da realização da perícia de natureza psicológica disse que o arguido pediu para saltar para o colo dele. Na fundamentação da sentença recorrida, como bem refere o recorrente, não é referido este ponto. No entanto, julgamos que, tal divergência, a ter ocorrido, não tem a relevância que lhe pretende atribuir o recorrente. De facto, dizer que saltou para o colo do arguido, fazendo o que lhe disse para fazer, por receio – repare-se que os factos ocorrem no decurso de uma aula de equitação, tendo a vítima apenas 14 anos de idade, sendo o arguido colaborador do Centro Hípico onde decorrida a aula, havendo uma natural ascendência do arguido sobre a vítima – não é substancialmente diverso de o arguido a ter agarrado, ficando com ela ao colo, pois que em ambas as situações existe uma situação desconforto e até mesmo de oposição, pois que a vítima não referiu, em ocasião alguma, que se lançou espontaneamente nos braços do arguido. E, para além disso, a amiga da vítima e a sua mãe, nos depoimentos que prestaram, foram perentórias em afirmar que, no dia dos factos, em decorrência do ocorrido com o arguido, a vítima estava psicologicamente abalada, o que seguramente não foi por ter vivenciado uma situação confortável. De qualquer modo, quanto às exatas palavras que a vítima terá dito à sua mãe, o recorrente não cumpriu o disposto no artigo 412º, nº 3 e 4 do CPP, não tendo indicado a passagem da gravação onde esta, quando inquirida como testemunha em audiência de julgamento, terá dito o que refere. E, por isso, não pode aqui ser considerado, por omissão da indicação de prova que impõe decisão diversa da proferida. Acresce dizer que, quem poderia ter contrariado o depoimento da vítima era o arguido, uma vez que mais ninguém presenciou os factos, mas, no exercício do direito que lhe assiste, manteve-se em silêncio, com isso aceitando a apreciação que o tribunal viesse a fazer do por ela declarado. Ora, a verdade é que não vislumbramos qualquer erro na apreciação efetuada pelo tribunal recorrido do declarado pela ofendida, com relevo para proceder à alteração da matéria de facto pretendida pelo recorrente. Neste sentido, não se percebe como é que o alegado riso, referido pelo recorrente, efetuado pela vítima aquando do inicio da prestação das declarações para memória futura releva para efeito de saber se o por ela declarado corresponde ou não verdade. Do mesmo modo, as considerações tecidas pelo recorrente acerca dos dois locais da ocorrência dos factos (lado direito e lado esquerdo do picadeiro) também não tem a relevância para descredibilizar o depoimento da vítima. A este propósito, concluiu o recorrente, dizendo que “Absolutamente nada impediria a alegada vítima, caso estivesse a ser vítima do que fosse, ou simplesmente a ter uma conversa que não lhe agradasse, de ao passar junto da porta do picadeiro, que está sempre aberta e é um portão largo, tivesse entrado para o mesmo ou tivesse ficado junto dos pais dos demais alunos que estavam a ter aula.” A verdade assim é, mas o recorrente olvida a natureza dos factos em causa, e que o arguido é uma pessoa adulta, que naquela ocasião estava a dar uma aula à vítima, que é uma criança. Neste contexto, é perfeitamente possível que os factos tenham ocorrido como a vítima os relatou. Outrossim, ao contrário do defendido pelo recorrente, não se vislumbra que relevância o tribunal poderia ter dado ao depoimento efetuado pela testemunha GG, proprietária do Centro Hípico, uma vez que esta não presenciou os factos. Por outro lado, as considerações efetuadas pelo tribunal recorrido sobre o documento de fls. 59 não são merecedoras das críticas que lhe são dirigidas pelo recorrente. Com efeito, o tribunal recorrido acreditou no depoimento da vítima. E, em face desse seu convencimento, afirmou que tal documento reforça esse seu convencimento, ou seja, “confere ainda maior credibilidade”. Esta afirmação não contém nada de errado, sem prejuízo de tal documento, por si só, nada de substancial comprovar, pelas razões referidas pelo recorrente. No que concerne ao ponto 17 dos factos provados, no qual se refere que “Ante a conduta do arguido acima descrita, a vítima ficou afetada psicologicamente com o sucedido, tendo necessitado de acompanhamento psicológico, durante vários meses.”, ao contrário do defendido pelo recorrente, é irrelevante para o efeito por ele pretendido o facto de vítima, em data anterior aos factos, ter acompanhamento psicológico, segundo a mãe, em virtude da morte do avô. Em suma, não se entende onde é que o tribunal errou ao dar credibilidade ao depoimento efetuado pela vítima. Os aspetos invocados pelo recorrente não têm o efeito pretendido de lhe retirar a credibilidade que lhe foi atribuída. Na verdade, não é claro que a vítima tenha alterado a sua versão dos factos, nem o facto de sofrer de baixa autoestima e ter complexos de inferioridade lhe retira a necessária credibilidade Por isso, somos levados a concluir que a apreciação efetuada pelo tribunal recorrido tem suporte na prova produzida e examinada em audiência, inexistindo fundamento par alterar os factos impugnado pelo recorrente. Em casos como o presente, as provas indicadas pelo recorrente impõem decisão diversa quando, confrontadas com as provas que serviram para formar a convicção do tribunal, seja claro que outra teria necessariamente de ter sido a decisão, por ter sido violado o princípio da livre apreciação da prova. Isto é, que a decisão recorrida não respeitou os limites de tal princípio[9], designadamente, porque afronta manifestamente as regras da experiência comum. É este o sentido uniforme e reiterado da jurisprudência desde há longa data. Assim, v.g. foi sumariado no acórdão RP de 12-05-2004, processo n.° 0410430, acessível in www.dgsi.pt. “A convicção do julgador só pode ser modificada pelo tribunal de recurso, quando seja obtida através de provas ilegais ou proibidas, ou contra a força probatória plena de certos meios de prova ou, então, quando afronte, de forma manifesta as regras da experiência comum. Sempre que a convicção seja uma convicção possível explicável pelas regras da experiência comum, deve acolher-se a opção do julgador. “cfr. Ac RP de 12-05-2004, processo n.° 0410430, acessível in www.dgsi.pt. No mesmo sentido, vide também v.g. o acórdão RG de 28.06.2004, processo 575/04-1, acessível em www.dgsi.pt “Quando o recorrente pretende (...) pôr em causa a livre apreciação da prova o recurso estará irremediavelmente destinado à improcedência. É que, como se referiu, o tribunal é livre de dar credibilidade a determinados depoimentos, em detrimento de outros, desde que essa opção seja explicitada e convincente, como é o caso. Cumprida essa exigência, a livre convicção do juiz torna-se insindicável até porque a documentação dos atos da audiência não se destina a substituir, nem substitui, a oralidade e a imediação da prova”. Acresce que “A verdade processual que se busca em processo penal não se confunde com a verdade ontológica. A verdade processual é o resultado probatório processualmente válido, isto é, a convicção de que certa alegação singular de facto é justificavelmente aceitável como pressuposto da decisão, por ter sido obtida por meios processualmente válidos. A verdade processual não é absoluta ou ontológica, mas uma verdade judicial, prática e, sobretudo, não uma verdade obtida a todo o preço mas processualmente válida”, cfr. Ac STJ de 03.10.2002, proc. n.º 45.931 - 5.ª Secção, relator Pereira Madeira. Noutros termos, segundo o Tribunal Constitucional, Ac. do TC n.