| Acórdão do Tribunal da Relação de  Évora | |||
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| Relator: | MARIA ISABEL CALHEIROS | ||
| Descritores: | MATÉRIA DE FACTO JUÍZO DE VALOR JUÍZOS CONCLUSIVOS ERRO NA APRECIAÇÃO DAS PROVAS | ||
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| Data do Acordão: | 10/02/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
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| Sumário: | I. O tribunal deve, oficiosamente, expurgar da matéria de facto os juízos de valor ou conclusivos, por si só, determinariam o desfecho da acção. II. Em vista dos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, a modificação da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto só deve ser usada quando se possa concluir, com segurança, pela existência de erro na apreciação dos factos impugnados. (Sumário da Relatora) | ||
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| Decisão Texto Integral: | Apelação n.º 741/22.1T8STR.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Santarém Juízo Central Cível de Santarém SUMÁRIO (da responsabilidade da Relatora – artigo 663.º, n.º 7, do CPC): (…) * I – RELATÓRIO 1.1. (…) veio instaurar acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra (…), Companhia de Seguros, S.A. pedindo a condenação da ré no pagamento da quantia global de € 60.000,00, acrescida de juros de mora legais desde a citação e até efetivo e integral pagamento. Alegou, para o efeito e em síntese, que sofreu um acidente de viação, cuja responsabilidade imputa ao condutor do veículo segurado pela ré, do qual resultaram para si danos patrimoniais e não patrimoniais, de que pretende ser ressarcido, a saber: a) Perda da viatura; b) Despesas médicas futuras, consultas, medicamentos, tratamentos, cirurgias, deslocações conexas, despesas com equipamentos e ajudas assistenciais, entre outras, que venham a ser realizadas em virtude do acidente; c) Perda de capacidade de ganho; d) Danos não patrimoniais. 1.2. A Ré contestou, pugnando pela sua absolvição do pedido, alegando, para o efeito, que o sinistro foi causado pelo autor, declinando a sua responsabilidade pela reparação dos alegados danos, que também impugna. 1.3. Foi proferido despacho saneador com elaboração dos temas da prova, e foi realizada a audiência de julgamento, finda a qual foi proferida sentença, que julgou parcialmente procedente a acção, com o seguinte teor decisório: «(…) Nestes termos, julga-se parcialmente procedente a ação proposta por (…) e, por conseguinte: A. Condena-se (…), Companhia de Seguros, S.A. a pagar ao autor as seguintes importâncias: 1. € 9.000,00 (nove mil euros) a título de perda de capacidade funcional permanente ao nível de integridade físico-psíquica, acrescida dos juros de mora civis, à taxa legal em vigor, desde a citação da ré e até efetivo e integral pagamento. 2. € 50.000,00 (cinquenta mil euros) a título de danos não patrimoniais, acrescido dos juros de mora civis, à taxa legal em vigor, vencidos desde a data da prolação da presente sentença e até efetivo e integral pagamento. B. Absolve-se a ré do mais peticionado». 1.4. Inconformada com a sentença proferida, a Ré interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que fosse provido e se revogasse a sentença recorrida, sendo ela absolvida do pedido. Concluiu as suas alegações da seguinte forma (que se reproduzem): «i. Existem assim duas versões contraditórias, elas foram, de um lado, a do Autor (Recorrido) e, do outro, a da testemunha (…); ii. O Tribunal somente atribui credibilidade à versão descrita pelo Autor; iii. A Recorrente discorda da avaliação feita pelo Tribunal, uma vez que a testemunha (…) descreveu de forma clara e coerente como ocorreu o acidente; iv. Conforme assinalou a Exma. Sra. Juíza no dia da audiência de julgamento, a dinâmica descrita pelo Autor é incompatível com os danos existentes nos veículos intervenientes; v. Exigia-se portanto que essa impossibilidade fáctica fosse inscrita e apreciada na motivação de facto, o que não sucedeu; vi. Decorre das declarações de parte do Autor que o início da manobra de ultrapassagem teve lugar a cerca de 100 metros do local de embate e que, nesse momento, o condutor do veículo de matrícula (…) não tinha acionado qualquer tipo de sinalização; vii. Esta factualidade não foi apreciada na motivação de facto; viii. Cabia ao Autor, ora Recorrido, demonstrar cabalmente o que alegou em sede de Petição Inicial, conforme o disposto no artigo 487.º, n.º 1, do Código Civil; ix. E dos autos apenas constam um depoimento de uma testemunha e as declarações de parte do Autor; x. Tendo em conta as regras do ónus da prova, o depoimento da testemunha (…) e as declarações de parte do Autor, impõe-se dar como não provados os factos 9 a 11 que constam da matéria de facto dada como provada e, em consequência, a respetiva inclusão nos factos não provados; xi. Por seu turno, impõe-se incluir os pontos a. e b. (com o acrescento da expressão “a cerca de 100 metros do local do embate”) na matéria de facto dada como provada; xii. O condutor do veículo segurado pela Recorrente não violou as regras estradais contidas nos artigos 21.