Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | PAULO AMARAL | ||
Descritores: | RESCISÃO DE CONTRATO COMUNICAÇÃO DA INTENÇÃO DE DESPEDIR SERVIÇO DOMÉSTICO FALTAS INJUSTIFICADAS | ||
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Data do Acordão: | 12/13/2011 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recorrido: | TRIBUNAL DO TRABALHO DE ÉVORA | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
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Sumário: | I- A comunicação a que alude o art.º 29.º, n.º 3, Decreto-Lei n.º 235/92 deve conter a narração concreta e circunstanciada dos factos que motivam a rescisão. II- A simples repetição ou utilização da fórmula legal (genérica e abstracta) («o trabalhador deu 5 dias de faltas consecutivas») não cumpre aquele preceito, pelo que a rescisão, por ilícita, confere direito a indemnização. Sumário do relator | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Évora M… intentou contra C…, acção declarativa com processo comum emergente de contrato individual de trabalho pedindo seja condenada a Ré a pagar à A., a quantia de € 2.599,99 a título de indemnização, proporcionais do ano da cessação, acrescida dos juros vencidos e vincendos à taxa legal e demais retribuições que deixou de auferir até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal. Alega em síntese que foi, desde Setembro de 2004, empregada doméstica da R. até Agosto de 2010, altura em que foi despedida. * A Ré contestou defendendo a improcedência parcial da acção, considerando-se que a Ré despediu com justa causa a A. e que apenas deve a quantia de €671,00 a título de proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal do período em que trabalhou em 2010.* Foi realizado o julgamento e proferida sentença que, julgando a acção procedente, condenou a R. a pagar à A. uma indemnização por despedimento ilícito e os proporcionais do ano da cessação.* A R. recorre discordando apenas da qualificação como ilícito do despedimento e consequente condenação no pagamento de indemnização.Defende a validade da comunicação de cessação do contrato de trabalho, de 27 de Agosto de 2010, onde consta, como uma das razões para a decisão, o facto de a A. ter dado mais de 5 faltas injustificadas. Entende, pois, e ao contrário do que se afirma na sentença recorrida, que a A. tomou conhecimento de forma escrita, expressa e inequívoca de um dos fundamentos para o seu despedimento, as ditas faltas. * A A. contra-alegou defendendo a manutenção do decidido.* Sendo o objecto do recurso definido pelas suas conclusões, é patente que parte da carta de 27 de Agosto de 2010 deve ser transcrita de modo a se ter à frente o seu conteúdo. A sentença recorrida não o faz e omite, assim, quais tenham sido as razões para o despedimento. Uma vez que o litígio se cinge à questão das faltas e uma vez que o documento não está posto em crise, acrescentar-se-á, na exposição dos factos que se segue, o referido tema (n.º 13-A).* A matéria de facto é a seguinte:1 - A A. foi admitida ao serviço da Ré em Setembro de 2004, para exercer as funções como funcionária do serviço doméstico e aí trabalhar sob as ordens e direcção desta, no exclusivo interesse da Ré, sem contrato escrito. 2 - Nessa data começou a desempenhar as funções então acordadas para com a Ré na sede e casa desta na Rua..., em Évora, as quais consistiam em limpar o pó, arejar, arrumar e varrer a casa. 3 - O horário de trabalho era de 8 horas diárias, entre as 9 e as 17horas, neste período se incluindo o tempo para almoço da trabalhadora, o qual era encargo e responsabilidade da Ré. 4 - A remuneração mensal era de € 500,00, sem que fosse entregue à trabalhadora qualquer recibo pelo trabalho prestado. 5 - Até Setembro de 2007, sempre foi esse o horário de trabalho e a contraprestação financeira do mesmo. 6 - Em Setembro de 2007 e até Julho de 2010, a trabalhadora por ordem da entidade patronal, passou somente a cumprir o horário de trabalho de 4horas, entre as 9 e as 13horas, passando a ter um vencimento de € 320,00 mensais, também sem recibo. 7 - Até ao princípio de Julho do presente ano, manteve-se ininterruptamente, a relação laboral, trabalhando a A., como funcionária doméstica por conta, direcção e fiscalização da Ré. 8 - No período de 9 a 16 de Julho, a R. dispensou a A., do seu trabalho, pediu-lhe as chaves que estavam na sua posse e mudou a fechadura da porta. 