º 198/2004 – DR II série, de 2/6/2004, a impugnação teria de se basear “na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objetivos que se apontam na convicção ou porque se violaram os princípios para a aquisição desses dados objetivos ou porque não houve liberdade na formação da convicção. Doutra forma, seria uma inversão da posição das personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar pela convicção dos que esperam a decisão”. A livre apreciação da prova, diferentemente do sistema da prova tarifada ou legal, consiste na possibilidade conferida ao tribunal de, entre as provas produzidas, poder escolher aquela ou aqueles de que se convença, segundo um raciocínio coerente, lógico segundo as regras da experiência comum. E, como se refere no Ac STJ de 11.07.2007, processo 07P1416, acessível em www.dgsi.pt, “O juiz aprecia a prova produzida – que se mede pelo seu peso e não pelo número –, dando conta na motivação dos resultados adquiridos e dos critérios adotados para justificar a decisão.” No sobredito contexto, o recorrente invocou também a seu favor os princípios do in dubio pro reo e da presunção de inocência do arguido. A invocação por parte do recorrente do princípio do in dubio pro reo[10] carece totalmente de sentido. O aludido princípio, sendo uma decorrência do princípio da presunção de inocência do arguido previsto no artigo 32º, nº 2 2ª parte da CRP, tem o significado de que o juiz quando não tiver a certeza sobre a ocorrência de factos relevantes que prejudiquem o arguido, e subsistir a dúvida, deverá decidir em favor do arguido[11]. Mas, nesse caso, terá de ser uma dúvida razoável, inultrapassável, que impeça a convicção do tribunal[12]. Como é sabido, em processo penal não existe um ónus da prova que impenda sobre os sujeitos processuais, devendo o tribunal investigar autonomamente o caso submetido a julgamento. Nas palavras de Figueiredo Dias[13] “À luz do princípio da investigação, bem se compreende, efetivamente, que todos os factos relevantes para a decisão (…) que, apesar de toda a prova recolhida, não possam ser subtraídos à «dúvida razoável» do tribunal, também não possam considerar-se como «provados». E se, por outro lado, aquele mesmo princípio obriga em último termo o tribunal a reunir todas as provas necessárias à decisão, logo se compreende que a falta delas não possa, de modo algum, desfavorecer a posição do arguido: um non liquet na questão da prova (…) tem de ser sempre valorado a favor do arguido”. A violação do in dubio pro reo ocorre, nomeadamente, quando o tribunal tendo ficado com dúvidas sobre factos relevantes, mesmo assim, tenha decidido contra o arguido, pelo que, nesta hipótese - como tem sido salientado pela jurisprudência, nomeadamente, do STJ[14] enquanto tribunal de revista - tal como os vícios da sentença do artigo 410º do CPP, o estado de dúvida do julgador terá de resultar do texto da sentença, por si ou conjugadamente com as regras da experiência comum, sendo o caso suscetível de configurar erro notório na apreciação da prova do nº 2 al. c) do artigo 410º do CPP. Mas, a violação do princípio do in dubio pro reo pode ser analisado em duas perspetivas consoante o estado de dúvida que se considere relevante, ou seja, a dúvida subjetiva sentida pelo tribunal, ou a dúvida em sentido objetivo, não se exigindo, neste caso, a dúvida subjetiva ou histórica, para que possa ocorrer a sua violação[15]. Neste último sentido (dúvida em sentido objetivo), que é em nosso entender o claramente perfilhado pelo legislador, ocorre violação do princípio do in dubio pro reo na hipótese de o tribunal recorrido considerar como provados factos relevantes desfavoráveis que prejudiquem o arguido relativamente aos quais, numa análise racional, objetiva e criteriosa da prova, se impunha que tivesse dúvidas inultrapassáveis. Por isso, diferentemente do que sucede no caso do STJ enquanto tribunal de revista, o Tribunal da Relação conhece de facto e de direito, cfr. artigo 428º do CPP. E, sendo assim, mesmo que a violação do princípio in dubio não resulte do texto da decisão recorrida, só por si ou conjugada com as regras da experiência comum, enquanto erro notório na apreciação da prova da al. c) do n.º2 do artigo 410.º do C.P.P., pode a mesma ser detetada no âmbito de impugnação ampla da decisão proferida sobre a matéria de facto. Nesta conformidade, faz todo o sentido afirmar-se que pode acontecer que o tribunal recorrido considere, expressa ou implicitamente, não ter tido dúvidas, quando deveria tê-las,[16] ocorrendo, neste caso, um vício na formação da convicção do tribunal. Nesta hipótese, deverá a questão ser a analisada no âmbito de uma eventual violação do princípio da livre apreciação da prova do artigo 127º do CPP[17], tendo presente, nomeadamente, a possibilidade de violação das regras da experiência comum, isto evidentemente caso tenha sido impugnada, por forma ampla, a matéria de facto. No caso vertente - em que foi impugnada, por forma ampla, a matéria de facto provada – o tribunal recorrido não teve dúvidas de que o arguido, aqui recorrente, praticou os factos considerados provados objeto de impugnação no presente recurso. A simples leitura da fundamentação de facto da sentença recorrida é clara a este propósito, tendo o tribunal recorrido explicado e evidenciado, as razões porque se convenceu de que o arguido praticou os factos. Ou seja, repete-se, com base fundamentalmente na credibilidade que atribuiu ao depoimento prestado pela ofendida. E não é pelo facto de, segundo o recorrente, a ofendida ter apresentado duas versões e de sofrer de baixa autoestima e de complexo de inferioridade que ocorre violação do in dubio pro reo. Assim, o tribunal recorrido não teve dúvidas e não as tinha que as ter tido, porquanto logrou convencer-se, em função de juízos de normalidade segundo as regras da experiência comum, do depoimento efetuado pela ofendida, donde resulta não ter sido violado o princípio invocado do in dubio pro reo. O que quer dizer que, no caso em análise, a prova produzida e examinada em audiência de julgamento suporta perfeitamente a convicção que dela formou o tribunal recorrido, sem que tenham ocorrido, consequentemente, qualquer erro ou atropelos às regras legais de apreciação da prova. Em síntese de tudo o que deixamos dito, a decisão recorrida está devidamente fundamentada, tendo sido claramente explicitados, sendo por isso perfeitamente percetíveis, os motivos da convicção alcançada pelo tribunal. Por outro lado, os aspetos evidenciados pelo recorrente não têm a virtualidade de impor decisão diversa da proferida, não se verificando, pois, erro de julgamento da matéria de facto, nos termos do disposto na alínea b) do nº 3 do artigo 412º do C. P. Penal, pelo que os factos impugnados irão permanecer inalterados, assim improcedendo esta parte do recurso. 3.4- O recorrente insurge-se contra a medida das penas, as quais, no seu entender, são exageradas. Segundo alega, “….além das circunstâncias já referidas na sentença, a reduzida gravidade real dos factos, conexa com a ausência de qualquer incidente fosse de que natureza fosse do arguido em toda a sua vida até agora, sempre impunham que ambas as penas fossem fixadas nos mínimos legais, devidamente atenuados, mostrando-se violado o disposto nos artigos 71,º , 72.º al. d) e 73.