º, n.º 1 e 35.º, n.º 1, do Código da Estrada; xiii. Termos em que deve ser julgada improcedente a ação em relação ao pedido formulado pelo Autor (ora Recorrido), deste absolvendo a ora Recorrente». 1.5. O Autor pugnou pelo não provimento da apelação e pela consequente confirmação da sentença recorrida, apresentando as seguintes conclusões: «1. Considerando os factos assentes, como é obvio, nunca outra poderia ser a decisão que consta da fundamentação da douta Sentença recorrida, 2. Face ao exposto a douta sentença recorrida não só não merece qualquer reparo, como, permitam-nos encontra-se exemplarmente bem fundamentada, traduzindo uma cristalina aplicação da justiça. 3. Acresce que, o âmbito do recurso delimita-se pelas conclusões que a recorrente extrai da respectiva motivação, logo não colocando em causa a Recorrente o valor das indemnizações em cujo pagamento foi condenada, a julgar improcedente o recurso a interposto pela Ré, terão tais indemnizações de se manter nos mesmos e exactos termos acima referidos. Posto isto, vejamos os fundamentos invocados pela Recorrente. 4. A Recorrente assenta a sua discordância na alteração da matéria de facto que indica, extraindo da mesma a absolvição da Ré em face da não culpabilidade do seu segurado no acidente em análise dos autos. 5. Porém, contrariamente ao douto Tribunal a quo que teve o cuidado de analisar de forma criteriosa, objectiva e equidistante todos os testemunhos e todos meios de prova juntos no que respeita à dinâmica do acidente. 6. A Recorrente, pretende ver alterada a matéria de facto com base em palavras soltas e descontextualizadas da generalidade dos meios de prova, o que obviamente não tem nem pode ter acolhimento. 7. Não basta forçar dizendo que estando perante duas posições/relatos antagónicas (Segurado e Recorrido) o Tribunal apenas valorou uma. 8. É que contrariamente ao referido pela Recorrente a descrição do acidente efectuada pelo Segurado e pelo Recorrido em nada se contradizem no que respeita ao Segurado ter feito ou não pisca quando iniciou a manobra. 9. O Recorrido diz que quando iniciou a ultrapassagem o Segurado não tinha feito pisca. 10. O Segurado afirma que quando iniciou a manobra olhou pelo espelho retrovisor (não fazendo qualquer referência aos espelhos laterais) e não estava lá qualquer carro. 11. Claro que não estava, o Recorrido já se encontrava a seu lado, 12. Pelo que, ainda que por hipótese o Segurado tivesse nessa altura tivesse feito pisca ele nunca seria visível pelo Recorrido. 13. Efectivamente os depoimentos apenas divergem quanto à travagem, que o Segurado diz ter ouvido e que o Recorrido diz não ter feito. 14. E sobre este aspecto, o depoimento da Guarda da GNR que ocorreu ao local e ainda dum agente da PSP (…) que descreveu de modo claro a dinâmica do acidente com recurso aos meios de prova (fotos e croqui) carreados nos autos e, bem assim, à análise que fez no local do acidente. 15. Resultou clara a inexistência de marcas de travagem no chão. 16. O que inquina o depoimento do Segurado. 17. Por outro lado pretender, ainda, a Recorrente alterar a matéria de facto com base em pequenas palavras, pequenas contradições, nomeadamente quando o A. ter iniciado a ultrapassagem a 100 m de distância. 18. O senso comum, diz nos que ninguém inicia uma ultrapassagem a velocidade de caracol (não há marcas na estrada de travagem) com 100 m de antecedência. 19. Pelo que pretender alterar a matéria de facto com base em tal afirmação é forçar uma posição, totalmente dispare da que resulta da conjugação de todos os testemunhos e meios de prova juntos no que respeita à dinâmica do acidente. 20. De facto, as alterações pretendidas à matéria de facto mais não são, na realidade, do que uma tentativa forçada de interpretação de palavras soltas e contradições ínfimas, sem qualquer relevo e que, na nossa modesta opinião, sustentam em si mesmas a credibilidade de um depoimento, em particular do aqui Recorrido. 21. Ou seja, por outras palavras, a matéria de facto dada como provada e não provada pelo Douto Tribunal a quo, não merece qualquer reparo. 22. Perante tal factualidade a única conclusão possível é a que consta da douta Sentença Recorrida: somos a concluir que o condutor do veículo segurado pela ré violou o disposto nos artigos 21.º, n.º 1 e 35.º, n.º 1, do Código da Estrada. E tal conduta foi, efetivamente, a única causa do acidente, tanto em concreto, já que se não tivesse atuado do modo como o fez, o embate não teria ocorrido, e ainda, em abstrato, porque a violação das normas estradais em causa é idónea a provocar um acidente como aquele que veio a suceder, do qual resultaram os danos materiais e as lesões físicas no autor nos termos evidenciados. 