9 - No dia 20. 7. 2010 a A. recebeu da Ré, através de cheque, o pagamento de € 320,00, respeitante ao subsídio de férias. 10 - Quando se dirigiu ao local de trabalho, no dia 16. 8, pelas 9horas, ninguém lhe abriu a porta e sequer apareceu alguém. 11 - No dia 17 de Agosto, acompanhada por 2 pessoas amigas, pelas 9 horas, voltou a comparecer no local de trabalho, sem que lhe abrissem a porta ou alguém desse qualquer explicação. 12 - No dia 16 de Agosto a A., enviou um C/R com aviso de recepção à R., a pedir esclarecimentos sobre esta situação e sobre o horário de trabalho. 13 - Em resposta a R. enviou para a trabalhadora uma C/R com aviso de recepção, com data de 27. 8, com o assunto”… Comunicação de intenção de cessação de contrato de trabalho …”. 13-A- Nesta carta, a R. indica como um dos «principais factos e comportamentos da trabalhadora que motivaram a presente cessação do contrato de trabalho» «g) Cinco dias consecutivos de faltas injustificadas ao trabalho». 14 - No último parágrafo desta carta a R. solicita à A. que entre em contacto consigo, de forma a receber as quantias que lhe são devidas, bem como o modelo RP5044 da DGSS. 15 - A A. como contrapartida do seu trabalho, auferia ultimamente a quantia de € 320,00. 16 - A Autora gozou férias em Agosto. 17 - No período que decorreu entre os dias 9 e 16 de Julho e uma vez que a R. se encontrava fora de Évora, dispensou a A. de comparecer ao serviço. 18 - A A. apresentou-se ao serviço dia 17 de Julho. 19 - No dia 20 de Julho pagou a R. à A. a importância de € 320,00, correspondente ao subsídio de férias. 20 - A A. bem sabia que a R. iria de férias para o Funchal no período que decorria entre 24 de Julho e 22 de Agosto. 21 - Ficou acordado que a A. se apresentaria ao serviço no dia 23 de Agosto, primeiro dia a seguir ao fim das férias da Ré. 22 - Na data acordada, 23 de Agosto, e posteriormente, não mais a A. se apresentou em casa da R. para iniciar o trabalho. 23 - Dentro das funções para que havia sido contratada e de que foi informada, teria que tratar e regar as plantas do jardim. 24 - A partir do início do mês de Julho recusou-se a fazer estes serviços, resultando que várias plantas secaram. * Como acima se disse, o fundamento único da discordância da R. prende-se com a validade da comunicação de despedimento.Entende a recorrente que à A. foi comunicado de forma escrita, expressa e inequívoca um dos fundamentos para o seu despedimento, as ditas faltas. A sentença recorrida, a este respeito, apenas diz que «a R. não deu a conhecer de forma expressa e inequívoca os factos que fundamentavam tal despedimento». Diga-se desde já que concordamos com a decisão impugnada. O art.º 29.º, n.º 3, Decreto-Lei n.º 235/92, determina que «no momento da rescisão [com justa causa] do contrato devem ser referidos pela parte que o rescinde, expressa e inequivocamente, por escrito, os factos e circunstâncias que a fundamentem». A menção expressa e inequívoca dos factos passa descrevê-los, por narrá-los. Como é jurisprudência uniforme (e sobre vários temas — despedimento após processo disciplinar, contrato a termo, resolução do contrato pelo trabalhador com invocação de justa causa), não basta a simples transcrição da cláusula geral que consta da lei. Isto porque é sempre devida à parte que não rescinde uma explicação cabal e uma oportunidade de defesa, de impugnar a realidade que é descrita na comunicação. Perante uma alegação genérica, fica a própria parte que rescinde o contrato, designadamente, a entidade empregadora que despede, impedida de, em tribunal, justificar a sua decisão (cfr. art.º 31.º, n.º 1). No caso dos autos, apenas se faz menção de que a A. faltou 5 dias consecutivos, desconhecendo-se, no entanto, que dias são esses, em que mês, em que ano. É indiferente que o tribunal dê por provadas as faltas; o fundamental é que elas estejam concretamente indicadas na comunicação de rescisão. A comunicação limita-se a reproduzir parcialmente a previsão da última parte da al. e) do art.º 30.º. Assim, tem razão a sentença recorrida quando afirma que «a R. não deu a conhecer de forma expressa e inequívoca os factos que fundamentavam tal despedimento». Pelo exposto, julga-se improcedente a apelação. Custas pela recorrida. Évora, 13 de Dezembro de 2011 Paulo Amaral João Luís Nunes Joaquim Correia Pinto |