º do Código Penal.” Vejamos. Não podemos deixar de salientar - quanto aos limites de controlabilidade da determinação da pena em sede de recurso - que entendemos ser de seguir o entendimento da doutrina[18] e da jurisprudência[19] de que “é suscetível de revista a correção das operações de determinação ou do procedimento, a indicação de fatores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, a falta de indicação de fatores relevantes, o desconhecimento pelo tribunal ou a errada aplicação dos princípios gerais de determinação, mas a determinação do quantum exato de pena só pode ser objeto de alteração perante a violação das regras da experiência ou a desproporção da quantificação efetuada”[20]. A determinação concreta da pena faz-se de acordo com os critérios fixados no artigo 71º, n.º 1 e n.º 2 do C. Penal, pelo que, numa primeira aproximação, a pena deve ser concretizada em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo ainda, numa segunda fase, a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, rodearam o mesmo, antes ou depois do seu cometimento. A medida concreta da pena há-de encontrar-se no espaço de liberdade fornecido por uma moldura que tem como limite máximo a culpa do agente e como limite mínimo as exigências de prevenção geral positiva[21]. Na verdade, importa precisar que: - A culpa do agente assinala o limite máximo da moldura penal, dado que não pode haver pena sem culpa, nem a pena pode ser superior à culpa, de acordo com princípios fundamentais da Constituição da República Portuguesa[22], do Código Penal e no respeito pela dignidade inalienável do agente[23]; - As exigências de prevenção geral (traduzidas na necessidade de tutela dos bens jurídicos face ao caso concreto, no respeito pelas legitimas expectativas da comunidade) têm uma medida ótima de proteção, que não pode ser excedida, e um limite mínimo, abaixo do qual não se pode descer, sob pena de se pôr em causa a crença da comunidade na validade da norma violada e os sentimentos de confiança e segurança dos cidadãos nos institutos jurídico-penais; trata-se, aqui, de determinar qual a pena necessária para assegurar o respeito pelos valores violados, pelo que, a pena a aplicar não pode ultrapassar os limites de prevenção geral, uma vez que, como dispõe o artigo 18º, nº2 da C.R.P., só razões de prevenção geral podem justificar a aplicação de reações criminais; e - Dentro desses dois limites atuam, na graduação da pena concreta, os critérios de prevenção especial de ressocialização, pois só se protege eficazmente os bens jurídico – penais se a pena concreta servir a reintegração do agente ou não evitar a quebra da sua inserção social. Em suma, a realização da finalidade de prevenção geral que deve orientar a determinação da medida concreta da pena abaixo do limite máximo fornecido pelo grau de culpa, relaciona-se com a prevenção especial de socialização por forma que seja esta finalidade a fixar, em último termo, a medida final da pena[24]. Para graduar concretamente a pena há que respeitar ainda, como supra ficou dito, o critério fornecido pelo n.º 2 do artigo 71º do C. P., ou seja, atender a todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele. Este critério é fornecido, exemplificativamente, nas suas alíneas e podem e devem ajudar o tribunal a concretizar, no sentido de vir a quantificar, quer a censurabilidade ao facto a título de culpa, quer as exigências de prevenção geral e de prevenção especial. A exigência de as referidas circunstâncias, favoráveis ou desfavoráveis ao agente (atenuantes ou agravantes), não integrarem o tipo legal de crime, ressalta de já terem sido levadas em conta pelo legislador na determinação da moldura legal, o que, no caso contrário, violaria o princípio ne bis in idem.[25] No caso vertente, o tribunal de primeira instância fundamentou a medida das penas da seguinte forma: “A determinação da medida da pena é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção (cfr. artigo 71º, nº 1, do Código Penal). Por outras palavras, a prevenção geral positiva ou de integração é a finalidade primordial, entendida esta como reforço da consciência jurídica comunitária e do seu sentimento de segurança, face à violação da norma. Conforme Figueiredo Dias (Direito Penal Português - As consequências jurídicas do crime, Coimbra Editora 2005, pág. 227 e ss.), a pena deve ser determinada no interior de uma moldura de prevenção geral positiva, cujo limite é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico; dentro desta moldura de prevenção geral positiva, a medida da pena será encontrada em função das exigências de prevenção especial positiva, ou seja, de ressocialização do agente. No entanto, a culpa do agente será sempre o limite inultrapassável da medida concreta da pena (cfr. artigo 40º nº 2 do Código Penal). A medida da necessidade da tutela de bens jurídicos terá que ser encontrada em concreto, segundo as circunstâncias do caso em análise e não em abstracto, já que o carácter abstracto dessa necessidade foi previamente definido pelo legislador penal ao determinar a moldura penal abstracta aplicável. A medida da necessidade da tutela de bens jurídicos terá que ser encontrada em concreto, segundo as circunstâncias do caso em análise e não em abstracto, já que o carácter abstracto dessa necessidade foi previamente definido pelo legislador penal ao determinar a moldura penal abstracta aplicável. Em conformidade com o disposto no artigo 71º nº 2 do Código Penal, atender-se-á a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, exemplificando aquele normativo alguns factores concretos que relevam tanto pela via da culpa como pela via da prevenção. No presente caso, é de realçar o seguinte: - o dolo reveste a sua modalidade mais grave - dolo directo; - a ilicitude é mediana atenta a forma de execução do crime, bem como a zona do corpo visada; - a idade da vítima; - a ausência de antecedentes criminais. Tudo ponderado, designadamente as necessidades de prevenção geral e especial, entende-se adequado e proporcional face às circunstâncias supra descritas, aplicar as seguintes penas: - 6 (seis) meses de prisão, pelo crime de actos sexuais com adolescentes; - 90 (noventa) dias de multa, pelo crime importunação sexual; Seguindo a ordem de apreciação das penas substitutivas de prisão sugerida pelo Acórdão da Relação do Porto, de 20-04-2009, publicado em www.dgsi.pt, urge agora, face ao teor do disposto no artigo 45º, nº 1, do Código Penal debruçarmo-nos sobre a questão da substituição da pena de prisão por multa. Enquanto no artigo 70º do Código Penal se acolhe um critério de conveniência para a escolha da pena, o artigo 45º impõe-nos um juízo de necessidade, isto é, só se deixará de converter a pena de prisão em pena de multa, se se revelar que a prisão é mais adequada em face das exigências de prevenção, sobretudo do ponto de vista da prevenção especial. No presente caso, pese embora a gravidade dos factos, a factualidade dos autos não é bastante para contrariar a regra da substituição prevista nesta norma legal, ou seja, para nos permitir concluir pela necessidade da pena de prisão. Não se vislumbra, apesar do exposto, que a personalidade do arguido emane dos factos como de tal modo refractária que faça o Tribunal afastar uma prognose favorável segundo a qual de futuro, e cumprida a pena pecuniária em que se converterá a sanção detentiva, se manterá afastado de comportamentos similares, estando nós convencidos que não se mostra absolutamente imprescindível, por ora, o cumprimento efectivo da pena de prisão, sendo de notar que os presentes factos ocorreram em data anterior ao trânsito em julgado da sentença que o condenou em pena de prisão, substituída por multa. Conforme referido no Acórdão de Fixação de Jurisprudência nº 08/2013, publicado no DR 77, Série I, de 19-04-2013: “A pena de multa que resulte, nos termos dos atuais artigos 43.