23. Logo andou bem a douta decisão recorrida que assim decidiu». *Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir. *II –OBJECTO DO RECURSO O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do NCPC), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser as de conhecimento oficioso (artigo 608.º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do artigo 663.º, n.º 2, in fine, ambos do NCPC). Tendo, então, em atenção as conclusões da Recorrente são as seguintes as questões submetidas à apreciação deste Tribunal: 1. Se ocorreu Erro na Apreciação da Prova; 2. Se uma vez alterada a decisão sobre a matéria de facto nos termos pugnados pela Apelante, não pode continuar a sustentar-se que a responsabilidade na produção do acidente cabe ao segurado da Apelante. *III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO O Tribunal de 1.ª Instância, «com interesse para a decisão da causa», deu como provados os seguintes factos (que se transcrevem apenas quanto à dinâmica do acidente, única posta em causa no recurso da matéria de facto): 1. No dia 13/03/2019, cerca das 14h15m, na Estrada da (…), (…), em Ourém, ocorreu um acidente de viação onde foram intervenientes o autor e (..). 2. A estrada é uma recta, o piso estava seco e limpo e em estado razoável, com sinalização de linha descontinua, inexistindo, no local, qualquer sinalização vertical de existência de entroncamento à esquerda. 3. O autor conduzia o veículo ligeiro de mercadorias de marca Peugeot, modelo 206, com a matrícula (…), da sua propriedade. 4. (…) conduzia o veículo ligeiro de mercadorias, de marca Peugeot, modelo Partner, com a matrícula (…), da sua propriedade. 5. À data, a responsabilidade emergente da circulação do veículo (…) estava garantida por contrato de seguro celebrado com a ré através da apólice (…). 6. No contexto espácio-temporal referido em 1, ambos os condutores seguiam na estrada da (…), no sentido Ourém – (…). 7. O veículo (…), conduzido pelo autor, circulava imediatamente atrás do veículo (…), segurado pela ré. 8. Junto ao n.º 11 daquela estrada, do lado esquerdo atento o sentido de marcha dos dois veículos, existe um caminho. 9. Ao aproximar-se desse local, circulando o veículo (…) à mesma exata velocidade que até então e não estando a sinalizar qualquer mudança de direção, designadamente para esquerda, o autor iniciou uma manobra de ultrapassagem desse veículo. 10. Quando o veículo (…) se encontrava a ultrapassar o veículo (…), (…) decidiu virar à esquerda para entrar no caminho referido em 8. 11. Embatendo, dessa forma, com a sua lateral frente esquerda na lateral frente direita do veículo (…). 12. Em consequência de tal embate, o veículo (…) foi projetado para a esquerda, indo embater no muro de uma residência da Estrada da (…), pertencente ao n.º 11 da indicada via e ficado imobilizado em paralelo ao referido muro. 13. Ao ser projetado contra o muro, o autor partiu com a cabeça o vidro da porta do seu lado, embatendo com a mesma no referido muro e gradeamento existente. 14. Do acidente resultaram danos materiais nos dois veículos, um ferido ligeiro, (…), e um ferido grave, o autor. *E considerou como não provado o seguinte: a. Que o condutor do veículo seguro (matrícula …), que circulava na Estrada da (…), no sentido Ourém-(…), efetuava uma manobra de mudança de direção à esquerda, tendo acionado o sinal luminoso de mudança de direção, quando foi embatido na sua parte lateral esquerda, pela parte frontal direita do veículo de matrícula (…); b. Que o condutor do veículo (…), ao iniciar a manobra de ultrapassagem ao veículo (…), contribuiu de forma exclusiva para a produção do acidente dos autos; c. Que o autor recebeu a quantia de € 200,00 pelos danos causados pelo acidente no seu veículo (…). * IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO 4.1. Da Modificabilidade da Decisão sobre a Matéria de Facto 4.1.1. Eliminação Oficiosa de Factos nos termos do artigo 662.º do CPC Dispunha o artigo 646.º, n.º 4, do anterior CPC, que se têm por não escritas as respostas do tribunal sobre questões de direito. Pese embora esta norma não tenha transitado expressamente para o CPC actual, o comando nela contido mantém plena vigência face ao regime processual agora previsto no artigo 607.º, n.º 4, do CPC actual, segundo o qual na fundamentação da sentença devem constar os factos julgados provados e não provados. Na verdade, na sentença, na parte respeitante à fundamentação de facto, só podem constar factos e não juízos de valor, conclusivos ou matéria de direito. Logo, se a matéria de facto constante da sentença não respeitar estes limites tem de ser expurgada dos elementos que integrem matéria de direito, juízos conclusivos e afirmações que se insiram na análise das questões jurídicas que definem o objeto da acção e são suscetíveis de conduzir, só por si, ao desfecho da ação. Neste mesmo sentido, veja-se o Acórdão do STJ de 28.9.2017 (Proc. n.º 809/10.7T8LMG.C1.G1, em www.dgsi.pt) segundo o qual «muito embora o artigo 646.º, n.º 4, do anterior CPC tenha deixado de figurar expressamente na lei processual vigente, na medida em que, por imperativo do disposto no artigo 607.º, n.º 4, do CPC devem constar da fundamentação da sentença os factos julgados provados e não provados, deve expurgar-se da matéria de facto a matéria susceptível de ser qualificada como questões de direito, conceito que, como vem sendo pacificamente aceite, engloba, por analogia, os juízos de valor ou conclusivos». Importa, ainda, não olvidar que «a supressão de expressões de cariz jurídico-conclusivo, não tem a virtualidade de afastar a valoração dos concretos factos que constem da matéria de facto provada, pois é com base em factos concretos que pode sustentar-se o juízo e não a partir de expressões conclusivas que representam conceitos / conclusões que não podem ser objecto de prova» (Acórdão da Relação de Évora de 28.6.2018 , rel. Florbela Moreira Lança, disponível em www.dgsi.pt). No caso em apreço, estando em causa apurar a responsabilidade na produção do acidente de viação, não podem constar da matéria de facto juízos sobre a responsabilidade pela ocorrência do embate (que, só por si, decide a questão relativa ao facto ilícito e à culpa). O que deve constar são factos que, posteriormente, em sede de enquadramento jurídico, permitam concluir pela verificação das circunstâncias que, à face da lei, possibilitam apurar a responsabilidade na produção do acidente. Foi dado como não provado: «b. Que o condutor do veículo (…), ao iniciar a manobra de ultrapassagem ao veículo (…), contribuiu de forma exclusiva para a produção do acidente dos autos». Tal traduz um juízo conclusivo determinativo, por si só, do desfecho da acção, reportando-se a conclusão que tem de ser apreciada, face aos factos provados, em sede de subsunção jurídica (como o foi). Assim sendo, dá-se por não escrita a alínea b) dos factos não provados, por conter um juízo conclusivo. *4.1.2. Se Ocorreu Erro na Apreciação da Prova O Recorrente considera que houve erro na apreciação da prova quanto aos factos provados n.ºs 9 a 11, pugnando que os mesmos sejam julgados como não provados e, quanto aos factos ali dados como não provados sob as alíneas a) e b), que devam considerar-se como provados, com o acrescento da expressão “a cerca de 100 metros do local do embate” quanto à alínea b). Fundamenta a sua impugnação sustentando que existindo duas versões contraditórias quanto à dinâmica do acidente – de um lado as declarações do autor e, do outro, da testemunha (…), condutor do veículo segurado na Ré, o Tribunal a quo somente atribuiu credibilidade à versão descrita pelo Autor, quando aquela testemunha descreveu de forma clara e coerente como ocorreu o acidente, sendo que a dinâmica descrita pelo Autor é incompatível com os danos existentes nos veículos intervenientes, a que acresce que teria iniciado a manobra de ultrapassagem a cerca de 100 metros do local de embate. Sob o ponto de vista formal, diga-se que a Apelante cumpriu o ónus de impugnação da matéria de facto previsto no artigo 640.º, n.º 1 e 2, alínea a), do NCPC [de delimitar com toda a precisão os concretos pontos de facto da decisão que pretende questionar; indicar os concretos meios probatórios em que se estriba, precisando com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso; e deixar expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada]. Vejamos, então, do mérito. Começa-se por referir que no âmbito do direito probatório material, quando estão em causa depoimentos das testemunhas, declarações de parte e prova pericial, rege o princípio da livre apreciação das provas (artigo 607.º, n.º 5, do CPC). Contudo, livre apreciação da prova não corresponde a «arbitrária apreciação da prova». Por isso, impõe-se ao Juiz a «identificação precisa dos meios probatórios concretos em que se alicerçou a convicção do julgador» e «a menção das razões justificativas da opção pelo julgador entre os meios de prova de sinal oposto relativos ao mesmo facto» (Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra Editora, Limitada, 1985, pág. 655). Mas «mantendo-se em vigor os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova, e guiando-se o julgamento humano por padrões de probabilidade e não de certeza absoluta –, precisa-se ainda que o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1.ª instância sobre a matéria de facto só deve ser usado quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente a concretos factos impugnados. Por outras palavras, a alteração da matéria de facto só deve ser efectuada pelo Tribunal da Relação quando o mesmo, depois de proceder à audição efectiva da prova gravada, conclua, com a necessária segurança, no sentido de que os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, apontam em direcção diversa, e delimitam uma conclusão diferente daquela que vingou na 1ª Instância. “Em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira Instância em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte” (Ana Luísa Geraldes, «Impugnação e reapreciação da decisão sobre a matéria de facto», Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas, Volume I, Coimbra Editora, pág. 609)» – Ac. do TRG de 19/09/2024, Proc. 1349/23.0T8VNF-A.G1 (acessível em www.dgsi.pt). Assente isto, vejamos os concretos pontos da matéria de facto que são motivo de discordância do recorrente: são eles os pontos 9 a 11 dos factos provados [9. Ao aproximar-se desse local, circulando o veículo (…) à mesma exata velocidade que até então e não estando a sinalizar qualquer mudança de direção, designadamente para esquerda, o autor iniciou uma manobra de ultrapassagem desse veículo. 