º, n.º 1, e 47.º do Código Penal, da substituição da pena de prisão aplicada em medida não superior a um ano, deve ser fixada de acordo com os critérios estabelecidos no n.º 1 do artigo 71.º e não, necessariamente, por tempo igual ou proporcional ao estabelecido para a prisão substituída.” Pois bem, reiterando aqui o referido supra sobre a fixação da medida concreta da pena principal, designadamente no que à culpa do agente e necessidades de prevenção diz respeito, cremos ser ajustado substituir os 6 (seis) meses de prisão por 180 (cento e oitenta) dias de multa. Quanto à fixação da taxa diária da multa, importa ter em conta que a finalidade da fixação da quantia monetária de multa por dia visa eliminar ou esbater as diferenças de sacrifício que o seu pagamento implica entre possuidores de diferentes meios de a solver (assim MAIA GONÇALVES, Código Penal Português Anotado, 18.ª edição, Almedina, 2007, p. 208). E, como se decidiu no acórdão do STJ, de 2-10-1997, CJ, t. 3, p. 183, o montante diário da multa deve ser fixado em termos de constituir um sacrifício real para o condenado sem, no entanto, deixar de lhe serem asseguradas as disponibilidades indispensáveis ao suporte das suas necessidades e do respectivo agregado familiar. Assim, o montante pecuniário não pode ser tão elevado que possa colocar em risco a sobrevivência do arguido. Contudo, não se pode ir tão longe que se faça perder o efeito da pena de multa que se visa fazer sentir. Isto é, a pena de multa é uma pena a que lhe estão associadas efeitos preventivos que, no que tange à prevenção geral, não podem ser olvidados, nem eliminados. Face à moldura da taxa diária, de € 5,00 a € 500,00 (artigo 47º, nº 2, do Código Penal), bem como à condição económico-financeira do arguido, tal como vem provada, e tendo em conta os factores supra mencionados, considera-se adequada e proporcional fixar a taxa diária em € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos).”. Da fundamentação da sentença recorrida, resulta que o tribunal a quo teve em conta cada um dos fatores suscetíveis de influenciar a medida concreta da pena, inclusive os indicados pelo recorrente, e sopesou-os devidamente de acordo com dos princípios gerais de determinação acima enunciados. Na verdade, a medida da pena foi fixada tendo presente o grau de ilicitude dos factos e da culpa, bem assim segundo as exigências de prevenção geral e especial que no caso se fazem sentir. O grau ilicitude dos factos, subsumíveis ao tipo legal de crimes, assume uma gravidade mediana, atenta a gravidade objetiva dos mesmos, sendo a vítima 14 anos, tendo o arguido (individuo adulto com 24 anos de idade). A culpa com que o arguido atuou é intensa, uma vez que agiu com dolo direto, ou seja, representou os factos e agiu com a intenção de os realizar (artigo 14º, n.º 1 do C. Penal). E é reveladora de uma personalidade muito desconforme ao Direito. A pena deve, tanto quanto possível, neutralizar o efeito do delito, passando a surgir este, sem sombra de dúvidas, como um exemplo negativo para a comunidade e contribuindo, ao mesmo tempo, para fortalecer a consciência jurídica da comunidade, procurando dar satisfação ao sentimento de justiça do mundo circundante que rodeia o arguido e que nos casos dos crimes de natureza sexual contra menores é particularmente sentido, tendo em consideração a censura cada vez mais crescente que este tipo de crimes vem merecendo por parte do legislador e da sociedade em geral, que estigmatiza e censura especialmente quem pratica este tipo de atos (função de prevenção geral). No que concerne às razões de prevenção especial (positiva e negativa), embora também com relevância por via da culpa, importa atender: - Ao facto de o arguido ser primário; - À inserção social, profissional e familiar do arguido (trabalha na construção civil; vive com a sua companheira e tem como habilitações literárias o 9º ano de escolaridade); e - À idade do arguido na data dos factos (o arguido tinha 24 anos de idade), sendo reveladora ainda de alguma imaturidade da sua personalidade. No que se refere às consequências, designadamente para a vítima, resultantes da prática dos crimes importa referir que elas se traduzem nas consequências normais decorrentes na prática do tipo de crimes cometidos. No caso, a vítima ficou afetada psicologicamente com o sucedido, tendo necessitado de acompanhamento psicológico, durante vários meses. Tendo o arguido exercido o direito ao silêncio, não prestando declarações sobre os factos da acusação, não pode evidentemente ser prejudicado por isso. Ou seja, o silêncio e a ausência de arrependimento não podem ser contabilizados como agravantes na medida concreta da pena. Porém, o arguido deixa de poder beneficiar de circunstâncias com relevante poder atenuativo, como seja a confissão e o arrependimento. Com efeito, e encontrando-se o arguido presente em audiência de julgamento, querendo beneficiar desta atenuante, apenas a ele cabe evidenciar essa circunstância, como ato pessoal do seu foro interno que é, verdadeiro ato de contrição e de interiorização do desvalor da conduta, por forma a que o tribunal avalie da sua veracidade e /ou sinceridade. Assim, vide, por todos, o Ac. STJ de 20.10.2008, processo 08P295, disponível em www.dgsi.pt, e os inúmeros acórdãos nele citados, em cujo sumário consta “O silêncio, sendo um direito do arguido, não pode prejudicá-lo, mas também dele não pode colher benefícios. É que a opção pelo silêncio pode ter consequências, que não passam pela sua valorização indevida: ao não falar o arguido prescinde de poder gozar de circunstâncias atenuantes de relevo, como sejam a confissão e o arrependimento.”; e o Ac. STJ de 03.11.2022, processo 19/20.5JBLSB.L1.S1, também disponível em www.dgsi.pt, em cujo sumário pode ler-se “O direito ao silêncio não tem só consagração legislativa ordinário sendo uma emanação do princípio do Estado de Direito. A confissão e o arrependimento são circunstâncias, quando se verificam, favoráveis ao arguido; não confessando o arguido, nem demostrando arrependimento, deixa de poder contar com essas circunstâncias favoráveis, mas isso não equivale a que se contabilize como agravantes a não confissão e não ter demonstrado arrependimento pela prática dos factos.” Em face do quadro descrito, e não obstante terem decorrido cerca de 3 anos após a data dos factos, considerando a data da sentença recorrida, julgamos que não ocorre violação das regras da experiência ou desproporção da quantificação efetuada das penas cominadas, as quais foram fixadas na parte inferior das respetivas molduras. Ao contrário do defendido pelo recorrente, não existe fundamento legal para proceder à atenuação especial da pena, cfr. artigo 73º, nº 1 al. d) do CP, a qual constitui uma autêntica válvula segurança do sistema, encontrando-se prevista para hipóteses especiais em que se verifiquem circunstâncias que diminuam por forma acentuada as exigências de punição do facto, deixando transparecer uma imagem global especialmente atenuada, relativamente ao complexo normal de casos em que o legislador terá tido ante os olhos quando fixou os limites da moldura pena respetiva, cfr. F. Dias, in As Consequências Jurídicas do Crime, pág. 302 e segs., o que não sucede, por forma manifesta, no caso em apreço, que é similar a muitos outros com que é possível confrontar na prática judiciária. Assim, o quantum das penas respeita a medida da culpa, os princípios da necessidade, proibição de excesso ou proporcionalidade das penas, observando o preceituado no artigo 18º, nº 2, da CRP, sendo adequado à reposição da validade das normas infringidas. Por conseguinte, decide-se manter a medida das penas aplicadas. 