10. Quando o veículo (…) se encontrava a ultrapassar o veículo (…), (…) decidiu virar à esquerda para entrar no caminho referido em 8. 11. Embatendo, dessa forma, com a sua lateral frente esquerda na lateral frente direita do veículo …] e as alíneas a) e b) dos factos não provados [a. o condutor do veículo seguro (matrícula …), que circulava na Estrada da (…), no sentido Ourém-(…), efetuava uma manobra de mudança de direção à esquerda, tendo acionado o sinal luminoso de mudança de direção, quando foi embatido na sua parte lateral esquerda, pela parte frontal direita do veículo de matrícula (…); b. o condutor do veículo (…), ao iniciar a manobra de ultrapassagem ao veículo (…), contribuiu de forma exclusiva para a produção do acidente dos autos]. Pretende a Apelante que as declarações de parte do A. e o depoimento da testemunha (…), condutor do veículo segurado na Ré, sejam valorados diversamente do que o foram na 1ª instância, de molde seja validado o depoimento desta última e julgada demonstrada a sua versão. Quanto à pretensão relativa à alínea b), esta, como vimos, encerra um juízo conclusivo, que, por si só, determinaria o desfecho da acção, pelo que nunca poderia ser considerada, tendo, aliás, sido eliminada oficiosamente (cfr. ponto 4.1.1.). Acresce que a expressão “a cerca de 100 metros do local do embate”, que ali se pretendia incluir, tem, no contexto, relevância essencialmente probatória (e, nessa qualidade, se apreciará infra). A 1ª instância fundamentou a sua convicção do seguinte modo, na parte que aqui releva: «A factualidade descrita nos pontos 1 a 14 da factualidade provada, relativa ao contexto espácio-temporal e dinâmica em que se deu o acidente de viação, nos quais foram intervenientes o autor e o condutor do veículo segurado pela ré, para além do parcialmente admitido a respeito pela ré na contestação, resultou da análise realizada pelo Tribunal aos vários elementos documentais carreados para os autos, a saber: participação do acidente de viação onde se descreve a via, os danos materiais do muro da residência identificada pelo n.º de polícia 11 onde o veículo do autor embateu e os danos causados na infraestrutura de ponto de recolha de passageiros onde o veículo segurado pela ré embateu, a existência de um ferido ligeiro e de um ferido grave e as declarações prestadas pelo ferido ligeiro, isto é, o condutor do veículo segurado pela ré, complementado pelo croqui elaborado pelo agente participante onde está assinalado o local possível do embate, de acordo com a versão do condutor do veículo segurado pela ré, e o local onde os veículos ficaram imobilizados; fotografias do local; informação camarária sobre a inexistência de qualquer sinalização vertical de existência de entroncamento à esquerda, atento o sentido da marcha dos dois veículos, e sobre a natureza do caminho para onde o condutor do veículo segurado pela ré pretendia seguir quando se deu o embate; fotografias dos dois veículos onde se observam os danos materiais causados pelo embate. Esses elementos documentais foram analisados em si e em conjugação com os depoimentos prestados, na audiência final, pelo condutor do veículo segurado pela ré, (…), pela guarda participante do acidente de viação, (…), e ainda pelas declarações aí prestadas pelo autor. (…), pese embora já não se recordasse com rigor dos acontecimentos, face ao tempo decorrido, atestou o teor do auto de participação de acidente de viação por si elaborado, assim como o croqui em anexo, elaborado com medidas reais e esclarecendo não existirem marcas de travagem no piso, caso contrário teria feito constar no auto, bem como não existir qualquer sinalização no local, o que corrobora a informação camarária junta aos autos. Disse ainda que o local provável do embate foi indicado pelo condutor do veículo segurado pela ré, uma vez que o outro condutor, dado o seu grave estado de saúde, havia sido transportado para o hospital, não se encontrando no local. (…), condutor do veículo (…)I, segurado pela ré, explicando que ia de Ourém para (…) para buscar estrume, a uma velocidade reduzida, abaixo de 50 km/h, ao aproximar-se de uma estrada vicinal existente à esquerda, fez pisca para virar à esquerda, olhou pelo retrovisor e não vendo o veículo conduzido pelo autor, iniciou a manobra, ouviu uma travagem e, quando já estava a virar para a esquerda, foi embatido a meio da porta lateral esquerda do seu veículo, do lado do condutor, pelo veículo conduzido pelo autor. Atestou a inexistência de sinalização de aproximação de entroncamento. O autor, por seu turno, nas declarações que prestou, recordando o sinistro, afirmou que o condutor que seguia à sua frente na estrada em causa não fez pisca para virar à esquerda, não travou e quando já havia iniciado a ultrapassagem, aquele decidiu, então, repentinamente, virar à esquerda, causando o embate sucedido. Disse ainda que não conduzia a uma velocidade superior a 50 km/h. Não havendo testemunhas presenciais do sucedido, resta-nos as declarações prestadas pelos dois condutores envolvidos, a analisar em face dos demais elementos probatórios carreados para os autos. Com efeito, como fenómeno dinâmico que é um qualquer acidente de viação, o seu processo causal não é, muitas vezes, de fácil apreensão e compreensão, impondo-se ao julgador uma tarefa mental de recreação ou de reconstituição a partir de todos os elementos disponíveis, carreados ao processo, não já para atingir a evidência ou a certeza integral, mas para chegar àquele grau de probabilidade bastante para fundar uma convicção, para consentir uma crença quanto às causas do evento. Desde já ressalta que, contrariamente ao declarado pelo condutor do veículo segurado pela ré, inexistindo marcas de travagem no local, não se mostra evidenciado que o autor tenha feito qualquer travagem quando se apercebeu da manobra de virar à esquerda realizada por aquele. A par, quanto ao acionamento do pisca para sinalizar a mudança de direção para a esquerda, alegadamente feita pelo condutor do veículo segurado pela ré, temos apenas o declarado a respeito pelo próprio, não existindo outra evidência que o ateste. E, de acordo com as regras da experiência comum, tudo nos leva a crer que, no concreto momento em que o autor decidiu fazer a ultrapassagem, o condutor do veículo segurado pela ré (ainda) não havia acionado o pisca. Caso contrário, mostra-se desprovido de sentido que o autor, diante de tal sinalização, persistisse na ultrapassagem, sabendo que da mesma muito provavelmente resultaria o embate dos dois veículos. Pelo que, deu-se por provado, tal como por ele alegado, que, quando o autor iniciou a ultrapassagem, o condutor do veículo segurado pela ré (ainda) não havia acionado o pisca. Poderá tê-lo feito depois, mas sem qualquer efeito, uma vez que o autor já havia iniciado a ultrapassagem, não estando em condições de a visualizar. A par, temos os danos materiais dos dois veículos resultantes do embate, que atestam a zona onde os mesmos colidiram, evidenciados nas fotografias dos veículos juntas aos autos e no declarado pelos próprios condutores: o veículo conduzido pelo autor foi embatido na parte lateral frente e o veículo segurado pela ré foi embatido a meio da porta lateral do condutor. Ou seja, ressalta destes danos que o autor já estaria a mais de meio da ultrapassagem do veículo segurado pela ré quando o condutor deste decidiu iniciar a manobra de virar à esquerda, rumo ao caminho existente junto à habitação com o n.º de polícia 11. E não tendo ele visualizado qualquer pisca, constatado qualquer abrandamento da velocidade do veículo que seguia à sua frente, que o fazia a uma velocidade relativamente reduzida, nem previsto a possibilidade desse veículo virar à esquerda, uma vez que no local não havia qualquer sinalização de aproximação de entroncamento, foi o autor surpreendido com a manobra do condutor do veículo segurado pela ré, dando-se, assim, o embate evidenciado entre os dois. Repare-se também o local onde dois veículos ficaram imobilizados após o embate: o veículo do autor, após ligeira projeção para a frente, foi arrastado lateralmente para o muro da referida habitação, ao passo que o veículo segurado pela ré foi projetado para mais de 4 metros à frente, acabando por embater na infraestrutura de ponto de recolha de passageiros. Ora, daqui ressalta que, quando se deu o embate, os dois veículos estariam praticamente lado a lado, paralelos um ao outro, o que reforça a ideia que o veículo do autor já estaria a mais de meio da ultrapassagem do veículo segurado pela ré. Daí que se tenha dado por provado que o veículo (…) se encontrava a ultrapassar o veículo (…), quando (…) decidiu virar à esquerda para entrar no caminho aí existente. De dizer ainda, quanto ao declarado pelo condutor do veículo segurado pela ré, no sentido de que quando decidiu iniciar a manobra para virar à esquerda, olhou pelo retrovisor, não tendo visto o veículo do autor, que esta afirmação também reforça o entendimento do Tribunal. Com efeito, ele não viu o autor quando decidiu iniciar a manobra de virar à esquerda porque, nesse momento, o autor já tinha iniciado a ultrapassagem, estando, provavelmente, na zona a que comummente se chama de “ponto cego”. (…), casado com a irmã do cônjuge do autor, mas também agente da PSP, com experiência na elaboração de croquis de acidentes de viação durante cerca de 10 anos, referiu que, cerca de 1/2 dias depois do acidente foi ao local onde se deu o acidente e descrevendo-o