3.5- O recorrente insurge-se também contra o facto de o tribunal recorrido não ter procedido à realização de cúmulo jurídico das duas penas de multa em que foi condenado, ou seja, a pena de multa de substituição da pena de prisão e da pena (principal) de multa aplicada, defendendo ter sido violado o disposto no artigo 77º, nº 1 e 3 do Código Penal. Segundo o recorrente, verifica-se que: “65 - Verifica-se que o arguido se mostra condenado numa pena de prisão substituída por multa e numa pena de multa. 66 – O Tribunal não procedeu ao cúmulo jurídico de penas, condenando o arguido numa pena única. 67 – É verdade que não podem ser cumuladas penas de diferente natureza, mas a pena de prisão ao ser convertida em multa gera no caso uma situação de obrigação de pagamento de duas multas. 68 - Conforme Ac. do STJ Proc. 01P4217, de 06-03-2002, tem de considerar-se a pena que efectivamente há a cumprir, mau grado a eventual possibilidade de futura alteração em caso de pagamento ou não pagamento da(s) multa(s). 69 - Com efeito, a situação dos autos é similar, pois que o arguido tem duas multas a pagar, sendo uma decorrente de uma pena originária de multa e outra decorrente de substituição de pena de prisão. 70 - Não deixa contudo o arguido de ter de pagar duas multas, pelo que se impõe-se a efectivação de cúmulo, que ao não ser efectuado gera nulidade da sentença. 71 - Verifica-se assim que deveria ter sido efectuado o cúmulo jurídico das penas, mostrando-se violado o disposto no artigo 77.º nºs 1 e 3 do Código Penal.” Vejamos. “Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles é condenado numa pena única. Na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente”, cfr. n.º 1 do artigo 77º do C. Penal. Como resulta do n.º 2 do artigo 77º, do Código Penal há que ter em consideração na elaboração da pena única "as penas concretamente aplicadas aos vários crimes". E o nº 3 do artigo 77º do C. Penal acrescenta “Se as penas aplicadas aos crimes em concurso forem umas de prisão e outras de multa, a diferente natureza destas mantém-se na pena única resultante da aplicação dos critérios nos números anteriores”. No caso vertente, o arguido foi condenado nas seguintes penas: - pela prática de um crime de atos sexuais com adolescentes, p. e p. pelo artigo 173º, nº 1, do Código Penal, na pena de 6 (seis) meses de prisão, que se substitui por 180 (cento e oitenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos). - pela prática de um crime de importunação sexual, p. e p. pelo artigo 170º, do Código Penal, na pena de 90 (noventa) dias de multa, à taxa diária de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos). Uma vez verificado que os crimes se encontram numa relação de concurso, em conformidade com o disposto no nº 1 do artigo 77º do CP, as penas que irão integrar a pena única são as penas principais w não as penas de substituição. Após a determinação da pena única é que se coloca a questão da eventual aplicação das penas de substituição. As penas principais são a prisão e a multa e encontram-se previstas na parte especial do Código Penal As penas de substituição em sentido próprio têm caráter não institucional ou não detentivo, sendo cumpridas em liberdade (no sentido de extramuros) e pressupõem a prévia determinação da medida da pena de prisão. Entre as penas de substituição não detentivas legalmente previstas está a pena de multa de substituição do artigo 45º do CP, com o seguinte teor: A pena de multa de substituição tem autonomia e um regime próprio e específico diverso da pena (principal) de multa, em que se salienta as diferentes consequências em caso de incumprimento culposo. Enquanto o não pagamento da muta de substituição conduz a que o condenado tenha de cumprir a pena de prisão fixada na sentença, o não pagamento da multa principal conduz ao cumprimento da prisão subsistiria pelo tempo correspondente reduzido a dois terços, cfr. artigos 45º, nº 2 e 49º do CP. Neste sentido, vide F. Dias, in Consequências do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, pág. 361, segundo o qual “(…) se as duas penas são diversas do ponto de vista político-criminal, são-no também ( e em consequência) do ponto de vista dogmático: a pena pecuniária é uma pena principal, a multa agora em exame é uma pena de substituição no mais lídimo sentido. Diferença esta donde resultam (ou onde radicam) , como de resto se esperaria, consequências prático-jurídicas do maior relevo, máxime, em tema de medida (…) e de incumprimento (…) da pena de substituição. A falta de reconhecimento deste aspeto das coisas, em muitas doutrinas, é fruto de, nelas, a teorização geral das penas de substituição se encontrar ainda atrasada, quando não falte completamente”. No caso vertente, pese embora como diz o recorrente, tenha duas multas para pagar, a verdade é que são realidades diferentes e as consequências também diferente em caso de incumprimento. Acontece que, nem o artigo 45º do CP (que prevê a pena de multa de substituição), nem o artigo 47º do CP (que regula a pena principal de multa) se referem ao cúmulo jurídico de penas ( no caso, de pena de multa de substituição com pena principal de multa). Por isso, a solução a dar à questão suscitada pelo recorrente terá de resulta do disposto no nº 3 do artigo 77º do CP, o qual tem a seguinte redação: “Se as penas aplicadas aos crimes em concurso forem umas de prisão e outras de multa, a diferente natureza destas mantém-se na pena única resultante da aplicação dos critérios nos números anteriores”. Ora, como se refere no Ac. RC de 29.03.2017, processo 117/16.0PBCLD.C1, disponível em www.dgsi.pt “ O n.º 3 do art.78.º do Código Penal, na redação de 1982, a que corresponde este n.º 3 do art.77.º do Código Penal vigente, tinha a seguinte redação: « A pena de multa e a prisão por condenação em alternativa, nos termos dos n.ºs 3 e 4 do artigo 46.º , são sempre cumuladas entre si e com pena de multa.». Debruçando-se sobre as regras do concurso das penas parcelares de espécies diferentes na vigência do n.º 3 do art.78.º do Código Penal, na redação de 1982, dizia o Prof. Figueiredo Dias, que « Se as penas parcelares forem de diferente espécie, o direito vigente abandona entre elas o sistema da pena única (e portanto da pena conjunta e do cúmulo jurídico) para seguir na essência um sistema de acumulação material: a pena de prisão e a pena de multa são sempre, nos termos do art.78.º -3, cumuladas entre si; …” – cfr. obra citada, pág. 289. Mais considerou, que o abandono do sistema da pena única e dos princípios da pena conjunta e do cúmulo jurídico em caso de concurso de penas de espécie diferente era injustificável, pelo que no Projeto de Revisão do Código Penal propôs que o texto do agora art.77.º, n.º 3 do Código Penal passasse a ser o seguinte: « Se as penas aplicadas aos crimes em concurso forem umas de prisão e outras de multa , será aplicável uma única pena de prisão , de acordo com os critérios estabelecidos nos números anteriores, considerando-se os de multa convertidos em prisão pelo tempo correspondente reduzido a dois terços.» - cfr. “Atas e Projeto da Comissão de Revisão do Código Penal” , edição do Ministério da Justiça , 1993 , pág. 84. Essa alteração não passou para o actual n.º 3 do art.77.