tal como consta do auto de participação junto aos autos, acrescentando não existirem marcas de travagem no piso, disse que, analisados os danos nas viaturas, ficou convencido que o embate se deu quando o autor já estava a ultrapassar a viatura da frente e o condutor desta, não se apercebendo da ultrapassagem do autor, decidiu virar à esquerda para entrar no caminho aí existente, tal como, de resto, concluído pelo Tribunal». Da convicção acima transcrita retira-se que na apreciação da prova o tribunal a quo analisou o depoimento do condutor do veículo seguro na Ré e as declarações do A. no confronto com os demais elementos de prova objectivos que constam do processo, a saber o croqui da participação do acidente com indicação do local onde os veículos ficaram imobilizados após o embate (sendo que a testemunha que o elaborou, corroborou inexistirem no local do acidente vestígios de travagem), as fotografias do local do acidente e do local onde os veículos ficaram imobilizados após o embate e as fotografias dos dois veículos com as respectivas zonas de embate, conjugados com as regras da lógica e experiência. Esses elementos objectivos do processo permitem extrair que: . o local do acidente é uma recta com boa visibilidade em ambos os sentidos de marcha, dentro de uma localidade (como de resto confirmado tanto pelo condutor do veículo seguro e como pelo A.); . nenhuma evidência foi detectada de traços de travagem no local do acidente, contrariando o referido pela testemunha condutor (“só sentiu uma travagem brutal”, nas suas palavras – 10:40) o que permite inferir que o veículo do A. não efectuou travagem, já que uma travagem, para mais, brutal, deixaria necessariamente vestígios, e, de outro passo, que o A. não teve tempo de reagir à manobra de viragem à esquerda do veículo segurado pela ré, que é súbita. . estando o veículo conduzido pelo autor batido na lateral frente esquerda e o veículo segurado pela ré na lateral frente direita, o veículo do autor tinha que estar a mais de meio na ultrapassagem do veículo segurado pela ré quando este decidiu iniciar a manobra de virar à esquerda, praticamente lado a lado, tal como afirmou o A., caso contrário o veículo do A. teria batido com toda a sua parte da frente (e não só com a lateral frente) no veículo conduzido pela testemunha. As regras da lógica e da experiência também falam a favor da plausibilidade da versão factual apresentada pelo autor: não é verosímil que iniciada pelo autor a manobra de ultrapassagem do veículo que segue à sua frente, no mesmo sentido de marcha, este último tivesse accionado o pisca para virar à esquerda, pois não faria sentido que perante a sinalização dessa manobra o autor pretendesse ultrapassá-lo, no que resultaria num embate, tanto mais que, realizada a manobra de viragem à esquerda pelo veículo que o precedia na via, esta ficava livre no seu sentido de marcha. Estes elementos permitem, portanto, suportar as declarações do A., com as quais são consentâneos, e retiram credibilidade ao depoimento da testemunha condutor do veículo segurado na ré, que se revelou, esse sim, incompatível com os elementos objectivos e as regras da experiência. Note-se, aliás, que, ao contrário do defendido pela recorrente, ouvido integralmente o depoimento desta testemunha, dele não resultou uma descrição clara e coerente do acidente, verificando-se, ao invés, pouca assertividade ao longo do seu depoimento quanto à circunstância de ter olhado pelo retrovisor antes de iniciar a manobra de virar à esquerda, denotando hesitações, referindo por diversas vezes foi tudo tão rápido, e, sobretudo, uma grande preocupação em responder de forma correcta sobre como realizou a manobra de viragem à esquerda. Ademais e, também ao contrário do que pretende a recorrente, o tribunal a quo, no momento próprio, e que é a analise crítica da prova no seu conjunto que lhe cabe fazer em sede de sentença (sendo irrelevantes os comentários parcelares que o juiz vai fazendo durante a inquirição de uma parte ou testemunha em audiência) avaliou a consistência das declarações do A., deixando explicitado na sua motivação a formação da sua convicção, designadamente a razão pela qual os danos revelados nos veículos são, precisamente, compatíveis com a versão apresentada por este –de que quando se dá o embate o veículo do autor já estaria a mais de meio da ultrapassagem do veículo seguro na ré, estando paralelos um ao outro. Sufragamos, pois, o que na sentença a este propósito se expressou: «Repare-se também o local onde dois veículos ficaram imobilizados após o embate: o veículo do autor, após ligeira projeção para a frente, foi arrastado lateralmente para o muro da referida habitação, ao passo que o veículo segurado pela ré foi projetado para mais de 4 metros à frente, acabando por embater na infraestrutura de ponto de recolha de passageiros. Ora, daqui ressalta que, quando se deu o embate, os dois veículos estariam praticamente lado a lado, paralelos um ao outro, o que reforça a ideia que