º do Código Penal , porquanto, no dizer do Cons. Maia Gonçalves, « Tratava-se de um critério revestido de alguma dureza, que só encontrava justificação porque mantinha o sistema da pena conjunta. Abandonada a solução proposta pela CRCP, ficou bem clarificado no texto que se mantêm as penas de prisão e de multa , aplicando-se a cada uma delas , para a formação da pena única ,os critérios estabelecidos nos números anteriores». – cfr. “Código Penal Português anotado” , 8ª edição ,pág. 374. Esta é, também a posição expressa pelos Conselheiros Leal-Henriques e Simas Santos, no “Código Penal” , 1º Volume , Rei dos Livros , 1995 , pág. 608. Efetivamente, do texto do n.º 3 do art.77.º do Código Penal, afastada que foi a proposta constante do Projeto de Revisão, não resulta expressa a possibilidade de cumulação jurídica entre penas de prisão e de multa, que são penas de espécie diferentes. Como tal não podem essas penas de espécie diferentes ser objeto de cúmulo jurídico entre si. (…) Não havendo nenhuma norma no Código Penal que regule os termos em que pode ser feita a punição do concurso entre pena de multa de substituição e pena de multa principal, que são penas de espécie diferente, a solução só pode buscar-se no princípio enunciado no art.77.º, n.º 3 do Código Penal e concluir que aquelas penas devem cumular-se materialmente.” O recorrente invocou em defesa da sua tese o acórdão STJ de 06.03.2002, processo 01P4217, disponível em www.dgsi.pt, o qual pronunciou-se, em sentido afirmativo, sobre a questão, controversa na jurisprudência, de a pena principal de multa convertida em prisão subsidiária dever ser cumulada juridicamente com a pena de prisão. Porém, trata-se de questão diferente e que que não se confunde com a questão em apreço, não relevando, pois, para o caso. Aliás, exemplo disso, pode ver-se o caso o Ac. STJ de 13.02.2019, processo 1205/15.5T9VIS.S1, disponível em www.dgsi.pt, que apesar de se ter seguido a mesma posição do referido arresto, no respetivo sumário pode ler-se“ 1.Devendo ser aplicada uma pena única, há que levar em conta o disposto no n.º 3 do artigo 77.º do Código Penal (CP), de acordo com o qual, se as penas aplicadas aos crimes em concurso forem umas de prisão e outras de multa, a diferente natureza da pena de multa mantém-se na pena única. 2. Penas de diferente natureza, para efeitos deste preceito, são somente as penas principais, de prisão e de multa; se à condenação anterior corresponder uma pena de substituição, a pena única conjunta há-de formar-se a partir da pena de prisão substituída.” Pelo exposto, no caso em apreço, nenhum reparo nos merece o facto de na sentença recorrida não ter sido efetuado o cúmulo jurídico entre as duas penas de multa em que o arguido foi condenado, porquanto as duas referidas penas de multa, sendo uma pena de multa substituição e outra sendo uma pena (principal )de multa, não podem deixar de ser consideradas penas de diferente natureza para efeitos do disposto no nº 3 do artigo 77º CP, motivos pelo qual deverão ser, como foram, cumuladas materialmente. Neste sentido, vide, v.g., para além do já citado RC de 29.03.2017, processo 117/16.0PBCLD.C1 e jurisprudência nele citada; Ac. RC de 12.04.2018, processo 131/17.8GCSAT.C1; e Ac. STJ de 27.04.2011, processo 2/03.5GBSJM.S1, disponíveis em ww.dgsi.pt, sendo que neste último se refere: “Quando o tribunal aplique em concurso uma única pena de multa como pena principal ou alternativa à de prisão, com uma multa substitutiva da prisão, nos termos do art. 43.º, do CP, tais penas devem acumular-se materialmente, atenta a sua diferente natureza. Se as penas parcelares forem de espécie diferente, o direito vigente abandona entre elas o sistema da pena única, e portanto o sistema da pena de conjunto e do cúmulo jurídico, para se seguir na essência, um sistema de acumulação material: a pena de prisão e a de multa são sempre, nos termos do art. 78.º, n.º 3, cumuladas entre si, a mesma situação vale, ainda, relativamente a penas mistas de prisão e de multa, bem como para o caso de penas sucedâneas, ou em caso de condenação em alternativa, nos termos do preceituado no art. 46.º, n.ºs 3 e 4, do CP, na tese perfilhada pelo Prof. Figueiredo Dias, in Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, § 417, firme opositor à solução legal, defendendo de jure condendo, “que outro seria o regime justificável, isto porque o regime de concurso vale, plenamente, para a hipótese de penas diferentes, em que o agente é o mesmo, uma só e unitária e a personalidade do agente, merecendo uma avaliação unitária”. Nesta conformidade, improcede este segmento do recurso. 3.6- O recorrente insurge-se contra o arbitramento à vítima da quantia de € 1.000,00 (mil euros), a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos, nos termos dos artigos 67.º-A, n.º 1, alínea a)-i), b), d) e n.º 3 do Código de Processo Penal, introduzido pela Lei n.º 130/2015, de 4-9, artigo 16.º, n.º 2 da Lei n.º 130/2015, de 4-9 e artigos 1.º, al. j) e 82.º-A do Código de Processo Penal. No seu entender, não deveria ter sido fixada quantia superior a €250,00. Vejamos. Antes, porém, impõe-se um esclarecimento prévio. Iremos apreciar esta parte do recurso por, e seguindo a orientação defendida pelo STJ, segundo a qual atendendo à natureza da reparação os requisitos de admissibilidade de recurso, no caso de reparação arbitrada ao abrigo do disposto no art. 82.º-A do CPP, não estão no plano do recurso da parte da sentença relativa à indemnização civil, decidida em ação civil no processo penal, mas antes, no domínio das regras de admissibilidade do recurso penal, cfr. Acs. STJ de 13.03.2024, processo 145/21.3GAALJ.G1.S1; de 02.05.2018, processo 156/16.0PALSB.L1.S1; e de 07.10.2021, processo 39/18.0JAPTM.E1.S1, todos disponíveis em www.dgsi.pt. Isto pese embora a posição que tem vindo a ser defendida nos Tribunais da Relação – tanto quanto julgamos saber maioritária - que analisa a questão da admissibilidade de recurso como se se tratasse de recurso de um pedido de indemnização cível, com a especialidade de atender apenas ao valor da sucumbência por não haver um pedido, cfr. v.g. Ac. RL de 16.03.2023, processo n.º 743/21.5SXLSB.L1-9; Ac. RC de 21.06.2023, processo n.º 235/21.2GBCLD.C2, e Ac. RE de 25.02.2025, processo 615/23.9PBEVR.E1, in www.dgsi.pt. Dito isto, e uma vez que no caso o recurso (penal) é obviamente admissível, analisemos a questão que nos é colocada, restrita à correção da quantificação da reparação determinada. De acordo com orientação consensual na jurisprudência, estando em causa a fixação do valor da indemnização por danos não patrimoniais com apelo a um julgamento segundo a equidade, devem os tribunais de recurso limitar a sua intervenção às hipóteses em que o tribunal recorrido afronte, de forma manifesta, as regras de boa prudência, de bom senso prático, da justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida, só se justificando uma intervenção corretiva se a indemnização se mostrar exagerada por desconforme a esses elementos, devendo ser garantido o princípio da igual dade, cfr. Antunes Varela-Pires de Lima in “Código Civil Anotado”, vol. 1º, anotação ao artigo 494.º; Ac. STJ de 6-1-2010, in Col. de Jur.-Acs do STJ, ano XVIII, tomo 1, pág. 173; Acs STJ de 22/2/2017, processo 5808/12.1TBALM.S1; de 29/6/2017, processo 976/12.5TBBCL.G1.S1; e de 10/11/2022, processo 239/20.2t8vrl.G1.S1, todos disponíveis para consulta em www.dgsi.pt. Ora, no caso em apreço, o tribunal recorrido pronunciou-se, desenvolvidamente e com inteiro certo, sobre a quantia a arbitrar à vítima, referindo que: “O Ministério Público requereu a condenação do arguido no pagamento de uma indemnização à vítima ao abrigo das disposições conjugadas dos 67.º-A, n.º 1, alínea a) -i), b), d) e n.º 3 do Código de Processo Penal, introduzido pela Lei n.º 130/2015, de 4-9, artigo 16.º, n.º 2 da Lei n.º 130/2015, de 4-9 e artigos 1.º, al. j) e 82.º-A do Código de Processo Penal. Dispõe o artigo 82º-A, nº 1, do CPP, que “Não tendo sido deduzido pedido de indemnização civil no processo penal ou em separado, nos termos dos artigos 72.º e 77.º, o tribunal, em caso de condenação, pode arbitrar uma quantia a título de reparação pelos prejuízos sofridos quando particulares exigências de protecção da vítima o imponham.” Por sua vez, o artigo 16º, nº s 1 e 2, do Estatuto da Vítima (EV), aprovado pela Lei nº130/2015, de 04/09, preceitua: “1- À vítima é reconhecido, no âmbito do processo penal, o direito a obter uma decisão relativa a indemnização por parte do agente do crime, dentro de um prazo razoável. 2. Há sempre lugar à aplicação do disposto no artigo 82.º-A do Código de Processo Penal em relação a vítimas especialmente vulneráveis, excepto nos casos em que a vítima a tal expressamente se opuser. (…)”. Por seu turno, dispõe o artigo 67º-A, nº 1, alínea b), do CPP, que considera-se vítima especialmente vulnerável a vítima cuja especial fragilidade resulte, nomeadamente, da sua idade, do seu estado de saúde ou de deficiência, bem como do facto de o tipo, o grau e a duração da vitimização haver resultado em lesões com consequências graves no seu equilíbrio psicológico ou nas condições da sua integração social; Dispõe ainda o nº 3 do citado artigo que “as vítimas de criminalidade violenta, de criminalidade especialmente violenta e de terrorismo são sempre consideradas vítimas especialmente vulneráveis para efeitos do disposto na alínea b) do n.º 1.” Ora, dispõe o artigo 1º, alínea j), do CPP, que “Para efeitos do disposto no presente Código considera-se: (…) 'Criminalidade violenta' as condutas que dolosamente se dirigirem contra a vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou a autoridade pública e forem puníveis com pena de prisão de máximo igual ou superior a 5 anos;” Esta indemnização prevista no artigo 82.º-A do CPP, é arbitrada oficiosamente pelo Tribunal, apenas em caso de condenação, segundo o prudente critério do julgador, sem pedido, relacionando-se com os prejuízos sofridos, mas não, necessariamente, coincidente com o seu valor. Não se trata, portanto, de uma indemnização por perdas e danos (objeto de pedido), relativa direta e exclusivamente aos danos quantificados, mas de uma indemnização oficiosamente atribuída, a título de reparação pelos prejuízos sofridos e fixada a critério do julgador. A ofendida não se opôs ao arbitramento de uma compensação pelos danos sofridos em consequência das condutas do arguido. Dito isto. Segundo o artigo 129º do Código Penal, a indemnização de perdas e danos emergentes de crime é regulada pela lei civil, o que nos remete para os artigos 483º e seguintes do Código Civil, os quais regulam a responsabilidade extracontratual por factos ilícitos. Impõe-se então determinar quais os pressupostos de que depende a constituição de alguém em responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito. Vejamos então: O princípio geral na matéria encontra-se previsto no artigo 483º nº 1 do Código Civil: “Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.” Acrescenta o nº 2 do referido normativo que “Só existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa nos casos especificados na lei.” Os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito são os seguintes: um facto voluntário do agente, que esse facto seja ilícito, que o agente actue com culpa, que ocorra algum dano e que haja um nexo de causalidade entre o facto ilícito e o dano (cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Volume I, 9ª Edição, Almedina, página 544 e Mário Júlio de Almeida Costa, Direito das Obrigações, 9ª edição, Almedina, página 509). O dano é a perda in natura que o lesado sofreu nos interesses (materiais, espirituais ou morais) que o direito violado ou a norma infringida visam tutelar. É a lesão causada no interesse juridicamente tutelado. Paralelamente a este, existe o dano patrimonial, que é o reflexo do dano real sobre a situação patrimonial do lesado e que se mede através da diferença entre a situação real actual do lesado e a situação hipotética em que ele se encontraria se não fosse o facto lesivo (cfr. ANTUNES VARELA, Das Obrigações em Geral, Volume I, 9.ª Edição, Almedina, Pagina 619). Por isso é que a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão, sendo que o dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão, podendo ainda atender-se aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior (cfr. artigos 56º e 564º do Código Civil). Os danos emergentes correspondem aos prejuízos sofridos, ou seja, à diminuição do património já existente do lesado; os lucros cessantes são os ganhos que se frustraram, os prejuízos que lhe advieram por não ter aumentado, em consequência da lesão, o seu património (cfr. PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA – Código Civil Anotado, Volume I, 4ª Edição, Coimbra Editora, Coimbra, página 579). O princípio geral é o da reconstituição natural, ou seja, «quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação» (cfr. artigo 562º do Código Civil). Sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor, prescreve o artigo 566º do Código Civil, que a indemnização é fixada em dinheiro, tendo como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos (teoria da diferença) e, se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados. A indemnização por danos não patrimoniais não visa propriamente ressarcir o lesado, no sentido de restituir a situação que existiria se o facto não tivesse ocorrido, mas oferecer-lhe uma compensação que contrabalance os prejuízos sofridos, ou seja, uma soma em dinheiro que compense os sofrimentos causados pelo acto ilícito. Na verdade, embora os danos não patrimoniais sejam insusceptíveis de uma verdadeira e própria reparação ou indemnização, podem ser, em todo o caso, compensados de algum modo, pois como dizia VAZ SERRA, “mais vale proporcionar à vítima essa satisfação do que deixá-la sem qualquer amparo” (in Reparação do Dano não patrimonial, BMJ, nº 83, pág. 69 e seguintes). No que diz ainda respeito aos danos não patrimoniais, o seu montante é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso – artigo 496º, nº 3 e 494º, do Código Civil. Posto isto, e atentando na matéria de facto provada não sofre dúvida a verificação, no caso, dos pressupostos gerais do dever de indemnizar pois que está provado que na sequência das condutas ilícitas (violação da integridade moral e psíquica da ofendida - artigo 25º nº 1 da CRP e artigo 70º nº 1 do Código Civil) e culposas do arguido, a ofendida viu pôr em causa o seu sentimento de vergonha e pudor sexual, bem como a sua liberdade e auto-determinação sexual. Ora, todos estes factos integram, seguramente, danos não patrimoniais que pela sua gravidade merecem a tutela do direito e foram causa adequada da acção ilícita e culposa do arguido sendo, pois, indemnizáveis. Conforme referido no Acórdão da Relação do Porto, de 13-07-2005, publicado em www.dgsi.pt: “A reparação judicial dos danos ou prejuízos, na jurisdição criminal, quer para os danos patrimoniais, quer para dos danos não patrimoniais, deve ser determinada, quanto ao montante da indemnização, segundo o prudente arbítrio do julgador que atenderá à gravidade da infracção, ao dano material e moral por ele causado, à situação económica e à condição social do ofendido e do infractor.” A indemnização, ou compensação, deverá constituir um lenitivo para os danos suportados, por isso que, não pode ser miserabilista, mas significativa (Acórdão do STJ, de 12-03-09, publicado em www.dgsi.pt). No seu cálculo intervém, sobretudo, critérios de equidade (mas fundados nas circunstâncias do caso concreto), de proporcionalidade (em função da gravidade do dano), de prudência, de senso prático, de ponderação das realidades da vida (Prof. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, volume I, 4.ª edição, pág. 449). Pois bem, recorrendo às circunstâncias do caso concreto, bem como aos referidos critérios, o sofrimento moral causado, julga-se adequado fixar a indemnização por danos não patrimoniais, no montante de € 1.000,00 (mil euros).” No caso vertente, tendo presente os factos provados na sentença recorrida, considerando a natureza dos factos praticados e a sua gravidade, bem assim as suas consequências para a vítima, nenhum reparo nos merece a decisão recorrida ao fixar em mil euros o valor que o arguido /recorrente fica obrigado a pagar à vítima por ter lesado dolosamente direitos fundamentais desta. Tal quantia, um pouco acima do salário mínimo nacional, mostra-se, por isso, adequada, estando de acordo com os parâmetros geral seguidos e aceites pelos tribunais aquando do julgamento de casos revestidos de gravidade similar. Nesta conformidade, improcede também este ponto do recurso. III- DISPOSITIVO Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes que integram a Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar improcedentes os recursos interpostos pelo arguido, assim confirmando o despacho e a sentença recorrida. Custas pelo arguido / recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 3 Ucs por cada um dos recursos – artigos 513º, nº 1 e 514º, nº 1 do C.P.P. e artigo 8º, nº 9 do R.C.P. e tabela III anexa a este último diploma legal. Notifique. Guimarães, 25 de junho de 2025 Texto integralmente elaborado pelo seu relator e revisto pelos seus signatários – artigo 94º, nº 2 do CPP, encontrando-se assinado eletronicamente na 1ª página, nos termos do disposto no artigo 19º da Portaria nº 280/2013, de 26.08, revista pela Portaria nº 267/2018, de 20.09. Os Juízes Desembargadores Armando Azevedo – Relator Bráulio Martins – 1º Adjunto Pedro Cunha Lopes – 2º Adjunto [1] Nas transcrições das peças processuais irá reproduzir-se a ortografia segundo o texto original, sem prejuízo de correção de erros ou lapsos manifestos e da formatação do texto, da responsabilidade do relator. [2] De entre as questões de conhecimento oficioso do tribunal estão os vícios da sentença do nº 2 do artigo 410º do C.P.P., cfr. Ac. do STJ nº 7/95, de 19.10, in DR, I-A, de 28.12.1995, as nulidades da sentença do artigo 379º, nº 1 e nº 2 do CPP, irregularidades no caso no nº 2 do artigo 123º do CPP e as nulidades insanáveis do artigo 119º do CPP. [3] In Direito Processual Penal Português, Universidade Católica Editora, Vol. 3, 2015, pág. 274. [4] Cfr. Paulo Saragoça da Matta, Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais, Almedina, 2004, A livre apreciação da Prova, pág. 265. [5] Assim, vide Alberto do Reis, Código de Processo Civil, anotado, vol. 5, pág. 140; Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, Vol. III (1972), pág. 246; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, pág. 669 e Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, pág. 221.. [6] Cfr v.g. Ac. do STJ de 26-03-2014, processo n.º 15/10.0JAGRD.E2.S1, disponível em www.dgsi.pt, e dAc. STJ de 30-04- 2014, (processo n.º 330.08.3PATNV.C2.S1), disponível na Coletânea de Jurisprudência online, com a referência 8895/2014.. [7] Cfr., entre outros, Ac. do STJ de 15-12-2005, Proc. nº 05P2951 e Ac. do STJ de 9-03-2006, Proc. nº 06P461, disponíveis em www.dgsi.pt. [8] Segundo o Prof. Germano Marques da Silva “o recurso sobre a matéria de facto não significa um novo julgamento, mas antes um remédio para os vícios do julgamento em 1ª instância” Forum Justitiae, Maio 99. Em sentido idêntico sustenta Damião Cunha ao afirmar que os recursos “…são entendidos como juízos de censura crítica « e não como «novos julgamentos», in O Caso Julgado Parcial, Publicações Universidade Católica, 2002, pág. 37. [9] Acerca dos limites do princípio da livre apreciação da prova, vide Simas Santos e Leal – Henriques, Noções de Processo Penal, Rei do Livros, 2ª edição, 2011, pág. 52 e 53. [10] Segundo Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Constituição da República Portuguesa Anotada”, 4.ª edição revista, 519, “o princípio da presunção de inocência surge articulado com o tradicional princípio in dubio pro reo. Além de ser uma garantia subjetiva, o princípio é também uma imposição dirigida ao juiz no sentido de este se pronunciar de forma favorável ao réu, quando não tiver certeza sobre os factos decisivos para a solução da causa”. [11] Este princípio restringe-se ao domínio da apreciação da prova, constituindo um limite ao princípio da livre apreciação da prova, cfr. Ac STJ de 27.05.2010, processo 18/07.2GAAMT.P1.S1, relator Raúl Borges; e Ac. STJ de 12.03.2009, processo 07P1769, relator Soreto de Barros, ambos acessíveis em www.dgsi.pt [12] A dúvida que leva o tribunal a decidir “pro reo” tem de ser uma dúvida positiva, uma dúvida racional que ilida a certeza contrária. Por outras palavras ainda uma dúvida que impeça a convicção do tribunal, cfr. Cristina Líbano Monteiro, Boletim da Faculdade de Direito, Coimbra Editora, 1997, pág. 51. [13] In Direito Processual Penal, Coimbra Editora, 2004, pág. 213. [14] Assim, vide, v.g., Ac STJ de 12.03.2009, processo 07P1769, relator Soreto de Barros; e Ac STJ de 14.07.2010, processo 149/07.9JELSB.E1.S1, relator Raúl Borges, ambos publicados em www.dgsi.pt [15] Cfr Ac RL de 07.05.2019, processo 485/15.0GABRR.L2-5, relator. Jorge Gonçalves; Ac RE de 13.09.2016, processo 89/15.8GTABF.E2, relator António Latas; Ac RE de 30.01.2007, processo 2457/06-1, relator António Latas, todos disponíveis in www.dgsi.pt. [16] Note-se que, neste caso, trata-se de uma questão de facto que não cabe num recurso restrito à matéria de direito, mesmo que de revista alargada. Neste sentido vide Ac STJ de 12.03.2009, processo 07P1769, relator Soreto de Barros, disponível em www.dgsi.pt [17] Cfr. Ac. STJ de 05.07.2007, proc. 07P22279, rel. Simas Santos, disponível em www.dgsi.pt [18] Vide F. Dias, Direito Penal Português, As consequências do crime, pág. 196 e segs. [19] Vide, entre outros, Ac. STJ de 29.03.2007, proc. 07P1034, relator Simas Santos, Ac. STJ de 19.04.2007, processo 07P445, relator Carmona da Mota, e Ac. RE 22.04.2014, proc 291/13.7GEPTM.E1, relatora Ana Barata Brito, todos acessíveis em www.dgsi.pt [20] Cfr. o atrás citado Ac STJ de 29.03.2007. [21] Vide F. Dias, Direito Penal Português, As Consequências do Crime, Editorial Notícias, p. 227 e ss. [22] Cfr. artigos 1º, 13º, n.º 1 e 25º, n.º 1. [23] Cfr. n.º 2 do artigo 40º do C. Penal. [24] Vide Anabela Rodrigues, "A determinação da medida concreta da pena..., R.P.C.C., nº2 (1991); "Sistema Punitivo Português, Sub Judice, 1996, nº11; da mesma autora vide também “O modelo de prevenção na determinação da medida concreta da pena”, Revista Portuguesa de Ciência Criminal”, Ano 12,n.º 2 Abril – Junho de 2002, 147/182 e F. Dias, Direito Penal Português, ob. cit., pág. 243 . [25] Vide A. Robalo Cordeiro, "Escolha e medida da pena", in Jornadas de Direito Criminal, CEJ, pág. 272. |