o veículo do autor já estaria a mais de meio da ultrapassagem do veículo segurado pela ré. Daí que se tenha dado por provado que o veículo (…) se encontrava a ultrapassar o veículo (…), quando (…) decidiu virar à esquerda para entrar no caminho aí existente. De dizer ainda, quanto ao declarado pelo condutor do veículo segurado pela ré, no sentido de que quando decidiu iniciar a manobra para virar à esquerda, olhou pelo retrovisor, não tendo visto o veículo do autor, que esta afirmação também reforça o entendimento do Tribunal. Com efeito, ele não viu o autor quando decidiu iniciar a manobra de virar à esquerda porque, nesse momento, o autor já tinha iniciado a ultrapassagem, estando, provavelmente, na zona a que comummente se chama de “ponto cego”». Para a formação da convicção nesse sentido também contribuiu o depoimento da testemunha (…), “casado com a irmã do cônjuge do autor, mas também agente da PSP, com experiência na elaboração de croquis de acidentes de viação durante cerca de 10 anos” e que, de forma transparente, explicou porque é que cerca de 1/2 dias depois do acidente foi ao local e, num depoimento emocionado no final com a descrição do estado em que ficou o A., mas não comprometido e de inquestionável seriedade expôs com objectividade a avaliação que formou com base na sua experiência, as observações que fez no local do acidente e nos danos nas viaturas, expondo os passos para o seu raciocínio, no sentido de que “o embate se deu quando o autor já estava a ultrapassar a viatura da frente e o condutor desta, não se apercebendo da ultrapassagem do autor, decidiu virar à esquerda para entrar no caminho aí existente”, como concluído pelo tribunal a quo. E a apreciação expressa pelo tribunal a quo não é invalidada pela circunstância de o autor ter declarado que iniciou a manobra de ultrapassagem no início da recta (cerca de 100 metros do local de embate) porquanto continua a não ser credível que a testemunha condutor tenha accionado com relevo o pisca: é que essa sinalização, a ter ocorrido com a devida antecedência, seria visível pelo A. desde o momento em que inicia a manobra de ultrapassagem até ao momento em que começa a alcançar o veículo que está a ultrapassar, não fazendo sentido que, se assim tivesse ocorrido, não avisasse o condutor que tinha accionado o pisca com o sinal sonoro ou persistisse durante esse percurso numa ultrapassagem da qual resultaria um embate; ora, se, como vimos, os elementos objectivos permitem inferir que o veículo do autor tinha que estar a mais de meio na ultrapassagem do veículo segurado pela ré, praticamente lado a lado, quando este vira à esquerda (corroborando as declarações do A.), é, não só, inconsequente, que nesse momento o condutor do veículo seguro tivesse accionado o pisca, como nada o confirma. Entende-se, então, que a apreciação da efectuada pelo tribunal a quo, tem iniludível assento na prova produzida, na qual declaradamente se alicerçou, e é claramente sufragável, não impondo, por isso, a respectiva alteração. De toda a prova produzida conclui-se inexistir fundamento para alterar os pontos 9 a 11 dos factos provados e a al. a) dos factos não provados nos termos pugnado pela recorrente, mostrando-se toda a factualidade essencial que foi alegada pelas partes apreciada pelo tribunal a quo. Improcede, por isso, o recurso quanto à impugnação da matéria de facto mantendo-se intocada a fixada pela 1ª instância. *4.2. Se uma vez alterada a decisão sobre a matéria de facto nos termos pugnados pela Apelante, não pode continuar a sustentar-se que a responsabilidade na produção do acidente cabe ao segurado da Apelante. A Recorrente fundou a sua pretensão recursória de alteração da decisão de mérito na procedência da impugnação da decisão da matéria de facto no sentido por ela defendido. Soçobrando, no entanto, a impugnação da decisão sobre a matéria de facto fica prejudicado o conhecimento da pretendida alteração da decisão de mérito. Na verdade, e conforme decidido pelo Acórdão da Relação de Guimarães de 19.12.2023, «dependendo a apreciação do recurso pertinente à interpretação e aplicação ao direito ao caso concreto do prévio sucesso do simultâneo recurso interposto sobre a matéria de facto fixada, sendo este último julgado improcedente, fica necessariamente prejudicado o conhecimento daquele» (disponível em www.dgsi.pt). Improcede também nesta parte o recurso. *V – DECISÃO Pelo exposto, e nos termos das disposições legais citadas, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação: i. em considerar não escrita a alínea b) dos factos não provados, por conter um juízo conclusivo. ii. em julgar totalmente improcedente o recurso de apelação interposto pela Ré recorrente e, em consequência, confirmar a sentença recorrida. *Custas da apelação pela Recorrente (conforme artigo 527.º, n.º 1 e n.º 2, do CPC, por nela ter decaído). * Évora, 02/10/2025 Maria Isabel Calheiros (Relatora) Anabela Raimundo Fialho (1ª Adjunta) Miguel Jorge Vieira Teixeira (2º Adjunto) |